LIVRO I
Paulo pastoreia os filipenses
Entrevista imaginária com o apóstolo Paulo (5) • Filipenses
Não sem razão a carta de Paulo aos filipenses é considerada como a carta da
alegria. Nesta conversa inventada, o apóstolo explica por quê.
ENTREVISTADOR — Sua gratidão para com os filipenses é grande.
PAULO — O que esses meus irmãos fizeram por mim nunca esquecerei. Você sabe: nem todos os cristãos prestam atenção às necessidades
dos outros. Os filipenses estão no outro grupo. Nunca me deixaram faltar
nada. Como escrevi, eles se associaram comigo na minha tribulação e me
supriram em todas as minhas necessidades. Quando recebi Epafrodito com
aquelas ofertas todas, eu me derramei em lágrimas de alegria. Eu não pedi
nada, e eles me deram tudo. Aleluia! Que Deus os recompense.
ENTREVISTADOR — Li sua carta e encontrei inúmeras expressões de
alegria, escritas na cadeia.
PAULO — Sim, escrevi a carta aos filipenses aqui, na prisão, com o
auxílio de Timóteo. Agora, olho para minha vida, sem saber o que me reserva, e me recordo da minha conversão na estrada para Damasco. Desde
então uma alegria sem fim tem me acompanhado. Aprendi a estar alegre
em toda e qualquer situação. Vivo feliz pois sou de Jesus. Quero ter a mente dele. Quero ter a atitude dele. Sou um filho amado de Deus. O que me
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acontecerá? Não sei. Vou sair vivo daqui? Não sei. O Deus que começou a
boa obra em mim vai terminá-la. Como, não sei. Eu estava morto, mas ele
me redimiu. O que vier é lucro.
ENTREVISTADOR — Gostei de ver em sua carta aquele hino que cantamos sobre a exaltação de Jesus.
PAULO — Eu faço isso para que as pessoas memorizem a doutrina por
meio de nossas canções.
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Filipenses 1.6
Deus é aquele que começa, aperfeiçoa
e completa sua obra em nós
Deus começou e consumará, mas não sem sua cooperação e parceria.1
Deus está aperfeiçoando a obra que começou em nós.
Estou convencido de que aquele que começou boa obra em vocês vai completá-la até o dia de Cristo Jesus.
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A graça de Deus nos torna cooperadores (colaboradores, “correalizadores”)
da sua obra no mundo (Fp 1.5). Essa obra se desenvolve na contramão dos
interesses dos nossos contemporâneos e mesmo de nossos próprios interesses, que são naturalmente outros. Como a obra lhe pertence, Deus nos capacitará a levá-la até o fim, apesar dos nossos ouvintes e apesar de nós mesmos.
Além disso, a graça de Deus é uma espécie de garantia prévia da sua
presença conosco, para nos conduzir em triunfo até o fim de nossa vida,
vitória que não se dá segundo as regras deste mundo, mas conforme os
ROBERTSON, A.T. Word pictures of the New Testament. Disponível em www.biblestudytools.com/commentaries/robertsons-word-pictures. Acessado em 1/8/2011.
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valores do alto (Cl 3.1). A graça é, portanto, um selo de qualidade sobre
nossa vida.
A experiência de Paulo
Desde sua inacabada viagem a Damasco, a experiência de vida do apóstolo
Paulo é um exemplo dessa verdade. Quando impediu que Saulo chegasse
ao seu projetado destino de ódio, Deus começou nele, com a concordância
dele, uma obra de transformação que só terminaria com a sua morte. Sua
nova vida foi uma trajetória de lutas, feitas de espinhos, açoites, prisões e
naufrágios, e também de vitórias, constituídas pela compreensão da natureza do mistério de Deus, pela proclamação deste mistério a um número
imenso de pessoas dos lugares mais distantes e pela edificação de comunidades inteiras no amor de Jesus Cristo, incluindo as de tantos séculos depois.
No entanto, o resultado maior da obra de Deus na vida de Paulo foi ter
ensinado o que muitos cristãos ainda precisamos alcançar: viver pela graça.
Quem pode dizer, como ele? Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem
alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. Tudo posso
naquele que me fortalece (Fp 4.12-13). Ao final de sua vida, ele pôde afirmar,
com alegria: Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé (2Tm
4.7). Deus sempre termina o que começa.
Pedro foi outro apóstolo que combateu o bom combate de Cristo. Ele
demorou a aprender, mas Deus começou e terminou sua obra no apóstolo
que tinha o temperamento forte como muitos de nós. Entre altos e baixos,
como também acontece conosco, talvez tenha pensado que sua oportunidade de servir ao Senhor tinha terminado quando negou, por três vezes,
conhecer a Jesus (Mt 26.75). No seu último encontro, contudo, ele teve novamente a oportunidade de declarar seu amor e seu compromisso para com
Cristo (Jo 21). Quando ele confessou que Jesus era o Messias (Mt 16.16),
teve início uma obra na sua vida. Quando ele liderou a igreja na sua gênese
(Atos 1-8), Deus continuou sua obra nele. Deus só escreve obras completas.
Abraão é outra prova de como o Senhor age conosco. Quando Deus
lhe pediu em sacrifício seu único filho, filho nascido após um tempo longuíssimo de oração e como cumprimento a uma dramática promessa,
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Deus é aquele que começ a , aperfeiçoa e completa sua obr a ...
Abraão deve ter achado que a sucessão de bênçãos em sua vida ia se encerrar. Quando viu o carneiro para ser sacrificado em lugar do seu menino, ele
entendeu que Deus não faz nada pela metade (Gn 22).
Essa verdade, contudo, tem o seu clímax na história familiar de Isaque
(Gn 25). Abraão enviou seu empregado Eliezer para buscar uma esposa para
seu filho. Deus orientou o mordomo de Abraão passo a passo, até encontrar
Rebeca, com quem Isaque se casou. Só que, tristeza das tristezas, Deus lhe
deu uma mulher estéril, portanto, incapaz de lhe dar uma descendência.
Isaque, em lugar de reclamar da bênção maldita, orou, durante longos vinte
anos (Gn 25.26), por sua fertilidade. A história terminou, como sabemos: o
Senhor lhe ouviu as orações, e Rebeca, sua mulher, concebeu (Gn 25.21).
Isaque sabia que o Senhor completaria a obra que tinha começado.
O Deus de Abraão e Isaque, a quem Pedro e Paulo serviam e a quem
nós servimos, não deixa sua obra pela metade. Embora não mereçamos,
ele nos torna idôneos (capazes, prontos) para receber a herança celestial
comum a todos os santos. E nós fruímos essa herança desde agora, embora
parcialmente, já que estamos sendo transformados dia a dia na imagem do
próprio Cristo (2Co 3.18).
Selados pelo Espírito
Isso nos acontecerá porque temos o selo do Espírito Santo estampado em
nós (Ef 1.13). Porque cremos em Deus, a promessa feita (de nos completar) se realizará. Em Efésios 1.14, o apóstolo usa uma figura do mundo
dos negócios financeiros para ilustrar como Deus age. A prática do penhor
bancário é antiga e persiste até os dias de hoje.
Uma das modalidades tem a ver com o oferecimento de garantias ao
banco por quem tem bens imóveis. Assim, se vamos a um banco tomar dinheiro emprestado, precisamos demonstrar que temos condições de honrar
o compromisso assumido. O banco exige que tenhamos bens suficientes
para pagar o empréstimo. Se não temos bens, nosso fiador precisa ter. Se
não houver pagamento, o banco fica com esses bens, vende-os e liquida a
dívida. O banco não pode perder. Por isso, ele penhora ou hipoteca esses
bens para se garantir. Jesus é a garantia de nossa vida. Ele se ofereceu ao
Pai como nossa garantia. Nós podemos falhar, mas nossa herança nos será
entregue porque Jesus a garante.
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Outra modalidade tem a ver com o oferecimento de joias ou pedras
preciosas em penhora. A Caixa Econômica Federal brasileira, por exemplo,
empresta dinheiro, desde que o tomador deixe nos seus cofres objetos no
valor correspondente à importância solicitada, já descontados os juros. Ao
final do período, o tomador comparece ao banco, devolve o dinheiro que
pegou e tem de volta as suas joias penhoradas. Nós somos propriedade de
Deus. Essa propriedade trocou de mãos (do Senhor da luz para o imperador das trevas) por um tempo, mas Deus a resgatou por meio de Jesus
Cristo, que é o penhor da nossa herança (Ef 1.14) de glória.
Ainda não vemos, nem na história geral nem em nossa história particular, a manifestação completa dessa glória. Pela fé, no entanto, nós a
vislumbramos. E só temos esse vislumbre porque o Espírito Santo do Pai e
do Filho já imprimiu em nós o selo da justificação e da santificação.
Esta é a realidade de todos os santos até os dias de hoje: somos criações
da graça de Deus, mas ainda não vivemos essa graça em toda a sua plenitude. Como nos ensina o mesmo apóstolo em outro texto (Rm 8.22-23),
a graça já nos alcançou, mas ainda não se consumou, razão por que ainda
gememos e suportamos as angústias próprias dos seres humanos. Mesmo
nós, os portadores das primícias do Espírito, aguardamos o tempo da redenção final, quando a obra será completada.
Definitivamente
O Espírito Santo nos sussurra ao ouvido, com sua linguagem própria (Rm
8.26), que já fomos resgatados e seremos resgatados. A obra da redenção
foi realizada DE UMA VEZ POR TODAS, mas vai também se manifestando AOS POUCOS em nossa vida diária (santificação) para se completar DEFINITIVAMENTE no final dos tempos, quando Cristo for tudo
em todos. Hoje ele é tudo em alguns, mas virá o tempo em que reinará
sobre todos. Hoje ele é tudo em parte de nós, mas virá o tempo em que
comandará cada célula do nosso ser. Eis o que esperamos, esperança que o
Espírito Santo alimenta a cada dia ao nos sustentar.
Este é o sentido da afirmação paulina: Deus está aperfeiçoando e continuará aperfeiçoando, para tornar completas a obra de salvação (transformação) que começou em nós e a obra do cuidado que exerce sobre nós,
e para nos tornar completos. Nisso consiste sua bênção sobre nossa vida.
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