CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAQUARA – UNIARA
Reitor
Luiz Felipe Cabral Mauro
Pró-Reitoria Acadêmica
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Pró-Reitoria Administrativa
Fernando Soares Mauro
REVISTA UNIARA
Conselho Editorial
Barbara Fadel – Uni-Facef /Franca
Denise Freitas – UFSCar/São Carlos
Marcelo Tavares – UFES/Vitória
Maria do Carmo Calijuri – USP/São Carlos
Mary Rosa Rodrigues de Marchi – Unesp/
Araraquara
Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco –
Unicamp/Campinas
Capa
Bruno Zago
Editores
Maria Lúcia Ribeiro
Denilson Teixeira
Luis Henrique Rosim
Lívia Nunes
Revisão
Dirce Charara Monteiro (Inglês)
Lívia Nunes (Editoração)
Rosmary dos Santos (Bibliográfica)
REVISTA UNIARA: Revista do Centro Universitário de Araraquara.
Araraquara – SP – Brasil, 1997.
v. 15, n. 1, jul. 2012. 132 p.
Publicação Semestral do Centro Universitário de Araraquara – Uniara.
ISSN 1415-3580
SUMÁRIO
EDITORIAL
...................................5
ARTIGOS ORIGINAIS
RELEITURA DO DIREITO DE PROPRIEDADE À LUZ DE SUA FUNÇÃO
...................................7
SOCIOAMBIENTAL E DA COMPENSAÇÃO AMBIENTAL COMO MECANISMO DE DENSIFICAÇÃO DO PRINCÍPIO
DO USUÁRIO PAGADOR/A REREADING OF THE PROPERTY RIGHT IN ORDER TO UNDERSTAND ITS SOCIAL
ENVIRONMENTAL FUNCTION AND THE INSTITUTE OF ENVIRONMENTAL COMPENSATION AS A MECHANISM OF
DENSIFICATION OF THE USER-PAYER PRINCIPLE
Mauricio Jorge Pereira da Mota
Daniel Queiroz Pereira
IDENTIFICANDO O PERFIL DO PÚBLICO-ALVO DOS CURSOS DE GRADUAÇÃO
.................................23
NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, NO BRASIL: UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA/IDENTIFYING THE
PROFILE OF THE SPECIFIC PEOPLE OF UNDERGRADUATE COURSES IN THE DISTANCE EDUCATION MODALITY IN
BRAZIL: AN EXPLORATORY ANALYSIS
Alexandre Luzzi Las Casas
Keyla Priscila dos Reis de Almeida
Rodrigo Bahia de Cerqueira Viana
"TEACHER, HOW TO DO THE 'PERNAS' IN ENGLISH?" UM ESTUDO COM
.................................35
CRIANÇAS BILÍNGUES DA 1.ª SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL/"TEACHER, HOW TO DO THE 'PERNAS' IN
ENGLISH?" A STUDY WITH BILINGUAL CHILDREN OF THE 1ST GRADE ELEMENTARY SCHOOL
Lidiomar José Mascarello
Mágat Nágelo Junges
PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUÇÃO COM EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
.................................54
UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA DO SEGMENTO QUÍMICO/PRODUCTION PLANNING AND CONTROL
WITH ENVIRONMENTAL EDUCATION: A CASE STUDY IN A CHEMICAL SEGMENT PLANT
Geraldo Cardoso de Oliveira Neto
Oduvaldo Vendrametto
Walther Azzolini Junior
Silvia H. Bonilla
.................................78
AVALIAÇÃO DE LOCAIS COM POTENCIAL E/OU UTILIZADOS NO TURISMO
AMBIENTAL NA CIDADE DE CAMPO GRANDE-MATO GROSSO DO SUL/AN EVALUATION OF PLACES
WITH POTENTIAL AND/OR USED IN THE ENVIRONMENTAL TOURISM IN THE CITY OF
CAMPO GRANDE-MATO GROSSO DO SUL
Andrea Cadija Duarte Jafar
Ademir Kleber Morbeck Oliveira
Vera Lúcia Ramos Bononi
Lúcia Elvira Alícia Raffo Mascaró
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
3
AVALIAÇÃO DA COMPATIBILIDADE ENTRE BULAS DE DIFERENTES MARCAS DE
..................................87
TIRAS REAGENTES DE URINA/EVALUATION OF COMPATIBILITY BETWEEN PACKAGE INSERTS OF
DIFFERENT BRANDS OF URINE REAGENT STRIPS
Guilherme de Oliveira Cezar
Vanessa Danesi dos Santos
Cláudia Funchal
ARTIGO DE REVISÃO
QUALIDADE: UMA REVISÃO DA LITERATURA NO ÂMBITO DE ENCONTROS
DE MARKETING/QUALITY: A LITERATURE REVIEW OF MARKETING
MEETINGS
Eduardo Carpejani
Wellington Aguiar
Guilherme Rossi
Natália Terra
Irene Raguenet Troccoli
................................101
COMUNICAÇÃO BREVE
GESTÃO DA INFORMAÇÃO E O SISTEMA SMART GRID: UM ESTUDO DE
CASO DA UFRN/INFORMATION MANAGEMENT AND SMART GRID
SYSTEM: A UFRN CASE STUDY
Arthur Nóbrega B. de Araújo
Jamerson Viegas Queiroz
Helton Tadeu P. Fernandes
João Paulo Bernardo da S. Gomes
Adriano Varella de Morais
................................121
NORMAS
................................131
4
DE
PUBLICAÇÃO
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
editorial
Tudo que observamos percorre um caminho até que seja interpretado por
nossa mente. Podemos dizer que esse percurso filtra a realidade e a transforma
em uma verdade pessoal, que muitas vezes pode interferir na comunicação e
na interpretação de fatos e situações. O resultado desse processo é nosso
modelo representativo do mundo e é por meio dele que definimos nossas
condutas e ações. Mudanças de valores e de comportamento são fundamentais
para o nosso futuro como sociedade. Assim, no limiar de uma situação em que
o consumismo e os valores materialistas exercem tamanha pressão sobre o
planeta, cabe perguntar por que não mudamos nosso comportamento.
Provavelmente a resposta esteja relacionada à formulação da nossa
representação do mundo e, de alguma forma, estamos ignorando as informações
que apresentam a urgência dessas mudanças, principalmente no que tange às
ações que estão ao nosso alcance. Entendermos nosso modelo de mundo frente
às questões ambientais significa caminharmos para uma realidade sustentável
de desenvolvimento.
Nesse sentido, a divulgação científica tem papel fundamental. A principal
função da revista acadêmica é justamente a disponibilização do conhecimento.
A Revista Uniara tem cumprindo esse papel trabalhando com conhecimentos
multidisciplinares, ampliando a participação de instituições e, certamente,
contribuindo na construção de um saber integrado. Este número apresenta
artigos que discutem questões ambientais, sociais e de saúde; esses manuscritos
de pesquisadores, de diferentes partes do Brasil, contribuem academicamente
com a máxima "pensar globalmente e agir localmente". É fundamental reconhecer
o papel da divulgação científica para a sociedade, pois a informação é a base
para estruturarmos novas concepções e ações. O resultado desse processo
pode alterar nosso modelo representativo de mundo.
Os Editores
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
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REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
RELEITURA DO DIREITO DE PROPRIEDADE À LUZ DE SUA
FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL E DA COMPENSAÇÃO AMBIENTAL
COMO MECANISMO DE DENSIFICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO
USUÁRIO PAGADOR
RESUMO
O escopo do presente trabalho consiste em realizar uma releitura do direito de propriedade de modo a se
chegar a um delineamento mais preciso de sua função socioambiental e do instituto da compensação ambiental.
Para tanto, empregou-se o método teórico-conceitual e descritivo-interpretativo, mediante a interpretação crítica
dos principais aspectos observados em relação ao tema. A partir daí, foi possível concluir que a função
socioambiental da propriedade figura como "peça estrutural" deste direito e as leis que determinam vínculos
ambientais ou ecológicos assumem um papel conformador (aclarador) dos limites constitucionalmente construídos
em consideração da tutela da natureza, do equilíbrio ecológico e do patrimônio cultural. Mais do que isso, a
partir da análise decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI n.º 3.378/DF, foi possível melhor compreender
o princípio do usuário-pagador, restando patente que cabe ao particular, na proporção da atividade por ele
despendida, reinternalizar os custos decorrentes de uma utilização intensiva e, por vezes, até predatória, dos
recursos ambientais, por meio do respectivo compartilhamento ou compensação.
PALAVRAS-CHAVE: Direito de propriedade; Função socioambiental; Compensação ambiental.
ABSTRACT
The objective of this work is to enable a rereading (new interpretation) of the property right in order to better
understand its social environmental function and the institute of environmental compensation. With this aim, we
used the theoretical-conceptual and descriptive-interpretative methods, offering a critical interpretation of the
main aspects related to the theme. This effort permitted us to conclude that the social environmental function of
the property stands as a "structural part" of this right and the laws that determine environmental links assume an
enlightening role of the constitutionally constructed limits in respect of nature's protection, environmental balance
and cultural estate. More than that, the analysis of Brazilian Supreme Court's decision in the ADI nº. 3.378/DF,
made it possible to understand the user-payer principle better, clarifying that it is the user's obligation, in the
proportion of the activity that he/she/it explores, to assume the costs of an intensive and, sometimes, predatory
use of environmental resources by the respective sharing or compensation.
KEYWORDS: Property right; Social environmental function; Environmental compensation.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
7
artigos originais
MOTA, Mauricio Jorge Pereira da. Procurador do Estado do Rio de Janeiro, professor de Direito Ambiental do
Mestrado e Doutorado da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Rua São
Francisco Xavier, n.º 524, 7.º andar, bloco F, sala 7045 – Maracanã, RJ – CEP 20550-900.
PEREIRA, Daniel Queiroz. Professor-assistente de Legislação Social da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro – UNIRIO. Bacharel, Mestre e Doutorando em Direito da Cidade pela Universidade do Estado
do Rio de Janeiro – UERJ. Rua Voluntários da Pátria, n.º 107 – Botafogo, RJ – CEP 20270-000.
E-mail: [email protected].
MOTA & PEREIRA
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 assegura o direito
de propriedade em seu art. 5.º, inc. XXII. Mais do
que isso, a Carta Magna declara expressamente que
a propriedade atenderá a sua função social (art. 5.º,
inc. XXIII), ou seja, indica que a propriedade "está
destinada a uma missão social, que necessariamente
terá de exercer, independentemente da vontade de seu
titular1".
Estabeleceu, pois, o legislador constituinte inegável
e íntima conexão dos objetivos a serem alcançados
pelo exercício do direito de propriedade com os
direitos fundamentais da pessoa, manifestando-se
também como expressão dos princípios da dignidade
da pessoa humana; do prestígio do valor social do
trabalho; do objetivo de erradicar a pobreza e a
marginalização; e da redução das desigualdades sociais
e regionais.
Mais do que isso, percebe-se hoje nítida
preocupação com a função socioambiental da
propriedade, que "funcionaliza o exercício do direito
de propriedade a interesses extraproprietários, como
a preservação do meio ambiente, consoante o que
dispõe o caput do artigo 1.228 do Código Civil2".
Nesse sentido, entende-se que os custos devem
integrar previamente a própria concepção do direito
fundamental, isto é, os custos devem ser trazidos para
o respectivo conceito, conduzindo a uma noção
pragmática de direito fundamental. O reconhecimento
de que todos os direitos envolvem custos quase sempre
elevados, e de que os recursos públicos são
insuficientes para a promoção de todos os ideais sociais
– impondo-se o sacrifício de alguns deles –, implica
também o reconhecimento de que tais direitos devem
ser exercitados com responsabilidade.
No que tange especificamente ao meio ambiente,
apesar de a Carta Magna, em seu art. 225, reconhecêlo como um "bem de uso comum de povo e essencial
à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações", o
que se constata é seu uso cada vez mais exaustivo e
exponencialmente degradante. Desse modo, faz-se
imperioso refletir acerca de mecanismos que permitam
a atribuição de uma justa medida do uso dos bens
ambientais e o asseguramento de um efetivo direito
difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
tal qual reclama o já aludido art. 225 da CRFB/88.
Nesse cenário se inserem as considerações que se
pretende traçar no decorrer deste trabalho acerca da
função socioambiental da propriedade, da noção de
compensação ambiental e do delineamento do princípio
do usuário pagador.
OS
DEL INEA M ENT OS D A F U NÇÃO SOC IAL DA
PROPRIEDADE
A propriedade, direito subjetivo por excelência na
época contemporânea, é uma construção social, que
se expressa na vitória dos movimentos revolucionários
liberais que culminaram com a Declaração de
Independência dos Estados Unidos da América, de 4
de julho de 1776, e com a Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão, na França, em 26 de agosto
do mesmo ano.
Contudo, a propriedade de características
individualísticas tem de se conformar à nova realidade
social, na qual a irrupção das necessidades de uma
sociedade de massas hipercomplexa torna necessárias
mudanças profundas nesse direito. É o momento em
que por toda parte se dissemina a ideia de função social,
1
Citando Orlando Gomes, menciona Joaquim Castro Aguiar que o novo esquema inerente à propriedade manifestou-se pela
consistência da função sob tríplice aspecto: "1.º – a privação de determinadas faculdades; 2.º – a criação de um complexo de
condições para que o proprietário possa exercer seus poderes; 3.º – a obrigação de exercer certos direitos elementares do
domínio". AGUIAR, Joaquim Castro. Direito da Cidade. Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p. 5.
2
MOTA, Mauricio. "Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal". In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do Direito Ambiental.
Rio de Janeiro: Elsevier, p. 8.
8
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
proclamando-a as Constituições e realçando-lhe os
aspectos singulares. Como a Constituição de Weimar
(art. 153), a Lei Fundamental da República Federal
Alemã de 1949 (art. 14, 2) ou a Constituição da Itália
(art. 42).
Há autores que, ainda no plano do subjetivismo,
irão propor a transmutação moderna do conceito de
direito subjetivo pelo de situação jurídica. Pietro
Perlingieri classifica mesmo a propriedade como uma
situação subjetiva complexa centro de interesses que
enfeixa poderes, deveres, ônus e obrigações, e cujo
conteúdo depende de interesses extraproprietários,
apurados no caso concreto3.
Entretanto, como definido em Tomás de Aquino, a
propriedade é propriedade segundo o uso e não
segundo a substância mesma dos bens. Uma
propriedade é legítima se está em conformidade com
os limites impostos pelo bem comum, pela destinação
universal, sempre anterior a qualquer uso particular4.
Procede-se, desse modo, à realização de verdadeiro
giro epistemológico, com a análise do tema a partir do
bem, da res, e de suas efetivas utilidades e não mais a
partir da ideia de "direito subjetivo"5.
Neste particular, é alvissareira a transcrição da
constatação que faz Rodotá acerca da disciplina do
direito de propriedade nas legislações modernas:
[...] las legislaciones modernas tienden a regular
la propriedad más en función de los bienes que
de los sujetos, llegándose a afirmar que "la
propriedad como derecho se disuelve y aparece
la propriedad como cosa"; con lo que se quiere
decir sustancialmente que ya no se persigue
garantizar la actividad del sujeto, sino la utilización
del bien del modo más conforme com el interes
que se considera preferente6 .
Uma propriedade será considerada legítima,
portanto, se estiver em conformidade com os limites
impostos pelo bem comum, pela destinação universal,
sempre anterior a qualquer uso particular. Desse modo,
a função social existe, primeiramente, nos bens objeto
do direito de propriedade, para depois se ver destacada
e atingida plenamente com o exercício do direito de
propriedade sobre eles, conforme o estatuto
proprietário reconheça ou não a função social deste
direito.
Na jurisprudência pátria, o Caso da Favela do
Pullman, em São Paulo, tornou-se paradigmático,
uma vez que o Tribunal de Justiça de São Paulo
considerou que, naquele caso, haveria uma
prevalência da posse com função social sobre a
propriedade sem função social, decisão
posteriormente confirmada pelo Superior Tribunal de
Justiça e transitada em julgado7.
Resta patente, portanto, que o direito à propriedade
dos bens pressupõe algum uso válido para estes no
decorrer do tempo. Assim, quando confrontada a
3
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: introdução ao direito civil constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pp.
121-122.
4
AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. II. II. v. 5. São Paulo: Loyola, 2005, p. 32, 5.
5
MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes teóricas do novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 148.
6
RODOTÁ, Stefano. El terrible derecho: estúdios sobre la propriedad privada. Madri: Civitas, 1987, p. 248.
7
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n.º 75.659-SP. Civil e Processual. Ação Reivindicatória. Terrenos de
Loteamento situados em área favelizada. Perecimento do direito de propriedade. Abandono. CC, arts. 524, 589, 77 e 78. Matéria
de fato. Reexame. Impossibilidade. Súmula n. 7-STJ. I. O direito de propriedade assegurado no art. 524 do Código Civil anterior
não é absoluto, ocorrendo a sua perda em face do abandono de terrenos de loteamento que não chegou a ser concretamente
implantado, e que foi paulatinamente favelizado ao longo do tempo, com a desfiguração das frações e arruamento originariamente
previstos, consolidada, no local, uma nova realidade social e urbanística, consubstanciando a hipótese prevista nos arts. 589
c/c 77 e 78, da mesma lei substantiva. II. "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial" – Súmula n.
7 – STJ. III. Recurso especial não conhecido. Recorrente: Aldo Bartholomeu e outros. Recorrido: Odair Pires de Paula e outros.
Relator: Ministro Aldir Passarinho Júnior. Brasília, 21 de junho de 2005. Disponível em www.stj.gov.br. Acesso em 18.5.2008.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
9
MOTA & PEREIRA
propriedade sem função social de bens supérfluos com
a posse com função social desses mesmos bens, a
propriedade deve ceder à posse porque, como
asseverava Tomás de Aquino, só será ato superrogatório pôr em comum, ativa ou passivamente, o
supérfluo em relação àqueles que não estão em
situação de necessidade extrema. Para todos os outros,
em litígio, impõe-se o dever de justiça de distribuição
dos bens8. Procede-se, conforme já mencionado, a
uma verdadeira reformulação do conteúdo da
propriedade.
Nas palavras de Maria Elizabeth Moreira
Fernandez, a propriedade privada – antes vista como
"direito negativo", conformativo de um espaço de
autonomia ao seu titular, com o correspondente dever
de abstenção por parte de seus destinatários passivos
– afigura-se hodiernamente uma propriedade positiva
porque o seu regime se encontra pré-figurado na
Constituição e configurado pela lei,
o que não quer dizer que o legislador ordinário
se encontre totalmente livre na tarefa de
conformar o direito em apreço, ou seja, que a
este caiba a determinação da totalidade de seu
conteúdo. Na verdade, o legislador ordinário
[...] encontra-se, na tarefa de complementar o
conteúdo deste direito fundamental, sujeito, por
outro lado, à garantia da propriedade, isto é, à
utilidade privada ou exercibilidade prática que
tal direito comporta e, por outro lado, à função
social que este desempenha no atual quadro
de Estado de Direito Social, cabendo-lhe
ponderar de modo justo ou proporcional os
interesses dos particulares e as exigências da
comunidade. O legislador, ao proceder à
concretização do direito de propriedade, realiza
uma síntese entre a proclamação sumária e
abstrata do preceito constitucional e o plano
da realidade factual, social e econômica de
modo a encontrar o âmbito da sua vigência
efetiva. A legislação há-de se encarregar de
aproveitar a propriedade constitucional para
instrumento ou veículo adequado de expressão
de novos interesses sociais, constituindo um
instrumento técnico de aplicação do programa
normativo, nomeadamente no que se refere à
prossecução do meio ambiente, da qualidade
de vida e do ordenamento do território9 .
Surge, assim, a função socioambiental como "peça
estrutural" do direito de propriedade10 e as leis que
determinam vínculos ambientais ou ecológicos assumem
um sentido conformador (aclarador) dos limites
constitucionalmente construídos em consideração da
tutela da natureza, do equilíbrio ecológico e do
patrimônio cultural.
A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE
O ambiente como "valor condicionador" do
direito de propriedade
Em Portugal, o fato de se encontrar previsto
constitucionalmente (art. 62.º CRP) dentro do
catálogo dos direitos econômicos, sociais e culturais
revela que o direito de propriedade, em especial
aquele cujo objeto incide sobre o solo, desempenha
um "protagonismo social", de modo específico
um protagonismo "ecológico-ambiental" que não
pode deixar de repercutir no âmago do seu estatuto
8
MOTA, Mauricio. Questões de Direito Civil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 593.
FERNANDEZ, Maria Elisabeth Moreira. Direito ao ambiente e propriedade privada: aproximação ao estudo e às consequências
das leis-reserva portadoras de vínculos ambientais. Coimbra : Coimbra, 2001, p. 174-175.
10
Na perspectiva de Juan Francisco Delgado de Miguel, a função social e a função ecológica não constituem, assim, um fim a
procurar no exercício do direito de propriedade privada, mas um dever que limita as suas faculdades, vinculando o seu exercício
a uma fronteira de interesses. J. F. DELGADO DE MIGUEL. Derecho Agrário Ambiental, Propryedad Y Ecologia, pp. 89-92
apud FERNANDEZ, Maria Elisabeth Moreira. Direito ao ambiente e propriedade privada: aproximação ao estudo e às
consequências das leis-reserva portadoras de vínculos ambientais. Coimbra : Coimbra, 2001, p. 193.
9
10
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
constitucional11.
No Brasil, conforme já mencionado, a propriedade
é reconhecida como direito fundamental (art. 5.º, inc.
XXII, CRFB/88) e, por isso, guarda "uma ligação
intrínseca com a liberdade pessoal. A ela cabe no
conjunto do sistema dos direitos fundamentais a tarefa
de assegurar ao titular dos direitos fundamentais um
espaço de liberdade na esfera jurídico-patrimonial
[...]12". Entretanto, não se pode perder de vista,
conforme já se afirmou sucessivas vezes no decorrer
deste trabalho, que também deve atender a sua função
social (art. 5.º, inc. XXIII, CRFB/88).
Nesse passo, insta relembrar que a propriedade
pressupõe a atuação do Estado na sua configuração e
isto se dá mediante a adoção de ações negativas e,
sobretudo, positivas, através do desenvolvimento de
um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente
equilibrado. Constata-se, pois, que
[...] a propriedade do solo encontra-se, hoje em
dia, sujeita ao exercício de uma função socialecológica, particularmente intensa, em
consequência da qual o legislador fica incumbido
da tarefa de harmonizar o interesse social da
mesma com o interesse individual, tantas vezes
antagônico e colidente, do seu proprietário13 .
No âmbito do ordenamento constitucional pátrio,
a função socioambiental da propriedade está
resguardada, como já salientado, nos arts. 225 e 170
da Carta Magna. Consoante o art. 225 da CRFB/88,
todo bem considerado essencial para a manutenção
da qualidade de vida deve ser especialmente
preservado, exigindo-se do seu proprietário, medidas
positivas e negativas para tanto, consubstanciando-se,
assim, a função socioambiental da propriedade. Da
mesma maneira, conforme o aludido art. 170, o uso
da propriedade para finalidades econômicas deve se
harmonizar com a preservação da utilização racional
dos recursos ambientais.
Já no plano infraconstitucional, o atendimento à
função socioambiental da propriedade instrumentalizase na Lei n.º 6.938, de 31 de agosto de 1981, que fixa
a Política Nacional do Meio Ambiente e visa promover,
dentre outros objetivos, "a imposição, ao usuário, da
contribuição pela utilização de recursos ambientais com
fins econômicos" e "a imposição ao poluidor e ao
predador" da obrigação de recuperar e/ou indenizar
os danos causados" (art. 4.°, VII). No mesmo sentido
segue o art. 36 da Lei n.º 9.985, de 18 de julho de
2000, que institui o Sistema Nacional das Unidades
de Conservação – SNUC.
Função socioambiental da propriedade,
compensação ambiental e princípio do usuário
pagador
Delineada a função socioambiental da propriedade
e indicados os principais dispositivos legais a ela
referentes, cumpre esclarecer os contornos da
compensação ambiental, uma vez que, se o direito de
propriedade se opera em função do direito de toda a
coletividade a um meio ambiente ecologicamente
equilibrado, quando o exercício do direito de
propriedade, através da construção de um grande
empreendimento, causa um significativo impacto
ambiental, tornando mais escassa a fruição do meio
ambiente pela coletividade presente e pelas gerações
futuras, exsurge para o proprietário o dever de
compensação. Esta foi a exegese que norteou a
paradigmática decisão do Supremo Tribunal Federal
na ADI n.º 3.378/DF, que adiante será mais bem
comentada.
11
FERNANDEZ, Maria Elisabeth Moreira. Direito ao ambiente e propriedade privada: aproximação ao estudo e às consequências
das leis-reserva portadoras de vínculos ambientais. Coimbra: Coimbra, 2001, p. 168.
12
BRITO, Miguel Nogueira de. A justificação da propriedade privada numa democracia constitucional. Coimbra: Almedina,
2007, p. 855.
13
FERNANDEZ, Maria Elisabeth Moreira. Direito ao ambiente e propriedade privada: aproximação ao estudo e às consequências
das leis-reserva portadoras de vínculos ambientais. Coimbra: Coimbra, 2001, p. 171.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
11
MOTA & PEREIRA
Desde já, percebe-se que a compensação ambiental
não decorre da contrariedade absoluta à norma jurídica
ambiental, quando então se poderia falar em ato ilícito
stricto sensu e responsabilidade civil, mas sim da
desconformidade para com o fim econômico-social
para o qual o direito de propriedade foi instituído.
Consoante à compensação ambiental e o princípio
do usuário pagador14, do qual decorre, o utilizador do
recurso ou promotor do impacto ambiental deve
suportar o conjunto dos custos destinados a tornar
possível a utilização do recurso ou a compensação do
impacto que não puder ser evitado.
Esclareça-se, mais uma vez, portanto, que a
compensação ambiental e, sobretudo,
O princípio do usuário-pagador não é uma
punição, pois mesmo não existindo qualquer
ilicitude no comportamento do pagador ele pode
ser implementado. Assim, para tornar obrigatório
o pagamento pelo uso do recurso ou pela sua
poluição não há necessidade de ser provado que
o usuário e o poluidor estão cometendo faltas
ou infrações. O órgão que pretenda receber o
pagamento deve provar o efetivo uso do recurso
ambiental ou a sua poluição. A existência de
autorização administrativa para poluir, segundo
as normas de emissão regularmente fixadas, não
isenta o poluidor de pagar pela poluição por ela
efetuada 15 .
A compensação ambiental tem por objetivo fazer
com que esses custos não sejam suportados nem pelo
Poder Público, nem por terceiros, mas pelo utilizador.
De outro lado, o limite da compensação será o custo
real do impacto ambiental (as externalidades ambientais
negativas), apurado consoante o EPIA/RIMA16,
podendo esse custo ser compartilhado com o Poder
Público quando o empreendimento for também do
14
O princípio do usuário pagador está expresso na Lei n.º 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que prevê que os recursos ambientais
são escassos (art. 1.º) e que aquele que os utiliza mais, em detrimento dos demais, deve arcar com o correlativo ônus pelo seu
uso intensivo:
Lei n.º 9.433, de 8 de janeiro de 1997
Art. 1.º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:
[...]
II – a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico.
Art. 5.º São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos:
[...]
IV – a cobrança pelo uso de recursos hídricos.
15
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 52. Neste particular, é
alvissareira a reprodução da lição de Henri Smets: "Em matéria de proteção do meio ambiente, o princípio usuário-pagador
significa que o utilizador do recurso deve suportar o conjunto dos custos destinados a tornar possível a utilização do recurso
e os custos advindos de sua própria utilização. Este princípio tem por objetivo fazer com que estes custos não sejam suportados
nem pelos Poderes Públicos, nem por terceiros, mas pelo utilizador. De outro lado, o princípio não justifica a imposição de taxas
que tenham por efeito aumentar o preço do recurso ao ponto de ultrapassar seu custo real, após se levarem em contas as
externalidades e a raridade". SMETS, Henri. Le Príncipe Utilisateur-Payer pour la Gestion Durable des Resources Naturelles.
GEP/UPP, doc. 1998.
16
"O Estudo Prévio de Impacto Ambiental consiste em estudo multidisciplinar que indica os pontos favoráveis e desfavoráveis
de determinado empreendimento e sugere medidas de mitigação dos impactos ambientais. Este estudo materializa o princípio
da prevenção. O Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente - RIMA deverá conter as conclusões do estudo, demonstrando
em linguagem acessível a toda a comunidade todas as vantagens e desvantagens, ambientais, sociais e econômicas. Deve-se
valer de quadros, tabelas, audiovisuais e simulações que facilitem a sua compreensão. Como norma, ficarão à disposição das
pessoas interessadas". MOTA, Mauricio. "Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova
interpretação da compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal". In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do
direito ambiental. Rio de Janeiro : Elsevier, 2009, p. 11.
12
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
interesse direto da coletividade.
Ao comentar os aspectos normativos concernentes
à compensação ambiental, salienta Mauricio Mota que:
A compensação ambiental foi introduzida no
ordenamento jurídico brasileiro pela Resolução
CONAMA n.º 10/1987 – a qual, quase 10 anos
depois, foi revogada e substituída pela Resolução
CONAMA n.º 02, de 18 de abril de 1996. De
início a compensação ambiental tinha um alcance
menor do que o atual, sendo exigida apenas dos
empreendimentos que pudessem destruir florestas
e outros ecossistemas (e não o meio ambiente
como um todo, o que deixava de lado, por
exemplo, o meio ambiente cultural e do trabalho),
em favor da implantação de uma Estação
Ecológica (e não das unidades de conservação
do grupo de proteção integral)17. Nesse sentido,
a Resolução CONAMA n.º 02/1996 ampliou o
objeto da compensação ambiental, permitindo que
os recursos desembolsados pelo empreendedor
a esse título fossem aplicados em outras unidades
de conservação públicas de proteção integral (de
uso indireto) que não, exclusivamente, as estações
ecológicas18 .
Finalmente, o art. 36 da Lei n.º 9.985, de 18 de
julho de 2000 (que institui o Sistema Nacional das
Unidades de Conservação – SNUC, disciplinou
17
Resolução CONAMA n.º 10, de 3 de dezembro de 1987.
Art. 1.º – Para fazer face à reparação dos danos ambientais causados pela destruição de florestas e outros ecossistemas, o
licenciamento de obras de grande porte, assim considerado pelo órgão licenciador com fundamento no RIMA, terá sempre
como um dos seus pré-requisitos a implantação de uma Estação Ecológica pela entidade ou empresa responsável pelo
empreendimento, preferencialmente junto à área.
Art. 2.º – O valor da área a ser utilizada e das benfeitorias a serem feitas para o fim previsto no artigo anterior, será proporcional
ao dano ambiental a ressarcir e não poderá ser inferior a 0,5% (meio por cento) dos custos totais previstos para a implantação
dos empreendimentos.
Art. 3.º – A extensão, os limites, as construções a serem feitas, e outras características da Estação Ecológica a implantar, serão
fixados no licenciamento do empreendimento pela entidade licenciadora.
18
Resolução CONAMA n.º 02, de 18 de abril de 1996.
Art. 1.º Para fazer face à reparação dos danos ambientais causados pela destruição de florestas e outros ecossistemas, o
licenciamento de empreendimentos de relevante impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente com
fundamento do EIA/RIMA, terá como um dos requisitos a serem atendidos pela entidade licenciada, a implantação de uma
unidade de conservação de domínio público e uso indireto, preferencialmente uma Estação Ecológica, a critério do órgão
licenciador, ouvido o empreendedor.
§ 1.º Em função das características da região ou em situações especiais, poderão ser propostos o custeio de atividades ou
aquisição de bens para unidades de conservação públicas definidas na legislação, já existentes ou a serem criadas, ou a
implantação de uma única unidade para atender a mais de um empreendimento na mesma área de influência.
§ 2.º As áreas beneficiadas dever-se-ão se localizar, preferencialmente, na região do empreendimento e visar basicamente a
preservação de amostras representativas dos ecossistemas afetados.
Art. 2.º O montante dos recursos a serem empregados na área a ser utilizada, bem como o valor dos serviços e das obras de
infraestrutura necessárias ao cumprimento do disposto no artigo 1.º, será proporcional à alteração e ao dano ambiental a
ressarcir e não poderá ser inferior a 0,50% (meio por cento) dos custos totais previstos para implantação do empreendimento.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
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MOTA & PEREIRA
o instituto da compensação, em termos legais19.
A regulamentação deste artigo veio pelo Decreto
n.º 4.340, de 22 de agosto de 2002 e pela
Resolução do CONAMA n.º 371, de 5 de abril
de 2006 (que, inclusive, revogou expressamente
a Resolução CONAMA 02/1996). Cumpre
mencionar também os atos normativos baixados
pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis – Ibama, com
vistas à criação e implantação da Câmara de
Compensação Ambiental (Portaria n.º 7, de 19
de janeiro de 2004, e Portaria n.º 44, de 22 de
abril de 2004) e gestão da compensação ambiental
(Instrução Normativa n.º 47-N, de 31 de agosto
de 2004)20.
Diante do exposto, é oportuno se proceder à
distinção entre responsabilidade civil e compensação
ambiental. Na compensação ambiental, ao contrário
da simples responsabilidade civil, há uma
preponderância do aspecto econômico, uma vez que
a atuação principal está ligada ao princípio da
contabilização dos custos, através do qual deve arcar
com os custos aquele que, pelo uso, provoca a
deterioração dos recursos naturais. Preconiza,
portanto, uma internalização dos custos sociais
externos. Na verdade, a compensação ambiental vai
muito além da responsabilidade civil, abrangendo
também a precaução, a prevenção e o diferimento do
dano no tempo.
Esclareça-se que o princípio da precaução traz,
antes de tudo, uma exigência de cálculo precoce dos
potenciais perigos para a saúde ou para a atividade de
cada um, quando o essencial ainda não surgiu21. Já o
princípio da prevenção incide quando existe certeza
científica de que a ocorrência de determinado evento
causará uma degradação significativa no meio
ambiente, consagrando o dever jurídico de se evitar a
consumação de danos ao meio ambiente. Em comum
têm o fato de que não há dano ambiental ainda
configurado e, assim, não se trata de responsabilidade
civil em seu sentido tradicional.
O dano futuro, ao seu turno, é o dano certo, mas
ainda não concretizado, quando da elaboração da
perícia sobre o local impactado. Consiste no
prolongamento inevitável e natural de uma situação
19
BRASIL. Congresso Nacional. Lei n. 9.985, de 18 de julho de 2000. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 19 jul.
2000. Seção 1.
Art. 36. Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, assim considerado pelo
órgão ambiental competente, com fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório - EIA/RIMA 373, o
empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral, de
acordo com o disposto neste artigo e no regulamento desta Lei.
§1.º O montante de recursos a ser destinado pelo empreendedor para esta finalidade não pode ser inferior a meio por cento dos
custos totais previstos para a implantação do empreendimento, sendo o percentual fixado pelo órgão ambiental licenciador, de
acordo com o grau de impacto ambiental causado pelo empreendimento.
§2.º Ao órgão ambiental licenciador compete definir as unidades de conservação a serem beneficiadas, considerando as
propostas apresentadas no EIA/RIMA e ouvido o empreendedor, podendo inclusive ser contemplada a criação de novas
unidades de conservação.
§3.º Quando o empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento a que
se refere o caput deste artigo só poderá ser concedido mediante autorização do órgão responsável por sua administração, e a
unidade afetada, mesmo que não pertencente ao Grupo de Proteção Integral, deverá ser uma das beneficiárias da compensação
definida neste artigo.
20
MOTA, Mauricio. "Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal". In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do direito ambiental. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2009, pp. 09-11.
21
GODARD, Olivier. "O princípio da precaução frente ao dilema das traduções jurídicas das demandas sociais: lições de método
decorrentes do caso da vaca louca". In: VARELLA, Marcelo Dias; PLATIAU, Ana Flávia Barros (coords.). Princípio da
precaução. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 164.
14
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
atual. Tal tipo de dano, também denominado "dano
consecutivo" ou "dano evolutivo" deve ser aferido a
partir de um juízo de alta probabilidade científica sobre
a sua ocorrência22.
No que concerne à natureza jurídica da
compensação ambiental, emergem diferentes
concepções.
Para alguns23, configura-se em modalidade de preço
público, pelo qual o empreendedor estaria remunerando
a União Federal pela exploração ou pelo uso de um
bem a ela pertencente. Ocorre que
há uma diferença marcante entre a compensação
ambiental (art. 36 da Lei n.º 9.985/2000) e a figura
chamada pela Lei n° 7.990/1989 de "compensação
financeira". No caso da exação prevista na Lei n°
7.990/1989, a obrigação é de recolher determinada
quantia aos cofres públicos (preço), enquanto a
compensação ambiental, conforme interpretação do
STF, engendra uma obrigação que pode ser cumprida
sem que recursos do empreendedor sejam recolhidos
diretamente ao erário. A obrigação do empreendedor
é de apoiar a implantação e manutenção de unidade
de conservação (art. 36, caput, da Lei n.° 9.985).
Após, quantificada em dinheiro essa obrigação (alíquota
definida de acordo com o grau de impacto ambiental),
a mesma pode ser cumprida diretamente pelo
empreendedor (sem o ingresso de recursos nos cofres
públicos) mediante "elaboração, revisão ou
implantação de plano de manejo", "aquisição de
bens e serviços necessários à implantação, gestão,
monitoramento e proteção da unidade,
desenvolvimento de estudos, etc." (art. 33 do
Decreto n.º 4.340/2002). Tudo isso é incompatível com
a noção de preço público24.
Para outros, configuraria modalidade de tributo,
havendo, dentro desta concepção, quem a considere
como taxa (de polícia)26 e quem defenda que configura
Cide (contribuição de intervenção ambiental)26.
Contudo, o valor pago a título de compensação
ambiental não se confunde com a taxa de polícia
cobrada pelo licenciamento ambiental, pois decorre
não do fato de os empreendedores utilizarem a
"máquina estatal" de polícia, mas sim da circunstância
de gerarem, com sua atividade, impacto ambiental
significativo e inafastável. Tampouco consiste em Cide,
uma vez que, ao determinar a aplicação de recursos
na melhoria das condições ambientais de espaços
territoriais especialmente protegidos, o Estado não está
buscando meios financeiros para promover uma
intervenção na ordem econômica, mas tão somente,
obrigando o causador de um impacto ambiental a
compensar o ambiente e a coletividade pelo mal
decorrente de sua atividade poluidora.
A par das concepções anteriormente esposadas,
há de se reconhecer que se trata de obrigação
econômica decorrente da função socioambiental da
propriedade:
A compensação ambiental, na realidade, tem
natureza jurídica de obrigação econômica de
22
STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 144.
23
CARNEIRO, Ricardo. "A reserva particular do patrimônio natural – RPPN como beneficiária da compensação ambiental
prevista na Lei 9.985/2000". In: FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de (coord.). Direito Ambiental em debate. Rio de Janeiro:
Esplanada, 2004, v. 1, p. 279-289
24
MOTA, Mauricio. "Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal". In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do direito ambiental. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2009, pp. 51-52.
25
SALIBA, Ricardo Berzosa. "A natureza jurídica da 'compensação ambiental': vícios de inconstitucionalidades". In: Revista
Interesse Público. Porto Alegre: Notadez, n. 29, 2005, p.197-214.
26
GUERRA, Sérgio. "Compensação ambiental nos empreendimentos de significativo impacto". In: WERNECK, Mário et alli
(coords.). Direito ambiental visto por nós advogados. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 139-145.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
15
MOTA & PEREIRA
reparação pelo uso do meio ambiente, entendido
esse como um direito intangível de todos a
determinada qualidade de vida, à preservação
do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Isso está expresso no caput do art. 225 da
Constituição Federal, que prevê que todos têm
direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondose ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações. Expressa ainda o mesmo
artigo, em seu parágrafo terceiro, que as
condutas e atividades consideradas lesivas ao
meio ambiente sujeitarão os infratores à
obrigação de reparar os danos causados 27 .
Dessa forma, figuram, resumidamente, como
características da compensação ambiental: o
proprietário/empreendedor é o responsável pela sua
implementação; a legitimidade do projeto deve ser
estabelecida antes das medidas compensatórias serem
consideradas, ou seja, o empreendimento deve estar
em consonância com todas as medidas legais exigíveis
de proteção do meio ambiente; os impactos deverão
ser evitados sempre quando possível ou então
mitigados, ou, como última alternativa, compensados,
de modo que não há que se falar em compra do direito
de poluir (que não existe); os impactos deverão ser
compensados em habitats de qualidade equivalente;
deve-se preferir sempre a compensação física, se esta
não for possível, torna-se necessário compensar
financeiramente.
Contudo, a reparação do dano ambiental ou, melhor
dizendo, sua compensação esbarra na dificuldade de
atribuição de preços aos bens e serviços ambientais.
Isso decorre do próprio caráter de bem público coletivo
do meio ambiente, cujo acesso é livre em razão da
inexistência de direitos claros de propriedade e do fato
de que seu "consumo" por um indivíduo não impedir
que ele também seja utilizado por outros. Não tendo
um preço, esses bens e serviços não podem ser objeto
de uma alocação ótima e acabam por ser
superexplorados e degradados. Contudo, conforme
salienta Paulo Affonso Leme Machado:
Temos que diferenciar dois momentos da
aplicação do princípio do "poluidor-pagador" ou
"predador-pagador": um momento é o da fixação
das tarifas ou preços e/ou da exigência de
investimento na prevenção do uso do recurso
natural, e outro momento é o da responsabilização
residual ou integral do poluidor. Com muita
acuidade, diz Cristiane Derani: "O custo a ser
imputado ao poluidor não está exclusivamente
vinculado à imediata reparação do dano. O
verdadeiro custo está numa atuação
preventiva" 28 . O pagamento efetuado pelo
poluidor ou pelo predador não lhes confere
qualquer direito de poluir.
O investimento efetuado para prevenir o dano ou
o pagamento do tributo ou do preço público não
isentam o poluidor ou predador de ter examinada
e aferida sua responsabilidade residual para
reparar o dano29.
Apesar do equívoco na designação da natureza
jurídica da compensação, que se configura como
obrigação econômica decorrente da função
socioambiental da propriedade, conforme já se teve
oportunidade de salientar, acerta o autor ao afirmar
que a compensação do dano não deve se limitar ao
valor patrimonial do meio ambiente afetado, mas deve
compreender os custos de uma atuação preventiva,
27
MOTA, Mauricio. Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal. In: _______ (coord.). Função social do direito ambiental. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2009, p. 56.
28
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 297.
29
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10 ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 52.
16
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
bem como a estimativa do valor dos serviços que o
pat rimônio atingido est aria produzindo ou
proporcionando à comunidade.
Consoante Tolmasquim30, o valor econômico total
de um recurso ambiental (VERA) é o valor que deriva
de seus atributos, com a peculiaridade de que esses
atributos podem estar ou não associados a um uso.
Ele apresenta a seguinte composição:
VERA = (VUD + VUI + VO) + VE
Sendo:
VU = VUD + VUI + VO
VU = valor de uso, que consiste naquele atribuído
a um bem ambiental pelos indivíduos que realmente o
utilizam ou usufruem;
VUD = valor de uso direto, que se expressa em
relação a um produto que possa ser consumido
diretamente (alimentos, biomassa), ou aos benefícios
que esse bem possa proporcionar (a produtividade de
um rebanho);
VUI = valor de uso indireto, que corresponde aos
benefícios funcionais que o bem produz ou às funções
ecológicas que desempenha (controle de enchentes),
produzindo algum efeito positivo sobre outros recursos;
VO = valor de opção, atribuído pelos indivíduos que,
sem utilizar no presente determinado bem ambiental,
pretendem conservá-lo para potencial uso futuro, tanto
para si mesmos, como para as futuras gerações;
VE = valor de existência, que consiste naquele
atribuído ao bem ambiental independentemente de seu
uso atual ou futuro, explicando-se por variados
motivos, desde o desejo de ofertar o meio ambiente
para as gerações futuras, até a simpatia por espécies
ou animais, fundamentada no sentimento ético de
direito à existência dos não humanos.
A cada uma destas parcelas correspondem um ou
vários métodos de valoração. Segundo Cláudio Elias
Carvalho31, os mais comuns são:
a) Produtividade Marginal: é baseado em uma
abordagem que mensura alterações na produtividade
de um sistema natural ou processo produtivo resultante
de mudanças nas condições ambientais. Os preços de
mercado ofertados podem ser usados para valorar essas
alterações. Esta abordagem é útil para dimensionar
impactos ambientais que afetam, por exemplo, a
produtividade pesqueira, agrícola ou de florestas;
b) Custo de Reposição/Reparação: usa as despesas
incrementais na reposição, manutenção ou reparação
de um bem físico como medida do dano ambiental. O
custo deve ser o resultado de alguns tipos de impactos
distintos dos custos de reposição e reparação que
normalmente ocorreriam, dadas as condições
ambientais do caso base. Esta abordagem se apóia na
hipótese de que o custo de reposição/reparação é, no
mínimo, tão alto quanto o valor do bem que é afetado;
c) Custos de Re-Localização: esta abordagem
considera os custos de realocar uma atividade física
que, em decorrência da mudança nas condições do
meio ambiente, não pode mais operar efetivamente em
sua localização original. Estes custos refletem o valor
econômico do dano ambient al previst o ou,
inversamente, os benefícios de prevenir o dano;
d) Despesas de Proteção: esta abordagem valora
os danos causados pela degradação ambiental de
acordo com os custos que consumidores e/ou
produtores estão dispostos a assumir para prevenir o
dano (por exemplo, a poluição) ou para obter algum
melhoramento de seu meio ambiente;
e) Despesas de Prevenção/Mitigação: esta
metodologia analisa as atuais despesas que as pessoas
têm na tentativa de evitar um dano ambiental (por
exemplo, a poluição) ou outras atividades ofensivas
ao bem-estar humano, para determinar a importância
30
TOLMASQUIM, Mauricio T. Metodologias de valoração econômica do meio ambiente. Rio de Janeiro: Coppe/UFRJ – PPE,
1999.
31
CARVALHO, Cláudio Elias. Desenvolvimento de procedimentos e métodos para mensuração e incorporação das externalidades
em projetos de energia elétrica: uma aplicação às linhas de transmissão aéreas. Tese de Doutorado. São Paulo: Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo, 2005, p. 64-73.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
17
MOTA & PEREIRA
que o indivíduo atribui ao meio ambiente e aos impactos
à saúde humana. Indiretamente, avalia as despesas para
mitigar o dano ambiental;
f) Método do Valor de Propriedade ou de Preços
Hedônicos: esta abordagem (também chamada de preços
hedônicos) busca mensurar os danos ou os benefícios de
melhoramentos ambientais traçando os efeitos da
qualidade ambiental nos preços da propriedade;
g) Método do Custo de Viagem (MCV): este método
foi criado para medir os benefícios proporcionados pelos
locais de recreação, especialmente os de livre acesso.
Os usuários não pagam nada ou no máximo uma taxa
nominal e, por isso, não há indicação direta da
disposição a pagar pelos benefícios. O MCV mensura
a disposição a pagar pelo acesso a um local derivandose de uma curva de demanda. O método estima a
demanda por um sítio natural com base na demanda de
atividades recreacionais ou serviços ambientais que este
sítio pode proporcionar;
h) Método da Valoração Contingente (MVC):
procura mensurar monetariamente o impacto no nível
de bem-estar dos indivíduos decorrente de uma
variação quantitativa ou qualitativa dos bens ambientais.
Esta abordagem baseia-se na premissa de que os
consumidores podem e irão revelar sua real disposição
a pagar por bens que não são de mercado dentro de
um mercado hipotético. Uma das vantagens desse tipo
de metodologia consiste justamente em produzir
estimativas de valores que não poderiam ser obtidos
por outros meios. Tais bens incluem, por exemplo, a
preservação de espécies, estética ambiental, fenômenos
históricos ou diversidade genética.
Delimitadas as bases da compensação ambiental,
cumpre relembrar que percorrer tal iter só foi possível
a partir da nova interpretação que o STF conferiu ao
princípio do usuário pagador, do qual decorre. Tratase da ADI n.º 3.378/DF, proposta pela Confederação
Nacional das Indústrias – CNI, que tinha por objeto a
declaração da inconstitucionalidade do art. 36 e seus
§§ 1.º, 2.º e 3.º, da Lei n.º 9.985/200032. Ficou assim
ementado, por fim, o acórdão do Supremo Tribunal
Federal, na referida ADI:
AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 36 E
SEUS §§ 1.º, 2.º E 3.º DA LEI N.º 9.985, DE
32
Constitucionalidade da compensação devida pela implantação de empreendimentos de significativo impacto ambiental.
Inconstitucionalidade parcial do § 1.º do art. 36.
1. O compartilhamento-compensação ambiental de que trata o art. 36 da Lei nº 9.985/2000 não ofende o princípio da legalidade,
dado haver sido a própria lei que previu o modo de financiamento dos gastos com as unidades de conservação da natureza. De
igual forma, não há violação ao princípio da separação dos Poderes, por não se tratar de delegação do Poder Legislativo para
o Executivo impor deveres aos administrados.
2. Compete ao órgão licenciador fixar o quantum da compensação, de acordo com a compostura do impacto ambiental a ser
dimensionado no relatório – EIA/RIMA.
3. O art. 36 da Lei nº 9.985/2000 densifica o princípio usuário-pagador, este a significar um mecanismo de assunção
partilhada da responsabilidade social pelos custos ambientais derivados da atividade econômica.
4. Inexistente desrespeito ao postulado da razoabilidade. Compensação ambiental que se revela como instrumento adequado
à defesa e preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, não havendo outro meio eficaz para atingir
essa finalidade constitucional. Medida amplamente compensada pelos benefícios que sempre resultam de um meio ambiente
ecologicamente garantido em sua higidez.
5. Inconstitucionalidade da expressão "não pode ser inferior a meio por cento dos custos totais previstos para a implantação
do empreendimento", no § 1.º do art. 36 da Lei n.º 9.985/2000. O valor da compensação-compartilhamento é de ser fixado
proporcionalmente ao impacto ambiental, após estudos em que se assegurem o contraditório e a ampla defesa. Prescindibilidade
da fixação de percentual sobre os custos do empreendimento.
6. Ação parcialmente procedente.
(BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Pleno. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.378-DF. Relator: Ministro Carlos Ayres
Britto. Acórdão de 8 de abril de 2008. DJ n. 112, 20.06.2008) (Grifei).
18
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
18 DE JULHO DE 2000.
CONSTITUCIONALIDADE DA
COMPENSAÇÃO DEVIDA PELA
IMPLANTAÇÃO DE
EMPREENDIMENTOS DE
SIGNIFICATIVO IMPACTO AMBIENTAL.
INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL
DO § 1.º DO ART. 36.
1. O compartilhamento-compensação
ambiental de que trata o art. 36 da Lei n.º
9.985/2000 não ofende o princípio da
legalidade, dado haver sido a própria lei que
previu o modo de financiamento dos gastos
com as unidades de conservação da natureza.
De igual forma, não há violação ao princípio da
Separação dos Poderes, por não se tratar de
delegação do Poder Legislativo para o Executivo
impor deveres aos administrados.
2. Compete ao órgão licenciador fixar o quantum
da compensação, de acordo com a compostura
do impacto ambiental a ser dimensionado no
relatório - EIA/RIMA.
3. O art. 36 da Lei n.º 9.985/2000 densifica o
princípio usuário-pagador, este a significar
um mecanismo de assunção partilhada da
responsabilidade social pelos custos
ambientais derivados da atividade
econômica.
4. Inexistente desrespeito ao postulado da
razoabilidade. Compensação ambiental que se
revela como instrumento adequado à defesa e
preservação do meio ambiente para as presentes
e futuras gerações, não havendo outro meio eficaz
para atingir essa finalidade constitucional. Medida
amplamente compensada pelos benefícios que
sempre resultam de um meio ambiente
ecologicamente garantido em sua higidez.
5. Inconstitucionalidade da expressão "não pode
ser inferior a meio por cento dos custos totais
previstos para a implantação do empreendimento",
33
no § 1.º do art. 36 da Lei n.º 9.985/2000. O valor
da compensação-compartilhamento é de ser
fixado proporcionalmente ao impacto ambiental,
após estudo em que se assegurem o contraditório
e a ampla defesa. Prescindibilidade da fixação
de percentual sobre os custos do
empreendimento.
6. Ação parcialmente procedente.
Percebe-se claramente, a partir da ementa ora
reproduzida, que o STF assentou que o direito de
propriedade se opera em função do direito de toda a
coletividade a um meio ambiente ecologicamente
equilibrado. Tal assertiva se torna ainda mais evidente
a partir da transcrição do seguinte fragmento do voto
do Ministro Relator Carlos Ayres Brito:
O desvelo com o meio ambiente foi tanto que a
Magna Lei Federal dele também cuidou,
autonomamente, no Capítulo VI do Título VIII.
E o fez para dizer que o "meio ambiente
ecologicamente equilibrado" é direito de todos,
erigindo-o, ainda, à condição de bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida (art. 225, caput). Além disso, a nossa Carta
Federal impôs ao Poder Público e à coletividade
o dever de defender e preservar o meio ambiente
para as presentes e futuras gerações, arrolando
as competências-deveres que a esse Poder
incumbe, minimamente (à guisa de exemplos,
portanto, e não de modo taxativo ou exauriente).
Não sem antes fazer da "defesa do meio
ambiente" um dos princípios da própria Ordem
Econômica brasileira (inciso VI do art. 170)33.
Assim, conforme já se mencionou, se o exercício
do direito de propriedade, através da construção de
um grande empreendimento, causa significativo impacto
ambiental, tornando mais escassa a fruição do meio
ambiente pela coletividade presente e pelas gerações
Disponível em: http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/ADI3378.pdf. Consulta em: 02 de setembro de 2011.
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19
MOTA & PEREIRA
futuras, exsurge para o proprietário o dever de
compensação.
O STF, na ADI em comento, posicionou-se no
sentido de que a compensação ambiental não
decorreria da contrariedade absoluta à regra jurídica
ambiental, quando então poderíamos falar em ato ilícito
stricto sensu e responsabilidade civil, mas sim da
desconformidade para com o fim econômico-social
para o qual o direito de propriedade foi instituído. O
usufruto maior do meio ambiente por parte de alguns
importa no usufruto menor por parte dos demais e,
como os direitos têm custos, estes custos fazem parte
do conteúdo do próprio direito, daí a obrigação de
compensação devido ao compartilhamento do mesmo
direito. Isso decorre da noção de que a propriedade é
uma função socioambiental, correlacionada e
funcionalizada ao direito difuso de todos ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado34.
Assim, a função precípua da compensação
ambiental não é a reparação dos danos causados,
"voltada para o passado", própria da responsabilidade
civil, mas a prevenção de danos graves e, por vezes,
irreversíveis, orientada para o futuro. A função
preventiva da compensação ambiental visa alterar o
processo de utilização abusiva dos recursos ambientais.
Salienta ainda em seu voto o Ministro Carlos Ayres
Brito que:
Nessa ampla moldura, é de se inferir que o fato
de, aqui e ali, inexistir efetivo dano ambiental não
significa isenção do empreendedor em partilhar
os custos de medidas preventivas. Isto porque
uma das vertentes do princípio usuário-pagador
é a que impõe ao empreendedor o dever de
também responder pelas medidas de prevenção
de impactos ambientais que possam decorrer,
significativamente, da implementação de sua
empírica empreitada econômica35.
Por fim, insta mencionar que a decisão do Supremo
Tribunal Federal, através de uma declaração parcial
de inconstitucionalidade com redução de texto
suprimiu, ainda, a apriorística fixação de percentual
mínimo sobre o custo do empreendimento, no montante
de meio por cento dos custos totais previstos para a
implantação do empreendimento, prevista no parágrafo
primeiro do art. 36 da Lei n.º 9.985/2000. Isso permite
que o órgão licenciador defina o valor do financiamento
compartilhado em estrita conformidade com os dados
técnicos do EIA/RIMA, aptos a apurar, com a
necessária precisão, o grau de impacto ambiental
provado pela implantação do empreendimento.
Entendeu o Pretório Excelso que o custo do
empreendimento não é o critério adequado para a
determinação do quantum da compensação ambiental,
mas sim o impacto (perda) do meio ambiente, apurável
através do EPIA/RIMA36.
Contudo, a aludida decisão consagra, apenas
implicitamente, o reconhecimento de que a
compensação ambiental representa uma contrapartida,
financeira ou de outra natureza, pelo impacto nos bens
ambientais decorrente do desenvolvimento de um
empreendimento ou de uma atividade econômica. De
fato, a compensação cumpre o papel de compensar
os demais titulares do direito difuso ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado pelas externalidades
provocadas pela nova instalação. Conforme já se teve
oportunidade de comentar à saciedade, trata-se de um
instrumento econômico, imposto por norma legal, de
gestão do meio ambiente.
34
MOTA, Mauricio. Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal. In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do direito ambiental. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 08.
35
Disponível em: http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/ADI3378.pdf. Consulta em: 2 de setembro de 2011.
36
MOTA, Mauricio. Função socioambiental da propriedade: o princípio do usuário pagador na nova interpretação da
compensação ambiental pelo Supremo Tribunal Federal. In: MOTA, Mauricio (coord.). Função social do direito ambiental. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2009, pp. 15-16.
20
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Releitura do direito de propriedade...
CONCLUSÃO
O escopo do presente trabalho, conforme o próprio
título já evidencia, consiste em realizar uma releitura
do direito de propriedade de modo a se chegar a um
delineamento mais preciso de sua função
socioambiental e do instituto da compensação
ambiental. Para a consecução de tal desiderato,
buscou-se desconstruir o caráter voluntarista do
sistema jurídico pátrio, centrado no direito subjetivo,
e que considerava a função social da propriedade como
uma mera limitação externa ao próprio direito de
propriedade.
Constatou-se, assim, que o reconhecimento da
propriedade privada não exonera o proprietário da
responsabilidade moral por exigências de justiça.
Desse modo, a terra não consiste propriamente em
uma mercadoria, apresentando conotações sociais,
culturais e ideológicas que a tornam singular e a
propriedade tem, portanto, de se conformar à nova
realidade social, na qual a irrupção das necessidades
de uma sociedade de massas hipercomplexa torna
necessárias mudanças profundas neste direito.
Uma propriedade só é legítima se está em
conformidade com os limites impostos pelo bem
comum, pela destinação universal, sempre anterior a
qualquer uso particular.
Nesse cenário, a função socioambiental da
propriedade figura como "peça estrutural" desse
direito e as leis que determinam vínculos ambientais
ou ecológicos assumem um sentido conformador
(aclarador) dos limites constitucionalmente
construídos em consideração da tutela da natureza,
do equilíbrio ecológico e do patrimônio cultural. É
alvissareiro reafirmar que todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações (art. 225, caput, da CF). Desse
modo, os bens, embora tenham titularidades
específicas (públicas ou particulares), em seu aspecto
ambiental são de utilização comum de todos, o que
se coaduna com sua natureza de direito difuso.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
No presente estudo, buscou-se ainda destacar os
principais aspectos da decisão do Supremo Tribunal
Federal na ADI n.º 3.378/DF, que, fundando-se na
interpretação de que a propriedade cumpre também
uma função socioambiental, contribuiu para a
construção da noção de compensação ambiental
como uma decorrência do princípio do usuário
pagador.
Um empreendimento que cause significativo
impacto ambiental acarreta, necessariamente, o conflito
entre dois direitos fundamentais, o direito à livre
iniciativa/desenvolvimento econômico e o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado. Da
composição necessária entre esses dois direitos resulta
uma situação jurídica que implica a consecução da obra,
mas, também, a alteração adversa das características
do meio ambiente que existia anteriormente. Esse
desnível entre a realidade ambiental antes existente e a
atual deve ser compensado.
A partir da referida decisão, fica patente que cabe
ao particular, na proporção da atividade por ele
despendida, apurada através do EPIA/RIMA,
reinternalizar os custos decorrentes de uma utilização
intensiva e, por vezes, até predatória, dos recursos
ambientais no bojo de seu empreendimento, por meio
do respectivo compartilhamento ou compensação. É
inegável que sua utilização maior, em detrimento dos
demais titulares do mesmo direito difuso ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado e das futuras
gerações, reclama a aplicação do instituto da
compensação, que, por sua vez, densifica o princípio
do usuário pagador e permite o pleno atendimento da
função socioambiental da propriedade.
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RECEBIDO EM 27/2/2012
ACEITO EM 29/5/2012
22
REVISTA UNIARA,v.15, n.1, julho 2012
IDENTIFICANDO O PERFIL DO PÚBLICO-ALVO DOS CURSOS DE
GRADUAÇÃO NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA,
NO BRASIL: UMA ANÁLISE EXPLORATÓRIA
LAS CASAS, Alexandre Luzzi. Professor titular da Pontificia Universidade Católica de São Paulo, FEA,
PUC-SP e doutor em Administração pela Fundação Getúlio Vargas, FGV-SP, Rua Monte Alegre, 984, São
Paulo. E-mail: [email protected].
ALMEIDA, Keyla Priscila dos Reis de. Mestranda em Administração na Pontificia Universidade Católica
de São Paulo, FEA, PUC-SP, Rua Monte Alegre, 984, São Paulo. E-mail: [email protected].
VIANA, Rodrigo Bahia de Cerqueira. Mestrando em Administração na Pontificia Universidade Católica
de São Paulo, FEA, PUC-SP, Rua Monte Alegre, 984, São Paulo. E-mail: [email protected].
RESUMO
A modalidade de educação a distância (EAD), processo de aprendizado em que parte da transmissão do
conhecimento é realizado de forma remota, tem se desenvolvido rapidamente no Brasil e se configurado como
uma alternativa educacional importante pelo seu potencial de inclusão social. Embora o número de matrículas e
a oferta de cursos de graduação tenham crescido significativamente nos últimos anos, um problema persistente
para a evolução dessa oferta é a carência de informações quantitativas e qualitativas atualizadas sobre o perfil
dos alunos matriculados. Para tentar suprir esta lacuna, este artigo busca identificar as principais características
desse grupo de alunos utilizando os dados do Censo de Educação Superior de 2009 e os resultados do
questionário socioeconômico do Enade de 2009, para depois fornecer sugestões para a customização e melhoria
dos cursos de graduação oferecidos nessa modalidade no Brasil.
PALAVRAS-CHAVE: Educação a distância; Marketing Educacional; Segmentação mercadológica.
ABSTRACT
Distance education (DE), a learning process where some parts of the knowledge transmission is remotely conducted
, has developed fast in Brazil and has been considered an important educational alternative, due to its great
potential for social inclusion. Although both the enrollment and the offer of undergraduate courses have grown
significantly in recent years, a persistent problem for the enhancement of this learning alternative is the lack of
quantitative and qualitative information about the student population. In order to try to fill this gap, this paper
aims to identify the main specific characteristics of this group of students using data from the Higher Education
Census 2009 and the results of the Socio-Economic Survey of ENADE 2009, then providing suggestions for
the customization and improvement of the undergraduate courses offered via DE in Brazil.
KEYWORDS: Distance Education; Educational Marketing; Marketing segmentation.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
23
LAS CASAS et al.
INTRODUÇÃO
Nas economias modernas, as fontes primárias de
troca são crescentemente benefícios de competências
especializadas (conhecimentos e capacidades
aplicadas), e a fonte do crescimento econômico é a
aplicação desses conhecimentos em bens e serviços
(LUSCH; VARGO; TANNIRU, 2004). Como reflexo
dessa nova realidade econômica, a busca por
conhecimento especializado tornou-se uma das mais
importantes vias para a ascensão social em muitas
sociedades, inclusive a brasileira. Moraes (2010)
afirma que a capacidade das nações de educarem sua
população parece constituir um divisor de águas que
separa o mundo moderno em diferentes categorias,
de acordo com o grau de escolaridade da população
de cada país. Costa (2009), utilizando os dados do
Censo de Educação Superior de 2007, notou que
menos de 15% dos jovens brasileiros, entre 18 e 24
anos, cursavam a universidade naquele ano. O índice,
considerado muito baixo para os padrões
internacionais, demonstra que o ensino superior, apesar
de ser tradicionalmente considerado um dos
elementos-chave da mobilidade social, permanece de
difícil acesso para boa parte dos jovens brasileiros,
por diferentes razões, entre as quais a necessidade de
conciliar o horário de trabalho e o das aulas, as
dificuldades no deslocamento até a universidade e os
custos envolvidos no pagamento das mensalidades.
Segundo Marinho (2010), citando dados da
Unesco, quando comparado a países de renda média
similar, o Brasil mostra um claro déficit educacional:
por exemplo, em 2008, o Chile possuía 43% da
população entre 18 e 24 anos matriculada em
universidades. O reconhecimento das dificuldades de
inclusão motivou diversas iniciativas governamentais
na última década, como o fortalecimento de
programas de financiamento estudantil (como o
ProUni) e a ampliação do número de vagas nas
universidades públicas. Essas iniciativas, apesar de
extremamente positivas, claramente não conseguirão
sanar os problemas para o acesso da população jovem
à educação superior no curto prazo. Dessa forma, de
acordo com Costa (2009), apesar do crescimento de
24
150% no número de alunos em 10 anos (entre 1994 e
2004), estamos claramente atrasados em relação a
muitos outros países emergentes.
Nesse contexto, a educação a distância (EAD) –
em que a maior parte do processo de aprendizado é
realizada de forma remota – tem o potencial de se
configurar como uma alternativa educacional
interessante pelo seu grande potencial de expansão e
de inclusão social, dada a flexibilidade do modelo e os
seus custos mais baixos que os da educação presencial.
Entretanto, os cursos de EAD só foram regulamentados
no país a partir de 1996, por meio da Lei de Diretrizes
de Base da Educação (Lei n.º 9.394/1996), porém de
forma semipresencial (a lei obriga as Instituições de
Ensino a proverem centros presenciais para atender
aos alunos na modalidade EAD, com o objetivo de
garantir um melhor acompanhamento do processo
educacional). Até 2005, contudo, não houve
participação efetiva das universidades públicas, pois
apenas naquele ano foi criado pelo Ministério da
Educação, o Sistema Universidade Aberta do Brasil
(UAB), sistema integrado por universidades públicas
e que busca oferecer cursos em diversos níveis (desde
especializações lato sensu à graduação e pósgraduação stricto sensu) por meio do uso da EAD.
Apesar de decorridos 15 anos desde a
regulamentação dos cursos superiores a distância no
Brasil, ainda existem muitas indicações de que o
reconhecimento da validade dessa modalidade
educacional não é consensual. Permanece acalorado
o debate entre os partidários da exclusão dos cursos
de graduação via EAD e os estudantes matriculados
em cursos nesta modalidade. Entende-se que as
resistências de alguns educadores e profissionais
merecem sem dúvida ser consideradas seriamente, uma
vez que os temores que motivaram as críticas poderão
se justificar nos próximos anos, com a popularização
da EAD e a expansão da oferta de cursos de qualidade
questionável. Caberá ao MEC acompanhar as
Instituições de Ensino Superior (IES) e exigir que
estas executem melhoramentos contínuos e sanem os
problemas observados. Por outro lado, é factível
supor que diversos problemas já detectados no ensino
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Identificando o perfil do público-alvo dos cursos...
superior presencial não serão resolvidos pela EAD.
Por exemplo, a falta de preparo de parte dos alunos
que ingressam no ensino superior (dado o seu fraco
desempenho no ensino médio) poderá ser um
impedimento para que consigam ter sucesso na EAD,
uma vez que este exige mais disciplina e algum grau de
autodidatismo.
Contudo, há que se reconhecer que existe certa
dose de preconceito nas críticas. O ensino a distância,
apesar de certamente sujeito a problemas de qualidade
(como, aliás, qualquer tipo de ensino), impõe em geral
maior planejamento que o ensino presencial, em que
há maior possibilidade de improvisação. Como afirma
o professor Moran (2007, p.2), a própria experiência
de criação de material para cursos EAD pode se refletir
numa melhor preparação de cursos presenciais. O
autor afirma, baseado em sua experiência, que
frequentemente os professores envolvidos na
organização de atividades a distância verificam que
estas exigem planejamento, dedicação, comunicação
e avaliação bem executados; caso contrário, os alunos
se desmotivam e desaparecem.
Esses mesmos professores, ao voltar para as salas
de aula presenciais, costumam ter uma sensação
de estranhamento, de que no presencial falta algo;
de que o planejamento é muito menos rigoroso,
que as atividades em sala são muito menos
previstas, que o material poderia ser mais
adequado e que a avaliação é decidida, muitas
vezes, ao sabor dos acontecimentos. Professores
e alunos, ao ter acesso a bons materiais a
distância, costumam trazê-los também para a sala
de aula presencial e isso vem contribuindo para a
diminuição da separação que ainda há entre os
que fazem cursos a distância e os presenciais,
nas universidades. (MORAN, 2007, p. 2).
Em resumo, a questão da manutenção da qualidade
nos cursos de graduação EAD é complexa e depende
de um esforço educacional intenso para a criação de
material didático e condições tecnológicas apropriadas.
Nesse aspecto, Prata (2003) propõe um framework
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
para a avaliação da aprendizagem a distância com
diversos módulos distintos, enfocando diversos
aspectos (por exemplo, Autoavaliação e Reflexões do
aluno, Planejamento das atividades, Avaliação do curso,
etc.). Restam poucas dúvidas de que, quando bem
executado, a EAD pode realmente proporcionar bons
resultados como evidenciam muitos casos em países
que já utilizam esta forma de ensino há anos, como os
EUA e a Inglaterra. Os resultados do Exame Nacional
de Desempenho dos Estudantes – Enade, por outro
lado, parecem, até agora, promissores: têm indicado
que a performance dos alunos na modalidade EAD é
bastante similar à dos alunos da modalidade presencial
e até mesmo superior, em algumas áreas. Por exemplo,
no Enade 2008, a avaliação dos alunos que ingressaram
em cursos superiores na modalidade EAD revelou que
estes obtiveram melhores resultados em 9 das 13 áreas
avaliadas (ABED, 2008), em comparação aos que
fazem o mesmo curso na modalidade presencial.
Este artigo busca identificar o público-alvo dos
cursos de graduação na modalidade de Educação a
Distância (EAD) no Brasil, por meio de uma
comparação do perfil dos alunos matriculados em
cursos de graduação na modalidade EAD e dos
matriculados em cursos de graduação na modalidade
presencial. Buscamos, através de uma análise
quantitativa, atualizar e enriquecer as conclusões de
Ristoff (2007), que, já em 2007, apontava que os
alunos de EAD tinham um perfil bastante distinto dos
presenciais. O objetivo final é que esta pesquisa possa
trazer luz sobre as necessidades específicas desses
alunos, de modo que as IES possam aprimorar sua
proposta educacional na modalidade EAD por meio
da customização dos cursos, utilizando estas
informações.
REVISÃO DA LITERATURA
Diversos estudos dedicam-se a explorar as razões
que levam os alunos a optar por esta forma EAD,
analisando as vantagens e desvantagens desta
metodologia de ensino (FILATRO, 2004; MEYEN
et al., 2006), a elaboração de um framework
tecnológico para EAD (CRUZ; MORAES; BARCIA,
25
LAS CASAS et al.
1998; FILATRO, 2004; CHRISTENSEN; HORN;
JOHNSON, 2009), além de abordar casos de sucesso
e fracasso (PRETI, 2009).
Por outro, lado Meyen et al. (2006) já declaravam
que haveria um gap nas pesquisas relacionadas à EAD,
pois as soluções de e-learning apenas poderiam ser
analisadas tendo em vista as características especiais
(por exemplo, socioeconômica) de cada grupo de
alunos, o que determinaria as condições em que se dá o
seu aprendizado. Assim, além de analisar essas soluções
e os resultados obtidos, segundo os autores, caberia
entender as necessidades específicas dos alunos, pois
uma proposta educacional via EAD poderia ser bastante
efetiva num grupo de alunos (por exemplo, profissionais
experientes e com alta renda, realizando cursos de pósgraduação a distância), mas ineficiente e pouco atraente
para outros grupos, como jovens adultos que cursam
cursos de graduação via EAD.
Há, contudo, relativamente poucos estudos que
exploram o perfil dos alunos de graduação via EAD
no Brasil, como o de Ristoff (2007). Assim, segundo
Preti (2009), muitas IES que estão lançando cursos
de graduação via EAD carecem de informações para
a customização da oferta educacional, através do
entendimento do público-alvo de cada curso e das suas
necessidades. Considerando-se que muitos autores
corroboram o conceito de Marketing como um
processo social, por meio do qual pessoas e grupos
de pessoas obtêm aquilo que necessitam com a livre
negociação de produtos e serviços de valor (KOTLER;
KELLER, 2006, p. 195, GUMMESON, 1999, p.
32), conclui-se logicamente que um melhor
conhecimento mercadológico seria crucial para as IES
lançarem cursos de graduação via EAD. Essa lacuna
parece, no entanto, ser mais grave nos cursos via EAD,
devido às características específicas desta modalidade.
Preti (2009), por exemplo, afirmava que a EAD,
por ser essencialmente mediada e haver uma distância
física entre professor e aluno, se constitui numa
modalidade de estudo individualizado e
independente, em que se reconhece a capacidade do
estudante de construir seu caminho, seu conhecimento
por ele mesmo, de se tornar autodidata, ator e autor
26
de suas práticas e reflexões. Assim, os cursos via EAD
deveriam oferecer suportes que viabilizem e incentivem
a autonomia dos estudantes. A tecnologia, mais que
apenas comunicar unidirecionalmente o conteúdo,
deveria, portanto, possibilitar a interação, buscando
estabelecer relações dialogais, criativas, críticas e
participativas durante o processo educativo.
METODOLOGIA
Entende-se que, para melhor atender a um públicoalvo, as empresas necessitam de informações relevantes
sobre seus potenciais clientes. Uma possibilidade para
o entendimento do público-alvo seria realizar uma
pesquisa quantitativa primária, buscando entender o
perfil dos alunos matriculados. Essa pesquisa, no
entanto, se revelou de difícil execução: os cursos na
modalidade EAD atendem a um público cuja
localização é muito variada (por exemplo, algumas
universidades provêm cursos em mais de 400
municípios brasileiros). Optou-se, portanto, pela
utilização de dados secundários contidos no Censo do
Ensino Superior de 2009 e nos resultados do
questionário socioeconômico do Enade de 2009.
Essas informações estavam disponíveis no site do
Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep),
vinculado ao Ministério da Educação.
Para entender o público-alvo dos cursos de
graduação na modalidade EAD, foi necessário analisar
separadamente cada uma dessas fontes, buscando
obter as diferenças entre o perfil dos estudantes de
cursos nesta modalidade e os da modalidade
presencial.
Utilizando o software estatístico SPSS, procedeuse a análise inicialmente dos dados do Censo do Ensino
Superior (2009). Deste censo constam dados referentes
a uma amostra de quase 7 milhões de alunos – 14,4%
eram estudantes na modalidade EAD e 85,6% eram
alunos na modalidade presencial. Compararam-se os
alunos dessas modalidades em relação à média,
mediana, frequência relativa e dispersão (variância e
desvio padrão) daquela que se considerou como sendo
a possível característica-chave para distinguir ambos
os perfis: a idade do aluno. Essa comparação visou
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Identificando o perfil do público-alvo dos cursos...
verificar a hipótese já levantada por outros autores,
como Ristoff (2007), de que o aluno na modalidade
EAD é, em média, mais velho que o aluno da
modalidade presencial e, além disso, possui perfil
socioeconômico distinto do aluno presencial, com
menor renda média.
RESULTADOS
A análise conjunta dessas fontes revelou o perfil
dos alunos de EAD, trazendo insights potencialmente
Modalidade
Idade Média Desvio Padrão
interessantes sobre o público-alvo. Ao analisar a idade
média dos alunos, em ambas as modalidades, a
conclusão aqui extraída confirma a de Ristoff (2007):
os alunos de EAD são em média mais velhos que os
alunos presenciais. O quadro a seguir mostra que os
alunos na modalidade EAD são em média 7,43 anos
mais velhos que os alunos na modalidade presencial.
Essa diferença foi considerada como sendo
extremamente significativa para traçar o perfil dos
alunos de EAD.
Variância
Número de
alunos
% do Total
Presencial
25,91
7,378
54,441
5.977.207
85,6%
EAD
33,34
9,316
86,790
1.004.811
14,4%
Total
26,98
8,118
65,895
6.982,018
100%
Quadro 1 – Comparação entre a idade média dos alunos de educação presencial e a distância.
Fonte: Elaborado pelos autores.
O fato de o aluno na modalidade EAD ser
marcantemente mais velho provavelmente se traduzirá
numa diferença de interesses significativa entre os
grupos, uma vez que alunos mais jovens tendem a ter
menos responsabilidades e encargos que alunos mais
velhos, devido ao fato de que muitos desses últimos
já podem ter constituído família e estar inseridos no
mercado de trabalho. Esse "atraso" no ingresso no
ensino superior muito provavelmente está associado
à alta evasão verificada no ensino médio. Barbosa
Filho e Pessoa (2011) mostram que, apesar de 96%
dos alunos entre 5 e 14 anos estarem matriculados,
este percentual cai para apenas 76% para os alunos
entre 15 e 19 anos. Ainda segundo os autores, "há
sinais claros de que parte significativa do abandono
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
escolar não se deve à necessidade de o aluno
trabalhar".
Ocorre que, abandonando o ensino médio, seja por
desinteresse ou falta de recursos, esses alunos
inevitavelmente entrarão mais tarde na universidade –
muito provavelmente numa idade em que a vida já lhes
cobra outras responsabilidades (como a de sustentar
outras pessoas). Assim, exatamente por ter menos
tempo a perder, pode-se dizer que o aluno de EAD
possui objetivos muito mais imediatistas, buscando
formar-se num curso superior que claramente lhe
permita progredir no mercado de trabalho, no qual já
estão provavelmente inseridos. Os gráficos a seguir
mostram claramente a diferença na composição etária
dos grupos presencial e a distância, respectivamente.
27
LAS CASAS et al.
Gráfico 1 – Composição etária dos alunos presenciais.
Fonte: Elaborado pelos autores.
O Gráfico 1, que mostra o perfil dos alunos presenciais, demonstra que os alunos presenciais são mais
jovens e possuem menor dispersão do que os alunos de EAD (Gráfico 2). Já o Gráfico 2, de forma mais
alongada e deslocada para a direita, evidencia a maior dispersão de idades e uma maior frequência de alunos
com mais de 40 anos.
Gráfico 2 – Composição etária dos alunos de EAD.
Fonte: Elaborado pelos autores.
28
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Identificando o perfil do público-alvo dos cursos...
Efetivamente, dado o maior desvio padrão e
variância verificados no grupo de alunos de EAD,
constata-se que este grupo possui maior dispersão,
isto é, constitui-se num grupo mais heterogêneo que o
dos alunos presenciais.
Subdividindo os alunos de EAD por quartis
(conforme quadro abaixo) e utilizando-se como
parâmetro a faixa etária, verifica-se que alunos com
mais de 40 anos representavam 25 % dos alunos de
EAD, em 2009.
Modalidade
1.º Quartil
2.º Quartil
3.º Quartil
Presencial
Até 21 anos
Até 24 anos
Até 29 aos
EAD
Até 26 anos
Até 32 anos
Até 40 anos
Quadro 2 – Idade média por quartis.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Por outro lado, verifica-se que 25% desses alunos
de EAD tinham menos que 26 anos, em 2009. Haveria
diferenças socioeconômicas entre o primeiro (até 26
anos) e último quartis (a partir de 40 anos), dada a
grande diferença de idade verificada entre esses quartis?
Considerou-se que os principais indicadores diretos
do perfil socioeconômico contidos no dado do censo
seriam a presença de apoio social, financiamento
estudantil e ingresso no ensino superior por meio de
reserva de vagas. Analisando-se esses dados apenas
para os alunos EAD, não foi possível identificar
diferenças significativas estatisticamente para o perfil
socioeconômico baseado apenas na idade dos alunos.
Assim, o resultado parece confirmar que o grupo de
alunos de EAD tem um perfil socioeconômico similar,
independentemente de sua idade. Contudo,
comparando-se o grupo de alunos de EAD e os
presenciais, nota-se que os primeiros têm maior
percentual de apoio social (moradia, transporte,
material didático e bolsa trabalho) que os demais.
Modalidade
Apoio Social
Financiamento
Estudantil
Ingresso por Reserva
de Vagas
Presencial
4%
18%
1%
EAD
18%
7%
1%
Quadro 3 – Fatores socioeconômicos.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Embora a maior presença de alunos com apoio social
(ou seja, que recebem ajuda de algum programa social)
possa indicar que o grupo de alunos de EAD tenha
menor renda média que os alunos presenciais, e como
a renda pessoal e familiar não consta do censo, esta
análise não é conclusiva, ainda que existam indicações
de que o aluno de EAD é mais desfavorecido
economicamente, como afirma Ristoff (2007) em seu
estudo. Entretanto, baseando-se nos dados do PNAD
2009, pode-se afirmar que os jovens das classes C/D
ainda são a grande maioria da população brasileira em
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
idade escolar. Nesse enorme mercado de jovens (e
jovens adultos), existe uma importante parcela que se
encontra defasada nos estudos (uma vez que a
escolaridade média da classe C, segundo o PNAD
2009, é cerca de sete anos menor que a dos integrantes
das classes A/B). Como a idade média dos alunos de
EAD é de 32 anos, muitos dos jovens das classes C/
D nesta idade já provavelmente estarão integrados ao
mercado de trabalho e terão constituído sua família, o
que dificultaria a sua adesão a cursos presenciais, e
que os levaria a optar pela graduação a distância.
29
LAS CASAS et al.
Por outro lado, quanto ao perfil de gênero (Quadro
4), nota-se uma interessante característica do público
dos cursos EAD: existem duas vezes mais mulheres
do que homens.
Modalidade
Masculino
Feminino
Presencial
45,6%
54,4%
EAD
31,8%
68,2%
Quadro 4 – Gênero.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Essa tendência pode estar influenciada pelo fato de
grande parte dos cursos de EAD oferecidos atualmente
serem voltados às Ciências Humanas e Sociais (mais
de 90% dos cursos estão assim classificados, segundo
o Anuário de EAD). Nesses cursos, tradicionalmente,
se nota uma maior presença de mulheres matriculadas
que de homens (que são majoritários apenas nas
Engenharias e Ciências Exatas). Por outro lado, Rocha
da Silva, Vendramini e Lopes (2010) mostraram que,
analisando-se os dados socioeconômicos e de gênero
do Enade de 2005, o público feminino matriculado no
ensino superior brasileiro tinha renda familiar mais baixa
que a do público masculino. Segundo essas autoras,
37% das mulheres que frequentavam curso superior
possuíam renda familiar menor que três salários
mínimos, ante cerca de 20% dos homens. Finalmente,
analisou-se o fator étnico ou racial, considerando-se o
grupo étnico como um fator autodeclarado pelos
alunos. Os dados são, entretanto, inconclusivos, pois
há um grande percentual de alunos cuja origem étnica
não estava disponível ou não foi declarada ao censo.
Concluiu-se, por meio desta análise, que o aluno
da modalidade EAD é, em média, cerca de oito anos
mais velho e, em sua grande maioria (68,2%), do sexo
feminino, além de ter menor renda média do que o
aluno presencial. Essas conclusões estão alinhadas com
as conclusões dos estudos de Ristoff (2007), mas
adicionam informações, sobretudo por destacarem as
marcantes diferenças em gênero e idade média.
Assim, mesmo confirmando as afirmações de Ristoff
(2007) de que este grupo de alunos seria em média
30
mais velho, mais pobre e menos branco, caberia a nós
acrescentar elementos inéditos ao perfil: estes alunos
também seriam majoritariamente do sexo feminino e
com idade média de 32 anos. Portanto, é provável
que uma parcela importante deles já tenha constituído
família (dado serem muito mais velhos), o que leva à
conclusão de que muitos provavelmente conciliariam
uma dupla ou tripla jornada (trabalho, estudos em casa
e cuidados com os filhos).
Com base nessas conclusões, quais seriam as
necessidades específicas do aluno em questão e como
adaptar a oferta educacional de cursos de graduação
em EAD, considerando que há uma marcante diferença
entre o perfil dos alunos de EAD e o dos alunos
presenciais? Como essas necessidades afetariam as
diversas etapas do processo educacional para os alunos
de EAD?
Segundo Preti (2009), há mandatoriamente duas
etapas a serem desenvolvidas em cada disciplina
ministrada nos cursos de graduação via EAD no Brasil.
Inicialmente, haveria um primeiro momento a distância,
em que o aluno assiste às aulas remotamente (por
exemplo, pela internet) e faz os exercícios em casa.
Em seguida, haveria um segundo momento, presencial,
em que o aluno teria que se deslocar para um centro
de estudos e discutir o material estudado e os
resultados das aulas (exercícios, sínteses) com seus
colegas de turma e um tutor. Ainda segundo Preti
(2009), o tutor seria um dos elementos-chave para o
sucesso do curso e teria um papel fundamental no
processo de aprendizagem, pois é através dele que se
garante a interação personalizada e se viabiliza uma
articulação entre os elementos do processo, necessária
à consecução dos objetivos propostos.
Como se identificou neste presente estudo, o aluno
de EAD, em muitos casos, concilia o estudo com as
atividades do trabalho e da família, e seria interessante
provavelmente tornar mais acessível o tutor, seja
realizando as reuniões presenciais em locais mais
próximos à residência do aluno (por meio de uma
estratégia de distribuição geográfica desses centros),
seja fornecendo transporte escolar aos centros de
estudos. Por outro lado, como se trata de um público
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Identificando o perfil do público-alvo dos cursos...
em grande parte do sexo feminino e muito
possivelmente com filhos, o oferecimento de convênios
com creches nos dias das reuniões presenciais seria
possivelmente um recurso interessante.
Além disso, o tutor poderia ser treinado para
desenvolver características de empatia e afinidade
com esse grupo de alunos, de forma a aumentar a
interação e diminuir o absenteísmo dos alunos às
reuniões presenciais. Uma das formas possíveis para
aumentar a interação seria recrutar tutores entre exalunos do ensino EAD e que compreendam suas
necessidades (por as terem vivenciado), por outro
lado fornecendo exemplos que reforcem a
autoconfiança dos alunos e seu autodidatismo. Dessa
forma, Preti (2009) afirma que cada instituição
deveria buscar construir seu modelo tutorial de forma
bastante cuidadosa, visando atender às necessidades
específicas do seu público-alvo, uma vez que este é
um dos principais fatores de sucesso. Por outro lado,
ainda segundo o autor, é muito importante que todos
os passos e etapas dos cursos oferecidos sejam
planejados pela equipe de coordenação com
antecedência e que os alunos sejam informados dos
detalhes práticos desde o início de seu percurso, por
meio de um Manual do Estudante.
Finalmente, a utilização de tecnologia que facilite a
interatividade é fortemente indicada, inclusive com o
fornecimento de equipamentos para os alunos (tais
como tablets ou computadores pessoais). Contudo,
para que seja efetivo qualquer aprendizado utilizando
computador, a tecnologia, segundo Christensen, Horn
e Johnson (2009, p. 99), deve ser centrada no aluno,
ou seja, a metodologia pedagógica, o software e os
recursos didáticos informatizados têm que ser
cuidadosamente testados, utilizando-se amostras de
alunos com o perfil identificado para que se verifique
sua adequação pedagógica e se possam realizar
gradativamente as melhorias necessárias no material
didático e nos recursos tecnológicos disponibilizados
(como por exemplo, a interface e o software para
acesso remoto, que deve ser bastante simples e
amigável, não requerendo configurações adicionais por
parte do aluno).
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Educação a Distância, segundo Daniel e Kanwar
(2008), surgiu como uma alternativa educacional para
atingir novos estudantes e suportar melhor a expansão
da acessibilidade ao ensino, com menor custo e menor
perda de qualidade no processo de democratização
da educação. Segundo os autores, a expansão do
acesso à educação presencial em geral ocorre em
detrimento da qualidade. No entanto, com a EAD esse
trade-off não necessariamente se confirmaria, pois,
quando bem planejada e executada, esta modalidade
de ensino teria a possibilidade de expandir-se sem que
a qualidade sofresse tanto.
O Brasil viveu recentemente a democratização do
acesso ao ensino fundamental e expandiu fortemente
as matrículas no ensino superior (embora com certo
atraso em relação aos países vizinhos, como Argentina
e Chile). Contudo, os resultados obtidos nas avaliações
dos alunos indicam que há um grande caminho a
percorrer até que se consiga atingir uma performance
aceitável. A EAD pode tornar-se um ponto positivo
nesse cenário, uma vez que as avaliações do Enade
têm sido supreendentemente promissoras.
Moran (2007), por outro lado, explicita as
profundas mudanças que a EAD pode causar na forma
tradicional de ensino, alterando o conceito de presença
e distância, no processo de aprendizado. Dessa forma,
haveria uma aproximação sem precedentes entre os
cursos presenciais e os a distância, sendo uma tendência
geral a forte flexibilização do processo educacional,
com mais independência em relação ao tempo e
espaço. Por outro lado, Christensen, Horn e Johnson
(2009, p. 107) concluem que quatro grandes forças
podem impulsionar a substituição do professor
presencial pelo ensino semipresencial via EAD: o
contínuo aperfeiçoamento das tecnologias envolvidas,
a crescente customização e melhoria dos programas
de ensino via EAD (uma vez que estes programas
estarão sempre sujeitos à avaliação governamental e
dos alunos), a crescente escassez de bons professores
frente à enorme demanda educacional e a redução
gradual dos custos de aprendizado.
Essas previsões têm-se confirmado no Brasil, uma
31
LAS CASAS et al.
vez que estamos observando um crescimento acelerado
da oferta de cursos e do número de matrículas em
cursos via EAD. Contudo, é vital para as IES identificar
o público a que se destinam esses cursos, pois se trata
de um público com demandas específicas.
De acordo com esta pesquisa, foi possível concluir
que o público para os cursos de graduação na
modalidade EAD é composto majoritariamente pela
população de jovens adultos (média de idade de 32
anos), de renda baixa ou média, do sexo feminino e
que concluíram com certo atraso o segundo grau,
buscando na modalidade EAD uma forma de
compensar o tempo perdido e progredir socialmente.
Os resultados obtidos permitem ainda confirmar a
maioria das conclusões de Ristoff (2007), que já
apontavam para um perfil socioeconômico diferente
dos alunos da modalidade presencial.
Estas conclusões podem constituir um ponto de
partida importante para o aprimoramento de uma
estratégia de Marketing Educacional nas IES, focada
nas necessidades do público-alvo desses cursos.
Contudo, para que as Instituições de Ensino Superior
(IES) privadas possam usufruir das vantagens
competitivas relativas à diferenciação da oferta em
EAD. Finalmente, apesar da identificação das principais
características do perfil desse público ser um passo
inicial para a criação de uma oferta educacional
diferenciada, o entendimento mais detalhado das
necessidades de um grupo tão heterogêneo de alunos
requer, por parte das IES, pesquisas adicionais e mais
detalhadas. Assim, como o presente estudo fez uso
apenas de dados secundários, é possível que, para
melhor compreender como disponibilizar uma oferta
de cursos mais atrativa, seja necessário realizar o
aprofundamento das informações sobre esse público
por meio da realização de uma pesquisa de dados
primários, utilizando amostras de alunos de EAD. Entre
as investigações que podem ser realizadas nessas
pesquisas adicionais, caberia entender as razões da
grande preponderância do sexo feminino nos cursos
de graduação via EAD. Isso se deveria ao fato de que
as mulheres têm menos tempo disponível para fazer
uma faculdade presencial (por exemplo, porque são
32
mães e cumprem dupla jornada de afazeres) ou isso
se deveria ao fato de a maior parte dos cursos de EAD
atualmente disponíveis serem voltados às ciências
humanas, o que acaba por atrair mais mulheres que
homens?
Por outro lado, neste artigo conseguimos identificar
que os alunos de EAD têm menor renda média que os
alunos presenciais. Mas quão mais baixa é essa renda?
Qual o nível socioeconômico (classe social) dos alunos
de EAD? Quais dificuldades e necessidades especiais
estariam associadas às limitações de renda e ao
ingresso tardio no ensino superior?
Essa segmentação mais aprofundada se constituiria
numa interessante aplicação do Marketing
Educacional, que, de acordo com a definição de Manes
(2005), deveria conduzir um processo de investigação
de necessidades sociais tendente a desenvolver e levar
a cabo programas educativos que as satisfaçam,
produzindo um crescimento integral do indivíduo.
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RECEBIDO EM 14/6/2012
ACEITO EM 9/7/2012
34
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"TEACHER, HOW TO DO THE 'PERNAS' IN ENGLISH?"
UM ESTUDO COM CRIANÇAS BILÍNGUES DA 1.ª SÉRIE DO
ENSINO FUNDAMENTAL
MASCARELLO, Lidiomar José. Licenciado em Letras Português/UFSC e mestre em Linguística pela
PPGL/UFSC. E-mail: [email protected].
JUNGES, Mágat Nágelo. Bacharel em Letras-Alemão/UFSC e mestre em Linguística pela PPGL/UFSC.
E-mail: [email protected].
RESUMO
Apresentam-se e discutem-se os dados observacionais protocolados em uma 1.ª série de escola de imersão
bilíngue (português brasileiro/inglês) de Florianópolis (SC, Brasil). O estudo tem por objetivos apresentar e
discutir os protocolos das observações realizadas na 1.ª série do Ensino Fundamental da escola acima referida,
à luz da base teórica pesquisada; revisitar conceitos de alfabetização e bilinguismo, respectivamente, segundo
os autores: Scliar Cabral (1982, 1984, 1985, 1989 e 2003), Landsman (1998), Dehaene (2007); Saunders
(1988), Riehl (2004), Bosch e Sebastián-Gallés (2001), e Poulin-Dubois e Goodz (2001). Utilizaram-se
protocolos de observação para registro descritivo de seis aulas, observadas em uma turma de 16 alunos e 2
professores (inglês/português). Os dados registrados foram analisados e confrontados com as teorias da
alfabetização e do bilinguismo na concepção dos autores já citados. Em relação aos alunos (16), confirmou-se
que: maior adaptação na escola e maior tempo de permanência na mesma favorecem o desenvolvimento da
leitura e da escrita (14 alunos estão na escola desde os 3 anos e 2 integraram o grupo nos últimos 6 meses).
PALAVRAS-CHAVE: Escola de imersão bilíngue (português brasileiro/inglês); Protocolos de observação; Conceitos
de alfabetização e bilinguismo.
ABSTRACT
This paper presents the observation data obtained in a first grade classroom of a bilingual immersion elementary
school (Brazilian Portuguese/English) in Florianópolis (SC, Brazil). The main goals of this study are: a) to
present all the recorded observations and to discuss these data based on the selected theoretical framework; b)
to review concepts of literacy and bilingualism according to the following authors: Scliar Cabral (1982, 1984,
1985, 1989 e 2003), Landsman (1998), Dehaene (2007); Saunders (1988), Riehl (2004), Bosch e SebastiánGallés (2001) e Poulin-Dubois e Goodz (2001). Method: observation protocols were used for the descriptive
recording of the data collected at the school with 16 students and 2 teachers. The data were analyzed and
compared to the theoretical framework of literacy and bilingualism. The results confirmed that a better adaptation
and a longer period of permanence at that school have helped the development of reading and writing skills (14
students have been studying at the school since they were 3 years old and two have just been enrolled for the last
six months).
KEYWORDS: Bilingual immersion school (Brazilian Portuguese/English); Observation protocols; Literacy and
bilingualism concepts.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
35
MASCARELLO & JUNGES
INTRODUÇÃO
Tentar entender como se dá o processo de
aprendizagem da leitura e da escrita é algo recorrente
entre os estudiosos de aquisição e aprendizagem da
linguagem. Procuramos, como outros também o
fizeram, dar uma resposta ao mesmo tempo em que
indagamos: como ocorre o processo de alfabetização
de crianças bilíngues? Para tanto, realizamos uma
pesquisa em uma escola bilíngue – português brasileiro
(PB)-Inglês –, de Florianópolis/SC), considerada uma
escola bilíngue de imersão.
Os principais objetivos desta pesquisa são:
descrever o processo de alfabetização bilíngue da
escola em português e em inglês através do protocolo
observacional, analisando e discutindo os dados
encontrados nas aulas com a base teórica pesquisada;
e revisitar conceitos de alfabetização e bilinguismo.
Temos como motivação para a realização desta
pesquisa os estudos de neurociências sobre leitura e
da psicolinguística referentes à alfabetização. Nos
últimos anos, as pesquisas e estudos da neurociência,
particularmente a pesquisa dos processos de
aprendizagem da escrita e da leitura, mostraram
avanços significativos. Assim, podemos afirmar que
nasceu uma ciência da leitura (DEHAENE, 2012,
p.15). Os progressos das neurociências e da psicologia
cognitiva conduziram a uma decodificação dos
mecanismos neuronais do ato de ler. Nossa capacidade
de aprender a ler coloca um curioso enigma, que se
denomina o paradoxo da leitura, também nominado
por Dehaene (2012, p.17) como enigma do primata
que sabe ler. Como pode ser que nosso cérebro de
Homo sapiens pareça finalmente adaptado à leitura,
quando esta atividade inventada não existe senão há
alguns milhares de anos? A escrita nasceu há
aproximadamente 5.400 anos entre os babilônios e o
alfabeto propriamente dito não tem mais que 3.800
anos. Em todos os indivíduos, em todas as culturas do
mundo, a mesma região cerebral, com diferenças
mínimas de milímetros, intervém para decodificar as
palavras escritas. Seja a leitura em inglês ou português
brasileiro, ou qualquer outra língua natural, a
aprendizagem da leitura percorre sempre um circuito
36
idêntico (DEHAENE, 2012 p.25 e sgs).
A nossa hipótese é que crianças que desenvolvem
o hábito de leitura diário, ou que ouvem desde a mais
tenra idade leituras dos pais ou leitores na família,
desenvolvem mais rapidamente as habilidades para
proficiência em leitura e escrita. Para a base teórica
que diz respeito à alfabetização, priorizamos Scliar
Cabral (1982, 1984, 1985, 1989 e 2003) e Landsman
(1998); já à aprendizagem da leitura, Dahaene (2007);
e ao bilinguismo, principalmente Saunders (1988),
Riehl (2004), Bosch & Sebastián-Gallés (2001) e
Poulin-Dubois & Goodz (2001).
A LFAB ETIZAÇÃO :
MAIS DO Q UE RECONHECER E
REGISTRAR MARCAS NEGRAS EM UM PAPEL BRANCO!
Para ser considerado alfabetizado, o sujeito tem
de ser capaz de grafar letras e aprender a ler o que vê
registrado, o que significa uma árdua caminhada no
universo das letras. Neste tópico trataremos
separadamente dois aspectos: a aprendizagem da escrita
e aprendizagem da leitura. Essa divisão é apenas por
questões metodológicas, pois na prática a aprendizagem
da leitura e sua proficiência devem preceder a escrita.
Ao pesquisarmos diferentes autores que tratam
desse tema, const atamos que, ao tratar do
desenvolvimento da linguagem, é preciso fazer uma
distinção entre processos de aquisição e de
aprendizagem, no tocante à língua oral e à língua escrita.
Adquire-se língua oral e aprende-se a língua escrita.
"Dizer refere-se a uma atividade que depende
de um sistema para realizar-se; essa atividade
origina um produto dinâmico e mutante, que pode
tornar-se dela independente e adquirir autonomia
[...]. Escrever é uma atividade física e simbólica
que para ser exercida precisa de um sistema. Um
sistema de notação convencional, que em
diferentes circunstâncias produz o escrito."
(DUCROT apud LANDSMANN, 1998, p.5).
E por aquisição ent endemos como o
desenvolvimento de capacidades e habilidades que o
sujeito faz de forma espontânea, já que o ser humano
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
que não apresenta desvios orgânicos ou funcionais mais
graves, é biopsicologicamente programado para
amadurecer e ser capaz de internalizar a língua, ou as
línguas, a que estiver exposto, processo esse que se
dá através da interação social, considerando fatores
de ordem socioeconômica, cultural e histórica: em
outras palavras, a contextualização do indivíduo.
Para aprender a ler e a escrever, além de todo o
contexto do sujeito, é necessário que haja instrução
formal e uma postura cognitiva consciente para que
ocorra o processo de aprendizagem. A oralidade é
considerada um fato biopsicológico, determinado pelas
condições de sobrevivência da espécie. A escrita é um
fato cultural. O escrever e o falar são duas situações
enunciativas que exigem outra dinâmica cognitiva: a
diferença não está na modalidade, mas é influenciada
por ela. "Escrever é mais lento que falar e permite o
retorno imediato ou adiado ao que foi feito."
(LANDSMANN, 1998, p.53).
O produto escrito é resultado de trabalho mental
que envolve conhecimento do conteúdo, do gênero
textual – o que se quer escrever? A oralidade é um
processo natural: salvo eventuais problemas ou desvios,
nosso aparelho biopsicológico, no qual avulta o sistema
nervoso central, evoluiu para permitir a produção e a
compreensão da linguagem oral.
O oral é universal: toda comunidade humana possui
fala, mas existem comunidades que não possuem escrita
e existem indivíduos analfabetos. A oralidade é primária,
precedeu a escrita. A escrita possui uma longa história
social. Sua denotação vai muito além da substância em
si, inclui certas qualidades que dependem das condições
de uso: função publicitária, jornalística, ritualística,
inventarial, comercial e outras. "A escrita cria um novo
tipo de conhecimento: o conhecimento científico, e uma
nova forma de aprendizagem, chamada ensino."
(HALLIDAY, apud LANDSMANN, 1998, p.15).
Para uma melhor compreensão do processo de
aprendizagem da língua escrita, é necessário
estabelecer uma relação direta com a língua oral. Para
Pinker (2004, p.6), "escrever torna nossa comunicação
ainda mais impressionante, pois transpõe intervalos de
tempo, espaço e convivência, mas o verdadeiro motor
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
da comunicação verbal é a língua falada que adquirimos
quando crianças".
Nesse processo ocorre naturalmente o
conhecimento fonológico e fonético intuitivo da
variedade linguística de cada indivíduo, que, para
Scliar-Cabral (1989, p.106), difere da consciência
fonológica, pois independe do aprendizado da escrita.
Esse conhecimento fonético e fonológico, internalizado,
ainda que em um processo inconsciente, desenvolvese em três estágios distintos:
1.º padrões entoacionais – a "palavra" é coberta
pelo enunciado e sílabas fortes e fracas e são
distribuídas de forma rítmica, correspondendo a
gestos articulatórios holísticos (diz respeito à
emergência dos primeiros enunciados na criança,
normalmente de uma ou duas silabas); 2.º
emergência gradual dos fonemas com seus traços
fonéticos distintos e aplicação de regras de
distribuição, incluindo as alofônicas foneticamente
determinadas pelo contexto; 3.º emergência
gradual das regras morfofonêmicas, as quais
sinalizam a fronteir a dos morfemas, sua
distribuição e regras alomórficas.
Para que ocorra o aprendizado dos sistemas
alfabéticos, é indispensável que o indivíduo tenha
desenvolvido uma consciência fonológica, pois é ela
que facilitará o desenvolvimento das habilidades de
leitura e escrita. É por meio da instrução formal que
ocorrerá um crescimento intelectual e a internalização
dos processos necessários ao desenvolvimento
cognitivo em uma cultura predominantemente letrada.
Os sistemas alfabéticos exigem do indivíduo um
conhecimento fonológico e fonêmico consciente para
viabilizar o entendimento das correspondências entre
as classes de sons e os grafemas, permitindo a
segmentação da sílaba, necessária nos sistemas
alfabéticos. Esse aprendizado, no entanto, só ocorre
se houver uma instrução específica sobre o que se quer
ensinar, pois, ainda que se tenha um bom entendimento
do alfabeto enquanto sistema de representação mental
e gráfica, é necessário desenvolver outras capacidades
37
MASCARELLO & JUNGES
metalinguísticas, como, por exemplo, análise e síntese
dos componentes. Não é suficiente dominar as
correspondências biunívocas entre os fonemas e
grafemas: é preciso aprender outras convenções, outras
regras estabelecidas para dada língua.
Na discussão sobre a função da escrita cabe um
rápido registro sobre a função mnemônica da grafia.
Há um aspecto de dualidade: existe um x para um y,
processo denominado de representação. Toda
representação externa implica uma diferenciação entre
significante e significado (SAUSSURE, 2008, p.79).
O fenômeno semiótico implica necessariamente três
elementos: um signo, seu objeto (o que simboliza) e
algum sujeito que interprete essa relação. Sem
conhecimento ou sem representação interna não existe
relação simbólica externa. Para Goodman (1968 apud
LANDSMANN, 1998, p.115), não existem gestos
motivados ou naturais que se contraponham a gestos
convencionais. Em sua interpretação, "todo gesto
depende de conhecimentos prévios compartilhados".
A função primordial dos símbolos em um sistema
notacional é de identificar uma obra, permitindo sua
reprodução. O sistema de escrita alfabética é um
sistema notacional. Inclui uma série finita de caracteres.
Por serem finitos é possível identificar se alguma marca
ou inscrição produzida por alguém pertence ou não ao
sistema (LANDSMANN, 1998).
Um sistema notacional requer de seu usuário o
entendimento de alguns princípios e o conhecimento
de algumas condições de uso desse sistema,
principalmente condições sintáticas, morfológicas e
semânt icas. Para Goodman (1968 apud
LANDSMANN, 1998, p.117), "a primeira condição
é que se distinga a diferença de caracteres, os traços
individuais de cada caractere, e a segunda condição é
o reconhecimento de que esse caractere é um símbolo
que possui uma representatividade".
No processo de escrita e produção textual, "ao
registrar, o produtor é separado do produzido, a fase
de codificação, de interpretação, o efeito – assim como
o pensado e o sentido – fica disponível para ser olhado
novamente, pensado de novo, sentido mais uma vez"
(LANDSMANN, 1998, p.47).
38
Entendemos que, no processo de ensino
aprendizagem, o progresso do nosso conhecimento
depende basicamente de três fatores: nossa bagagem
biológica; nossas interações com o meio (o professor
precisa acreditar que o aluno pode aprender); nosso
trabalho interno (nossos neurônios em ação, trocas
sinápticas) sobre o conhecimento já adquirido. Esses
fatores precisam ser considerados no momento de
ensino de metalinguagem (na realidade em qualquer
proposta de ensino); em função dessas características,
cada sujeito processará as informações de uma forma
diferenciada e terá um resultado diferenciado.
Em relação à leitura, e a capacidade de tornar-se
um leitor proficiente, os estudos da neurociência
mostram por meio de imagem por ressonância
magnética (IRM), da eletroencefalografia (EEG) e do
magnetoencefalografia (MEG) como nosso cérebro
trabalha durante a leitura (DEHAENE, 2012, p. 108
e segs). Isso nos mostra que a leitura é uma atividade
que depende de processamento individual, mas inserida
num contexto social que envolve disposições e atitude,
capacidades relativas à decifração do código escrito e
capacidades relativas à compreensão.
De acordo com Dehaene (2012, p. 15 segs), "atrás
de cada leitor se esconde uma mecânica neuronial
admirável de precisão e eficácia, da qual começamos
a compreender a organização". Com o avanço da
neurociência e da psicologia cognitiva, desenvolveramse também métodos e mecanismos que possibilitam
visualizar em cérebros humanos as áreas ativadas, bem
como as redes neurais em ação, quando da
decodificação das palavras no ato de ler. Sob essa
perspectiva empírica têm-se condições de desenvolver
uma teoria de leitura, necessariamente não a única. Essa
teoria procura explicar como "funcionam os circuitos
corticais herdados de nosso passado evolutivo"
(DEHAENE, 2012, p. 84 segs), e explica também
como as redes neurais aprendem a ler. Sabe-se
também que a aprendizagem da leitura não acontece
sem choques. Todas as crianças, seja qual for à língua,
encontram dificuldades no momento de aprender a ler.
Por que é difícil aprender a ler? Quais são as
profundas modificações que a aprendizagem da leitura
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
impõe aos circuitos do cérebro? Há outros elementos
extraindivíduo que interferem nesse processo de
aprendizagem?
Segundo uma perspectiva fundamentada no
desenvolvimento neuronal e na evolução da espécie,
ainda não temos um circuito neural próprio para o
processamento da leitura, e o nosso cérebro de leitor
se constrói com a colaboração de outros genes, como,
por exemplo, da capacidade de aprender pela via do
olhar. Ainda segundo Dehaene (2012, p 16 sgs), "as
delicadas engrenagens da mecânica cerebral que nos
permitem ler são complexas [...] sua organização se
orienta em direção a um fim aparente: identificar as
palavras escritas com precisão e rapidez".
A leitura não é senão um exemplo das atividades
culturais surpreendentemente diversas que a
espécie humana criou numa dezena de milhares
de anos. Numa primeira abordagem, um fosso
parece separar as invenções culturais da biologia
do cérebro.
Nosso cérebro é capaz de aprendizagem, sem o
que não poderia incorporar as regras próprias da
escrita latina, japonesa ou árabe. Em todos os
indivíduos, em todas as culturas do mundo, a
mesma região cerebral, com diferenças mínimas
de milímetros, intervém para decodificar as
palavras escritas. Seja a leitura em francês ou
chinês, a aprendizagem da leitura percorre
sempre um circuito idêntico.
Sobre a base destes dados, Dehaene apresenta
outro modelo, radicalmente oposto ao do
relativismo cultural que denomina "reciclagem
neuronal".
De acordo com esta hipótese, a arquitetura de
nosso cérebro é estreitamente enquadrada por
fortes limites genéticos. Contudo, os circuitos do
córtex visual dos primatas possuem certa margem
de adaptação ao ambiente na medida em que a
evolução os dotou de uma plasticidade e de regras
de aprendizagem. (DEHAENE, 2012, p.19)
Feitas essas considerações sobre a individualidade
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
dos sujeitos e como eles podem ser contemplados e
respeitados em seus processos particulares de
aprendizagem e desenvolvimento da habilidade de
leitura, consideramos que também é significativo o
contexto em que esse indivíduo se desenvolve e os
meios que são utilizados para que o input chegue até
ele. Sabe-se que é no sistema visual que se inicia um
processo de "extração", olhamos para os grafemas e
percebemos significados, e a partir daí entram em cena
a via fonológica e a via lexical. A primeira permite
converter a cadeia de letras em sons da língua (os
fonemas). A outra permite acessar um dicionário mental
(ainda que haja divergências teóricas sobre esse
conceito) onde está estocado o sentido das palavras.
"A existência do texto é silenciosa até que o leitor a
leia. Não é senão quando o olho atento entra em
contato com as marcas deixadas sobre a superfície
que começa a vida ativa do texto. Todo o escrito
depende da generosidade do leitor." Alberto Manguel,
Une histoire de la lecture (apud DEHAENE, 2012,
p.20). Portanto, crianças que estão expostas com mais
frequência a eventos de leitura e escrita tendem a melhor
desenvolver essa habilidade, pois consideramos que
habilidades pessoais e o contexto do sujeito interagem
constantemente, resultando no desenvolvimento
progressivo do indivíduo, no caso a criança em idade
escolar.
Considerar o desenvolvimento de cada sujeito
implica para a escola rejeitar um ensino tradicional
preocupado apenas em oferecer conceitos e regras
prontas, em que o aluno só precisa memorizar e,
também, abandonar uma perspectiva de aprendizagem
centrada em automatismos e reproduções mecânicas.
Implica, ainda, oferecer meios adequados que
favoreçam o desenvolvimento das capacidades
linguísticas e metalinguísticas, de ler e escrever, falar e
ouvir com compreensão, em situações diferentes das
familiares. Esse processo não acontece de forma
espontânea, é preciso ser ensinado de forma
sistemática, principalmente nos primeiros anos de
escolarização.
Apesar da estrutura neuronal de cada indivíduo ser
muito semelhante, parece que a qualidade do input e
39
MASCARELLO & JUNGES
a valoração dada para determinada atividade em seu
meio sociocultural também interferem no resultado da
aprendizagem da leitura e escrita.
Realizada essa discussão sobre alfabetização,
passaremos a seguir para a definição e a discussão a
cerca do bilinguismo.
O QUE É BILINGUISMO?
Em uma sociedade como a nossa, marcada por
eventos em que uma segunda língua (L2) desempenha
um papel crucial, cada vez mais as pessoas sentem a
necessidade de aprender uma L2, seja numa escola
de idiomas, na universidade ou inclusive vivendo no
país, onde a língua é falada.
Nesse sentido, há um determinado número de
pessoas que já possuem conhecimento de duas línguas
ou de algum dialeto falado em casa juntamente com a
família. Podemos, assim, tratar de um tema presente
que se relaciona tanto linguística quanto social e
educacionalmente. Esse tema é o bilinguismo.
No entanto, antes de abordá-lo, é preciso definilo. Segundo Saunders (1988, p. 71):
A palavra bilíngue possui diferentes conotações
para diferentes pessoas. Para algumas delas,
bilinguismo significa ter o controle do tipo nativo
de duas línguas naturais, definição introduzida
pelo linguista norte-americano Leonard
Bloomfield (1933, p. 56 apud SAUNDERS, ib.;
tradução nossa)
Essa definição para o conceito diz respeito ao tipo
de bilinguismo considerado na literatura como
bilinguismo verdadeiro, que representa o nível mais alto
de bilinguismo, apesar de ser restrito, de acordo com
Thiéry (1976 apud SAUNDERS, 1988). Outros
termos que também se referem a esse tipo de
bilinguismo são denominados de "equilíngue"
(equilingual) e "ambilíngue" (ambilingual) (falante que
possui o mesmo nível linguístico em ambas as línguas).
Dessa maneira, apenas eram considerados falantes
bilíngues aqueles que eram competentes2 nessas
línguas.
Quão proficiente um falante deve ser para ser
considerado bilíngue?
Esta é certamente uma boa pergunta para
determinar a partir de que ponto uma pessoa se
enquadra ou não no grupo dos bilíngues.
De acordo com o que se apresenta na literatura,
principalmente pela pesquisa de Einar Haugen (1953
apud SAUNDERS, 1988), bilíngue é o falante que
pode produzir expressões completas e com sentido
na outra língua. Já Diebold (1961 apud SAUNDERS,
1988) considera o início da compreensão de sentenças
em uma segunda língua, sem ainda estar apto a
expressar alguma sentença sobre si mesmo3.
Se relacionarmos as duas definições propostas para
o termo, vemos que há uma distinção relevante entre
elas: a primeira, que trata de produzir expressões
completas e com sentido na outra língua, e a segunda,
que trata de compreendê-las. Ou seja: na primeira, o
falante, para ser considerado bilíngue, deve ser
necessariamente ativo junto à língua, ao contrário da
outra definição, que se preocupa com a sua
passividade, em que o falante ouve os outros e pouco
interage.
Por isso, segundo Saunders (1988), o termo pode
significar "conhecer duas línguas" (e bilinguismo também
é frequentemente empregado na literatura para designar
o mesmo que "multilinguismo", isto é, falar mais do que
duas línguas). Na verdade, os falantes bilíngues podem
1
Todo este capítulo (Nr. 3) está baseado na obra de Saunders (1988), que foi traduzido por nós do inglês para o português
brasileiro (PB).
2
Competente no sentido chomskyano do termo, apesar de ele propor o falante ideal competente e monolíngue.
3
Os termos "produzir" e "compreensão" são definidos por Mari Haas (1957 apud SAUNDERS, p. 9), respectivamente como
"receiving oral bilinguals" e "receiving sending oral bilinguals".
40
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
ser enquadrados em um contínuo do mais raro dos
falantes equilíngues, que são indistinguíveis de falantes
nativos em ambas as línguas, de um lado; por outro,
podem recém ter começado a adquirir uma segunda
língua, ou seja, existe mais de um nível de bilinguismo
entre os falantes.
Nesse sentido, também podemos arrolar o
desenvolvimento e a constituição das quatro
habilidades presentes em uma língua natural: a
compreensão, a fala, a leitura e a escrita. Embora haja
muitas possibilidades de intersecção entre elas, o falante
bilíngue pode desenvolver melhor algumas dessas
habilidades do que outras. Por exemplo: ele pode falar
alemão e francês, e conseguir se expressar oralmente
melhor em alemão; contudo, consegue escrever melhor
em francês (considerando neste caso que o falante
nasceu na Alemanha e posteriormente passou a residir
na França, quando lá começou a receber e ter os seus
primeiros contatos com o francês).
Além disso, podemos relacionar o seguinte termo
sobre o assunto: o bilinguismo equilibrado, que para
muitos autores, como Haugen (1973, p. 508 apud
SAUNDERS, 1988), é utilizado como sinônimo de
equilíngue (termo já apresentado anteriormente).
Porém, para outros, como Peal & Lambert (1963, p.
8 apud SAUNDERS, 1988), o termo é interpretado
com um sentido diferente, pois não implica perfeito
domínio de ambas as línguas. Portanto, são
considerados falantes bilíngues equilibrados aqueles
que são aproximada e igualmente capacitados nas duas
línguas, ou seja, deve existir um equilíbrio entre eles.
Novamente, citando Saunders (1988), isso significa
afirmar que alguém que poderia passar por falante
nativo em ambas as línguas seria considerado um
bilíngue equilibrado.
Outro fator que podemos incluir nessa discussão leva
em conta a "dominância" que uma língua exerce sobre a
outra num contexto de bilinguismo equilibrado, apesar
de estes falantes não poderem dominar as mesmas áreas
em todas as (suas) línguas. De acordo com o autor
(SAUNDERS, 1988), pode haver domínios ou
situações em que bilíngues geralmente usem somente
uma delas. Por exemplo: uma criança australiana pode
usar somente inglês na escola, entretanto, falar somente
grego com a sua mãe. Consequentemente, ele pode se
expressar melhor, ou com mais facilidade, em grego
numa conversa sobre cozinhar, já que está exposto a
essa língua nesse contexto.
Se avançarmos um pouco mais, John Macnamara
(1967 apud SAUNDERS, 1988, p. 10) descreve dois
aspectos do bilinguismo. Primeiro, quando uma língua
se emprega do ponto de vista do falante, do tópico, da
situação, etc., as duas línguas são igualmente adequadas.
Por exemplo, um falante bilíngue de inglês e alemão pode
manter um diário em inglês, quando ele poderia
igualmente bem mantê-lo em alemão. Tal preferência
pela escolha de uma ou outra língua para determinado
uso poderia ser um indício de que a sua língua dominante
é de fato o inglês. Segundo, "dominante" se refere à
tendência de uma das línguas do bilíngue ter influência
sobre a outra, o que Weinreich (1953, p. 1 apud
SAUNDERS, 1988) chamou de interferência.
O bilinguismo pode ser considerado vantajoso
ou desvantajoso?
Antes de discorrermos sobre esta indagação, será
que os próprios falantes bilíngues4 já se perguntaram
isso? Como seria lidar com duas línguas para o resto
de suas vidas?
De acordo com o que Saunders (1988, p. 14) nos
apresenta, antes da época em que testes de QI foram
aplicados entre falantes bilíngues e monolíngues, havia
uma discordância teórica na literatura, que pode ser
abordada pelos seguintes autores: Otto Jespersen (1922
apud SAUNDERS, 1988), em seu livro Language.
Its Nature, Development and Origin5, posiciona-se
4
Aqui falantes bilíngues referem-se somente àquelas crianças que adquiriram duas línguas quando crianças. São bilíngues de
primeira infância, portanto, nos termos de Saunders (ib.).
5
No PB seria: Linguagem/Língua. Sua natureza, desenvolvimento e origem.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
41
MASCARELLO & JUNGES
a favor da aquisição bilíngue pela criança, no entanto,
com uma restrição:
É claro que é uma vantagem para a criança ser
familiar com duas línguas, mas sem dúvida essa
vantagem pode ser obtida juntamente a um preço
alto. Em primeiro lugar, a criança em questão
dificilmente aprende uma língua tão perfeitamente
quando teria feito, se ela tivesse se limitado a
somente uma. Em segundo lugar, o esforço
cerebral requerido para a competência em duas
línguas, em vez de uma, certamente diminui a
capacidade da criança de aprender outras coisas
que podem e deveriam ser aprendidas.
Schuchardt observa que se o bilíngue tem duas
flechas para o seu arco, ambos são
aproximadamente folgados/frouxos (tradução
nossa).
O outro linguista que também se posicionou em
relação a essa discussão se chama Reynold, que em
1928 publicou um artigo na Suíça, no qual ele expressou
a sua opinião: "[...] Bilingualism leads to language mixing
and language confusion which in turn results in a
reduction in intelligence, an increase in mental lethargy
and reduced self-discipline" (In: SAUNDERS, 1988).
Pode-se depreender, da sua afirmação, que o
bilinguismo para o autor pode ser considerado
desvantajoso e, sobretudo, muito ruim para o falante
que assim o é.
Por outro lado, quando acrescentado às hipóteses
dos testes do QI sobre "inteligência verbal e não verbal",
Saunders (1988) chega à conclusão de que falantes
monolíngues possuiriam um desempenho significamente
melhor do que seus colegas bilíngues. Porém, não foi
o que se comprovou na prática. Segundo os resultados
dos autores, os falantes bilíngues obtiveram um
desempenho significativamente melhor do que os
monolíngues, nos testes de QI "não verbais". Para não
nos estendermos sobre o tema, citamos uma espécie
6
de "resumo" proposta pelo autor, novamente de
acordo com Saunders (1988, p. 15-16; tradução
nossa):
Intelectualmente, a experiência do bilíngue com
dois sistemas linguísticos parece oferecer-lhe uma
maior flexibilidade mental, uma superioridade na
formação de conceitos, e um conjunto mais
diversificado de habilidades mentais, no sentido
de que os modelos dessas habilidades
desenvolvidos por eles são mais heterogêneos.
Não é possível declarar, a partir deste estudo, se
a criança mais inteligente se tornou bilíngue ou
se o bilingualismo contribuiu para o seu
desenvolvimento intelectual. Porém, não há
dúvida sobre o fato de que ele é superior
intelectualmente. Em contrapartida, o falante
monolíngue parece ter uma inteligência mais
unitária que ele deve usar para os tipos de tarefas
intelectuais.
Por fim, de acordo com o autor (1988, p. 16-17;
tradução nossa):
Outros estudos também indicam que o bilinguismo
pode ter um efeito positivo na inteligência [da
criança] e pode oferecer a ela certas vantagens
cognitivas em relação aos seus colegas
monolíngues. Norman Segalowitz (1977), segundo
Saunders (ib.), por exemplo, expõe que o
background verbal e cultural do bilinguismo é
inerentemente mais rico por causa da sua
bilingualidade, que então produz uma ocorrência
mais cedo de certas experiências críticas ao
desenvolvimento intelectual.
Portanto, algumas das vantagens6 apresentadas pelo
falante bilíngue são as seguintes:
a) Maior e anterior consciência da arbitrariedade
linguística.
Tais vantagens não são arroladas neste artigo, dado que não pertencem ao nosso objetivo principal.
42
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
b) Separação anterior do significado em relação
ao fonema.
c) Maior adequação para avaliar homologações
contraditórias e não empíricas.
d) Maior adaptação a opiniões divergentes.
e) Maior adaptação a opiniões criativas.
f) Maior criatividade linguística e cognitiva.
g) Maior sensibilidade social.
h) Maior facilidade na formação de conceitos.
As idades de aquisição bilíngue
Sabe-se que a aquisição ou o aprendizado7 de uma
segunda língua pode ocorrer em qualquer idade,
independentemente do período crítico (válido para a
língua-mãe) e do período crítico sensitivo (válido para
a língua estrangeira), pois as aptidões, as oportunidades
e as motivações para o aprendizado dessa língua são
diferentes em cada momento. Nesse sentido, Einar
Haugen (1956, p. 72 apud SAUNDERS, p. 13)
refere-se a essas idades de aquisição bilíngue de uma
língua. São elas, então: bilinguismo na aquisição,
bilinguismo infantil, bilinguismo adolescente e
bilinguismo adulto. Os alunos que foram observados
na pesquisa estão em fase de transição da 1.ª para a
2.ª fase, ou seja, da aquisição para o bilinguismo infantil.
Bilinguismo e alfabetização através da leitura
em voz alta pela criança
Uma criança – Uma família – Duas línguas sendo
adquiridas simultaneamente.
A aquisição de duas línguas que se tornaram [línguas]
maternas, familiares e faladas espontaneamente pela
criança pode ocorrer informalmente (em um ambiente
familiar) ou/e formalmente (quando a criança está imersa
em uma escola de educação bilíngue). Em ambos os
contextos, a criança também pode ser alfabetizada nas
duas línguas sem que isso lhe traga qualquer confusão
ou interferência no seu aprendizado. Aexposição primária
dela com a leitura (uma forma de letramento) em seu lar
pode render-lhe bons frutos, quando ela for inserida na
escola. De acordo com Saunders (1988, p. 199): "A
evidência realmente emerge quando a leitura desde cedo
possui efeito favorável no desenvolvimento da pronúncia
de uma língua nativa de uma criança na pré-escola."
(ROBERTO LADO, 1987 apud SAUNDERS, 1988;
tradução nossa).
Em relação à leitura, por exemplo, quando realizada
em voz alta pela criança, ela desempenha um progresso
superior na sua leitura se comparada às crianças que
não realizam essa atividade de letramento em casa.
Assim, essa criança adquirirá um nível melhor de leitura
do que as crianças que só leem na escola.
Além disso, os pais não precisam ser necessariamente
linguistas, professores, pedagogos, etc. Basta
simplesmente exercer essa atividade com os filhos em
casa, pois "uma criança madura o suficiente para falar é
também madura o suficiente para ler". (TRELEASE,
1984 apud SAUNDERS, 1988.)
Após essa abordagem, o próximo capítulo tratará
de apresentar a metodologia utilizada nesta pesquisa.
METODOLOGIA
O método utilizado é o protocolo observacional
sobre as atividades de alfabetização da 1.ª série do
Ensino Fundamental de uma escola de imersão bilíngue
de Florianópolis (SC). Inicialmente, fizemos um
levantamento bibliográfico e um estudo teórico sobre
o processo de alfabetização e os principais desafios
enfrentados por professores alfabetizadores.
Interessou-nos, particularmente, o tema da
alfabetização bilíngue, por se tratar de uma prática
pouco comum nas escolas brasileiras (na rede pública
de ensino é praticamente inexistente e nas instituições
privadas também é limitada).
Após a definição do tema de pesquisa, iniciamos o
processo de contato com as instituições de ensino, o
que não foi uma tarefa difícil, pois o número de
estabelecimentos é reduzido; no primeiro contato
7
Para nós, aprendizado (learning) não se confunde com aquisição (acquisition), apesar de aparecerem como sinônimos muitas
vezes na literatura estrangeira.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
43
MASCARELLO & JUNGES
encontramos disponibilidade e acolhida por parte da
instituição pesquisada e de sua coordenação
pedagógica, onde fomos recebidos.
Entramos em contato com funcionários da escola e
realizamos duas visitas prévias para combinar o
acompanhamento de algumas atividades juntamente
com os alunos e as professoras alfabetizadoras da 1.ª
série do Ensino Fundamental.
Acompanhamos três dias de atividades realizadas
em sala de aula e analisamos parte do material utilizado
para a realização das atividades de alfabetização
bilíngue. O grupo de alunos observado constitui o que
se denomina de primeiro ano do Ensino Fundamental
e fazem parte desse grupo 16 crianças com idades de
5 e 6 anos – 2 alunos ainda não completaram 6 anos,
e a maioria já faz parte do grupo desde os 2 ou 3 anos
de idade, e conhecem a metodologia da escola e o seu
regime de funcionamento, desde a pré-escola.
Constatamos que apenas 2 alunos integraram o grupo
havia menos de seis meses.
Protocolo de observação
Os registros dos relatos (em anexo) foram feitos a
partir das observações de três dias de atividades em
aula na escola, tanto nas aulas ministradas em língua
portuguesa quanto em língua inglesa. Cada aula aqui
relatada teve a duração de uma hora e trinta minutos.
Por questões de ordem, optou-se, por primeiro, em
descrever as atividades ministradas em língua
portuguesa e em seguida em língua inglesa.
Aulas ministradas em língua portuguesa
Das aulas ministradas em língua portuguesa,
registramos que: de modo geral são propostas
inicialmente atividades orais com temática do cotidiano
do aluno, como por exemplo, hábitos de higiene. Após
a oralização, são propostas atividades de leitura e em
seguida atividades de escrita sobre o tema discutido.
As aulas seguem um padrão regular, isto é, são
organizadas com os mesmos procedimentos didáticos,
mudando o conteúdo proposto.
Aulas ministradas em língua inglesa
Em relação às aulas em língua inglesa, percebemos
44
que também seguem uma rotina didática: com
conversação sobre atividades desenvolvidas pelas
crianças e seus familiares. Constatamos também que
em muitos momentos os alunos fazem interferência em
língua portuguesa, vejamos um exemplo:
A conversação tem início com uma das crianças
dizendo espontaneamente:
"Yesterday I went to Beto Carrero", disse uma
das crianças em inglês.
"Eu não fui na montanha (russa)", disse uma das
crianças em português.
Logo mais, a professora perguntou a eles: "What
about the weather yesterday?"
"It was raining", disse uma das crianças.
"How do you say 'viajar' in English?"
(to) "Travel", responderam algumas crianças,
e, posteriormente, uma delas faz a seguinte pergunta:
"You're going to the Disney of Paris?" Então,
a professora lhe oferece o input positivo, corrigindo-a:
"To the Paris' Disney."
Realizado o momento de conversação, a professora
passa para o momento de registros escritos e de leitura.
Cada aluno tem seu material didático de apoio e realiza
primeiro uma leitura individual para, em seguida, ler
em voz alta para a turma. A partir da leitura das
crianças, foram anotadas algumas observações quanto
à relação grafema-fonema do inglês.
No livro adotado pela turma, uma das sentenças
exibidas é: "I can fix a van", que foi lida pela criança,
embora ela tenha produzido a vogal a de van como a
vogal anterior média-alta em vez de [E], que foi
pronunciada por uma colega tentando "corrigi-la".
Além desse exemplo, outra produção de uma das
crianças nos chamou a atenção, justamente por ela ter
lido de forma adequada, inclusive os clusters e a fricativa
linguodental sonora do inglês, que ocorreu em um dos
vocábulos durante a leitura. O vocábulo lido por ela
foi <bright>, que possui o cluster inicial <br>.
Outro exemplo que surgiu com a leitura das crianças
foi a sentença "I can fix a cat", que também consta
do mesmo livro. Nesta, observamos o fato de a vogal
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
de "cat" ter sido produzida semelhantemente à maneira
de realização do inglês norte-americano.
Outro exemplo que também serve para relatar a
aquisição de consoantes do inglês ocorreu, quando uma
das crianças disse: "Teacher, the agends!" Nesta
sentença, há a produção das duas consoantes africadas
do inglês, em "teacher", e, em "agends".
A seguir, o próximo capítulo concerne à análise e à
discussão dos resultados obtidos.
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Apresentar-se-ão a análise e a discussão dos
resultados obtidos nesta pesquisa. Primeiramente, tratarse-á da transferência linguística lexical do português
brasileiro para o inglês, juntamente com exemplos
herdados da literatura sobre bilinguismo, assim como
os casos observados nas aulas de inglês (na escola).
Transferência
linguística-lexical
e
reconhecimento/diferenciação dos sistemas
linguísticos pelas crianças bilíngues
A partir das observações levantadas, verificamos
alguns casos em que as crianças utilizaram vocábulos
do PB em meio a sentenças do inglês; o mesmo
processo não foi observado nas aulas de português
com interferência do inglês. O dado nos dá margem
para introduzirmos o conceito da transferência
linguística de uma língua para outra, cujo fundador é
Weinreich (1953). Como essas crianças vivem no
Brasil, parte-se do princípio de que o PB representa
sua língua dominante frente ao inglês, embora esta
também tenha sido adquirida por algumas das crianças.
Nesse sentido, tal conceito é definido por Clyne da
seguinte maneira (1991a, p. 160 apud RIEHL, 2004,
p. 28; tradução nossa): "A transferência é compreendida
pelo processo de trazer quaisquer itens, traços ou regras
de uma língua natural para outra, e pelos resultados desse
processo. Qualquer instância de uma transferência
significa transferir." Portanto, essa transferência pode
ocorrer em um contexto bilíngue também, junto ao qual
o léxico se desenvolve. Riehl (ib. p. 68; tradução nossa)
cita dois exemplos com os quais podemos nos familiarizar
a essa discussão:
Crianças que adquirem duas línguas
concomitantemente possuem um léxico misturado,
e a partir dos dois anos e meio/três anos idade é
que ocorre sua separação, segundo Romaine (1995,
p. 190 apud RIEHL, 2004, p. 68; tradução nossa).
Como na aquisição monolíngue de uma língua
materna, os conceitos são adquiridos em situações.
Elas adquirem respectivamente, por ex., a palavra
árvore em alemão, Baum, em um contexto, e a
palavra tree do inglês, em outro. Com isso, elas
tiveram que aprender a generalizar dois campos
semântico-pragmáticos. Quando já conseguem
efetuar isso, é porque já reconhecem dois sistemas
linguísticos. Um exemplo de Taeschner (1983, p.
36f) nos mostra que a sua filha, Giula, que fala alemão
e italiano, emprega a palavra specchio, espelho em
italiano, para o espelho do banheiro, e a palavra
Spiegel, espelho em alemão, para o espelho da sala
de estar.
Sobre esse tipo de situação, citamos a ressalva que
a autora (ib.) faz em relação à diferenciação dos
sistemas linguísticos pelos bilíngues em fase de
aquisição: "(...) crianças com aproximadamente 3 anos
de idade já diferenciam e denominam [ambas] as
línguas." Bosch e Sebastián-Gallés (2001, p. 71;
tradução nossa) também confirmam similarmente que,
"(...) no geral, o principal argumento para a falta de
discriminação acontece no âmbito da mistura
linguística 8/9 na fala das crianças, e, embora a
8/9
"(...) Até o fim dos anos 80, o uso de duas línguas em uma única elocução das crianças era considerado um reflexo de falha
delas em diferenciar suas línguas, e ainda um sinal de confusão entre as línguas. Mais recentemente, outras explicações foram
sugeridas." (POULIN-DUBOIS e GOODZ, 2001, p. 96; tradução nossa)
No texto, em inglês, é empregado o termo language mixing.
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MASCARELLO & JUNGES
diferenciação inicie pelo final do segundo ano, sua
realização seria alcançada após o final do terceiro ano".
Para efeito de exemplificação, em situações reais de
fala, há um exemplo que nos mostra que isso realmente
pode ocorrer:
Por ex., segundo a autora (ib.), a criança americana
de Washington, de 3 anos de idade, Betty, cujo pai é
alemão e a mãe inglesa, e que só compreende alemão
passivamente, em um voo com seu pai para Mount
Vernon acabou chamando a atenção de um turista
alemão dizendo: "Papa, the man spricht Deutsch",
em que o DP (determiner frase/determinante da frase)
do inglês [the man] – [o homem] se une ao VP
(Sintagma Verbal) do alemão [spricht Deutsch] – [fala
alemão], demonstrando com isso uma espécie de
"mistura linguística" entre ambas as línguas.
Nesse contexto, podemos introduzir também o
conceito de "code-switching", que, segundo a autora
(ib.), ocorre com a mistura das línguas, quando
elocuções linguísticas são mist uradas, e,
acrescentaríamos, "incorporadas". Um dos exemplos
coletados na literatura apresenta metade da sentença
expressa em alemão e a outra metade em inglês, até
que o falante retoma o alemão novamente. Segue o
exemplo: "Es war Mr. Fred Burger, der wohnte da
in Gnadenthal (em alemão) and he went out there
one day and Mrs. Rohr said to him (em inglês): Wer
sind denn die Männer do her 10 ? (em alemão,
novamente) (Ib., p. 20) Aqui, podemos, aliás, tratar
do conceito de "inserção", apresentado por Muysken
(2000 apud RIEHL, 2004, p. 22; tradução nossa) e
definido como a incorporação de unidades [linguísticas],
assim como é visto no seguinte exemplo, no qual há a
inserção de uma unidade do inglês, em negrito, em meio
a uma sentença do espanhol: "Yo anduve in a state
of shock pro dos dias.11"
Em relação às nossas observações na escola,
percebemos que os alunos realmente distinguem
conscientemente as duas línguas (o inglês e o PB), e
sabem quando um vocábulo ou uma sentença pertence
ao PB ou ao inglês, são crianças com 5 e 6 anos de
idade.
Além disso, há mais um dado pertinente em relação
à maneira de como se dá a mistura linguística pelo
falante bilíngue:
(...) Genesse et al. (1995) perceberam que
crianças bilíngues são mais suscetíveis a
apresentar a mistura (linguística) quando estão
usando sua língua não-dominante. Similarmente,
Goodz (1994) relatou que mesmo crianças que
falam somente uma das duas línguas de casa
exibem a mistura linguística, quando interagem
com seus pais falando essa língua não-dominante
(POULIN-DUBOIS e GOODZ, 2001, p. 96;
tradução nossa).
Por outro lado, apesar de elas já estarem na fase
final de aquisição, isto é, no final do período crítico,
por volta dos 5 anos, poderíamos indagar se assim as
crianças estariam usando dois sistemas linguísticos de
fato, já que há vocábulos de uma língua sendo
incorporados na outra. Segundo o que encontramos
na literatura disponível, Riehl (ib., p. 70; tradução
nossa) afirma que a mistura do léxico não é um critério
seguro para dizer que a criança não tem consciência
de que está utilizando duas línguas. Pelo contrário:
A mistura entre as línguas pode enfraquecer,
quando o vocabulário é tão vasto, que as crianças
não veem mais necessidade de pedi-lo emprestado
da outra língua. No início, a criança atribui mais
valor a aprender novas designações para os
objetos e os conceitos do que em adquirir
equivalentes de significado. Assim, um vocábulo
para um objeto já é o suficiente.
10
Tradução da sentença para o PB: Foi o (Sr.) Fred Burger que morava lá em Gnadenthal (antiga colônia alemã na
Austrália) e que saiu um dia, e Mr. Rohr disse a ele: Quem é que são, então, os caras lá? Conversa informal. (Ib.)
11
Tradução da sentença para o PB: "Andei por dois dias em estado de choque."
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"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
Pelos exemplos encontrados, podemos destacar
que esse valor que a criança atribui às novas
designações para os objetos e os conceitos, quando
estão se expressando, é o que parece estar ocorrendo
no momento da aquisição e do aprendizado do inglês
por elas, pois na verdade o que lhes interessa
essencialmente é a comunicação através dessa língua.
Além do mais, trata-se aqui de crianças imersas em
um ambiente de sala de aula sociointernacionista
vygostkyano, onde estão aprendendo (aprendizado
formal com a língua), e que não estão preocupadas se
produzirem uma sentença com um ou mais vocábulos
emprestados ou transferidos do PB para o inglês. Isso
acaba se tornando irrelevante para elas.
Portanto, abaixo seguem os exemplos encontrados
nas aulas e que contêm algumas dessas transferências
lexicais abordadas:
Um dos exemplos observados surge quando as
crianças passam a comentar a história (dos animais),
enquanto a professora lê para elas, até o momento em
que uma delas diz: "A dinossaur", apontando para o
jacaré. Assim, outra criança próxima a ela a corrige
dizendo em português: "É um jacaré."
Uma criança pergunta: "Teacher, how to do the
'pernas'?" "So, you know we say 'pernas' in
English…", responde-lhe a professora, até que a
criança lembra a palavra e diz: "Legs."
A professora segue a aula perguntando: What's the
story about? E elas respondem novamente: "One lady
swallowed animals 'sem querer' and catch the
others."
A professora pergunta-lhes o seguinte: "How do
you say 'grudento' in English? "Sticky", dizem elas.
"And how do you say 'picado' in English?" "Bite",
dizem elas, novamente.
How do you say 'comida' for the dog?", perguntalhes a professora. "It's dog-food", respondem elas.
"And the longhair of the lion?" "Juba"! Yes, but in
English! "Mane", dizem elas.
"How do you say 'rabinho' in English?" E as
crianças respondem para ela: "Tail!"
Realizada essa longa atividade, as crianças
começam a se preparar para jogar dado. Nesse
intervalo, eu mesmo, Mágat, indago uma das crianças,
dizendo: "How do you play it?" E ela me responde:
"I don't know... I have to talk to Vi12, but Vi 'não tá
aqui'…"
Exemplos coletados da relação grafemofonema do inglês (anotações de ditados realizados
por alguns alunos)
Destacamos aqui algumas anotações dos ditados
de quatro alunos da escola, denominados de alunos
(A, B, C e D), a fim de apresentar a relação grafemafonema do inglês ainda em fase de sistematização pelas
crianças, assim como a da separação silábica. As
sentenças escritas por elas são:
Aluna A:
"I weta thu the cinema ENA I woth the sureca
for ever."
I went to the cinema and I watched the Shrek
forever.
Aluno B:
"I wotch tivi FIFA World Cup."
I watched the FIFA World Cup on TV.
"Tudey I woti Brazil ne Protugau game ne I eat
pizza."
Today I watched Brazil x Portugal game and I
ate pizza.
Aluna C:
"To day I wot the gaimof Brailzenportugal en
et. was zerolazero en I eit a lot of pitzza en it was
fun."
Today I watched Brazil x Portugal game and it
was 0-0. And I ate pizza too.
"Lara went to my house si the game of Italien
Brazil."
Lara went to my house to see the game from
12
Vi, segundo o contexto da conversa, presume-se que seja provavelmente um colega ou uma colega da criança que estava
ausente naquela aula.
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MASCARELLO & JUNGES
Italien x Brazil.
"My brodur trai e to plei futbal."
My brother tried to play football.
Aluno D:
"To day I watht the Brazilian game at school.
And it wasinporto I ate 5 pitska of pizza."
Today I watched the Brazilian game at school and
it was in Porto. And I wate 5 pieces of pizza too.
Segundo Scliar-Cabral (2003), ao tratar dos
Princípios Alfabéticos do Português Brasileiro, para
que ocorra o aprendizado dos sistemas alfabéticos, é
indispensável que o indivíduo tenha desenvolvido uma
consciência fonológica, pois é ela que vai facilitar o
desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita,
e, esse aprendizado ocorre por meio da instrução
formal, este vai favorecer um crescimento intelectual e
a internalização dos processos necessários ao
desenvolvimento cognitivo em uma cultura
predominantemente letrada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme nossa hipótese inicial: que crianças que
desenvolvem o hábito de leitura diário, ou que ouvem
desde a mais tenra idade leituras dos pais ou leitores
na família, desenvolvem mais rapidamente as
habilidades para proficiência em leitura e escrita.
Podemos observar que o grupo pesquisado é um grupo
que tem a possibilidade de receber um bom suporte
pedagógico, tanto da escola quanto da família, e isso
os coloca em contato direto com diferentes culturas e
diferentes entendimentos socio-históricos, favorecendo
assim o processo de ensino/aprendizagem, pois,
recebem um número maior de estímulos.
Acreditamos que, para aprender a ler e a escrever,
além de todo o contexto do sujeito, é necessário que
haja instrução formal e uma postura cognitiva
consciente para que ocorra o processo de
aprendizagem.
Em relação ao processo de ensino/aprendizagem
de duas línguas, constatamos que a maioria dos pais
utiliza tanto o português quanto o inglês para se
comunicar com os filhos, mas percebemos, durante a
48
observação das aulas, que há uma predominância do
português: esse flui mais naturalmente. Não houve, por
exemplo, comentários ou perguntas em inglês nas aulas
em português, mas o contrário ocorreu.
Outro elemento significativo é que, embora todos
os alunos do grupo apresentassem bom desempenho
em leitura e compreensão dos comandos dados, os
alunos que frequentam a escola desde os 2 anos de
idade, e, conhecem há mais tempo a forma de
funcionamento da escola, apresentam maior
desenvoltura (em relação à leitura e escrita, não timidez
ou outros aspectos) que os alunos que integraram o
grupo nos últimos seis meses.
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bilingual infants. In: CENOZ, Jasone; GENESEE,
Fred (Ed.). Trends in Bilingual Acquisition:
Trends in Language Acquisition Research. San
Sebastián: John Benjamins Publishing North
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BOSCH, L., & SEBASTIÁN-GALLÉS. Evidence
of early language discrimination abilities in infants
from bilingual environments. Infancy, v.2, n.1,p. 2949, 2001.
DEHAENE S. Os Neurônios da Leitura: Como a
Ciência explica a nossa capacidade de ler. Tradução
para Português, Scliar-Cabral, L. São Paulo: Penso,
2012.
DIEBOLD, A. Richard. Incipient bilingualism.
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HALLIDAY, M. A. K. As bases funcionais da
linguagem. In: DASCAL, Marcelo. Fundamentos
metodológicos da linguística. São Paulo: Global,
1973.
LANDSMANN, L. T. Aprendizagem da
Linguagem Escrita, processos evolutivos e
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"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
implicações didáticas. 3 ed.São Paulo: Ática.
1998.
PINKER, S. O Instinto da Linguagem: Como a
mente cria a linguagem. São Paulo: Martins Fontes,
2004.
______. Do que é feito o pensamento: a língua
como janela para a natureza humana. São Paulo:
Companhia das Letras, 2008.
POULIN-DUBOIS; GOODZ. Language
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babbling. In: CENOZ, Jasone; GENESEE, Fred
(Ed.). Trends in Bilingual Acquisition: Trends in
Language Acquisition Research. San Sebastián –
Spain: John Benjamins Publishing Co. – North
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PEAL, E., W.E. LAMBERT. "The Relation of
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RIEHL, Claudia Maria. 5 Erwerb und Verlust von
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Sprachkontaktforschung; Eine Einführung. Tübingen;
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SAUNDERS, G. BILINGUALISM: What is
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SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral.
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SCLIAR-CABRAL, L. Princípios do Sistema
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Contexto. 2003.
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Boletim da Abralin, v. 3, p. 150-168, 1982.
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processos de leitura. Brasília: INEP, 1983.
SEBASTIÁN-GALLÉS, N., & BOSCH, L. The
building of phonotactic knowledge in bilinguals: The
role of early exposure. Journal of Experimental
Psychology: Human Perception and Performance,
v.28, p.974-989, 2002.
ANEXO
Observação das aulas ministradas em língua
portuguesa
Das aulas ministradas em língua portuguesa,
registramos o seguinte: No primeiro dia de observação,
o tema central da aula foi higiene nas cidades e uso
consciente da água. Houve bastante participação dos
alunos. A professora conversou sobre hábitos de
higiene, importância da limpeza, perguntou se eles, os
alunos, já viram áreas e lugares com lixo na cidade, a
maioria dos alunos respondeu que já viu locais com
lixo, que já viu o caminhão da empresa que recolhe
lixo. Além disso, conversaram também sobre a
importância de preservar e cuidar da água, assim como
evitar o seu desperdício. Passados mais de 30 minutos
de conversa, a professora pediu que os alunos abrissem
a revista Lego na página 56 para fazer um exercício
que tinha como tarefa:
"Descubra qual o caminho mais fácil para levar água
do riacho ao reservatório".
As crianças não tiveram problema para ler e
entender o enunciado nem para resolver o exercício.
Outro exercício, na página seguinte da mesma revista:
"Economizando água" com a seguinte tarefa: "Tem
gente desperdiçando água! Marque com um 'X' em
quem está brincando com a água."
O exercício apresentava três gravuras com desenhos
49
MASCARELLO & JUNGES
representando crianças em diferentes contextos como:
uma escovando os dentes, outra lavando a mão e outra
brincando debaixo do chuveiro. O exercício também
foi bem-sucedido e realizado sem problemas pelas
crianças.
Na sequência da aula, os alunos foram organizados
em grupos com quatro componentes, cada um recebeu
uma atividade específica: um coordenador, um
registrador, um selecionador de peças e um montador
para realizar uma atividade prática. Cada grupo deveria
montar um bebedouro para bichinhos de estimação.
Foram utilizados os seguintes materiais: uma garrafa
pet pequena, um prato plástico para vasos, fita crepe
e régua. Na página 58 da revista Lego, havia instruções
e passos para montagem, e todas as equipes
conseguiram realizar a atividade. A maior dificuldade
foi definir os papéis de cada membro da equipe, pois
todos preferem ser o montador, mas aos poucos, e
com a ajuda da professora, eles perceberam que todos
da equipe assumiam papel importante e que um
dependia do outro para o êxito da atividade. Essa
atividade de montagem em equipe é realizada todas as
segundas-feiras, com o intuito de trabalhar a
coletividade e a importância de exercer e respeitar
diferentes funções e papéis.
Na outra aula observada, os alunos deveriam
realizar a leitura de pequenos textos do livro de
português nas páginas 88 e 89 e fazer os exercícios.
Os alunos foram orientados em um primeiro momento
a realizar uma leitura individual, para verificar se o texto
era compreensível e se havia palavras desconhecidas.
Os alunos leram os textos 1 e 2, Saci-pererê e Como
pegar o Saci, respectivamente. Em seguida, a
professora pediu que alguns alunos lessem em voz alta
para o restante da turma. Constatou-se que apenas
dois alunos ainda apresentam alguma dificuldade para
leitura fluente – os demais leem com fluência e
entendimento do que leram, todos já viram filmes e
leram outros textos que tratam de folclore ou já
assistiram a algum programa televisivo que trata da
figura mítica do Saci-pererê. Após a discussão do texto,
os alunos foram orientados a fazer os exercícios.
1) Os dois textos que você leu falam sobre o Saci.
50
O primeiro é um poema. O outro é um texto que dá
instruções de como fazer para pegar um Saci. É
um texto instrucional. Você e seus colegas vão
comparar os dois textos e discutir quais são as
diferenças. (JULIO, 2008, p. 89)
Alguns alunos tiveram dificuldade para fazer o
exercício e distinguir bem as diferenças, a professora
acompanhou e foi dizendo, dando pistas para comparar
os dois textos.
2) "Você conhece outros tipos de textos que
ensinam a fazer alguma coisa? Pense e marque um 'X'
nos textos instrucionais que você conhece."
E como opção de resposta aparecia, por exemplo,
receita culinária, regras de jogo, bula de remédio,
instruções de montagem, dentre outros. A professora
foi fazendo comentários e ajudando os alunos. Os
alunos já viram receitas médicas, receitas culinárias,
instruções de montagens de jogos, ou seja, não é algo
desconhecido para eles.
Na outra aula observada, tratou-se do ensino de
números e quantidade. A professora iniciou a aula com
a música do Indiozinho: "um, dois, três, indiozinhos,
quatro, cinco, seis indiozinhos, sete, oito, nove
indiozinhos..." Após terem cantado a música algumas
vezes, a professora perguntou se mais alguém conhecia
outra música que falava de números. Um dos alunos
lembrou: "1,2 feijão com arroz; 3,4 feijão no prato;
5,6 falar inglês, 7,8 comer biscoito; 9,10 comer
pastéis."
Em seguida, a professora apresentou diferentes
formas de representar quantidade, indicando pelo
desenho do número, por colagem de gravuras,
contando os dedos das mãos. A professora entregou
o livro de matemática (cada aluno tem seu livro) e pediu
que fizessem os exercícios das páginas 32 e 33. O
primeiro exercício fazia referência a outra cantiga, com
a seguinte tarefa:
"Aproveite a cantiga e ligue as quantidades com a
ilustração correspondente."
Todos os alunos realizaram a atividade sem fazer
perguntas para a professora. O outro exercício com o
enunciado era:
"Mariana ensinou outra cantiga com números. Leia
REVISTA UNIARA,v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
a letra da música e complete a última estrofe."
No livro estava registrada a cantiga com a última
estrofe incompleta.
O outro exercício dizia o seguinte:
"Complete as sequências numéricas com os
adesivos da página 175."
Todos os alunos fizeram as atividades sem
dificuldades e sem perguntas pertinentes sobre o
conteúdo para a professora. Em seguida, os alunos,
em grupos com quatro elementos em cada grupo,
deveriam escolher formas de representar quantidade
e os números de 1 a 10. Um grupo escolheu palitos
coloridos para colar em folhas de papel, outro grupo
resolveu desenhar borboletas e o outro grupo recortou
e colou figuras. Os trabalhos foram expostos em um
local da sala onde todos pudessem visualizá-los.
Aulas ministradas em língua inglesa
Primeira aula (13 de julho):
No início dessa primeira aula, estava havendo uma
conversação em inglês entre a professora e as crianças,
que passaram a interagir formulando perguntas e as
respondendo. O assunto sobre o qual estavam
conversando era viagem. A conversação teve início com
um dos alunos dizendo espontaneamente:
"Yesterday I went to Beto Carrero", contou uma
das crianças em inglês.
"Eu não fui na montanha (russa)", disse uma das
crianças em português.
Logo mais, a professora perguntou a eles: "What
about the weather yesterday?"
"It was raining", disse uma das crianças.
Em seguida, passaram a conversar novamente
sobre o Beto Carrero, até que em um momento da
conversa a professora perguntou: "How do you say
'viajar' in English?" "(to) Travel", responderam algumas
crianças, e, posteriormente, uma delas fez a seguinte
pergunta: "You're going to the Disney of Paris?" então,
a professora lhe oferece o input positivo, corrigindo-a:
"To the Paris' Disney."
Após a conversação, a professora passou a fazer a
revisão das formas com os alunos:
Review: What is review?
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Para iniciar a aula, a professora, diante da lousa,
indagou o seguinte: "Where can I find this kind of
thing"?, apontando para as formas como o triângulo,
o losango, o retângulo, o círculo, etc, que foram
reproduzidas na lousa para as crianças visualizarem e
responderem às perguntas. Então, uma das crianças
responde:
"I know the retangle."
"What's retangle?", perguntou a professora.
"The door, the building, the window, the paper",
responderam as crianças, em coro, até que uma delas
respondeu: "The beans." Com essa resposta, a
professora a corrigiu, dizendo: "No, beans are oval."
Consequentemente, a professora disse: "Another
shape... here in the classroom!" Assim, uma das crianças
apontou para a mesa. A professora perguntou-lhes:
"This part is square? And what about this part here?"
Apontando para a porta: "Yes, it's retangle", respondeu
uma das crianças. A professora seguiu com a aula,
dizendo: "Is that square?", apontando para um objeto
da sala de aula. E as crianças responderam: "No!" A
professora continuou: "I think, this is the most square.
I think, the alphabet is square. The picture is square.
Look!" Depois, ela perguntou às crianças: "The
computer is…?" E as crianças: "Retangle!"
Prosseguindo a aula, a professora continua
perguntando: "What shape is that? Is it this one?"
(Tocando a lousa). Neste momento, as crianças
passaram a participar da aula cada vez mais ativas...
What is oval? Perguntou de novo a professora. E as
crianças passaram a apontar para o ovo, até que uma
das crianças disse: "The egg"... And where can I find
star-shape? Perguntou a professora. E, de forma bem
emotiva, responderam as crianças: "In the sky",
apontando para o céu.
Realizada esta atividade, a professora passou para
a atividade com os livros, dizendo: "Warm-up!", e cada
criança começou a se preparar para ler. Disse a
professora, depois: "I want everybody to open your
books. On page 58!" Ela seguiu a aula perguntando:
"Why do you have to do this?! You have some of the
shapes here. Write the retangle, the circle and the date."
Dada a ordem, as crianças passaram a realizar a
51
MASCARELLO & JUNGES
atividade e a professora ficou observando se alguma
delas precisava de ajuda… "Don't forget your names
and the date", disse a professora. Neste meio tempo,
uma das crianças perguntou como escrever o grafema
<c>. A professora disse: "Do you remember 'city'?"
Does it start wit letter? "C" [], respondeu a criança.
E a professora: "It sounds like CNI."
Após terem concluído essa atividade, a professora
passou para a atividade de leitura com as crianças,
pedindo que alguma delas lesse alguns trechos de um
pequeno livro infantil. Junto à leitura das crianças, foram
anotadas algumas observações quanto à relação
grafema-fonema do inglês.
Nesse livro, uma das sentenças exibidas é: "I can
fix a van", que foi lida muito bem pela criança, embora
ela tenha produzido a vogal <a> de <van> como a
vogal anterior média-alta [e] em vez de [E], que foi
pronunciada por uma colega tentando "corrigi-la".
Portanto, [] foi produzida como [] pela
criança.
Além deste exemplo, outra produção de uma das
crianças nos chamou muito a atenção, justamente por
ela ter lido muito bem, inclusive os clusters e a fricativa
linguodental sonora do inglês [], que ocorreu em um
dos vocábulos durante a leitura. O vocábulo lido por
ela foi <bright> [], que possui o cluster inicial
<br> [].
Outro exemplo que surgiu com a leitura das crianças
foi a sentença "I can fix a cat", que também consta do
mesmo livro. Nesta, observou-se o fato de a vogal [{]
de "cat" ter sido produzida semelhantemente à maneira
de realização do inglês norte-americano.
Outro exemplo que também serviu para relatar a
aquisição de consoantes do inglês ocorreu quando uma
das crianças disse: "Teacher, the agends"! Nesta
sentença, houve a produção das duas consoantes
africadas do inglês [], em teacher, e [], em
agends."
Segunda aula (14 de julho):
No segundo dia de observação, outra professora,
que deu início ao seu estágio na escola, preparou a
atividade de leitura para as crianças e disse: "Listen to
52
me!" As crianças foram com ela para o pátio da escola,
formaram uma roda, sentadas no chão, e passaram a
se organizar para ler o livro "Never, ever - Shout in a
Zoo" (Scholastic Editor), em cujas laudas há uma
gravura e o parágrafo para a leitura.
O livro trata de uma pequena história que se passa
em um zoológico. Em uma das páginas, durante sua
leitura, há um alce, moose em inglês, e, como as
crianças estão se engajando em um projeto sobre o
Canadá, elas já estão familiarizadas com o animal. A
professora perguntou:"Where does the moose
come?" E as crianças: "From Canada", apontando
para o animal que aparece no livro.
Adiante, outro exemplo pertinente observado surgiu
quando as crianças passaram a comentar a história,
enquanto a professora a leu para elas, até o momento
em que uma delas disse: "A dinossaur", apontando
para o jacaré. Assim, outra criança a corrige, dizendo
em português: "É um jacaré."
Lida essa estória, a professora partiu logo para outra,
que se chama "Where the plants and animals live" e fez
a seguinte pergunta: "What animals live in the forest"?
Então, as crianças passaram a dizer os nomes dos animais
em voz alta. Além disso, concomitantemente à leitura da
história pela professora, as crianças diziam os nomes
dos animais exibidos nas páginas. Posteriormente, uma
das crianças produziu a sentença: "Teacher, the camel
have a lot of...", na qual a criança trocou a 3p.sing.
<has> pela 3.p.pl. <have>.
Realizada essa atividade, a professora introduziu a
próxima atividade: as crianças desenharam os animais
e, assim, sistematizaram-nos com as suas formas.
Então, uma criança perguntou: "Teacher, how to do
the 'pernas'"? "So, you know we say 'pernas' in
English…", respondeu-lhe a professora, até que a
criança lembrou a palavra e disse: "Legs."
Terceira aula (15 de julho):
Nessa terceira aula, a professora-titular da turma
retornou e introduziu um ditado às crianças. Ela disse:
"Write the numbers from 1 to 5", e, então, as crianças
passaram a escrevê-los. Feito isso, a professora iniciou
o ditado e disse: "Try to write by yourself." 1.ª palavra,
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
"Teacher, how to do the 'pernas' in English?"...
portanto: "Seven"; 2.ª: moose; 3.ª: have; 4.ª this (e uma
das crianças disse: <t> [] e <h> []; 5.ª fog
(acrescentou uma criança: "When you can see
nothing..."); 6.ª Wolverine ("Nine letters", disse a
professora). Depois do ditado, a professora pediu que
uma criança soletrasse todas as letras que foram
escritas, e, surpreentemente, a aluna as soletrou
perfeitamente.
Após essa atividade, as crianças passaram a outra,
sobre os animais, usando um livro. A professora
perguntou-lhes: "What's the main character of this
book?" Então, as crianças responderam: "The old lady."
A professora seguiu a aula, perguntando: What's the
story about? E elas responderam novamente: "One
lady swallowed animals 'sem querer' and catch the
others."
"Today we are going to see…what can we see?"
Responderam as crianças: "A lot of animals, butterflies,
snakes…" "What's mov?", indagou a professora. E elas
respondem: "It's a butterfly which shines at night." "What
are they", seguiu indagando a professora. "They're
insects", responderam elas. A aula seguiu, portanto,
com a professora dizendo: "Tell me about the body
parts of this insect…" "Four and two wings",
responderam elas mais uma vez. "What is that? How
do you say it in English?", perguntou a professora,
apontando para a teia de aranha na estória, até que
elas responderam: "Spider-web." A aula prosseguiu e,
de repente, uma criança perguntou como se diz
"grudento" e outra perguntou como se diz "picado" em
inglês. E a professora perguntou: "How do you say
'grudento' in English? "Sticky", disseram elas. "And
how do you say 'picado' in English?" "Bite", disseram
elas novamente…." Tell me the characteristics of the
bird!", disse a professora, e elas responderam: "Flings,
the head…" Seguiu a contação da história, até que a
professora perguntou: "How do you say 'rabinho' in
English?", e as crianças responderam para ela: "Tail!"
"And the cat...it lives where?", perguntou ela às
crianças, novamente, e elas responderam: "In the city!"
A aula continuou com o vaivém de perguntas e
respostas... "How do you say 'comida' for the dog?",
perguntou-lhes a professora. "It's dog-food",
responderam elas. "And the longhair of the lion?"
"Juba"! Yes, but in English! "Mane", disseram elas.
Realizada essa longa atividade, as crianças
começaram a se preparar para jogar dado. Nesse
intervalo, eu mesmo indaguei a uma das crianças: "How
do you play it?" E ela me respondeu: "I don't know...
I have to talk to Vi, but Vi 'não tá aqui'…"
RECEBIDO EM 24/5/2012
ACEITO EM 29/6/2012
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
53
PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUÇÃO COM EDUCAÇÃO
AMBIENTAL: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA DO
SEGMENTO QUÍMICO
OLIVEIRA NETO, Geraldo Cardoso de. Doutor em Engenharia da Produção. Professor e pesquisador do
Programa de Mestrado em Engenharia da Produção da Universidade Nove de Julho – Uninove, Rua Francisco
Matarazzo, 612 CEP 05001-100, São Paulo/SP. Brasil. E-mail: [email protected].
VENDRAMETTO, Oduvaldo. Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade de São Paulo – USP.
E-mail: [email protected].
AZZOLINI JUNIOR, Walther. Doutor em Engenharia Mecânica – USP-São Carlos, professor-assistente da
USP/São Carlos e pesquisador convidado do Grupo de Pesquisa em Gestão da Produção com ênfase no PCPPLACOP vinculado ao Departamento e ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da
Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.
BONILLA, Silvia H. Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo – USP, professora-titular da
Universidade Paulista – Unip, Rua Bacelar, 1212 CEP 04026-002, São Paulo/SP. Brasil. E-mail: [email protected].
RESUMO
Este artigo tem por objetivo abordar um estudo de caso de uma empresa química que adequou o sistema de
Planejamento, Programação e Controle da Produção à Educação Ambiental. Com esse propósito dá ênfase à
infraestrutura necessária, visando sensibilizar e disseminar a educação ambiental de maneira transversal para os
funcionários operacionais e planejadores da produção, tornando possível formar ecotime para a disseminação
dos conhecimentos em Educação Ambiental e desenvolvimento de projetos sustentáveis. É importante salientar
que os dois planejadores de produção foram os principais agentes do ecotime na criação do plano de ação
sobre a estruturação da manufatura limpa. O desenvolvimento do estudo de caso se deu por meio de entrevista
semiestruturada e observação participante, que permitiram levantar os princípios, as práticas e os capacitadores
da Manufatura Limpa que a organização adotou como objetivo de desempenho para competitividade. Também
foi possível avaliar as vantagens econômicas e ambientais da implantação do projeto envolvendo o sequenciamento
das tarefas no âmbito das funções de planejamento e controle. As vantagens ambientais foram mensuradas por
meio do método Wuppertal (2008). Duas variáveis foram consideradas na medição dos resultados obtidos
com a implantação: o volume de produção em litros e o custo por litro da principal matéria-prima. O aumento
do volume de produção foi de 20% em litros e a redução do custo por litro, de 10,6%.
PALAVRAS-CHAVE: Planejamento e Controle da Produção; Educação Ambiental; Produção enxuta; Estudo de
caso; Segmento químico.
ABSTRACT
This article presents the case study of the implementation of Production Planning and Control with environmental
education in a chemical plant. For this purpose, it emphasizes the necessary infrastructure, to sensitize and
disseminate environmental education in a transversal way for officials and planners operating in production,
making it possible to form ecoteam for the dissemination of knowledge in environmental education and sustainable
development projects. It is noteworthy that the two production planners were the main agents of ecoteam in
creating the action plan for the structuring of cleaner production. Semi-structured interviews and participant
observation were used for the development of the case study, allowing to raise the principles, practices and the
Clean Manufacturing enablers that the organization has adopted as a performance goal for competitiveness. It
was also possible to evaluate the economic and environmental advantages of implementing the project involving
54
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
the sequencing of tasks within the planning and control
functions. The environmental benefits were measured
by the Wuppertal (2008) method. Two variables were
considered in the measurement of results obtained with
the implementation: the production volume in liters and
the cost per liter of the main raw material. The increasing
of the amount of production was 20% in liters and the
cost reduction, of 10.6% per liter.
K EYWORDS: Production Planning and Control;
Environmental Education; Lean production; Case study;
Chemical segment.
INTRODUÇÃO
As estratégias competitivas de natureza corporativa
e as estratégias de manufatura têm evoluído devido a
questões relacionadas aos paradigmas da manufatura.
Essa evolução transforma a organização e a adequação
do trabalho, a partir das alterações que
proporcionaram aos profissionais da área de
Planejamento, Programação e Controle da Produção
o aprimoramento das habilidades e competências ao
longo dos anos. Contudo, as transformações ocorridas
na forma de organização e adequação do trabalho
foram direcionadas pelo mercado, fazendo com que
os objetivos de desempenho da organização fossem
alterados ao longo do tempo. Dessa forma, as
organizações passam a considerar em sua estratégia
novas práticas e princípios com o uso de ferramentas
condizentes à realidade das organizações. Nesse
contexto foi possível o aprimoramento das habilidades
ao longo dos anos.
Este artigo tem por objetivo geral abordar um
estudo de caso de uma empresa química que adequou
o sistema de Planejamento, Programação e Controle
da Produção à Educação Ambiental. Para isso,
estabeleceu a infraestrutura necessária para o controle
de suas operações e estruturou o projeto e o sistema
de produção para transformá-lo em uma Manufatura
Limpa. A organização identificou, por meio de
entrevista semiestruturada e observação participante,
a necessidade atual de mudança e a tendência do
avanço do aprimoramento do processo de gerência
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
de produção frente à sustentabilidade. Dessa forma, o
presente artigo demonstra os princípios, as práticas e
os capacitadores da Manufatura Limpa que a
organização adotou como objetivo de desempenho
para competitividade.
Na concepção deste artigo, considera-se a
definição de paradigma sob a ótica das trajetórias
tecnológicas, incorporando fortes prescrições sobre
as direções da mudança técnica no sistema produtivo,
em que ao longo dos anos ocorrem mudanças
incrementais no conhecimento prático e teórico de
know how, métodos, procedimentos e atividades,
dispositivos físicos e equipamentos denotando
progresso (DOSI, 2006). Segundo Godinho Filho
(2004), para surgir um novo Paradigma Estratégico
na Gestão da Manufatura (PEGEM) há uma
dependência direta de (i) direcionadores, que são as
condições de mercado que possibilitam, requerem ou
facilitam a implantação do PEGEM, assim como de
(ii) princípios caracterizados pelas ideias que
fundamentam as empresas rumo aos PEGEM, de (iii)
capacitadores, compost os de tecnologias,
metodologias e ferramentas de gestão e de (iv)
objetivos de desempenho para tomada de decisão
(SLACK et al., 2007). Especificamente, propõe-se
avaliar e comparar as vantagens econômicas e as
vantagens ambientais nesse arranjo. Os ganhos
ambientais foram calculados por meio do método
Wuppertal (2008).
REFERENCIAL TEÓRICO
Evolução do Paradigma Estratégico da Gestão
da Manufatura para a Manufatura Limpa
Nesta seção há a intenção de apresentar o caráter
evolucionário da gestão da manufatura ao longo dos
anos (Quadro 1). Verificou-se, por meio da revisão
bibliográfica, que o direcionador de mercado é
propulsor da competitividade, ele dita a adequação,
isto é, a maneira pela qual se organiza o trabalho, não
o bastante, como transforma as habilidades das
pessoas envolvidas no processo.
Antes do século XX, as empresas processavam
produtos artesanais sem grande inserção de práticas
55
OLIVEIRA NETO et al.
de gestão na manufatura. Womack et al. (1992)
relatam que a Manufatura Artesanal foi um período
caracterizado por força de trabalho altamente
qualificada em projeto, produção e montagem, com a
particularidade de empresas descentralizadas com
baixo volume de produção.
Segundo Porto et al. (2004), é a partir do século
XX que a sistemática da divisão econômica do trabalho
passa a imperar no âmbito da Manufatura em Massa,
com o intuito de garantir um aumento de produtividade,
a qual é intensamente incrementada. Godinho Filho
(2004) revela que, nesse período, havia alta divisão
do trabalho e alto grau de repetitividade com produção
baseada no baixo custo que explorava as economias
de escala.
Em 1960, há um grande crescimento do mercado
automotivo, que exigia "alta qualidade e baixos custos",
impulsionando as organizações a se tornarem mais
enxutas (BUFFA, 1984). Womack & Jones (1998)
definem Manufatura Enxuta como uma nova
abordagem, segundo a qual existe uma forma melhor
de organizar e gerenciar os relacionamentos de uma
empresa com os clientes, cadeia de fornecedores,
desenvolvimento de produtos e operações de produção.
O objetivo essencial é fazer mais com menos. Godinho
Filho (2004) diz que a ênfase passou a ser na melhoria
das operações, eliminação de desperdícios, retrabalhos
e diminuição do setup das máquinas com o intuito de
redução do tamanho do lote de produção e,
consequentemente, com o aumento na variedade de
produtos oferecidos aos clientes. Em 1970 as empresas
evoluíram para a produção sem defeitos, com inovações
nos processos e pontualidade de entrega.
A necessidade de pontualidade na entrega
direcionou as organizações a implementarem uma série
de métodos destinados a reduzir o tempo de resposta
aos clientes (BLACKBURN, 1991a). A estratégia da
gestão da Manufatura Responsiva enfatiza a redução
do tempo de desenvolvimento de produto e de
produção como fatores vitais para o aumento da
competitividade de uma empresa (BOWER & HOUT,
56
1988; BOOTH, 1996), a fim de tornar a manufatura
mais atraente sob a ótica do consumidor
(HANDFIELD, 1995).
As indústrias perceberam que não basta fabricar
produt os padronizados; é preciso inserir
Customização em Massa, passando da economia de
escala para uma economia de escopo, de forma a
permitir a disponibilização de múltiplos produtos a
custos mais baixos do que poderiam ser conseguidos
individualmente (GOLDHAR; JELINEK, 1983). As
empresas perceberam que, reduzindo os ciclos de vida
dos produtos e fragmentando a demanda, poderiam
obter grande vantagem competitiva, caso tivessem a
habilidade de agregar flexibilidade e velocidade ao
sistema produtivo, tornando-o capaz de responder às
incertezas de mercado e às variabilidades internas
rapidamente e com menor custo (PINE, 1994).
Sendo assim, em 1991 surge a Manufatura ágil
(GODINHO FILHO, 2004), para responder às
incert ezas de mercado de maneira rápida
(GUNASEKARAN, 1999). Dessa forma, entendese que a Manufatura Ágil possui como objetivos
principais: atender às necessidades dos clientes e
responder a mudanças inesperadas de maneira
correta e no tempo, permitindo explorar novas
oportunidades de mercado (DE VOR et al., 1997;
SHARIFI & ZHANG, 1999).
A partir do ano 2000, os stakeholders passaram a
influenciar a rede de suprimentos para a produção de
bens e serviços com consciência ambiental, orientando
a produção para a manufatura limpa. Nesse caminho,
as organizações procuram sensibilizar os envolvidos
por meio da Educação Ambiental, para adequar o
sistema produtivo para princípios, práticas e
capacitadores ambientais, com o intuito de implantação
da produção mais limpa e ecologia industrial. É
importante salientar que, por um lado, a organização
favorece a redução da poluição, apresentando
vantagens ambientais; por outro, ganha em
competitividade e vantagens econômicas (OLIVEIRA
NETO et al. 2010).
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Paradigma Estratégico da
Gestão da Manufatura
Manufatura artesanal
Anterior ao século XX
Manufatura em Massa
I nício do século XX
Direcionador de Mercado
Necessidade de adequação
Habi lidades
Participação do cliente no
projeto
Preço baixo/ Produtos
padronizados
Des centralização / Baixa
Produtividad e
Qualificado em projeto
Produtividade/ Custo
Especialista
Manufatura Enxuta da década
de 1950 a década de 1970
Qualidade/ Produ tos
diversificados
Desperdício/ Qu alidade/
Treinam ento
Novas técnicas administrativas e
nova forma de organização
industrial
Manufatura Res ponsiva
Surge em 1987
Prazo de entrega em curto
prazo
Produtos com
especificidades dos
clientes no curt o prazo
Resposta a mu danças
rápidas de mercado
Tempo / Flexibilidade
R esponsividad e / Adaptabilidade
Customi zação em Massa
Surge em 1987
Manufatura ágil
Surge em 1991
Manufatura Li mpa a partir do
ano 2000 até atual
Imagem da empresa
Socioambiental Mar keting Verde e
ISO 1 4000
Customização / Personalização/
Preços Baixos / Flexibilidade /
Produtividad e
Incertezas e mudanças con stant es/
Tecnolo gia avançada / Qual idad e
Produ ção Mai s Limpa/ eficiên cia
ecológica/ Anális e do Ciclo de
Vida/ Ecologia Industrial/ C adeia
de Suprimentos Verde/ Logística
Reversa/ P&D de pro dutos
ambiental mente corretos
Customização
Resposta rápida e enfrentar
desafios
Educação Ambiental
Quadro 1 – Necessidades de adaptação e habilidades frente ao surgimento de paradigmas no sistema
produtivo ao longo dos anos.
Fonte: Adaptado de Godinho Filho (2004).
Planejamento, Programação e Controle da
Produção com Educação Ambiental (PPCPEA)
Nesta seção será conceituado o processo de
infraestrutura e estrutura do PPCPEA (Figura 1). É
importante ressaltar a necessidade de considerar as
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
questões ambientais no PCP de maneira flexível e
adaptativa ao sistema produtivo, permitindo
estabelecer mudanças incrementais na programação
da produção, visando resolver problemas ambientais
(YUKSEL, 2007).
57
OLIVEIRA NETO et al.
Figura 1 – Implementação do novo PEGEM no sistema produtivo.
Fonte: Oliveira Neto et al. (2010).
Entende-se por infraestrutura o conjunto de elementos que enquadram e suportam toda a estrutura da
manufatura (AZZOLINI, 2004). Os elementos infraestruturais do PCPEA são apresentados no Quadro 2.
Elementos da infraes trutura
1) Implemen tar estrat égia de recursos humanos, a fim de disseminar Educação Ambi ental, permiti ndo estimu lar os funcio nários a atitudes
socioam bientais e inclusive a t ornar-se multiplicadores.
2) Inserir na gestão da qualidade da empresa a gestão ambiental e como consequência implementar a ISO 14000 nos process os
organizacionais.
3) Estabelecer no plano estrat égico da empresa a estreita relação entre (PPCP) enxut o e a (P+L), com o objetiv o de implementar a nova
con cepção de (PPCPEA) no si stema de produção; para isso, além de planejar um fluxo Just in time, estabelecer o (MRP), a fim de descartar
os resíduos de maneira correta, ou até mesmo assimilar o subproduto no fluxo produtivo, a fim de adquiri r vantagens ambi entais e
econômicas.
4) Disseminar consci entização ambiental na empresa, a fim de en vol ver a estrutura, visando à aceit ação da evolução paradigmática d o
sistema produtivo para uma manufatura limpa.
Quadro 2 – Elementos da infraestrutura.
Fonte: Oliveira Neto et al. (2010).
58
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Dessa forma, considera-se de suma importância
educar os funcionários operacionais sob a ótica
ambiental de maneira transversal, para desenvolver
infraestrutura apropriada e incentivar a criação de
projetos ecoeficientes intrínsecos ao planejamento e
controle da produção.
Fundamentado na Carta de Belgrado, os
funcionários das organizações precisam se ater aos
objetivos da Educação Ambiental, visando disseminar:
conscientização e sensibilidade sobre os problemas
ambientais; conhecimento sobre o meio ambiente em
relação à influência do homem; atitudes e valores para
participação; habilidades para participação ativa;
capacidade crítica de avaliação e participação
responsável e de urgência em relação às questões
ambientais (BARBIERI & SILVA, 2011). O objetivo
central da Educação Ambiental é motivar o
envolvimento e ação do ser humano na resolução de
problemas ambientais (INTERGOVERNAMENTAL
CONFERENCE ON ENVIRONMENTAL
EDUCATION, 1977). A concepção da Educação
Ambiental deve ser abordada entre os profissionais
cujas atividades e decisões geram repercussões
significativas sobre o meio ambiente, como
administradores, engenheiros, economistas,
desenvolvedores de produtos, formuladores de política
pública, entre outros (BARBIERI E SILVA, 2011), e
pode ser estendida aos stakeholders, visando à
transformação para a consciência ambiental de todos
os envolvidos (PEARSON, 2011).
Portanto, é importante educar os funcionários sob
a ótica ambiental para identificar de maneira completa
e clara os responsáveis pelos assuntos socioambientais
na empresa (FURTADO, 2005; YUKSEL, 2007),
com objetivo de formação de ecotimes, para o
desenvolvimento de projetos sustentáveis, alinhamento
e monitoramento para geração de ideias entre os
envolvidos nesses projetos (NEVENS et al., 2008).
Além de disseminar informações sobre os aspectos
ambientais e sociais nos fluxos e processos gerais da
empresa (NIELSEN & MULLER, 2009). Para a
integração funcional de conhecimento sobre a
sustentabilidade, com consciência ambiental,
REVISTA UNIARA,v.15, n.1, julho 2012
tecnologias limpas, conhecimento tecnológicos e
implementação das práticas no sistema produtivo,
flexível e adaptativo (SHIN et al., 2008).
É preciso que se harmonize o discurso da Educação
Ambiental, destacando a oportunidade de capacitar
pessoas a se concentrar na resolução de problemas
socioambientais (STRIFE, 2010). O conhecimento e
a complexidade dos componentes de materiais e suas
interligações para facilitar o entendimento do impacto
ambiental e poderão desenvolver produtos que restrinja
tais materiais (NIELSEN & MULLER, 2009). A
Educação Ambiental não visa apenas inspirar cidadania
responsável, mas principalmente capacitar pessoas
para proteger a sociedade de hoje e as condições de
sobrevivência futura (STRIFE, 2010). Por meio de
situações de aprendizagens, em que os envolvidos têm
a oportunidade de explorar, analisar e interpretar as
ações humanas em situações de vida real (KYBURZGRABER, 2006).
Conforme Oliveira Neto et al. (2009), a
metodologia para Educação Ambiental visa: disseminar
princípios de sustentabilidade para a formação de
disseminadores do conhecimento, com o propósito de
capacitar os envolvidos, além de delegar poder com
clareza para responsabilizar a equipe para o
gerenciamento dos processos, que incluem
planejamento, alocação de recursos e mensuração de
desempenho para incentivar a ações práticas.
Segundo Oliveira Neto et al. (2009), a metodologia
para Educação Ambiental deve ser disseminada em sete
fases: 1) Apresentar, informar e sensibilizar os
envolvidos; 2) Priorizar a realidade e necessidades mais
urgentes da empresa e de seu ambiente mais próximo;
3) Motivar os envolvidos; 4) Reflexão sobre a educação
ambiental, a fim de eliminar a reatividade; 5)
Diagnosticar os problemas; 6) Agir, a fim de priorizar
os problemas mais urgentes e passíveis de
encaminhamentos; 7) Acompanhar e avaliar a
implementação para melhorias contínuas. Sendo assim,
requer participação, diagnóstico, reflexão e ação dos
envolvidos para desenvolver estudos nos processos para
germinar análises críticas.
Após desenvolver infraestrutura apropriada, com
59
OLIVEIRA NETO et al.
capacitação de funcionários em educação ambiental,
criação de departamento para gestão ambiental e
considerar a P+L no sistema produtivo, é possível
estabelecer a estrutura de PPCPEA. Segundo Azzolini
Elementos da es trutura
1)Objet ivo de desempenho
com Pro dução Mais Li mpa.
2)Projetar as inst alaçõ es
i ndustriais.
3)Cap acidade produtiva.
4)Estratégia de proces so
ambiental.
5) Tecnologia limpa.
6)Terceirização e
verticalização.
7)Planejamento e
desenvolvimento de
pr odutos ambientalment e
corretos.
(2004), a estruturação da produção frente a uma nova
estratégia competitiva depende das decisões
relacionadas ao projeto do sistema de produção. Os
elementos da estrutura são apresentados no Quadro 3.
Conceituação
Nova forma de organizar o trabalho e rede de su pri mento s, a fim de reduzir o uso de recursos e
diminui r a poluição, permitindo conquistar vantagem econômica e ambiental.
Arranj o físico fabri l com máquinas e equipamen tos com tecnologias l impas e redes de operações e
localização geográfica estratégica, a fim de evitar desperdí cio de tempo e combustível para reduzir
o nível de CO² na atmos fera.
A organização precisa cres cer economicament e, mas com Edu cação Ambiental, visando à
sustentabilidade.
Vi sa considerar na estrat égia em operações a (P+L) como rotina do (PPCPEA).
Controles auto mat izados do pro cesso por meio de tecnologia lim pa, que permit em reduzir o
descarte de efluentes ou outros resíduos, bem com o o u so d e matéria prima e energia.
O processo de homol ogação de forn ecedores certificados pela ISO 14001, visando transformar o
caráter linear do sistema industrial em u m si stema cícli co, no qual matérias-primas, energia e
resíduos sejam sempre reuti lizados.
Estab elecer engenharia simultânea, com a presença d e um engenh eiro ambiental, a fim de avaliar
todos os produtos, componentes ou matérias-primas utilizad os, a fim de selecionar categorias de
produt os para i dentificar o de menor impacto ambiental; além d isso, é necessário considerar
aspectos de ecodesign, a fim de identificar e cotar produtos recicláveis, que permitam a
reutil ização e a remanufatura.
Quadro 3 – Elementos da estrutura.
Fonte: Oliveira Neto et al. (2010).
MÉTODO DE PESQUISA
Para a coleta de dados utilizou-se o método de
estudo de caso por meio da observação e participação,
a partir da coleta de dados de natureza qualitativa com
análise quantitativa. Segundo Eisenhardt (1989), o
estudo de caso é uma estratégia de pesquisa focada
em compreender a dinâmica existente em cada cenário.
Estudos de caso normalmente combinam métodos de
coleta de dados, como arquivos, entrevistas,
questionários e observações. As evidências podem ser
qualitativas, quantitativas ou ambas. Segundo Bogdan
e Biklen (1992), a observação participante e a
entrevista semiestruturada são os instrumentos mais
comuns da pesquisa qualitativa e que melhor
representam suas características. Por meio desta, é
possível compreender "a importância da linguagem e
das histórias na vida de uma pessoa como meio para
seu conhecimento e sua compreensão" (SEIDMAN,
1991).
60
Sobre a pesquisa quantitativa, permite-se a
mensuração de opiniões, reações, hábitos e atitudes
em um universo, por meio de uma amostra que o
represente estatisticamente (DENZIN; LINCOLN,
2005; NEVES, 1996; HAYATI; KARAMI; SLEE,
2006). Para a análise quantitativa foi utilizado o método
desenvolvido pelo Instituto Wuppertal, que pode
avaliar as mudanças ambientais associadas à extração
de recursos de seus ecossistemas naturais. Dessa
forma, para suprir com um fluxo de materiais um
sistema, uma quantidade maior de material foi
previamente processada em vários compartimentos
ambientais. Os compartimentos são classificados em:
abiótico, biótico, água e ar. Segundo Odum (1998), o
compartimento biótico consiste no conjunto de todos
os organismos vivos, como plantas e decompositores;
o compartimento abiótico é o conjunto de fatores não
vivos de um ecossistema, mas que influenciam no meio
biótico, e consiste na temperatura, pressão, pluviosidade
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
de relevo, entre outros. A quantidade total de material
de cada compartimento que foi processado para suprir
um dado material é denominada Intensidade de Material.
Para determinar a Intensidade de Material, o fluxo de
entrada de massa (expresso nas unidades
correspondentes) é multiplicado pelo fator MIF (mass
intensity factors), que corresponde à quantidade de
matéria necessária para produzir uma unidade de fluxo
de entrada. Os valores de MIF usados no presente
trabalho estão na Tabela 1.
Tabela 1 – Fatores de Intensidade de Material usados no presente trabalho.
Água potável (L) a
Energia elétrica
industrial (kWh) b
Material abiótico
0,01
Material biótico
2,67
Água
1,3
Ar
0,001
37,9
0,640
Fonte: Dados dos autores.
ESTUDO DE CASO
Nesta seção será apresentado o estudo de caso
desenvolvido por meio de entrevista e observação
participante em cinco fases: (i) buscou-se, de maneira
qualitativa, mostrar os fatores determinantes que
impulsionaram a empresa à criação do projeto,
considerando a sensibilização dos funcionários em
Educação Ambiental imprescindível para a formação de
ecotime, que permitiu posteriormente, sob a liderança
do PCP, estabelecer mudanças incrementais na
infraestrutura e estrutura da produção; (ii) acrescentouse o método quantitativo, a fim de estabelecer análise e
avaliação do cenário produtivo, permitindo estabelecer
diagnóstico e balanço material; (iii) será apresentado a
implementação e resultados do projeto de estruturação
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
da manufatura no sistema produtivo; (iv) medidas de
desempenho e (v) plano de continuidade.
Fatores determinantes que impulsionaram a
criação do projeto
O objetivo principal é evidenciar a implementação
do (PPCPEA) em um estudo de caso caracterizado
por uma Indústria multinacional de Transformação do
ramo químico de produtos de limpeza, no qual
considera a necessidade de educar os funcionários, o
diretor de supply chain e os planejadores da produção
de maneira transversal sob a ótica ambiental. No
Quadro 4 mencionam-se os fatores determinantes que
norteiam a concepção paradigmática do sistema
produtivo da empresa pesquisada.
61
OLIVEIRA NETO et al.
Fatores
determinantes
Direcionadores
Objetivos de
desempenho
Capacitadores
Práticas e
princípios
PEGEM da empresa em estudo
Imagem socioambiental (Marketing verde e ISO 14000) visando à competitividade.
Segundo Contador (2008), algumas empresas estão buscando manter a imagem de empresa confiável, visando à
transparência e maior competitividade.
Produção Mais Limpa.
Centro Nacional de Tecnologias Limpas – CNTL/ Indicador econômico/ Indicador ambiental – Wuppertal/ Ênfase na
metodologia de RH e Capacitador voltado a projetos sustentáveis
a) Infraestrutura para o controle das operações
Desenvolver pessoas com educação ambiental; Conquistar certificação ISO 14000: 2004;
- Planejamento do sistema produtivo “Lean and Green”;
b) Estruturação da estratégia de processo no sistema produtivo
- Objetivo de desempenho – Produção Mais Limpa;
- Pequenas melhorias no layout;
- Reduzir desperdício de água e tempo no processo de limpeza melhorando a capacidade de produção;
- Implementação de tecnologia limpa para reduzir consumo de energia elétrica;
- Homologação de fornecedores, considerando a sustentabilidade como critério ganhador de pedidos;
- Desenvolvimento de produtos ecologicamente corretos.
Quadro 4 – Fatores determinantes da concepção paradigmática no sistema produtivo da empresa
pesquisada.
Fonte: Dados dos autores.
Sensibilização e disseminação da educação
ambiental de maneira transversal e formação do
ecotime
A Educação Ambiental foi disseminada para os
funcionários do setor de produção da empresa
química pesquisada, visando à conscientização sobre
práticas de sustentabilidade no sistema produtivo. A
organização considerou de suma importância
capacitar o diretor de supply chain, os dois gestores
de planejamento e controle da produção e os 180
funcionários operacionais, sendo 90 do turno do dia
e 90 do turno da noite.
Para isso a empresa decidiu contratar dois
professores/consultores do Serviço Nacional de
Atividade Industrial – SENAI para gerenciar o processo
e capacitar os envolvidos. É importante salientar que
foi aplicada a metodologia para Educação Ambiental
fundamentada em Oliveira Neto et al. (2009). O
direcionamento estratégico, que formou o escopo do
projeto exigido pela empresa química, consiste em: (i)
Princípios, a formação de disseminadores sobre
62
práticas ambientais no sistema produtivo; (ii) Propósito,
o treinamento e capacitação; (iii) Poder para
sensibilização dos envolvidos para delegar e
responsabilizá-los; e (iv) Processos e prática, a fim
ensinar na teoria e na prática analisar os processos da
manufatura por meio da ferramenta de produção mais
limpa e metodologia wuppertall para avaliar a redução
do impacto ambiental resultantes das ações realizadas.
Para atender à necessidade da empresa química,
os professores/consultores organizaram a sistemática
das aulas, considerando segundas e quartas. Por turno
ministravam-se dois períodos: pela manhã, das 8h às
12h, para 45 operários, e à tarde, das 13h às 17h,
mais 45 operários, o diretor de supply chain e os dois
planejadores. No segundo turno, uma turma com 45
operários das 18h às 22h e outro com mais 45
operários das 23h às 3h. Também foi desenvolvido
um cronograma das ações a serem seguidas em relação
ao tempo. Na Figura 2 mostram-se no vértice y as
sete atividades e, no eixo x, o período em meses para
cada atividade, sumarizando oito meses.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
7 - Medidas de desempenho para melhorias contínuas.
6 - Desenvolvimento de planos de ação com priorização.
5 - Formação de ecotimes para diagnosticar os problemas.
4 - Reflexão sobre educação ambiental.
3 - Motivar os envolvidos.
2 - Estabelecer prioridades/ escopo.
1 - Apresentar, sensibilizar o pessoal.
1
2
3
4
5
Meses
6
7
8
Figura 2 - Cronograma para implementação de educação ambiental no sistema produtivo.
Fonte: Dados dos autores.
No Quadro 5 apresenta-se o cont eúdo
programático (SENAI, 2003) ministrado nos
primeiros quatro meses, visando sensibilizar o pessoal
à Educação Ambiental sobre práticas de produção
mais limpa, com carga horária de 64 horas. O tema
Educação Ambiental foi discutido de maneira
transversal em todos os dias de aprendizagem aos
colaboradores e gestores "cujas atividades e
decisões geram repercussões significativas sobre o
meio ambiente" (BARBIERI & SILVA, 2011),
visando motivar o envolvimento e ação do ser
humano na resolução de problemas ambientais
(INTERGOVERNMENTAL CONFERENCE ON
ENVIRONMENTAL EDUCATION, 1977).
1. Evolução das questões ambientais e mudança incremental no sis tema produtivo
1.1 O qu e é produção mais l impa
1.2 Produção mais li mpa X Fi m-de-tubo
2. Benefícios da Produção Mais Limpa
2.1 Benefícios Ambientais – eli minação/ redução de resíduos; produção sem polui ção; eficiên cia energética; saúde e segurança no trabal ho;
pro dut os ambientalm ente adequados e embalagens ambientalmente adequadas.
2.2 Benefícios econômicos
3. Implementação da Produção Mais Limpa
3.1 Etapa 1 – Formação do ecotime
3.2 Etapa 2 – Estudo do fluxograma do processo; realização do diagnóstico ambiental e de processo e seleção do foco de aval iação.
3.3 Etapa 3 – Elaboração do balanço mat erial e estabelecimen to de indi cadores; identificação das causas da geração de resíduos e
identificação de opções de produção mais li mpa
3.4 Etapa 4 – Avali ação t écni ca, ambiental e econômica e seleção de oportunidad es viáveis
3.5 Etapa 5 – Pl ano de implementação e monitoramento e plano de conti nuidade.
Quadro 5 – Conteúdo programático das aulas.
Fonte: Centro Nacional de Tecnologias Limpas (SENAI, 2003).
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
63
OLIVEIRA NETO et al.
No quarto mês avaliou-se a aplicação dos alunos no
curso e selecionaram-se os funcionários com melhor
desempenho para compor o ecotime, que se tornaram
responsáveis em diagnosticar os problemas ambientais
no sistema produtivo, desenvolver projetos sustentáveis
e estabelecer alinhamento e monitoramento para geração
de ideias entre os envolvidos nesses projetos. A meta
estabelecida foi de 85%, sendo 30% da nota de
participação e 70% por meio de teste com 20 questões.
A Figura 3 mostra que apenas 33 funcionários atingiram
a meta, sendo 17 funcionários do turno dia, entre estes
o diretor de supply chain e outro o planejador da
produção, e 16 funcionários da noite, considerando um
planejador da produção.
Figura 3 – Primeira avaliação de desempenho dos funcionários na aprendizagem sobre educação ambiental.
Fonte: Dados dos autores.
Entre o quarto, quinto e sexto meses de trabalho,
foi desenvolvido pelo ecotime o plano de ação com
dez prioridades "PCPEA" (Quadro 6). É importante
salientar que os dois planejadores de produção foram
os principais agentes do ecotime para desenvolver o
detalhamento do plano de ação, devido à visão holística
do processo. Segundo os planejadores, no momento
da sensibilização e disseminação, eles já refletiram nos
pontos de melhorias ambientais no sistema produtivo,
Priorização
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
por conhecerem o processo. Dessa forma, considerase a temática do modelo "PCP com Educação
Ambiental" como inovação na literatura, aplicado após
a publicação do modelo em 2010. Também é
importante ressaltar que a P+L está intrínseca em todo
o processo, como consta do modelo, mas que a
implementação da P+L só foi possível após a
sensibilização e disseminação da Educação Ambiental
de maneira transversal entre os envolvidos.
Atividades
Retransmitir os conceitos de produção mais limpa e educação ambiental para150 reprovados e entrantes.
Constatações das necessidades de infraestrutura para o projeto com apoio da alta administração.
Constatações dos aspectos necessários para estruturação do projeto no que tange a estratégia de processo das etapas de
implementação da produção mais limpa.
Análise do cenário produtivo para implementação do projeto Minimization (Sequenciamento de Cargas).
Desenvolver análises no sistema produtivo e planejamento e controle da produção a fim de desenvolver diagnóstico
ambiental.
Elaboração do balanço de material para identificação das causas da geração de resíduos.
Implementação do projeto de estruturação do sistema produtivo Minimization (Sequenciamento de Cargas.
Resultados - Avaliação das vantagens econômicas e ambientais.
Medidas de desempenho para melhorias contínuas.
Estender os conceitos de produção mais limpa e educação ambiental para a rede de suprimentos.
Quadro 6 – Plano de ação com dez prioridades "PCPEA".
Fonte: Dados dos autores.
64
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Sendo assim, o primeiro desafio para o ecotime
será disseminar o conteúdo para os funcionários
reprovados e os entrantes. Depois serão analisadas
as constatações de necessidades de infraestrutura e
estrutura para o desenvolvimento do projeto; em
seguida, visa-se estabelecer análise no sistema
produtivo, com o objetivo de elaborar o balanço
material para identificar as causas da geração de
resíduos antes da implementação do projeto. Também
serão avaliados os resultados no que tange às
vantagens econômicas e ambientais e, por fim,
pretende-se inserir medidas de desempenho, visando
a melhorias contínuas, além de estender a Educação
Ambiental para todos os funcionários da rede de
suprimentos, incluindo fornecedores e clientes nos
próximos anos. Na Figura 4 mostram-se melhorias
nos resultados em relação aos conceitos de Educação
Ambiental e produção mais limpa quando foram
retransmitidos pelo pessoal do ecotime, em que 80%
tiraram nota acima de 85. Segundo o entrevistado, a
melhoria nos resultados ocorreu por motivo de
alinhamento na linguagem.
Figura 4 – Segunda avaliação de desempenho dos funcionários na aprendizagem sobre Educação
Ambiental.
Fonte: Dados dos autores.
Após conquistar mais adeptos, desenvolveu-se a
formalização junto à alta administração das
necessidades de infraestrutura para a implementação
da produção mais limpa no sistema produtivo, assunto
que será tratado na próxima seção.
Infraestrutura para o controle das operações
Os aspectos de infraestrutura (Quadro 7) foram
REVISTA UNIARA,v.15, n.1, julho 2012
desenvolvidos com base na sensibilização e
disseminação da Educação Ambiental para
flexibilizar as pessoas para o processo de mudança,
para: desenvolver pessoas com E ducação
Ambiental, a implementação da gestão ambiental
com certificação ISO 14001 e o planejamento do
setor produtivo frente ao PEGEM – Manufatura
Limpa.
65
OLIVEIRA NETO et al.
Aspectos de infraestrutura
Desenvolver pessoas com
educação ambiental.
- Assunto discutido de
maneira transversal na
sensibilização e
disseminação (3.2.1) e na
estruturação da P+L (3.4.1).
Implementação da gestão
ambiental com
certificação pela ISO
14000:2004.
- A alta administração
definiu a política ambiental.
Planejamento do setor
produtivo frente ao atual
PEGEM – Manufatura
Limpa.
- Redução da poluição e ser
ecoeficiente;
- Mercado socioambiental
Constatações da observação participante
Capacitação do ecotime por meio de abordagem colaborativa, não somente treinar o pessoal de
produção para atingir as metas de produção (produção dia, setup, capacidade ociosa,
capacidade protetora) e treiná-los para (P+L). Para isso estruturou a liderança e poder para o
controle do processo, depois diagnosticou a cultura organizacional a fim de educá-los sobre
educação ambiental, e buscou-se também formar multiplicadores para a disseminação do
conhecimento.
a) seja apropriada à natureza, escala e impactos ambientais de suas atividades, produtos e
serviços; b) incluindo um comprometimento com a melhoria contínua e com a prevenção de
poluição; c) incluindo um comprometimento em atender aos requisitos legais aplicáveis e
outros requisitos subscritos pela organização que se relacionem a seus aspectos ambientais; d)
fornecer uma estrutura para o estabelecimento e análise crítica dos objetivos e metas
ambientais; e) sendo documentada, implementada e mantida; f) sendo comunicada a todos que
trabalhem na organização ou que atuem em seu nome; g) estando disponível para o público. A
empresa química estabeleceu um cronograma para o cumprimento das atividades durante um
ano até conquistar a certificação ISO 14001:2004, as atividades incluem os aspectos de
infraestrutura e estruturais.
Implementação do MRP ambiental a fim de gerar relatórios que estabeleçam a quantidade de
resíduos esperada durante o processo de produção e quando ocorrerá para a destinação correta.
“PPCP Lean and Green”, que permitiu rever os processos a fim de reduzir os tempos, os
custos, racionalizar o uso de matéria prima por meio da reciclagem ou da reutilização. Outra
característica importante, é planejar produtos ambientais e analisar o ciclo de vida, também
buscando otimizar e adequar o transporte a fim de reduzir a emissão de CO2 e outros gases
venosos ao ecossistema (US EPA, 2000).
Quadro 7 – Constatações das necessidades de infraestrutura para o projeto com apoio da alta
administração.
Fonte: Dados dos autores.
Projeto de estruturação do sistema produtivo
Neste tópico é apresentado o projeto de
estruturação do sistema produtivo na empresa química
(Quadro 8), que considera a Educação Ambiental de
maneira transversal no cerne do PCP, com o objetivo
de estabelecer as etapas de implementação da
66
estratégia de processo da produção mais limpa, que
visa: a) estudar o fluxograma do processo produtivo;
b) elaborar balanço material; c) identificar opções de
(P+L); d) estabelecer avaliação técnica econômica e
ambiental; e) implementar o plano e monitoramento; e
f) desenvolver plano de continuidade.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Aspectos para estruturação
do projeto
4.1 Desenvolver análises no
sistema produtivo e
planejamento e controle da
produção a fim de
desenvolver diagnóstico
ambiental.
4.2 Elaboração do balanço
de material para
identificação das causas da
geração de resíduos.
4.3 Implementação do
projeto na estrutura do
sistema produtivo
Minimization
(Sequenciamento de
Cargas).
5 Resultados - Avaliação das
vantagens econômicas e
ambientais.
5.3 Medidas de desempenho
para melhorias contínuas.
5.4 Estender os conceitos de
produção mais limpa e
educação ambiental para a
Constatações da observação participante
Desenvolver estudo no processo produtivo com o apoio do ecotime a fim de levantar o
quantitativo de matéria-prima, água e energia, permitindo avaliar a geração de resíduos
durante e após o processamento com o objetivo da formação de uma estratégia de
minimização da geração de resíduos, efluentes e emissões, elucidando parâmetros
econômicos e ambientais existentes no sistema produtivo. Para a avaliação é preciso
conhecer regulamentos legais, a toxicidade dos resíduos, e os custos envolvidos.
1) Matérias-Primas - uso de matérias-primas com possibilidade de reutilização, reciclagem e
remanufatura comparada as compras tradicionais;
2) Causas relacionadas aos resíduos - inexistência de separação de resíduos,
desconsideração pelo potencial de reutilização de determinados resíduos, não há recuperação
de energia nos resíduos dos produtos e emissões e manuseio inadequado;
3) Know how/processo - má utilização dos parâmetros de processo e uso de tecnologias de
processo ultrapassadas.
Identificação das opções de Produção Mais Limpa: 1) Modificação do processo envolve
estratégias de modificação no sistema de produção; 2) As boas práticas operacionais adoção de medidas de procedimento, técnicas para minimizar os resíduos, efluentes e
emissões; 3) Substituição de matérias-primas e materiais auxiliares e 4) Reciclagem Interna
estão relacionadas a todos os processos de recuperação de matérias-primas e materiais
auxiliares.
Avaliação técnica, econômica e ambiental: 1) Na avaliação técnica o impacto da medida
proposta sobre o processo, produtividade, segurança, etc., 2) Na avaliação ambiental a
quantidade de resíduos, efluentes e emissões que será reduzida; 3) Na avaliação econômica
os investimentos necessários e as possíveis vantagens.
Plano de implementação e monitoramento: 1) Implementação das especificações técnicas
detalhadas e 2) Monitoramento das medidas a serem implantadas.
Plano de continuidade: Após o Programa de Produção mais Limpa no processo ser
considerado como implementado é importante não somente avaliar os resultados obtidos,
mas, sobretudo, criar condições para que o programa tenha sua continuidade assegurada
Quadro 8 – Constatações dos aspectos necessários para estruturação do projeto.
Fonte: Dados dos autores.
Fundamentado nas constatações das necessidades
de infraestrutura para o projeto, os dois planejadores
da produção, sensibilizados à Educação Ambiental,
estabeleceram os aspectos necessários para a
estruturação do projeto, que originou o planejamento
das etapas de implementação da estratégia de processo
da produção mais limpa. Na próxima seção apresentarse-á o projeto de (P+L) "Lean and Green" para
minimização de resíduos e melhorias no sequenciamento
de cargas desenvolvido pelo ecotime e, principalmente,
pelos planejadores da produção com Educação
Ambiental em três fases: (i) no início do projeto os
planejadores da produção com Educação Ambiental
estabeleceram análises no sistema produtivo e nas
atividades do planejamento e controle da produção, a
fim de desenvolver diagnóstico ambiental; (ii)
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
elaboraram o balanço material para identificação das
causas da geração de resíduos; e (iii) implementaram
o projeto de estruturação no sistema produtivo
Minimization (Sequenciamento de Cargas).
Análise do cenário produtivo para implementação
do projeto Minimization (Sequenciamento de
Cargas)
O ecotime considera de suma importância a
implementação da P+L no cerne das ações de PCP e
para isso pediu apoio ao centro técnico e a qualidade
assegurada visando aumentar a produtividade por
equipamentos de produção; reduzir os tempos gastos
para a produção de cada batelada de produto e reduzir
os impactos ambientais gerados durante o processo
produtivo. Foi de suma relevância capacitar os
67
OLIVEIRA NETO et al.
planejadores da produção em educação ambiental,
que nomearam o setor como Planejamento e Controle
da Produção com Educação Ambiental.
Desenvolver análises no sistema produtivo e
PCP para diagnóstico
Para cada batelada de produção o consumo de
tempo por dia varia de 1 a 5 horas, envolvendo as
seguintes etapas, conforme mostra a Figura 5: 1)
Separação – separação das matérias-primas (MP)
com ordem de trabalho (OT) impressa; 2) Adição
de matérias primas – suprimento de matéria-prima
na parte superior do tanque; 3) Processo de agitação
– processo de homogeneização das matérias-primas;
4) Análise da qualidade do produto acabado – o
departamento de qualidade assegurada testa a
qualidade do produto quanto a suas especificações
de uso e autoriza a transferência do produto acabado
Separação
Adição de
matériaprima
Processo de agitação
(16 tanques)
para o processo de preenchimento das embalagens,
no caso de produto não autorizado deve-se recuperar
o produto final até que atenda às especificações
quant o ao uso; 5) Envase – subprocesso
agrupamento dos frascos e embalagens; e 6) Limpeza
– consiste em enxaguar o tanque de produção com
objetivo de remover o resíduo do produto fabricado,
impregnado nas paredes do tanque. A água na forma
de resíduo circula através do tanque, bombas e
tubulações por onde o produto havia circulado e, ao
final, destina-se para a estação de tratamento de
efluentes. O processo era realizado até que se
removesse completamente o resíduo, de forma que
não ocorra contaminação cruzada do produto
posterior por corantes, perfumes, tenso-ativos e/ou
matérias-primas incompatíveis. Após o processo de
limpeza, o equipamento de produção fica disponível
para nova batelada.
Análise
da qualidade
sim
Envase
Limpeza
não
Estação de Tratamento
de Efluentes
Figura 5 – Processo de fabricação de produtos químicos à limpeza.
Fonte: Dados dos autores.
O tempo médio gasto no processo de limpeza era
de 20 minutos, e havia também um consumo
considerável de tempo nas etapas do próprio processo
produtivo em cada equipamento de produção.
Produzia-se, em média, até cinco bateladas por dia.
Isso implicava um gasto médio de até 1 hora e 40
minutos por dia, apenas com o processo de limpeza.
Como não se conheciam os tempos gastos em
cada etapa do processo, não havia planejamento sobre
o que cada equipamento poderia produzir em um
determinado dia, ocasionando, às vezes, a ociosidade
do equipamento. Com isso, o equipamento permanecia
à disposição, mas não havia bateladas programadas
68
para ele para o restante do dia.
Elaboração da análise sobre o balanço de
material para identificação das causas da geração
de resíduos para a implementação da produção
mais limpa
A empresa consome mensalmente 3.197 m³ de
água, sendo 2.333 m³ para a fabricação do produto e
633 m³ para as lavagens de tanques agitadores,
tubulações e envase. O Quadro 9 detalha o consumo
de água por dia e por mês do subprocesso de limpeza,
considerando o tempo de 1h40 por dia e 43h20 no
mês, considerando o mês com 26 dias úteis.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Etapas da limpeza
Tubulações
Envase
Lavagem dos tanques
Totais
Consumo de água por dia
0,2 m³ por lavagem x 5 bateladas = 1 m³ por dia
0,5 m³ por lavagem x 5 bateladas = 2,5 m³ por dia
542 m³ / 26 = 20,85 m³ / 80 = 0,26 m³ por tanque X
80 = 20,85 m³
24,35 m³
Consumo de água por mês
26 m³
65 m³
542 m³
633 m³
Quadro 9 – Consumo de água dia e mês para as lavagens antes da implementação do projeto.
Fonte: Dados dos autores.
O componente água representa 2.333 m³ por mês
na fabricação de produtos, por dia 89,73 m³ em 8
horas de trabalho. Outro fator relevante é o consumo
de energia: o consumo médio é apresentado no
Consumo médio mensal de Energia
Elétrica para 130 bateladas
5125,375 kWh
Cada Batelada
consome
39,43 kWh
Quadro 10. A empresa de produtos químicos
consome em sua fabricação 5.125,375 kWh ou
184,59 GJ de energia elétrica, com um custo de
R$ 1.335,36.
Custo em R$ mensal de
Energia Elétrica
R$ 1.335,36
Custo em R$ por Batelada de
Energia Elétrica
R$ 10,27
Quadro 10 – Consumo de energia elétrica mensal e por batelada na fabricação de 2.799,6 m³ de produtos.
Fonte: Dados dos autores.
O custo hora/homem da empresa química é de
R$ 200,52 por hora de produção. As perdas devido à
hora improdutiva na limpeza são de aproximadamente
1h40 por dia e representa o total de R$ 334,87 por
dia; mensalmente, R$ 8.706,58.
Em terceiro, foram desenvolvidas medidas de
desempenho, visando a melhorias contínuas e, por fim,
mostra-se o plano de continuidade que visa estender os
conceitos de P+L e Educação Ambiental para a rede
de suprimentos.
Implementação e resultados do projeto de
estruturação no sistema produtivo
O projeto foi implantado em todos os equipamentos
de produção entre janeiro e maio de 2009, num total de
16 tanques de produção (agitadores) e na máquina de
envase. Dessa forma, primeiro estabeleceram-se
mudanças incrementais no sistema produtivo para tornar
a manufatura limpa. Para isso, foram implantados: (i)
tecnologias limpas no que tange a motores para reduzir
30% de energia elétrica e equipamentos para controles
numéricos e sistemas automáticos de identificação, (ii)
mudanças no plano de sequenciamento, e (iii) mudanças
no layout da manufatura. Em segundo, foram avaliadas
as vantagens econômicas e ambientais da implementação
do projeto e elucidados os ganhos lean no que tange à
otimização da capacidade produtiva, que resultou em
aumento da produção, redução de custos de produção,
redução no custo por litro produzido e aumento do lucro.
Mudanças incrementais no sistema produtivo
para concepção da Manufatura Limpa
Nos agitadores e no envase foram trocados os
motores trifásicos por motores trifásicos com selo
PROCEL com inversores de frequência de economia
de energia. O selo Procel tem por objetivo indicar os
produtos que apresentam os melhores níveis de
eficiência energética do mercado, proporcionando
assim economia de energia elétrica. Os inversores de
frequência são equipamentos de baixo custo para o
controle da velocidade de motores de indução
trifásicos, o que gera uma economia de energia sem
prejudicar a qualidade final do sistema. A grande
vantagem de utilização de inversores é que, além de
gerar economia de 30% de energia elétrica, também
reduz o custo de instalação do sistema.
Também foram instaladas máquinas de controle
numérico e sistemas automáticos de identificação nos
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
69
OLIVEIRA NETO et al.
tanques agitadores e na máquina de envase, a fim de
mensurar a quantidade de matéria-prima e energia
elétrica gastos no processo produtivo. Essas
tecnologias limpas permitiram desenvolver análise
crítica sobre possíveis melhorias na produção
ecoeficiente, visando reduzir o consumo de energia.
O primeiro passo foi observar o tempo gasto em
todas as etapas do processo de cada batelada,
conforme relatado anteriormente em média de 1 a 5
Etapas da
limpeza
Tubulações
Envase
Lavagem tanques
Consumo total
H²0
Tempo gasto
por batelada, que corresponde a 6h20min. de produção
e 1h40min. de lavagem. Então se buscou,
posteriormente, identificar as possibilidades de melhoria
sem que isso viesse a comprometer a qualidade do
produto. O projeto objetivou, conforme o Quadro 11,
reduzir o tempo ocioso gasto com a limpeza, que
passou a ser de 20 minutos por dia e 8h40 no mês, e o
consumo de água na limpeza, que passou a ser de 4,86
m³ por dia e 127,20 m³ por mês.
Consumo de água antes
da implementação por
dia
1 m³ por dia
2,5 m³ por dia
20,85 m³ por dia
Consumo de água
depois da
implementação por dia
0,2 m³ por dia
0,5 m³ por dia
0,26 m³ x 16 = 4,16 m³
Consumo de água antes
da implementação por
Mês
26 m³
65 m³
542 m³
Consumo de água depois
da implementação por
Mês
0,2 m³ x 26 = 5,2 m³
0,5 m³ x 26 = 13 m³
4,16 m³ x 26 = 109 m³
24,85 m³
4,86 m³
633 m³
127,2 m³
1:40 h
0:20 h
43,20 h
8: 40 h
Quadro 11 – Comparativo do tempo gasto e do consumo e água.
Fonte: Dados dos autores.
Essa economia ocorreu devido a melhorias no
sequenciamento de produção e pequenas mudanças
no layout da manufatura, de forma que os primeiros
produtos fabricados não afetariam a qualidade dos
próximos. Por exemplo: primeiro, são fabricados os
produtos de aparência límpida ou sem cheiro, depois
os que levam corantes ou perfumes em sua formulação.
Esse sequenciamento foi estabelecido primeiro para
todos os produtos ácidos, sendo seguido pelos
cáusticos, lubrificantes e detergentes. Isso também
possibilitou a eliminação do processo de limpeza entre
um produto e outro, obtendo-se considerável economia
no uso da água. Portanto, a economia de água utilizada
para a lavagem dos tanques, tubulações e envase foi
de 505 m³ por mês (633 m³ mês – 127,2 m³ mês) e de
tempo foi de 43h20 para 8h40 por mês. Com a
economia de água e de tempo, o PCP passou a
programar seis bateladas por dia, aumentando a
produtividade, totalizando 156 bateladas no mês, 26
bateladas a mais do que antes da implementação do
projeto. Cada tanque de produção tem capacidade
de água de 17,95 m³.
70
É importante ressaltar que o consumo de energia
elétrica deveria ter aumentado de 5.125,375 kWh para
6.150,45 kWh, considerando cada batelada medida
no campo com um gasto de 39,43 kWh; porém, com
a instalação das bombas trifásicas com selo Procel,
com os inversores de energia e com os equipamentos
de controle numérico, foi possível reduzir o consumo
de energia para 4.305,315 kWh, em que cada batelada
passou a ter um gasto de 27,60 kWh. Assim o PCP
passou a utilizar melhor a sua capacidade produtiva.
Outro ponto que merece destaque é a economia de
água da natureza, que equivale a 269,60 m³, R$2,68
por m³, totalizando R$ 722,53.
Vantagens econômicas e ambientais na
implementação do projeto
Nesta seção são apresentadas as vantagens
econômicas e ambientais que a empresa química
conquistou ao considerar o Planejamento da Produção
com Educação Ambiental. Um aspecto relevante é que,
o setor de PCP, após inserir a Educação Ambiental de
maneira transversal, mudou o enfoque concomitantemente
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
ao crescimento econômico e ao ganho ambiental nas
ações de planejamento, programação e controle da
produção, possibilitando considerar a produção mais
limpa como novo objetivo de desempenho. Para isso,
inseriu algumas ferramentas de gestão fundamentada
no Centro Nacional de Tecnologias Limpas – CNTL,
possibilitando elencar indicadores de desempenho para
o controle do processo, tais como: (i) indicador
econômico; (ii) indicador ambiental – Wuppertal; (iii)
ênfase na metodologia de RH; e (iv) quantidade de
projetos sustentáveis sugeridos. Dessa forma, primeiro
serão apresentadas as vantagens econômicas e
ambientais "Lean and Green", depois, a
implementação de indicadores de desempenho para o
monitoramento do projeto e, por fim, pretende-se
Implementação do
projeto
Consumo
de água
em m³ e
em R$
Produto
químico
Soluto+
Solúvel
Densidade
1,2
Custo em
R$ da
água na
limpeza
dos
tanques
Consumo
de Energia
elétrica em
kWh e em
R$
Antes
3197 m³
R$
8.567,96
2799,6 m³
R$
1.759,74
5.125,375
kWh
R$ 3.333,30
3360,24
m³
R$ 340,89
4305,315
kWh
R$ 2.799,97
Redução
de custo
R$ 722,53
Redução
nos custos
em R$
533,33 e
redução no
consumo de
EE em
820,06
kWh
Depois
Lean and
green
2927,40
m³
R$
7.845,43
Redução
nos custos
(R$
722,53) e
redução no
consumo
de água
em 269,6
m³
Aumento
de
Produção
em 17%
estender os conceitos de produção mais limpa e
Educação Ambiental para a rede de suprimentos com
o foco no P&D de produtos ecologicamente corretos.
Vantagens "Lean and Green" e vantagens
econômicas da implementação do projeto
Com o aumento de uma batelada a mais por dia,
156 bateladas passaram a ser produzidas no mês,
ocasionando um aumento de 17 pontos percentuais
de produção, em consequência, conforme o Quadro
12, da redução nos custos em 18% de hora/homem,
que refletiu diretamente nos custos de produção. Sobre
os custos de produção é possível perceber claramente
que o projeto reduziu os gastos, depois de
implementado, em R$ 5.977,82.
Custo hora homem
(Total de 30) R$
1100,00 + encargos
Custo de
produção
por batelada
1100 X 30: 164,57
(tempo de
produção) = R$
200,52 CHH
1100 X 30: 199,33
(tempo de
produção) = R$
165,55 CHH
R$
7.154.533,30:
130 = R$
55.034,00
R$
7.652.763,90:
156 = R$
49.056,18
Redução do custo
hora homem em
18%
Redução do
custo em
R$ 5.977,82
Tempo de
produção
Tempo de
lavar os
tanques
130
bateladas
164:34 h
43:20 h
156
bateladas
199:20 h
8:40 h
Aumento
de
capacidade
produtiva
34: 77 h e
mais 26
bateladas
Redução
do tempo
em 34:30 h
de
ociosidade
Quadro 12 – Vantagens "Lean and Green" mensais na implementação do projeto
Fonte: Dados dos autores.
No Quadro 13 é possível verificar que, com o
aumento da produção em 17%, consecutivamente
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
reduziu o custo do produto por litro produzido de
R$ 2,55 para R$ 2,28.
71
OLIVEIRA NETO et al.
Antes – Mensalmente
Mo direta – 30 (func.)x R$ 1100,00 + 80% (salário + encargos
sociais) = R$ 59.400,00
Mo indireta – R$ 12.000,00 (gerente) + R$ 5.000,00 (supervisor)
+ R$ 3200,00 (encarregado) + R$ 8.600,00 (4 Ass. ADM) = R$
28.800,00
Matéria Prima – R$ 8.567,96 (água) + R$ 2.491.432,10 (soluto)
+ R$ 3.333,30 (Energia Elétrica) = R$ 2.503.333,30.
Transporte – R$ 1.560.000,00
Custo de Armazenagem – R$ 2.000.000,00
Depreciação de máquinas – R$ 3.000,00
Equipamentos em comodato – R$ 1.000.000,00
Somatório (Custo de produção) = R$ 7.154.533,30
Produção = 2.799.600 litros
Custo do produto = R$ 2,55
Depois - Mensalmente
Mo direta = R$ 59.400,00
Mo indireta = R$ 28.800,00
Matéria Prima = R$ 7.845,43 (água) + R$ 2.989.718,50 (soluto) + R$
2.799,97 (Energia Elétrica) = R$ 3.000.363,90
Transporte – R$ 1.560.000,00
Custo de Armazenagem – R$ 2.000.000,00
Depreciação de máquinas – R$ 3.000,00
Equipamentos em comodato – R$ 1.000.000,00
Somatório (Custo de produção) = R$ 7.651.563,90
Produção = 3.360.240 litros
Custo do produto = R$ 2,28
Quadro 13 – Comparativo dos custos por litro do produto.
Fonte: Dados dos autores.
Com a implementação do projeto foi possível
concluir (Quadro 14) que houve uma redução no custo
do produto em R$ 0,27 por litro; por questões de
mercado o preço foi mantido, assim a empresa passou
Implementação do
projeto
Antes
Depois
a ter um ganho de 22%, além do aumento da
capacidade de produção em 17%. Somando-se,
financeiramente, ocorreu um aumento de R$
5.966.507,00.
Custo do litro
Faturamento por litro
Faturamento mensal
R$ 7.154.533,30: 2.799.600 litros =
R$ 2,55
R$ 7.651.563,90: 3.360.240 litros =
R$ 2,28
R$ 2,55 + 80% = R$ 4,59
2.799.600 litros x R$ 4,59 = R$
12.850.164,00
3.360.240 litros x R$ 4,59 + 22% = R$
18.816.671,00
Aumento dos ganhos financeiros em
R$ 5.966.507,00
R$ 2,28 + 102% = R$
4,59
Mantém se o preço do
mercado aumenta os
ganhos em 22%
Quadro 14 – Redução no custo do produto e vantagem econômica.
Fonte: Dados dos autores.
Vantagens ambientais
Neste tópico são apresentadas as vantagens
ambientais. São considerados como materiais todos
os produtos que não são dispensados no meio
ambiente de maneira negligente, incluindo a economia
de água e de energia elétrica. Por meio dessa ação
o impacto ambiental foi reduzido. A empresa
informou o total de Massa em Material (MM) por
mês que foi economizado: 269.600 litros de água e
820,06 kWh por mês. Para determinar a Intensidade
de Material, o fluxo de entrada de massa (expresso
nas unidades correspondentes) é multiplicado pelo
72
fat or MIF (mass i ntensit y f actors), que
corresponde à quantidade de matéria necessária
para produzir uma unidade de fluxo de entrada. Os
valores de MIF usados no presente trabalho estão
na Tabela 1. Por exemplo: MM * MIF.
A Tabela 2 mostra a representatividade da
economia de 4.885,56 de materiais no compartimento
abiótico, isto é, contribui com a sustentabilidade no
que tange ao aquecimento global, o desgaste da
camada de ozônio, a pressão atmosférica, etc. Além
disso, deixa de poluir a água com 381560,27 Kg e o
ar com 794,44 Kg.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
Tabela 2 – Vantagens ambientais conquistados na implementação do projeto.
Água potável (L) a
Energia elétrica
industrial (kWh)b
Total
Fatores de Intensidade de Material
Material abiótico
Material biótico
2696
2189,56
4885,56
Água
350480
31080,27
Ar
269.60
524,84
381560,27
MTC
794,44
387240,27
Fonte: Dados dos autores.
Medidas de desempenho para melhorias
contínuas
Entre o sétimo e o oitavo meses, o ecotime elencou
os indicadores de desempenho para o controle do
Indicadores
(i) Ênfase na metodologia de RH
- Avaliação do desempenho de
aprendizagem. (Quantitativo).
- Reforço do direcionamento
estratégico
no
processo
de
sensibilização de educação ambiental.
(Qualitativo).
- Projeção de estender a educação
ambiental para a rede de suprimentos.
(Qualitativo e Quantitativo).
(ii) Indicadores econômicos.
- estudo de tempos e métodos dos
processos. (Qualitativo).
- redução de custo hora homem.
(Quantitativo).
aumento
de
produção.
(Quantitativo).
- redução de custos de produção.
(Quantitativo).
- redução no custo do produto.
(Quantitativo).
(iii) Indicadores ambientais –
Intensidade de material – MIF.
(Quantitativo)
(iv)
Projetos
sustentáveis.
(Quantitativo).
processo (Quadro 15), que são: (i) ênfase na
metodologia de RH; (ii) indicador econômico; (iii)
indicador ambiental – Wuppertal; e (iv) quantidade de
projetos sustentáveis sugeridos.
Objetivo/ Meta
Visa sensibilizar e disseminar a educação ambiental para funcionários
entrantes.
Mínimo 85% na nota, sendo 30% pela participação das aulas e 70% a nota do
teste com vinte questões.
- Princípios – formação de disseminadores sobre práticas ambientais no sistema
produtivo;
- Propósito – treinamento e capacitação do diretor de supply chain, dois
planejadores e os 180 funcionários operacionais;
- Poder – sensibilização dos envolvidos para delegar e responsabilizá-los;
- Processos e prática – ensinar na teoria e na prática analisar os processos da
manufatura por meio da ferramenta de produção mais limpa e metodologia
wuppertall para avaliar a redução do impacto ambiental resultantes das ações
realizadas.
Objetiva capacitar as camadas de fornecimento e os clientes sobre o P&D de
produto ecologicamente correto. Pretende-se avaliar o desempenho da
aprendizagem da mesma maneira que avalia os funcionários.
Visa avaliar as vantagens econômicas.
- estudar a rotina das operações a fim de conhecer os tempos e os processos.
- (quantidade produzida/hora de trabalho) – Quanto maior a produção em dada
hora menor é o custo hora homem.
- estudar possibilidades para aumentar a quantidade produzida.
- Analisar possibilidades de redução: custo de água + custo de energia + custo
mão de obra + custo de componentes químicos = custo de produção
- Em detrimento da redução do custo de produção é possível reduzir o custo do
produto.
Visa avaliar os ganhos ambientais em detrimento ao reuso, reciclagem,
remanufatura.
Visa avaliar a quantidade de projetos sustentáveis sugeridos e aceitos por
trimestre.
Quadro 15 – Indicadores de desempenho para o controle do processo visando melhorias.
Fonte: Dados dos autores.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
73
OLIVEIRA NETO et al.
Estender os conceitos de P+L e educação
ambiental para a rede de suprimentos
A empresa química tende a estender os conceitos
de produção mais limpa e Educação Ambiental para a
rede de suprimentos nos próximos anos. Para isso, irá
planejar e desenvolver produtos ecologicamente
corretos, com o objetivo de verificar o ciclo de vida
dos produtos, a fim de verificar a possibilidade de
encontrar componentes substitutos que tenha menor
impacto ambiental. Um aspecto relevante da análise
do ciclo de vida é analisar as fontes de fornecimento,
visando à homologação de fornecedores com
certificação da qualidade ISO 14001:2004, que inclui
a avaliação in locus sobre: reciclagem, reuso,
remanufatura no sistema produtivo em ciclo fechado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo buscou-se enfatizar uma discussão
mais profunda do tema e a qualificação dos profissionais
do PCP, para que se tornem os gestores desse novo
modelo (PPCPEA), podendo tomar decisões mais
assertivas frente à sustentabilidade.
Para isso, a alta administração da empresa química
de transformação decidiu entronizar a Educação
Ambiental nas ações operacionais, considerando de
suma importância, antes da implementação da P+L,
sensibilizar os 180 funcionários, diretor de supply chain
e dois planejadores da produção.
Em um primeiro momento decidiu-se contratar dois
professores/consultores do Serviço Nacional de
Atividade Industrial – SENAI para gerenciar o
processo e capacitar os envolvidos em educação
ambiental. O tema Educação Ambiental foi discutido
de maneira transversal em todos os dias de
aprendizagem, visando motivar o envolvimento e ação
do ser humano na resolução de problemas ambientais.
As aulas foram ministradas nos dois meses iniciais
e, ao final, selecionaram-se 33 funcionários para
compor o ecotime. Esses funcionários selecionados
tiveram desempenho igual ou superior a 85 no que tange
à aprendizagem.
A partir daí o ecotime, com o apoio da alta
administração, desenvolveu plano de ação com dez
74
prioridades para serem cumpridas em mais seis
meses, que visam: retransmitir os conceitos sobre
Educação Ambiental e produção mais limpa para 150
funcionários reprovados, desenvolver infraestrutura
e estrutura para a implementação do projeto
Minimization (sequenciamento de cargas), com o
objetivo de analisar o sistema produtivo e elaborar o
balanço material para verificar ganhos econômicos e
ambientais oriundos da redução de consumo de água,
energia elétrica, aumento da produção e redução de
custos operacionais. Além disso, foi possível
implementar medidas de desempenho com ênfase na
metodologia de recursos humanos, visando
principalmente à sensibilização sobre Educação
Ambiental, indicadores econômicos e ambientais e
mensurar a quantidade de projetos sustentáveis
sugeridos.
É importante salientar que os dois planejadores de
produção foram os principais agentes do ecotime para
desenvolver o detalhamento do plano de ação, devido
à visão holística do processo. Segundo os
planejadores, no momento da sensibilização e
disseminação, eles já refletiram nos pontos de melhorias
ambientais no sistema produtivo, por conhecerem o
processo. Dessa forma, considera-se a temática do
modelo "PCP com Educação Ambiental" como
inovação na literatura, aplicada após a publicação do
modelo em 2010. Também é importante ressaltar que
a P+L está intrínseca em todo o processo, como consta
do modelo, mas que a implementação da mesma só
foi possível após a sensibilização e disseminação da
Educação Ambiental de maneira transversal entre os
envolvidos.
Nesse projeto Minimization (Sequenciamento de
Cargas) ocorreu uma economia de 270.420,06 Kg
por ano (soma bruta dos materiais) e representa
387.240,27 Kg de mat eriais de todos os
compartimentos (MTC) que não são retirados do
meio ambiente. Os ganhos lean com a otimização da
capacidade produtiva resultaram em aumento de 17%
da produção, redução dos custos de produção e,
consecutivamente, redução no custo do produto por
litro produzido, que impulsionaram a aumento da
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Planejamento e controle da produção...
lucratividade de R$ 5.966.507,00. Calculando a
relação (Material Economizado (ME)/Dinheiro
Economizado (DE)), muda de 0,05, considerando só
os materiais reaproveitados, para 0,06, quando são
considerados os mat eriais de todos os
compartimentos (MTC). No primeiro caso, cada real
economizado corresponde a 0,05 de material. Quando
se considera a escala global, por cada real, há um
beneficio de 0,06 de material, que não é modificado
nem retirado dos ecossistemas. Os resultados
apontam para um ganho da organização, que teve
aumentada sua capacidade produtiva em 17%,
reduzido o custo da mão de obra direta em 18% e
uma vantagem ambiental maior em 0,01 de materiais,
correspondendo ao material que não é modificado
nem retirado dos ecossistemas.
Os benefícios ambientais podem ser avaliados
quantitativamente usando uma metodologia adequada.
Isso permite acompanhar o desempenho da empresa.
É possível obter informações em escala global
confrontando aspectos ambientais e financeiros. Os
resultados apresentados na discussão e conclusão são
satisfatórios para a empresa em estudo: de um lado a
organização adquire vantagens econômicas e, de outro,
vantagens ambientais, favorecendo a competitividade
empresarial.
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ACEITO EM 9/7/2012
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
77
AVALIAÇÃO DE LOCAIS COM POTENCIAL E/OU UTILIZADOS NO
TURISMO AMBIENTAL NA CIDADE DE CAMPO GRANDE-MATO
GROSSO DO SUL
JAFAR, Andrea Cadija Duarte; OLIVEIRA, Ademir Kleber Morbeck*; BONONI, Vera Lúcia Ramos;
MASCARÓ, Lúcia Elvira Alícia Raffo. Universidade Anhanguera-Uniderp. Programa de Pós-Graduação em
Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional. Rua Alexandre Herculano, 1400 – CEP 79037-280, Campo
Grande, MS, Brasil. *E-mail: [email protected].
RESUMO
A cidade de Campo Grande possui áreas com atrativos naturais que podem ser utilizados para a prática do
turismo ambiental. Porém, a avaliação desses locais, por meio de critérios de potencial turístico, indica que a
maior parte das áreas não possui infraestrutura adequada para a recepção dos visitantes ou sua estrutura física
está deteriorada, e apenas cinco áreas possuem condições adequadas (alto potencial).
PALAVRAS-CHAVE: Áreas verdes; Parques urbanos; Turismo ecológico.
ABSTRACT
The city of Campo Grande has natural attractions that can be used in the so-called environmental tourism.
However, most areas with such potential do not have proper infrastructure to shelter visitors or their physical
structure is deteriorated. The critical evaluation of these places using criteria of tourist potential indicates that
most of the areas of the city do not have adequate infrastructure for the reception of the visitors or their physical
structure is spoiled and only five areas have adequate conditions (high potential).
KEYWORDS: Green areas; Urban parks; Ecological tourism.
78
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação de locais com potencial...
INTRODUÇÃO
A cidade de Campo Grande é considerada umas
das cidades brasileiras com melhor qualidade de vida,
com ruas e avenidas, largas e arborizadas, além de
muitos parques e praças, que propiciam um ambiente
agradável, que muitas vezes lembra as cidades de
interior. Em 1977, com a divisão do Estado de Mato
Grosso, tornou-se a capital do Estado de Mato
Grosso do Sul e passou por um processo acelerado
de urbanização e crescimento, tornando-se um polo
de atração para pessoas de outras cidades e regiões
(CAMPO GRANDE, 1999). Esse processo, como
em outras grandes cidades, criou problemas
urbanísticos e ambientais e a qualidade de vida em
determinadas regiões caiu, surgindo favelas e outras
habitações de baixa qualidade em determinados locais,
normalmente associados a fundos de vale, por exemplo
(ALMEIDA NETO et al., 2011).
Porém, mesmo com os problemas surgidos, a
cidade continua sendo um polo de atração regional,
com uma forte presença econômica no setor
secundário e terciário, o que também atrai empresários
e outras pessoas ligadas a diferentes ramos da
economia, além de uma forte presença no ramo de
eventos, tais como simpósios, encontros e congressos.
Dessa maneira, a cidade atrai turistas, que
permanecem na região por um determinado período e
se dividem em dois grandes grupos: turismo de
participação em congressos, eventos em geral ou
negócios; e turismo ambiental, com destino ao Pantanal
ou à região da Serra da Bodoquena – Campo Grande,
por possuir aeroporto com capacidade de receber
aviões de grande porte, além de ser ponto de passagem
da rodovia BR- 262, que se liga a essas regiões,
tornou-se um polo receptor (transitório) de turistas que
se dirigem a esses locais. A maior parte desses
visitantes tem um tempo médio de permanência na
cidade de dois a três dias, apesar de a cidade possuir
locais com atrativos naturais que podem ser utilizados
para prática esportiva, além de áreas para visitação e
contemplação passiva, como parques e reservas.
Esse tipo de turismo, relacionado à natureza, cresce
a uma taxa de 10 a 30% ao ano, o que mostra que as
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
pessoas cada vez mais estão em busca de áreas
naturais para o lazer (CEBALLOS-LASCURÁIN,
1993; LINDBERG e HAWKINS, 2001). Segundo
Ruschmann (2009), nas últimas décadas, as pessoas
estão procurando um maior contato com a natureza,
através da "busca do verde" e da fuga dos tumultos
dos grandes conglomerados urbanos, tentando
recuperar o equilíbrio psicofísico em contato com os
ambientes naturais durante seu tempo de lazer. A busca
desse contato com a natureza é chamada de questão
de amenidade.
Apesar dos atrativos naturais da cidade, a maioria
da população continua desconhecendo esses locais.
Porém, para que o usuário dessas áreas ligadas à
natureza e ao lazer possa ser adequadamente recebido,
é necessário conciliar o conhecimento e a divulgação
dos pontos em questão e, em alguns casos, adaptar
sua infraestrutura. Essa melhoria propiciaria uma maior
permanência dos turistas na região, gerando divisas e
também atraindo moradores das cidades vizinhas e da
própria capital, que não conhecem esses pontos por
falta de informação ou pela pouca divulgação de suas
belezas naturais. Portanto, um planejamento de um
roteiro de ecoturismo na cidade poderá ser viável,
desde que sejam feitas algumas adequações.
Dessa maneira, o objetivo deste trabalho foi fazer
o levantamento dos locais com potencial para o
ecoturismo em suas diferentes vertentes, avaliando o
potencial das áreas e verificando a infraestrutura
existente para atender os usuários.
MATERIAL E MÉTODOS
A cidade de Campo Grande está localizada na Bacia
do Rio Paraná, no centro do Estado de Mato Grosso
do Sul, nas coordenadas geográficas de latitude
20°28´11,775" e longitude 54°37´24,04960", com
população em torno de 800 mil habitantes (CAMPO
GRANDE, 1999). Para o desenvolvimento da
pesquisa, foram escolhidas 14 áreas que são utilizadas
ou constam do plano diretor da cidade como pontos
de interesse ambiental, mapeadas de acordo com suas
posições em relação ao centro urbano através do
programa Google Earth (Figura 1).
79
JAFAR et al.
Figura 1 – Recorte de uma imagem de satélite da cidade de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, com os
pontos turísticos propostos.
Fonte: Google Earth.
Os locais em estudo foram descritos e classificados
de acordo com o Plano Diretor de Campo Grande,
onde se encontram as áreas especiais de interesse
ambiental e urbanístico (CAMPO GRANDE, 1998).
A avaliação do potencial turístico foi feita por meio
da criação de uma tabela de potencial turístico,
adaptando-se conceitos de Ignarra (2003), Beni (2004)
e Cunha (2006), em que os atrativos foram avaliados
de 0,0 a 10,0, sendo de 0,0 a 2,0 ruim; de 2,1 a 4,0
regular; de 4,1 a 6,0 médio; de 6,1 a 8,0 bom; e de 8,1
a 10,0 ótimo, com a elaboração de uma média para
cada atração, através de visitas in loco nas áreas de
estudo e informações obtidas em órgãos públicos
municipais e estaduais, sendo avaliados os seguintes
parâmetros:
80
Acesso (inclui condições da estrada ou rua,
pavimentação, distância do centro, se a propriedade é
pública, privada ou área militar);
Lanchonete/restaurante (presença ou ausência,
diversidade de oferta de produtos, além de estado de
conservação e aparência);
Delimitação de limites (área cercada e o estado
de conservação de sua cerca ou outro tipo de limite);
Segurança (presença de guardas ou outro tipo
de segurança);
Administração e proteção do local (existência
de local construído para administração da área, se
possui posto para guarda patrimonial ou polícia militar,
sendo utilizado ou não, além da conservação dos
mesmos);
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação de locais com potencial...
Sanitários e pontos de oferta de água potável
(estado de conservação, localização e quantidade no
local, levando-se em consideração o tamanho da área);
Auditório, teatro ou espaço coberto para eventos
que atendam a população e seu estado de conservação;
Área de esportes (inclui quadra para atividades,
tais como futebol de salão ou vôlei, campo de futebol,
equipamento para atividades físicas, tais como barras
ou prancha para abdominais, pista para cooper ou
caminhada, entre outros, além do estado de
conservação);
Área de recreação (inclui área de piquenique ou
local para observação/contemplação, tais como bancos
ou gramados, piscinas ou outro tipo de local para
recreação aquática, equipamento de recreação para
crianças, tais como parquinhos, além da conservação
dos equipamentos ou locais);
 Lago e/ou espelhos d'água (áreas para
contemplação da paisagem, prática de esportes e/ou
lazer do usuário);
Telefone público (número de aparelhos,
localização, considerando-se o tamanho da área, além
da conservação dos mesmos);
Estacionamento (existente, pavimentado ou não,
arborizado, além do número de vagas e estado de
conservação);
Iluminação (presente em toda área, sem luminárias
queimadas ou desligadas);
Vegetação (com ou sem presença de vegetação
nativa e projeto de paisagismo que ofereçam conforto
visual e ambiental aos visitantes ou ausência de
vegetação de porte – árvores).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram avaliados 14 locais, de acordo com suas
respectivas características:
a) Parque Estadual Matas do Segredo
Possui 179,58 hectares de vegetação composta de
Cerrado, cerradão e matas decíduas em processo de
regeneração na região norte do município, próximo aos
Bairros Mata do Jacinto, Nova Lima e Coronel
Antonino. No local, encontra-se a nascente do córrego
Segredo; por enquanto, não está aberto à visitação e
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
a única atividade pública existente é voltada para
educação ambiental, civismo e atividades militares com
jovens que residem nos bairros próximos e frequentam
o local no período vespertino, quando têm aulas e são
servidos almoço e lanche.
Avaliação: acesso pavimentado, mais de 10 km do
centro, propriedade pública, local demarcado com
portaria, com segurança, sede de administração,
sanitários, local para reuniões, vegetação nativa em
bom estado e presença de fauna, sem local para
atividades físicas ou recreação, telefones públicos ou
estacionamento, iluminação precária e trilhas não
sinalizadas. Média – 2,9.
b) Área de Preservação Ambiental do Ceroula
(Inferninho)
Situado na região da APA do Córrego Ceroula, a
25 km do centro de Campo Grande, saída para a
cidade de Rochedo. Compreende a mata ciliar situada
dentro do vale formado pelo córrego Cerroula até 500
(quinhentos) metros após a cachoeira do local
denominado "Inferninho" (queda livre de 35 m). Está
inserido numa propriedade particular, possuindo
características de fauna e flora fundamentais à
conservação da biodiversidade regional, altamente
modificada na região.
As atividades mais praticadas no local são o rapel,
mountain bike e o turismo relacionado a trilhas, tirolesa
e lazer em geral, como banhos nas cachoeiras e
contemplação da paisagem, porém sem planejamento e
manejo dos impactos decorrentes da visitação. Parte
da área, principalmente o vale formado após a cachoeira
do Inferninho, poderia ser transformada em uma reserva
biológica ou um parque municipal, propiciando-se o
cuidado e a manutenção do local, com equipamentos
de infraestrutura básicos para atender seus usuários.
Avaliação: rodovia de acesso não pavimentada e
em mau estado de conservação, mais de 10 km do
centro, propriedade particular, sem local de recepção,
limites definidos, segurança, local para recepção e
descanso, telefone, estacionamento, sanitários,
iluminação; presença de vegetação natural e fauna.
Média – nota 0,9.
81
JAFAR et al.
c) Parque Estadual do Prosa (antiga Reserva
Ecológica do Parque dos Poderes)
Área da nascente do córrego Prosa, no Parque dos
Poderes, área administrativa do governo estadual, hoje
conhecida como Parque Estadual do Prosa. É um dos
últimos fragmentos de Cerrado, Floresta Decídua e
matas de galeria na área urbana da capital, além de
uma das únicas unidades de conservação estaduais
abertas para visitação. A vegetação encontra-se em
processo de regeneração bastante avançado, pois a
área sofreu intervenções agropecuárias no passado,
através de retirada de parte da vegetação nativa.
Como atrativos, possui trilhas interpretativas, com
monitores aptos a acompanhar os visitantes e a
propiciar-lhes um passeio interessante, passando por
pequenas pontes e deques ao longo dos córregos
Joaquim Português, Desbarrancado e Prosa. Possui
um centro de visitantes que mostra, por meio de um
vídeo, um pouco do passado de Campo Grande e dos
conceitos atuais de proteção dos recursos naturais,
além do cantinho do Prosa, um espaço de arte. No
local também está localizado o CRAS, Centro de
Reabilitação de Animais Silvestres, normalmente não
aberto à visitação pública.
Como sugestões para melhoria do local, uma trilha
alternativa com entrada pela Avenida Mato Grosso e
um melhor acompanhamento dos turistas, evitando a
saída da trilha original, o que possibilita a degradação
das margens, ampliando desnecessariamente a trilha.
Dentro do parque não há a disponibilidade de serviços
como lanchonete e venda de artesanato local, que
poderiam gerar renda e emprego, além do conforto
ao usuário.
Avaliação: rodovia de acesso pavimentada, menos
de 5 km do centro, área pública, presença de fauna e
vegetação nativas, com limites definidos, segurança,
sede, sanitários, área de lazer, telefone público,
iluminação; sem local para reunião e estacionamento.
Média – 5,0.
d) Lago do Amor
O lago é formado pelo represamento do córrego
Segredo na área do campus da Universidade Federal
82
do Mato Grosso do Sul – UFMS. Possui um potencial
enorme para o turismo ambiental, pois se situa ao lado
da reserva biológica da UFMS, formada por vegetação
de mata de galeria e vereda em processo de
regeneração. Porém, o local está interditado para
passeios de pedalinhos, por exemplo, pois a água está
poluída, já que parte do esgoto da região é descartada
no córrego. O local é constantemente tomado por
plantas aquáticas, que cobrem toda a lâmina d'água e
produzem um local propício para a criação de
pernilongos e outros insetos, que trazem desconforto
aos moradores próximos, além de a matéria orgânica
produzida, quando em processo de decomposição,
gerar odor desagradável, além de outros problemas
ambientais.
A região até poucos anos era ponto referencial de
turismo na cidade de Campo Grande e, atualmente, é
uma lagoa degradada. Poderia ter seu valor resgatado,
voltando a ser um ponto turístico da capital sul-matogrossense, através do tratamento de esgoto. Atualmente
foi construída uma área de contemplação próxima a
uma das margens, com bancos na calçada e iluminação.
Avaliação: área pública, menos de 5 km do centro
com acesso asfaltado, presença de fauna e flora,
lanchonete, limites, local de recreação, telefone,
iluminação, segurança parcial e área para atividade
física, através de caminhada. Média – 5,7.
e) Área da Lagoa Itatiaia
Localizada no Bairro Tiradentes, a lagoa foi
urbanizada em dezembro de 2003, recebendo
calçamento e iluminação ao redor da área alagada; em
2011 recebeu equipamento para atividades físicas, a
chamada academia ao ar livre. A área enfrenta
problemas de lixo nas margens e a vegetação ainda
está se recompondo, pois o local foi degradado
anteriormente, recebendo, inclusive, restos de obras
de construção.
Avaliação: área pública, menos de 5 km do centro
da cidade com acesso asfaltado, presença de fauna e
flora, local de recreação, lanchonete, telefone público,
iluminação; segurança parcial e sem sanitários,
estacionamento ou local para reunião. Média – 4,5.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação de locais com potencial...
f) Área da Lagoa da Base Aérea
É citada como uma das áreas especiais de interesse
ambiental, localizando-se dentro da Base Aérea de
Campo Grande, na Avenida Duque de Caxias. Porém,
o curso d'água que abastecia a lagoa foi desviado por
duas vezes por motivos de construções na área e a
lagoa secou. Mas ainda existe na área uma reserva
ecológica, onde é possível visualizar a flora local e
encontrar animais como quatis, tatus e araras.
Dificilmente, no entanto, a área pode ser incluída num
roteiro de turismo, pois é uma área militar e a visitação
é mais restrita.
Como sugestão, a transformação da reserva em
parque estadual ou municipal, passando o controle para
o poder público civil, o que permitiria a utilização do
local de maneira mais democrática, além de garantir,
em teoria, sua manutenção.
Avaliação: área pública militar, menos de 5 km
do centro com acesso asfaltado, presença de fauna e
flora diversificada, telefone, iluminação e segurança;
sem áreas para atividade física ou recreação,
lanchonete, sanitários, estacionamento ou local para
reunião. Média – 2,8.
No local, há trilhas para a prática de MotoCross –
esse uso levou à retirada de vegetação nativa,
descobrindo o solo, apresentando erosão laminar e
falta de segurança em alguns pontos. O local também
possui campo de areia para prática de vôlei e futebol,
piscinas, churrasqueiras e um parque infantil em
condições precárias. Para que o local atenda à
demanda turística, é necessária uma reforma em geral
das instalações.
O local é de interesse público e poderia ser
desapropriado para sua preservação, sendo
transformado em um parque municipal, pois na área
existem buritizais e áreas de Cerrado, remanescentes
de vegetação original, além de nascentes importantes
para a preservação dos recursos hídricos. Atualmente
existe um projeto para a transformação do local em
área pública.
Avaliação: não possui acesso pavimentado (estrada
em mau estado de conservação), mais de 10 km do
centro, propriedade particular, portaria onde se cobra
taxa de visitação, com fauna e flora, limites, sede,
sanitários, equipamento de recreação, telefone,
iluminação; segurança parcial. Média – 5,2.
g) Área do Jockey Club de Campo Grande
(Hipódromo Aguiar Pereira de Souza)
O hipódromo está situado próximo à saída para
São Paulo (BR-163), onde ocorrem corridas
esporádicas. Todos os dias, no período vespertino, os
cavalos treinam na pista. Porém, o local precisa de
alguns cuidados em relação à vegetação e limpeza.
Também falta sinalização para o acesso.
Avaliação: área particular, mais de 10 km do centro
com acesso asfaltado, presença de animais, telefone,
iluminação, estacionamento, vegetação, sede,
sanitários; sem segurança, áreas para atividade física
ou recreação, lanchonete. Média – 4,1.
i) Parque das Nações Indígenas
O local possui 116 hectares e está localizado em uma
posição geográfica privilegiada – altos da Avenida
Afonso Pena, que possibilita o fácil acesso de moradores
provenientes dos mais diversos bairros da capital, sendo
circundado por uma parte nobre da cidade, com belas
residências, centros comerciais, hospital e pavilhão de
feiras e exposições, assim como pelo centro político e
administrativo do Estado, o Parque dos Poderes.
Avaliação: área pública, menos de 5 km do centro
com acesso asfaltado, presença de fauna local,
oferecendo uma adequada infraestrutura completa para
a prática do lazer e esporte, museus, restaurante,
estacionamento, lanchonete, concha acústica,
sanitários, policiamento, pista para caminhadas, skate,
patins e um grande lago artificial, resultado do
represamento do córrego Prosa, com deque para a
contemplação da paisagem, porém com problemas de
assoreamento. A vegetação do parque é antropizada,
h) Balneário Lagoa Rica
A lagoa está situada na fazenda pertencente à família
Metello, na área rural do município, a 16 km do centro
urbano, próximo a BR-262. É utilizada para prática de
esportes náuticos sem motores, desde a década de 1960.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
83
JAFAR et al.
com espécies típicas da região intercalada com
exóticas. Uma parte das espécies está catalogada, com
informações ao usuário; outras não possuem placas
informativas. Média – 8,1.
j) Parque Jacques da Luz Filho (Parque das
Moreninhas)
Possui 43 hectares e localiza-se no Bairro
Moreninha II, local com aulas de balé, dança de salão,
capoeira, natação, pintura em tela e teatro. No local,
frequentemente, tem-se apresentações, shows, festas
comemorativas e outros eventos para confraternização
dos usuários.
Avaliação: área pública, mais de 10 km do centro
com acesso asfaltado, possuindo uma boa
infraestrutura, com banheiros públicos, quadras
poliesportivas (cobertas e ao ar livre), piscinas, pista
de caminhadas, salas para aula de teatro e dança com
camarim, espaço para eventos coberto, cantina e
estádio de futebol (Toca da Onça), além de telefone,
iluminação e segurança. A infraestrutura do parque é
parcialmente adequada, mas faltam placas de
sinalização para se chegar ao local, lanchonete,
sanitários, estacionamento; a vegetação é pobre e a
presença de fauna é escassa. Média – 7,7.
k) Parque Ayrton Senna
Área de 7 hectares, o parque está localizado no
bairro Aero Rancho, às margens do córrego Segredo,
com construções em estilo moderno, possuindo
programa e projetos focados nas atividades esportivas.
Avaliação: área pública, menos de 5 km do centro
com acesso asfaltado, possuindo como infraestrutura,
banheiros públicos (manutenção inadequada, com
vasos sanitários quebrados), telefone, segurança,
quadras poliesportivas, piscinas (fora de uso por falta
de manutenção), parque infantil, pista de caminhada,
sala de arte, de capoeira, espaço para eventos coberto
e cantina (desativada) e iluminação precária, além da
falta de placas de sinalização para o acesso. Além disso,
a vegetação arbórea e/ou arbustivo-herbácea não
existe na maior parte da área; também falta
estacionamento. Média – 7,0.
84
l) Parque das Acácias
Área de 42 hectares em um local privilegiado,
numas das principais entradas de Campo Grande, no
acesso para o Pantanal sul-mato-grossense, em frente
à Base Aérea e do Aeroporto Internacional. O local
foi decretado como parque e está em processo de
implantação.
Avaliação: área pública, menos de 5 km do centro
com acesso asfaltado, sem local de recreação, telefone,
iluminação parcial, vegetação, segurança, áreas para
atividade física, lanchonete, sanitários; estacionamento
ou fauna local. Média – 0,7.
m) Parque Florestal Antônio de Albuquerque
(Horto Florestal)
Situado na área central da cidade, possui um
elaborado projeto paisagíst ico, em estilo
contemporâneo. O local possui segurança e uma boa
infraestrutura, que frequentemente passa por
manutenção, atendendo perfeitamente seus usuários,
pois é mantido em parceria com organizações, tal como
o SESC, o que propicia a manutenção adequada para
o local, além de segurança.
Também oferece cursos e oficinas, sendo aberto à
visitação gratuita de terça-feira a domingo e às segundasfeiras é fechado para manutenção, com exceção da
biblioteca, que é aberta no período vespertino. Outro
grande atrativo do parque são as atividades voltadas
para a terceira idade, público este que aumenta
frequentemente, procurando uma melhor qualidade de
vida e lazer, pois o local possui um centro de convivência
para os idosos (Centro João Nogueira Vieira).
Avaliação: área pública central com acesso
asfaltado, local de recreação, telefone, iluminação,
segurança, áreas para atividade física, pista de
caminhada com vegetação catalogada, lanchonete,
sanitários, local para eventos e biblioteca; sem
estacionamento ou presença de fauna significativa.
Média – 8,9.
n) Parque Sóter
Formado pela bacia do córrego Sóter, no início da
Avenida Via Parque, área norte da cidade. Foi criado
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação de locais com potencial...
para solucionar os problemas de erosão que existiam
em determinados pontos da região que formavam
grandes voçorocas, ameaçando a nascente do córrego
Sóter e o arruamento da área.
Avaliação: área pública, localizada a menos de 5
km do centro com acesso asfaltado, telefone,
iluminação, estacionamento, segurança, sanitários;
pequena presença de fauna, quadras esportivas,
parque infantil, pistas de skate, de caminhada, espaços
para descanso e lazer, auditório, além da área
administrativa do parque. No local foi detectada a
falta de serviços como lanchonete e loja para venda
de produtos locais (artesanato), já que dispõe de um
auditório, que atrai público quando da realização de
eventos. Também é necessária a catalogação das
espécies vegetais existentes, como forma de educação
ambiental voltada aos usuários, além do controle dos
processos de erosão e do assoreamento do lago do
local. Média – 7,3.
CONCLUSÃO
A maior parte das áreas com potencial turístico da
cidade não possui infraestrutura adequada para a
recepção dos visitantes ou sua estrutura física está
deteriorada. Outros não possuem placas de sinalização
e são desconhecidos, tanto dos moradores como dos
visitantes da cidade.
Apenas cinco áreas possuem condições adequadas
(alto potencial): Parque das Nações Indígenas (8,1),
Parque Jacques da Luz Filho (7,7), Parque Ayrton
Senna (7,0), Parque Florestal Antônio de Albuquerque
(8,9) e Parque Sóter (7,3), com infraestrutura
apropriada, acesso em boas condições e equipamentos
com condições para atender o usuário.
Também cinco locais apresentam potencial médio,
onde precisam ser feitas algumas alterações: Parque
Estadual do Prosa (5,0), Lago do Amor (5,7), Jockey
Clube (4,1), Lagoa Itatiaia (4,5) e Balneário Lagoa
Rica (5,2). Cada um com suas particularidades, não
alcançaram boa média pelo fato de não oferecerem
infraestrutura que outros locais oferecem ao público.
No caso da Lagoa Rica, as instalações e os
equipamentos de recreação, em condições precárias,
REVISTA UNIARA,v.15, n.1, julho 2012
precisam de reforma.
Com médias baixas: Parque Estadual Matas do
Segredo (2,9), Área de Preservação do Inferninho
(0,9), Área da Lagoa da Base Aérea (2,8) e Parque
das Acácias (0,7). No caso do Parque Estadual Matas
do Segredo, a média foi baixa pelo fato do local ainda
não ter implementado seu plano de manejo. A área de
preservação do Inferninho está distante do centro
urbano, com acesso não pavimentado e sem
infraestrutura. Já o Parque das Acácias está sendo
implantado e a área da lagoa da base tem problemas
de acesso.
A cidade ainda não possui condições de atrair e
manter turistas voltados ao turismo ambiental em razão
da pequena oferta de locais com alto potencial turístico.
AGRADECIMENTOS
Ao prof. dr. Sílvio Jacks dos Anjos Garnés, à
turismóloga Flávia Néri e à engenheira Vera Acceturi
(secretária de Meio Ambiente), pela colaboração na
elaboração das imagens de satélite, materiais e
informações. À CAPES pela bolsa de estudos
concedida.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA NETO, J.V.; OLIVEIRA, A.K.M.;
BONONI, V.L.R. Atuação do Conselho Municipal
do Meio Ambiente em Campo Grande-MS:
Licenciamento Ambiental. Revista Uniara, v. 14, n.
1, p. 158-168, 2011.
BENI, M.C. Análise estrutural do turismo. 10
ed. São Paulo: SENAC, 2004. 513p.
CAMPO GRANDE. Instituto Municipal de
Planejamento Urbano e Meio Ambiente –
PLANURB. Legislação municipal de interesse
ambiental de 1977 a janeiro de 1997. Campo
Grande: EDUFMS, 1998. 448p.
CAMPO GRANDE. 100 anos de construção.
Campo Grande: Matriz Editora, 1999. 420p.
85
JAFAR et al.
CEBALLOS-LASCURÁIN, H. Ecotourism in the
third world: problems for sustainable tourism
development. Tourism management, v. 14, n. 2, p.
85-90, 1993.
CUNHA, L. Economia e política do turismo.
Lisboa: Verbo, 2006. 488p.
IGNARRA, L.R. Fundamentos do turismo. São
Paulo: Thompson, 2003. 930p.
LINDBERG, K.; HAWKINS, D.E. Ecoturismo,
um guia para planejamento e gestão. São Paulo:
SENAC, 2001. 292p.
RUSCHMANN, D. Turismo e planejamento
sustentável: a proteção do meio ambiente. São
Paulo: Papirus, 2009. 199p.
RECEBIDO EM 28/3/2012
ACEITO EM 29/6/2012
86
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
AVALIAÇÃO DA COMPATIBILIDADE ENTRE BULAS DE
DIFERENTES MARCAS DE TIRAS REAGENTES DE URINA
CEZAR, Guilherme de Oliveira. Biomédico, graduado pelo Centro Universitário Metodista, do IPA,
Porto Alegre-RS.
SANTOS, Vanessa Danesi dos. Biomédica, graduada pelo Centro Universitário Metodista, do IPA,
Porto Alegre-RS.
FUNCHAL, Cláudia. Farmacêutica e Bioquímica, Mestre e Doutora em Ciências Biológicas: Bioquímica,
Docente do Programa de Pós-Graduação Biociências e Reabilitação do Centro Universitário Metodista, do IPA,
Rua Cel. Joaquim Pedro Salgado, 80 – Porto Alegre – RS, Brasil, CEP 90420-060. Tel: (51) 3316-1233.
E-mail: [email protected], [email protected].
RESUMO
Com o exame de urina podemos avaliar a função renal e identificar patologias do trato urinário. As tiras reagentes
de urina são um método de análise fácil, rápido e muito utilizado. É de suma importância verificar a compatibilidade
entre as diferentes marcas, garantindo uma melhor compreensão no diagnóstico. Foi feita a comparação das
bulas de oito diferentes marcas de tiras reagentes de urina quanto aos reagentes utilizados nas determinações
urinárias, além das informações quanto ao limite de detecção, intervalos de leitura e possíveis interferências. A
comparação das bulas mostrou diferenças entre elas. No que se refere aos reagentes utilizados, em geral, todas
as marcas utilizam reativos similares, porém em quantidades diferentes. As bulas apresentam inúmeros interferentes,
porém se observou que algumas marcas não mencionam interferentes que em outras marcas são citados. Quanto
às legendas das dosagens semiquantitativas, grande parte das marcas não inclui essas informações na bula do
produto; entre as demais se observou que os analitos glicose, bilirrubina, cetonas e sangue não possuíam a
mesma correspondência de concentração e legenda entre as marcas. Ressalta-se a importância de que haja
uma maior padronização das informações contidas nas bulas das tiras reagentes.
PALAVRAS-CHAVE: Trato urinário; Análise química de urina; Tiras reagentes.
ABSTRACT
Through the urine test we can measure kidney function and identify pathologies of the urinary tract. The urine test
strips are a fast, easy and increasingly used method of analysis. It is extremely important to check compatibility
between the different brands assuring a better understanding of the diagnosis. We compared the package inserts
of eight different brands of urine test strips and the reagents used in the urinary determination, besides information
concerning the detection of limit ranges, reading intervals and possible interferences. A comparison of the leaflets
showed differences among them. Concerning the reagents used, in general, all brands use similar ones but in
different quantities. The patient information leaflets have several interferences, but it was observed that some
brands do not mention the interferences that are mentioned in other brands. As for the legends of semiquantitative
measurements, most brands do not include this information on the product leaflet. Among the brands that could
be analyzed with this parameter was observed that the analytes glucose, bilirubin, ketones and blood did not
have the same correlation between concentration and label brands. We stress the importance of ensuring a
greater standardization of the information contained in the leaflets of the reagent strips.
KEYWORDS: Urinary tract; Chemical analysis of urine; Test strips.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
87
CEZAR et al.
INTRODUÇÃO
Por meio da análise de urina deu-se início à medicina
laboratorial. A análise da urina, com propósito de
diagnóstico, tem sido usada por séculos e é um dos
mais antigos procedimentos laboratoriais usados na
clínica médica (RINGSRUD et al., 1995). Os
primeiros registros da ocorrência de estudos de urina
foram encontrados nos hieróglifos egípcios e em
desenhos nas cavernas. Em quadros antigos também
já se tinha a imagem de médicos analisando amostras
de urina, apesar de não contarem com os sofisticados
métodos que temos hoje. Eram feitas observações
básicas, como cor, volume, turvação, odor e
viscosidade, obtendo as informações necessárias para
um diagnóstico. Em muitos casos, os pacientes nem
viam o médico, mas tinham seu diagnóstico feito com
base nessas informações.
Um método curioso, na época, para detectar a
presença de açúcar na urina era feito através da
observação de formigas na amostra. O interessante é
que todos os parâmetros inicialmente analisados ainda
são utilizados até hoje para o diagnóstico, porém a
met odologia de análise é mais sofisticada
(STRASINGER, 2000; FUNCHAL et al., 2011).
Pelo exame de urina podemos avaliar a função
renal e identificar patologias renais e do trato
urinário. O exame de urina é considerado um exame
de rotina por possuir baixo custo, simplicidade e
facilidade na obtenção da amostra (COLOMBELI;
FALKENBERG, 2003).
O exame de urina de rotina, ou exame qualitativo
de urina (EQU), compõe-se habitualmente de três
etapas: o exame físico, o exame químico e a
microscopia do sedimento. Cada um deles tem seu
valor, sendo os dois primeiros de execução mais
simples e o último é considerado moderadamente
complexo (COSTAVAL et al., 2001).
A análise química compreende a pesquisa de
determinados elementos urinários. É realizada em urina
homogeneizada, sem centrifugação, sem adição de
conservantes e testada à temperatura ambiente. O
método realizado com a tira reagente representa o foco
principal do exame químico da urina (HENRY, 2008).
88
Usualmente a análise dos constituintes bioquímicos da
urina é feita através de tiras reagentes, objetivando
tornar mais rápida, mais simples e mais econômica a
determinação dos elementos presentes na urina.
Atualmente há no mercado instrumentos que executam
a leitura das fitas reagentes, melhorando assim o grau
de precisão ao eliminar parte do elemento subjetivo
inerente à leitura das mudanças de cor pelo olho
humano. As tiras reagentes são um meio rápido e
simples de realizar no mínimo dez análises bioquímicas
importantes: proteínas, cetonas, pH, glicose, sangue,
leucócitos, densidade, nitrito, bilirrubina e
urobilinogênio. Essas tiras são formadas por pequenos
pedaços de papel absorvente impregnados com
substâncias químicas específicas. Na presença da
amostra ocorre uma reação química que leva a uma
mudança na coloração do papel absorvente e, dessa
forma, o resultado é visto por meio da comparação
entre a coloração produzida na fita e a tabela cromática
fornecida pelo fabricante da tira reagente. É definido
um valor semiquantitativo através da nomenclatura:
raros, 1+, 2+, 3+ e 4+, e, em alguns casos, é estimada
também a concentração em mg/dL (STRASINGER,
2000; FUNCHAL et al., 2011).
As tiras reagentes de urina são um método de
análise fácil e rápido, e têm sido cada vez mais
utilizadas em substituição a exames de maior
complexidade, como a análise microscópica. Além
disso, o exame de urina permite diagnosticar diversas
patologias e, por meio das tiras reagentes, pode-se
fazer um diagnóstico presuntivo da existência de
doenças. Por essa razão, é importante que os sistemas
utilizados nessas análises sigam uma padronização,
permitindo a igualdade da interpretação dos
resultados independentemente do local, analista e
marcas de reagent es utilizados na análise
(COLOMBELI; FALKENBERG, 2003).
Na pesquisa clínica o controle de qualidade é um
ponto de suma importância, mas não costuma receber
atenção suficiente. Isso muitas vezes ocorre porque as
medições sempre parecem ser mais simples do que
realmente são. Porém, se não forem delineados os
adequados procedimentos de controle, é provável que
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
ocorram muitos erros ou perdas de dados (HULLEY
et al., 2003).
Sendo assim, é de grande importância verificar a
compatibilidade entre as diferentes marcas de tiras
reagentes de urina, quanto à elaboração das bulas, aos
interferentes de cada parâmetro analisado e a igualdade
entre as simbologias utilizadas para representar as
diferentes concentrações encontradas, garantindo uma
melhor compreensão no diagnóstico. Portanto, nosso
objetivo foi analisar as possíveis divergências
encontradas entre as bulas de oito diferentes marcas
de tiras reagentes comercializadas no Brasil.
METODOLOGIA
O trabalho buscou realizar a comparação das bulas
das tiras reagentes de urina das marcas: Uriquest
(Labtest®), Combur (Roche®), Biocolor (Bioeasy®),
SD Urocolor 10 (Standard Diagnostic Inc. ®), URS11 (Cortez Diagnostics), Sensi 10 (Sensitive®),
Uristick (Labor import) e Urofita®10 DL (Prodimol®).
Os parâmetros avaliados foram: quanto aos reagentes
utilizados nas determinações urinárias de pH, proteínas,
glicose, cetonas, sangue, bilirrubina, urobilinogênio,
nitrito, densidade, leucócitos e ácido ascórbico, além
das informações quanto ao limite de detecção,
intervalos de leitura e possíveis interferências nos
parâmetros avaliados.
RESULTADOS
A primeira diferença que pode ser observada é
quanto aos compostos analisados em cada marca, onde
as marcas Roche®, Labor import, Sensitive® e
Prodimol® não incluem o parâmetro Ácido Ascórbico.
Todas as marcas analisadas detectam os seguintes
analitos: glicose, cetona, bilirrubina, urobilinogênio,
sangue, leucócitos, proteínas, nitritos, pH e densidade.
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Limites de detecção
Foi analisado o limite de detecção de cada marca
para cada analito, conforme podemos observar na
Tabela 1. Observou-se que, para pH, densidade e
sangue, todas as marcas mantiveram seus limites de
detecção iguais; porém, para os demais parâmetros,
apresentaram algumas diferenças. A tira reagente da
marca Sensitive® não apresentou valores referentes à
sensibilidade dos testes na bula.
A detecção mínima de proteínas foi semelhante nas
marcas em geral, com exceção da Labtest®, que
apresentou sensibilidade inferior para este analito
(detecção mínima de 30 mg/dL). No analito bilirrubina,
a Labor import apresentou em sua bula sensibilidade
pelo menos duas vezes menor que as demais marcas.
Quanto ao analito urobilinogênio, a sensibilidade
apresentada pela Standard® chegou a ser cinco vezes
maior que a sensibilidade apresentada pela tira da
Prodimol®. A detecção de leucócitos diferiu apenas
para a marca Standard®, onde a sensibilidade descrita
foi duas vezes menor que as demais (25 leucócitos/
µL). A detecção de glicose foi semelhante nas marcas
Labtest®, Roche®, Bioeasy®, Labor import e
Prodimol® (50 mg/dL); já as marcas Cortez® e
Standard® apresentaram limites de detecção mínima
mais altos (100 mg/dL). Para a análise de cetonas, a
marca Bioeasy® demonstrou maior sensibilidade,
tendo uma capacidade de detecção quatro vezes maior
que a demonstrada pela Labor import. Para nitritos,
as tiras reagentes chegaram a apresentar uma diferença
de sensibilidade de 50 vezes entre as marcas
Standard® e Labor Import. Dentro das quatro marcas
que possuíam análise de ácido ascórbico, duas
(Labtest® e Bioeasy®) apresentaram limite de
detecção mínima de 5 mg/dL e duas (Cortez® e
Standard®), de 10mg/dL (Tabela 1).
89
CEZAR et al.
Tabela 1 – Limites de detecção apresentados nas bulas das tiras reagentes de urina.
Labtest
Roche
Bioeasy
Cortez
Labor
Prodimol
Standard
Ácido Ascórbico
5mg/dL
-
5mg/dL
10mg/dL
-
-
10mg/dL
Glicose
50mg/dL
40mg/dL
50mg/dL
100mg/dL
50mg/dL
50mg/dL
100mg/dL
Bilirrubina
0,5mg/dL
0,5mg/dL
0,4mg/dL
0,4mg/dL
0,2mg/dL
0,5mg/dL
0,5mg/dL
5mg/dL
5mg/dL
2,5mg/dL
5mg/dL
10mg/dL
10mg/dL
5mg/dL
Densidade
1,000 - 1,030
1,000 - 1,030
1,000 – 1,030
1,000 - 1,030
1,000 - 1,030
1,000 - 1,030
1,000 - 1,030
Sangue
0,015mg/dL
0,015mg/dL
0,015mg/dL
0,015mg/dL
0,015mg/dL
0,015mg/dL
0,015mg/dL
pH
5,0 - 9,0
5,0 - 9,1
5,0 – 9,2
5,0 - 9,3
5,0 - 9,4
5,0 - 9,5
5,0 - 9,6
Proteína
30mg/dL
6mg/dL
7,5mg/dL
15mg/dL
15mg/dL
10mg/dL
10mg/dL
Urobilinogênio
0,4mg/dL
0,4mg/dL
0,2mg/dL
0,2mg/dL
0,2mg/dL
0,5mg/dL
0,1mg/dL
Nitrito
0,05mg/dL
0,05mg/dL
0,05mg/dL
0,075mg/dL
0,01mg/dL
0,05mg/dL
0,5mg/dL
10/L
10/L
10/L
10/L
10/L
10/L
25/L
Cetona
Leucócitos
Fonte: Elaborada pelos autores.
Reagentes utilizados pelas tiras
Também foram analisados os reagentes utilizados
para cada analito nas tiras reagentes de diferentes
marcas, conforme pode ser observado na Tabela 2. A
marca Labor import® não apresentou, na bula, as
concentrações e os reagentes utilizados. De uma forma
geral, todas as marcas analisadas utilizam os mesmos
reagentes, variando apenas as quantidades de uma
marca para outra. Podemos ressaltar algumas
diferenças consideráveis, como a quantidade de
Peroxidase utilizada no teste de glicose da marca
Roche® (35 UI), muito superior à das demais marcas.
Observou-se também que o mesmo composto é citado
por diferentes nomenclaturas (Tabela 2).
Os analitos proteína, cetona, bilirrubina,
urobilinogênio, leucócitos e pH apresentaram os
mesmos reagentes em todas as marcas analisadas. Para
o analito densidade observa-se que o componente Azul
de Bromotimol está presente em todas as marcas,
porém algumas apresentam um segundo componente
90
e outras não. Na análise da glicose todas as marcas
utilizam a Peroxidase e a Glicose Oxidase; as marcas
Bioeasy®, Cortez® e Sensitive® apresentam como
terceiro componente o Iodeto de potássio. As marcas
Labtest® e Prodimol® apresentam o-toluidina e a
marca Roche®, Tetrametilbenzidina (Tabela 2).
Quando analisada a presença de sangue, todas as
marcas utilizam como reagente principal a
Tetrametilbenzidina. As marcas Standard®, Sensitive®,
Prodimol®, Cortez®, Bioeasy® e Labtest®
apresentam como reagente secundário o hidroperóxido
de cumeno e a marca Roche®, o dimetil hidroperoxi
hexano (Tabela 2).
Na análise de nitrito as marcas Cortez®, Roche®,
Sensitive®, Bioeasy® e Standard® continham
sulfanilamida. As marcas Labtest® e Prodimol®
continham ácido sulfanílico. Concomitantemente, as
marcas Standard®, Prodimol®, Labtest® e Roche®
apresentaram derivados de quinoleína e a Sensitive®,
dicloridrato-N-etilenodiamônio (Tabela 2).
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
Tabela 2 – Reagentes utilizados na detecção de cada um dos analitos conforme descrito pela bula das tiras
reagentes de urina.
Labtest
Roche
Bioeasy
Ácido Ascórbico
0,7% diclorofenolindofenol
-
0,3% 2,6-diclorofenolindofenol
Glicose
2,1% glicose oxidase
0,9% peroxidase
5,0% o-toluidina
3,1% sal de diazônio
2,0% nitroprussiato de sódio
2,8% azul de bromotimol
6 UI glicose oxidase
35 UI peroxidase
103,5µg tetrametilbenzidina
16,7µg sal de diazônio
157,2µg nitroprussiato de sódio
36µg azul de bromotimol
182,8µg ácido etilenoglicoldiamino-etilétertetracético
2,0% tetrametil benzidina diHCl
21,0%
hidroperóxido
isopropilbenzol
2,0% vermelho de metila
10,0% azul de bromotimol
1,5% glicose oxidase
0,5% peroxidase
10% iodeto de potássio
0,5% sal de diazônio
5% nitroprussiato de sódio
2,5% azul de bromotimol
25% hidróxido de sódio
55% metilvinil éter/maleico anidrida
4% tetrametil benzidina
Bilirrubina
Cetona
Densidade
Proteína
Urobilinogênio
Nitrito
0,2% azul de tetrabromofenol
3,6% sal de diazônio
1,9% ácido sulfanílico
1,5% tetrahidrobenzenoquinolinol
52,8µg tetrametilbenzidina
297,2µg
dimetildihidroperoxihexano
1,2µg vermelho de metila
13,9µg azul de bromotimol
8,6µg fenolftaleína
13,9µg azul de tetrabromofenol
67,7µg sal de diazônio
29,1µg sulfanilamida
33,5µg hidroxitetrahidrobenzoquinoleína
Leucócitos
0,4% carboxilatos heterocíclicos
0,2% sal de diazônio
15,5µg éster de indoxil
5,5µg sal de diazônio
Cortez
Prodimol
Sensitive
Standard
5,8% cloreto férrico
1,2% dipiridil
4,9% DTPA
16,3% glicose oxidase
0,6% peroxidase
7% iodeto de potássio
-
-
-
3,2 UI glicose oxidase
0,2 UI peroxidase
65µg o-toluidina
63µg glicose oxidase
10µg peroxidase
41µg iodeto de potássio
0,4% sal de diazônio
7,7% nitroprussiato de sódio
2,8% azul de bromotimol
28,2% hidróxido de sódio
69%
metilvinil
éter/maleico
anidrida
4% tetrametlbenzidina
6,6% hidroperóxido de cumeno
0,2% vermelho de metila
2,8% azul de bromotimol
26µg sal de diazônio
116µg nitroprussiato de sódio
12µg azul de bromotimol
295µg copolímero
42µg sal de diazônio
153µg nitroprussiato de sódio
17µg azul de bromotimol
13µg nitrito de sódio e sal de
diazônio
190µg nitroprussiato de sódio
18µg azul de bromotimol
59µg tetrametil benzidina
253µg hidroperóxido de cumeno
2,8µg vermelho de metila
10µg azul de bromotimol
20µg tetrametilbenzidina
353µg hidroperóxido de cumeno
0,6µg vermelho de metila
13µg azul de bromotimol
12µg tetrametilbenzidina
5µL hidroperóxido de cumeno
1,4µg vermelho de metila
9µg azul de bromofenol
Proteína
Urobilinogênio
Nitrito
0,3% azul de tetrabromofenol
2,9% p-dietilaminobenzaldeido
1,4% ácido p-arsanilico
7,5µg azul de tetrabromofenol
28µg sal de diazônio
80µg ácido sulfanílico
20µg azul de tetrabromofenol
26µg dimetilminoenzaldeído
56µg ácido p-arsanílico
Leucócitos
0,4% derivado de indoxil éster
0,2% sal de diazônio
25µg derivado de quinoleína
10,6µg carboxilato
4,4µg sal de diazônio
3,6µg azul de tetrabromofenol
189µg sal de diazônio
20µg sulfanilamida
10µg
dicloridrato-Netilenodiamônio
296µg derivado de éster naftil
148µg sal de diazônio
Sangue
pH
Ácido Ascórbico
Glicose
Bilirrubina
Cetona
Densidade
Sangue
pH
6% hidroperóxido de cumeno
0,5% vermelho de metila
5% azul de bromotimol
0,3% azul de tetrabromofenol
2,5% p-dietilaminobenzaldeido
4,5% ácido p-arsanilico
0,5%
aminoácido-éster-pirrole
derivado
0,4% sal de diazônio
10µg tetrahidrobenzoquinolina
9µg fenilpirrol derivado
7µg sal de diazônio
As quantidades apresentadas são encontradas em cada cm2 de tira reagentes. No caso das apresentações em porcentagem (%) o diluente utilizado é um tampão.
Fonte: Elaborada pelos autores.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
91
CEZAR et al.
Intervalo de leitura
Na Tabela 3 são apresentados os intervalos de
leitura especificados nas bulas das tiras reagentes das
marcas Roche®, Prodimol® e Standard®. As demais
marcas não mencionaram essas informações na bula.
Os significados das legendas para os analitos bilirrubina
e cetonas não são citados, na bula, pela marca Roche®.
Observou-se que existem algumas diferenças entre
as três marcas já citadas, relacionadas às legendas
utilizadas. A marca Standard® utiliza as legendas
"traços", "+", "++" e "+++". Já a marca Roche® não
utiliza a legenda "traços", porém acrescenta "++++", e
a marca Prodimol® utiliza até três cruzes, porém sem
o uso da legenda "traços" (Tabela 3).
Conforme podemos observar na Tabela 3, na
comparação das bulas com relação à glicose, percebese que há uma diferença considerável, onde "+" para a
marca Roche® representa 50 mg/dL e, para a marca
Standard®, 250 mg/dL. Ao final, a presença de 1000
92
mg/dL de glicose na urina analisada é demonstrada pela
marca Roche® como "++++", e pela marca
Standard®, como "+++" (Tabela 3).
Quanto ao analito ácido ascórbico, não podemos
fazer comparações. Isso porque apenas uma das três
marcas que mencionavam os intervalos de leitura na
bula trabalha com a dosagem desse composto. Já para
pH, densidade, nitritos, proteínas, leucócitos e
urobilinogênio, a tendência segue semelhante entre as
três marcas analisadas (Tabela 3).
No parâmetro sangue também há diferenças entre
a marca Roche® e as outras, em que a quantidade
de 250 células/µL equivale à legenda "++++" e, nas
outras marcas, a mesma concentração de células
equivale à legenda "+++". Já para cetonas, a marca
Standard® estabelece como "+++" a concentração
de 100 mg/dL, enquanto para a marca Prodimol®
essa mesma legenda se refere a 300mg/dL de cetonas
(Tabela 3).
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
Tabela 3 – Intervalos de leitura para os diferentes analitos, descritos nas bulas.
Roche
Bilirrubina
Cetona
Densidade
Sangue
pH
Proteína
Urobilinogênio
Nitrito
Leucócitos
Standard
-
-
(-) 0mg/dL
(+) 50mg/dL
(++) 100mg/dL
(+++) 300mg/dL
(++++) 1000mg/dL
(-)
(+)
(++)
(+++)
(-)
(+)
(++)
(+++)
Negativo
50mg/dL
150mg/dL
500mg/dL
1000mg/dL
(-) 0mg/dL
(+) 1mg/dL
(++) 2mg/dL
(+++) 4mg/dL
(-) 0mg/dL
(+) 25mg/dL
(++) 100mg/dL
(+++) 300mg/dL
(-) 0
(+) 5-10/µL
(++) 25/µL
(+++) 50/µL
(++++) 250/µL
(-) 0mg/dL
(+) 30mg/dL
(++) 100mg/dL
(+++) 500mg/dL
0 (negativo)
entre 5-10/µL
cerca de 50/µL
cerca de 250/µL
(-) 0mg/dL
(+) 30mg/dL
(++) 100mg/dL
(+++) 500mg/dL
(-) 0mg/dL
(+) 1mg/dL
(++) 4mg/dL
(+++) 8mg/dL
(++++) 12mg/dL
(-) / (+)
negativo
(+) 10-25/µL
(++) 75/µL
(+++) 500/µL
Normal
2mg/dL
4mg/dL
8mg/dL
12mg/dL
(-) / (+)
Negativo
25/µL
75/µL
500/µL
Ácido Ascórbico
Glicose
Prodimol
(-) 0mg/dL
(+) 10mg/dL
(++) 25mg/dL
(+++) 50mg/dL
(-) 0mg/dL
(traços) 100mg/dL
(+) 250mg/dL
(++) 500mg/dL
(+++) 1000mg/dL
(-) 0mg/dL
(+) 0,5mg/dL
(++) 1mg/dL
(+++) 3mg/dL
(-) 0mg/dL
(traços) 5mg/dL
(+) 10mg/dL
(++) 50mg/dL
(+++) 100mg/dL
(-) 0
(+) 10/µL
(++) 50/µL
(+++) 250/µL
(-) 0mg/dL
(traços) 10mg/dL
(+) 30mg/dL
(++) 100mg/dL
(+++) 300mg/dL
(-) 0,1mg/dL
(traços) 0,1 - 1,0
(+) 1mg/dL
(++) 4mg/dL
(+++) 8mg/dL
(-) / (+)
negativo
(+) 25/µL
(++) 75/µL
(+++) 500/µL
Fonte: Elaborada pelos autores.
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93
CEZAR et al.
Interferentes
Outro importante elemento a ser descrito nas bulas
de tiras reagentes são os possíveis fatores que podem
interferir nos resultados. Abaixo e na Tabela 4 estão
apresentados, separadamente para cada analito, os
interferentes citados pelas diferentes marcas.
Sangue – A bula da marca Prodimol® cita como
possíveis interferentes na detecção de sangue na urina
produtos de limpeza contendo oxidante, como o
hipoclorito de sódio. Já a marca Biocolor® cita que
infecções do trato urinário podem vir a causar falsos
positivos, devido à presença de peroxidase bacteriana.
As marcas Labor import e Sensitive®, além dos
interferentes citados acima, mencionam também que a
presença dos fármacos Lodine e Captopril pode induzir
a um resultado falso negativo. A marca Standard®
acrescenta também a interferência de ácido ascórbico,
em concent rações superiores a 50 mg/dL,
ocasionando resultados falsos negativos. Cortez®
declara que ácido ascórbico em altas concentrações e
densidade alta leva a resultados falsos negativos e
infecções do trato urinário, a resultados falsos positivos.
Além de todos os parâmetros já mencionados acima,
a Labtest® cita ainda como interferente a presença de
formaldeído e mioglobinúria, causando falsos positivos;
e proteína, ácido úrico, ácido gentísico e nitritos em
altas concentrações ocasionando falsos negativos. A
bula da marca Roche® não mencionou interferentes
para este analito (Tabela 4).
Densidade – As marcas Roche® e Biocolor®
mencionam a interferência de proteínas em quantidades
moderadas e de cetoacidose levando ao aumento da
densidade. As marcas Cortez®, Sensitive®, Labor
import, Labtest® e Standard® citam a interferência
das proteínas levando ao aumento da densidade e do
pH levando à diminuição. A marca Prodimol®, além
desses fatores, menciona também que concentrações
de glicose superiores a 1000 mg/dL impedem a
interpretação da leitura da densidade (Tabela 4).
Urobilinogênio – A marca Labor import cita que a
94
presença de formaldeído, ácido aminosalicílico,
sulfonamidas e ácido aminobenzóico interfere na
determinação desse analito. Além desses, a presença
de corantes pode ocasionar resultados falsamente
positivos. A marca Prodimol® menciona a interferência
dos corantes e também da exposição da urina à luz,
que pode causar resultados falsos negativos devido à
oxidação do urobilinogênio presente na amostra. A
marca Labtest® apresenta como interferentes todos
os já citados anteriormente e acrescenta também a
interferência de nitrofurantoína, riboflavina,
fenazopiridina e beterraba, levando a resultados
falsamente positivos. Biocolor® cita a interferência dos
mesmos fatores mencionados pela Labor import,
porém não menciona a intereferência de corantes. Na
bula da marca Sensitive® é mencionada a interferência
de formaldeído e de corantes; na da marca Cortez®
são citadas as interferências de corantes, ácido
aminosalicílico e de sulfonamidas; e da marca
Standard® a interferência de formaldeído, ácido
aminosalicílico e de sulfonamidas. A Roche® não
menciona na bula possíveis interferentes para esse teste
(Tabela 4).
Bilirrubina – A Labtest® menciona na bula a
interferência de ácido ascórbico e nitrito em
concentrações elevadas e a exposição à luz como
causadores de resultados falsos negativos. E a presença
de urobilinogênio elevado e de medicamentos como a
fenazopiridina, fenotiazina e clorpromazina, causando
resultados falsamente positivos. As marcas Sensitive®,
Cortez®, Biocolor® e Labor import citam a
interferência do ácido ascórbico e de medicamentos.
A marca Prodimol® menciona como interferentes a
exposição à luz, ácido ascórbico e nitritos elevados e
corantes. Já a marca Standard® menciona apenas o
ácido ascórbico e os nitritos. A bula da tira reagente
da marca Roche® não cita nenhum dos interferentes
acima mencionados (Tabela 4).
Proteína – Prodimol® cita como interferentes
medicamentos com quinino, resíduos de desinfetantes,
infusão com polivinilpirrolidona e urina alcalina, levando
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
a resultados falsamente positivos. Já os corantes
causariam resultados falsamente negativos. A Labtest®
refere-se aos mesmos interferentes citados acima,
porém acrescenta que resíduos de detergentes
poderiam causar resultados falsamente negativos.
Cortez®, Labor import e Bioeasy® mencionam apenas
resíduos de desinfetantes e amostras alcalinas. Além
destes, a Bioeasy® cita que amostras com densidade
alta podem levar a falsos resultados negativos. A marca
Roche® ressalta a interferência de resíduos de
desinfetantes e infusões com polivinilpirrolidona. A
Sensitive® cita o pH alcalino como único interferente.
Standard® menciona na bula que resíduos de
desinfetantes causariam resultados falsamente positivos
e que o pH alcalino, em contraposição às demais
marcas, causaria resultados falsamente negativos
(Tabela 4).
Glicose – Bioeasy® e Labor import citam que urinas
com densidade alta e grande quantidade de ácido
ascórbico poderiam apresentar resultados falsamente
negativo e que a variação de temperatura também pode
vir a prejudicar o teste. Além dos fatores já citados, a
Sensitive® acrescenta a interferência de cetonas. A
Prodimol® menciona a interferência do ácido ascórbico
e de ácido gentísico ocasionando resultados falsamente
negativos e a interferência de produtos de limpeza a base
de oxidantes gerando resultados falsamente positivos.
Cortez® concorda com relação à interferência de altas
concentrações de ácido ascórbico, cetonas e variações
de temperatura. Por fim, Labtest® concorda com os
interferentes citados por Prodimol®; e acrescenta ainda
a interferência de amostras com pH alcalino, presença
de formaldeído e ácido úrico. Roche® e Standar® não
apresentam interferentes para este parâmetro na bula
do produto (Tabela 4).
Cetona – A interferência de fenilcetonas e de
compostos ftaleínicos é mencionada pelas marcas
Roche®, Prodimol®, Cortez® e Labtest®. A
Roche® e a Biocolor® citam também a interferência
de grupos sulfidril causando reações falsamente
positivas. Sensitive®, Labor import, Labtest®
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
acrescentam o resultado falso positivo causado pela
presença de metabólitos de levodopa e de urina com
densidade alta. Labor import acrescenta também a
int erferência de amo st r as com pH baixo.
St andard® menciona que resultados falsos
positivos podem ser ocasionados pela presença de
captopril, ácido fenilpirúvico, fenilsulfonaftaleína e
2-mercaptoetanosulfônico (Tabela 4).
Leucócitos – Bioeasy® menciona que a densidade, a
glicose, as proteínas e o ácido oxálico elevados, junto
à presença de tetraciclina, cefalexina e cefalotina,
ocasionam resultados falsamente negativos. A Labtest®
acrescenta, além de todos os fatores citados acima,
também a presença de gentamicina como interferente.
E menciona que a presença de formaldeído, de
corrimento vaginal e de resíduos de agentes oxidantes
pode gerar resultados falsamente positivos. As marcas
Cortez® e Roche® falam da interferência da
cefalexina, gentamicina, proteínas e glicose inibindo a
reação química de mudança de cor. E a Roche®
menciona também a potencialização da reação pelo
formaldeído, meropenem, imipenem e ácido
clavulânico. A marca Standard® acrescenta que a
presença de bilirrubina e nitrofurantoína poderiam
causar resultados falsamente positivos. E quanto aos
falsos negativos, assim como Prodimol®, cita a
presença de proteínas e glicose elevadas, cefalexina e
cefalotina. A marca Labor import menciona, como
interferentes, causando falsos positivos, a presença de
formaldeído e corrimentos vaginais. Sensitive® cita a
densidade, glicose, tetraciclina, cefalexina e cefalotina.
Labor Import cita cefalexina, cefalotina, ácido oxálico
e tetraciclina (Tabela 4).
Nitrito – Standard® e Sensitive® citam como
interferente apenas a presença de ácido ascórbico
em altas concentrações. Já Bioeasy® e Labtest®
acrescentam a interferência do pH alto. A Labor
import menciona que, além do ácido ascórbico, a
densidade elevada também pode ocasionar resultados
falsamente negativos. A Prodimol® e a Roche®
apresentam a interferência de antibióticos inibindo a
95
CEZAR et al.
reação e de corantes potencializando-a. A bula da
marca Cortez® não apresentou interferentes para este
analito (Tabela 4).
pH e Ácido ascórbico – Não foram mencionados
interferentes para esses parâmetros nas bulas das
marcas analisadas (Tabela 4).
Tabela 4 – Interferentes para os diferentes parâmetros descritos nas bulas.
Analitos
Falso Positivo
Falso Negativo
Sangue
Infecção do trato urinário, hipoclorito
de sódio, mioglobinúria, formoldeído.
Lodine,
captopril,
ácido ascórbico,
densidade alta, proteínas, ácido úrico, ácido
gentísico, nitritos.
Leucócitos
Formoldeído,
corrimento
vaginal,
hipoclorito de sódio, meropenem,
imipenem,
ácido
clavulânico,
bilirrubina.
Densida alta, glicose, proteínas, ácido
oxálico, cefalexina, cefalotina, gentamicina,
tetraciclina.
Proteínas
Quinino, desinfetantes, urina alcalina,
polivinilpirrolidona.
Corantes, detergentes, densidade alta, pH
alcalino.
Glicose
Hipoclorito de sódio.
Densidade alta, ácido ascórbico, ácido
gentísico.
Cetona
Grupos sulfifril, metabólitos de
levodopa, densidade alta, captopril,
ácido fenilpirúvico, fenilsulfonaftaleína.
Bilirrubina
Urobilinogênio,
fenazopiridina,
fenotiazina, clorpromazina.
Ácido ascórbico, nitrito, exposição à luz.
Urobilinogênio
Corantes, nitrofurantoína, riboflavina,
fenazopiridina.
Exposição à luz.
Nitrito
Corantes.
Densidade
antibióticos.
-
alta,
ácido
Ácido ascórbico
-
-
pH
-
-
Densidade
Proteínas, cetoacidose.
ascórbico,
pH
Fonte: Elaborada pelos autores.
96
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
D ISCUSSÃO
A Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT) padroniza a coleta, armazenamento e
transporte das amostras de urina, e também o exame
microscópico de urina. Porém, com relação ao exame
químico de urina, é mencionado apenas que se deve
seguir a bula das tiras reagentes, sem acrescentar
nenhuma padronização das informações contidas
nestas (ABNT, 2005).
A comparação das oito bulas analisadas mostrou
diferenças entre elas, partindo do fato de que apenas
três delas incluíam o parâmetro "ácido ascórbico".
Quanto aos reagentes utilizados em cada reação, em
geral, todas as marcas utilizam reativos similares, porém
as quantidades não são as mesmas. Mas observou-se
que as bulas, quando comparadas entre elas, utilizam
diferentes formas de indicar a concentração dos
reagentes utilizados. As bulas apresentam inúmeros
interferentes, porém observou-se que em algumas
marcas não são mencionados interferentes que em
outras marcas são citados. Partindo do fato de que a
reação analisada e os reagentes utilizados são os
mesmos, as interferências também deveriam ser as
mesmas, deduzindo mesmo que haja omissão desses
interferentes em algumas bulas.
Quanto às legendas das dosagens semiquantitativas,
observou-se que grande parte das marcas não inclui
essas informações na bula do produto, não
possibilitando uma comparação clara entre elas. Entre
as marcas que puderam ser analisadas nesse
parâmetro, observou-se que os analitos glicose,
bilirrubina, cetonas e sangue não possuíam a mesma
correspondência de concentração e legenda entre as
marcas. O que possivelmente geraria confusões na hora
da interpretação ou até mesmo resultados incorretos.
Devido a tantas patologias relacionadas aos analitos
dosados pelas tiras reagentes de urina, dá-se a
relevância deste trabalho e dos resultados aqui
alcançados, demonstrando a necessidade de
padronizar essas dosagens para que o diagnóstico
clínico possa ser realizado com precisão e,
consequentemente, gerando resultados fidedignos.
Para Kirsztajn (2010), a dosagem da proteína na
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
urina, proteinúria, é de grande importância não somente
pelo fato de ser utilizada como um marcador renal,
como por também ser indicativa de doenças
cardiovasculares. O trabalho considera esse exame
como o principal na detecção precoce de doença renal
crônica (DRC), patologia que vem aumentando sua
incidência cada vez mais. Sodré et al. (2007) salientam
que as tiras reagentes de urina apenas identificam a
dosagem de albumina urinária e não o teor de proteínas
totais, sendo necessário o uso de outros métodos para
uma dosagem mais precisa e confiável. Apesar de as
tiras apenas dosarem a albumina urinária, as marcas
analisadas no presente estudo, em geral, apresentamse similares no que se refere a limites de detecção,
reagentes e intervalos de leitura. Entretanto, quanto aos
interferentes citados, ressalta-se que a marca
Standard® menciona que urinas com pH alcalino
poderiam causar resultados falsos negativos, em total
contradição com as demais marcas, que afirmam ser
falso positivo essa interferência.
As tiras reagentes de urina fazem uma dosagem
semiquantitativa da glicose, a qual é de baixo custo e
fácil realização. Podem ser utilizadas para diagnóstico
e controle de Diabetes Mellitus, porém, a dosagem
de glicose na urina não possui grande importância no
controle da glicemia, já que o aparecimento da glicose
na urina só é observado quando as concentrações
séricas do analito são superiores a 180 mg/dL, em
pacientes com função renal normal (GROSS et al.,
2002). Entretanto, a presença de glicose na urina,
quando não acompanhada de hiperglicemia, é
indicativo de distúrbios na reabsorção tubular. Esses
distúrbios podem estar relacionados a patologias como
a Síndrome de Cushing, hipertiroidismo, doenças
hepáticas, doenças do sistema nervoso central, uso de
corticoesteroides, infecções graves, entre outros
(FUNCHAL et al., 2011). Os intervalos de leitura para
o analito glicose apresentaram legendas diferentes entre
as marcas observadas: a legenda "+++" equivale a 300
mg/dL para a marca Roche® e, para a Standard®, a
mesma simbologia equivale a mais que o triplo da
concentração considerada pela Roche® (1000 mg/
dL). Essas diferenças poderiam levar a interpretações
97
CEZAR et al.
incorretas dos resultados, dificultando a detecção das
patologias acima mencionadas e oferecendo um relativo
risco à saúde dos pacientes.
Já o resultado positivo para nitritos indica a presença
de bactérias gram-negativas na urina, pois estas são
capazes de reduzir o nitrato em nitrito. Logo, essa
dosagem é sugestiva da presença de infecção urinária.
O teste rápido para nitrito urinário, realizado através
das tiras de reagentes, possui razoável precisão e
exatidão quando comparado a outras metodologias
(SATO et al., 2005); porém, conforme observado
neste estudo, pode sofrer interferência de compostos.
Essa interferência não fica clara na comparação entre
as bulas, pois alguns interferentes como antibióticos,
corantes, urina com densidade elevada não são
mencionados por cinco das oito marcas analisadas.
Além disso, a marca Cortez® não menciona nenhum
interferente.
Nesse caso seria fundamental definir quais são os
reais interferentes do teste e em quais concentrações
eles passam a oferecer risco à leitura dos resultados.
Outro ponto verificado pelo estudo se refere ao limite
de detecção desse parâmetro, apresentado pela marca
Standard®, em que sua sensibilidade é 50 vezes menor
do que a marca com maior sensibilidade (Labor import).
Ainda na análise de nitrito, algumas marcas continham
como reagente a sulfanilamida associada à
hidroxitetrahidrobenzoquinoleína ou ao dicloridrato-Netilenodiamônio, enquanto outras apresentam o ácido
sulfanílico associado à quinoleína, também não
deixando claro qual deles seria ideal.
A detecção de bilirrubina na urina é importante para
o diagnóstico de hepatites, cirrose, obstrução biliar e
outras doenças hepáticas. Além disso, essa dosagem
permite a identificação das causas de icterícia
(FUNCHAL et al., 2011). Porém, por meio da análise
das bulas, observou-se que alguns fatores, como a
exposição da amostra de urina à luz, presença de ácido
ascórbico, nitrito e alguns medicamentos, podem levar
a falsos resultados, o que conduziria a conclusões
errôneas. Já o urobilinogênio se encontra aumentado
em doenças hepáticas e estados de desidratação e febril
(STRASINGER, 2000). Neste estudo se observou
98
que as marcas analisadas seguem uma tendência
semelhante quanto aos reagentes utilizados na
detecção, limites de detecção e legendas
semiquantitativas.
A leucocitúria, presença de leucócitos na urina, em
geral refere-se à presença de neutrófilos na urina e
ocorre devido a uma inflamação no trato urogenital,
indicando presença de infecção urinária. Porém, em
alguns casos não infecciosos, como a litíase, a nefrite
intersticial, neoplasias, rejeição de transplantes,
glomerulonefrite, trauma gênito-urinário, contaminação
vaginal, entre outros, se encontra também a presença
de leucócitos (HEILBERG; SEHOR, 2003;
CAMARGOS et al., 2004). Para esse analito, os limites
de detecção e intervalos de leitura mostraram-se
bastante semelhantes entre as bulas, apresentando
apenas uma marca com sensibilidade inferior as demais.
A semelhança entre as marcas contribui para a
elaboração de um laudo mais fidedigno.
A presença de hemácias íntegras na urina, hematúria,
está relacionada a distúrbios urogenitais ou renais,
como tumores, traumatismos, cálculos renais,
pielonefrite, doenças glomerulares, exercício físico
intenso, exposição a drogas e produtos tóxicos e
menstruação. Já a hemoglobina livre, hemoglobinúria,
é originada através da quebra das hemácias, que pode
ocorrer devido a infecções, queimaduras graves,
exercícios físicos intensos, reações transfusionais e
também em portadores de anemia hemolítica
(FUNCHAL et al., 2011). Nas bulas analisadas, a
dosagem de hemácias se mostrou semelhante entre as
marcas, no que diz respeito aos reagentes utilizados e
ao limite de detecção. Porém, quanto aos intervalos
de leitura, observam-se diferenças nas legendas
semiquantitativas entre as marcas: "+++" para a marca
Roche® refere-se a 50/L; já para a marca
Standard®, a mesma simbologia se refere a cinco vezes
mais (250/L), podendo gerar resultados imprecisos.
A cetonúria é utilizada no diagnóstico da
cetoacidose, complicação aguda típica de pacientes
com Diabetes Mellitus. Essa complicação ocorre
devido à deficiência de insulina, parcial ou total, e pode
desenvolver sintomas leves, como a sonolência, ou até
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Avaliação da compatibilidade entre bulas...
mesmo levar ao coma (FREITAS-FOSS; FOSS,
2003). A cetonúria elevada pode ser observada
também em casos de carência alimentar e de
desidratação (FUNCHAL et al., 2011). Considerando
a importância da detecção da cetonúria, se faz
necessário destacar um ponto apresentado neste
trabalho: o risco de interpretação incorreta da leitura
da cetona presente na urina, principalmente quando
esta estiver elevada. Isso porque uma das marcas nos
mostra "+++" equivalendo a 100 mg/dL, enquanto
outra interpreta a mesma simbologia como o triplo da
concentração (300 mg/dL). Já as demais marcas não
apresentam intervalos de leitura para esse parâmetro
em suas bulas, o que também não se considera ideal.
Valores alterados de densidade são observados em
pacientes com Diabetes Mellitus, diabetes insipidus e
hiperaldosteronismo, casos em que há perda da
capacidade de concentrar a urina. Pacientes com
desidratação também apresentam densidade específica
abaixo do normal (STRASINGER, 2000). Além disso,
observamos no presente estudo que amostras com
densidade alterada podem interferir na dosagem dos
demais analitos, ocasionando falsos resultados. Já os
valores de pH alterados podem auxiliar no diagnóstico
de algumas doenças, como a acidose e alcalose
respiratória. Além disso, a medida do pH é importante
no tratamento de distúrbios e de infecções urinárias,
em que se deve manter um pH urinário dentro de uma
faixa ideal. Pode-se utilizar a medida do pH também
no auxílio da identificação de cristais presentes na urina.
Por fim, um pH incompatível com o de substâncias
químicas inorgânicas presentes na urina pode ocasionar
a precipitação das mesmas e levar a formação de
cálculos renais (FUNCHAL et al., 2011). As bulas
das tiras reagentes citam também que urinas com pH
alcalino podem dificultar a dosagem de proteínas de
forma precisa, gerando resultados falsamente elevados,
e urinas com pH ácido prejudicam a dosagem de
cetonas.
A detecção de ácido ascórbico na urina não é
utilizada como diagnóstico, já que este composto não
é patológico. Porém, utiliza-se sua dosagem como
referência nas determinações de sangue e glicose, pois
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
a presença de ácido ascórbico na urina pode interferir
nas dosagens destes, ocasionando resultados alterados
(STRASINGER, 2000). A afirmação pode ser
confirmada no presente estudo, onde, além de
encontrarmos a interferência deste composto na
dosagem de sangue e glicose, foi mencionada a
interferência deste também na dosagem de bilirrubina
e nitritos.
CONCLUSÃO
Levando-se em conta a importância clínica do
exame qualitativo de urina e a necessidade de que este
seja realizado com agilidade e precisão, faz-se relevante
as considerações realizadas neste trabalho.
Demonstrando ser fundamental a necessidade de
padronização dos aspectos envolvidos nesse tipo
exame, bem como as informações contidas nas bulas
quanto à definição dos reais interferentes, e em quais
concentrações eles passam a oferecer risco à leitura
dos resultados. Também se torna necessária a
equiparação entre as legendas e simbologias utilizadas,
permitindo a igualdade da interpretação dos resultados
independentes do local, analista ou marcas de reagentes
utilizados na análise. Evitando-se, assim, possíveis
diagnósticos incorretos.
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STRASINGER, S.K. Uroanálise e Fluídos
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RECEBIDO EM 10/6/2011
ACEITO EM 29/7/2011
100
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
QUALIDADE: UMA REVISÃO DA LITERATURA NO ÂMBITO DE
ENCONTROS DE MARKETING
CARPEJANI, Eduardo; AGUIAR, Wellington; ROSSI, Guilherme; TERRA, Natália; TROCCOLI, Irene
Raguenet. Universidade Estácio de Sá, Mestrado em Administração e Desenvolvimento Empresarial. Av.
Presidente Vargas, 642, 22.º andar - Centro. CEP: 20071-001 - Rio de Janeiro - RJ. Tel: (21) 2206-9741/9743.
E-mail: [email protected].
PALAVRAS-CHAVE: Revisão da literatura; Qualidade; Percepções; Comportamento do consumidor.
ABSTRACT
The quality construct has been widely researched in the marketing literature focused on understanding the gap
between what consumers expect and what is actually perceived. This paper presents a literature review of the
20 articles presented at the four Encontros de Marketing (EMAs) sponsored by Associação Nacional dos
Cursos de Pós-Graduação em Administração (ANPAD), which mentioned the word quality in their titles. The
alternative constructs most widely used to support the studies were satisfaction and loyalty / trust / commitment;
and the studies that were analyzed seldom contained similar references. As a suggestion for future studies, a
similar research in the context of the Encontros da ANPAD is proposed.
KEYWORDS: Literature review; Quality; Perceptions; Consumer behavior.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
101
artigo de revisão
RESUMO
O construto qualidade tem sido amplamente pesquisado na literatura acadêmica de Marketing voltada para a
busca pelo entendimento dos fatores causadores do hiato entre o que espera o consumidor e o que é de fato
percebido. O presente artigo traz levantamento bibliográfico relativo aos 20 artigos apresentados nos quatro
Encontros de Marketing (EMAs) promovidos pela Associação Nacional dos Cursos de Pós-Graduação em
Administração (Anpad), que continham a palavra qualidade no título. Verificou-se que os construtos
subsidiariamente mais utilizados para suportar os estudos foram satisfação e lealdade/confiança/comprometimento
e que, dentre os trabalhos analisados, raramente houve similaridade nos referenciais. Como sugestão para
futuros estudos, propõe-se pesquisa semelhante no âmbito dos encontros da Anpad.
CARPEJANI et al.
INTRODUÇÃO
Os estudos acadêmicos de Marketing que versam
sobre a percepção de qualidade por parte do
consumidor, em sua ampla maioria, enfocam o mercado
de serviços. De fato, a quantidade de monografias, de
dissertações, de teses e de artigos científicos
produzidos sobre a percepção de qualidade no
consumo de serviços é infinitamente maior do que
aquela que se observa para o caso de produtos físicos.
Pode-se supor que tal se deva a dois fatores. O
primeiro seria a grande contribuição que autores como
Zeithaml, Bitner e Gremler (2011), Bitner (1992) e
Lovelock e Wirtz (2006) garantiram à disciplina
Marketing de Serviços, ao se lançar em pesquisas que
deram origem a livros didáticos e a artigos acadêmicos
de elevada qualidade. E estes, sem dúvida,
contribuíram para despertar o interesse dos estudantes
e pesquisadores de Administração de Empresas no
estudo desse tema – principalmente aqueles estudantes
e pesquisadores versados na abordagem quantitativa,
a partir do esforço bem-sucedido de Zeithaml,
Parasuraman e Berry (1988, 1990) na formatação de
instrumento de medição da qualidade percebida em
serviços, o Servqual.
O segundo fator que explicaria esse interesse tão
disseminado seria a própria intangibilidade dos
serviços. Enquanto uma das características que os
distinguem dos produtos físicos, ela implica uma, por
assim dizer, volatilidade que garante um certo charme
desafiador à busca deste conhecimento – afinal, é
possível se conhecer realmente a qualidade de algo
tão abstrato quanto um serviço? – que parece
retroalimentar as pesquisas que buscam esta resposta.
Uma vez que não limitado à área de serviços, este
artigo busca expandir a baixa oferta de trabalhos de
Marketing com foco em qualidade não restrita ao
segmento terciário da Economia. Com ele, pretendese prover, àqueles que se interessem pelo tema
percepção de qualidade de uma forma geral, uma
amostra de encadeamentos lógicos tratados na área
de Administração de Empresas a respeito deste
assunto. Isso se fez por meio do mapeamento dos
autores – e de suas concepções teóricas e práticas –
102
citados nos referenciais teóricos dos artigos
apresentados nos quatro Encontros de Marketing
(EMAs) promovidos pela Associação Nacional dos
Cursos de Pós-Graduação em Administração (Anpad)
até o ano de 2010, que tenham trazido a palavra
qualidade em seus títulos.
Além desta introdução, o presente artigo traz a
metodologia do estudo, os resultados do levantamento
bibliográfico, as conclusões e, finalmente, sugestões
para futuros estudos.
METODOLOGIA
Inicialmente, levantaram-se os títulos de todos dos
trabalhos apresentados nos quat ro event os
mencionados, e, por meio da ferramenta de busca por
palavra disponível no software Word, buscou-se a
palavra qualidade nos títulos. Essa busca indicou 20
artigos, que foram impressos, e cuja distribuição
temporal foi a seguinte: 1) dois no evento de 2004:
Rodrigo, Pereira e Siqueira (2004); Prado e Santos
(2004); 2) cinco no evento de 2006: Guarita e Urdan
(2006); Marchetti, Prado e Cuperschmid (2006);
Baptista e Mazzon (2006); Durão et al. (2006); Xavier
et al. (2006); 3) sete no evento de 2008: Koetz, Santos
e Kopschina (2008); Torres (2008); Basso et al.
(2008); Lopes, Alves e Leite (2008); Lopes, Alves e
Leite (2008); Rodrigues (2008); Cavalcanti (2008);
4) seis no evento de 2010: Perez e Rodrigues (2010);
Koetz e Costa (2010); Barbosa et al. (2010);
Hernandez et al. (2010); Tinoco, Pereira e Ribeiro
(2010); Cerchiaro e Mota (2010). Em seguida,
identificaram-se os enfoques utilizados pelos autores
em seus referenciais teóricos. Para tanto, utilizou-se o
recurso de observar os subtítulos de seus respectivos
referenciais teóricos, onde normalmente estão
indicados terceiros construtos que compõem a linha
de raciocínio científico relativo à avaliação – ou à
mensuração – da qualidade percebida de um produto
ou de um serviço.
Vale salientar, aqui, duas particularidades nesta
análise: 1) excluiu-se a consideração à palavra
qualidade eventualmente mencionada – isoladamente
ou em conjunto com outra palavra – nos subtópicos,
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Qualidade: uma revisão da literatura...
partindo-se do princípio de que o assunto estaria
implícito no referencial teórico de todos os artigos; 2)
excluíram-se subtópicos que seriam específicos a
instrumentos utilizados para a mensuração da qualidade
percebida, tais como o modelo Servqual – conforme
encontrado em Cerchiaro e Mota (2010) – e a escala
Retail Service Quality, conforme encontrado em Lopes,
Alves e Leite (2008). Quando o artigo analisado não
apresentava esse sistema de utilização de subtítulos
com a indicação dos tópicos abordados no referencial
teórico – como ocorre em Torres (2008) –, buscaramse indicadores internos ao material que esclarecessem
seu embasamento teórico; a tática para tanto foi o exame
do seu conteúdo por meio da leitura, buscando-se
indicações do(s) próprio(s) autor(es) sobre qual teria
sido aquele embasamento.
Em seguida à identificação dos tópicos, foram
selecionados aqueles abordados por pelo menos dois
artigos da amostra total. Em cada um deles foi
levantada a literatura citada, com a indicação dos
nomes dos autores mencionados e uma breve menção
de sua linha de raciocínio resgatada pelo(s) autor(es)
dos 20 artigos.
Vale notar que, como forma de se organizar a
análise dos trabalhos selecionados, foi verificado se
havia, nos respectivos resumos dos 20 artigos da
amostra, a menção a algum outro componente de
Marketing além da qualidade, que também teria sido
utilizado na investigação. Verificou-se que, à exceção
de três artigos, os demais lançaram mão desse recurso,
tendo sido localizados 13 desses componentes (ver
Quadro 1). Os mais utilizados foram satisfação e
lealdade/confiança/comprometimento, em
respectivamente quatro e três artigos. Logo em seguida
na preferência, com dois artigos utilizando-os,
destacaram-se relacionamento, valor, marca,
dramaturgia e propaganda. Com menção em somente
um artigo situaram-se preço, encontros, imagem,
gerenciamento de impressões, emoções, ambiente e
marca.
Quadro 1 – Construtos utilizados nos referenciais teóricos dos 20 artigos com a palavra qualidade no título
apresentados nos EMAs de 2004 a 2010.
Fonte: Elaboração própria, com base nos EMAs.
Após esse esforço, teceram-se considerações finais
sobre o material avaliado, e foram lançadas propostas
de futuros estudos.
RESULTADOS DA REVISÃO DA LITERATURA
Revisão dos artigos que utilizaram a satisfação
Xavier et al. (2006), Lopes, Alves e Leite (2008),
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Rodrigues (2008) e Tinoco, Pereira e Ribeiro (2010)
foram os autores que utilizaram a satisfação para
complementar suas pesquisas sobre qualidade. O foco
de Xavier et al. (2006) situou-se no relacionamento
direto entre satisfação e qualidade, tendo os autores
partido do princípio de que, a partir das expectativas
criadas a respeito de uma determinada oferta de bens
103
CARPEJANI et al.
ou serviços, pode-se considerar que a satisfação traduz
o grau de congruência entre as expectativas e as
consequências da compra. Inicialmente eles se
basearam em Karsaklian (2000), em Boulding et al.
(1993) e em Johnson, Anderson e Fornell (1995),
tendo relembrado que a satisfação pode ser vista
enquanto avaliação de uma experiência particular com
certo produto ou serviço, e enquanto a experiência
total do consumo de um produto ou uso de um serviço
de forma cumulativa. Em seguida, eles remeteram a
Van Raaij (1981) e a Wärneryd (1988), ao
mencionarem que o conceito de satisfação com base
na experiência acumulada é, sob o ponto de vista da
psicologia, equivalente à noção subjetiva de bem-estar,
representando o desempenho atual e no longo prazo.
E, mais adiante, lançaram mão de Bolton e Drew
(1991) e de Parasuraman, Zeithaml e Berry (1988)
para passar à questão de a qualidade de um serviço
ser descrita como uma forma de atitude, relacionada –
mas não equivalente – à satisfação, vez que esta resulta
da comparação entre expectativa e desempenho.
Finalmente, concluindo a discussão a respeito da
satisfação, Xavier et al. (2006) colocam que haveria
uma tentativa dos pesquisadores, como ocorre nos
estudos empíricos de Yu e Dean (2001), de verificar
se sua gênese partiria de fatores afetivos ou cognitivos.
O segundo artigo que também trabalhou a
satisfação foi o de Lopes, Alves e Leite (2008). De
forma sucinta, eles inicialmente utilizam Láran (2003),
que definiu a satisfação em dois grupos – como
resultado de um processo e como uma parte de um
processo –, com os aspectos cognitivos e afetivos dos
julgamentos de satisfação sendo ressaltados no
processo. Em seguida, mencionam Yi (1990) e
Semenik e Bamossy (1996) para quem a satisfação é
um julgamento que o consumidor faz depois de um
encontro com o fornecedor de serviços ou de produtos.
O referencial teórico do artigo de Rodrigues (2008)
inicialmente cita Rossi e Braga (2004), salientando a
necessidade de se interrogar diretamente o cliente e
de se medir formalmente o seu grau de (in)satisfação,
na busca pela convergência entre qualidade oferecida
pelo produtor e percebida pelo cliente. Mencionando
104
Albrecht (1998) e Kotler (2000), a autora frisa que as
empresas que se sobressaem são aquelas que
conhecem as expectativas e as necessidades de seus
clientes. Ela se preocupa também em buscar, na
literatura, autores que diferenciaram qualidade de
satisfação; isso foi encontrado em Machado (2004),
para quem satisfação seria um julgamento de qualidade
ao longo do tempo, e em Anderson, Fornell e Lehman
(1994), para quem a avaliação da satisfação depende
de uma experiência com o serviço – diferentemente
do que ocorre com a percepção de qualidade –, assim
como do valor e da percepção do consumidor no
momento do consumo.
Finalmente, o último artigo a tratar da satisfação
em seu referencial teórico foi o de Tinoco, Pereira e
Ribeiro (2010). Inicialmente referindo-se a Oliver
(1980, 1993), os autores lembram que ele foi um dos
primeiros autores a propor um modelo de satisfação
do cliente baseado no paradigma da desconfirmação
das expectativas. Em seguida, eles se preocupam em
ressalvar que Churchill e Surprenant (1982), Bearden
e Teel (1983) e Tsiros, Mittal e Ross. (2004) avaliaram
e confirmaram esse modelo, assim como salientam que
outros determinantes foram estudados e incluídos nos
modelos de satisfação dos clientes por parte de Spreng,
Mackenzie e Olshavsky (1996), de Olshavsky e
Kumar (2001), de Andreassen e Lindestad (1998),
de Bei e Chiao (2001) e de Liang e Zhang (2009). A
pesquisa a respeito da determinação da satisfação dos
clientes, principalmente pela qualidade percebida,
também é objeto da revisão da literatura nessa pesquisa
– com base em Choi et al. (2004) e em Jiang e Wang
(2006) –, assim como pelo valor, com base em
Whittaker, Ledden e Kalafatis (2007) e em Vlachos e
Vrechopoulos (2008). Os autores aproveitam para
lembrar um trabalho anteriormente realizado por dois
deles (TINOCO; RIBEIRO, 2007), em que é proposta
uma abordagem para a modelagem da satisfação de
clientes de serviços a partir da identificação das
relações entre alguns destes múltiplos determinantes
encontrados na literatura: imagem corporativa,
desconfirmação de expectativas, emoções vivenciadas,
desejos pessoais, expectativas, qualidade percebida,
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Qualidade: uma revisão da literatura...
valor percebido, satisfação e preço do serviço.
Revisão dos artigos que utilizaram lealdade e
ou confiança e ou comprometimento
Baptista e Mazzon (2006), Basso et al. (2008) e
Torres (2008) foram os autores que utilizaram lealdade
e ou confiança e ou comprometimento para
complementar suas pesquisas sobre qualidade.
Baptista e Mazzon (2006) iniciam sua revisão
bibliográfica apontando Rosenberg e Czepiel (1983)
e Andreassen e Lindestad (1998) enquanto autores
que se preocuparam em mostrar a necessidade de se
perseguir a retenção dos clientes, conceito intimamente
relacionado à lealdade do consumidor. Já este último
é por eles apresentado como elemento complexo há
muito estudado sob as abordagens comportamental e
atitudinal, tal como fizeram Mowen (2003), Assael
(1998), Seth el al. (2001), Neal (1999), Lawrance
(1969), Tucker (1964), Blattberg e Sem (1976), e
Wind e Frank (1967). Em seguida eles passam à
discussão sobre a importância de se distinguir a
lealdade verdadeira da lealdade espúria, recorrendo a
Bennett e Rundle-Thiele (2002) e a Day (1969). Mais
à frente, relembram o papel dos processos cognitivos
e afetivos na geração de preferências com base em
Oliver (1999) e em Jacoby e Kyner (1973), chegando
em seguida ao estudo de Dick e Basu (1994), que
parte de uma abordagem composta em que está
proposta uma estrutura conceitual para compreender
melhor a dinâmica da lealdade dos consumidores.
O estudo da lealdade do cliente leva Baptista e
Mazzon (2006) a abordarem também Seth e Park
(1974), cuja pesquisa destacou os aspectos cognitivos,
afetivos e conativos da atitude enquanto determinantes
da lealdade, composta de três dimensões distintas que,
se combinadas, podem resultar em sete diferentes tipos
de lealdade à marca. Eles lembram que esse enfoque
misto de comportamento de recompra com atitude
também foi utilizado por Baldinger e Rubinson (1996),
cuja proposição de outra tipologia contribuiu
academicamente ao trazer evidências empíricas de que
a lealdade atitudinal contribui tanto para a manutenção
como para a geração da lealdade comportamental. Já
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
completando sua revisão bibliográfica, Baptista e
Mazzon (2006) abordam o fato de que realizar novas
transações com a empresa é aspecto muito importante
(ou mesmo indissociável) da existência de lealdade,
pois se encontra no cerne da própria definição que
diversos autores apresentam para a lealdade. Assim,
o questionamento direto ao cliente dessa intenção de
recompra se configura em indicador usual para
mensuração da lealdade, ainda que se caracterize como
um est imador possivelment e enviesado da
probabilidade efetiva de recompra, conforme
pesquisaram diversos autores: Prado (2004),
Gonçalves Filho et al. (2003), Lau e Lee (2002),
Bloemer e Odekerken-Schröder (2002), Santos e
Rossi (2002), Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002),
Srinivasa, Anderson e Ponnavolu (2002), Bei e Chiao
(2001), Bloemer, Chaudhuri e Holbrook (2001),
Mathwick, Malhotra e Rigdon (2001), Urdan e Zuniga
(2001), Cronin, Brady e Hult (2000), Pritchard, Havits
e Howard (1999), Sirohi, McLaughlin e Wittink (1998),
Taylor e Baker (1994), e Zeithaml, Berry e
Parasuraman (1996).
Finalmente, ao encerramento, Baptista e Mazzon
(2006) remetem a autores que vinculam a lealdade a
uma predisposição para comunicação boca a boca
positiva por parte do cliente: Cortimiglia et al. (2003);
Nijssen et al. (2003); Santos e Rossi (2002); Verhoef,
Franses e Hoekstra (2002); Cronin, Brady e Hult
(2000) e Yu e Dean (2001).
O segundo artigo selecionado que constrói seu
referencial teórico ancorado na lealdade é o de Basso
et al. (2008), que ampliam sua pesquisa incorporando
mais dois elementos afins a este: confiança e
comprometimento. Dentre os autores utilizados no que
diz respeito à lealdade se destacam, além de clássicos
como Oliver (1999), Newman e Werbel (1973), Day
(1970) e Dick e Basu (1994), obras mais recentes.
Dentre estas, um dos destaques é a de Laran e Espinoza
(2004), que confirmaram empiricamente que o índice
de recompra nem sempre indica lealdade à empresa: a
compra pode ter sido em função de outros fatores,
como preço, conveniência ou até mesmo lealdade a
mais de uma marca. Também é resgatado o trabalho
105
CARPEJANI et al.
de Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002), para quem
confiança, percepção de valor e satisfação são
consideradas antecedentes da lealdade. Mais adiante,
Basso et al. (2008) referem-se ao trabalho de Gounaris
e Stathakopoulos (2004), que classificaram quatro
tipos de lealdade – a não lealdade, a cobiça à lealdade,
a lealdade inercial e a lealdade premium – e ao de
Hennig-Thurau e Klee (1997), para quem a qualidade,
a confiança e o comprometimento se relacionam entre
si e são capazes de, direta ou indiretamente, influenciar
a lealdade do consumidor.
Passando ao estudo da confiança, Basso et al.
(2008) recorrem a Perin et al. (2004), a Moorman,
Zaltman e Deshpandé (1992), a Morgan e Hunt
(1994), a Gabarino e Johnson (1999) e a Masterson
et al. (2000) para lembrar que ele passou a
desempenhar fundamental importância para as
organizações devido à maior percepção de risco e
incerteza para os clientes. E que, principalmente sob a
ótica dos serviços, a confiança é tratada como um
antecedente da lealdade, por representar a integridade
e a dignidade percebidas por um parceiro no outro,
que a faça ser vista como um ingrediente essencial para
o sucesso dos relacionamentos, segundo Berry (1995),
Dwyer, Schurr e Oh (1987), Moorman, Deshpandé e
Zaltman (1993) e Morgan e Hunt (1994). Em seguida,
Basso et al. (2008) lembram, com base nos trabalhos
de Moorman, Zaltman e Deshpandé (1993) e de Singh
e Sirdeshmukh (2000), que a confiança é vista
geralmente sob dois aspectos: como crença, sentimento
ou expectativa, e como comportamento. Também
pode também ser encarada como um estado
psicológico e como uma escolha de comportamento,
de acordo com Kramer (2000). Já pelo lado dos
clientes de serviços, em que existe forte confiança no
atributo confiabilidade, eles frisam que os benefícios
trazidos pela confiança são importantes, conforme
apontou a pesquisa de Bejou, Ennew e Palmer (1998),
estando o desenvolvimento da confiança intimamente
relacionado à duração do tempo do relacionamento,
segundo Swan e Nolan (1985). Na esteira desse
raciocínio se situam os trabalhos de Lagace, Dahlstrom
e Gassenheimer (1991), Morgan e Hunt (1994) e
106
Oakes (1990), que apontam que a confiança é vista
como de considerável importância no processo de
construção e de manutenção de relacionamentos.
Finalmente, no que tange ao comprometimento,
Basso et al. (2008) recorrem a Garbarino e Johnson
(1999), a Sheth e Parvatiyar (1995) e a Morgan e
Hunt (1994) para expor que ele é considerado central
para o estudo do comportamento relacional com o
consumidor, sendo capaz de influenciar a lealdade e
sendo considerado variável-chave em modelos de
relacionamento. Por outro lado, eles também lembram
que a especificação da variável comprometimento
ainda não está clara na literatura, conforme Prado e
Santos (2003), porque alguns autores preferem uma
visão independente, tais como Hennig-Thurau e Klee
(1997), enquanto outros são partidários da vinculação
entre comprometimento e lealdade, tais como Chaudhuri
e Holbrook (2001).
Um outro aspecto resgatado no referencial teórico
de Basso et al. (2008) diz respeito às consequências
do comprometimento dentro das organizações.
Conforme Morgan e Hunt (1994), essas consequências
incluem o decréscimo de turnover, maior motivação e
aumento do comportamento cooperativo. Em paralelo,
eles lembram que o comprometimento entre um
consumidor e uma organização pode afetar a lealdade,
de modo a criar um sentimento de obrigação entre os
atores, de acordo com Vieira e Damacena (2007), e
que diversos estudos têm encontrado relações entre o
comprometimento e a lealdade, tais como em
Grönroos (1994) e em Pritchard, Havitz e Howard
(1999).
O terceiro e último artigo que trabalha confiança é
o de Torres (2008). Contudo, embora sua proposta
seja a de testar um modelo que avalie as relações entre
qualidade percebida pelo cliente do varejo virtual e
comprometimento, lealdade e confiança, tal esforço é
feito sem uma revisão bibliográfica específica a respeito
desses últimos.
Revisão dos artigos que utilizaram
relacionamento
Prado e Santos (2004) e Marchetti, Prado e
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Qualidade: uma revisão da literatura...
Cuperschmid (2006) foram os autores que utilizaram
o relacionamento para complementar suas pesquisas
sobre qualidade. Embora o propósito de Prado e
Santos (2004) seja, por meio da proposta de modelo
estrutural, enfocar a avaliação da relação entre
empresas e consumidores finais, e os resultados do
processo de relacionamento, os autores o fazem sem
lançar mão de revisão bibliográfica específica a respeito.
O segundo artigo localizado foi o de Marchetti,
Prado e Cuperschmid (2006), cujo propósito é
apresentar um modelo para avaliação da qualidade do
relacionamento em companhias distribuidoras de gás.
Como no caso de Prado e Santos (2004), eles o fazem
sem lançar mão de revisão bibliográfica específica a
respeito do relacionamento.
Revisão dos artigos que utilizaram valor
Guarita e Urdan (2006) e Lopes, Alves e Leite
(2008) foram os autores que utilizaram o valor para
complementar suas pesquisas sobre qualidade. Além
de lançarem mão do construto valor, Guarita e Urdan
(2006) também trabalharam o preço. Inicialmente eles
se preocupam em deixar claro que valor é ainda tratado
de forma ambígua na literatura acadêmica, conforme
pode definir tanto aquilo que o cliente recebe do
fornecedor quanto aquilo que o fornecedor recebe do
cliente, conforme Woodwall (2003), podendo ser
usado de diferentes maneiras, dependendo daquilo que
mais se valoriza, de acordo com Zeithaml (1988),
Holbrook e Corfman (1985) e Gremaud et al. (2003).
Em seguida, os autores lembram a dificuldade de se
conceituar e de se medir o valor percebido, de acordo
com Parasuraman, Zeithaml e Berry (1985, 1988),
Garvin (1992) e Gale (1996). Finalmente, eles chegam
à discussão sobre a relação entre qualidade e valor,
para tanto resgatando as contribuições de Dodds,
Monroe e Grewal (1991) e de Teas e Agarwal (2000).
Depois, eles tocam em outro ponto muito comum na
literatura de Marketing atinente a valor: a diferença entre
qualidade percebida e valor percebido. No caso, eles
lançam mão dos trabalhos de Monroe e Krishnan
(1985) e de Gronroos (2001).
O segundo trabalho que enfoca valor é o de Lopes,
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Alves e Leite (2008). Em sua curta revisão teórica a
respeito, à semelhança de Guarita e Urdan (2006), os
autores resgatam os pontos de vista Woodall (2003),
de Zeithaml (1988), e de Holbrook e Corfman (1985).
E, em seguida, eles utilizam Sirdeshmuck, Singh e Sabol
(2002) para mostrar a variedade de definições a
respeito.
Revisão dos artigos que utilizaram dramaturgia
Durão et al. (2006) e Cavalcanti (2008) foram os
aut ores que utilizaram a dramat urgia para
complementar suas pesquisas sobre qualidade. O
artigo de Durão et al. (2006) estuda encontros de
serviços e as teorias dos papéis e dos roteiros. Ao
rever trabalhos acadêmicos sobre a teoria dos papéis,
os autores enfocam Bitner, Booms e Tetreault (1990),
que dizem que as partes envolvidas no processo de
entrega de um serviço são consideradas responsáveis
por papéis que interpretam durante a interação existente
a cada encontro. Sua primeira preocupação é indicar
que essa teoria deriva da Teoria da Penetração Social,
conforme proposta por Altman e Taylos (1973), da
abordagem da interação social, conforme proposta por
Goffman (1975) e por Simmel (1977, 1990), e de
elementos diádicos da teoria das trocas sociais
(HOMANS, 1961; KELLEY; THIBAUT, 1993),
concentrando seu foco na interatividade dentro de
padrões de trocas sociais. Ademais, Durão et al.
(2008) deixam claro, apoiados em Biddle (1986), que
essa teoria é considerada um movimento – e não uma
escola teórica única – que explica os papéis ao
considerar que pessoas são membros de posições
sociais e que carregam consigo expectativas sobre os
próprios comportamentos e daqueles com quem
interagem. Eles avançam no assunto, explicando que,
das cinco perspectivas da teoria dos papéis apontadas
por Biddle (1986) como existentes na literatura –
funcional, interacionista simbólica, estrutural,
organizacional e cognitiva –, existem dois enfoques
mais divergentes, de acordo com Stryker e Staham
(1985): um de ênfase estruturalista e outro com ênfase
interacionista.
O segundo artigo a utilizar a dramaturgia em seu
107
CARPEJANI et al.
referencial teórico é o de Cavalcanti (2008). Nele, a
autora resgata Grove e Fisk (1989), para quem a
dramaturgia é baseada no comportamento como uma
metáfora dramática e na representação das interações
sociais como teatrais. No caso, as falas de um ator
numa peça seriam representativas de um desempenho
de um papel que é a fonte da motivação do
personagem, sendo que essas motivações podem ser
identificadas como sendo as normas sociais e os
objetivos pessoais que limitam os comportamentos
individuais no dia-a-dia, conforme Grayson e Shulman
(1999). E cada performance dos atores teria uma
intenção de criar uma variedade de reações e
respostas na audiência, de acordo com Baron, Harris
e Harris (2001).
Revendo o conceito de interações sociais a partir
de Babcock (1989), Cavalcanti (2008) explica que se
trata de esforço cooperativo de apresentar um
desempenho aceitável e convincente, no qual o
indivíduo (ou ator) irá promover uma imagem particular
e implicitamente pedir a outros que acreditem no
personagem. Nesse sentido, o ator não está sozinho,
ele está sempre trabalhando em conjunto com a
audiência. E a autora prossegue, fazendo um paralelo
entre a dramaturgia e os encontros de serviços – com
base em John (1996), em Grove e Fisk (1983), em
Grove, Fisk e Dorsh (1998) e em Goodwin (1996) –
, indicando a importância do paralelo entre atuações
teatrais e desempenhos organizacionais trazido pelo
trabalho de Schreyögg e Höpfl (2004).
Revisão dos artigos que utilizaram propaganda
Koetz, Santos e Kopschina (2008) e Koetz e Costa
(2010) foram os autores que utilizaram a propaganda
para complementar suas pesquisas sobre qualidade.
Koetz, Santos e Kopschina (2008) inicialmente alertam
que a forma de abordagem do tema nos estudos de
comportamento do consumidor segue linhas de trabalho
distintas, com destaque para as de Chandy et al.
(2001) e de Vakratsas e Ambler (1999). Em seguida,
os autores baseiam-se em Kirmani e Rao (2000) para
chamar a atenção de que a qualidade dos produtos
das empresas que investem grandes montantes em
108
propaganda é vista pelos consumidores como sendo
boa, muito embora haja estudos – tais como o de
Kirmani (1997) e o de Barone, Taylor e Urbany (2005)
– apontando que existem diversos fatores que atuam
nesse mecanismo.
O segundo trabalho da amostra cujo referencial
teórico aborda a propaganda é o de Koetz e Costa
(2010), mas estudando-a enquanto veículo de
sinalização da qualidade. As autoras indicam,
inicialmente, que Nelson (1974) foi um dos precursores
a analisar a relação entre o volume investido em
propaganda e a informação sobre o produtor ao
público consumidor. Em seguida, elas encerram sua
pesquisa bibliográfica resgatando os trabalhos de
Kirmani e Wright (1989) e de Kirmani (1990), que
analisaram a influência dos investimentos publicitários
na percepção de qualidade dos consumidores.
Revisão dos artigos que utilizaram marca
Perez e Rodrigues (2010) e Hernandez et al.
(2010) foram os autores que utilizaram a marca para
complementar suas pesquisas sobre qualidade. Perez
e Rodrigues (2010) inicialmente mencionam Perez
(2004, 2007) e sua definição de que as marcas são o
elo simbólico de ligação entre as organizações e as
pessoas, com essa construção de identidade
começando com a própria escolha do nome da marca,
e passando pelas diferentes expressividades
mencionadas por Gobé (2003), que a organização
constrói no tempo. Ao final de sua pesquisa
bibliográfica, eles chamam a atenção para os estudos
de gestão de marcas realizados por Aaker (1991), por
Keller (1997) e por Kapferer (1993), além de resgatar
a pesquisa sobre marcas de luxo realizada por Thomas
(2008). Mais à frente eles salientam que há dois
movimentos bastante evidentes em relação às marcas,
conforme apresentado por McCraken (2003): 1) em
direção à diferenciação social, as marcas são o símbolo
do sucesso econômico, do êxito, do status elevado; e
2) em direção à afirmação da identidade, da
autenticidade, da personalização e, muitas vezes, até
da negação à moda.
O segundo artigo da amostra estudada que salienta
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Qualidade: uma revisão da literatura...
marca como suporte em sua pesquisa sobre qualidade
é o de Hernandez et al. (2010). No caso, seu foco é a
extensão de marcas, com foco específico nas marcas
corporativas. Ao explicitarem-no, os autores lançam
mão do estudo de Grime, Diamantopoulos e Smith
(2002), que indicou que extensões de marcas
promovem lembrança imediata, proporcionando uma
forma relativamente fácil e barata para se entrar em
novos mercados. Também aproveitam para relembrar
as pesquisas de Smith e Park (1992), de Balachander
e Ghose (2003) e de Swaminathan, Fox e Reddy
(2001) para afirmar que, além de facilitar a aceitação
do novo produto, a utilização de uma marca conhecida
para o lançamento de produtos e serviços também tem
efeitos benéficos para a marca-mãe: maior eficiência
dos investimentos em propaganda, melhoria da imagem
da marca e o aumento da visibilidade da marca-mãe.
Em seguida, os autores lançam seu foco ao estudo da
extensão de marcas corporativas de serviços. Com
base em Iacobucci (1992), em Iacobucci e Ostrom
(1996), em Rao, Qu e Ruekert (1999), e em Keller e
Aaker (1998), eles indicam ser este estudo
especialmente atraente, por dois motivos: 1) dada a
complexidade e intangibilidade dos serviços, a
aquisição de serviços é percebida como mais arriscada
que a de um produto tangível, e 2) porque a utilização
de uma imagem corporativa bem estabelecida pode
aumentar a credibilidade e facilitar a percepção de
qualidade do novo serviço. Eles também aproveitam
para salientar que tanto Völckner e Sattler (2006)
quanto Bottomley e Holden (2001) já indicaram que
os principais determinantes para a aceitação de uma
extensão de marca são a similaridade percebida entre
a marca e o novo produto e a qualidade da marcamãe. Entretanto, ressaltam que, até à época de seu
levantamento, os estudos anteriores sobre extensões
de marcas de serviços (RUYTER; WETZELS, 2000;
RIEL; LEMMINK; OUWERSLOOT, 2001; LEI;
PRUPPERS; OUWERSLOOT, 2004; PINA et al.,
2006) se haviam abstido de examinar
experimentalmente a extensão de marcas corporativas
de serviços para outras categorias de serviços.
Contudo, Hernadez et al. (2010) salientam que, de
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
acordo com Ruyter e Wetzels (2000), a despeito da
importância do setor de serviços, e de o citado trabalho
de Riel, Lemmink e Ouwersloot (2001) indicar
claramente que há diferenças na avaliação de extensões
de marcas entre produtos tangíveis e intangíveis, a
maior parte dos estudos tem se enfocado no estudo
de produtos tangíveis e em marcas individuais. E
aproveitam para indicar que uma das exceções é o
citado trabalho de Pina et al. (2006).
CONSIDERAÇÕES FINAIS, LIMITAÇÕES E SUGESTÕES PARA
FUTUROS ESTUDOS
A proposta de um artigo de revisão bibliográfica,
como o nome diz, é mostrar quais os autores e as
respectivas linhas de raciocínio foram utilizados em uma
amostra de textos, selecionada a partir de um critério
em especial. Adicionalmente, sua virtude pode ser
expandida a partir de uma avaliação crítica daquilo que
foi encontrado.
Passando-se primeiramente à descrição dos dados
macro que o levantamento indicou, tem-se, como ponto
inicial mais relevante, o fato de que os quatro EMAs
mapeados apresentaram, em seu conjunto, 425 artigos
aprovados, e, destes, tão somente 20 trouxeram o
construto qualidade em seus títulos – ou seja, menos
de 5%. Embora seja provável que outros artigos
veiculados nos eventos possam ter envolvido esse
elemento, embora sem trazê-lo no título, é legítimo
supor-se que poucos o teriam feito sem uma menção
no título. Ou seja, pelo menos no âmbito dos EMAs,
o interesse acadêmico pelos estudos versando sobre
qualidade não parece elevado. A confirmação – ou
não – dessa situação poderia ser obtida em futuros
estudos que mapeassem os construtos de todos os 425
artigos, de forma a verificar quais os mais assíduos, e
comparando-os com a frequência apurada aqui.
A segunda constatação é que muito poucos artigos
se atêm a explorar o construto qualidade de forma
isolada, sem lançar mão de outro(s) que ajude(m) na
construção dos raciocínios. E, dentre esses construtos
auxiliares, o mais utilizado é a satisfação. Esta
preferência faz sentido, tendo em vista ambos os
construtos – satisfação e qualidade – serem
109
CARPEJANI et al.
praticamente complementares na literatura de
Marketing – e, muitas vezes, até confundidos.
Conforme Zeithaml, Bitner e Gremler (2011), em
serviços a satisfação do cliente advém de quatro
fatores: fatores situacionais, preço do serviço, fatores
pessoais, e da percepção do cliente de que o serviço
tem qualidade, sendo esta última entendida como
atitude de longo prazo, que reflete a avaliação de
percepções de serviços realizados em pontos
específicos do tempo.
Dentre os demais elementos utilizados
subsidiariamente nas pesquisas, os mais destacados
foram a lealdade, a confiança e o comprometimento.
Utilizados nesta pesquisa como um único bloco, são
tradicionalmente vistos, nas pesquisas de Marketing
sobre qualidade, como consequências naturais da
satisfação que a ela se segue – assim como seus
antônimos seriam consequências naturais da
insatisfação – num encadeamento lógico: se percebo
qualidade, posso ficar satisfeito e, por consequência,
me tornar leal à marca ou ao prestador do serviço,
nela(e) confiando e com ela(e) sentindo-me
comprometido. Ou seja, como já dizia Oliver (1999),
a satisfação é um caminho indispensável para o
desenvolvimento da lealdade.
A terceira constatação é a de que poucos artigos
lançaram mão, simultaneamente, de mais do que apenas
um elemento subsidiário à qualidade: um artigo utilizou
três outros e três artigos utilizaram dois outros. Isso
pode indicar tão simplesmente que os autores
preferiram um comportamento mais comedido, visando
não só facilitar-lhes a consecução como também
diminuir a probabilidade de questionamentos
metodológicos que colocassem em risco a validade
dos resultados das pesquisas e, por tabela, a aprovação
do material no evento.
Uma quarta e última constatação remete aos
elementos que foram menos utilizados subsidiariamente
nesses estudos sobre qualidade: preço, gerenciamento
de impressões, encontros, imagem, emoções e
ambiente. Essa parcimônia pode sugerir que se trata
de domínios entendidos como pouco interessantes à
academia e ou como mais difíceis de serem trabalhados.
110
Uma sugestão para dirimir esta dúvida seria a realização
de pesquisa semelhante em eventos internacionais de
Marketing de primeira linha, de forma a se avaliar se
haveria similaridade nessa tendência.
Passando-se às conclusões a respeito das
referências em si utilizadas pelos diversos autores,
verifica-se que, de uma forma geral, estes tenderam à
diversidade: dentro de cada conjunto de trabalhos que
lançaram mão de um mesmo elemento para suportar a
pesquisa sobre qualidade, raramente se observou uma
similaridade no referencial. Ao contrário, com exceção
obviamente de trabalhos seminais, o que se vê é uma
tendência à pluralidade.
Esse fenômeno trouxe, a reboque, enfoques
diferenciados ao referencial teórico e às linhas de
raciocínio de cada um dos trabalhos. E é relevante notar
que isso ocorreu mesmo naqueles casos em que o foco
da pesquisa remete à discussão acadêmica
exaustivamente presente na literatura. Foi o caso dos
quatro trabalhos que utilizaram o construto satisfação:
este e o construto qualidade, como se viu anteriormente,
têm sido muito frequentemente analisados em uníssono
na área de Marketing, o que poderia sugerir certa
tendência à congruência ao se montar os referenciais
teóricos. Contudo, os artigos de Xavier et al. (2006),
de Lopes, Alves e Leite (2008), de Rodrigues (2008)
e de Tinoco, Pereira e Ribeiro (2010) primam pela
diversidade dos autores que embasaram seus
respectivos referenciais – o que sinaliza esforço bemsucedido, por parte dos pesquisadores selecionados
nos EMAs, ao embasar seus estudos em fontes
diferenciadas, de forma a reforçar-lhes a originalidade.
É importante ressaltar que este artigo, assim como
qualquer outro texto científico, possui limitações, sendo
uma delas o tamanho limitado da amostra. Outra
limitação remete à precisão e ao rigor metodológico
do método de seleção de corpus com base em
indexação de palavras. Este pode tão somente indicar
relacionamento conceitual circunstancial entre os
elementos identificados, assim como não está garantida
a clareza quanto à relação entre eles.
Finalmente, como mais uma sugestão de futuros
estudos, indica-se a execução de pesquisa semelhante
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Qualidade: uma revisão da literatura...
a esta no âmbito dos encontros da Associação Nacional
de Pós-Graduação em Administração, em seguida
comparando-se os resultados.
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120
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
GESTÃO DA INFORMAÇÃO E O SISTEMA SMART GRID: UM
ESTUDO DE CASO DA UFRN
RESUMO
A eficiência energética e a confiabilidade na distribuição de energia elétrica são tendências de foco nesse tipo de
serviço. O presente trabalho defende que uso de tecnologia de informação e automação em redes elétricas a fim
de torná-las inteligentes (Smart Grid) melhora o processo de tomada de decisão. A metodologia adotada foi
uma análise conceitual a partir da hierarquia de valor dos sistemas de informação, utilizando um estudo comparativo
desse tipo de tecnologia com a usada na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Conclui que a automação
de processos aumenta a eficiência do processo, bem como a eficiência da tomada decisão, mas exige uma
estratégia voltada para a gestão do conhecimento.
PALAVRAS-CHAVE: Sistemas de informação; Tecnologia de automação; Processo decisório; Redes elétricas
inteligentes.
ABSTRACT
The energetic efficiency and the reliability in the electricity distribution are tendencies in this kind of service. The
present essay advocates that the utilization of information and automation technology in electric grids, in order to
make them intelligent (Smart Grid), improves the decision-making process. It was used a conceptual analysis
about the information system's value hierarchy in the methodology, making a comparative study of this kind of
technology with the one used at the Universidade Federal do Rio Grande do Norte. We concluded that the
automation in processes improves its efficiency, as well as the efficiency in the decision-making process, but it
requires a strategy that is focused in knowledge management.
KEYWORDS: Information systems; Automation technology; Decision process; Intelligent electric grids.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
121
comunicação breve
ARAÚJO, Arthur Nóbrega B. de. Graduando em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN. Telefone: (84) 8802-3966. E-mail: [email protected].
QUEIROZ, Jamerson Viegas. Dr. em engenharia de Produção, professor do programa de Pós-Graduação
em Engenharia de Produção da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. Telefone: (84) 36421839. E-mail: [email protected].
FERNANDES, Helton Tadeu P.; GOMES, João Paulo Bernardo da S.; MORAIS, Adriano Varella de.
Graduandos em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.
ARAÚJO et al.
INTRODUÇÃO
O setor de energia elétrica é de importância
estratégica para o bem-estar da indústria de um país,
pois faz parte da infraestrutura básica para o
funcionamento desta. Dessa forma, pode-se inferir que
a qualidade nesse setor é fundamental, assim como
afirma Chowdhury et al. (2003).
Em virtude de ser uma atividade econômica
altamente regulamentada, de utilidade pública e,
pela sua natureza, com características de
monopólio, é de suma importância a verificação
periódica da qualidade do serviço de
fornecimento de energia elétrica prestado aos
consumidor es
pelas
concessionárias
(SILVESTRE et al., 2010, p. 98).
O foco da qualidade na distribuição de eletricidade,
em relação ao consumidor, está diretamente associado
à confiabilidade, como defende Billinton et al. (1997).
Além disso, Cassula et al. (2003) afirmam que a
confiabilidade é de suma importância na transmissão
de energia elétrica, pois esse serviço exige altos
investimentos e tem impacto direto no meio ambiente
e na sociedade.
Assim, é interessante buscar alternativas que
minimizem as falhas que causem quedas de energia,
como o próprio crescimento da demanda, que
sobrecarrega a rede e interrompe o fornecimento. Para
tal, Madani e King (2011) abordam a importância do
uso da tecnologia de informação e monitoramento para
a redução de falhas em redes elétricas. Em âmbito
mais geral, Queiroz e Vasconcelos (2005) defendem
que a implantação de tecnologia de informação e
automação aumenta a eficiência nas organizações,
contanto que seja elaborada uma estratégia voltada
para a adaptação do trabalhador a essa tecnologia.
O presente trabalho busca avaliar como a
estruturação de uma Smart Grid (rede inteligente) na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte pode
afetar o processo de tomada de decisão em relação
aos problemas de distribuição de energia elétrica, uma
vez que essa organização passa por problemas de
122
frequentes quedas de energia, o que caracteriza baixa
confiabilidade da rede.
A organização do presente estudo inicia-se com
essa abordagem introdutória, seguida pela seção 2,
que discute a revisão da literatura; o capítulo 3 apresenta
a metodologia; na seção 4 é ressaltado o estudo de
caso da UFRN; a seção 5 apresenta os resultados
encontrados; e, por último, a seção 6 trata das
considerações finais.
REFERENCIAL TEÓRICO
Eficiência energética e redes elétricas
Eficiência é a relação entre o resultado alcançado e
os recursos que foram utilizados na operação. A
eficiência energética é o principal foco de uma rede
elétrica inteligente, que através do autogerenciamento
da rede busca realizar o consumo da energia de forma
ideal, reduzindo perdas desde a geração até a distribuição
para o consumidor final. Um sistema inteligente se torna
mais eficiente pelo fato de tomar decisões em tempo
real, utilizando a energia de modo racional.
[...] o uso intenso das fontes de energia
conhecidas e seus impactos adversos sobre o
ambiente, problemas diretamente relacionados
aos sistemas de energia elétrica, também
aparecem sob o pálio do desenvolvimento
sustentável. Por esses motivos, o impacto
ambiental é um fator de relevância crescente e
de importância nas condições atuais de operação
e de desenvolvimento desses sistemas e,
indiscutivelmente, deve ter um efeito mais intenso
sobr e a indústria no futuro (GÓMEZEXPÓSITO, 2011).
Há também a necessidade de garantir a eficiência
operacional do sistema elétrico em todas as suas etapas,
a partir do gerenciamento correto da rede de energia
elétrica. As perdas devem ser diminuídas e os impactos
ambientais, reduzidos. Com isso, as empresas se
tornam mais competitivas em razão do meio ambiente,
mas claramente em função da eficiência, da redução
de custos e despesas causadas pela dificuldade de
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Gestão da informação e o sistema Smart Grid...
produzir de forma correta.
A maioria dos equipamentos e processos utilizados
nos dias de hoje nos setores de transporte, industrial
e residencial foi desenvolvida numa época de
energia abundante e barata e quando as
preocupações ambientais ou não existiam ou eram
pouco compreendidas. Estes são os motivos pelos
quais haja tantas oportunidades para melhorias na
economia de energia, seja para aumentar a
competitividade das empresas, seja para melhorar
a imagem pública de indústrias que deixaram de
ser poluentes (GOLDEMBERG, 2000, p. 93).
Sistemas de informação e automação
O cerne da administração de organizações está na
tomada de decisão, e os sistemas de informação são
responsáveis por dar suporte aos gerentes para tal.
Guimarães e Évora (2004) afirmam que "[...] a
informação é um recurso primordial para tomada de
decisão e que, quanto mais estruturado for este
processo, [...] mais indicado se faz o uso de sistemas
de informação".
Moresi (2000) aborda a cadeia de valor de um
sistema de informação, que por sua vez é sustentado
por algum tipo de tecnologia de informação. Essa cadeia
é mostrada na Figura 1.
Figura 1 – Cadeia de valor dos sistemas de informação.
Fonte: Adaptado de Moresi (2000).
Como mostrado, a tecnologia de informação tem
seu valor acrescido de acordo com seu desempenho
nessa cadeia de valor. Se um sistema apenas coleta
dados, seu valor será inferior em relação ao que
processa.
Slack et al. (2009) dividem os sistemas de
informação em três tipos diferentes: o de suporte à
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
decisão, que coleta, processa e dissemina dados a fim
de informar o gerente e apoiar sua decisão; o de
informação gerencial, que agrega ainda mais valor,
chegando a usar ferramentas de modelagem e
apresentação dos dados; e ainda os sistemas
especialistas, que tomam decisões para resolver
problemas limitados.
123
ARAÚJO et al.
A partir daí, é possível falar em automação flexível,
que, de acordo com Zukin e Dalcol (2001), é uma
integração entre tecnologia de informação – TI e
processo de manufatura automatizado, através de
computador. A TI usada na automação é justamente a
de sistemas especializados, chegando a tomar decisões
e inclusive agir, ou seja, esse tipo de tecnologia está no
topo da cadeia de valor dos sistemas de informação.
A automação aumenta a flexibilidade do processo
produtivo, pois reduz a burocracia na tomada de
decisão, uma vez que ela passa a acontecer em nível
operacional, e não tático. Mesmo assim, é importante
ressaltar que esse tipo de tecnologia não retira a
necessidade de pessoas no processo decisivo, já que
o sistema precisa ser gerenciado e suas decisões são
limitadas a processos repetitivos e/ou simples.
Sordi e Medeiros Júnior (2006) defendem que o
uso de uma única plataforma integradora é mais
interessante para gerenciar as informações, pois isso
aumenta a confiabilidade da informação, o número de
possíveis análises com a mesma informação, e ainda
facilita o processo de automação.
A rede elétrica inteligente
A tradução do termo Smart Grid já transmite a
essência do seu significado: rede inteligente. Esta rede
é a aplicação de tecnologia de informação para o
sistema elétrico de potência, integrada aos sistemas
de comunicação e infraestrutura de rede automatizada.
Esse conjunto tecnológico seria o responsável por
significativos ganhos de eficiência energética, por
permitir automação e operação remota do sistema,
por melhorar a fiscalização e monitoramento das
condições de rede e qualidade de energia, por
incrementar a capacidade de tomada de decisões
nas diferentes fases do setor, por viabilizar
tecnicamente ao consumo programado,
inteligente, de energia, dentre outros (RIBEIRO,
2011, p. 3).
Para alcançar esses resultados, a Smart Grid conta
com três pontos principais: o sensoriamento, a
124
telecomunicação e o processamento.
O sensoriamento exerce o papel de captação das
informações sobre a operação e o desempenho da
rede, apresentando, por meio dos medidores
inteligentes (uma das ferramentas do sistema),
parâmetros como tensão e corrente, e após uma análise
fornece as informações.
A telecomunicação exerce a função de transmitir
as informações coletadas da rede. Esta transmissão
pode ocorrer de duas maneiras: com a Power Line
Communications, tecnologia que usa a própria rede
elétrica para transmitir os dados, ou com tecnologias
de transmissão de dados desvencilhadas da rede de
energia elétrica (GSM, GPRS, UMTS, SMS, etc). O
processamento, último ponto, exerce a função de
interpretar as informações em trânsito e tomar decisões
de forma independente, entre outras coisas.
A Smart Grid funciona a partir de sensores que,
quando detectam informações significativas,
comunicam os dados de volta para um sistema analítico
central. Este sistema é representado, geralmente, por
um software que irá analisar os dados e determinar o
que há de errado na rede e o que deve ser feito para
melhorar o desempenho dela.
Essa tecnologia proporciona três grandes
benefícios. O primeiro deles é a eficiência energética.
A confiabilidade aparece como segundo benefício,
pois a rede tem a capacidade de detectar quando os
ativos estão funcionando de maneira irregular (risco
de falha, desempenho em declínio, etc.) e identificálos para a concessionária repará-los antes de uma
interrupção real.
A tecnologia da Smart Grid permite localizar a falha
com precisão, respondendo de maneira mais rápida
ao funcionamento incorreto e minimizando o impacto
das falhas aos clientes, isolando uma região menor e
fazendo com que menos clientes sejam afetados.
Por último, há a integração de ponta que varia desde
o sistema de gestão do cliente em casa, através da
leitura dos medidores inteligentes, até o controle e
acompanhamento da integração de outras fontes, como
as placas solares. Existe também o abastecimento de
veículos elétricos que exigem a interação com a rede
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Gestão da informação e o sistema Smart Grid...
para ser bem-sucedido.
METODOLOGIA
A princípio, foi realizada uma pesquisa bibliográfica
descritiva sobre a rede Smart Grid, e percebeu-se
que o foco no desenvolvimento desse tipo de sistema
não está na redução de custos, e sim na simplificação
da tomada de decisão e no aumento da qualidade da
distribuição de energia no que diz respeito à
confiabilidade da rede.
Além de pesquisa bibliográfica, foram realizadas
discussões com o intuito de definir os objetivos do
trabalho, o que foi feito a partir das necessidades mais
urgentes observadas, no caso, a resolução do problema
da baixa confiabilidade da rede.
Com um objetivo definido, a pesquisa de referencial
teórico começou com os sistemas de informação e
automação e seus impactos no processo decisório, além
das questões ambientais relacionadas à eficiência
energética, fatores diretamente ligados às quedas de
energia. Em seguida, foi realizado um estudo mais
aprofundado da instituição, avaliando como é feito o
gerenciamento da rede e quais seus pontos fortes,
fracos, oportunidades e ameaças.
A partir daí, foi montada uma matriz SWOT, com o
intuito de averiguar a viabilidade estratégica da instalação
desse sistema. Na matriz, foram usados índices de
correlação entre os aspectos externos (oportunidades
ou ameaças) e os aspectos internos (forças ou
fraquezas). Caso a relação fosse grande, usou-se o índice
9, média, 5, pequena, 1, e inexistente, 0.
Os resultados foram usados para explorar as formas
de influência que um sistema de informação e
automação tem na tomada de decisão, especificando
o caso da UFRN, bem como levantar as vantagens no
gerenciamento de energia que esse tipo de tecnologia
pode trazer.
ESTUDO DE CASO – UMA REDE INTELIGENTE NA UFRN
Situação energética da UFRN
Como já mencionado, a proposta do trabalho é
estudar a viabilidade da implantação de uma Smart
Grid na UFRN, logo, ela é o cliente do negócio. Foi
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
aplicado um questionário na Superintendência de
Infraestrutura acerca do contexto energético na
universidade e, a partir dele, o cliente foi caracterizado.
O crescimento médio, nos últimos cinco anos, do
consumo de energia elétrica na UFRN é de cerca de
25% por ano. Existem duas redes que abastecem a
instituição, as subestações de Neópolis e de Lagoa
Nova. Os dois contratos de energia (um para cada
rede) totalizam seis mega Watts de potência elétrica.
Segundo a própria Superintendência de
Infraestrutura, as principais causas para as frequentes
quedas de energia em alguns setores da universidade
são falhas da concessionária e sobrecargas da rede,
gerada por um aumento significativo da demanda
energética.
A rede elétrica na UFRN não á automatizada,
havendo apenas um sistema de monitoramento. Assim,
quando um circuito entra em sobrecarga, outro que
esteja suboperado não pode abastecê-lo. Por causa
disso, estão sendo realizados investimentos em
infraestrutura energética, como a construção de
subestações próprias da UFRN e expansões das linhas
de distribuição.
Existem equipes de manutenção da rede elétrica,
que operam caso haja falhas. Por exemplo, em caso
de sobrecarga, eles são responsáveis por desligar
circuitos de menor prioridade a fim de reduzir a
demanda por eletricidade e a rede voltar a transmitir.
Um sistema de automatização da rede permitiria realizar
esse tipo de ação preventivamente e sem ter que
acionar a equipe de manutenção.
O sistema atual
O sistema de gerenciamento de energia elétrica
utilizado pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte possibilita o acompanhamento do consumo de
energia elétrica objetivando o melhoramento da gestão
energética na organização.
Ele tem como característica funcional o
fornecimento de detalhes das despesas mensais com
o consumo energético, para que se tenham informações
sobre comportamento (consumo ao logo do tempo),
possibilitando o planejamento de ações que possam
125
ARAÚJO et al.
ser aplicadas para minimizar um possível desperdício
de energia, além de projetar a oferta para demandas
imediatas que ocorram na comunidade acadêmica.
O atual sistema também fornece subsídios para
identificação de algumas perdas motivadas por ações
passadas e atuais, como:
i. Cultura do desperdício de energia;
ii. Penalidades por contratos de energia mal
elaborados, devido a demandas mal dimensionadas;
iii. Descontrole nas medições do consumo;
iv. Dimensionamento inadequado de fontes
consumidoras de energia, tais como a iluminação além
da real necessidade, sobre dimensionamento de
motores, entre outros;
v. Sobrecarga nos transformadores e cabos de
energia;
vi. Inexatidão das contas de energia;
vii. Inadequações nas chaves de rateio de custos.
Esse sistema também permite o monitoramento de
fluxos de energia em utilidades em tempo real, em que
pode ser feito o acompanhamento da medição de
energia, medição de utilidades, supervisão da demanda
e do consumo e acionamento de alarmes de problemas
na rede, como também a verificação do fator de
potência, rateio de custo, qualidade da energia e
simulações no sistema.
Portanto, o sistema atual é de suporte de informação
gerencial, o qual coleta dados sobre o comportamento
da rede elétrica para subsidiar a geração de relatórios
analíticos e vários gráficos. Só então poderá ser
realizada alguma ação pelos técnicos de manutenção
para a correção do problema ou minimização de seus
efeitos.
RESULTADOS ENCONTRADOS
Comparações entre uma Smart Grid e a rede
atual
Ao analisar o sistema da Smart Grid, foram
identificadas suas funcionalidades, as quais possibilitam:
a distribuição de pacotes de energia para cada unidade
126
consumidora; o gerenciamento do consumo de energia
em tempo real, diminuído o lead time; o fornecimento,
em tempo real, do gasto de energia em reais da unidade
consumidora; a automação do sistema possibilita
realização de operações de forma preventiva, como
desligamento de equipamentos que estejam
aument ando o consumo na ponta; evitar o
sobredimensionamento da infraestrutura da rede elétrica
para alguns momentos de pico (em torno de 10% do
dia); preparar a UFRN à realidade futura da distribuição
energia pelas concessionárias.
Na investigação sobre o sistema de monitoramento
de distribuição energética da UFRN, verificou-se que
ele possibilita: alertar sobre ultrapassagem do consumo
preestabelecido; monitoramento da distribuição de
energia; fornecimento do consumo energético, em
tempo real; fornecimento de dados para que sejam
tomadas as decisões pelo departamento.
Assim, percebe-se que a principal diferença entre
os sistemas é que a tecnologia da Smart Grid é um
sistema especialista, possibilitando a automação flexível,
enquanto o sistema atual é de informação gerencial.
Dessa forma, a rede inteligente reduz a burocracia na
tomada de decisão, que passa a ser feita no âmbito
operacional em vez do tático, o que torna as ações
realizadas preventivas. O sistema atual dá suporte aos
gestores para que eles tomem a decisão, mas sempre
de forma corretiva.
A rede inteligente ainda permite alocar potência
elétrica em circuitos que têm maiores demandas,
reduzindo o fornecimento para os que têm menores
demandas, o que reduz o desperdício no fluxo de
eletricidade. Outro fato é a possibilidade de cortar
circuitos de menor prioridade para evitar quedas de
energia em circuitos prioritários, evitando assim as
quedas de energia nas ocasiões de sobrecarga. Dessa
forma, se torna desnecessário sub-redimensionar a
infraestrutura elétrica para picos de demanda isolados,
reduzindo os investimentos em subestações de
distribuição.
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
Gestão da informação e o sistema Smart Grid...
MATRIZ SWOT
Figura 2 – Matriz SWOT de uma Smart Grid para a UFRN.
Fonte: Elaboração própria.
De acordo com o resultado da matriz, a postura
estratégica a ser adotada é a de desenvolvimento, o que
prova a viabilidade estratégica do projeto. Isso se deve
ao fato de a maior pontuação na matriz ter sido no
quadrante que analisa pontos fortes e oportunidades, o
que indica que a UFRN possui real necessidade de um
sistema desse tipo (oportunidades) e o sistema realmente
atende aos requisitos (pontos fortes).
A postura estratégica de desenvolvimento prevê o
investimento em inovação, uma vez que tanto o
ambiente interno como o externo estão favoráveis ao
crescimento do negócio. Assim, o projeto de instalação
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
de uma Smart Grid vem a calhar, pois elimina
problemas que a universidade enfrenta atualmente e
provê sustentação para um crescimento futuro.
Como mostra a matriz, alguns aspectos internos que
se destacam nos resultados são treinamento e
automação. Isso demonstra a importância do
gerenciamento do sistema após sua instalação, sendo
imprescindível treinar os funcionários, devido à
automação da rede, que altera as funções e atividades
da gerência, que deixa de ter papel de corrigir
problemas e passa a controlar o funcionamento do
software.
127
ARAÚJO et al.
Em relação aos aspectos externos, verifica-se que
o a burocracia dentro das instituições públicas, bem
como a existência de uma estrutura gerencial,
influenciam fortemente nos resultados. Assim, é
necessário que a Superintendência de Infraestrutura
participe da instalação do sistema.
Smart Grid e suas consequências na tomada
de decisão
Amaral e Sousa (2011) afirmam que as decisões
podem ser tratadas como algo científico e racional,
enfatizando-se as análises e as relações de causa e
efeito, com o intuito de antecipar ações e decidir de
forma mais eficaz e eficiente.
A rede inteligente possibilita o downsizing, que nada
mais é do que antecipação da tomada de decisão, que
deixa de ser feita no âmbito estratégico ou tático, e
passa a acontecer no operacional. Assim, o problema
das quedas de energia seria reduzido em razão da
característica proativa da Smart Grid.
Como defende Li et al. (2010), um dos principais
benefícios da Smart Grid é a customização. Logo, a
tomada de decisão relacionada às redes elétricas será
direcionada aos indicadores que vão predeterminar as
ações que o sistema realizará, bem como os índices
de desempenho a serem usados para avaliar o próprio
sistema.
Segundo Passos e Silva Filho (1994), definir
indicadores em sistemas de informação e automação
é algo complexo devido à dimensão e complexidade
desses tipos de sistemas. Logo, haverá necessidade
em treinar e especializar os agentes decisórios na
gestão elétrica da organização.
De acordo com Ferreira (2008) apud Tomaselli
(2010), decidir é o "ato que se apoia nos passos
antecedentes da percepção e avaliação das condições
oferecidas, constitui a essência dos atos humanos, ao
reunir a capacidade de captar informações, analisálas e ponderar sobre elas, abrindo caminho, assim, para
a função especial do pensar, que seguido pelo agir,
pode criar e transformar".
A citação acima argumenta a necessidade de
treinamento gerencial e desenvolvimento de uma
128
política voltada para a gestão do conhecimento na
gestão de uma Smart Grid. Essa é uma estratégia a
ser priorizada no processo de implantação do sistema.
CONCLUSÕES
A importância da gestão da informação em
organizações é ascendente com o passar do tempo,
pois aumenta a eficiência na tomada de decisão e facilita
o trabalho dos gerentes. Dessa forma, as organizações
se tornam mais competitivas e aumentam seus reflexos
às variações de mercado.
O uso de tecnologia de automação aumenta a
eficiência dos processos produtivos, uma vez que
possibilitam o downsizing. Esse aumento de eficiência
possui consequências nos custos da empresa, na
produtividade, na necessidade de investimentos e nos
impactos ambientais gerados, que normalmente são
reduzidos.
O uso de uma Smart Grid em redes elétricas
permite esse aumento de eficiência, reduzindo os
impactos ambientais na distribuição de eletricidade,
devido ao equilíbrio entre demanda e oferta que é
proporcionado, além do aumento da qualidade e
confiabilidade da rede.
Desenvolver esse sistema é uma forma de produzir
conhecimento, além de reduzir o problema das quedas
de energia existentes na UFRN, a partir do controle
dos circuitos pelo próprio sistema. Logo, conclui-se
que a implantação do sistema apresenta vantagens para
o funcionamento da universidade como um todo.
Para pesquisas futuras, é interessante definir quais
indicadores usar para determinar as ações do sistema,
além de determinar que índices de desempenho são
melhores para medir o funcionamento do sistema.
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RECEBIDO EM 13/2/2012
ACEITO EM 10/5/2012
130
REVISTA UNIARA, v.15, n.1, julho 2012
NORMAS DE PUBLICAÇÃO
A Revista Uniara é uma publicação multidisciplinar
do Centro Universitário de Araraquara – Uniara que
tem por finalidade divulgar artigos originais de diferentes
áreas do conhecimento.
Os textos submetidos não deverão ser apresentados
em outro periódico e, após a sua aceitação, será solicitada
dos autores a transferência dos direitos autorais. Os
manuscritos serão encaminhados a pareceristas, que
deverão analisar o valor científico do trabalho.
Os trabalhos deverão ser enquadrados em uma das
seguintes modalidades:
a) Artigos originais: trabalhos inéditos de pesquisa
com no máximo 25 páginas, incluindo figuras, tabelas,
quadros, esquemas, etc.;
b) Artigos de revisão: sínteses de conhecimentos
disponíveis sobre determinado tema, mediante análise
e interpretação de bibliografia pertinente, com no
máximo 25 páginas;
c) Comunicações breves: resultados preliminares
de pesquisa, com no máximo 10 páginas incluindo
figuras, tabelas e referências;
d) Resenhas ou análise crítica de livros: máximo 4
páginas;
e) Seção temática (a convite): seção destinada à
publicação de trabalhos sobre temas de interesse atual.
PREPARAÇÃO DOS MANUSCRITOS
As submissões dos manuscritos deverão atender
aos seguintes critérios:
a) Os textos deverão ser digitados em espaço
duplo, fonte Times New Roman, tamanho 12;
b) Título do artigo, nome e endereço dos autores
(nome completo por extenso e filiação acadêmica).
Havendo autores com diferentes endereços, eles
deverão vir imediatamente após o nome de cada autor.
Agrupar os autores por endereço. O autor para
correspondência e seu endereço, incluindo e-mail,
deverão ser assinalados com asterisco;
c) Os resumos deverão ser redigidos em português
e em inglês, em um único parágrafo (máximo de 250
palavras), de modo claro e conciso contendo:
objetivo, procedimentos metodológicos, resultados
e conclusões, acompanhados de 3 palavras-chave,
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também redigidas em português e em inglês;
d) Figuras (incluindo gráficos, esquemas, etc.)
deverão utilizar o mesmo padrão de letra do texto,
ser numeradas sequencialmente, em algarismos
arábicos, com a respectiva legenda. As figuras deverão
ser encaminhadas em folhas separadas, com a
localização aproximada indicada no texto. Ilustrações
(fotografias, gráficos, desenhos, mapas, etc.) deverão
ser enviadas e em preto-e-branco, em arquivos
formato jpg e/ou tif.
e) Só deverão ser utilizadas unidades de medida,
símbolos e abreviaturas padronizados. Abreviações não
familiares deverão ser definidas na primeira vez em que
forem apresentadas no texto;
f) Os artigos referentes a pesquisas envolvendo
seres humanos e animais deverão ser acompanhados
de uma cópia do parecer emitido por um Comitê de
Ética em Pesquisa aprovando o desenvolvimento da
pesquisa;
g) Os manuscritos deverão conter, de modo geral:
introdução, metodologia, resultados e discussão,
conclusão, agradecimentos e referências. Recomendase evitar a subdivisão do texto em um grande número
de subtítulos ou itens.
h) As referências deverão ser elaboradas de
acordo com as normas da Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT), conforme formatos
descritos a seguir:
1) LIVRO
SOBRENOME, Nome. Título em destaque:
subtítulo. Edição. Cidade: Editora, ano. Número de
volumes ou páginas. (Série).
Edição do livro:
- se for em português colocar: 2. ed.
- se for em inglês colocar: 2nd ed.
2) CAPÍTULO DE LIVRO
Autor do capítulo diferente do responsável
pelo livro todo:
AUTOR DO CAPÍTULO. Título do capítulo. In:
AUTOR DO LIVRO. Título do livro em destaque.
Edição. Cidade: Editora, ano. volume, capítulo,
131
REVISTA UNIARA
página inicial-final da parte.
Único autor para o livro todo
AUTOR DO CAPÍTULO. Título do capítulo. In:
______. Título do livro em destaque. Edição.
Cidade: Editora, ano. volume, capítulo, página
inicial-final da parte.
3) ARTIGO DE PERIÓDICO
SOBRENOME, Nome. Título do artigo. Título do
periódico em destaque, v., n., p. inicial-final, mês
abreviado no idioma de origem. ano de publicação.
4) ARTIGO DE JORNAL
AUTOR do artigo. Título do artigo. Título do jornal
em destaque, cidade de publicação, dia, mês
abreviado. Ano. Número ou Título do Caderno, Seção
ou Suplemento, p. seguido dos números da página
inicial e final, separados entre si por hífen.
5) DISSERTAÇÃO, TESE E MONOGRAFIA
SOBRENOME, Nome do autor. Título em
destaque: subtítulo. Ano de publicação. Número de
volumes ou folhas. Categoria (Curso) – Instituição,
Cidade da defesa, ano da defesa.
6) EVENTO CIENTÍFICO – CONSIDERADO NO TODO
TÍTULO DO EVENTO, número., ano, cidade de
realização. Título da publicação em destaque.
Cidade de publicação: Editora, data. Páginas ou
volumes.
132
7) EVENTO CIENTÍFICO – CONSIDERADO EM PARTE
(Trabalhos apresentados e publicados)
AUTOR DO TRABALHO. Título do trabalho:
subtítulo. In: NOME DO EVENTO,em número, ano,
cidade de realização. Título da publicação em
destaque. Cidade de publicação. Título do documento
(Anais, proceedings, etc. em destaque), local: Editora,
ano. Página inicial-final do trabalho.
8) NORMA TÉCNICA
NOME DA ENTIDADE RESPONSÁVEL.
Título da norma em destaque: subtítulo. Cidade de
publicação, ano. Número de páginas.
9) DOCUMENTO ELETRÔNICO
Após a indicação dos dados de cada documento,
acrescentar as informações sobre a descrição física
do meio eletrônico respectivo.
– SE FOR CD-ROM acrescentar o: Número de
CD-ROM
– SE FOR ON-LINE acrescentar: Disponível em:
<endereço eletrônico>. Acesso em: dia mês abreviado.
Ano.
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as Normas de Publicação serão devolvidos aos
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