O USO DE TECNOLOGIAS EM ASSENTAMENTOS DE REFORMA AGRÁRIA EM SERGIPE E SEUS REBATIMENTOS SOCIAIS Fábio Ferreira Santos Universidade Federal de Sergipe [email protected] Jamile Oliveira Rodrigues Universidade Federal de Sergipe [email protected] Andréa Tavares de Jesus Universidade Federal de Sergipe [email protected] Profª Drª Josefa de Lisboa Santos 1 Universidade Federal de Sergipe [email protected] RESUMO Este artigo analisa as condições da apropriação de tecnologias por assentados de reforma agrária nos assentamentos 8 de Outubro e Edmilson de Oliveira, respectivamente situados em Simão Dias e Carira, no estado de Sergipe. Sabe-se que o uso de tecnologias tem rebatimentos na qualidade da saúde, nos padrões de produção, nas relações e condições de trabalho e no endividamento dos pequenos agricultores, representando desafios à sua reprodução social, muitas vezes, implicando na ampliação da sujeição da renda da terra ao capital. Entretanto, pesquisas de campo demonstram que, os assentados da reforma agrária no estado de Sergipe, vêm propondo um novo modelo tecnológico que se baseia em técnicas de produção de alimentos saudáveis, com respeito ao ambiente e uso de insumos orgânicos. Para os assentados, a incorporação de conhecimentos sobre a agroecologia tem se colocado como uma estratégia viável para as perspectivas de reprodução social. Esta direção tomada pelos assentados colocou o desafio de explicar, através da análise de entrevistas realizadas com assentados durante o primeiro semestre de 2010 e de estudos feitos junto ao Grupo de ‘Estudos Políticas Públicas e Produção do Espaço’ se o uso de tecnologias tem contribuído para a sua 1 - Prof.ª Dra. do Departamento de Geografia do Campus Itabaiana e Coordenadora do Grupo de Estudos Politicas Públicas e Produção do Espaço, ambos sendo desenvolvidos no campus Prof. Alberto Carvalho. sujeição aos ditames do capital ou à garantia da reprodução social nos assentamentos. PALAVRAS CHAVE: uso de tecnologia na agricultura, desenvolvimento rural e agroecologia. ABSTRACT This article analyzes the conditions of the appropriation of technologies by settlers for land reform settlements in the August and October Edmilson de Oliveira, respectively located in Simon Dias and Carira in the state of Sergipe. It is known that the use of technologies has aftermaths as health, patterns of production and relations and working conditions and the indebtedness of small farmers, representing challenges to their social reproduction, often involving the expansion of income subject land to capital. However, field surveys show that the land reform settlers in the state of Sergipe, have proposed a new technological model that is based on techniques for producing healthy foods, with respect to the environment and use of organic inputs. For the settlers, the incorporation of knowledge of agroecology have been faced as a viable strategy for the prospects of social reproduction. The direction taken by the settlers put the challenge to explain, through analysis of interviews with settlers during the first half of 2010 and studies made by the Group? Public Policy Research and Production Space? The use of technologies has contributed to its submission to the dictates of capital or the guarantee of social reproduction in the settlements. KEY WORDS: technology use in agriculture, rural development and agroecology I - INTRODUCÃO A luta pela terra traz a tonicidade de uma reivindicação pelas injustiças sociais no campo. Assim, a difícil batalha de conquista da terra, os trabalhadores rurais semterra só passam a ter posse da terra com o aval do Estado Federal, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). A partir daí dar-se o processo de territorialização, conceito que visa explicar o processo de assentamento das famílias. FERNANDES (1996, p.241), afirma que, “O assentamento é o território conquistado, é, portanto um novo recurso na luta pela terra que significa parte das possíveis conquistas representa, sobretudo a possibilidade da territorializaçaõ”. 2 O assentamento rural constitui das experiencias enfrentadas no acampamento, sendo que a consolidação do assentamento dá uma conotação maior ao camponês/assentado ou seja, melhores condições para que ele possa prosseguir na terra. 2 Ver ENG – Encontro Nacional de Geógrafos – Porto Alegre, 2010. Assim, no assentamento, os trabalhadores rurais enfrentam enormes dificuldades, desde a falta de água e energia, a necessidade de produzir os seus alimentos. Assim, a luta pela terra passa agora a ser a luta na terra, fato que atinge os assentamentos rurais em todo o território brasileiro. Nesse processo de assentamento, devem-se observar os impactos territoriais que acontecem e vem acontecendo no campo a partir da instalação de um assentamento rural. Nesse viés, pode dizer que de uma terra vazia, sem ninguém, passa agora para uma terra onde se planta, produz e diversifica o território. Assim, o assentamento 8 de Outubro e Edmílson de Oliveira situados respectivamente em Simão Dias e em Carira, onde vêm assumindo um papel importante na transformação do território. Portanto, a vitória de uma fração do território passa a ser a luta na terra no assentamento. Todo esse processo de materialização do assentamento pode produzir – e muito freqüentemente produz - impactos territoriais. Os impactos territoriais no Assentamento 8 de Outubro e Edmílson de Oliveira podem ser evidenciado na consolidação do assentamento. Nesse espaço de moradia e produção, podemos observar os impactos territoriais oriundos do assentamento, antes caracterizado como uma “terra sem ninguém” para uma “terra de gente”, uma terra de trabalho e produção. Nesse contexto, percebe-se que o uso de tecnologias em assentamentos rurais são viáveis a partir que se consolida este núcleo ou mancha rural numa determinada fração do território causando rebatimentos socioterritoriais na região em que se encontra. Desse modo, a aplicação de instrumentos tecnologias, como tratores, fertilizantes, etc. Contribui para um aumento da produção nos assentamentos. Sendo assim, o uso de tecnologias tem rebatimentos na qualidade da saúde, nos padrões de produção, nas relações e condições de trabalho e no endividamento dos pequenos agricultores, representando desafios à sua reprodução social, muitas vezes, implicando na ampliação da sujeição da renda da terra ao capital. Entretanto, pesquisas de campo demonstram que, os assentados da reforma agrária no estado de Sergipe, vêm propondo um novo modelo tecnológico que se baseia em técnicas de produção de alimentos saudáveis, com respeito ao ambiente e uso de insumos orgânicos. Para os assentados, a incorporação de conhecimentos sobre a agroecologia tem se colocado como uma estratégia viável para as perspectivas de reprodução social. . II - OS IMPACTOS SOCIOTERRITORIAIS DOS ASSENTAMENTOS RURAIS As reivindicações pela reforma agrária pelos movimentos sociais, precisamente, o MST, nos revela o caráter concentrador de terras nas mãos de um pequeno número de pessoas frente a uma massa desprovida da propriedade da terra. As inúmeras ocupações nos latifúndios improdutivos e o erguimento de acampamentos nestes locais produzem uma nova visão do espaço rural brasileiro frente às barbáries do sistema capitalista vigente. A luta pela terra é um processo social, político e econômico que abarca um conjunto de transformações no campo, redistribuindo a propriedade da terra e o poder, redirecionando e democratizando a participação da população rural no conjunto da sociedade brasileira. (SAUER, 2010, p.38) assim, a luta pela terra mostra as contradições existentes no sistema capitalista e possibilita uma transformação nas estruturas agrárias do país. Evidentemente que a luta pela reforma agrária seja um embate entre expropriados e expropriadores, exploradores e exploradores, latifundiários e sem-terra numa dialética constante do capitalismo atual. A conquista da terra simboliza a vitória do MST frente às injustiças sócias, onde o erguimento dos assentamentos rurais vai provocar rebatimentos socioterritoriais em pequenos núcleos ou manchas no território, visto que o assentamento rural passa a ser alvo de diversas políticas públicas no campo provenientes do Estado. O que antes era uma “terra de ninguém” passa a ser uma “terra de gente” onde produz, cultiva, etc. reorganizando o território rural e produzindo transformações sociais, econômicas, políticas, culturais na região. “O assentamento é o território conquistado, é, portanto um novo recurso na luta pela terra que significa parte das possíveis conquistas representa, sobretudo a possibilidade da territorializaçaõ.” (MANÇANO, 1996, p.241). Desse modo, as transformações no território podem ser visto desde a ocupação (acampamento de famílias no latifúndio improdutivo) a construção e consolidação do assentamento rural, onde os rebatimentos sociais podem ser vislumbrados com maior nitidez. A consolidação do assentamento rural abarca diversos fatores desde a política de crédito fundiário a reorganização do espaço rural. Daí, pode perceber os impactos socioterritoriais promovidos pela reestruturação espacial. Esses impactos, vão se concretizando com o acesso aos créditos rurais, a construção de casas, escolas, a produção de alimentos, o acesso a saúde, entre outros, que irão ocasionar rebatimentos sociais na região onde se localiza. Nessa reestruturação espacial pode observar o uso de tecnologias em assentamentos rurais provenientes do acesso ao credito rural que vão auxiliar o assentado a construir condições de sobrevivência no local e organizar as suas atividades produtivas. O acesso a tecnologias permite o assentado um melhor rendimento na agricultura. II - O USO DE TECNOLOGIAS EM ASSENTAMENTOS RURAIS: O CASO DOS ASSENTAMENTOS 8 DE OUTUBRO E EDMILSON DE OLIVEIRA Com a construção do assentamento e a sua consolidação, os assentados passam a ter a preocupação com o processo de produção de alimentos, visto que a vida no campo é fruto do seu próprio trabalho. Nesse processo de produção, observa-se a atuação das forças produtivas ou do uso de tecnologias que vão dar suporte para o assentado produzir seus alimentos de força mais eficaz. O uso de tecnologias é viável em assentamentos rurais desde que os assentados reestruturem radicalmente 3 para a construção da socialização dos meios produtivos. É verdade que os efeitos sociais da tecnologia devem ser concebidos como uma relação de forças produtivas que depende da atuação dos grupos sociais envolvidos no seu processo de desenvolvimento e no modo de sua utilização. 4 Assim, os assentados ao utilizar os instrumentos tecnológicos na produção de alimentos devem pressupor o seu uso socialmente, interagindo com os outros assentados da região numa forma de socialização dos meios de produção. Segundo Feenberg (2002) “a tecnologia é um artefato social e que, por isso, não está livre de influencias históricas, políticas e culturais”. 5 Desse modo, os camponeses assentados passam a manipular o uso de tecnologias nos assentamentos rurais conforme as suas necessidades. 3 Ver MESZÁROS, Istvan. Para além do capital. Campinas: Boitempo editorial/ editora UNICAMP, 2002. 4 Ver NOVAES, Henrique. O fetiche da tecnologia: A experiência das fabricas recuperadas. São Paulo, Editora: expressão Popular, 2007. 5 FEENBERG, A. Transforming tecnology. Oxford: Oxford University press, 2002. Apud: NOVAES, Henrique. O fetiche da tecnologia: A experiência das fabricas recuperadas. São Paulo, Editora: expressão Popular, 2007 Nessa perspectiva, podemos afirmar que “a tecnologia é o resultado de relações sociais de produção dentro da sociedade” 6, onde ela está sujeita ao conflito histórico entre os detentores dos meios de produção e a mão-de-obra assalariada. Por isso, que o MST, a inserir o uso de tecnologia em assentamentos rurais pressupõe um uso diferenciado onde cada assentado utilize-a socialmente e interagindo com os demais assentados para produzir alimentos mais saudáveis. O comando de tecnologias pelos trabalhadores rurais quebra com o domínio empresarial, oferecendo uma oportunidade de uma vida mais digna no campo. É imprescindível não observar os rebatimentos sociais a partir do uso de tecnologia nos assentamentos de reforma agrária, pois o domínio das forças produtivas pelos trabalhadores /camponeses quebra com a dominação do capital sobre os trabalhadores e constitui uma nova forma de organizar o território. No assentamento de reforma agrária a construção de uma socialização entre os assentados, ou melhor, “a união das famílias assentadas resulta na criação de cooperativas, na implantação de unidades processadoras, na articulação de redes de comercialização, na articulação de experiências comunitárias de desenvolvimento econômico, social e cultural, bem como nas diversas formas de cooperativização e de formação política, amplia-se a capacidade de resistência do campesinato aos diferentes extratos do capital (fundiário, comercial agroindustrial, financeiro, etc)”. 7 Assim, “Os camponeses podem conquistar sua autonomia frente ao capital, já que passam a dominar as cadeias de comercialização/industrialização/distribuição agrícolas, vendendo diretamente aos consumidores ou ao mercado de massas, ou ainda, produzindo para o auto-consumo.” 8 Em Sergipe, mais precisamente nos assentamentos 8 de Outubro e Edmilson de Oliveira são frutos da luta pela terra e os seus rebatimentos sociais dinamiza a regiao em que se encontram. No assentamento 8 de outubro localizado em Simão Dias, o uso de tecnologia propocionou um aumento da produção, onde se “produz anualmente 675 toneladas de 6 Ver NOVAES, Henrique. O fetiche da tecnologia: A experiência das fabricas recuperadas. São Paulo, Editora: expressão Popular, 2007 7 Ver GONÇALVES, Sérgio. CAMPESINATO, RESISTÊNCIA E EMANCIPAÇÃO: O MODELO AGROECOLÓGICO ADOTADO PELO MST NO ESTADO DO PARANÁ. Tese de Doutorado; UNESP Presidente Prudente, 2007. 8 abóbora, 3 mil sacos de feijão, 120 mil sacos de milho, o que equivale a 7.200 toneladas do produto e uma grande quantidade de coentro. A produção do assentamento é comercializada para vários Estados brasileiros, como Bahia, Pernambuco, Alagoas e Rio de Janeiro. Tudo plantado individualmente no lote de 18 hectares de terra que cada família recebeu na época da posse. “Somos um dos melhores produtores de abóbora da região. Mas trabalhamos com a diversificação das espécies, porque é bom para o solo e para o agricultor”, observa Marcelo Alves, agrônomo que atende ao assentamento há nove anos”. 9 Já o assentamento Edmilson de Oliveira é um orgulho para a região de Carira, pois seus impactos se espalham por todo território sergipano. Formado em 2002, o assentamento que produz 12 mil sacas de milho anualmente, desenvolveu em parceria com a Embrapa uma área de pesquisa de espécies – como o girassol, o milho e o feijão –, e transfere experiência tecnológica sobre agricultura para a cidade de Carira e para os povoados vizinhos. 10 Assim, o uso de tecnologias nestes assentamentos rurais promoveu uma melhoria nas condições de vida e principalmente na atividades agrícolas, produzindo rebatimentos sociais na região onde se encontram e promovendo significativas transformações no território. III - CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da pesquisa de campo foi possível observar que a luta pela terra iniciase na ocupação da terra podendo resultar na conquista da mesma. A luta começa no acampamento, onde camponeses sem-terra acampam em fazendas improdutivas ou na beira de rodovias e vão reivindicar e fazer protestos contra as injustiças sociais no campo na cidade, onde é o placo das decisões judiciais. Após ter conquistado a terra, os camponeses sem-terra, agora assentados passam pela difícil tarefa de permanecer na terra, pois as circunstâncias e a improdutividade dos terrenos tornam-se um obstáculo para a permanência na terra, mesmo assim, os assentados perpetuam sonho de tornar-se produtor rural. 9 10 Ver Cinform. A realidade do MST em Sergipe. Postado em 09/09/2009. Ver Cinform. A realidade do MST em Sergipe. Postado em 09/09/2009. Assim, no processo de espacialização da luta pela terra empreendida em Sergipe, a ação do MST foi decisiva para a territorialização dos movimentos sociais no Estado e para a conquista de assentamentos em todo o estado. As experiências de luta e organização dos trabalhadores rurais sem-terra no estado serviram de base para os assentados .Os assentamentos 8 de Outubro e Edmilson de Oliveira vêm passando por diversas transformações e que causam impactos territoriais na região de Simão Dias e Carira e que possibilitam melhores condições de vida para as pessoas assentadas. O uso de tecnologias em assentamentos de reforma agrária em Sergipe foi prescindível para a consolidação dos assentamentos e a construção de uma cidadania no campo. Os rebatimentos sociais dos assentamentos rurais foram sendo construídos desde a ocupação da terra até a consolidação dos assentados na região, provocando alterações no território. Portanto, as reivindicações dos movimentos sociais, o MST, no ato da ocupação e com a construção dos assentamentos promoveu rebatimentos sociais na região onde se encontram localizados. O uso de tecnologias nos assentamentos 8 de outubro e Edmilson de Oliveira alterou as relações de produção e promoveu uma maior produtividade de alimentos para os assentados, consolidação o papel da reforma agraria no contexto de politicas publicas no campo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FEENBERG, A. Transforming tecnology. Oxford: Oxford University press, 2002; FERNANDES, Bernardo Mançano. MST. Formação e territorialização. São Paulo: Hucitec, 1996. GONÇALVES, Sérgio. Campesinato, resistência e emancipação: o modelo agroecológico adotado pelo mst no estado do paraná. Tese de Doutorado; UNESP Presidente Prudente, 2007. MESZÁROS, Istvan. Para além do capital. Campinas: Boitempo editorial/ editora UNICAMP, 2002. NOVAES, Henrique. O fetiche da tecnologia: A experiência das fabricas recuperadas. São Paulo, Editora: expressão Popular, 2007; SANTOS, F. F. A luta pela terra em Sergipe: os impactos territoriais do/no assentamento joão amazonas – se. IN: ENG – Encontro Nacional de Geógrafos – Porto Alegre, 2010; SAUER, Sérgio. Terra e Modernidade: a reinvenção do campo brasileiro. São Paulo; Editora Expressão Popular, 2010; Cinform. A realidade do MST em Sergipe. Postado em 09/09/2009. IN: http://www.cinform.com.br/noticias/99200915373350069/A+REALIDADE+DO+MST+EM+SERGIPE. html