8 JORNAL DE BRASÍLIA Brasília, domingo, 15 de fevereiro de 2015 Torcida . Roberto Wagner, Lucas Magalhães, Eric Zambon e Suzano Almeida naporrada Maniqueísmo Lance Armstrong não é um monstro, Ben Johnson foi o verdadeiro campeão em Seul e Anderson Silva se tornou uma lenda do MMA porque é um lutador completo. E o doping? Pois bem, vamos endereçar a questão do ponto de vista esportivo, tentando se distanciar da opinião “pachequista” do comentarista de internet. Em 2005, a portuguesa Vânia Silva, lançadora de martelos com três Jogos Olímpicos no currículo, usou o tema para compor seu trabalho de conclusão do curso de Licenciatura em Educação Física. À época, ela havia acabado de competir em Atenas e estava bastante inteirada sobre a rotina dos atletas. Sua dissertação é interessantíssima para qualquer um que se interesse pelo assunto e está disponível na internet. Com base em um questionário respondido por 51 homens e mulheres que competiam no Challenger Europeu de Lançamentos, na Turquia, em março de 2005, ela chegou, dentre outras, às seguintes conclusões: 65% dos entrevistados consideraram frequente ou muito frequente o uso de substâncias dopantes por atletas de elite, sendo que apenas 4% não souberam responder e nenhum escolheu a opção “nada frequente”; 94% declararam que recusariam uma oferta do treinador para usar substâncias ilícitas, mas os mesmos 94% acreditaram que quem fez uso desses meios seria devido a algum tipo de pressão dos patrocinadores, enquanto 92% disseram crer que era a mídia responsável por esse comportamento. O mais impressionante, no entanto, é quando ela aborda a aceitação ou não desse recurso no meio esportivo. Segundo o levantamento de Vânia, 66% dos [email protected] atletas consideraram as punições para doping leves ou justas, mas surpreendentes 38% consideraram pesadas ou muito pesadas. Ou seja, pelo menos naquele meio esportivo, não existe a noção de que “dopou, errou, merece o exílio”. Muito pelo contrário, o tema gera polêmica justamente porque não existe unanimidade quanto ao seu mal. O próprio Anderson Silva, se julgado e for comprovado o uso deliberado de substâncias ilícitas no pré e pós-luta, pode ser vítima de seu senso comum. Na prévia de seu combate contra Nick Diaz, o “Spider” chegou a dizer que um atleta flagrado no antidoping deveria “nunca mais atuar”. Ora, nesse caso deveríamos limar 80% dos profissionais de praticamente qualquer modalidade esportiva de alto rendimento! Lance Armstrong disse não acreditar na existência de medalhistas olímpicos livres de doping. Após o martírio midiático e esportivo pelo qual passou, poucos deram crédito à sua fala, mas basta analisar atitudes do próprio Comitê Olímpico Internacional (COI) para dar trela ao papo do ex-ciclista. Em 2012, oito anos após os Jogos de Atenas, 110 amostras congeladas de atletas que participaram do evento foram analisadas e cinco medalhistas olímpicos caíram no antidoping. No entanto, o buraco é mais embaixo. Os testes só aconteceram pois uma emissora de TV alemã descobriu que as amostras estariam prestes a serem descartadas por falta de interesse do COI em submetê-las a um procedimento científico. O pior de tudo é que somente as 110 supracitadas foram checadas, num universo de 3,7 mil à espera. Casos suspeitíssimos como do campeão dos 100m rasos de 2004, Justin Gatlin, nunca tiveram a devida atenção. O atleta em questão foi flagrado dois anos depois por uso de esteroides anabolizantes, mas sua amostra jamais foi reanalisada. Conveniente não? Anderson Silva será julgado, oficial e não-oficialmente, assim como Vitor Belfort, Wanderlei Silva, Rousimar “Toquinho” e tantos outros sempre foram. Seu passado era limpo, é verdade, mas será que não era uma questão de saber mascarar o uso de certas substâncias ao invés de estar, efetivamente, “limpo”? E, seguindo a linha de raciocínio, isso é tão condenável? Alguém pode apontar o dedo, como o treinador de Georges St.-Pierre, Firas Zahabi, fez no início da semana, ao compará-lo com Lance Armstrong de maneira pejorativa? O próprio GSP nunca fez uso de nada considerado ilícito? Diante da realidade é duro de acreditar, mas como não há testes para que alguma coisa seja provada, ficamos com o bom-mocismo de quem mete o dedo nessas questões. E vejam bem, para que não haja confusões, a coluna não defende o uso indiscriminado de substâncias dopantes, especialmente pelo potencial nocivo à saúde da maioria delas, mas somos a favor da discussão a respeito. Se temos tantos exemplos, atuais e antigos, porque perpetuar a dicotomia sobre o assunto quando, claramente, o tema é mais complexo? Se o próprio UFC não segue todos os critérios de avaliação da Wada, já que se submete à Comissão Atlética de Nevada, que tem regras próprias e distintas, quem poderá realmente regular o padrão de conduta dos praticantes de MMA? Ainda há muito a ser debatido sobre o tema, e fechar os olhos para essa realidade, fazendo o julgamento fácil de “bom” e “mau” para cada caso não é a solução. Esta coluna é publicada aos domingos JOSH HEDGES/ZUFFA LLC/ZUFFA LLC VIA GETTY IMAGES MMA Novos e velhos nomes para limpar a imagem Doping de Anderson Silva pegou o mundo das artes marciais mistas de surpresa O Brasil vive um momento de incertezas após o caso de doping de Anderson Silva, mas alguns lutadores mostram que existe uma luz no fim do túnel. Ainda em alta no País, o MMA (Artes Marciais Mistas, da sigla em inglês) tem talentos e candidatos a donos de cinturão em diversas categorias São os casos de veteranos como Vitor Belfort, Lyoto Machida e Junior Cigano, de campeões como José Aldo e Fabricio Werdum, e promessas como Rafael dos Anjos, John Lineker, Edson Barboza, Gilbert Durinho, Thominhas Almeida e Claudinha Gadelha. Em comum, todos querem se manter ou chegar ao topo. O sonho, quem sabe, é alcançar o status que atingiu Anderson Silva antes de perder o cinturão dos médios para Chris Weidman. O mais forte candidato no momento é Vitor Belfort, 2 brasileiros detêm o título do UFC que tem 37 anos e vai disputar o cinturão contra o carrasco de Spider provavelmente em 23 de maio. Além do “Fenômeno”, outros três lutadores que já tiveram o cinturão nas mãos e sonham com uma nova sequência vitoriosa podem brilhar na temporada. Machida, 36, Cigano, 31, e Barão, 28, vão estar em ação nos próximos meses com lutas pelo cinturão ou próximo disso. Cigano é sempre um dos pleiteantes do título. É possível incluir nesse trio Ronaldo Jacaré, 35. Invicto no UFC, ele encara o cubano Yoel Romero no fim do mês. NOVA SAFRA Em 14 de março, Rafael dos Anjos vai subir no octógono para tentar tirar o cinturão das mãos de Anthony Pettis. Outro nome nacional que está começando a chamar a atenção é Gilbert Durinho, 28. Invicto no MMA, ele vai encarar no próximo mês o norte-americano Josh Thomson. John Lineker, 24, por sua vez, tem lutado contra a balança, embora dentro do octógono não tenha tido problemas. Ele foi obrigado a subir para o peso galo (até 61,2 kg) e vem forte para a disputa. Por fim, Thominhas Albuquerque, 23, e Claudinha Gadelha, 26, são outros nomes brasileiros que têm chamado a atenção.