OBRAS INDICADAS PELA
UESPI - 2004
RESUMO DE OBRA
O HOMEM E SUA HORA
Mário Faustino
COLÉGIO PRO CAMPUS - “A PAZ ESTÁ NA BOA EDUCAÇÃO” - OBRAS INDICADAS - UESPI
O Homem e Sua Hora
(Mário Faustino)
Prof. Jorge Alberto
1-RESUMO BIOGRÁFICO:
Mário Faustino dos Santos e Silva nasceu em Teresina a 22 de outubro de 1930. Em 1940,
transfere-se para Belém do Pará, ingressando no jornalismo aos 16 anos n'A Província do Pará. No
ano seguinte, colabora no suplemento literário do jornal Folha do Norte, publicando seus primeiros
poemas, contos e traduções.
Em 1949, ingressa na faculdade de Direito. Dois anos após, conquista uma bolsa de estudo
em língua e literatura inglesa, permanecendo nos Estados Unidos até 1953.
Em 1955 publica seu único livro em vida (O Homem e Sua Hora). Deixa o Pará no ano seguinte,
sendo contratado pela Fundação Getúlio Vargas, onde exerce várias funções. Todavia, nunca abandona
a carreira jornalística, tendo uma página dominical no Jornal do Brasil chamada Poesia-Experiência,
publicada entre setembro de 1956 a novembro de 1958.
Falece em 1962, quando viajava a trabalho pelo Jornal do Brasil em um desastre aéreo. Seu
avião explode no ar na região dos Andes, matando todos os passageiros. É criado um mausoléu na
cidade de Lima para todos os tripulantes do avião.
II-CONSIDERAÇÕES GERAIS:
Á
Quando o livro O Homem e Sua Hora foi publicado em 1955 , o panorama literário brasileiro
passava por uma confluência de estéticas. De um lado, o pós modernismo ou a geração de 45; do
outro, o surgimento de vanguardas brasileiras (Concretismo, Poesia Práxis, Poema Processo,...).
Alguns críticos são um tanto radicais ao ressaltarem que a geração de 45 só existe por uma
determinação cronológica . O que se pode afirmar, sem tais excessos de radicalismos, é que tal
momento foi um refluxo das propostas modernistas de 22 . Aqui , desprezou-se aquela ousadia
oswaldiana em detrimento de uma poesia "mais bem comportada" , valorizando-se o soneto , a
linguagem elegante , o que leva a ser chamada de um Neoparnasianismo. Nem todos os autores
desse período podem receber esse rótulo . Embora João Cabral de Melo Neto desenvolvesse uma
poética racional, ele está longe de ser enquadrado nos moldes parnasianos , visto não só uma
reestruturação da linguagem poética quanto ao aspecto social de sua obra .
Já com o aparecimento de novas vanguardas que se iniciam com o Concretismo (1955) , temse a total ruptura com o que vinha sendo desenvolvido na geração de 45 . A quebra com o verso
tradicional , valorizando o espaço em branco do papel ; a ênfase ao signo lingüístico, dando um
enfoque à desestruturação do significante como novas possibilidades de obtenção do significado,
nortearam uma nova visão dos caminhos que a nossa poesia poderia tomar a partir da segunda
metade desse nosso século .
Todavia , há um grupo de escritores que não segue nenhuma dessas duas correntes como
modelo poético, procurando desenvolver um caminho próprio. É nesse grupo que podemos enumerar
autores como Ferreira Gullar (posterior à experiência concretista) , Walmir Ayala , Homero Homem ,
Alberto da Costa e Silva e Mário Faustino.
Mário Faustino estréia em sua carreira literária publicando dois poemas em 1948 no jornal
paraense Folha do Norte intitulados "Dois motivos da Rosa" e "Poemas do Anjo". Já dessa época , o
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professor Francisco Paulo Mendes nos chama a atenção para a potencialidade do escritor piauiense
, colocando que aqueles poemas refletem o "desaparecimento do mundo puro da infância" , focalizando
os "primeiros contatos diretos com a vida áspera e má que os homens arrostam ."
O autor de O Homem e Sua Hora (1955) só publicou esta obra em vida . Sua intenção era fazer
um longo poema. Esse projeto ambicioso consistiria na reunião de vários poemas menores
(fragmentos) que seriam justapostos , criando uma unidade poética . Dessa forma , ter-se-ia uma
união entre vida / poesia , refletindo o caráter existencial de seu trabalho poético . É o próprio autor
que ressalta a sua forma de criação literária em carta ao crítico Benedito Nunes:
"Conto-te como trabalho . De certo modo estou procurando fazer em poesia aquilo que , em
mística , os santos chamam de oração contínua . Isto é : penso (quando verdadeiramente penso ...)
já em estado de poesia . Se posso , se estou sozinho , se tenho papel e lápis à mão , vou escrevendo
em bruto , da mesma maneira que em cinema se tomam takes que mais tarde serão montados .
Essa parte do meu trabalho se confunde com a minha vida , i. e., com minha verdadeira vivência".
Foram encontrados somente doze "fragmentos" que constituiriam esse projeto de Faustino ,
além de um longo poema intitulado "A Reconstrução" , que seria dividido em oito partes , tendo sido
feita somente a primeira .
A linguagem poética de Mário Faustino é planejada, como a de João Cabral de Melo Neto e
Carlos Drummond de Andrade. De estilo conciso, enxuto, o autor se utiliza de poucos adjetivos,
centrando sua linguagem no verbo ("ação transformadora") e no substantivado (objeto). Das figuras
de linguagem empregadas, são de sua preferência a metáfora (alcançando tons sublimes), a anáfora
e a antítese.
O livro é um livro dividido em três partes :Disjecta Membra (do latim , membros dispersos) ,
Sete Sonetos de Amor e Morte e O Homem e Sua Hora .
Os poemas que compõem a primeira parte são: Mensagem - Brasão - Noturno - Vigília -Legenda
- Romance - Vida toda linguagem - Estrela roxa - Alma que foste minha - Solilóquio - Mito - Sinto que
o mês presente me assassina e Heceldama. À exceção de Romance (em redondilha maior), há o
predomínio do verso decassílabo, trabalhado pelo poeta com uma grande variedade rítmica, utilizandose de formas livres na composição poética .
Integram a segunda parte: O mundo que venci deu-me um amor - Nam Sibyllam - Inferno,
eterno inverno, quero dar - Agonistes - Onde paira a canção recomeçada - Ego de Mona Kateudo Estava lá Aquiles, que me abraçava. Os sonetos são estruturados à maneira inglesa (quatorze versos
sem a divisão estrófica). Dos sete, quatro seguem a tradição renascentista de ter como título o
primeiro verso do poema.
A última parte contém o poema que dá título ao livro. Nele, temos a concretização dos anseios
poéticos do autor expostos na primeira e segunda partes. O texto possui 235 versos (na maioria
decassílabos), com forte carga de intertextualidade, visitando a poética passada e presente para
concretizar sua "renovação da poesia".
ANTOLOGIA
PREFÁCIO
Quem fez esta manhã , quem penetrou
À noite os labirintos do tesouro ,
Quem fez esta manhã predestinou
Seus temas à paráfrases do touro ,
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A traduções do cisne : fê-la para
Abandonar-se a mitos essenciais ,
Desflorada por ímpetos de rara
Metamorfose alada , onde jamais
Se exaure o deus que muda , que transvive .
Quem fez esta manhã fê-la por ser
Um raio a fecundá-la , não por lívida
Ausência sem pecado e fê-la ter
Em si princípio e fim : ter entre aurora
E meio-dia um homem e sua hora .
1.1-Primeira Parte - Disjecta Membra
MENSAGEM
Em marcha, heróico, alado pé de verso,
busca-me o gral onde sangrei meus deuses;
conta às suas relíquias, ontem de ouro,
hoje de obscura cinza, pó de tempo,
que ele os venera ainda, o jogral verde
que outrora celebrou seus milagres mais fecundos.
Dize a eles que vinham
tecer silentes minha eternidade
que a lava antiga é pura cal agora
e queima-lhes incenso, e rouba-me farrapos
de seus mantos desertos de oferendas
onde possa chorar meu disfarce ferido.
Dize a eles que tombam
como chuvas de sêmen sobre campos de sal
sem mancha, mas terríveis
que desçam sobre a urna deste olvido
e engendrem rosas rubras
do estrume em que tornei seus dons de trigo e vinho.
Segue, elegia, busca-me nos portos
e nas praias de Antanho, e nas rochas de Algures
os deuses que afoguei no mar absurdo
de um casto sacrifício.
Apanha estas palavras do chão túmido
onde as deixo cair, findo o dilúvio:
forma delas um palco, um absoluto
onde possa dançar de novo, nu
contra o peso do mundo e a pureza dos anjos,
até que a lucidez venha construir
um tempo justo, exato, onde cantemos.
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ROMANCE
Para as Festas da Agonia
Vi-te chegar; como havia
Sonhado que já chegasses:
Vinha teu vulto tão belo
Em teu cavalo amarelo,
Anjo meu, que, se me amasses,
Em teu cavalo eu partiria
Sem saudade, pena, ou ira;
Teu cavalo, que amarraras
Ao tronco de minha glória
E pastava-me a memória.
Feno de ouro, gramas raras.
Era tão cálido o peito
Angélico, onde meu leito
Me deixaste então fazer,
Que pude esquecer a cor
Dos olhos da Vida e a dor
Que o Sono vinha trazer.
Tão celeste foi a Festa,
Tão fino o Anjo, e a Besta
Onde montei tão serena,
Que posso, Damas, dizer-vos
E a vós, Senhores, tão servos
De outra Festa mais terrena Não morri de mala sorte,
Morri de amor pela Morte.
BRASÃO
Nasce do solo sono uma armadilha
Das feras do irreal para as do ser
- Unicórnios investem contra o Rei.
Nasce do solo sono um sobressalto.
Nasce o guerreiro. A torre. Os amarelos
Corcéis da fuga de ouro que implorei.
E nasce nu do sono um desafio.
Nasce um verso rampante, um brado, um solo
De lira santa e brava - minha lei
Até que nasça a luz e tombe o sonho,
O monstro de aventura que amei.
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1.2-Segunda Parte - Sete Sonetos de Amor e Morte
INFERNO, ETERNO INVERNO, QUERO DAR
Inferno, eterno inverno, quero dar
Teu nome à dor sem nome deste dia
Sem sol, céu sem furor, praia sem mar,
Escuma de alma à beira da agonia.
Inferno, eterno inverno, quero olhar
De frente a gorja em fogo da elegia,
Outono e purgatório, clima e lar
De silente quimera, quieta e fria.
Inverno, teu inferno a mim não traz
Mais do que a dura imagem do juízo
Final com que me aturde essa falaz
Beleza de teus verbos de granizo;
Carátula celeste, onde o fugaz
Estio de teu riso - paraíso?
ESTAVA LÁ AQUILES, QUE ABRAÇAVA
Estava lá Aquiles, que abraçava
Enfim Heitor, secreto personagem
Do sonho que na tenda o torturava;
Estava lá Saul, tendo por pajem
Davi, que ao som da cítara cantava;
E estavam lá seteiros que pensavam
Sebastião e as chagas que o mataram.
Nesse jardim, quantos as mãos deixavam
Levar aos lábios que o atraiçoaram!
Era a cidade exata, aberta, clara:
Estava lá o arcanjo incendiado
Sentado aos pés de quem desafiara;
E estava lá um deus crucificado
Beijando uma vez mais o enforcado
O MUNDO QUE VENCI DEU-ME UM AMOR
O mundo que venci deu-me um amor,
Um troféu perigoso, este cavalo
Carregado de infantes couraçados.
O mundo que venci deu-me um amor
Alado galopando em céus irados,
Por cima de qualquer muro de credo,
Por cima de qualquer fosso de sexo.
O mundo que venci deu-me um amor
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Amor feito de insulto e pranto e riso,
Amor que força as portas dos infernos,
Amor que galga o cume ao paraíso.
Amor que dorme e treme. Que desperta
E torna contra mim, e me devora
E me rumina em cantos de vitória...
1.3-Terceira Parte - O Homem e Sua Hora
O HOMEM E SUA HORA
1 Et in saecula saeculorum: mas
2 Que século, este século - que ano
3 Mais-que-bissexto, este 4
Ai, estações 5 Esta estação não é das chuvas, quando
6 Os frutos se preparam, nem das secas,
7 Quando os pomos preclaros se oferecem.
8 (Nem podemos chamá-la primavera,
9 Verão, outono, inverno, coisas que
10 Profundamente, Herói, desconhecemos...)
11 Esta é outra estação, é quando os frutos
12 Apodrecem e com eles quem os come.
13 Eis a Quinta estação, quando um mês tomba,
14 O décimo-terceiro, o Mais-Que-Agosto,
15 Como este dia é mais que Sexta-feira
16 E a Hora mais que Sexta e roxa.
17
Aqui,
18 Sábia sombra de João, fumo sacro de Febo,
19 Venho a Delfos e Patmos consultar-vos,
20 Vós que sabeis que conjunções de agouros
21 E astros forma esta Hora, que soturnos
22 Vôos de asas pressagas este instante.
23 Nox ruit, Aenea, tudo se acumula
24 Contra nós, no horizonte. As velas que ontem
25 Acendemos ou brancas enfunamos
26 O vento apaga e empurra para o abismo.
27 As cidades que erguemos, nós e nossos
28 Serenos ascendentes se arruinam
29 (Muros que escravos levantamos, campos
30 Ubi Troja - Nossa Tróia, Tróia! - fruit ...)
31 E no céu onde a noite rui só vemos
32 Pálidos anjos, livros e balanças,
33 Candelabros, cavalos, crocodilos
34 Vomitando tranqüilos cogumelos
35 Róseos de sangue e lava - bestas, bestas
36 Aladas pairam, à hora de o futuro
37 Fazer-se flama, e a nuvem derreter-se
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38 Em cinza presente.- Vê, em torno
39 De mesas tortas jogam meus sonâmbulos,
40 Meus líderes, meus deuses. Como ocultam
41 As cartas limpas, como atiram negros
42 Naipes no vale glauco de meu sonho!
43 Erza, trazem mais putas para Elêusis
44 E hoje Amatonte é todo o vasto mundo:
45 Prostitutas sagradas! - Se esta carne
46 Demais sólida pudesse dissolver-se,
47 Derreter-se e em rocio transformar-se!
48 Príncipe louro, oh náusea, proibição
49 Do mais ilustre amor, oh permissão,
50 Oh propaganda santa do mais rude!
51 L'amor che move il sole e l'altre stelle
52 Aqui parou, em ponto morto. Nem
53 Cometas hoje aciona, ou gestos de
54 Ternura move rumo aos eixos trêmulos
55 De seres enlaçados; nem desperta
56 Encantados centauros de seu sono.
57 Amor represo em ritos e remorsos,
58 Eros defunto e desalado. Eros!
(...)
111 Aqui devo deixar-te, Herói. Retiro-me
112 Para uma ilha, Chipre, onde nascido
113 Outrora fui, onde erguerei não uma
114 Turris ebúrnea, torre inversa, torre
115 Subterrânea, defesa contra as pombas
116 Cobálticas, columbas de outro Espírito 117 Torre abolida! No marfim que leves
118 Lunares unicórnios cumularam
119 Em cemitérios amorosos, eu,
120 Pigmalion, talharei a nova estátua:
121 Estátua de marfim, cândida estátua,
122 Mulher primeira, fêmea de ar, de terra,
123 De água, de fogo - Hephaistos, sobe, ajuda-me
124 A compor essa estátua; fácil corpo
125 Difícil Face, Santa Face - falta
126 O sopro acendedor de tua esperta
127 Inspiração... à noite, enquanto durmo,
128 Cava-lhe, oh coxo, o gesto e o peito, pede
129 À deusa tua esposa dê-lhe quantos
130 Encantos pendem de seu cinto. Phanos,
131 Phanos, imagens de beleza, chagas
132 Na memória dos homens... pede a Hermes
133 Idéias que asas gerem nos tendões
134 Das palavras certeiras - logos, logos
135 Carregando de força os sons vazios 136 Dá-lhe tu mesmo, Fabro, o mel, a voz
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137 Densa, eficaz, dourada, melopaico
138 Néctar de sete cordas, musical
139 Pandora de salvar, não de perder...
140 Orfeu retesa a lira e solta o pássaro.
141 Pronta esta estátua, agora, os deuses e eu
142 Miramos o milagre: branca estátua
143 De leite, gala, Galatéia, límpida
144 Contrafação de canto e eternidade ...
(...)
187 Vai, estátua, levar ao dicionário
188 A paz entre as palavras conflagradas.
189 Ensina cada infante a discursar
190 Exata, ardente, claramente: nomes
191 Em paz com suas coisas, verbos em
192 Paz com o baile das coisas, oradores
193 Em paz com seus ouvintes, alvas páginas
194 Em paz com os planos atros do universo (...)
223 Vênus fará de teu marfim fecunda
224 Carne que tomarei por fêmea, carne
225 Feita de verbo, cara carne, mãe
226 de Paphos, filho nosso, que outra ilha
227 Fundará, consagrada a tua música,
228 Teu pensamento, paisagem tua.
229 Ilha sonora e redolente, cheia
230 De pios templos, cujos sacerdotes
231 Repetirão a cada aurora (hrodo,
232 Hrododaktulos Eos, brododaktulos!)
233 Que Santo, Santo, Santo é o Ser Humano
234 -Flecha partindo atrás de flecha eterna 235 Agora e sempre, sempre, nunc et semper...
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