ESPECIAIS
Quando um trabalho é um sonho. E vice-versa.
01 Maio 2015
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Hugo
Tavares da
Silva
No dia do trabalhador, a história de Marko e Alex, dois
irmãos da Califórnia, que tiveram o melhor emprego do
mundo. O ator português João Cajuda também o quis. Não
conseguiu por pouco.
Quando era garoto, Marko sonhava ser diplomata… ou
carteiro. Misturar e aproximar culturas fascinava-o. A arte de
fazer chegar ao destino uma carta tem muito mais poesia em si
do que realizamos (já não se escrevem cartas como
antigamente), mas ele só queria andar na rua e poder dizer
“olá” às pessoas o dia todo. A seguir veio a paixão pelo
jornalismo e pelas palavras. Já Alex, o irmão, esboçou no seu
amanhã três caminhos: veterinário, surfista e explorador. O
futuro, esse colossal ponto de interrogação, trouxe-lhes quase
tudo o que desejaram: aventura, mergulhos de cabeça noutras
culturas, reportagem, palavras, animais e desconhecido.
Marko e Alex Ayling (29 e 27 anos), dois irmãos de San Diego,
Califórnia, mandaram tudo ao ar e decidiram participar
naqueles concursos do estilo “o melhor emprego do mundo” e
ganharam. Neste caso, foi o “Biggest Baddest Bucket List” da
My Destination. Foi preciso ultrapassar 1.250 candidatos, de
110 nacionalidades, para garantirem um emprego que passava
por viajar durante seis meses, documentar tudo e alimentar as
redes sociais e site da empresa. Ah, e meteram ao bolso quase
50 mil euros.
Marko e Alex Ayling (29 e 27 anos), dois irmãos de San Diego,
Califórnia, mandaram tudo ao ar e decidiram participar naqueles
concursos do estilo “o melhor emprego do mundo” e ganharam.
As histórias, memórias, lições e aventuras viveram-se em
muitos palcos. México, Vietname, Costa Rica, Brasil, Dubai,
Tanzânia, Zimbabwe, Singapura, Islândia e Nova Zelândia são
apenas alguns exemplos. Foi um regabofe de vivências e razões
para brilharem entre amigos quando forem velhinhos, um
viver a bom viver. E que tal um appetizer para ganhar água na
boca como quem pensa num crepe de Nutella?
“Quando estávamos no Cazaquistão”, conta Marko, “tínhamos
como missão encontrar nómadas a viver em yurts [uma
espécie de iglus ou tendas, se quisermos]. Fomos num todo-oterreno pelo Vale de Assy, perto de Almaty, e finalmente
encontrámos nómadas a acampar junto a centenas de
cavalos. Aproximamo-nos deles cautelosamente, mostrámos a
nossa câmara e perguntámos se podíamos estar com eles.
Primeiro ficaram confusos, depois o nosso guia traduziu a
nossa história para russo e eles sentaram-nos, começando
depois a oferecer-nos shots de vodka atrás de shots de vodka.”
As histórias, memórias, lições e aventuras viveram-se em
muitos palcos. México, Vietname, Costa Rica, Brasil,
Dubai, Tanzânia, Zimbabwe, Singapura, Islândia e Nova
Zelândia são apenas alguns exemplos. Foi um regabofe
de vivências e razões para brilharem entre amigos
quando forem velhinhos, um viver a bom viver.
Os locais quiseram depois sacrificar um cavalo em honra dos
irmãos, mas o guia rejeitou o convite pois teriam de ficar uma
semana. Diz a lenda, ou a hospitalidade cazaque, que ficariam
obrigados a ficar por lá uma semana inteira, enquanto
sobrasse carne de cavalo…
A culpa desta paixão pelo desconhecido é, maioritariamente,
da mãe, que trabalhou como hospedeira na PanAm, a mesma
que esteve em destaque no filme “Catch Me If You Can”, com
Leonardo Di Caprio. O pai é da Nova Zelândia, daí o apego
às diferentes culturas e costumes, dizem. Por isso tudo,
viajaram desde novos para todo o lado. “Os nossos pais
conheceram-se numa viagem à Suíça nos anos 70, portanto
podemos dizer que está nos nossos genes. A nossa mãe é
poliglota e costumava falar connosco em diferentes línguas,
especialmente em italiano”, explica Marko. “Estamos
extremamente agradecidos por terem casado e decidido criarnos assim”, complementa Alex.
Mas o que era, afinal, o “Biggest Baddest Bucket List”? “Foi
uma viagem de 25 semanas por 25 destinos, em 22 países —
seis meses em seis continentes. O objetivo passava por fazer as
maiores loucuras em todo o lado durante a nossa viagem
‘bucket list’ e documentar tudo através das redes sociais”,
explica Marko. O termo “bucket list” é relativo a coisas que
uma pessoa quer fazer antes de morrer.
Em Edimburgo, Escócia. Com kilt e tudo...
“Éramos responsáveis, todas as semanas, por fazer dois vídeos,
6 fotos
dois artigos e tirar muitas fotografias para o Instagram. Era
muito trabalho — e, algumas vezes, quase nos matou –, mas
acabámos por fazer das coisas mais incríveis que há para fazer
no planeta: dançar com os Maasai [um povo que habita na
Tanzânia e Quénia], fazer bungee jumping nas Victoria Falls
[Zimbabwe] e mergulho na Grande Barreira de Coral
[Austrália] e ainda queda livre na Nova Zelândia”, conta Alex.
Os desafios para vencerem a competição foram muitos, mas
um deles falava a língua de Fernando Pessoa. João Cajuda, um
ator que passou pelos “Morangos com Açúcar”, já havia
decidido que queria aquele estilo de vida, mas ficou-se pela
final. “O João é um porreiro e um cineasta extremamente
talentoso. Para ser sincero, era a pessoa com quem estávamos
mais preocupados. Ele era o mais talentoso e profissional, e o
vídeo dele foi o que impressionou mais ao nível da
cinematografia”, recorda Alex. “Na altura víamos todos os
vídeos que davam entrada, e quando vimos o do João
dissemos: ‘Uh, oh… este gajo é competição a sério!’. Quando
ele foi escolhido como finalista ficámos ainda mais nervosos”,
admite Alex.
“Inscrevi-me por brincadeira”, conta João Cajuda ao
Observador. “É que costumo fazer vídeos de viagens, e aquilo
acabou por ser uma experiência única. Fiz novos amigos,
abriu-me os olhos para o que queria fazer: viagens.” O filho do
treinador Manuel Cajuda é uma cara que já é muito conhecida
em Portugal, por participações em várias novelas, mas a agulha
mudaria.
"Inscrevi-me por brincadeira. É que costumo fazer vídeos
de viagens, e aquilo acabou por ser uma experiência
única. Fiz novos amigos, abriu-me os olhos para o que
queria fazer: viagens."
João Cajuda
“A televisão ficou um bocado de lado. Gosto muito do que faço
agora, foram opções. Até fui estudar Marketing e
Publicidade…”. Mas nada mudaria a sua vida como um diretor
de Marketing de um hotel em Marrocos, que gostou do vídeo
que ele fez naquele país, convidando-o depois a colaborar com
eles — foi aqui que começou a olhar para aquela vida com
outros olhos. A seguir, João conheceu uns portugueses que o
convidaram para fazer uns tours por Marrocos. “Fiz muitos
contactos em Marrocos, espero conseguir expandir para outros
países.” Quem quiser acompanhar o trabalho e as aventuras
deste português pelo mundo basta segui-lo no Instagram, blog
de viagens, Facebook e Twitter. De férias, tem-se aventurado
nos últimos largos anos pela Ásia: “Já chega, agora vou até
África. Vai ser Tanzânia…”
Marko e Alex, ainda antes de pensarem em concorrer ao
“BBB”, já vinham a desenvolver um projeto semelhante. “Foi o
passo perfeito, porque já estávamos a trabalhar em algo
semelhante. Passámos um ano a desenvolver o nosso estilo e
conceito para uma série de vídeos de viagens, por isso, quando
vimos o concurso, a nossa preparação encaixava perfeitamente
com o que eles procuravam num candidato”, diz Marko.
“Muitas pessoas dizem que temos sorte, mas não creio que
nenhum dos finalistas tenha tido sorte. Sorte é quando a
preparação encontra o timing. E, obviamente, a oportunidade
de exercer o nosso trabalho de sonho era demasiado bom para
deixar passar”, conta Alex.
Vivemos alguns dramas de infância típicos entre irmãos. Por isso,
houve muitas discussões, mas acabámos por ficar mais próximos.
Agora podemos chamar-nos verdadeiramente melhores amigos.”
Seis meses, vinte e quatro horas por dia, em locais difíceis ou
longe da zona de conforto, com desafios complicados ou
loucuras mil não deixa de ser intenso, até mesmo para irmãos
— ou especialmente para irmãos. Terá a relação deles sofrido
uma qualquer transformação? Foi duro? “Sim e sim”, começa
por escrever Alex num email enviado ao Observador, a partir
da Califórnia. “Ficámos muito mais próximos, mas estarmos
juntos 24 horas por dia, durante seis meses, foi um desafio
muitas vezes”, admite. Até ao concurso, já somavam oito anos
sem viverem juntos, conta Marko. “Vivemos alguns dramas
de infância típicos entre irmãos. Por isso, houve muitas
discussões, mas acabámos por ficar mais próximos. Agora
podemos chamar-nos verdadeiramente melhores amigos.”
Numa espécie de regresso ao passado, joguemos ao “Quem é
Quem?”. Tem barba? Óculos? Espera, espera, tem chapéu?
Não interessa. A pinta que estes dois irmãos norte-americanos
bem-parecidos tiraram um ao outro vai muito além do
acessório. Nas palavras de Marko, Alex é “determinado, um
verdadeiro contador de histórias e a vida de uma festa”. Nas
palavras de Alex, Marko é “inteligente, sensível, curioso e
único… Só há um Marko”.
A comida foi outro desafio. No Cazaquistão fugiram ao tal
banquete de cavalo, mas acabaram por comer carne desse
elegante animal. Aventuraram-se também no leite de camelo,
insetos (Ásia), cara de ovelha e tubarão fermentado (Islândia),
por exemplo. “Comemos muitas coisas esquisitas”, admite
Alex. Bom, não poderia ser tudo um paraíso, certo? Mas ficam
estes episódios para uma lengalenga sedutora, aquela que os
vai transformar em autênticos Rambos nas jantaradas de
amigos e família. “A melhor comida foi provavelmente em
Istambul e Singapura, porque em ambos os locais há muita
mistura cultural e influências culinárias”, diz Marko.
Marko, a festejar a conquista na Liga dos Campeões (?), no Vietname
Longe, muito longe de casa, Marko sentiu falta de um burrito
californiano e de uma cerveja de San Diego, enquanto Alex
suspirou durante esses seis meses pela prancha de surf e
bicicleta. Sempre foi assim, antes mesmo de investirem neste
estilo de vida. Quando ainda não sabiam o que lhes traria o
futuro, tiveram de fazer opções e foram para a
faculdade. Marko estudou Economia e Ciência Política na
Universidade da Califórnia. “Às vezes as pessoas riem-se
quando ouvem isto, porque parece que estou a fazer algo
completamente oposto ao que estudei, mas vejo as minhas
licenciaturas como excelentes prismas para entender e
interpretar o mundo à minha volta. (…) Depois da faculdade,
trabalhei fora: desenvolvimento económico na Índia e depois
como professor de inglês em Espanha, altura em que decidi
que queria ser um escritor de viagens.”
Alex estudou Antropologia e História na Universidade da
Califórnia. “Sempre tive interesse no passado e na forma como
isso influencia pessoas e culturas hoje. Por isso, filmar viagens
e experiências em diferentes culturas é um trabalho de sonho.”
Tal como o irmão, também Alex foi professor de inglês no País
Basco. E toda esta aventura começaria com umas brincadeiras
com a GoPro. “Decidimos fazer equipa e juntar os nossos
talentos.”
Todas estas aventuras e desventuras adoçaram-lhes ainda mais
o apetite pelo desconhecido, ou então pelo sentimento que lhes
invade a alma quando estão longe de casa. Onde viveriam,
Vagabrothers? “Imagino-me a viver em muitos sítios que
visitámos, mas definitivamente Rio de Janeiro, Istambul,
Londres, Vancouver e Melbourne… qualquer sitio que tenha
boa comida, pessoas bonitas e uma cultura interessante”, diz
15 fotos
Marko. Já Alex preferiria assentar na Nova Zelândia, a terra do
pai. “É o país mais bonito do mundo e, como o nosso pai é de
lá, somos cidadãos desse país.”
Bom, ponto final nos sonhos e na viagem inacreditável.
Desçamos à realidade. E que tal está a vidinha hoje em dia? O
que andam estes irmãos a preparar? “Estamos em San Diego.
Voltámos agora de uma interrail de dois meses pela Europa e
estamos focados no que vem a seguir. Estamos comprometidos
com uma publicação semanal no nosso canal de YouTube, mas
estamos também muito em Los Angeles para explorar
oportunidades nos media digitais e na televisão tradicional”,
diz Marko.
Vagabrothers
@vagabrothers
Seguir
Epic day cruising #SanDiego w/ @stevebooker &
@lostfoundkeep !
@visitsandiego @VisitCalifornia @discoveramerica
19: 32 - 27 abr 2015
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“Quando não estamos a viajar, estamos a planear as viagens.
Só planeamos a três meses. Mas também é bom aproveitar a
companhia dos amigos e família. Num dia normal, acordo e
passo uma parte do dia a editar trabalhos para o nosso atual
projeto, depois vou andar de bicicleta umas horas ou surfar no
Pacífico, que é o que amo em San Diego”, conta Alex.
Quem ficou curioso com a pedalada destes rapazes, basta
seguir o site oficial, Facebook, Instagram e Twitter. Quem ficou
a sentir inveja… não há crise, é natural. Que sirva para
inspiração, que sirva para sonhar acordado ou então, quem
sabe, para mudar de vida…
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