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A FACA E O QUEIJO NA
MÃO
Revisão: Luiz Antonio de Souza Jr
® paulo vitor grossi, 2011
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Uma novela pequena de
paulo vitor grossi
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Mas o homem que vem de cruzar de novo a porta da
muralha jamais será igual ao que partira para essa
viagem. Será, daí por diante, mais sábio, embora menos
arraigado em suas convicções, mais feliz, ainda que
menos satisfeito consigo mesmo, mais humilde em
concordar com a própria ignorância, embora esteja em
melhores condições para compreender a afinidade
entre as palavras e coisas, entre o raciocínio sistemático
e o insondável mistério que ele procura, sempre em vão,
compreender. (As Portas da Percepção, Aldous
Huxley).
– Não há uma única mulher – declarou Eumolpo –, por
mais fria que seja, que uma nova paixão não possa levar
aos maiores excessos. Para provar o que digo, não é
preciso recorrer às antigas tragédias, citar nomes
famosos dos séculos passados. Para provar-lhes,
contar-vos-ei um episódio ocorrido em nossos dias.
(Satíricon, Petrônio).
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Uma mulher. Um homem. Ou os dois liquidificados! Duas histórias
para dois humanos em lados opostos. Cada qual, seu capítulo. Julia,
Horizontal e “O Velho”, Vertical. Está o universo inteiro – deles - em
jogo, em xeque, espiando, sorrindo e questionando. “Como eu faria
para ligá-los???”, pergunta-se o ser que atende pelo nome de Folgato,
cuja influência sobre as pobres personagens move sua própria rasura.
Talvez onde estejam isso seja normal, ou não! Tudo bem, peço que
supere o fato de não haver maturidade ao par em questão. Não se
assuste com o teor narcisista, deve ser coisa de época! Seja você
também um aventureiro da mente. E “boa sorte”.
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PARTE PRIMEIRA
“Abandonar o homem a seu destino opaco”
(André Breton)
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CAPÍTULO 1: “Fase salgada: Vinho e Podrões”
“Oh! Mas que pena que não se possa viver apenas esfregando a
barriga!”
(Diógenes de Sínope)
“O Velho” chega. Huuu, o velho viciado em saídas. Nem se
assusta, volta para casa, a eterna segurança... sóbria. Vagou pela noite
fria do final de julho, pálida e com neblina. Ahhh, uma cascata de
visões e poucas pessoas no sereno ressoar. Veio de bicicleta e, nesse
percurso, viu um sapo – ou rã, sei lá, cara – que tava morto e virou
casca no asfalto, pra depois ser visto como documento de chão há
algum tempo desconhecido. Foi o que ele classificou nessa noite de
aparições.
Em casa, a TV tá ligada, mas ele nem presta atenção. Também
um colchão surrado ao lado e a sala vazia. Prepara um hambúrguer
com queijo e maionese excessiva. Deita pra comer e descansar de
nada. Tava bom, e é o começo: pega o vinho barato de R$ 3,49 na
geladeira. Ferrugem não o atrapalha. E bebe um gole, outro, outro e
deita no colchão. Desliza pela fadiga e noite extasiante: é a vida, o
andar, nada de emprego. São as relações. É o início, em plena quintafeira.
Sente o ócio controlado. Era pra sair novamente? Tava ficando
paranóico. Ele também era um gato comum das ruas, um transmissor
da hora – cheio de resina de tartaruga? Na pele? Não. Ele já foi
período, agora é deslocamento e liberdade sem namoro. Ele dá uma
pausa, olha para frente. Pausa e pensa:
− O que estou dizendo em terceira pessoa? Sou eu mesmo aqui. Pííí!!
***, que mané. Meus pensamentos fluem em rios... E assim vou
contar as coisas! Sou O Velho.
Tempo de natureza, guerra. Uma melodia MPB/rock salta aos
meus olvidos. Em cada nota, uma mensagem! Assalto sem armas,
sinfonia de desilusões com o mundo, reação coletiva, corpo, reflexões,
obra natural e a história dum homem. Peça e apresentação porca –
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em quem me inspiro? A contemplação foi antiga... tudo sonho, e
termina. Alô! Boa noite e até amanhã.
Lá vem o Gordo! Carrega a televisão nas costas. Melhor tirar da
tomada direto, claro. Adiós, jornal página de vida, amizade, comercial
de TV. Pô, o meu hamster antes de morrer roeu alguns botões do
controle remoto. Como posso trocar de canal? Tédio sovino. Foge,
ratinho... O ratinho fugia. Talvez eu te mate. Ainda que desta vez não
tenha rolado, não voltou... devo oferecer-lhe vela? É meu convidado
ou não?
Correria pra cozinha: sou um ator não desenvolvido. Onde
estão meus papéis? Na fome, no tabaco. Fumaça densa. Larguei o
cigarro, fumo esse tal fumo pra cachimbo. Faço meus cigarrinhos
com eles, mas não trago. É uma opção.
Desgosto depara-se ao fim de noite. A cor é bronze. Ele é culto
demais. Daí estraga, meus caros. O pôr-do-sol emburrou! A cara
descabelada. Minha cara. “O que não diz no anterior, fosso aqui”:
traição!... traição, lua brilhante, sol brilhante... e a lua brilhante para
os queridos corpo e alma... Um som sem escutar. O pôr do sol
emburrou! Dormir, vinho pra dormir. Sonho pra sonhar.
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CAPÍTULO 2: “Uma data no espaço e algo novo:”
“Eu não era culpada, mas sinto que vou morrer criminosa.”
(Astarté)
“considerou então os homens como eles na realidade são, insetos
devorando-se uns aos outros num átomo de lama.”
(Zadig)
“Tudo é perigoso neste mundo, e tudo é necessário.”
“Eremita” Do livro Zadig ou O destino
(Voltaire)
Menti, confesso, aumentei a história!! Ler não é criar uma
expectativa? Qual o porquê de se escrever este livro? Resposta
pessoal: coisa de mulher interativa... E meu nome é Julia!
Cá mostrando um livro sobre uma Julia que não existe mais
totalmente – eu nem existo! Sou pura ficção da minha própria cabeça
moderninha. Mas ando aqui, apresentando-me esmagando dedinhos:
literária e nem um pouco conceitual – de lado com os esquemas
escritivos. É minha vida, meu lado pessoal, meu olhar para dentro,
por eu mesma, já que a desordem me atrai; minha intimidade jogada
ao vento: sou muito mais mulher do que tantas piratas por aí.
Não preciso, ué... nem tenho disponibilidade para ficar
enriquecendo muito. Não sou nenhuma profissional. Só vou falar o
necessário, aquilo que veio do jeito bobo que é.
Percebam: analisar é bom, surpreender é interessante. Sei que
poderia dar alguns caminhos. Contudo, deixar pistas é mais
revelador. Sei que vou largar muitos fatos, pessoas etc. de lado, mas
isso é normal. São acidentes do subconsciente – quem liga pra tanto?
É história, é impressão, é biografia, é cotidiano e mentalidade.
E depois é a concentração bastarda, nada do que disse fiz...
Espalho Julia em várias formas e ações: uma mulher tentando
abraçar o mundo, e ele é claro e vazio... Como um rio, tem
dificuldades. É história, é narração de momento. No canto, entre
quatro paredes sujas à base de seduções e psicotrópicos!
É pelo silêncio dos intervalos de fluxo mental seguido do
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jorrar-composição que desenvolvo. Daí vem. Dançar sobre mim? É
desejo, é tratamento; escrevo. Um dia alguém vai ver ou ouvir: as
cartas de amor rasgadas e picadas em pedacinhos que foram jogadas
no bolso; roubos, furtos, mentiras, reflexos, hábitos litigiosos,
adolescência.
Às vezes, muitas vezes, roubo e minto coisas imateriais, mas
porque é boa a adrenalina nas minhas veias moças. É... de propósito.
Julgar as pessoas, autocrítica, perfeccionismo, mau humor,
autoritarismo etc... “Ela é realista demais. Ela é frágil e tácita”,
diziam. Tácita? Não pode ser real. Mas escondo, secreta, senhora de
mim, pois tenho coisas a dizer, e as acho demasiado relevantes,
fortes, feministas... Não pensem que eu sou esquisita ou má pessoa.
Muito pelo contrário, sou apenas sincera e emotiva. Adoro a vida e
novos ares. Sou simples, mais do que pensam. Apenas pensativa
demais – um óleo entre dedos me surpreendendo. Minhas juntas
renovadas: penso, vivo. Amante em todos.
Julia conflituosa, louca pelo jeitão “Clarice escritora”, e não
escondo... Quem é que pode me proibir? Deus na figura dum homem
ou um homem na figura de um deus? Não adianta proibir o
instrumento. A curiosidade e a teimosia humana fazem mostrar o
contrário, como uma criança, e crianças precisam de uma estrutura
familiar positiva para se tornarem adultos sem problemas. Mas vem a
adolescência e aí... Desculpem-me, crianças. Desculpem-me,
adolescentes, não é pra atingir ninguém. Desculpa? Os sonhos da
juventude devem ser cultivados e concretizados enquanto há tempo,
porque quando se é adulta eles não voltam... Sim... porque já foram
esquecidos. Por isso, tento dizer tudo agora. Por isso, os dualismos. É
necessário. No final das contas, humana demais. É da minha natureza
ser assim tão Julia – contudo já sei que “Egoísmo” é coisa da essência
de nós, humanos sedentos por carne, devendo este mesmo “Egoísmo”
ser controlado e subjugado o mais rapidamente. Também não é só
atual ser dramática. Tudo, sim, deve deixar de ser tabu. Eu sou
jovem, sinto isso. Posso o Cosmos!
Nesta continuação de algo, estou realmente suada. Converso
comigo. E chego à conclusão de que não vou ser uma cadelinha,
porque não tenho mais limite – este foi o último desjejum do tipo
sociedade/família.
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Ainda suada – muito mesmo! E meu cérebro? Nossa, neste
negócio já vou pra me explodir, de modo que dito minhas regras e até
parei de pensar nas roupas de gola branca e casa mobiliada.
Vou ter poucas coisas, intensamente suada. Serei a vergonha da
sociedade em pessoa! Por exemplo: comer com colher e cuspir na
mesa do patrão enquanto digo “me demito!”. E ter uma sanidade
inventada, fazer tudo que anseio dar certo, como planejei, como é pra
ser. Já vejo até no meu delírio a sala branca e a mulher que era pra
parecer... Eis que vejo também que sou pura ânsia de liberdade, de
ser arredia, feminista, machista, mas um pouco sólida. Quero
conforto emocional suprível, e inalcançável é minha organização. Ser
a imagem num filme que admiro e minha consciência num livro que
me identifico. Afundo minha cara de Julia em mim e em mais
ninguém. Voltei ao meu tempo, agora e nexo. Tudo nestas folhas de
caderno são impressões, e a gaveta é muito restrita, não acham?
“Ei, barbudos? Quem são estas pessoas em trajes? É, trajes!!
Ah, não... não traga, hômi! Cansei de acreditar que ser normal é tão
irreal.” Não? Não é isso que quero. Basta de balas na cabeça. Já fui
torturada de verdade de outras formas, mesmo assim... Abri minha
mente! Abri minha mente! Abri minha mente, e para outro alguém.
Me soltei. Os cabelos numa estrada sem volta. Aqui vai, aqui foi! Ah,
sim.
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CAPÍTULO 3: “É belo feio, mesmo!”
É belo feio, mesmo! Sorte, sorte! Não é? E acordo pesado, torto,
morto, fedido, gosmento na boca, bafento, feio e fraco. Tudo normal,
como parece. Mas é lindo. Bela, a vida. Além de tudo – aliás,
corrigindo-me, é uma comédia, a vida –, eu sou sortudo. Sempre
lembro que sou sortudo. Isso mesmo, cara... Por quê? Eu ganhei na
loteria! Há três anos eu fui um felizardo que enriqueceu da noite pro
dia ou dia pra noite, não lembro. Só de sacanagem, por bobeira,
comprei, apostei no escuro. Comprei dois apartamentos e vivo de
aluguéis... Como posso ser triste? Eu era um simples
vintepoucosanos atolado em dívidas!! Agora, incrivelmente feliz.
Jesus sorriu pra mim! Isso, sim, é alegria: a vida eterna fácil. Já
poderia ser ateu! Já consegui. Agora posso rir tranquilamente. Mãos
nos bolsos, meia no pé, e tomar café na padaria. Não preciso de
estresse. Caraca, do que posso reclamar? E, além de tudo, meu lar
infantil desapareceu... Tudo, tudo resolvido, tudo, tudo fácil! Bom
dia! Eu já tava esperando por isso há muito tempo.
Daqui não saio. Mesmo que fale sozinho, mas nem tem
problema, né!? Miro ao lado um livro novo da biblioteca. História
interessante: vida cotidiana estraçalhada por assassinato
escatológico. O livro me dá uma condição. Leio na cama, deitado.
Como biscoitos. Tento inchar.
Tarde quente. Ventilador em cima de mim. Será que ficarei
barrigudo? No livro há a sensação do definhar, do podre no humano.
Eu sou isso? Ããn!? Qual foi! Não devo nada a ninguém. Sou artesanal
e registrado.
Bem servido agora. Tem... é... deixa eu ver... Pão, queijo,
salsicha frita, catechupi, mostarda, maionese e a carne: suculento
esse hambúrguer – Mas o que curto é o queijo, ahhh... hum...
comedor de hambúrguer noturno! Quando saio de casa, é o podrão
e/ou cachorro-quente com coca. Morte lenta e deliciosa. Aleluia! Bom
apetite, crianças. A fita K7 vai escorregar do som. Salve a noite
solitária e a mão engordurada. Pança cheia. Sento e só posso rir das
reticências.
“Noites vampíricas” em que olho o horizonte... Mais
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exatamente vampírico/cachaçador. E DAÍ! Ahhhhh, que ressaca
agradável, que só se cura com outro porre...
Senhor do meu destino, teimoso em admitir que é obsessão por
nada. Se alguém tentar telefonar, eu saio. Se não, vou me afundar em
gravações antigas, memórias culturais. Estoque lotado. Demorou!
Vou morgar até perder o saco com a TV. Então, fujo novamente sem
ninguém ver – bem servido agora.
Resmungo sem fim??? Prato vazio, bateria esporrenta na
minha cabeça. Fiquei mecânico, virei uma fábrica? Vinho pra dormir,
quem sabe quem! Cooperativa, coletivo pra driblar a agonia. Hoje vou
tomar banho, 3 dias já se passaram sem eu notar. Calmos. Calados.
Quem deveria organizar tudo? Na prática é diferente: não consigo.
Com a ajuda dos amigos, eu vou conseguir? Que amigos? Nem
Zaratustra conseguiu, enquanto também o leio... Talvez Grenouille,
para ser mais perfeccionista. Merda, virei um mendigo reclamão,
resmungando bêbado pro vazio, pedinte na frente do Banco desse
Brasil, até trago mais tipos desses, todos fodidos pela causa! E vocês
aí. Por quê??
Não queria sentir saudade do emblemático Bar. Muito menos
do fracasso daquelas pessoas encostadas, ou a cerveja mais barata
com meus antigos amigos. Ou relembrar o Sinucão. É tão difícil. Mas
adoro as sensações envolvidas. Boas lembranças guardadas. Novas
sensações. E se subisse o Esqueleto? – Pra quem não sabe, era um
prédio abandonado invadido por vagabundos de todo tipo! Lá em
cima, poderia procurar por um tipinho chamado “russo”, mas sem
letra maiúscula. Será que ele ainda tá vivo? O prédio já era, a tia
vazou, a Lapa se foi. A segurança é turística. E Boemia também foi
para o beleléu. Jesus habita filmes e bilhões de Assembleias de Deus
por todos os cantos das ruas novas da urbanização tardia carioca.
Ciganos não existem aqui. É o poder, M das grandes. Quantas
lembranças... desde a cachaça de R$ 0,50, até os dias de hoje.
Impunidade pelas ruelas. É uma pena que vivo tão em casa, e da
MORAL todo o mundo já falou mal. Os remédios têm me viciado.
Tudo me vicia pra segurar o tranco. Barbitúricos, não encontro.
Adjacências dão um aliviozinho. Multidão sem casa na minha mente.
Aspirador de Pó de Dedetizador? Bela referência... Hoje tem pouca
coisa. Não é que misturei tudo no liquidificador?! Mas vou tocar tudo
na base da fé no álcool em si, róliudi vermelho, vinho pra dormir. São
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tempos difíceis. Onde tá o passado? Jovem ainda? Quem é meu pai?
Meu nome tem que ser esse mesmo? “O Velho”. Eu sou “O Velho”
ainda. Aliso a barriga. Tudo vira poesia. “E a noite toda me
surpreendeu, fechada em seu egoísmo surdo e tenebroso”. Cadê
Folgato nestas horas???
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CAPÍTULO 4: ““Onde “Maria” vive””
Mulher a... Botar tudo pra fora! É difícil, mas gratificante.
Depois prazeroso. Sei, é preciso vender a si até render. Não há como,
nesta nossa época, fazer ou produzir extravagâncias literárias sem um
movimento, sem um apoio. Mas tenho uma cara na moral, posso
tirar umas fotocas! Nunca disseram que sou das que assustam. Bem...
Sozinha, eu tenho que ser VISÍVEL – digo na voz de uma que está
para, por exemplo, declamar seus poemas em praça pública... mas
odeio o fato. E não vou fazer.
Sou uma aprendiz, um “Quadro de Curiosidades ou você
sabia?”. Mas geralmente o que escrevo é pequeno (não gosto de
alongar algo em que posso me expressar por algumas linhas e o
sentido multiplicar-se). Porém, não é Sócrates o meu mestre, então,
vocês que deem um jeito de ligar as partes e achar sentido... Assim
como ela: “Maria”. Vou falar de “Maria” – quase esqueço! (...). Maria
é uma situação, um grupo de pessoas. Onde é que mora a sua Maria,
heim? Quem é o óbvio nesse algo/alguém?
Ela, a “Maria”, tem a ver comigo e como pode-se perder às
vezes – uma personagem meio fictícia, irada, morta de visões. Maria
também era eu, sem rumo e num lugar estranho. Achava que não
tinha casa, pois morava com avós. Maria são pessoas perdidas. Se
acharem esquisito, não liguem. Acudam as marias desse mundo! Vão
ver que tem a ver com o próximo capítulo.
Há também que falar do nome de menina: Maria. Não era
nada, somente isso. Nem precisavam discutir, ou procurar soluções
em estupidezes. Lálálá, heiiei, ohoh... huhuuu. Por que nunca olham
os próprios narizes? O problema de ser uma Maria era a timidez
daquela época. Meu único problema era timidez. E se tinha esse
problema, quem diz nem sabe o porquê de se explicar. Mas o que digo
é que meu único problema era timidez, pois tinha um nome de
menina, nas atitudes de mulher. Qual nome disso? Ah, precisa dizer?
Onde a Julia/Maria viveria? Onde vivo, droga? Onde me
largaram? E quanto a ela? Ela vive nas ruas. Ela sente fome e raiva. E
quando aquele garoto rico jogou lixo nela, sentiu-se como se
realmente fosse aquela sujeira.
Vive num lugar onde quase não há sinal de liberdade, igualdade
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ou fraternidade. No seu coração, Maria é tomada por seus ódios
sociais e preconceitos raciais. Onde Maria vive?
Oh, Maria... Oh, é por todo lado.
A inibição, a vergonha e o sentimento de inferioridade são
fundamentos da sua vida. Vive? Oh, Maria! Ah, querida.
E num raro ato de desespero e/ou alívio, cortei meus cabelos,
que antes eram longos até os ombros e castanhos, bem curtos agora,
como Elis em seu auge. Aqui em casa ouço suas interpretações e
também a vejo em lindas canções repetidamente direto do aparelho
de som. Brindo ao meu vigésimo aniversário: sozinha e desconfiada
da vida. Mas não me importo, é como deve ser uma pedra.
Não posso aceitar perder! É uma guerra, dura, tenho minhas
armas, tenho uma pistola pregada na parte de dentro da perna.
Tenho belas saias sexy!
Acham isso ruim? Quais juízes escolher? Vocês se perguntaram
por que falei da “Maria”, certo? É só pra ilustrar, queridinhos.
Acontece que essa tal é como eu, um exemplo. Bom, ainda sou Julia, e
digo: é impressionante como um só dia pode conter e acarretar tantos
fatos relevantes e rumos – quiçá ir-relevantes.
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CAPÍTULO 5: “O Bar Código”
Muitas vezes, típica segunda-feira. Segunda-feira. Velho
velando! Dia de ninguém. Ócio puro. Corpo cansado. Saliva de
cigarro. Desânimo.
Ontem dei uma passada no Bar Código, pra ver umas bandas
de rock alternativo. Achei legal. Mais ou menos: é, na verdade, nada
disso me empolga, pô. Mas a cerva e todo o resto de pinga chique e
lanche de batata frita com calda de queijo amarelo era caríssimo pros
meus padrões que provêm de baixo da cadeia alimentar. E mesmo
que estivesse com a grana, não daria pra eles. Peguei uma Ráinequen,
R$ 3,50 – fazer o que, não tinha Brama! E sentei no balcão. Ouvia o
som das apresentações. Me inclino no balcão. O Barman resmunga
que a guitarra do moleque tá alta pacas. Se o Barman em sua
fastidiosa rotina enfurnada, se soubesse como o Rock incipiente,
roqueando ali, atentando ao pudor, é mágico! Se! Ou recebendo seus
sopapos harmônicos, microfonando de peculiar tom. Meu caro
Barman, a guitarra mostra o caminho. As alminhas é que se auto
convidam, conduzindo-se ao matadouro de hienas de todas as caras.
Porém, é mesmo, é som frio demais prum domingo cinza e chuvoso –
por que eles não fazem algo diferente? Por que não misturam COM
BRASILIDADES? PODEM VISUALIZAR QUE PERFEITA UNIÃO??
Essa segunda não é muito diferente. É necessário recolher-me
em significância. Contudo, sigo de meias pretas com furo no dedão,
bermudinha e casaco. Tosco. É que vivo como peregrino caseiro. A ir
preparar um ratão-de-casa. O colchão me espera seguido dos
quadrinhos ao lado. Nem eu me entendo, cara!
O dia será longo, mas tenho livros. Tô com tempo de sobra!
Olho a parede, penso. Olho ao redor, reflito. É minha folga, sabe –
que piada horrível!!
O vinho da geladeira tá no fim. À tarde tem VHS que aluguei
dez anos atrás. Depois... Noite é só vadiagem. Oh, a rima é tão
selvagem...
Acho a sa-í-da. Muita mosca em casa. Pano de chão cheio de
terra. Tênis mofado pela água da chuva ao lado da porta. Batata
palha. A geladeira tá triste. A música de fundo é do extremo norte de
uma América nocauteada. Mas é a realidade.
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Folgato ainda não voltou. Os insetos e as sombras se alastram –
ele me ajudaria, ah claro! Meu amigo perdido.
Jornal Hoje. É preciso lavar o sanitário e botar as toalhas pra
secar. Limpar a pia e jogar o lixo fora fica pra mais tarde. Pooooxa.
Por que essas paradas simplesmente não saem voando e dão um pluft
e evaporam??
Hoje tentarei matar COTIDIANO. Ele me assola como peste.
Mas primeiro vou espantar os demônios do dia: as moscas, antes da
saída!
Horas depois, vento na cara. Orelha gelada. Borda do jeans
molhada. Jaqueta. Mãos nos bolsos. Guarda-chuva encaixado na alça
da mochila. Cara anestesiada e repentina. Espera. Parado. Imóvel e
olhando ao redor. Ao que seria tua tia da Salvação, pede. Espere e
sim. Ruas úmidas, escombros, casas fechadas. Verde escuro nas
árvores. Poças d’água. Fumaça do cigarro como um rastro. Neblina à
frente. Carros passando com os vidros fumê fechados. Cochichos.
Passos meus. Eu tava esperando meu cara. Toca o orelhão, o fone,
fora do gancho. Onde tá o asfalto? Aspirinas pra minha cabeça
latejante. Passos fora de compasso. É a música da minha situação!!
Rotina, saí de casa em pedaços. Ao lado, uma árvore seca,
árvore que racha o chão. Pichação no Rio de Janeiro.
Bar. Esquina. As velhinhas me olharam mijar. O cão abaixou a
cabeça. Ninguém viu, ninguém vê. Caminho. A avenida é larga.
Profunda. O final é branco. Toda a cidadela é estria e erosão. Beco
escuro. Ratinhos. Casa. Escadas e um novo amanhecer. Eu sou
umidade. Ela veio. Eu sou um, voltei.
Mas espera, espera, espera, espera: susto! Um carro passa
voado! Nada... ufa... era outra carruagem morta, indo. Tudo bem,
ainda não era.
Fictícia não é mais a entrada. É a Rua Santo. A fachada da casa
tá ensopada de letrinhas. Entro.
Traáácq! (Triinlilin)
−Caiu o prato!
−Que coisa, toda hora... Deixa que eu apanho.
−Chega logo ô, toma teu troço – rosnou-se o Traficante.
−Ah, já vou... – Digo eu, largando as outras “especiarias” para
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conferir as novidades!
Escuro. Profunda lerdeza. Um zumbido anuncia que se eu não
impuser um limite, já era. Dou uma gargalhada gordurosa de louco.
Que bobeira fútil. Eu sou tudo aqui. Mas, mas. Meus amigos já
morreram antes de mim. Que bom que nunca me desesperei. “Valeu,
doido! Te ligo na próxima”, digo ao tal comerciante ilegal, figura em
extinção.
Tremedeira Sandinista, por que não se cala!? Recorda que a
volta é demorada. Imbecil sarjeta e paranoia. Huuuuuu.... a Ooonda!
“Tua mãe vai chegar”, ouvi. “Fedeu!”, disse rápido! Tô doidão.
Coração na mão e memórias. Um arriba doutro, mais e mais. Hoje eu
não tenho limites. Ergo o dedo! Alto, alto, alto!!
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CAPÍTULO 6: “E mulheres retratadas...”
Alguém me disse: “Pra Julia, um recado: consorte, apenas por
sorte ei de esquecer que já li o livro que me deu. E apenas por
esporte, Julia, não volta”. Mas esse “alguém” era alguém
significante: uma mulher, ah, sim, uma mulher. Seu nome seria
irrelevante dizer, já que vocês não a conhecem e eu tenho um pouco
de receio. Mas o fato é que ela me deixou triste algumas vezes, e
algumas dessas estão embaixo de mim, em subdividadas partes
desordenadas das letras, sempre prontos para recordar.
“Hoje ia prepará-la um jantar à luz de cinema e flores secas
daquela loja, te botar na parede, porque continua a mesma de quem
fiquei com raiva, mas teu pouco esforço pra conosco me fez deixá-la a
sós. Ainda gosto disso, mas sei muito bem viver longe daqui. O que
vai acontecer, então? É totalmente imprevisível. Quase como ser uma
anti-heroína você, e eu a vilã.
Hoje é um dia de decisão, pois agora que refleti já não tenho o
que temer nem perder de você. E este cabelo, agora, é meu mesmo. A
influência passou, como o dia.
Quando estiver derretendo de verdade e começar a apodrecer,
vou te perguntar se é verdade ou mentira, paixão ou ilusão, hora ou
ano?
Já não tenho o que perder, agora que sei o que sou. Quero e
faço à imagem. Sou minha princesa e, se me tem como amiga, te
quero longe. Ontem e hoje, ah.
E sobre esta água de piscina, à mão de caneta amostra grátis,
declaro: vou ser uma dessas rainhas! Já vi o ruim e caminho sobre o
inventado bom. Já este e o mais estrelado dos céus e já sem lua
minguante sobre guarda-sol enchendo d’água. É a confirmação das
“Noites estreladas, estrelas cadentes e insônia”.
Visto a armadura de pássaro sem casa, na cultura; e quando
varrer escritório dos outros, serei reconhecida; dita por ruim e
palavras lembradas. Terei um canto sem esse calor e poderei usar
várias roupas sobrepostas como uma Judas-Gato-de-Botas.
Vem e vai, ziguezague... Ganhei um chaveiro de bronze e uma
conta bancária. Mas e as despesas? Sim, sim, sim... Há luz, que de
longe é mimada, peixinhos de espécies diversas, pia com restos de
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almoço, mosquitos e sopas do governo, mas também há uma mulher
com seu “eu lírico” inquieto: que vem e vai, ziguezigue... É assim...
Ganhei um chaveiro de bronze e uma conta bancária, amiga. Mas e as
despesas sem norte? Sim, sim, sim, e elas, como as pagarei?
Uma tira de lã escreve no ar o nome de mulher numa camisa
verde. É (a camisa) em forma de tira... Essa camisa tinha furos que
foram drenados pelos traçados contornos “x”, que, aliás, não foi dito,
era verde também, mas tinha uma coloração clara e fina em seus
traços pequenos.
Depois do transcrito na camisa, essa tornou-se nova: tinha
beleza de vitrine. Tudo mais que lhe faltava era um toque de artista
da próxima dona – diga-se de passagem que ficou linda, mesmo já
gasta e com bolinhas de algodão.
Ela tinha uma nova apresentação, ainda que mesma cara,
mesmo cheiro. Por que, então, te deixaram assim? É distinta! Já pode
ser vendida! E no mostruário vai estar escrito: “– Se for confortável,
esteja disponível”. Mas em outra loja terá o seguinte aviso: “– Vida a
objetos inanimados. Preço justo!”
O subconsciente pôs uma etiqueta ruim na tua estampa, cara:
CAMISA NOVA, e impôs: “– Produza, faça mais desse tecido
modificado”. Mas eu comparo: o tempo é longo – cheio de surpresas
a lápis.
A primeira vez que te vi (Desculpe, mas tinha que contar este
episódio, mesmo ainda estando triste):
Estava quente. Você... Ficou umedecida e me molhou os olhos e
dedos. Ouvi a música lenta e deslizei como uma menina agradecida...
Seu gosto salgado – e pouco azedo – grudou no meu cérebro, tanto
que meus cabelos tiverem de ser lavados. Tudo virava macio e
anestesiado, mas ela só me usou e testou até mandar embora, com
fome, ah, querida folha de papel/mulher.
Minhas pernas paradas, você contra mim, beijou, e, suas
pernas também... Ainda está em mim, e ela sabe quando reclama,
chora, faz tudo voltar, mas não vou te ajudar. É como o óleo entre
dedos... só sentimentalismo.
Srta. Larissa. Viram? Está bom para alguém? Me condenem.
Esse é o nome. E... apesar da vida curta, ela já foi muita coisa pra
muita gente diferente. Às vezes, ela mesma não sabe o que é ou quem
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é. Sentindo-se diferente, tenta lembrar o que aconteceu, mas apenas
sabe que procurava algo – todos nós sabemos o que é. Por quanto
tempo ela ficou cega? “As trevas” a cercaram, envolveram-na,
cresceram dentro dela, tavam sobre ela. Tudo o que foi repugnante,
peças e ação.
Só então, neste momento frio e cotidiano, é que ela viu a
verdade do instinto – sempre esteve lá, mas ela não tinha percebido.
Sempre disseram a ela que desafinava, que não se importava com
droga nenhuma.
Por que aquela escuridão interferiu em sua vida tanto tempo?
Todos nós sabemos o porquê. Ela desejava isso – validava sua
existência.
Bruxas e gritos, feitiços, quanta besteirada: “– Não se importa
com nada nem conosco, né”. Roupas pretas e botas com salto de
agulhas, usa e nos usa. Nossa, como poderia ter sido boa pra você,
querida. Eu quero sexo bom em tu. Lari, Larissa, ah porcaria! Como
repito essa bomba de nome! O que você vai me dar, além de munição
para aniquilar ex-marido?
Larissa, a mulher sozinha. Pensa e anda pra lá e pra cá. A sua
mulher, separada, mas não só, vivendo ali num novo ângulo. Dessa
forma, fica fácil trocar de vida: sair da rua, da velha rua, agora
molhada pela chuva desta estação. Tantas por aí, personagens das
ruas... De pinguças de bares noturnos a mães como as nossas, todas
olham as alternativas. Menos essa.
Peço que repare por trás do palco: ele está limpo, mas também
há alguma sujeira. É relativo: tantos cérebros não aproveitados
passaram por ali. E tu?
Fica sozinha, minha querida. Te amo tanto para que fique dessa
maneira. Tudo está se modificando. É melhor ficar só. Sei que prefere
a mesma companhia, normal, cotidiana, não tiro a sua razão. Porém…
Tenta algo tipo... viajar! Muito fazem. Viaja para uma praia linda,
tranquila, azul, doce, sono, amor... de mulher, casinha aconchegante,
tudo pra tu... E manda a conta da água de coco! Não vai estar só, é a
solução, vai mudar sua vida. Eu juro.
Leitura, escrita, fala... tudo na aprendizagem – e o mais difícil
neste percurso é a audição. Não é vazio tudo o que digo; o que digo, é
da mais pura sinceridade infantil descoberta – posso me orgulhar
dessa qualidade. Se eu escrevi (muito disso aqui), escrevi por tu, Lari.
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Amei isso aí desde o dia do nosso carnaval a três, antes de tu gostar
de crianças, antes de ter e largar o marido travesso. Quem sabe o
porquê de haver química entre os corpos? Olha, eu gosto dela e
acabou, fim de papo. ”
Não resisto. Nestes últimos parágrafos acima disse o que
poderia ter dito com uma só frase: “Venho aqui me apresentando,
confundindo e escrevendo sobre saudade e aflição de estar você tão
longe, fofa”. Sim, o nome é Larissa – cabelo roxo, boca rosa, óculos
amarelos, pele verde. Ela é o quê?
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CAPÍTULO 7: “Pre'la”
Sheila. Droga, droga. Sheila quer tremer na sexta. Eu não te
amo, sapequita. Você é só tesão! Por que insiste? Não sou de
ninguém. Sheila, sua idiota. Ahhh.... anjinho... Para de me procurar
por aí. Tu não é Joana D’Arc! Mais parece Dalila. Sabe como a vejo?
Como aquelas lendárias mulheres das histórias do Robert E. Howard.
Imaginem sem a roupa da época!! Ou vestida nela, huuu! É o tipo
forte, fêmea com fibra.
Daí, é... mesmo assim corro atrás dela. Essa menina tem algo,
dou-lhe minha colher de chá. Sempre me interessa. Então vou ao
encalço, voo até seu apê. Chego na portaria:
−Como assim ela não tá?
−Não tá, doutô – disse Gilmar, o porteirinho.
−Eu é que procuro – respondo aporrinhando.
−Dá pra perceber.
Deixa pra lá. Essazinha... Eu não queria tê-la na minha cozinha
mesmo. Talvez seja mentira do porteirinho, às vezes acho esse cara
apaixonado por ela. Por mim, pouco importa, eu não me preocupo
com nada que não do meu interesse momentâneo. Nunca escondi
meu egoísmo despeitado. Era só diversão. Ainda que tivesse me dado
um friozinho quando consegui uma fêmea depois de tanto. Mas
passa.
É hora de esquecer... Querida, você foi muito rápida. Eu tou
fora. Às vezes sumo por necessidade. Um tempo nos dias. Ninguém
me acha. Minha fuça vai dar uma corridinha por aí. Se alguém pensar
em me procurar: não tenta, não vai achar. Ninguém vê mesmo!
Desligue-me a TV. Evito conversar com os outros humanos, prefiro o
meu raio de ação, prefiro a desordem. Desliguem a droga da tevêêê...!
Fim de Carreira, mas melhor do que cantar sozinho num
videoquê em festa de criança, bêbado e abraçando uma futura tiazona
baranga. Sheila me deu um toco, que fiz de errado? “Olha o que você
fez!”. Dei um tiro no pé, vai ter que fugir mesmo! O mais fundo que tu
puder, fofa. Foge o mais que der, é medo, eu sei.
Me deu uma irritação repentina que tive que sumir no mesmo
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momento. Sempre acontecia. Isso é que nem bipolaridade. Largueime daquele prédio!
Sheila, huuu... Li e reli meus clássicos. Empilhei tantos livros
em casa que parecia que montei um sebo! E como me refugiava nas
impressões dos meus livros! Distrai, né?! Me leva pra fora de tudo
isso... Mas não sei o que passa na tua cabeça; onde mais procuro a
resposta?
Caminho, para que ela saiba de saudades – se é que sim,
porque com o dinheiro que recebi, pude comprar dignidade,
independência, orgulho, poder. Aliás, eu podia dizer mais como aliso
a barriga. Alguém desconfiaria que é uma característica minha?
Hunf... Sinto um pouco de saudade das segundas e terças afins no
Beco, da casa onde cresci, do barro, da chuva e do frio debaixo da
coberta assistindo um filme. O dinheiro só nos isola. O Amor como
museu!
Súbito um morador, um sujão de nome desconhecido mas de
reputação risonha aparece; ele brota loucaço! Grita que “ÉRRSSA
POURRA DI CACHAÇA ÉRR pííí!!***!”. E quebra a garrafa. Destrói
com a mesma determinação dum Olímpico! Cacetada! Gostaria de
saber o nome!! O barulho da pinga estilhaçando no chão é incrível,
um TRRRRÁÁÁÁ LINININN!! Sabem? Digam o que quiserem, mas é
uma autopunição. Do mendigo, o deleite próprio mais uma vez, do
símbolo que é, do Homem, enfim, em si. É a vida. Outra vez. Claro
que alguém comeu a carne e sangue e tripas desse ser. Desastroso
episódio desde o primeiro dia após as vitórias. Tranquilizantes e
álcool, botecos e calçadas, a finitude do dinheiro sugando ao fundo,
pedindo mais cachaça, zerando opinião, vontade, forma. Acabou seco
o cara, e sua garrafa também, estraçalhados aí.
Eu rio, mas logo serão os que o riso acabará lágrima/e dor de
cabeça! São todos os “artistas”, “vagabundos”/“parasitas” dessa
cidade Rio de Janeiro/ Centro. Becos escuros/ Casas
abandonadas/pelo Império Antigo/praias desertas.
Tô só pensando. Como alguém que entra numa loja e diz pro
vendedor: “tô só olhando, obrigado”. E fica nisso.
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CAPÍTULO 8: “Limbo, limo, mofino e acidular...”
“ Ainda algo ou coisa, ainda é dia... Já
vou cansada, já fui cobrada e irritada. “Só resta esperar...”. Mês que
vem serei recompensada com meu salário de vozes. Acho que vou
gritar, quebrar o abajur. Mostrar que não sou uma puta idiota. É a
realidade a que se acostuma, o bisturi contra as veias, vexame e
glória de mãos dadas transformados em supernovas de prazer...
amordaçado! ”
(Julia)
“Personagem” é quem eu gostaria ou teria sido em minha vida
imaginativa. Então... Não seria melhor esquecer, apagar, bloquear
mentalmente as passagens ruins? Bom, é o que tento; fazer o que,
né!? Pra mim, só o ideal serve, caso contrário fico assim, deprê. E
Julia pra baixo nem é legal.
Droga... Suja e fedida de tanto escrever e pensar acerca de meu
mundo. Devemos pedir perdão? Por quê?? Contudo adoro meu
cheiro: quando bom ou ruim, me ponho como uma macaca auto
coçando e snifando... hunf, quer dizer, tenho minha marca. De
madrugadas sem luz. Fico em casa só pensando, inválida dengosa.
Com o tempo, a paciência vai pro beleléu!! Essas paradas de
humanos cansativos, ah minha paciência.... Lembro das “mariposas”,
as cheias de vaidade, ambição; ambas nós, filhas de lares sem pão,
calejadas, pois sempre seremos lembradas como as putas de carne e
osso, assim como cogumelos na terra úmida. Ambas nós.
Sina? As nuances dos meus desejos iguais a felinos e felinas
entregando-me à própria sorte. Desesperada, recorri às pequenas
orações, bebi da água turva onde ninguém vê, pus meu útero em
ruínas ao comércio sexual e... dessa forma tosca, jogaram-me no
cárcere do Homo Lascivus:
−Quanto é o programa?
−Importa? Tu não é rico?
−Mas eu quero ouvir da tua boca o TEU PREÇO!
E calo.
Vamos lá!! Agora outro assunto: o outro lado das coisas: há
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alguma ponte relevante nas estranhezas... e, ah, esquece. Não quero
ser tão chata quanto já ando sendo. Vou falar de meu jeito de
escrever. Bom, eu gosto das quebras pra deixar os escritos mais
vanguardistas, de uma forma que qualquer um possa ler, aí já é
diferente. Depende da uma interpretação nada vocal. Eu sou bem
desregulada no quesito quebra, pontuação, lógica. O que faço é bem
livre e pausado, cheio de pedaços. Não acham que há beleza em
esquemas assim? Extravagâncias mais simples, digeríveis, ou mesmo
bizarras? E no encaixe das partes, o tem a dizer? – talvez estejam se
perguntando: como essa desgraçada sabe escrever? Digamos que eu
estudei “bastante” quando deu vontade... ainda que escola pública no
Rio de Janeiro deixe tanto a desejar. Não que sejamos burros, apenas
o ensino foi pouco. Existe gramática na escola pública? Pra mim não!
Enfim, odeio política. Não cedo.
Já lhes falei da história da máscara que vi num museu? Linda.
Nem um pouco enrugada. E até escrevi para ela: hum... Leiam:
“Obsessão: prejudica-me – é sabido –, mas não há nada a fazer.
Peço desculpas a quem acreditava nessa máscara posta e a quem já se
irritou com o que for. Comigo... deixa pra lá. Nem importa tanto
assim. Olha aqui!
A traidora: isso já tá fora de controle. Não tenho mais limites.
Chega de vida dupla, aventura. Onde me esqueci? Minha consciência
tá dura. O que me tornei? Meu pulmão me expele.
Sou uma traidora? Ou reveladora? Cheiro à desconfiança?
E tu, mulher em formato de L, vai falar algo?
É tempo de mortos-vivos, escravos...”
Ufa! Uh, hahah, falei demais, né!?
27
CAPÍTULO 9: “Alargue-o”
Nada. São os dias que passam para esse “Velho”. Não tive força
de vontade pra memorizar nada.
Será que vai acontecer uma mudança radical? Será verdade que
chega a hora em que nossas vidas vão ao avesso? Caminhando,
metamorfoseando. É tão irreal que me choca ao ponto de não querer
mais nada!
Mas é preciso alargar. Eu falo dos dias, fazer passar, botar pra
atuar o escapista inabalável que sou. Com máscara ou não, porém
munido de Língua de Sogra! Hahaha, só rindo. Aqui, nesta cidadela
chamada Rio de Janeiro – quem nunca abalou-se com algo daqui?
Quem nunca se sentiu afetado por este estado de folia? Ou falando de
nada e dando em nada? Queeemnão?
É como uma “Turnê Decadência”. Minhas pestes são motivo de
admiração. É uma turnê primitiva esta que atende pelo nome...
Decadência. Minha cabeça tá pra explodir; as dores pulsam como um
bigulin se animando. Todos os dias tenho sofrido (sem porquê
concreto). Penso em tudo, tanto pra fazer e tanta vontade de só olhar.
Mas todos os dias me curo em escapismo. Analgésicos, indigno. Pois
a dor é Decadência e minha cama tá fedida a couro cabeludo de anos,
esse travesseiro é duro. Êee! Fedor ao redor. É uma pedra o existir.
Cadê você, Folgato? Cadê? Folgato, um Mago da atualidade! Eu
preciso conversar com um amigo que não me questione, eu preciso de
algo novo. Quem diria... É que, puta que la mierda, agora que entrou
na minha cabeça, vai ser brabo recuar...
Vou comprar o primeiro álbum do Mutantes e dosar a saída pro
novo bem-estar. Antes eu ficava pê da vida por ter que ganhar meu
pão pelos outros, sendo explorado num emprego dia a dia. Agora,
sacoé, me faço! Ouço, a MÚSICA é minha cúmplice.
Mas me carece de reais cúmplices! Tô encrustado no
isolamento social de improvisos, um território movediço da natureza
humana. Ouve-se até chocalhos indígenas.
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Financeiramente reduzido à preguiça de levantar daqui,
profetizando, olhos fixos e neutros e delirando. Bobeiras de fundo de
quinal. Sabe, é que tô zureta! As estribeiras pupulufi... Vejo minha
lápide e rio altão: ““O Velho” já era? Entrou pra galeria das ameixas
vivas? Só Folgato pode reanimá-lo? Noite adentro com a perdição,
maldição induzida: solidão. Ele espera. Reclama, bebe seu vinho,
come queijo. Até que aconteça algo...”. O único que acontece é o riso.
Menti e assentei pra mim, mesmo que só pra me safar... na cama.
Eu devia ter nascido um hamster pra viver brincando debaixo
das serragens da solidão paga com ração de girassóis! Ou ter virado
caminhante pela Terra pra não me preocupar com mais nada senão a
contemplar o espetáculo das planícies e tundras de amanhã! E... é...
Pode parecer que eu vivo na não-era, na pííí!!*** nenhuma, mas eu
também me divirto, uso as minhas “drogas” e viajo e largo o pííí!!***!
Ah! No outro dia sai o comentário sobre o disco: “Um dia darei
um comentário sobre o disco que não ouvi!”. Não me tomem por
exemplo, não sou novela, tenho ideais. Ai, que mancada.
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CAPÍTULO 10: “Um antes de”
Ter simplicidade num livro cheio de aventuras de situações e
fatos de brinquedo é complicado. Às vezes, penso que poderia ter me
inspirado mais em Crusoe, por exemplo, e me aplicar mais em alguns
momentos. Vejam abaixo:
−Robinhouuu, me empresta uma agulha.
−Mas para que, minha cara Julia?
−Preciso costurar um vestido bem lindo.
−Eu não preciso desses apetrechos por aqui, portanto, nem possuo! –
Responderia Robinson Crusoe, tranquilamente, e com o clássico
sotaque inglês.
Escrever tem sido mais que uma distração. Para tanto, peço
desculpas se mal expressei em algo. Venho tentando trazer para o
coletivo o que em vários instantes passei. É quase uma impressão
gigante. Mas não se preocupem: o papel branco não me assusta,
muito pelo contrário, ajuda. Afinal, a cor branca dá vazão à
decoração.
Apesar de nem gostar de tudo, admito que relevo porque meu
inconsciente expulsou... Dar sentido pra certas e não perecer uma
ostra, até porque somente reclamar seria comum e fácil demais –
puxei isso de família! Talvez gostando de sofrer eu seja mais forte e
resistente cada dia melhor... Expurgando...
Não vou exaltar a morte ou o suicídio. Não sou assim tão
extrema. Nunca vi alguém que podia rir, chorar e sonhar virar carniça
na minha frente, então não posso vir a ser tachada de hipócrita.
Os grandes livros da humanidade talvez não sejam tão bons
quanto eu imaginava. É só a primeira impressão! O mal existe; a
morte é algo sério, transparente, sóbrio.
Rolo e enrolo. Meu peito batendo acelerado em pique intenso, e
o corpo assusta-se. Nasci com um sopro no coração... agito-me e
quase morro de tão eufórica pelo B.P.M. enfurecido. Meu peito duas
vezes mais a pulsar; e enlouqueço ao me perceber estática, silenciosa
de êxtase quase sentindo o sangue ferver e me arrepiar embaçando os
olhos. É um filme pornô a minha vidinha. Sou tratamento, meu
prazer aqui dentro... respirando rápido. Seria assassinato ver de longe
a Julia, enjaulada. Cérebro meu, expulsa alguma coisa que preste pro
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resto da vida!!
Morta de sono, não consigo pensar em nada, somente digo
estas coisas com coisas, coisas com palavras – quase sonho. Palavras
avulsas. Vou para cama.
Passando os canais e vendo tantas bobeiras e imagens de todos
os gêneros, inúteis... Imagens sobre imagens. Passando de canais sem
dar importância, só para ver algo correr meus olhos e não fazer nada.
Mas já cansei disso também, TV não presta, prefiro cinema, livros,
ruas.
Meu nome já deve estar até soando mais suave e familiar aos
ouvidos de quem o diz, repete. (Não?) sou uma mulher em crise. Até
que provem o contrário, não me entrego ao chocolate e coca cola
vendo novela ou filmes à noite no sábado – que, aliás, é A hora de
atividade mesmo!
Flerto com a banalidade e o vital... Tenho que dizer algo: não há
verdade estática no mundo, somente pessoas com a sensibilidade
exposta, e na incoerência é que moram todas as leis (ditas e
fraseadas). Por exemplo: uma noite estrelada é só uma noite
estrelada. A incrível capacidade de associações da raça humana é que
a transforma em poesia, literatura, verdade universal. Acontece
mesmo é o nadica de nada estigmatizado e estilizado. O vazio seco
absurdo é que é. Mais tudo e complexo que viagens lisérgicas de
alguns poetas virtuosos. Não me levem a mal, por-fa. É a era
moderna pendular arcaica. Ser o que quer ser é puro instinto. A
repressão é um evento de domingo, como verdades falhas, eu
estatelada. Quis no medo morar uma verdade. Essa é a insegurança, o
pudor.
Sou pura intuição e vontade jovem, inspirei na observação.
Senti na pele, carne, ossos... que para uma pessoa que se contenta
com tão pouco e ao mesmo tempo busca tanto, uma palavra de
coragem ou agradecimento, conta muito. Ah sim! É gratificante, tanto
que quase choro de alegria. Mas sou dura..
Alegria. Um desenho, uma pintura do estado de graça. É sentirse bem consigo e com a consciência. Eu converso com ela, falo, digo
tudo. Porém, só consigo dizer tudo escrevendo – cara a cara
desconverso, fujo, falo só besteira. É quase meu papel nessa peça
chamada VIVÊNCIA sendo descoberto. Inspiro-me em crianças que
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dizem o que vêm à cabeça e na sabedoria dos velhos. Agora, tento
repassar.
É na simplicidade das particularidades que me acalmo. Até os
objetos inanimados podem ter vida – lembram da tira de lã de que
comentei antes?? Só depende do seu amor pela cara e importância
que eles podem dar pra gente. Pode haver relevância em tudo. Já
disse o quanto sou fã da imaginação? Ainda tenho bonecas velhas e
rasgadas de quando era menorzinha, e as trato como se só estivessem
dormindo. Quem me dera o mesmo?
Poderia até ter nascido uma planta. Sim, uma planta. Gosto de
vê-las sendo tão lindas e mundanas – de um esplendoroso vigor. Sua
delicadeza e cor verde/orgânico são como a sabedoria de um povo. É
verdade, gosto da ideia de ser uma planta, uma linda a ser observada
por gente que me acha tão bela quanto a própria existência, e tão
significante quanto a natureza – vistosa à brisa, representando. A
planta sempre vive e é sinônimo de realização; profunda vida e amor;
ser, parte da coisa.
A verdade, quase sempre ela, é tão simples. E, às vezes, nem
tanto dolorosa quanto dizem. É o momento. O caminho da realização
completa o ciclo na felicidade. Se rodo a bolsinha, e daí?? Tanto que,
exemplificando, uma velhinha ficou me encarando... dessa vez. Eu
bolada com um monte de troço... Dei um berro no ouvido dela,
subitamente, feito louca: “– Que Foi, chata??”. Estremeceu toda,
soltou um “Jesus!!!” e enfiou o rabo entre as pernas. Mereceu! Mas já
faz tanto que passou.
O caminho do autoconhecimento não é tão difícil quanto
pensam os cultos. Nós, plebeus de tempo de vida, observamos
externa e internamente, e vimos o quanto é simples, fácil pacas. É
isso: antes de morrer, preciso entender. Não posso me enxergar vaga
demais. Recuso ISSO. Não sei se há depois, chance depois. Isso é
libertar-ser. Um dia conquistarei mais que isso, melhor. Vão ver!
Liberto a Julia tanto quando me olho; e no espelho me
identifico como pessoa e rio.
Por que não disseram antes que há tantos sentidos nas
sensações e palavras ao nosso redor? Tanto a se entender – queria,
agora, poder domar o tempo e conduzir à perfeição levando a mil
reflexões. Queria mais disponibilidade para crescer – cresço muito
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devagar, “trabalho” como uma formiga. Cadê a outra meia-lua? Eu
tenho um fígado para ser comido. Sou muito esperta!
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CAPÍTULO 11: “2544”
Ou o que encontrei por lá dos meus pensamentos:
18:05. Eu sou muito inteligente! Mesmo que deixe os dias
passarem devagar. Pois é... Dias passam devagar... Hunf... ai, ai... O
tempo e as intempéries me cansam. Mais complexo vitamínico pra
me deixar em 60% da minha capacidade humana. Dias passam
devagar, e daí? É uma larica eterna!!
18:07. Hum... fez sol essa tarde na recriminação própria. A
plateia tá apática, a casa é de prazeres, a força com filtros de voz.
18:16. Minha senha é 2544. Digam que dá pena. Chama, vai,
sou vendedor de cartões de crédito em tenda de centro comercial na
galáxia 2544; ou seja, não bati a meta.
18:20. Sem asas, memórias(?) de agora que não voltam... são o
lembrete do póstumo esquecimento que ainda não se concretizou; um
passarinho burro que tenta todos os dias fazer seu ninho urbano na
caixa de correio duma casa número 6 qualquer – e que os donos
sempre o reprimem, retirando os primeiros galhos. Ah o rapaz, chei
de Antiácido analgésico pro “Velho”.
18:25. Cof, cof órfão de pai. Tosse, tosse, infeliz. É o castigo cof,
cof. Você precisa é dum banho de sal, desintoxicação, ou mãe... Não!,
deixa a mãe fora disso. É imoral. Edipiano. Não sei, mas pouco me dá
na telha!
18:30. Ahhh, a passagem 11 disso, tudo corrompido. Tudo
avariado, tudo remexido de “sebo nos cabelos”!
18:31. Sol das 17 horas. Já tô ni outro dia, ou só parece? Não.
Uma tarde bonita. Grama, onde não devem as pernas ruins passar,
luz sobre as flores. Frescura. Sol das 17 horas. É sábado. Hora de
caminhada, pão, café.
Mas eis que surge: dum bueiro, um sujão, ele vai soltar pipa ali
mesmo. Mesmo acabado, game over pro mundo, ele tá feliz agora...
consegue. Não tem responsabilidade... também não tenho, mas por
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que não carrego a cara de felicidade dele? Não saio de minha
“pobreza” porque gosto de ficar assim tão cinematográfico!
18:32. Não um morto-vivo, amigo! Coé! Eu sei andar. Ando
desde a adolescência, mesmo que só do colégio pra me irar. Eu sei
andar, sei ouvir Pixies com “Velouria”. Confundam, por favor. Olhar e
caminhos também se confundem – tantos são eles! Hoje. Estou de
hoje, e hoje tem muita gente, meu mundo é plural, e é difícil ser
escutado como algo.
18:40. Ultrarromântico? Azia. Queimação estomacal ou fígado?
Bílis? Bah. É a minha teimosia. Tampouco desejo isso a ninguém.
Imundice mesmo. Eu sempre soube: algo fervia
verborragicamente. Tenho 20 anos, e daqui a 3 meses vou pra idade
ultrarromântica. Mas o que sou, enfim? Talvez um pouco de tudo, sei
lá.
18:50. Ouvi o ditado castelhano “El bien suena, y el mal vuela”.
Enfim, como vou interpretar a estrutura da realidade? Nem eu sei por
que tô aqui, pois é tudo sobra, tudo que meu cérebro não quer – um
tipo Rimbaudiano rejeitando seu passado. Subliminar & limiar. Pré-,
pré-, pré-. Uma mina terrestre, o chão de ovos... Perfeição, longe,
sempre vai. Sabe, eu sou incapaz mesmo. Contudo, não é pra dar
importância. Puta teia de emoções que se move... É horrível, e abro a
dispensa, e a cerveja não tá gelada como no comercial. Por outro lado,
intertextualizar é como Interzone. Ah, aqui tá infestado!
18:53. Personalidade. Doido pra saber quem sou, como e
porquê? Não é? Certo? Aqui absorto há mó tempão e ainda não sei.
Vivo chegando da noitada fedido a álcool, cigarro e batom de mulé, e
não tomo banho; no outro dia lavo o corpo, mas a cabeça fica pra
outra ocasião. Como pizza velha da geladeira. Minhas camisas
brancas encardiram-se e as cobertas daqui têm buracos. Meu único
par de tênis possui três bocas. Quase nunca lavo meus jeans. A toalha
fica na cama... sou um projeto de macho dominante
desgovernadooohouu!
18:59. Jesus, sinto o fundo do poço ou ressaca. Querido
Álcool... tremular coisa amarga, irritante magia, gole dos infernos, eu
perdi a vida; desatenção em lista. Um clima terrível! Hamlet é meu
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pai. Maria Madalena é minha mãe. Salva eu!!
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CAPÍTULO 12: “Mascar quebra-cabeças e pregos?”
Bem, bem, chega de encher linguiça à toa... Já percebi que isso
está parecendo um fútil diário casca de ovo. Mas entendam: ainda
estou viva (isso soa melodramático, mas não tem nada a ver) e
frequentemente descrevendo minha “obra” (canteiro de obras?)
eucarionte doida. Pode rir! Ei, é compreensível. Não me condenem
por nada, pois já que está aqui, foi por SUA vontade. Alguém te impôs
ler isso aqui??
ATÉ PODERIA TER PARADO, ENTRETANTO VI DE NOVO...
Poderia existir um recanto onde me escondesse e tivesse lendo o
futuro e pensando no que escrevo nestes tempos. E com gosto de
sabão na boca eu faria escrever, lidando com a realidade e
associações, pouco método e à moda “SEM COMPASSO”. Inspirandome em vidas – minha e tua, Larissa: o objetivo é fazer da gente um
quebra-cabeças. Um tipo raro, com... é... Finalidade sim, de
esclarecer isso e tentar alertar sobre os defeitos. Não é bem uma
crítica, nem alusão (acho que pensaram isso): é o que acontece no
dia-a-dia – indigne.
É que Larissa tinha – ou tem!? – uma particularidade a seu
favor: era a mesma mulher de dia e de noite, desde a hora que
acordava e até quando corriqueira. Não seriam disfarces, nem coisa
“forçada”. Era de verdade, uma humana. Larissa ingrata!
Profunda desordem, ah... Caprichos... Onde recolhe-se a
disposição conveniente? Em tu, que lê. Você é a chave das associações
– indigne.
Como é engraçado ver a gente na rua, digo, ver-se numa tela ou
foto. A imagem, a cor que só o artista ou câmera obscura sabe
reproduzir. Contudo, quando me enxerguei, vi uma eu que não
conhecia: em gestos ou fisionomia – no papel é difícil explicar. Assim
como convencer qualquer criatura sobre aquela lenda de pescador
que fala das escamas, das virgens, dos peixes, e do bobó de camarão
em suas férias de anos. Pensem num filme e na personagem que mais
se identificam. Agora imaginem-se lá. Viram? Serão o que quiserem –
adoro imagens, adoro climas bem passados nelas! Há tantas
possibilidades e formas além de sentimentos a se mostrar!
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Mergulho. Peço desculpas à minha natureza e caio nesse
buraco que é a distração da leitura... A outra realidade! Caixa arquivo,
eu entro. Despreocupada. Adentro como Metamorfose Ambulante!
Em minhas mãos, eu, mulher. Como meu pai um dia ensinou: “–
Vamos fazer tudo certo para não haver decepções. Te amo muito e
quero teu bem. Digo isso para ressaltar minhas expectativas quanto
ao teu futuro, e rezar contigo, minha filha. Vamos, ajoelhados, no
escuro, ao lado da cama, antes de dormir, pedindo que sejamos
felizes”.
E falei, tomada pela sabedoria dele: “Meu pai não queria que
eu dissesse, mas rezamos todos os dias à noite pedindo felicidade”.
Esta é uma boa lembrança de minha infância, dos nossos
testamentos... “...e rezar contigo, minha filha. Vamos, ajoelhados, no
escuro, ao lado da cama, antes de dormir, pedindo que sejamos
felizes”. Bom lembrar disso.
Minha cara – minha cara é ela, a Larissa. – ela falou um dia da
situação de estar com a mente em branco – ir e vir como baratas
tontas? Daí, neste ponto é que começamos o próximo diálogo juliar:
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CAPÍTULO 13: “Aplausos, ecos e Folgato”
Por que me chamam de velho? Talento, dádiva, presente ébrio.
Insanidade forçada. Evangelho caseiro. Pretensão. Ruído fraco. Ou só
pra rotular?? Pensem! Pendulemos.
Após sair de casa para ouvir novos sons, o que anda rolando, e
ler algumas revistas das bancas, ainda em mim lembranças
soporíficas dos zum zuum de todos os lados na minha bebedeira e a
canção estrangeira chamada “the gift” toca na minha caixa... torácica.
Leio mais letreiros caminhando. Meus olhos brilham, e um friozinho
toma minha nuca e barriga.
Água borbulhante. Esquisitice. Lado de lá. Experimento.
Desencanado. Descolado. Aí. Imagens de Piva. O que é assepsia?
Queimei meu dicionário de bolso. Já era! Injustiça. Loucura bacana.
Luz, compasso. Também não sei cantar. A quarta dura pouco. Quem
vai mixar isso aqui? Escroto. Pecados. Obstinação. É a trilha desta
aqui. Talvez inferno calmo. Bruxas do limbo invólucro. Gemidos.
Órgão. Transe. Tortura. Faça. Falta de possibilidade. Tentativa final
do artista. Oh, goodbye!
O olhar crítico do mundo e eu de bobe por aqui, heheh.
Assim, uma mulher gritou na avenida:
−TÁ CAGADO! VAZA DAQUI, BABACA!
Outra:
−Joga a TV pela janela: tá passando o “Esperança Criança”!
Bom, o laboratório vai chamar. Até quando tem trem no
domingo? Edaí, edaí, tô zureta!!! (Risos)
Penso: “Chuveiro... pra tirar o fedor das axilas e sexo. Aproveita
e retira a massa nos dentes, homem. A remela. O cotovelo russo.
Pensa no que fez – eu fiz, fiz de tudo bobo”.
Passo os olhos pela habitação e vejo dinossauros enfaixados!!!
Bola de cristal envidraçada. Gênio “sem” da lâmpada. Uiiii, logo
diriam. Retrato meu vestido de marinheiro na escola aos 9 anos.
Tadinhas das pessoas que me jogaram aqui... Assim é.
Relógio do camelô!!! Protetor solar. Globo de 20 cm. Bíblia
virando pó. Peixe empalhado. Poeira, discos da matriarca. Eu bebê...
39
como pude ser tão...??? Coisas da escola... Minha estante antiga tá de
lado... Como vou indo. Não o mesmo de antes, bem mudado.
Retrógrado, ou besteirada. Barriga pra frente!... Pelos esparsos
nas costas. Antigo piercing juvenil no mamilo esquerdo. Cicatrizes.
Sujeiras nas unhas. Barba grande. 20 anos. A cobrança feroz. Indo.
Canceroso e aidético por afinidade. Inutilizado pelos prazeres
desconhecidos da bebida e tudo quanto é tóxico que vejo pela frente;
é atração, fazer o quê!? E pouquíssimas perspectivas na “vida”. Eu
semimorto e vejo. Tudo o que quero é acabar... e desaparecer. Mas eu
sou “O Velho”, tô na parada ainda!
Esta necessidade de entorpecer tá me consumindo, atrasando,
atraindo cada vez mais dor de cabeça. Retratando minhas ações,
aflorando emoções tolas. Minha moléstia é ninguém menos que
euzinho. E. Fecho os olhos. Enjoo. Vomito. Cara de bunnn… éerrrc.
Quero ajuda mútua, secreção, inseto. Kafka pra ler? De
Quincey pra ler? E pra ajudar no caso de Folgato, o desaparecido,
Patrícia M.?
Inversão (onanismo diário pra relaxar ao acordar). Meleca. Dia,
volta. Espanque-o, mais e mais até ter aquele sono. Mamãe num tá
aqui. Espanca, hu. Fotos no cérebro: onde elas estarão neste exato
momento? As musas petrificadas. Aperto o botão e entram em
movimento. Quanto tempo passou desde o dia da gravação? Espanco,
até dizerem: cacetada, por que diabos cê fez isso? Até não querer mais
nada, só aquele sono/acordado de alívio e gozada e laricas.
Aos poucos, vou voltando... Deitado, pensando. Em. Mentir,
roubar e dar voltas. Quanto é preciso por um banquete? Uma figura
sinistra. Papel de goma de mascar. O olhar das pessoas lá embaixo. O
nervosismo. Calma, me, me, melecaaa! Tô de volta ao jogo, olha só
meu vinhosinho, ahhhh. Não ligo pra eles lá fora se exaurindo
pedindo morrer. Mim morrê bem. No meu reinado. Descascar
caroços. Densidade. Levitação. Os pôsteres dos meus ídolos olhando
pra mim. Tô errado? Meus caros, eu não entendi o que tá escrito nas
suas cabeças. Vivo? Sem torturas, cintilantes metralhadoras no
cérebro. O escuro e o ventilador de teto. Corpo na cama, deitado.
Calmaria. Doce. Súditos. Eu me fecho, ê... n.d.a. Mais... Desliguem-se
vocês mesmos. Volta mais tarde.
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Saio, mas retorno. E vocês aí? Voltando pra casa depois de três
cervas só no bar do Senvida, eu paro é na extremidade da
compreensão e olho dois vagabundos jogando cartas. Vejo também
uma lata de lixo com rádio acoplado que toca Jovem Guarda. Os
vagabundos viram e sorriram; eu sorri e fui embora, correndo.
Ostrava satisfeito. Quem sabe dos trocadilhos de ontem e hoje? Mas
que horas são? Devo comer jornal de anteontem pra me atualizar!
Aposto que tô fatigado e lesado e... apático, agora tanto quanto o
Universo. Chamo esse todo de Real/Realidade, pensem. Qual a
pergunta certa? Quem pode dizer!? Quero um jantar alto nível.
Próximo. Pois preciso demais recuperar as forças. Rir. Mesmo com o
friozinho, e mesmo com a madruga aos meus pés, os mosquitos saem
das roupas, sapatos, cortinas, sofá, cama. No Tibete tem mosquito?
Como eles são? Será que aguento aqueles sete anos? Carne, pelo,
leite... o caminho da fronteira e conversa com gosto de chá. Paisagem
exuberante em qualidade de fora. Tão besta. O que acha, Buda?
Acho que já posso ouvir e apreciar o barulho da gandaia de
Folgato – ou será mais um engano da ansiedade? Talvez ele já esteja a
caminho pra pular dentro do cesto de lixo... e rolar... ou sair com a
cabeça cheia de farofa, e a tradicional cara de pau com sorriso “ops,
foi mal”. Possivelmente ficarei de cabeça pra baixo ao saber o que
aconteceu com ele: quantas histórias; por quantas aventuras ele
passou? Hum... e se invadiu uma casa à procura de acasalamento e
encontrou apenas ração?(...) E se nessa ração estiveram, escondidas
pelo próprio Salomão, três suculentas pepitas de diamante? Ou recém
postas ali por outro pirata que as ocultou no interior dos biscoitos
cheirosos, numa fábrica? (...) Folgato foge e caga o que comeu. Ai.
Um moleque pisa na bosta. Ele vê o paraíso! Sou eu esse garoto?
Atravancado, tortuosamente estrume de vida pós-mim.
A paranoia com Folgato volta como as ondas do vinho fresco de
geladeira! O ladrão não vem atrás de Folgato. Ele sabe do garoto, seus
passos são de glória. Sua mochila é divina. (...) O escorrego é flácido e
a mochila vai parar na Baía de Guanabara. Os próximos farão o show
continuar. Tudo pode acontecer com o aprendiz de sósia. (...) Não
temos celular, Folgato. Calha de nem ser tão urgente assim! Pai e mãe
não nos trarão copos de leite com chocolate... Boa noite, amigo...
onde quer que esteja vagando. Escreve uns postais, pô!
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CAPÍTULO 14: “Atacando seres humanos,”
Certo dia, um cliente perguntou:
−E agora, pra onde vai?
−Eu? – Me assustei!
−É, tu! Nos divertimos aqui e tal...
−Pra onde vai a tua mulher?
−Hã? – Embranqueceu e mixurucou o cara. Devia ter uns 33 anos,
casado há pouco, ainda sem filhos. Um tipo normal, que dá umazinha
com a universitária depois do trabalho, para na casa de um amigo e
toma banho, bebe sua cerveja, papeia um monte de escrotice e volta
pros braços despreocupados da esposa. De quem é a culpa? Eu?
Quem manda ele perguntar um troço desses?? Só porque sei e não
reajo? Prendam-no em flagrante. Eu sou uma viciada, acessível. A
falta de afeto reclamando não é só minha, é de todos. Sei que vivemos
sob o signo do medo, que me resta se não lucrar??
−O que disse? – Ele pergunta novamente, como que certificando-se.
−Nada, só tava te zoando, bobinho! Vai ligar de novo pra mim?
−Vou pensar no teu caso, gatona. – E dessa forma se despede, não
sem antes deixar algumas notas sobre um criado-mudo. Ah, o apego!
As aortas que o digam! Também já desisti de ser como as outras,
horizontalmente. Mas todos sabem, é malvadeza sim. Fatos
lamentáveis com as esposas acontecem... (Risos)
Penso na cara do meu cliente. Hunf... Aquele a me assassinar
no olhar, que me sustenta e condena. Ao vivo. É... Os idiotas são os
que detém as moedas! Fico suando. É ruim mesmo olhar por isso. Às
vezes, suporto a dualidade mirando o chão, pra baixo, baixinho,
punindo.
Há sentido... Tem mesmo? Pelo que sei, aqui a fé perdeu-se,
escangalhada por usos e abusos – num sonoro não! E como me
SALVAR se não possuo dindin pra TER uma Religião? Ah esse
mundo despreocupado desajeitado de hoje, nem sabe onde ir. E mais:
MERECEMOS!! A rotina nem é tão importante. Os grandes fatos
relevantes sim. Guardem!!
Imunda, pensei em refúgio nos braços da Lari. Mas cadê ela?
Voluptuosamente atrapada, sofrendo de raiva; preciso das mãos
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sujas. A terra me suga, eu rejeito ainda. Mas Larissa... Preciso de
carinho, explosões vulcânicas de emoção. Não que me escape das
mãos a vaidade, mas é que... Claro que entendem, poxa!
Ainda pequena, como na vez em que fui à praia com meu
padrinho (irmão da minha mãe) e esposa e filha dele, me ocorreu
uma negócio filhadapííí!!***: ele não sabia que eu num sei nadar! E
nesse esquecimento versus brincadeira, meu tio me largou numa
parte funda do mar, e eu... Afundei, ops.
Não, na verdade eu me afoguei, mas tentei demonstrar orgulho
e saí sozinha, “nadando” pra frente, quase sem ar, desesperada,
ahhhhhrr, realmente debaixo d'água, roxa. Sobrevivi, mais uma vez.
Mas o que isso tem com o quê deste capítulo? Na verdade não sei o
que vou fazer, me perdi de novo no quebra-cabeças repetitivo! Quero
falar de pessoas egoístas que não percebem a rotina que passa diante
da fuça, nos significados e palavras atribuídas a sentenças que não
deveriam relatar. Confuso? Olha para uma árvore e pensa em tudo o
que ela está para a Vida – lembra de que a observação vale muito.
Tenta, eu sei que pode. Agora olha ao redor, o que você faz pela
Natureza?
Dou, mas sem resposta concreta neste profundo paradoxo de
amor em significados distintos para cada uma. Não depende só de
minha vontade, compaixão deve ser recíproca. A questão é que a
responsabilidade materna em você, Lari, aflora. Em tal caso, a
transviada que sou serve de lição de moral às outras mulheres – até
porque o mal e o bem têm conotações diferentes, e criar o menino é
algo mais importante que um antigo prazer estritamente carnal (isso
para ela). É uma pena ter sido tão ingênua – digo pelas duas, sim.
Jogo a titica no ventilador. Mas sempre revejo suas pernas na minha
cara, eu e meus gritinhos de pode mais. E pensamentos
descontrolados, onde tudo é proibido e saboroso.
Tenho que, para me curar, tomar suco de laranja ou abrir a
mente e mostrar um outro lado conotativo. Dominar meu corpo é
minha cobiça, meu estado, e ela é sentir. Aprendi que a Faca corta, a
faca endemoniada despreza esses. A Faca Versus “O Zero vestígio
sentimental” e seus delitos degenerados de Julia. Era pra ter dito a
Larissa que eu sou a FACA! A FACA E SEUS DÉJÀ VURES
CURATIVANDO-SE. Cada dia sendo nova ou ainda eu mesma?
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Pois é, bem, mais uma fase. Gratuidade alertando. A fase do Píííí-íí!!***
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CAPÍTULO 15: “Do Conto da Ilha Desconhecida”
Eu quero falar do conto da ilha desconhecida, mas meus dedos
doem. É a consciência do solteiro de terça-feira. Acordar preguiçoso.
Padaria. Supermercado. Suprimentos. Biblioteca. Livro... e um tal de
conto da ilha desconhecida, no qual me espelho mar para entender
que me falta um barco. Eu não sei. A situação deste momento é:
necropsia em mim. Erro médico ao me dar à luz. Inquérito e sentença
num depoimento onde a testemunha diz: “Obrigado!”
Sons. Todas as minhas noites são de camisa preta,
bermuda/pijama e meias furadas. Meus pelos emergem como
cachoeira e a calda de morango do sorvete é meu sangue. Minha
urina é vodca e meu cocô, o sorriso do anunciante das belezas
mundanas. O sofá cresce em ondas marítimas, o cheiro é de madeira
e a música ambiente é o gotejar do chuveiro... Aliás, sabem as
maravilhas sonoras produzidas por controles remotos, caixinhas de
música, relógios e radinhos de pilha, colocados junto à captação
duma guitarra??? Um dia eu fiz isso, adicionei microfonia e
dedilhados clássicos. Aí, meu quarto virava estúdio de banda de
garagem e eu fantasiava um CD cheio de climinhas, fundos daqueles
que só se ouve com fone. Tão idiota adolescência! Que bom que
passei.
Ihhh.. . A fome é feia, já disse um amigo. Transformo-me num
roedor e deslizo pelo piso até a carrocinha de x-tudo/cachorroquente/refri, mas substituo as bolhas dos gases daquele Tobi de
refrigeréco prum digestivo melhor: pinga da boa. (...) O cara é de
longe, lá do nordeste. Ele é um alquimista amador dos podrões!
Juntou líquido marrom com textura de couro, e deu: “hambúrguer de
papelão! Não vale, heim, bacana...” Um dia te descobrem. Calor,
calor, calor e risos no cenário! – É que ouvi dum outro desocupado
uma tal lenda: indivíduo que envenenava as pessoas com “carne”
“falsificada”! Porém engraçado. E, do nada, o cara da carrocinha me
pergunta se não tô perdido. Respondo “Que não!”. Aí ele resmunga
informações sobre uma tal casa. Provável que fosse um Inferninho
repleto de palpitantes ninhos de seda e veludo azul e carpetes
vermelhos ou sorrisos acessíveis. Quem dera! Digo que “não, valeu” e
pico a mula. E ele fica lá com uma cara de quem comeu e não gostou,
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caramba! É impressionante como antes entrava e saía dos lugares
como um fantasma! Em vista disto, a toda hora alguém quer trocar
um palavreado.
Cães na praça, na rua de volta! Os cães me acompanharam até
chegar em casa, eiiiii. Que houve? Os cães me acompanharam até em
casa – uivamos. Huuuuuu... Praguejo com eles e lamentamos ter que
repor o sono noturno para não sermos devorados pelo dia. Todos já
fomos surrados demais, tudo calejado. Um dia nós contamos como
toda essa miséria começou...
Quero ninar (com chá mate e biscoitos de sal), espantar
demônios, exorcizar meu bebê interior, roer unhas, me cobrir todo,
deitar afundando o rosto no travesseiro da melhor das camas de
veludo vermelho; mão por baixo do travesseiro, mão apontando como
D. Pedro (I ou II???) e batalhas!!! “...e mesmo diante do abismo
dançar ainda”. Mas num passam de delírios de matar com água
minhoquinhas do banheiro. Criar uma enxurrada que tudo leva. Estas
minhocas de festa. Todo ao ralo. Espera! Eu ouço! É uma...
reverberação do gotejar da bica. O reflexo do espelho mostra o pano
de chão que já foi lençol, e eu, tristo, abaixo pra pegar o chinelo ao
sair do chuveiro: minha bunda livre de cuecas, meu bumbum largado.
Que desagradável eu pelado. Que coisa horrível, Jesus Tristo! É meu
fim do poço, na casa vazia, meu universo limitado. Tanto livre.
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CAPÍTULO 16: “Sim, eu sou Julia!”
Uma índia cidadã. Sim, é uma história de pessoa que nem
existe totalmente, uma personalidade oculta, uma projeção – um
exemplar de explicações!! Trace meu rosto. Eu, a criadora, nem
pensei em nada. Serei o que você quiser, desde ilusão até fetiche – é
meu trabalho! Limito-me em nome, nome esse que é uma referência.
Sou a história e a interpretação, turbilhão de ideias perdidas,
zombeteiras com minha paciência. Tanto que Ela (Lari) sempre
perguntava:
−Você não consegue parar quieta?
−É que pensotudo aomesmo tempo! Que posso fazer, poxa? (Risos)
−Tem calma. Vê se relaxa de vez em quando. Só isso.
−Tem uma bebidinha, hãn?
A observação vale muito mesmo; talvez este seja um teste, mas
será que ele ficou escroto ou cafajeste? Queria saber, já que não era a
intenção. Foi tudo escorrido. Acho até que o título deveria ser “Julia e
as confissões”. Hum... delitos tal confissões introspectivas, reflexões,
conclusões... Chato... Literatura, interação... (Houve conhecimento
prévio?). Acho que errei no começo... nos meus princípios não. Ah,
droga!
De resto, nada existe como realmente pretendo, e não pensem
que sou um ser narcisista, tampouco me deixo ser altruísta. Ah! Lari.
Antifísica! Chama por Julia, sei lá, “Atendente”. Será que ainda me
resta poder de escolha? Mas não tá pronta, não para a conjunção
carnal de verdade, para a natureza ardente, as seguidas cópulas. Não
você Lari, Lari! Imagine ações antinaturais, e dia após dia. Larissa
atrasada, peculiar. Provavelmente nem sabe também que eu só existo
porque existem prostituidores. Talvez eu devesse jogar na cara dela
que eu sou a Fada e a Feiticeira, que a puta já existe antes de tu aí!
Que eu posso!!
Isso me faze lembrar o que um cliente certa vez disse: “É sério
que pensa que vai ser assim gostosinha o resto da vida?”. Acho que
ele não queria pagar. Mas o que será que acontece com as putas
velhas??? Nem consigo mensurar.
Depois, voltando pra casa sozinha, pensei no que imaginei pelo
caminho ao deparar-me com a cidade em movimento: “Olhei
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praqueles bonecos e ri. Vivos e controlados! Olhando daqui de cima,
até que dá pra brincar com eles...”.
É muito difícil escrever por extenso. Acho que não estou
conseguindo fazer ter coerência direito, mas entendam: é difícil, é por
causa da quantidade de assuntos e o espaço temporal. Poxa, também
fico perdida na cidade que nomearei Briluz, a dos sonhos – Briluz,
meu reino utópico!! Brilhou, nem vi pois estou chapada em mágoas
ilusórias! E que bom! Os remédios me afastaram das pessoas! Como
sou de libra, como sou maleável também balanço, mas pesei a mais!
Penso que fui muito crítica como os defeitos das pessoas que
vejo, tenho, essas coisas. Deve ser por causa da sua e da minha
fragilidade. É algo que tento consertar pro bem. Eis que acabo é
estrebuchando tudo no asfalto pobre de tudo. Por que a gente tem
que estar sempre se ferrando? Por que não posso ganhar mais e viver
melhor? Por que não me deixam escrever um romance sobre o
"Proletário" Carioca? O título poderia ser "OS SUBALTERNOS". Por
que não? O fato de eu não ser erudita, mas uma que aprendeu na
marra, ajudou na medida em que dito os termos como me vêm,
pensamento sobre pensamento. O mais real possível. Acho que essa
parada é intuição. Do meu sangue indígena, obrigado.
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CAPÍTULO 17: “Um verme gigante sai do ralo: ele é mãe das
minhoquinhas do box”
Aquilo me observa, mas não dou bola. Pego o isqueiro, olho as
cinzas pela manhã... as guimbas do cinzeiro. Meus dedos fedidos,
bafo terrível. É o café pra vir, é mágica! E a cabeça explode como o
conflito no Oriente Médio; sem fim. Não posso fazer mais nada.
Cortes rápidos. A rolha levanta voo contente quando eu a atiro
pro teto. Ela cai ali no canto onde viverá pra sempre. A garrafa do
vinho novo me encharca e tinge por dentro. Tudo o que consegui
lembrar é o depois, caído no chão, mole e descansando algumas
lágrimas de descaso. Amo muito. Oh, sim, então é isso, ou melhor,
não, não, é o tal TUMOR, TUMOR, deitado em forma de estrela, mas
minha hora não chegou. Será mesmo que nunca mais faço isso???
A TRANQUILIDADE FOI FATAL, E, REPETINDO: como posso
ficar aqui? ISSO O DIA TODO! A TRANQUILIDADE FOI FATAL,
anterior a tudo, fatal no final.
Quando dou por mim tô levantando do piso. Aiii, tá tudo no
liquidificador... O cabelo pro alto, cara espantada, olhos de amêndoa
e pés sem meia. Uma puta olheira que resmunga. Sento na borda do
sofá, olho pra frente. Num tô legal. Ajeito o cabelo, recoloco as meias
pra não ter nas pernas um cardápio supremo pros mosquitos. Digo
siiim, e caio novamente. Sonho dentro de sonho, acho que no terceiro
sonho o que me dizem é: “você é um gentil ou um palhaço!???” As
pessoas passam e me espiam parado, fitando as cartas amigas,
amorosas, familiares, inexistentes. Todos balançam a cabeça em sinal
de reprovação, e pensam: só daqui a 40 anos haverá reconhecimento
(de cadáver?). Você não consegue. Contudo, enxergo um lugar que se
assemelha a uma capela: mendigos na entrada. Lá dentro, um padre
(ou algo parecido) me empurra algumas imagens, eu recuso... quero
aquela maior, a dele, pendurado, o tal... quero ser ele...
“Quem será ele...”. A frase ecoa neste outro dia. Folgato me
olharia. Ele estaria imóvel. Depois viraria desdém. Ele é sincero. Sabe
que eu é que sou o atrasado nesta história.
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Ando mesmo morrendo??? Estou. Eu estou desaguando, ora,
digo ao amigo que não conheci. Todos nas paredes me encarando.
Preciso abandonar a cidade mais uma vez??? Relutante em fechar a
mala até que outra viagem me consuma por completo, sigo pensando,
ou melhor, juntando as partes e voltando.
−Não quero saber de ser mais nada. Desisti... Substituam a minha
pessoa!!! EU ME DEMITO!! Eu só ando cansado... huuunnf. Não
sirvo pressascoisas... hunf... Pííí!!***, ainda o velho sono... Afundo a
cara no travesseiro. E me espreguiçar – Disse como faria um
atorzinho de meia tigela! Porém, este ator não consegue lidar com o
verme gigante que provém do seu ralo. Ah, não mesmo! Porque ele é
uma minhoquinha de box ainda.
Há continuação, “Velho”, de meses até milênios... Tento me
convencer! Num cubículo cheio de papéis espalhados, livros, lençóis e
colchão, roupas penduradas, cacarecos e mais cacarecos... sem febre,
doença alguma, só a consciência; filosófica e banalidade e chatice,
gato por lebre!
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CAPÍTULO 18: “Com um pouco de amor, até que enfim.”
Vida mastigada, compreensão fácil. Da grande percepção da
existência tento cuidar. Sabe de uma coisa, a próxima frase é terrível:
“O viver é passível de limitação”, isso me dá arrepios... isso me causa
revolta. Ei, eu sou mulher. Me dá asco, caracas. Odeio coisa pouca.
Devia é receber um salário para poder existir assim tão bem! Mas o
dinheiro só nos isola. O Amor como museu!
Julgo um porquê de nossa relação, e um porquê de nossa é...
dês-relação? Hunn, como um filho pode mudar tudo. Essa tua cria,
Larissa, que está para nascer, fruto de uma noite correta e de parceiro
ocasional – e ocasional de raiva –, trouxe frutos desgarrados que
desgarraram até nós duas. O verbo do agora é parar e antecedido de
poderia. Erramos. Que o que é bom, dura pouco!
Preciso voltar, pagar a língua. Há em mim um pesadelo de
sangue e angústia cinza. E já sei o fim disso. Por que, então, sempre
volto aqui? Está uma bagunça – já tive dias melhores. Talvez seja
mesmo um pouco ignorante, pois gosto de aprender vivendo errando.
Sabe, as jovens do meu tempo acham-se perdidas, procurando afeto
onde nem existe mais, daí se iludem umas com as outras na
infrutífera festa que termina num dia dos normais.
Fiz alguns rodeios necessários, mas volto ao assunto que me
causa tristeza atualmente: ela, Larissa. Lembro agora de quando ouvi
as tais palavras “não dá mais”, uma bomba tic-tac-tic-tac explodiu na
minha esperançazinha. Olhei pro lado e vi só os pombos sujos do Rio.
Mééér... ah!
Abri essa porta quebradiça... ela é azul-ausência-de-sentido;
com amor! Sim, eu preciso voltar! Já sei o fim disso... Por que, então,
eu gosto de voltar? Sei não.
Nada é sério quando se está um pouco chateada e dopada. O
que preciso é amor (é isso um conto ou música?).
O que eu andei fazendo na casa dela? E deles? Que invasora.
Destruidora de lares, que isso! O único que me mantém viva é
idealizar. E reclamar... mesmo a honra dessa dança. E me dou conta
de que está personificada na praça, no meio do público, desaplaudida
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e mirada, esta, a própria. Droga! O vento soprava, fiquei sóbria. Já
que fui conduzida ao xadrez, serei a que atrai o adversário a fim de
queimá-lo logo após.
Passeio (ou arrasto, quem sabe) minha maliciosa figura. Eram
chamarizes. Meu casaco com pele impregnada, só ele suporta o frio
do mar e dessa brisa. Mas acabo por dar de cara com um sujeito de
rosto enigmático e expressão de reles fanfarronice. Só para mudar
meu rumo. Me pede um cigarro o tal, assim:
−Um fósforozinho, bela dama!
−Aqui – passo a caixinha.
−Agora o cigarro – diz isso com a maior calma do mundo...
−Qual a tua? E como sabe que eu tenho essas coisas na bolsa, se eu
nem fumava?
−Perdão, nem me apresentei! Meu nome é Folgat...
Nesse instante bate um baita vento e meus cabelos me rodeiam.
Mó barulhão. Empretebranquei e o cara sumiu!! Aáái! Só gente
maluca...
Entulho inútil de tentativas. Dá descarga nisso!
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CAPÍTULO 19: “O ínterim”
Bate um vento que agita as cortinas e refresca e renova o ar.
Não sou espírita, porém senti na hora uma presença. Falei alto: “Que
tal parar o suspense e contar a história desde o princípio?”. Eu
pensava em Folgato, eu tinha os olhos cansados mas fui ficando
beeem... e sorri! Vi os caminhos pra Iluminação. A anunciação. Ui,
peixes descamados desenhados pelas mãos do Folgato. Mas sou eu
quem decide a forma; se real ou imaginária, pouco importa!
Fuuuuuúú! Erros, erro, cessando, desferindo, golpes na, autoestima
até reacender. E ri de novo! Ah. Que bom!!
Acho que vou tacar tudo o que fiz pela janela, não sem antes
colocar o conteúdo numa caixa de madeira com gravuras em preto e
branco como decoração, e deixar cair guimba de róliudi; vai virar
uma beleza de poluição, meu expurgo... Aí, sim, eu jogo pela janela:
numa sacola de papelão, vai: FOGO NO CÉU. Tchau. A vida é muito
mais gostosa quando temos um dia livre! Por isso tchau!, tchaaaaau.
Digo o que digo, ou melhor, imaginei essas besteiradas pois meu
braço direito me denuncia, e já doeu muito; meus dedos tão sem
unhas. Será que refaço tudo, ou desisto? Café pra pensar! Minhas
moléculas agitadas. É o que preciso. Mas o sonífero é de vinho. Só
pode. E o desjejum de ontem será de podrão. Quê? Que foi?
Lembro de algo como: “Sinto falta de sofrer”... ou de tristeza?
Sei lá, mas a ideia central é: o isolado produz mais. É, mas odeio toda
essa... Huuu, eu tou num fundo de poço, fim de mundo em mim.
Rechonchudo. Entretanto, é voluntário como gripe, é ópio caseiro
pirata. Desculpem-me. Não, não me desculpem. Justo agora que acho
que me dei bem?
Bocejar. Chinelos que fazem barulho. Por nada. Copo d’água.
Luz da geladeira. Bolo com gotas de chocolate. Mãos pelas paredes.
Deslizar brilhoso. Vestimentas pelo caminho. Caminhar, caminhar.
Refrescar. Vultos de pensamento. LinilinlinlinnlililililililililiLiLILILI!
Alma penada, te escrevo isso, é uma carta, onde eu, é, eu tava bêbado
pela milésima vez – tinha convulsões e ânsias de vômito na minha
cama. Sonolento, pensei que a palavra sarjeta era linda. Vi minha
identidade no chão... percebi que tudo o que tinha tava caquético, até
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mesmo eu, quem diria?! Minha cara via-se de cabeça pra baixo, tudo
lixoso e fodido... É pííí!!*** saber descrever, lembrar, bom... é...
pensem na desordem total, em algo que odiamos: era assim que tava
minha visão tremida, mais ou menos isso... isso que... Então, me pus
nu, pra escrever uma carta louca ao Folgato, meu grande e único
amigo – é claro que desconfio de que existem papinhos que nem são
culpa dele! Eu disse tudo o que tava passando. A Folgato, o único que
não me dizia o quanto eu adiava à toa.
Para Folgato, Mago da atualidade!
Folgato,
Já visitou teu primo, o gato de Cheshire? Sinto falta das
nossas conversas.
Tou de porre neste monólogo horrível. Volta, camarada. Traz
o aliquod estranho logo.
Não foi por ele que saiu?
Tudo tá lerdo... um sequestro, um baú envernizado pra
parecer tonel conservado, e eu lá, perdido no fundo.
Dom Quixote me dá cotoveladas pra prestar atenção aos
moinhos daqui da vizinhança.
Chaves olha pra mim com aquela expressão comovedora do
episódio de Natal.
Kafka e eu nos perguntamos: pode se enquadrar???
Folgato, demora não. Eu terei vários assuntos acumulados...
tipo GIGASENA.
Meus cumprimentos,
O “Velho”
Pela manhã, ponho a carta na caixa de correio da esquina. Não
há remetente.
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CAPÍTULO 20: “E se ainda há poesia,”
Liberdade... E um ponto final.
Sob o influxo incompreensível selvagem que é a curiosidade,
dei um pulo em Bostafogo. A terra dela!! Poetas disseram de lá, que:
“Botafogo é um filme idealizado / Botafogo muito mitológica pra
mim”. E que “Uma jovem mãe faz o sinal da cruz / reflete seus
anseios no bebê sorridente / Eu choro”. Mas, e minha Larissinha?
Peço crença, fiz isso – ESCREVER – às pressas, semvergonhice de minha personalidade descarada! Da mesma forma que
invadi muitos lares, usei dos outros, fartei-me de inocentes incêndios
intencionais!! Da mesma Beleza sempre foi sinônimo de poesia. Sou
bela. Sou então poesia? Preciso é dum autor? Ou seria melhor eu
resolver estes “percalços” sozinha, tocando no meu centro, exibindo a
origem de tudo; desde Felicidade até Tristeza, o centro, o sexo!
Chafurdar. Ui! Bom, não teria mais característica de poesia, seria
quase um recado. Ficaria mais fácil aos que têm preconceito com o
tema – fazer poesia sem saber se está certo. Ser burra mesmo não
seria mais fácil, né, querida?
Olha, se vou desperdiçar ou não, se vou estragar ou não, nem
sei. Se vou borrar um título, não importa, pelo menos tentei. Tenho
que deixar de lado a hipocrisia, ostentações, o materialismo,
vergonha e sei lá mais o que possa impedir o corpo mover-me. Tem
tantas situações que são irrelevantes. Vamos pensar e dar nossas
interpretações dos fatos, não distorcê-los. Cada um tem uma visão
relevante das coisas. Não precisa padrão. É o seu poder de
interpretação em jogo. Estou aqui te chamando de atriz e eu de
roteirista. Será que ainda é viável curtir a simplicidade?
Tenho consciência de que me descaracterizo quando longe do
meu cantinho. Odeio ser tão metódica de vez em quando, pois
dependo de mim e da forma com que me organizo e a meu espaço.
Sei que preciso da parte feminina (dócil) de volta, por isso sinto
tanto faltar Lari aqui, no meu lar e respirando levemente ao ler um
bom livro ou roubando meu ar quando aproximamos nossos rostos.
Confesso: me deu um friozinho quando consegui uma fêmea depois
de tanto. Mas passa. Mas me deu um friozinho também perdê-la, e
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ouvir “Hey Jude”. Quero um poema da individualidade, da realização,
do chute na bunda da hipocrisia que ainda reina apesar dos esforços
dos meus antepassados!!!
Me deixei levar. Sonhei em ser mais que uma mulher atraente,
é, gos-to-sa, em roupa colada, exibindo as coxas pelas ruas,
corrompendo eu mesma minha inteligência. Como agora, passeando
pela cidade cegamente sem dar “Oi!”. É que sempre vou e volto.
Para finalizar, repito porque é necessário: “É o seu poder de
interpretação que vai em jogo. Te chamando de atriz e eu de
roteirista”. Vamos lá, pensem! Quem foi??! Mas não achem que
classificar é o mesmo que dar sentido.
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CAPÍTULO 21: ““Ruas” & “O panorama””
Quem sabe como são as ruas? Como são incompreensíveis e
lastimáveis as ruas... Desertos são tranquilos e misteriosos. Mas o
meio da multidão é que é bizarro e extremo. Distancio do fluxo. O
calor. O fedor. O fedor novamente. O lixo em partículas. A ruína. Os
tons cinza. O subúrbio. O centro do caos, da cidade. A cidade fictícia.
Meus olhos.
Fuuui, fui contemplar a vida. Tchau!
(...) e digo isso, pois tenho nojo de aglomerações cegas – grupos
cada vez mais inusuais e fúteis. Fico apreensivo e contemplativo ao
ver a miséria humana. Cacetadis! E isso tudo pra apenas ir ao
supermercado comprar mantimentos (material pra hambúrguer e
garrafas novas de vinho tinto – comprei um espanõl também, além
dum brasileiro; o braseiro, mato agora, o espanõl eu espero passar
um cado). Volto pro lar em transporte público no horário de pico do
trampo dos normais, a ida do povão pras suas residências. Eu não
preciso disso.
Abro a danadinha, usando o saca-rolhas do meu canivete suíço
de 1,99. Som oco. Óc! Sorrisinho do Curinga. Adoro “a cor” de gelado
da garrafa escura. Rolha meia bomba. Canção. Gole um: vou rezar
pela volta de Folgato. Tá difícil. Gole dois: eu acho que aguento...
Como um ícone, nenhum respeito pela vida daqui. “Uma visão
memorável”.
Gole 18. Panorama desolador... ele é pastor. Suas cabras são
domésticas e violentas. Ainda é complicado, intrigante e
arquitetonicamente como corações de aprendizes. Pergunte a um
especialista, ele dirá que tem que colar os selos da promoção e rezar
pelo futuro.
Assim loucamente, saio e pego um táxi:
−Segue pra Oeste!
−Táááaa legal, chefia...
Aterrizo numa tendinha.
Engasguei, tossi, respirei e consegui dizer estas palavras: “Um
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café, por favor”. Para depois:
−Opa! Café expresso, por favor – repeti, pois o cara não me viu ou
não entendeu. Das duas, uma.
Hoje conservo a vida dos outros longe e não poluo o meio
ambiente, mesmo estando lá e cá.
Sou o intervalo do Humano, duma Era antes do Final, por isso
pouco acrescentei.
Protege eu, Folgato. Já fui pro gole 22! Ainda nem sonhei em
ver um fio de cabelo branco, contudo minha bostinha de seriedade
vital tá na minha mão – e sou “O Velho”, como cê mesmo me
apelidou. Nada de badalação. Sinuca em mim! Ilha deserta de água
cristalina ou acordar da quimera induzida? POR QUE EU TÔ É
SONHANNNDOUUUWW... UM ESPETÁCULO MULTICOLORIDO
DOSTOIÉVSKIANO!!
POIS EIS QUE... FINDA A ÚLTIMA GOLADA, SUBTAMENTE:
PAZ, PAZ MIL VEZES!!! Sinto algo bom, fácil..., muito mais
energético que aqueles dias! Sinto uma ILUMINAÇÃO. Prefiro isso,
não tem fim a felicidade! UHHHHHhh. Estige, Estige, tá escrito em
todos os lados a palavra ESTIGE. Estige, não sou mais, aguentaria
agora levantar todos os dias e abrir os olhos – pena ver só “meu
quarto”. É! “Eu não mais anulado!”. Putzmerrrr***! Acho que isso é a
glória mística! O que posso dizer? Do nada, eu melhorei
completamente! Sou feliz! FELIZ. É como se me tornasse extrahumano! Estivesse um passo à frente!!
Acordei! Daí “O tempo passa como que banhado em vaselina”.
“Chegara enfim o dia desejado,
Ambos unidos, soluçara um beijo,
Era o supremo beijo de noivado!”
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CAPÍTULO 22: “Algo se transforma...”
Ao cabo de três dias, mavontadeando, fui até uma loteria
próxima para pagar a praga de uma conta. R$ 69,00. Vocês sabem,
essas contas vivem tendo que ser pagas.
Saio pensando em comprar algumas miudezas novas... e sou
surpreendida. Daí foi tudo embora! Digo que obscureceu-se e
apaguei, é, desmaiei, fui atropelada, estatelada estrela no chão. Me
senti a mãe do John Lennon!! Que baita coincidência. Mas logo eu
atropelada, a devassidão labéu de putana. Imaginem quantos clientes
ocasionais, quantos excessos de álcool pelas noites afora e quais
improvisos premeditados não cometeria? Que piada. Eu ri da
mortezinha.
Acordo com um branco e olhares. Mas que pá de cal na
retaguarda, que mentirosa sou. Ê:
−Que passou comigo? – Perguntei fraca, como que recuperando-se de
um parto.
Nisso, uma voz que não identifico disse, longe:
−Calma, foi só um susto.
−Ahãmn..
−Qual o seu nome, bela?
−Julia... a – Respondi zonza, fraca, montando os pensamentos e
articulações.
Se eu disser que era muuuuito igual à voz, ao timbre do
esquisitão do fósforo, alguém estranharia? Pois de um sobressalto,
verifiquei que não estava lá o tal. Que danado! Bati a poeira, agradeci
aos curiosos e fui.
Mais tarde, no aconchego de casa, minha fotografia é a da
caneta que ia na minha boca. Era o símbolo de algo que bem conheço
e gosto, sim. Olhei pela janela minha pose. Eu era tão fria quanto esta
“rua”, não mais debaixo das asas e barra da saia de mamães. Preciso
ter doces de comer!! Encaminho rápido.
Não faço só pra mim, nem sobre eu – capítulos curtos e
indiretos. Tive interesse de escrever sobre a vida dos outros e ser uma
observadora. Na realidade, uma outra que não era do mesmo signo.
As vivências tristes e traumas das sofredoras me interessam. Mas
percebi que isso cansa, no meu caso e pra quem foi citada. Vou deixar
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“isso” de lado, é um treco dedicado a um vão entendimento, este
cotidiano e mentalidade. Esta barra de chocolate que se derrete ante
meus dedos! Por que o mal cobiça a nós, jovens? As jovens idem. Vou
te encontrar, ser supersimpática mas não te ter. Mas você sim. E eu
também, ainda que fazendo ceninhas de ciúmes na pista. Semana que
vem só te ligo para marcarmos algo, do meu jeito; será que consigo
ser assim e não uma dama de feriado?? Não quero te conhecer mais, e
mais ninguém. Quero é esquecer tudo, para assim, depois, ai, reapaixonar-me! Pois a vida é de verdade...
Algo se transforma, acaba. Azeda. Acaba, meu bem. C´est jolie.
Foi. O passado significa a volta ao lar, e tu a carne humana a fazer
sabão. Tomara que pro meu melhor. Senti algo como saudade, coisa
da minha língua... A esfoliar todo encantamento juvenil – Foi-se,
voltei aos tempos da pedra e dos incensos, reencarnando dessa
maneira a feiticeira que tantas vezes encarnei.
Agora tão... é, acordada, “e nem bonita nem simpática”, nesta
tarde encoberta, bem-bom de café e biscoitos e cobertas. Pois chuva
se aproxima, é cerrrrto, chuva sempre se aproxima do Rio de Janeiro
a plenos Julho e Agosto. Estou só, anotando anotações. Agora “o
próximo”...
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CAPÍTULO 23: “Conversa fiada”
O encontro. Eu sei!! É chegada a hora. “O Velho” já era? Entrou
pra galeria das ameixas vivas? Só Folgato pode reanimá-lo? Noite
adentro com a perdição, maldição induzida: solidão. “Ele espera.
Reclama, bebe seu vinho, come queijo. Até que aconteça algo”...
Estou num thriller!? Num filme de caídos, numa comédia onde a
piada é a fissura.
Lembro de quando achei Folgato num meio-fio, com seus
irmãos abandonados. Os filhotes se mexiam tanto dentro daquela
caixa de sapatos. Escolhi o que mais fugia: era como eu, igualzinho!
Igualzinho, é... Ouço o remexer do novo batendo à porta. O Calor da
ansiedade. Oi.
−Oi, amigo – Eu disse a Folgato.
−Pensou que eu estava longe, não é?
Sorrio. A casa tá cheia novamente.
Segundos depois, Folgato à minha frente, em preto e branco. Já
que é preciso falar um ao outro, ele me ouve. A conversa flui...:
−Pra finalizar, Folgato, tenho que te contar um fato muito relevante,
revelador, fantástico, simples: a modéstia do mamão!
−Quê? – espantou a sobrancelha!
−Isso, o mamão... Uma mulher que passava na minha reta na exata
hora em que desci pra tomar um café no Portuga deixou cair uma
sacola – essas coloridas de feira – lotada de mamões. Acho que era
meio doida, descabelada e sem marido, na certa, entendeu?
Simpatizei com a dona, e, incrivelmente, ninguém a ajudou. Eu fui,
né... Peguei as tais frutas caídas e recoloquei na sacola. Nem parecia
eu! Ela agradeceu – tão simpática, coitada – e ainda me chamou de
gentil(!). Ah drogaaaa. E, pra me presentear, ela me deu um mamão.
Que mamão de Deus! Eita, como era feio por fora, com machucados e
manchas pretas.
−Você já havia visto ou comido um?
−Há mó tempão era que eu nem me lembrava da existência...
−E aí? Vai contar ou só fazer suspense?!
−Vou pular toda essa cena e voltar logo pra casa, é melhor.
−Claro.
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−Levei o feioso pra cozinha, peguei uma faca e parti-o ao meio: vi
uma estrela!
−Onde? Como assim??
−O mamão era uma estrela de casca. Acho que sou um mamão,
Folgato!
−Explica melhor, Velho. Sente-se bem?
−Hahahah!! O mamão quando cortado em duas metades iguais... o
centro dele forma uma “estrela”, já que nele o contorno formou as
pontas em forma de estrela. E é feita de sementes. E comigo é o
mesmo. Agora sei que meu melhor tá no interior, e que por fora é só
esse “treco” casca de mamão que tu vê. Entendeu?
−Mas é claro.
−Eu sou um mamão, Folgato.
−Sorte sua então.
−Acho até que cheiro igual a um...
−Não sei se te apoio ou mudo de assunto.
−Que bom que foi sincero, Folgato.
−Miau pra você também.
−Palhaço!
−Estou pensando a respeito.
−Vamos terminar esse papo. Já tô com vontade de abraçar meu
travesseiro e virar uma estrela na cama. Teu dormitório continua o
mesmo – e pausa nosso Velho.
Mas é Folgato quem continua, dando uma nova informação:
−Não percebeu nada de estranho no ar daqui, Velho bobo?
−Não, por quê?
−Tenho vindo aqui secretamente. Você nem percebeu, anda sempre
apagado, doidaço.. Deixei uma novidade. Um ar, um vidrinho
destampado atrás do sofá, emanando seu cheiro, libertando os seus
duendes em navios lotados a fim de aportar.
−Ah é?
−Ahãm... Me parece que você está meio de bom humor...
−É... espera, era esse o dito aliquod? Era a poção que tu foi resgatar??
A tal? Diz, pô!
Mas Folgato só abriu um sorrisinho e brincou:
−Isso se chama Estige.
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CAPÍTULO 24: “Epílogo prematuro”
E teve o dia em que choveu e ventou bastante. Todos corriam.
Até homens e mulheres. Até... Julia. Os guarda-chuvas, como
pássaros, quebrados, jaziam no chão. Era novembro...
Desfecho? Não, ou sim? Depende da entonação, né!? Não, nem
quero mais escrever sobre mim, tenho responsabilidades. Isso de
perder o dia todo rabiscando e no final ainda ficar com uma
enxaqueca irritante é para os mártires. É coisa de desocupado. Tanto
que abandono constantemente o pensamento biográfico; queria me
dedicar a tagarelar – eu sei fazer isso? Porém? Queria me dedicar
ainda mais a escrever sobre outros temas – talvez um romance.
Acabaria por passar fome, já que tem muito mais por aí. Aliás, não
posso passar fome, com meu trabalho nunca fico sem nada,
raramente alguém me esquece!
Enfim, La... Lariss... Lalá, é muito difícil explicar; ter tantos
cromossomos em comum e sermos tão desiguais. Somos pessoas,
portanto, este livro ficou assim: incompleto, em várias partes, mal
acabado. Foi mal. Sei que a forma que utilizei foi desconexa – como
pude pensar que seria o contrário? Juntei as palavras e deixei o
sentido subjetivo – a interpretação cabe a quem se esforçar. Aviso
logo que tenho problemas.. Tudo muda rapidão, o mundo girando
mais e mais.
O desenvolvimento emocional... Ficou bom? Já disse à minha
família: “Não vivi, sobrevivi” (...) Desculpem-me de novo, por tudo.
Ah... abusei de esquemas de conteúdo e blocos associativos... todo um
ciclo para se chegar a isso! E plaft, foi por cano abaixo! Como olhar
Larissa na cama, abraçada ao macho dela – memórias de fumaça.
Abaixo, abaixo, a... Me deu raiva na hora, porque os peguei em
flagrante, sabe?! Mas fiquei e olhei, olhei fundo. Estive na fresta da
porta e meio que gozei junto deles. Mas a cara da Larissa satisfeita
não foi tão legal. (Risos)
Evaporei de lá. Na saída do prédio as luzes das vidas e mundos
pela cidade me agrediram.
O tóc tóc tóc surdo e enfurecido do meu salto alto chama a
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atenção de uma senhora. Ela repara distante e retrai o corpo a si
mesma, nota-se que está noutra. A doida canta que “Prudência não,
aaaaahmeudeus!!!”. Porém mesmo ela vende umas jujubas bem
visíveis. Eu paro, escuto, presencio tanta bujinganga de camelô.
Desculpem se bizarrei a velhinha. Falei com ela, é apenas uma pobre
ambulante chamada:
−Tia Luka! Meu nome di verdadi, fiia!
−Eu sei, minha querida. Eu te dei quatro reais. Falta cinquenta de
troco.
−Olha, antes de tu consegui erguê o narizinho eu já tinha alugado us
modo na sarjeta, sabi e
−Se tu soubesse que minha casa é que tem lanterna vermelha...
−Pois então, mi dá essa gorjetinha, heheh, já qui somos tão parecida...
Que papo estranho. Tchau, Tia! Eu! Dita ruim e desalmada, não
quero ser chamada de “anti-heroína”. Uma mulher rica eu seria
quando ganhasse muitos “obrigados” ou “parabéns”, aí sim me
sentiria uma realizada. Mas que nada, ainda há necessidade de
muita... água em pequenas doses ao longo do dia... meu rosto...
refrescando a pele macia. Portanto, a Água e a Mulher são irmãs.
Bato palmas para as mulheres, a razão de tudo! Assim pra Água a
mesma premissa.
Algumas perguntas finais – prometo não ser mais tão-tão…
pentelha! –, somente para fechar o fluxo de pensamento desse troço:
1) Já tomou forma? 2) Ocorreu a característica de algo? 3) Você, ao
ler, teve qual impressão? 4) Qual a imagem que formou de mim e das
situações aqui relatadas? 5) Entenderam o conceito de “Epílogo”? 6)
Como anda a tua imaginação?
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CAPÍTULO 25: “Fase agridoce: Vinho, Estige, Queijo e a
Beleza.”
“O melhor vinho é o mais velho; a melhor água, a mais nova”
Provérbios do Inferno
(William Blake)
Então o Presente de Folgato, eis o presente:
−Respira, fica aliviado de tudo que tem ou ainda terá.
−Que é?
−Não me pergunta mais nada, tem coisas que não têm
esclarecimento. Apenas respira, tá certo!?
−Claro, amigo. Demorou tanto só por mim?
−Não vou responder.
−Já esperava. Mas brigado.
−De nada.
Folgato, da mesma forma que os outros felinos, são os mais
sinceros – mais que crianças. Devia aprender dele isso. Ele brada:
“Voa, o quebra-cabeças foi desfeito...”. Mas a voz emitida é
sussurrada, longe, grande. O “De nada” como um eco. Passou um
filme, tudo tremendo suavemente, divertindo-se com os próprios
risos.
Um oscilar entre díspares, ah cara... Agora o Sol, o Calor
depois do frio... E entendo tudo, meio que li o roteiro num
segundo: “Estige é O Alimento, aliquod dum Matrimônio
do Céu e Inferno”. “Voa, o quebra-cabeças foi desfeito”...
Voa... Pras ruas (de ideias). Pingos gelados na cara,
jaqueta jeans, braços cruzados, ar latente, clima, cães
atropelados apodrecendo na beira de estrada, gatos
correndo na minha frente, assutado. Agosto. Derrapagem.
Vinho, Estige, Queijo e a Beleza... O presente de Folgato: “Eis aí
a felicidade! Uma colherzinha bem cheia! A felicidade com toda a sua
embriaguez, todas aquelas loucuras, todas as suas criancices! Pode
engolir sem medo, disto não se morre”. “Que enlevo do espírito! Que
mundos interiores!”.
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Agora eu caminho bem, tal espectro vivo, suspenso, viajante.
Posso fazer comentários sobre “Quem é o cachorro molhado?”. Onde.
Quê? Seria mais ou menos: Um bebê sentiu meu odor de cachorro
molhado, uma criança disse pros amiguinhos que eu cheirava a
cachorro molhado, uma adolescente me xingou de fedido a cachorro
molhado, uma sereia me chamou de cachorro molhado e disse “vem
cá”. Então, eu sou um cachorro molhado. “O Velho”... mas pode me
chamar também de sortudo. Foi a chuva boa, foi, eu disse. E nas
veias estas, fluidos vitaminados – que importa minha casca agora?
Intervenho! Rabiscos reclamões não mais!
Só a estrela! Sei que sou farrapozão dos bons, e nada jamais em
mim vai ter charme ou beleza estética... é porque sou anestesiado.
Amo meu odor. Estige em grande volume! Ohhhh... o mar é meu! Por
que eu tou nessa? Nem me dou muito bem com os outros seres. A
solitária é legal. Fecha a tampa, vim como gambá do teu infortúnio!!
Autorreflexões de frente para o vaso – não mais! Todo o
planeta é ruim, sempre foi, sempre será. Daí a Beleza do refúgio! Um
túnel ou casa a se acostumar. Este líquido é paz amorfa.
GUIMBAS são feitas pra serem o resto do fumo, pois então,
vamos existir. Já disseram que a vida é um cigarro: se não fumá-lo,
ele se apaga e acabará de qualquer maneira. Então, somos todos
GUIMBAS ao final... e sempre aparecerá um puto pra nos pisar e
extinguir. Porque... alguns cigarros são apagados ainda no começo;
esses são mártires, ou bobos... quem sabe!?
Sorte minha mais uma vez: eu tenho Estige engarrafado. O
melhor amigo desse mundo. Muito obrigado milhões de vezes,
Folgato:
−Não precisa agradecer – respondeu meu amigo felino.
Aaaah... Lembranças do aliquod sagrado... o cálice usado por
Jesus Cristo na Última Ceia, a tentativa por parte do cavaleiro de
alcançar a perfeição; o Santo Graal não é nada frente à sua
facilidade... A peça chave do Graal é o líquido, não o metal, todos
sabem!
Um alguém palpável? Ou inanimado? Nada sei! Apenas
imparcialidade. Questionamentos secretos... sempre tive dificuldade
pra entender... e o porquê??? Poucos são os que se importam.
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Logo, logo, tô imerso em banho de temas, “O aliquod” – há
quanto não sabia o que era isso? Se é que já soube o que é ser feliz...
As situações do mundo aos pés... Tétis tentou tornar Aquiles
invencível mergulhando-o no Estige. Quem dera.
(Eis que) No lugar da fala, silêncio, destruição. E profunda
recusa de “Todo o” sentido... Odisseia sem retorno. Solidão e
independência. Desaparecido! Nos momentos de impasse, e ao tentar
simplificar tudo, ou mesmo esquecer o passado, acabei me
aborrecendo. Em euforia, estupidez, Estige, salva eu. Vá ékstasis.
Me salvou!!! Huuuuurúú, era flutuando. Que nem desenho
animado. As lembranças foram vencidas!!! O aliquod será eterno! Eu
pulei do muro, tava lá altinho, meio belengando prum lado ou para
outro, sem saber se vivia vegetando ou mordia o melhor do bolo de
existir. Hum.. Efeito Estige (prolongará!). “Eu sou o Rei pagão no
meu trono fechado. Eu não tenho súditos, nem memória de pedra.
Amor, amor, amor, luzes”. Em. Cantos, cantos, canto aos ídolos,
todos juntos, ao mesmo tempo, que sou um FELIZARDO (eu posso
fazer)!!!
Mas. Durante o percurso, entre enxaquecas, ondas e ilhas
esquecidas, dores no peito, anos de excesso, destino trágico,
inventado... por empatia, contraculturas, o agonizar, o precoce,
profundidade, abjeção humana, trajetória, impossibilidades,
invisibilidade, abismo, artificialismo, indução, mares, desertos:
dilaceração, defasagem, opacidade, crueldade, catástrofe... Ah, a obra
das suas várias águas, que maravilha, sobrepõe tudo em asteriscos
múltiplos.
Olha o teu ancestral, Folgato, O Rei dos Gatos, ele foi incrível
ao te botar na linha de produção, amigo. Eu falo de admiração.
Festa, a festa não tem fim... sem volta? O futuro é o delírio de
agora: pelancudos emperucados dançam ao som desafinado do
cantor enegrecido de clima. Correndo pela casa depois de acordar na
cama dos outros, cheio da vontade suprema de ir ao banheiro... Alívio
dos deuses! Opa, Folgato, cê tá aí? Acho que tu engoliu diamantes e
se esconde de mim; “Os donos da fortuna tão loucos, certo?
Compreendo”. É complicado. Não morre num telhado qualquer,
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amigo. Nada disso. Se não, dois anos depois, quem achar a tua
carcaça recheada da fortuna humana será um mendigo de casa. Não o
deixe ter uma vida boa. Nós não merecemos.
Viagem sem hora pra acordar. Que. Trama simples, rosto
limpo, dedos cansados de nada, e risadas. Bom. Veludo azul... já usei
uma calça assim, e ela era engraçada. Bons tempos infantis. A, é...
figura do ídolo. O assassino do filho deu-se numa jogada. Não, não de
sueca... Cê tem alguma opinião? Ao menos uma, amigo? Que noite
sozinha, que virada. Sozinho. A mesa... De onde vem tanto assim???
Trip. Trap. Zip. Zap!!! Quem disse que me importo? Peripécias, estalo
– lúcido. Abertura de vidrinho! Qual nova manhã novamente da nova
outra vez eu terei?
A CHEGADA AO ESTIGE. Mega. Talvez seja este o cume do
Everest estigiano, o debutar dos sentidos, a virgindade do corpo
renascida, seduzida pelo aroma das tuas águas.
Reconheço o Sertão habitado por índios bravos... Há um
quadro em mim, o Nirvana dos bobos acabou, 0 equivalente atual é o
campo de espinhos até se chegar à Floresta de Ressurreição, da “fila
de homens cegos”. E eu lá, na porta, rindo de todos! A faixa no céu
levada pelo planador, o avião de Saint-Exupéry. O Caminho da
Cessação do Sofrimento... veio-me apresentado pelas correntezas,
onde: “a jangada é um meio para se atravessar, não pra se guardar”
em “fila de homens cegos”. Tardios repetitivos! Agora não mais
obscurecido, nada mais traz repulsa e decrepitude. E “desaparecer
todo o meu orgulho por minha vida” tá na página do pergaminho
invisível. Ilusões perturbadoras nada são perante o caminho
iluminado-seco do Nirvana dos que não sabem o que é o Nirvana;
Nirvana é ejaculação precoce ante o Estige-molhado (este que tá
perto, perto, perto!).
Logo, logo, vão querer reprimir a prática do Estige, pois dá
prazer, belisca a seriedade. Contudo, é minha obrigação fazer um fojo
(pelo menos uma vez na vida) e mostrar os trechos cintilantes... De.
“Uma visão memorável”, memorável, incorpórea, murmúrio
espectral, lasciva pela incompreensão compreendida fácil do Estige.
Inomináveis continentes de saturação relaxante, arquibancada de
espectadores invejosos... tão transparentes pra mim... Ascendente
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indígena, mas de qual tribo, local, época? A jornada começa sem fins
parâmetros, nem presente, é descoberta! Insonoro grito pasmo de
alegria – eu tou vivo!!! Nostalgia em poesia.
Sou disforme, tudo é disforme, incomum no comportamento e
mundo da lua. Concepção mítica. Reticências novamente. Traduzirme? Falem por si próprios. A liberdade é minha, a compreensão é
sua. Não há mistério mais. Há uma nova e decisiva incorporação por
parte dos que não mais existem – e eu existo mesmo! Puro Estige!!!
Na raça. Sangue!! Na filosófica/realidade.
Anda, anda, é rápido e lento. Depende. Nada com estrutura.
Vejo o outro mundo, agora que sou REI-DEUS-SUPREMOUNIVERSAL DESSE LIMBO. Eu corro, como se o planeta Terra meu
brinquedo de mão; em seu dia de ser inundado. Hoje é meu
aniversário. Tive tantos orgasmos pelo Estige, nas fotos delas, e ao
final do “dia”, vejo-me: solitário, antissocial, esquecido e escondido,
enevoado, denso, introspectivo, mas claro, algo sóbrio!! Por esse
motivo essas nomeclaturas foram citadas.
Calmaria... Ah, nova Beleza, infernal; lúgubre. Água! Estige
com meu adorado Vinho... Perfeição! Pra curar a dor dessa aguinha
evaporando, só Estige. Pode. Fazer o impossível, dar origem ao
mesmo, como um criador. EU SOU MEU SENHOR E QUE SE
MULTIPLICA O RESTO! Que se fiiillll o resto! (Risos)
Dionísio me salva da morte. Dionísio veio me buscar, falei dele
sem saber quem era e nem o conhecia. Mas então apareceram um
sufista, um surfista e um sofista pra estragarem a festa – a morte
seria iminente! Confundiram as bolas (Risos). Os deuses também
correm perigo. Entretanto, Dionísio e Folgato ajudam de novo –
Dionísio, com a vigilância do meu felino favorito, escondeu-me em
sua coxa, assim como seu pai, e entendeu e consentiu o Estige em
mim. Então eu jurei, e virei pra sempre servo do líquido. Até ganhei
de brinde uma burla! Chamei-os pra tomar vinho e celebrar,
agradecendo. Os deuses também comemoram! Então eu me
apresento bêbado, simulando e profanando somente a mim. Isso que
é candura, redenção, beatificação própria. Nada de mal a ninguém...
Por isso, digo claramente: sou um completo, eu posso fazer. É
SÉÉRIO!
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Ao Final Falho (porque o aliquod de agora irá reverberar em
todo o resto). Nem tem caminho. Novo. Novo dia triste estaria pra
vir. Eu vou ficar sendo atacado por palavras soltas – agora que desci
do Plano Astral. E... “e pétalas/tempo, tou no meu paraíso”. Anotar
mentalmente: NOVE vezes: “pelas águas do Estige” – Folgato me
trouxe o mapa, pra sempre irmos buscar Estige.... lá e... Olá pra água!
Quantas eras já se passaram desde nosso encontro? Quanto poderia
ter sido e agora é? É incrível ser espuma do seu mar... Mesmo que a
abstinência custe a tentativa. Abro os olhos, vertical, vertical, tudo tá
como deveria ser.
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CAPÍTULO 26: ““Epílogo secreto: “O real gran finale das
pobres almas””
Ver o conceber de alguma cena na cabeça, na pessoa, é algo que
faz realizar. Você que entrou no espírito, no campo da descoberta, da
junção de funções jururus. Ah... Ela volta, Lari volta? Até seria difícil
separar... Fiquei é bolada, talvez porque fora assim repentino
demais... Boa sorte, lero-Lari. E até inventei uma história para não
ficar muito por baixo. Enviei por e-mail para evitar ter a desagradável
surpresa de ouvir tua voz. Saca só: "Oi, francamente, eu não gostaria
mais de receber nenhum recado seu. Das últimas vezes, meu novo
namora-do não gostou nem eu estou mais interessada em saber
notícias do que você faz ou deixa de fazer. O que já tivemos terminou.
Amo meu homem e não desejo que nada atrapalhe nosso
relacionamento. Para que não haja mais desentendimentos entre eu e
meu na-mo-ra-do, não quero mais que isso se repita. Boa sorte na sua
vida e adeus. Cháaau!". Foi polida, né!?
Com este final, poderia até ficar muito triste, mas é
desnecessário tamanho clichê – sei que tudo isso passa. Atira a
primeira pedra quem foi diferente! Sei também que numa grande
biografia, os fatos ruins vão sendo sobrepostos pela síntese do “bom”
tema. O ruim passa, é claro. Por que me desesperar? Sou forte e gosto
da vida; é muito mais interessante que lamentar, hunf; a experiência
conta tanto quanto matar-se aos poucos. Sei o que é melhor, talvez
tenha crecido um tantinho; sei que acho que cresci, e tento nem
vacilar ou cambalear... Ainda tantas sensações, deleites. Pouco
saberia ajudar na criação do filho dela porque faço parte daquele tipo
de mulher não sabe educar. Eu mesma não me criei toda ainda,
estando mais desorientada que o Patinho Feio, pois os melhores são
os que têm estilo. Porém, vê-se apenas normal... à mercê do mundo,
é, numa era de violência, pena não ser homossexual integralmente.
Existirá logo um Epílogo, apêndice e o final: já pra “AQUELA
QUE É BRILHANTE, CHEIA DE JUVENTUDE”. É Julia... e não sabe
o quanto é incrível. Ladra, linda hipócrita. Alguns também não, mas
os que sabem não dizem, pois é uma fatalidade íntima. Nada de dona
de casa! Ééé, doninha de casa de touca e avental. Que pervertida! Que
fora-da-lei! À espreita relaxando o marido. A dona-de-casa é a
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carranca da Sociedade! Desmilinguida “Sereia envolta em aura
aliciadora”! Assassina! A mulher que se deixa pouca nos antros
caseiros é que devia ser enforcada. A quantos me procurarem eu direi
que sempre fui contra.
Sim, AQUEÇAM SUAS QUESTÕES. Constrói pilares por tempo
decorrido de vivência; esqueçam as com corjas; atentem às
oportunidades de quem acha que as merece.
Isto é o agora, fetiche moderno de vitrine... Como é mesmo que
chamam aquilo que desconhecem? Ãn? Jus. Jura. Julia. Júbilo.
Charme. Putinha de mentira (sou puta, isso mesmo! mas foi opcional,
prazeroso, lucrativo). Mesmo iludida pela minha linda cliente, a que
falei tanto. Volta pra ele, Larissa, pro cara que faz coisas bestas do
tipo esculachar os outros. Leiam:
“Dexa eu lavar o vrido aí tio?”, pede um flanelinha.
E o maridão diz: “NÃO”.
“Natal sem fome pô”, fala o menor.
O marido arranca com o carro, e a mulher pasma ao lado pede
por perguntar: “Você não tem pena?”. Ele responde: “Quem tem pena
é galinha, Lari”. Viram? Sacaram mesmo, não é?? Um caldo de
testosterona e titica no lugar da cabeça!
Eu deveria ter me vendido ao casamento quando meu
namoradinho me usou, sabe. Mas é pouco divertido pensar em como
seria! Agora eu é que estou desvirginada, enganada pela vida, e ainda
queria possuir uma cara de pau como eu... Ou pensam mais além...
seríamos sacerdotisas, pois nobreza é hereditária – seríamos, ah é.
Vai achando bobagem.
Eu daqui vou passando. Pois descobri ser mesmo é
Observadora – já disse. Sem esperar a hora de morrer, quero só que
aconteça.
Eu tô fudrida mêêrmo! Boiando neste rio indígena e desabando
nos hotéis decadentes com seus loucos bêbados estrebuchando de
cana na mente! Que mais queriam que eu fosse? Assim é. Diante da
beberagem. Só preciso girar esse botão e zerar meus vestígios
sentimentais. Mas esquece, só tem valor simbólico, como
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“esperanssas”... blé!
A prestação do corpo, sempre ela, é versada na língua da
enganação, e que belo exemplo já dito! Os apreciadores amam.
Larissa tentou mutilar com navalhadas o meu rosto. O sangue
ferveu ontem, hoje, senti as ondas de vermelho alastrando e
enchendo-se. Me falta energia para largar-me daqui. A reação tem
sua finalidade. Sabem, agora babôgeral.
Ah, mais uma? Queima esta porcaria sem trama que escrevi!
Não é pra entender. Por certo que tudo caminha a algum final
perdido. É Deus se embananando e esquecendo os seres vivos
fazendo idiotices. Não volto pra escola. Ninguém te dá rumo.
Foudassi, Lari.
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PARTE FINAL
desfecho
“O suplício é lento”
[...]
“Ela foi encontrada!
Quem? A eternidade
É o mar misturado
Ao sol”
(Arthur Rimbaud)
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CAPÍTULO 27: “O encontro da Faca e do Queijo”
“Não somos loucos, somos médicos maravilhosos, conhecemos a
dosagem da alma, da sensibilidade, da medula, do pensamento. Que
nos deixem em paz, que deixem os doentes em paz, nada pedimos aos
homens, só queremos o alívio das nossas dores”
Segurança Pública,
A liquidação do Ópio
(Antonin Artaud)
Agora prestem atenção. Pois é diferente. Este encontro é de
duas histórias, uma dentro da outra e um desfecho comum, tá bom?
Virá um pouco dele e dela! Diretamente. Vamos lá... falam destes
jovens exemplos deste Tempo condenado à reclamação, juntos
vítimas para suportar o Inverno. O desabafo a eles tem que ser um
longo diálogo! Mas nem tanto, pois parecem indecisos e
nonsenseados pela dura ficção! Somente assim é obtido o resultado
final. Relaxa, espera. É, está é mesmo chegando A PARTE FINAL
DAS COISAS DESTE LIVRO. Você prestou atenção, leitor? Acreditou
nestas palavras? Por todos os meios?
Estão os dois: “O Velho” & “Julia” num bar do começo da Rua
Voluntários da Pátria, Botafogo. É abril. Sol foi. É o “Desespero
Humano” Artaudiano revisado!!!
Ela atende ao celular, discute com Larissa e desliga. Os Mestres
mechem-se, segundo fala-se. De histérica, passou a exaltadinha, ela.
Ele logo após chega desapercebido – voltando duma imobiliária. Não
sabe de nada, meio alto, procurando o que fazer. Pede uma cerveja,
olha para verificar se há alguém reconhecível e afunda-se na leitura
de alguma revista em quadrinhos qualquer.
“Lari”, Julia pensa, “Que se pííí!!*** a La-ris-sa”. Leu o e-mail e
ficou irritadinha. A própria expressão dá ótima pista.
Enquanto isso, o vai e vem dos goles já deixando zonza, e vê-se
perto “O Velho” à toa e de olhos paralisados embaçados. A princípio,
ambos seriam apenas solteiros. Estes dois não sabem – ou não
deveriam ter certeza – que o Destino lhes reserva um Acaso. É
esquisito? “O Velho” tinha reparado nela. É bonita, simples mas
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sensual. Não era retocada, sabe?! Que coisa. Ele olha, para, toma
coragem, puxa uma cadeira e senta de frente – isso sim foi uma
maratona física e mental, entretanto era como se algo o impelia a
fazer “isso”. Quem sabe do Velho entende que esse ato não foi
ensaiado, e sim cuspido e inusual em sua biografia. Instantes rápidos.
Isso é um bar, daqueles com cadeiras pra rua, típicos da Zona Sul
deste Rio. Pessoas e mesas com pessoas. Amigos, conhecidos, gentes,
universitários, vagabundos, sustentados pela mãe, periguétes,
passantes, passantes saídos dos vários cinemas, turistas, moradores
dos prédios de cima, enfim, “O Ponto”, a Voluntários! Pois... Nas
conversas nos botequins de aqui, todo mundo se acha Nietzche e
Freud. Cantam sambas de antiquários... Enfim, “O Velho” somado a
Julia, está aqui um reforçando o outro... são equivalentes e implicam
logicamente cada qual sua parte!
Julia assenta a proposta do rapaz e sorri como que sem
preocupações entre onde e aonde. Os dois conversam e não lhes cai a
ficha do que rola afora:
−Coéééé. Ahhhh. Coé – disse rápido “O Velho”.
−Esse teu “coé” soa meio que como “eu não acredito”. Estou correta?
−Acho que é por aí, Dona Julia. Que engraçado, notei, sei lá, tive a
impressão de que somos meio parecidos...
−Que eu faço fazendo aqui... Você é maluquinho, cara! – Falou ela,
arrastada.
Nisso, chega o garçom e pergunta ao Velho:
−Outra bebida, chefia?
Julia olha a mão do atendente, sobre a cabeça, vê os olhos e
paralisa-se. Ela percebeu na hora quem era!
−Traz umas batatinhas fritas, amigo. Aliás, cadê o Fábio Júnior? –
Pede sem olhar, “O Velho”. E o garçom reage:
−Quem, o outro garçom?
−É, o de sempre!
−Ah tá.
E a cena recomeça, como se nada daquele desconforto tivesse
existido:
−Eu te chamei?
−Mas não me expulsou, benzinho! Corre em nossas veias o mais puro
veneno.
Julia pausa e engata, sarcasticamente:
−Ih, tô bêbada!
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−Será que tu daria uma boa esposinha?
−Calaboca e me beija – assim falou Julia. Deve ter sacado algo a mais!
−Quê? – “O Velho” assustou-se zoando, meio dando uma de
desentendido. E pensa alto “De onde cê é mesmo...”. Mas logo se dá
conta de
−EU DISSE: “CALABOCAEMEBEIJA!!”
−Tá bom.
Tufi!
Se eles estivessem zapeando de assunto, procurando
afinidades, cairiam no buraco da Alice. Diriam que não curtem a
Borboleta, e sim a Lagarta. Que estranho seria ter um imã e não
conseguir libertar-se da tal SOLIDÃO que reclamam. Julia catuca as
ideias com “Há quanto tempo eu não tenho um amante de verdade?
Por que não?”. Por fim, é o Velho pensando também: “É misteriosa,
tem cara de... sei lá... VIVA”.
Finaliza ao som que reverbera do “Tufi!”
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CAPÍTULO 28: “(Cê tá com) a faca e o queijo na mão”
Eles atravessam o círculo.
Se alguém tivesse o x da questão não o usaria?
A mola ressoou. Parece que os dois já se conhecem desde o tufi,
ou aprenderam curiosamente rápido. Ou era isso! Ou sei lá, mágica!
Nas imaginações, o intuito de uma relação onde não há namorados,
apenas ficantes que estão bem um com o outro no momento, nos
momentos juntos. Trabalhando com hipóteses? Então. Sem ciúmes,
sem um trato chato, apenas a diversão. Amantes da noite, das
possíveis festas. Uma vida onde reinasse ousadia ou tranquilidade.
Onde celulites, cotidiano, risos fossem descartáveis e motivos de
chacotas. Confidências? “Nós não temos”, diriam. “Bom, só algumas”,
responderiam. Mas nada que impeça. Têm algo para falar, pois
EXISTE. “Não há temor de causa ou efeito, compreende?! Quero
tempo, e um tempo pro outro”. “E se der vontade, ir tomar um café,
ou jantar numa pensão ou transar dois dias e sorrir. Pela madrugada,
veríamos o Corujão, ou algo parecido... dos refugos da noite, dos
desesperados, dos ociosos, nós”.
É a faca e o queijo na mão, a dualidade ou o destino. Quem
sabe???
Algo mais habita 'a casa'. Ele, “O Velho”, tinha que aceitar
aquela situação e tirar proveito dela. Ela, Julia, ah Julia, ela tinha que
fazer mesmo que só pra saber que estava errada... Porém, que seria
do amor sem perdas? Essa pergunta vai para “O Velho”, Julia,
Larissa, Sheila, Folgato, o Porteirinho, O Barman, a cria da Larissa e
todos mais... NO PALCO DA VIDA.
São pessoas que ainda não estão na época de relembrar
histórias com os amigos, mas sim pra criá-las! São jovens. Pessoas da
época de zero zero. E está tudo à frente.
Segue o desfecho:
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CAPÍTULO 29: “A gente se encontrou, e daí?”
Percebam o garçom contente ao contemplar seu trabalho, por
assim dizer. Fita munido de seus belos olhos – amêndoas – de gato.
Geriu a feitura de uma nova substância a partir deste químico
encontro. Sensação e pensamento lado a lado franco atirando-se,
frustrações e promessas no sábado de aleluia! A nova solução
fisiológica pra atenuar algum futuro apocalíptico. Sou Folgato
investigando o espírito humano! Porquês!!
Depois:
−Então, eu tenho um vinho especial lá em casa
−Ei, ei, epaa! Já está me convidando dessa forma, queridinho?
−Sou educado, poxa.
−Tudo bem, sou acostumada.
−Tu acha mesmo que eu perderia a oportunidade? – Franziu este “O
Velho”.
−Nem deveria – Responde Julia, polida.
−Tá, mas você deve, aliás, deve não, VAI SABER O QUE É!
−Na tua casinha?
−Calma, relaxa (Risos)
−E se não der certo isso de fi-car? – Indaga ela.
−Ô, eu preciso repetir?...
−Siiimnn, bobinho.. – Respondeu Julia, a Faca.
−LEGAL, A GENTE SE ENCONTROU, E DAÍ? – Livrou-se Julia,
como sempre.
−Ei, já ouviu falar em Estige? – “O Velho” perguntou meio que
subitamente alegrando-se.
−Ãh??? – Ela se assustou – É nome de bebida?
−!... – E riu. Logo continua:
−Relaxa, calaboca e me beija! – Foi o que decidiu nosso “Velho
Queijo”.
E beijaram-se. A contento. Os dois. Feito. Que tal? E aqui
termina o esquema.
79
Para Taiana S. Kamel,
80
Paulo Vitor Grossi (Rio de Janeiro, 10 de novembro de 1985).
Escritor carioca, formado em Turismo no Rio de Janeiro,
aventura-se por poemas, contos, pequenos romances e mesclas.
Os Sonhos, Nicolas; Volume II: Adiós, Lite de Ratura ; Santa
Cruz; Carne Viva; Rara (Volume três) & o hotel m tá infestado
de pragas são seus primeiros livros. É o autor, e ao mesmo
tempo, o ilustrador de suas obras. Fornece o site
http://paulovitorgrossi.webs.com/ .
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