ASPECTOS
GEOLÓGICOS DA
SERRA
DE
SINTRA
E A SUA INFLUÊNCIA NO MEIO
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Geologia é a ciência que estuda a estrutura e os materiais que compõem o
planeta Terra, bem como a sua evolução.
A geologia foi uma das ciências que nos demonstrou que a Terra tem cerca de
4500 milhões de anos e que é composta por várias camadas sobrepostas: A
Crosta, o Manto e o Núcleo.
Fig. 1 – Estrutura interna da Terra (in A Geografia)
É na superfície da crosta terrestre que todos os seres vivos habitam. A vida na
Terra depende directamente dos minerais que a compõem, pois são estes que
permitem a existência das plantas, juntamente com a água e a energia solar.
As plantas, por sua vez, são a base da cadeia alimentar.
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É também através da geologia que se sabe onde procurar jazidas de minerais
e outros materiais necessários à nossa tecnologia, como o ferro, o cobre, o
ouro e até mesmo o petróleo, o carvão e o gás natural.
Esta ciência explicou-nos, igualmente, o fenómeno dos terramotos, o
vulcanismo, o porquê dos diferentes tipos de rochas e solos, entre outras
coisas.
Existem basicamente três tipo de rochas, relativamente ao seu processo de
formação: as magmáticas, as sedimentares e as metamórficas. Uma rocha é
uma mistura de diferentes minerais. Um mineral, por sua vez, é um cristal
formado por uma mistura de vários elementos químicos (caso do quartzo,
resultado da união de um átomo de Silício e de dois átomos de Oxigénio) ou
por um só elemento (o ouro e o cobre, por exemplo). Apesar dos minerais
poderem existir em estado puro, é muito mais comum estarem combinados uns
com os outros formando rochas.
Quase todos os processos geológicos decorrem
ao longo de milhões de anos, por isso não os
podemos observar em acção. Apenas os seus
resultados. Algumas excepções são os sismos e
as erupções vulcânicas.
Fig. 2 – Erupção vulcânica (in Ciências
Naturais – Ambientes)
As rochas magmáticas, como o nome indica, formam-se a partir do magma.
Exemplos de rochas magmáticas são o granito e o basalto. O granito é um
caso específico de rocha magmática – é uma rocha plutónica. Um modo de
identificar este tipo de rochas é através da sua resistência, quando comparadas
com os outros tipos de rochas, para além de se notarem a olho nu os seus
cristais constituintes (textura granular ou holocristalina – vide Glossário). Sintra
é precisamente um local onde se encontra muito granito. Porquê?
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A Serra de Sintra deve a sua origem a um fenómeno geológico denominado
intrusão magmática. E o que é uma “intrusão magmática”? O manto terrestre é
constituído por magma que se encontra a grandes temperaturas e,
consequentemente, fundido. Por ser menos denso, este material tende a subir
em direcção à crosta e até mesmo a atravessá-la, dando origem aos vulcões.
O processo é análogo ao das bolhas na água a ferver. Por vezes, o magma fica
retido e não alcança a superfície. Quando a profundidade a que está retido é
de cerca de 3 a 15 km, o magma acaba por arrefecer dando origem a rochas
plutónicas. No caso de Sintra formou-se, principalmente, granito. É pelo facto
de esta massa de rochas plutónicas se ter “encaixado” noutros tipos de rochas
que se
utiliza
a designação
intrusão.
As movimentações
tectónicas
empurraram, muito lentamente (alguns milímetros por século!), essa massa de
granito em direcção à superfície e, ao mesmo tempo, as camadas de crosta
que se encontravam por cima foram sendo erodidas. Finalmente, alguns
milhões
granito
de
anos
começou
a
depois,
o
surgir
à
superfície, dando origem à serra.
Foi assim que a Serra de Sintra
(ou Maciço Eruptivo de Sintra) se
formou, há cerca de 80 milhões
de anos, aparecendo à superfície
há cerca de 30 milhões de anos!
São seus contemporâneos os
maciços intrusivos de Sines e de
Monchique. A formação destes
três
maciços
associada
ao
encontra-se
processo
abertura do Oceano Atlântico.
de
Fig. 3 – Intrusão Magmática vs extrusão (vulcão)
(adaptado de Understanding Earth)
Foi por esta altura que se deu a extinção dos dinossauros e de outros seres
vivos. Há cientistas que pensam que foi o aumento da actividade vulcânica
mundial que se estava a verificar por esta altura que provocou essa extinção
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maciça. Outros há que pensam que tal se deveu a um gigantesco meteorito,
que embateu na Terra nesta altura, alterando o ambiente e o clima a ponto de
provocar a extinção de inúmeras espécies. Por fim, existe outro grupo de
cientistas que pensam que este acontecimento se deveu a uma combinação de
ambos os factores.
O granito, como já foi referido, é geralmente uma rocha plutónica constituída
por diversos minerais facilmente visíveis, sendo os principais o quartzo e o
feldspato. Outros minerais constituintes do granito são a moscovite e a biotite,
por
exemplo.
Esta
rocha
apresenta,
geralmente, uma
cor acinzentada
mas,
as
conforme
proporções
dos minerais que
a
constituem,
pode ter também
um tom rosado.
Fig. 4 – Granito (in http://www.geo.umn.edu)
As rochas sedimentares resultam da acumulação e da consolidação de
sedimentos (resultantes da erosão de outros tipos de rochas, incluindo rochas
sedimentares) ou de precipitação química.
O calcário é um exemplo de uma rocha sedimentar, formado pela precipitação,
nos oceanos, de carbonato de cálcio (CaCO3) proveniente de restos de seres
marinhos microscópicos. Chegam-se a formar depósitos de centenas de
metros de espessura de calcário nos fundos marinhos e, por vezes, devido a
processos tectónicos que duram milhões de anos, acabam por surgir à
superfície. A Serra da Arrábida é um exemplo de uma dessas formações
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calcárias. Muitas vezes, a precipitação do calcário preserva vestígios de
animais ou plantas, sendo este um dos processos de formação de fósseis.
Uma área significativa da península de Lisboa são depósitos sedimentares
formados no Jurássico e Cretácico, emersos há cerca de 70 milhões de anos
por movimentações tectónicas, como a Serra de Monsanto, por exemplo. Ao
mesmo tempo que as movimentações tectónicas elevavam esses sedimentos
calcários, criaram episódios de vulcanismo que “temperaram” Monsanto com
materiais basálticos.
A areia é um conjunto de partículas que têm origem na erosão de outras
rochas, inclusive outras rochas sedimentares. No caso da areia diz-se que é
uma rocha sedimentar detrítica móvel. Um exemplo de rocha sedimentar
detrítica consolidada é, por exemplo, o arenito, que é areia agregada por um
cimento natural.
O solo é, em parte, o resultado de processos erosivos. Este tem origem na
erosão de outras rochas e na humificação (decomposição) de restos orgânicos.
O solo formado a partir de rochas basálticas tem excelentes qualidades
agrícolas, devido à sua riqueza de minerais. A zona de Lisboa tem solos deste
tipo, daí a sua aptidão para as actividades agrícolas.
Apesar de a erosão ser necessária para criar o solo, também o pode destruir.
Como vimos, sem solo as plantas não sobrevivem e as plantas são a base da
cadeia alimentar e, logo, o suporte de quase toda a vida na Terra. Um modo de
evitar a erosão dos solos é precisamente através da protecção providenciada
pelas plantas, que evitam que as terras sejam arrastadas pelo vento e pela
água da chuva e dos rios.
As rochas metamórficas têm origem em rochas magmáticas e sedimentares
que, sob condições particulares de pressão e de temperatura, sofrem um
metamorfismo, i.e., uma mudança das suas propriedades, com recristalização
(vide Glossário) e consequente alteração de textura e de estrutura, originando
novas rochas. Como exemplos temos a ardósia, o xisto e o mármore. O próprio
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granito pode ter origem metamórfica mas esse não é o caso do granito que
encontramos em Sintra.
Por fim, as rochas magmáticas podem dar origem a rochas sedimentares e
metamórficas e todas estas
podem reverter ao magma,
através
dos
processos
tectónicos.
Influência da geologia de
Sintra no meio envolvente.
O maciço montanhoso de
Sintra sobressai acima das
plataformas calcárias que a
montanha perfurou na sua
ascensão
através
dessas
camadas sedimentares. De
facto,
anteriormente
à
formação da Serra, este local
era uma zona litoral de terras
baixas e planas, ocupada por
braços de mar e lagunas. As
lamas
destes
pantanosos
fundos
formaram
camadas sedimentares que,
por sua vez, num processo de
petrificação que dura milhões
Fig. 5 – Ciclo das rochas (in Ciências Naturais – Ambientes)
de
anos,
formaram
as
plataformas calcárias. Ao irromper, a Serra deformou essas plataformas. Foi
assim que rastos de dinossauros, previamente formados nessas lamas e
preservados na horizontal, durante a formação do calcário, aparecem hoje
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expostos em posições quase verticais ou de grande inclinação, como é o caso
na Praia Grande.
De certo modo, a Serra parece uma ilha de verde no meio de uma paisagem
mais plana, menos arborizada e urbanizada (principalmente a Sul). E,
provavelmente, já o foi. Existem algumas evidências de tal ter acontecido entre
6 e 15 milhões de anos atrás, e de novo há menos de 1 milhão de anos.
A exuberância da vegetação pode ser explicada pelo clima típico da Serra, que
por sua vez se deve ao seu relevo, que intercepta a humidade proveniente do
Atlântico. Cria-se assim um microclima mediterrânico mas de feição oceânica,
com humidade quase subtropical. A evapotranspiração gerada pela floresta
ajuda a manter um elevado nível de humidade. A protecção constante do solo
providenciada pelas copas e pela manta morta também contribui para uma
temperatura e níveis de humidade no solo adequados à diversidade de
espécies encontradas. Criou-se, desta forma, uma espécie de ciclo, em que a
humidade vinda do oceano permite a existência de muita vegetação que, por
sua vez, mantêm as condições para a permanência de um nível quase
constante de humidade na Serra, o que vai beneficiar a manutenção do coberto
vegetal.
Uma influência visível do relevo geológico na flora pode ser constatada nos
locais mais altos da Serra, como na Cruz Alta. Pode-se ver como, conforme a
altitude e o grau de exposição aos elementos, as árvores crescem mais ou
menos. Um efeito curioso é o das copas das árvores que nasceram nos vales
estarem ao quase ao mesmo nível das que nascem nos locais mais elevados.
O que se passa é que as árvores dos vales, para terem acesso à luz, crescem
muito rapidamente em altura, até atingirem
um nível de exposição à luz mais favorável.
Por sua vez, as árvores que nasceram em
locais mais elevados e expostos já têm
bastante exposição ao Sol. Não só não
necessitam de crescer muito em altura como
a própria exposição ao vento o torna mais
Fig. 6 – Feteira da Rainha – Parque da
Pena (Foto: J. Canavilhas)
difícil. Além disso, nos locais mais íngremes,
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como é frequente em locais mais altos, a erosão sobrepõe-se à sedimentação,
levando a que haja menos solo disponível para uma árvore poder crescer com
mais vigor.
É nos vales, mais protegidos dos excessos térmicos e com maior abundância
de água e de solo que, por vezes, se encontram as espécies de origem mais
tropical, como é o caso do Vale dos Fetos em Monserrate e da Feteira da
Rainha na Pena, onde fetos arbóreos exóticos coexistem com espécies
autóctones.
Os microhabitats providenciados pelo relevo e pela variedade litológica
explicam também a elevada biodiversidade que a Serra apresenta, apesar da
sua relativa pequena dimensão. Uma característica das paisagens graníticas
que contribui muito para a criação de microhabitats são os caos de blocos.
Os caos de blocos são o resultado da erosão do granito durante milhões de
anos. As variações de temperatura a que as rochas estão sujeitas com o
passar do tempo e das estações vão provocando alterações de volume nas
mesmas e provocam fracturas e fendas. A essas fracturas chamam-se
diáclases. Com o tempo, as diáclases transformam um bloco de granito num
aglomerado de blocos menores, o caos de blocos. A Cruz Alta é um bom
exemplo de caos de blocos.
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Fig. 7 – Caos de Blocos. (in Ciências Naturais – Ambientes)
A bioerosão amplifica esse mecanismo. Trata-se da erosão provocada pelos
seres vivos durante a sua vida. Um bom exemplo são os líquenes que vão
lentamente “corroendo” a superfície das rochas onde crescem, abrindo
caminho para as plantas se poderem fixar. Com o tempo, cria-se uma camada
de solo à superfície da rocha que permite a fixação de plantas maiores e mais
exigentes. Eventualmente, uma árvore poderá aí estabelecer-se e as suas
raízes irão forçar as fendas das rochas que lhe servem de suporte, até as
fracturarem completamente. De um modo resumido, é este um dos processos
de formação de solo, desde grandes rochas até uma camada de solo mais ou
menos uniforme. São muitos os locais no Parque da Pena onde se podem
encontrar vestígios de bioerosão.
A bioerosão não deve ser confundida com a erosão provocada pelas
actividades humanas. Regra geral, a bioerosão tende a criar solo. A erosão de
origem humana tende a fazer o oposto.
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Quando andar a passear no campo, observe os diferentes tipos de rochas que
encontra, o tipo de solo que pisa, e pense nos processos de formação
envolvidos e no tempo que levou a criar estas diferentes paisagens e rochas.
Leve um guia de geologia consigo para mais facilmente identificar as diferentes
rochas e minerais.
Todos os exemplos dados são só uma fracção muito pequena dos episódios
geológicos. Os vulcões em Lisboa não apareceram só nas alturas
mencionadas e poderão voltar a aparecer. A paisagem não é constante e,
enquanto existirem movimentações tectónicas, serão criadas e destruídas
montanhas, vales, oceanos, rios... numa escala temporal que se mede em
milhões de anos. Alguém comparou a Geologia como sendo a capacidade de
descobrir a história de um filme vendo apenas uma única imagem do mesmo,
ou a história de um livro, lendo apenas uma página!
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Glossário:
Basalto: A mais vulgar das rochas magmáticas. Os seus minerais
constituintes são a piroxena, a plagiocláse e a olivina. Varia entre a cor preta e
o cinzento-escuro.
Cretácico: Nome dado ao período geológico entre 144 e 66,4 milhões de
anos atrás.
Erosão: Desgaste contínuo das rochas por acção do vento, da água, de
mudanças de temperatura ou da acção de seres vivos (bioerosão).
Fósseis: vestígios de seres vivos há muito mortos e conservados,
principalmente, em rochas sedimentares. Através destes é possível investigar a
evolução dos seres vivos ao longo do tempo e as suas condições de vida na
altura da fossilização. Também tornam possível ficar a saber as condições
ambientais dominantes durante a formação desses sedimentos. Se no alto de
uma montanha aparecer um fóssil de um animal marinho, isso implica que os
sedimentos e rochas que constituem a montanha formaram-se debaixo do mar.
Humificação: formação de compostos orgânicos no solo a partir dos
restos orgânicos dos seres vivos.
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Jurássico: Nome dado
ao período geológico entre
208 e 144 milhões de anos
atrás.
Magma: ver Manto.
Manto:
Camada
do
interior da Terra que se segue
à Crosta. O material que o
constitui está fundido, devido
às
altas
pressões
e
temperaturas. Esse material
fundido por vezes atravessa a
crosta,
dando
origem
ao
magma que é expelido pelos
vulcões
e
às
intrusões
magmáticas.
Microclima:
Características
climáticas
relativamente
numa
constantes
área
relativamente
pequena e que contrasta com
os
padrões
climáticos
da
região circundante.
Período:
No
contexto
geológico,
corresponde
à
unidade básica de tempo, em
que sistemas específicos de
rochas se formaram.
Fig. 8 – Movimentação dos continentes nos últimos 200
milhões de anos (in A Pré-História).
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Tectónica: ramo da Geologia que estuda a deformação da crosta
terrestre e das forças que a provocam.
Textura granular ou holocristalina: diz-se das rochas em que os minerais
são facilmente identificáveis a olho nú.
Recristalização: neste contexto, é a reorganização da estrutura espacial das
ligações entre os átomos constituintes dos cristais ou a formação de novos
cristais, devido a processos metamórficos. Um bom exemplo é a grafite, um
mineral resultante do metamorfismo de sedimentos ricos em Carbono (a grafite
também pode ter origem magmática).
BIBLIOGRAFIA:
™
António Quaresma Coelho (Direcção), Ciências Naturais – Ambientes; 7º Ano, Constância Editores, S.A. 1998
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Frank Press, Raymond Siever, Understanding Earth, W. H. Freeman and Company, New York, 1994
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Jennifer L. Justice, A Geografia – Enciclopédia Juvenil Ilustrada, Grisewood and Dempsey Ltd, Londres &
Círculo de Leitores, Lda., Lisboa, 1980 – 1983
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Natureza, 1997
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Mark Lambert, A Pré-História – Enciclopédia Juvenil Ilustrada, Grisewood and Dempsey Ltd, Londres & Círculo
de Leitores, Lda., Lisboa, 1980 – 1982
NA INTERNET:
Em português:
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http://www.igm.pt
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http://www.igm.pt/departam/geologia/inicial.htm
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http://www.geopor.pt/
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http://www.geopor.pt/imagens/HTerra.JPG
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http://geologia.fc.ul.pt
Em inglês
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http://www.geo.umn.edu/
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http://college.hmco.com/geology/resources/geologylink/index.html
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http://geology.com/
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http://www.ucmp.berkeley.edu/exhibit/geology.html
™
http://www.journals.uchicago.edu/JG/home.html
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DE
DE
EDUCAÇÃO
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AMBIENTE
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