ISSN 1413-8557
Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE)
Volume 9 Número 1 Janeiro/Junho 2005
ABRAPEE
Expediente
A revista Psicologia Escolar e Educacional é um veículo de divulgação e debate da produção científica na área específica e está vinculada
à Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE). Seu objetivo é constituir um espaço para a apresentação de pesquisas atuais
no campo da Psicologia Escolar e Educacional e servir como um veículo de divulgação do conhecimento produzido na área, bem como de
informação atualizada a profissionais psicólogos e de áreas correlatas. Trabalhos originais que relatam estudos em áreas relacionadas à Psicologia
Escolar e Educacional serão considerados para publicação, incluindo processos básicos, experimentais, aplicados, naturalísticos, etnográficos,
históricos, artigos teóricos, análises de políticas e sínteses sistemáticas de pesquisas, entre outros. Também, revisões críticas de livros, instrumentos
diagnósticos e softwares. Com vistas a estabelecer um intercâmbio entre seus pares e pessoas interessadas na Psicologia Escolar e Educacional, conta
com uma revisão às cegas por pares e é publicada semestralmente. Seu conteúdo não reflete a posição, opinião ou filosofia da Associação Brasileira
de Psicologia Escolar e Educacional. Os direitos autorais das publicações da revista Psicologia Escolar e Educacional são da Associação Brasileira de
Psicologia Escolar e Educacional, sendo permitida apenas ao autor a reprodução de seu próprio material, previamente autorizada pelo Conselho
Editorial da Revista. As transcrições e traduções são permitidas, desde que no limite dos 500 vocábulos e mencionada a fonte. São publicados textos
em português, espanhol e inglês.
C
O N S E L H O
E
D I T O R I A L
Editora: Maria Cristina Rodrigues Azevedo Joly / Editora Adjunta: Marilene Proença Rebello de Souza
CORPO EDITORIAL
Acácia Aparecida Angeli dos Santos
Alessandra Gotuzzo Seabra Capovilla
Ana Paula Porto Noronha
Célia Vectore
Cristina Maria Carvalho Delou
Denise de Souza Fleith
Elenita de Rício Tanamachi
Elisabeth Brunini Sbardellini
Eunice M. L. Soriano de Alencar
Evely Boruchovitch
Fermino Fernandes Sisto
Geraldina Porto Witter
Gerardo Prieto
Hermínia Vicentelli de Castillo
José Aloyseo Bzuneck
José Fernando B. Lomônaco
Josiane Maria de Freitas Tonelotto
Leandro Almeida
Lino de Macedo
Maria Helena Novaes
Maria Lúcia Boarini
Maria Júlia Ribeiro
Mercedes Villa Cupollillo
Nádia Maria Dourado da Rocha
Silvia Koller
Silvia Maria Cintra da Silva
Solange Muglia Wechsler
Thomas Oakland
Universidade São Francisco
Universidade São Francisco
Universidade São Francisco
Universidade Federal de Uberlândia
Universidade Federal Fluminense
Universidade de Brasília
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
Universidade Tuiuti do Paraná
Universidade Católica de Brasília
Universidade Estadual de Campinas
Universidade São Francisco
Universidade Mogi das Cruzes
Universidad de Salamanca
Universidad Pedagógica Experimental Libertador
Universidade Estadual de Londrina
Universidade de São Paulo
Pontifícia Universidade Católica de Campinas
Universidade do Minho
Universidade de São Paulo
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Universidade Estadual de Maringá
Universidade de Taubaté
Universidade Católica de Goiás
Faculdades Ruy Barbosa
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Universidade Federal de Uberlândia
Pontifícia Universidade Católica de Campinas
University of Florida
CONSULTORES AD-HOC
Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla – Universidade Estadual de Campinas
Carla Witter – Universidade São Judas
Psicologia Escolar e Educacional./ Associação Brasileira de
Maria de Fátima Silveira Polesi Lukjanenko - Universidade São Francisco Psicologia Escolar e Educacional.- v. 1, n. 1. 1996Soely Aparecida Jorge Polydoro – Universidade Estadual de Campinas
Campinas : ABRAPEE, 1996.
ASSISTENTE DO CONSELHO EDITORIAL
Katya Luciane de Oliveira – Doutoranda em Educação
Lucicleide Maria de Cantalice – Mestre em Psicologia
Indexação em:
Index Psi / LILACS
Disponível nas bibliotecas da Rede Brasileira de Bibliotecas da
Área de Psicologia - ReBAP (www.bvs-psi.org.br/rebap/)
Apoio:
CNPq
Tiragem:
600 exemplares
Quadrimestral : 1996-1999.
Semestral : 2000ISSN 1413-8557
l. Psicologia educacional. 2. Psicologia escolar.
3. Educação. 4. Brasil. I. Associação Brasileira de Psicolo-
Revista de Psicologia Escolar e Educacional
Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 – Itatiba/SP – 13251-900 – Tel: (11) 4534-8046
http://www.abrapee.psc.br e [email protected]
Psicologia Escolar
e Educacional
PUBLICAÇÃO SEMESTRAL
11
ISSN 1413-8557
2005 Volume 9
Número 1
Editorial
Artigos
15
Auto concepto y rasgos de personalidad: un estudio correlacional
Débora Cecílio Fernandes
Daniel Bartholomeu
Fabián Javier Marín Rueda
Adriana Cristina Boulhoça Suehiro
Fermino Fernandes Sisto
27
Criatividade no trabalho docente segundo professores de história: limites e possibilidades
Maria de Fátima Magalhães Mariani
Eunice Maria Lima Soriano de Alencar
37
Avaliação da aprendizagem na universidade
Katya Luciane de Oliveira
Acácia Aparecida Angeli dos Santos
47
Comportamento social na escola: diferenças entre gênero e séries
Laura Fogaça Saud
Josiane Maria de Freitas Tonelotto
59
Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngües e bilingües
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça
Denise de Souza Fleith
71
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla
Mariana Wisnivesky
Paula Saretta
Fernanda Costa Paulucci
Carolina Pasquote Vieira
Carolina de Aragão Escher Marques
87
Clínica-escola: levantamento de instrumentos utilizados no processo psicodiagnóstico
Fernanda Andrade de Freitas
Ana Paula Porto Noronha
95
Psicologia escolar em educação infantil: reflexões de uma atuação
Tatiana Yokoy
Regina Lúcia Sucupira Pedroza
105
Inclusão escolar: visão de alunos sem necessidades educativas especiais
Nilza Sanches Tessaro
Ana Sayuri Ribeiro Waricoda
Renata Cristina Marques Bolonheis
Ana Paula Barletta Rosa
117
O professor e o aluno em liberdade assistida: um estudo exploratório
Jeyse Martins
Caroline Catozzi
Flávia Sayegh
Isabel Cristina Dib Bariani
127
Teleavaliação da habilidade de leitura no ensino infantil e fundamental
Elizeu Coutinho de Macedo
Fernando César Capovilla
Carolina Cunha Nikaedo
Fernanda Tebexreni Orsati
Katerina Lukasova
Alessandra Gotuzo Seabra Capovilla
Cléber Diana
135
Cultura da paz e psicologia escolar no contexto da instituição educativa
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi
Claisy Maria Marinho de Araújo
Marisa Maria Brito da Justa Neves
Resenhas
147
Práticas em psicologia escolar
Nayá Bellintani Caparrotti
149
Processos psicológicos e sociais na aprendizagem
Miriam Cruvinel
151
Desenvolvimento das habilidades do pensamento acadêmico
Geraldina Porto Witter
155
O aluno universitário e suas questões
Janete Aparecida Silva Marini
História
159
Entrevista com Elcie Aparecida Fortes Salgado Masini
Entrevistadora: Lucicleide Maria de Cantalice
Sugestões práticas
163
Focos de intervenção em psicologia escolar
Edla Grisard Caldeira de Andrada
Informativo
167
Notícias bibliográficas
169
Informe
171
Normas de publicação
179
Ficha para novos sócios da ABRAPEE
ISSN 1413-8557
SUMMARY
11
Editorial
Papers
15
Self concept and personality traits: a correlational study
Débora Cecílio Fernandes
Daniel Bartholomeu
Fabián Javier Marín Rueda
Adriana Cristina Boulhoça Suehiro
Fermino Fernandes Sisto
27
Creativity in teaching according to teachers of history: limits and possibilities
Maria de Fátima Magalhães Mariani
Eunice Maria Lima Soriano de Alencar
37
Learning evaluation in the university
Katya Luciane de Oliveira
Acácia Aparecida Angeli dos Santos
47
Social behavior in school: differences between gender and grade
Laura Fogaça Saud
Josiane Maria de Freitas Tonelotto
59
Relationship between monolinguals and bilinguals’ creativity, intelligence, and self-concept
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça
Denise de Souza Fleith
71
Sharing formation, practice and dilemmas: a contribution to the professor development
Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla
Mariana Wisnivesky
Paula Saretta
Fernanda Costa Paulucci
Carolina Pasquote Vieira
Carolina de Aragão Escher Marques
87
School psychology clinic: a survey of instruments used in psychodiagnotics process
Fernanda Andrade de Freitas
Ana Paula Porto Noronha
95
School psychology in childhood education: profissional intervention´s reflexions
Tatiana Yokoy
Regina Lúcia Sucupira Pedroza
105
Scholar inclusion: view of students without special educative necessities
Nilza Sanches Tessaro
Ana Sayuri Ribeiro Waricoda
Renata Cristina Marques Bolonheis
Ana Paula Barletta Rosa
117
Teacher and the student in assisted freedom: an exploratory study
Jeyse Martins
Caroline Catozzi
Flávia Sayegh
Isabel Cristina Dib Bariani
127
Long distance assessment of reading ability in schoolars
Elizeu Coutinho de Macedo
Fernando César Capovilla
Carolina Cunha Nikaedo
Fernanda Tebexreni Orsati
Katerina Lukasova
Alessandra Gotuzo Seabra Capovilla
Cléber Diana
135
Peace culture and school psychology in the context of educative institutions
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi
Claisy Maria Marinho de Araújo
Marisa Maria Brito da Justa Neves
Reviews
147
School psychology atuation
Nayá Bellintani Caparrotti
149
Psychological and social process in the learning.
Miriam Cruvinel
151
The development of the thinking academic abilities
Geraldina Porto Witter
155
The university student questions
Janete Aparecida Silva Marini
History
159
Interviewing Elcie Aparecida Fortes Salgado Masini
Practical Suggestions
163
Intervention focus in the school psychology
Edla Grisard Caldeira de Andrada
Informative
167
Bibliographic Notes
169
Events
171
Instructions to Authors
179
ABRAPEE Membership
EDITORIAL
Psicologia Escolar e educacional: da teoria à prática escolar
Teoria e prática em Psicologia escolar foi, de fato, o foco da discussão de 1500 congressistas que, vindos
de todos os estados brasileiros, participaram do VII Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional
(CONPE) na Universidade Tuiuti do Paraná, em Curitiba , de 21 a 24 de abril de 2005. Acre e Roraima foram
os únicos estados que não se fizeram representar.
Pode-se observar quão importante é esse evento para a comunidade científica da Psicologia Escolar e
Educacional brasileira pelas recentes produções científicas apresentadas. Foi um espaço para discussões, reflexões
e propostas de ações que congregou tanto profissionais e estudantes de psicologia quanto os de outras áreas
afins. É relevante explicitar que vários educadores vinculados à rede municipal, estadual e particular de ensino
de Curitiba e região participaram ativamente do VII CONPE.
Cabe, aqui, um registro das atividades que, sob diferentes perspectivas, efetivaram a proposta de fazer
um percurso da teoria à prática escolar na Psicologia Escolar e Educacional. Foram 11 conferências, 25
mini-cursos, 22 mesas redondas, 35 simpósios, 31 apresentações para partilhar experiências, 285 comunicações
orais e 160 painéis de pesquisa. Além, destaque seja dado, dos cinco livros lançados, dos dois Fóruns de
debates, da exposição da História da Psicologia Educacional Brasileira e do II Encontro de Estagiários.
A quantidade de informação aliada à indiscutível qualidade das atividades demonstrou o compromisso do
Psicólogo Escolar com as atuais necessidades da educação brasileira, revelando o atual panorama da área.
Participações tão comprometidas com a Psicologia escolar também têm sido constatadas pelo grande número
de manuscritos encaminhados à revista, tanto provenientes das diferentes regiões brasileiras quanto da América
Latina e Europa.
Isso revela que, além de contarmos com muitos profissionais investigando e atuando na área, a revista está
com maior visibilidade e se consolidado como representante do registro e divulgação científica da área em
realce. Espera-se que tal desempenho cresça e a informação e produção que compõem este periódico possa
ser acessada pelo maior número possível de pessoas.
Visando atingir esta meta com dinamismo e buscando intercâmbio entre pares e pessoas interessadas na
Psicologia Escolar e Educacional, a revista, como anunciado no último editorial, está sendo editada também
eletronicamente. Ela faz parte da coleção de revistas da base de Periódicos Eletrônicos em Psicologia – PEPSIC
(www.bvs-psi.org.br), recém lançada em parceria com a Biblioteca Virtual da Saúde – BVS- Psi. Assim, este
número e os fascículos que o compõem estarão disponíveis on line e também impressos. Que as informações
possam ser muito úteis a pesquisadores e profissionaise estudantes.
Maria Cristina Rodrigues Azevedo Joly
Editora
Artigos
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1 15-25
AUTO CONCEPTO Y RASGOS DE PERSONALIDAD: UN ESTUDIO CORRELACIONAL
AUTO CONCEPTO Y RASGOS DE PERSONALIDAD
Débora Cecílio Fernandes1
Daniel Bartholomeu2
Fabián Javier Marín Rueda3
Adriana Cristina Boulhoça Suehiro3
Fermino Fernandes Sisto4
Resumen
Este estudio ha investigado las relaciones entre los rasgos de personalidad y auto concepto. Fueron aplicadas la Escala de Traços de Personalidade
para Crianças y la Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil en 389 niños, con edad de 8 a 10 años de escuelas públicas y particulares. Se han hallado
diferencias de sexo para casi todas las medidas hechas. Para los varones, ha sido observado correlaciones positivas entre extroversión y auto
conceptos escolar y familiar, neuroticismo y psicoticismo con auto conceptos personal y social, y sociabilidad con auto concepto familiar; y
correlaciones negativas entre extroversión y auto concepto social, psicoticismo y auto concepto familiar, y sociabilidad y auto concepto personal.
Para las niñas, fueron observadas correlaciones positivas entre el auto concepto social y psicoticismo y sociabilidad con el familiar; y correlaciones
negativas entre extroversión y el social, psicoticismo y neuroticismo con el familiar. Los análisis de los grupos extremos confirmaron los datos
encontrados.
Palavras-clave: Rasgos de Personalidad; Auto concepto; Evidencia de Validez.
SELF CONCEPT AND PERSONALITY TRAITS: A CORRELATIONAL STUDY
Abstract
This study investigated the relationship of the personality traits to self concept. The Escala de Traços de Personalidade para Crianças and
Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil were administered to 389 children aged from 8 to 10 years, attending at public and private schools. Almost
every measure done was differentiated by gender. For the boys, the positive correlations found were between extraversion and scholar and familiar
self concept, neuroticism and psychoticism with personal and social self concept, and sociability with familiar self concept. The negative
correlations found were between extraversion and social self concept, psychoticism and familiar self concept, and sociability with personal self
concept. For the girls, positively correlations between the social self concept and psychoticism and sociability with familiar self concept were
emerged. Negative correlations were revealed between extraversion trait and social self concept, psychoticism and neuroticism traits correlated
with familiar. The contrasting group’s analyses confirmed the found data.
Keywords: Personality traits; Self concept; Validity Evidence.
INTRODUCCIÓN
El auto concepto es estudiado en diversas áreas de
la Psicología en virtud de la importancia que asume en
la comprensión del proceso del desarrollo humano
(Cortesão & Torres, 1984; Vaz Serra, 1986; Vaz Serra
& Firmino, 1986; Vaz Serra, Mattos & Gonçalves, 1986;
1
Veiga, 1988,1989). Pese a eso, se considera que la
investigación teórica en esa área es caracterizada por
una gran imprecisión de la terminología y discordancias
en lo que se refiere a las definiciones empleadas. Todavía,
aunque la literatura no revele una definición operacional
Doutoranda pela Universidad de Salamanca.
Mestrando do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia da Universidade São Francisco e bolsista da CAPES.
3
Doutorandos do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia da Universidade São Francisco e bolsistas da CAPES.
4
Livre – docente pela Unicamp e docente do curso de Psicologia e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Avaliação Psicológica da
Universidade São Francisco.
2
16
Débora C. Fernandes, Daniel Bartholomeu, Fabián J. Marín Rueda, Adriana C. B. Suehiro e
clara, concisa y universalmente aceptada, hay una cierta
concordancia entre autores en relación a la definición
general del término. Así que, el auto concepto es definido como la percepción que el individuo tiene de si mismo
y que se sostiene directamente por sus experiencias en
relación a los otros y en la valoración que hace de su
propia conducta (Jacob & Loureiro, 1999; Marsh, 1984;
Marsh, Byrne & Shavelson, 1988; Shavelson, Hubner
& Stanton, 1976; Stevanato & Loureiro, 2000; Sisto &
Martinelli, 2004; Sossai, 1975; Vaz Serra, 1988; Loureiro, 2001).
Teniendo en cuenta las deficiencias terminológicas
y la gran multiplicidad de conceptos de la literatura, se
trabajará en este estudio con la definición operacional
adoptada por Sisto y Martinelli (2004). Esos autores
afirman que el auto concepto es un producto de la
interacción entre la persona y su medio ambiente durante su proceso de construcción social y ciclo de vida,
acompañada de una evaluación de sus capacidades,
realizaciones, experiencias y representaciones. Aunque
esa definición a la multidimensionalidad del constructo,
no tiene como base la existencia de una jerarquía entre
sus componentes como la defendida por el modelo teórico presentado por Shavelson, Hubner y Stanton
(1976), una vez que se han elegido la postura teórica
defendida por Mead (1934) y James (1890) de que la
persona puede tener varios “yo” o varios auto
conceptos.
Las referencias históricas sobre los estudios relativos
al auto concepto empiezan por William James (1890,
1892) como un de los primeros autores a analizar tal
constructo desde el punto de vista psicológico. Su principal contribución fue la distinción entre dos aspectos
fundamentales del self o “yo”, el “yo-sujeto” y el “yoobjeto”. El primero era concebido como el “yo”
conocedor que, conforme Damon (1983), tendría la
función de organizar e interpretar, de forma subjetiva,
las experiencias del individuo. El segundo, o sea, el “yoobjeto”, representado como un agregado de cosas
objetivamente conocidas sobre el “yo” seria constituido
por cuatro componentes responsables por conferir al
sujeto su individualidad, a saber, el self espiritual (formado por estados de conciencia, facultades psíquicas),
el material (compuesto por el cuerpo, familia, bienes), el
social (compuesto por las relaciones, papeles,
personalidad) y el corporal.
Gran mérito es atribuido a James por, además de
proponer una estructura multidimensional para el
Fermino F. Sisto
concepto de si mismo, poner de relieve su naturaleza
típicamente social (Burns, 1982). Tales ideas son
igualmente compartidas por Mead (1934), pues concibe
que varios “yo” se pueden desarrollar en función de las
diferentes experiencias sociales, que posibilitarían la
aceptación de que los auto conceptos de los individuos
pueden, de alguna manera, influenciar y ser influenciados
por el contexto social en que son analizados y al cual
están sometidos. Así, es posible referirse a un “yo”
social, respecto al grupo al que pertenece y actúa, a un
“yo” familiar, que corresponde a las actitudes frente a
la familia, a un “yo” escolar, formado a partir de las
relaciones con los profesores y colegas y a un “yo”
personal, en relación a su manera de concebirse.
Independientemente de la definición adoptada, hay
un consenso cuanto al impacto de las opiniones de los
otros en la construcción del auto concepto del individuo,
asumiéndose que el desarrollo psicológico del ser
humano se da a lo largo de toda su existencia y que es
durante la infancia que el individuo agrega las
principales adquisiciones concernientes a la
organización de la personalidad que lo instrumentalizarán para la vida. Tales adquisiciones son resultado
de los cambios constantes del individuo con su entorno.
En ese sentido, muchos estudiosos afirman que la
interacción entre el niño y sus primeros cuidadores,
posibilita su madurez y la inclusión de otras personas
para interacción. De acuerdo con autores como Berger
y Berger (1990), la experiencia social comienza con el
nacimiento, pues es a partir de ese momento que el
niño desarrolla una interacción entre el su cuerpo, el
ambiente físico y las otras personas con las cuales ella
convive. Así, los motivos fisiológicos y subjetivos del
niño son involucrados y modificados por la experiencia
social a la que es sometido por aquellos que lo cercan
y que actúan como mediadores del proceso.
Dentro de esa perspectiva, Jacob (2001) afirma que
el niño experimenta y registra un abanico de vivencias
afectivas que apuntan una serie de elementos para la
formación de su concepción a respecto de sus
capacidades, habilidades e importancia para las
personas que conviven con él. Así, la percepción del
niño es mediada por el ambiente que, al mismo tiempo,
señala como la percibe. Esa relación continuada de
percepciones se refleja, según la autora, en la imagen
que el niño hace de si mismo y en la construcción de
su identidad, constituyéndose como la principal fuente
de cambios en el desarrollo. En ese sentido, las
Auto concepto y rasgos de personalidad: un estudio correlacional
relaciones familiares asumen un papel relevante, pues
los padres son el punto de referencia del niño y es en
la interacción con ellos que el niño pasa a reconocer lo
que se espera de él, construyendo un auto concepto
familiar positivo o negativo, dependiendo de la manera
como tales relaciones son percibidas (Allport, 1966;
Oliveira, 2000).
Mientras el niño crece sus intercambios y
solicitaciones en el ambiente van siendo cada vez más
diferenciados y diversificados y su universo de relaciones
y personas de otros contextos se tornan fuente de
intercambios afectivos y de refuerzo. Así que el ingreso
en la escuela coloca al niño en contacto con nuevos
contenidos y con otras personas, ampliando las demandas a las cuales estará sujeto. En ese ambiente, hasta
entonces desconocido y de nuevas vivencias interactivas,
los niños pasan a experimentar nuevas exigencias y a
ser evaluados en relación a sus comportamientos y
aprendizajes.
La escuela se presenta, entonces, como una de las
más importantes instituciones sociales para hacer la
mediación entre el individuo y la sociedad y el pasaje de
un nivel de escolaridad para otro, como también en todas las transiciones entre distintos contextos presupone
para el estudiante nuevos desafíos cognitivos y sociales.
Así, la institución escolar interviene no sólo en la
transmisión del saber científico organizado culturalmente,
como influencia en todos los aspectos relativos a los
procesos de socialización y individuación del estudiante,
sobre todo en lo que se refiere al auto concepto, a la
auto estima y a la construcción de la autonomía del
alumno (Cubero & Moreno, 1995).
En ese contexto académico, el desempeño del
estudiante en las actividades propuestas por la escuela
es interpretado como un prenuncio de sus capacidades
y de su potencial productivo, siendo el auto concepto
escolar definido, de acuerdo con Simões (1997), como
el universo de representaciones que el alumno tiene de
sus habilidades, de sus realizaciones escolares, bien como
las evaluaciones que él hace de esas mismas capacidades
y realizaciones. Las vivencias de ese proceso son
percibidas de forma positiva o negativa. Mientras el
alumno es solicitado a ejecutar las tareas propuestas y
se siente capaz y habilitado para eso, desarrolla el sentido
de realización y construye una visión más positiva de si
mismo, lo que influencia su motivación y sus actitudes
en relación al estudio (Costa, 2001; Jacob, 2001).
Sisto y Martinelli (2004) cuando han construido la
17
Escala de Auto Conceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ)
han defendido que la escuela ocupa un papel relevante
en la vida afectiva del niño y del adolescente. Además
que ese tipo de información se ha constituido en un instrumento importante para la toma de decisiones sobre
las personas que presenten algún problema de
adaptación. Por fin, consideraron también la
preocupación creciente de los educadores con su papel
constructivo y la necesidad de instrumentos de
evaluación pautados en principios científicos,
En oposición a las necesidades educacionales,
referidas anteriormente, y a la preocupación de que
tanto la comprensión del auto concepto de los
estudiantes, cuanto sus expectativas de suceso y
percepciones del contexto académico sean pautadas
en una evaluación válida y confiable, se encuentra,
además, la dificultad de evaluación del auto concepto
en el Brasil. Tanta dificultad se justifica, segundo Sisto
y Martinelli (2004), por un lado, en función de buena
parte de los instrumentos estar publicada en tesinas,
tesis de doctorado y artículos, no siempre de fácil
acceso y, por otro lado, por el hecho de que los estudios
sobre evidencias de validez y los dados de precisión
ni siempre son conocidos o presentan informaciones
sobre las normas para compararse y evaluar a las
personas.
Construida con la finalidad de evaluar con mayor
precisión los diferentes niveles de auto concepto en distintos contextos de la vida de los estudiantes, cuales sean,
personal, familiar, social y escolar, la Escala de Auto
Conceito Infanto-Juvenil obtuvo, por medio del análisis
de los componentes principales, evidencia de validez de
constructo para los cuatro contextos. De acuerdo con
sus autores, las correlaciones ítem-total por escala
indicaron buena consistencia, así como los alfas de
Cronbach, que variaron de 0,68 la 0,82, a pesar de las
escalas tener de 4 a 6 ítems. Además de eso, la
consistencia temporal (teste-reteste) por escala ha variado de 0,78 a 0,88 y el dato global sugirió buena
estabilidad temporal ítem a ítem.
Solamente un estudio que da evidencia de validez
para la Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil consta
en la literatura brasilera (Carneiro, Martinelli & Sisto,
2003). El objetivo de los investigadores era verificar se
habría diferencias significativas entre los niveles de
dificultad de aprendizaje en la escrita y el auto concepto
en sus múltiplas manifestaciones. Los resultados
mostraron que la dificultad de aprendizaje en la escrita
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 15-25
18
Débora C. Fernandes, Daniel Bartholomeu, Fabián J. Marín Rueda, Adriana C. B. Suehiro e
estuvo significativamente relacionada con el auto
concepto general y escolar, indicando que conforme ha
aumentado el nivel de dificultad han disminuido también
los puntajes en esas escalas.
Queda claro, de ese modo, que pocos estudios con
esa escala se han detenido a analizar las relaciones
que los diferentes tipos de auto concepto establecen
con otras variables. Así que, considerando las
características ya mencionadas para cada tipo de auto
concepto es posible plantear la hipótesis de que haya
relaciones con variables como emociones o mismo con
rasgos de personalidad. En otros términos, nuevas
pesquisas deben buscar más evidencias de validez para
la Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil. Es en
ese contexto que este estudio se insiere buscando
contribuir para la implementación de ese instrumento,
teniendo como marco los rasgos de personalidad.
Añádase a eso el hecho de que suelen hacer
referencias a características de los diferentes tipos de
auto concepto en las descripciones de las conductas
que involucran los rasgos de personalidad.
Eso queda todavía más evidente al considerarse los
rasgos de personalidad analizados por la Escala de
Rasgos de Personalidad para Niños (ETPC), instrumento utilizado en este estudio. Esa escala fue construida
basada en los presupuestos de Eysenck y Eysenck
(1987), estando configurada para niños brasileños de 5
hasta 10 años, y que evalúa cuatro factores con validez
de constructo y de contenido, a saber, neuroticismo,
psicoticismo, extroversión y sociabilidad. Además de esas
evidencias, cinco otros estudios fueron realizados,
ofreciendo nuevas evidencias de validez del instrumento. Así que, tres de esos estudios se relacionan a la
situación de enseñanza-aprendizaje y los otros dos a otras
características psicológicas que estarían relacionadas a
rasgos de personalidad. Los estudios de precisión dieron
buenos índices. El análisis de consistencia interna ha
resultado en estimativas variando de 0,80-0,91; ya por
la técnica de dos mitades de Spearman-Brown los
índices se han ubicado entre 0,79 y 0,92; finalmente, los
coeficientes de correlación de Pearson en la situación
de teste-reteste, fueron de 0,80 a 0,92 (Sisto & cols.
2003).
Para Eysenck y Eysenck (1987) ciertas tendencias
son percibidas en los procesos de modificaciones y
reorganizaciones de la personalidad que diferencian un
sujeto del otro. De esa forma, cada persona debe manejar
sus motivos y las influencias ambientales, que ni siempre
Fermino F. Sisto
son favorables, para reajustar su conducta. Su teoría
considera la personalidad como una jerarquía de rasgos,
definiéndolos como tendencias duraderas, modos de
comportarse en una diversidad de situaciones.
Consecuentemente, la tendencia de una persona a ser
impulsiva, agitada, irascible, impetuosa y impaciente
podría ser consecuencia de la tendencia más básica de
ser excitable (Sisto, Oliveira, Oliveira, Bartholomeu,
Oliveira y Costa, 2004).
Vale destacar que la perspectiva teórica de
personalidad adoptada comprende ese fenómeno como
un sistema cognitivo, afectivo y comportamental
integrados, que interactúan con características innatas,
adquiridas, orgánicas y sociales, recibiendo
contribuciones de funciones psicológicas y sociales
(Sisto, Bueno & Rueda, 2003; Sisto y cols, 2004). Ahora
bien, teniendo en vista el aspecto interactivo del cual
la configuración de los rasgos de personalidad depende, se puede pensar que ciertas características
presentan intersecciones con los tipos de auto concepto
anteriormente definidos, una vez que eles también son
construidos en base a la interacción de la persona con
su entorno y acompañados por evaluaciones que los
individuos hacen de sus experiencias y representaciones. En ese sentido, el presente estudio tuvo como
objetivo investigar las relaciones que pueden
establecerse entre rasgos de personalidad y auto
concepto. Ese tipo de información sería otro tipo de
evidencia de validez para la Escala de Autoconceito
Infanto-Juvenil. De una manera más esquemática,
se presenta una breve descripción de cada uno de los
rasgos de personalidad de acuerdo con Sisto y cols.
(2003), al mismo tiempo en que a las hipótesis
aventadas son puestas.
El rasgo extroversión caracteriza a la persona
generalmente impulsiva, despreocupada, agresiva, optimista, espontánea y abierta a relaciones
interpersonales, o sea, sociable. Esas personas poseen
muchos amigos, les gusta conversar y no les gusta leer
o estudiar solas. Así, se tiene la expectativa de que el
niño con alto puntaje en ese rasgo presente auto
concepto familiar, social, escolar y personal elevados.
En oposición, se espera que una alto puntaje en
neuroticismo denote un bajo nivel en todos los tipos
de auto concepto, una vez que individuos con
predominancia de neuroticismo pueden ser retratados
con características de ansiedad, depresión, sentimiento
de culpa, baja auto-estima, timidez, tristeza, temor,
Auto concepto y rasgos de personalidad: un estudio correlacional
nerviosismo e inquietud. Se resalta también que la principal característica de un niño con alto puntaje en
neuroticismo es una constante preocupación, con
fuerte instabilidad emocional.
El psicoticismo fue retratado como una
dimensión de la personalidad normal. Entretanto,
altas puntajes indican una cierta despreocupación
en relación a los otros y soledad; además de una
tendencia a la crueldad y a la poca sensibilidad. Niños
con ese puntaje se muestran hostiles, inclusive con
los más íntimos; desprecian el peligro y sienten
placer en perturbar a los otros, dejándolos de mal
humor. Presentan pocos indicios de socialización y
de sentimientos de simpatía. Por eso hay la
expectativa de que una alto puntaje en ese rasgo
evidencie una disminución en los niveles de auto
concepto familiar, social y escolar, como también un
elevado auto concepto personal. Al lado de eso, se
espera que el niño con alto puntaje en la escala
sociabilidad presente niveles altos en todos los tipos de auto concepto, teniendo en vista su tendencia
a comportarse dentro de reglas y conveniencias
sociales.
MÉTODO
Participantes
Han participado de esta investigación 389 sujetos,
con promedio de edad de 9 años (DP=0,78), variando
de 8 a 10 años. Con relación al sexo, 49,1 % eran varones
y 50,9 % niñas, siendo todos provenientes de escuelas
públicas y particulares de una ciudad del interior de São
Paulo-Brasil.
19
atribuido 1 punto para las respuestas afirmativas y cero
para las negativas a cada ítem, siendo que el escore
bruto es compuesto por la suma de los puntajes en los
ítems de cada sub-escala.
B - Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EACIJ) (Sisto & Martinelli, 2004)
Consiste en una escala compuesta por 20 cuestiones
al todo que evalúan el auto concepto en las cuatro
dimensiones, personal, escolar, familiar y social. En
relación al auto concepto personal, el instrumento dispone
de cinco cuestiones, el escolar otras cinco, cuatro para
evaluar el auto concepto familiar, y finalmente seis que
informan sobre el auto concepto social. Las respuestas
son dadas en escala Likert de 3 puntos (siempre, a veces
y nunca) que deben ser señaladas con una “X” de
acuerdo con la intensidad que la frase caracteriza a la
persona que responde. Ese test posee también normas
para personas de ocho a 16 años, disponiendo de un
cuadro que permite trazar un perfil del auto concepto de
los sujetos.
El instrumento es auto explicativo, no necesitando
muchas instrucciones para la aplicación. También, el
manual hace algunos apuntes en el sentido de dejar a
los individuos lo mejor acomodados posible para
responder al test, así como también da algunas
instrucciones iniciales que fueron relatadas a los sujetos
en la situación de test.
Para las sub-escalas del auto concepto personal y
social, se atribuye punto para las respuestas siempre,
punto para a veces y para nunca. En las sub-escalas
que informan sobre el auto concepto escolar y familiar
los puntajes son invertidas.
RESULTADOS
Instrumento
A - Escala de Traços de Personalidade para
crianças (Sisto, 2004)
Se caracteriza por un cuestionario con 30 ítems,
que evalúa los rasgos de neuroticismo, psicoticismo,
extroversión y sociabilidad. Su utilización debe ser
hecha en niños de 5 hasta 10 años de edad, siendo que
la escala de neuroticismo contiene 7 ítems; la de
extroversión, 10 ítems; la de psicoticismo, 11 ítems; y
la de sociabilidad, 6 ítems. El niño debe responder si o
no a cada pregunta y la evaluación de cada rasgo fue
hecha de acuerdo con las indicaciones del manual. Es
Los auto conceptos personal y familiar también
presentaron promedios considerablemente elevados y
muy próximos (5,14 y 4,82 respectivamente). En
relación al auto concepto familiar, fue quien presentó
el menor promedio (2,91). Sin embargo, se debe
observar que, considerando la variación posible para
las sub-escalas en cuestión, con excepción del auto
concepto personal, en los otros tres las personas han
presentado promedios abajo de los respectivos puntos
medios en cada tipo de auto concepto, indicando una
disminución de ellos.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 15-25
20
Débora C. Fernandes, Daniel Bartholomeu, Fabián J. Marín Rueda, Adriana C. B. Suehiro e
Para verificar hasta que punto los diferentes tipos de
auto concepto como también los rasgos de personalidad
diferían en razón del sexo de los individuos, se ha utilizado la prueba t de Student. Los resultados de ese análisis
se encuentran en la Tabla 1.
Tabla 1 - Valores de t y p en relación al sexo (N=389)
t
p
Auto concepto personal
3,786
0,000
Auto concepto escolar
-2,296
0,022
Auto concepto familiar
1,168
0,244
Auto concepto social
3,190
0,002
Psicoticismo
-4,240
0,000
Extroversión
0,320
0,749
Neuroticismo
5,492
0,000
Sociabilidad
3,831
0,000
Se pudo observar que el rasgo extroversión no
diferenció el sexo. De la misma forma, con relación al
auto concepto, solamente el auto concepto familiar no
enseñó diferencia significativa para el sexo.
En relación a las tendencias, fue verificado que, para
los auto conceptos personal y social, el sexo masculino
tuvo promedios más altos en comparación al femenino.
Ese hecho sugiere que los varones suelen percibirse
mejor, con menos preocupaciones, miedos y ansiedades
que las niñas. Además de eso, se ven mejores intelectualmente, con sentimientos de superioridad en relación
a sus amigos, poseyendo más ganas de ayudar a los
otros y buscando más ayuda cuando necesitan en
comparación a las niñas.
En compensación, las niñas han presentado más alto
auto concepto escolar, siendo sugestivo que se ven bien
intelectualmente, sintiéndose como se tuvieran cierto
liderazgo y fueran más aceptadas por los colegas de
escuela. Se creen también más divertidas y bondadosas
en relación a los varones.
Asimismo, en lo que se refiere a los rasgos de
personalidad se ha observado que el sexo masculino
forneció promedios más altos en neuroticismo y
sociabilidad. Ya el sexo femenino ha mostrado más
psicoticismo cuando comparadas a los varones.
Niños que presentaron el rasgo de neuroticismo
pueden ser descriptos como ansiosos, depresivos, con
sentimientos de culpa, baja auto-estima, timidez,
melancolía, tristeza, temor, nerviosismo, inquietud,
Fermino F. Sisto
oscilaciones de humor y emotividad. Esas fueron las
características más evidenciadas en los varones de la
muestra estudiada. Además de eso, ellos demostraron
ser más adecuados y ajustados a las reglas sociales
que las niñas, de acuerdo con sus respuestas a la subescala de sociabilidad.
Por otro lado, las niñas fueron más caracterizadas
por el rasgo psicoticismo cuando comparadas a los
varones y pueden ser descriptas como siendo duras, sin
preocupaciones con los otros, solitarias, anti-sociales y
creadoras de problemas; crueles, deshumanas,
insensibles y hostiles. Sienten también placer en perturbar a los otros y desprecian el peligro.
Considerando que hubo diferencia significativa en
relación al sexo en casi todas las variables en estudio,
se optó por correlacionar las medidas de los diferentes
tipos de auto concepto con las medidas de los rasgos de
personalidad separándolos por sexo. Los valores de r y
p obtenidos por la prueba de correlación de Pearson
para el sexo masculino y femenino, están en la Tabla 2.
En relación al sexo masculino fueron evidenciadas
correlaciones significativas y positivas entre el auto concepto
personal y psicoticismo y neuroticismo bien como negativa
con el rasgo sociabilidad. Eses datos pueden ser
interpretados como que al aumento del auto concepto
personal, le corresponde un aumento en los rasgos de
psicoticismo y neuroticismo y disminución de la sociabilidad.
Cuanto al auto concepto escolar, la única correlación
encontrada fue con el rasgo de extroversión y para los
niños. El coeficiente fue positivo y significativo, indicando
que el aumento del auto concepto escolar es acompañado
de aumento de la extroversión.
Asimismo, fueron halladas correlaciones positivas
entre el auto concepto familiar y los rasgos de
extroversión y sociabilidad, bien como negativo con
psicoticismo. Eso es indicativo de que el aumento del
auto concepto familiar indica también el aumento de
intensidad en los rasgos de extroversión y sociabilidad
como también disminución en el psicoticismo.
Finalmente, en lo que atañe al sexo masculino, el auto
concepto social se correlacionó positivamente con
neuroticismo y psicoticismo y negativamente con
extroversión. En otros términos, las personas con auto
concepto social alto han mostrado más intensidad en los
rasgos neuroticismo y psicoticismo y menos en el rasgo
extroversión.
Diferentemente del sexo masculino, el sexo femenino
no presentó correlaciones entre auto concepto escolar
Auto concepto y rasgos de personalidad: un estudio correlacional
21
Tabla 2 - Coeficientes de correlación de Pearson (r) y niveles de significación (p) para las diferentes medidas
del auto concepto y rasgos de personalidad en relación al sexo (N=389).
Tipos de auto concepto
Auto concepto personal r
p
Auto concepto escolar r
p
Auto concepto familiar r
p
Auto concepto social
r
p
Auto concepto personal r
p
Auto concepto escolar r
p
Auto concepto familiar r
p
Auto concepto social
r
p
Rasgos de personalidad
Psicoticismo Extroversión Neuroticismo Sociabilidad
Sexo masculino
0,22
-0,09
0,34
-0,17
0,002
0,224
0,000
0,016
0,08
0,15
-0,04
-0,02
0,303
0,039
0,633
0,772
-0,26
0,25
-0,1
0,34
0,000
0,001
0,139
0,000
0,28
-0,17
0,28
-0,08
0,000
0,020
0,000
0,298
Sexo Femenino
0,09
-0,12
0,27
-0,08
0,219
0,084
0,000
0,248
-0,01
0,11
-0,01
0,05
0,879
0,137
0,864
0,481
-0,26
0,12
-0,21
0,27
0,000
0,104
0,003
0,000
0,18
-0,19
0,07
-0,05
0,013
0,009
0,364
0,471
y rasgos de personalidad. En contraposición, fue
verificada una correlación positiva y significativa entre
auto concepto personal y neuroticismo, lo que indica que
cuanto más alto el auto concepto personal esas niñas
poseen, más alta también es la intensidad del rasgo
neuroticismo.
En lo que se refiere al auto concepto familiar se
verificó correlaciones negativas con psicoticismo y
neuroticismo, como también positiva con sociabilidad.
Esos datos pueden ser interpretados como al aumento
del auto concepto familiar le corresponde una disminución
de los rasgos psicoticismo y neuroticismo y aumento de
la sociabilidad.
Por fin, el auto concepto social mostró correlación
positiva con psicoticismo y negativa con extroversión.
De ese modo, altos índices de auto concepto social en
las niñas están asociados a mayor incidencia del rasgo
psicoticismo y menor incidencia del rasgo extroversión.
Con vistas a verificar hasta que punto los grupos
extremos en relación a los auto conceptos se diferenciaban
en relación a los rasgos de personalidad, esos grupos
fueron comparados por medio de la prueba t de Student,
nivel se significación 0,05, en relación a los cuatro tipos
de auto concepto. Para componer los grupos extremos
fueron seleccionados el 25% de los sujetos con los puntajes
más altas y el 25% de los sujetos con puntajes más bajas.
Se mantuvo también el análisis separando los participantes por el sexo. Los resultados para el auto concepto
personal se encuentran en la Tabla 3.
Tabla 3 – Valores de t y p en relación a los grupos extremos
de auto concepto personal para cada sexo (N=239)
Rasgos de personalidad
t
p
Psicoticismo
-3,042
0,003
Extroversión
1,489
0,139
Neuroticismo
-3,888
0,000
Sociabilidad
1,646
0,103
Psicoticismo
-2,111
0,037
Extroversión
1,303
0,195
Neuroticismo
-4,207
0,000
Sociabilidad
1,701
0,091
Sexo Masculino
Sexo Femenino
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 15-25
22
Débora C. Fernandes, Daniel Bartholomeu, Fabián J. Marín Rueda, Adriana C. B. Suehiro e
Los grupos extremos de auto concepto personal
para los varones enseñaron diferencias significativas
en los rasgos psicoticismo y neuroticismo. Cuanto a
las niñas, se han constatado diferencias significativas
en los rasgos psicoticismo y neuroticismo, no
habiendo diferencias en relación a los varones. En
ambos sexos, el grupo que presentó un auto
concepto personal mayor, presentó también puntajes
más altos en psicoticismo y neuroticismo. En la Tabla
4 están los resultados para el auto concepto escolar
y los rasgos de personalidad. Como puede ser
observado, no hubo diferencias estadísticamente
significativas entre los grupos extremos estudiados
en ninguno de los cuatro tipos de rasgos de
personalidad para los sexos
Tabla 4 – Valores de t y p en relación a los grupos extremos
de auto concepto escolar para cada sexo (N=237)
Rasgos de personalidad
t
p
Psicoticismo
-0,522
0,603
Extroversión
-1,810
0,073
Neuroticismo
-0,025
0,980
Sociabilidad
0,361
0,719
Psicoticismo
0,153
0,879
Extroversión
-0,940
0,349
Neuroticismo
-0,375
0,708
Sociabilidad
-1,064
0,289
Sexo Masculino
Sexo Femenino
Los grupos extremos de auto concepto familiar
para los varones han sido hallados diferencias
significativas en los rasgos psicoticismo, extroversión y sociabilidad. Cuanto a las niñas, se
verificaron diferencias significativas en los rasgos
psicoticismo, neuroticismo y sociabilidad, o sea, las
niñas no presentaron diferencias cuanto al rasgo
extroversión, así como los varones en relación al
rasgo neuroticismo.
En los varones, el grupo con un auto concepto
familiar elevado ha tenido también un promedio más
alto en los rasgos extroversión y sociabilidad,
mientras que los varones con un auto concepto
familiar más bajo mostraron más alto puntaje en el
rasgo psicoticismo. Cuanto a las niñas, las que
presentaron un auto concepto familiar más bajo,
Fermino F. Sisto
tuvieron puntajes más altos en los rasgos
psicoticismo y neuroticismo, ya las que mostraron
un auto concepto familiar más elevado obtuvieron
un promedio más alto en el rasgo sociabilidad.
Tabla 5 – Valores de t y p en relación a los grupos extremos
de auto concepto familiar para cada sexo (N=296).
Rasgos de personalidad
t
p
Psicoticismo
3,862
0,000
Extroversión
-3,677
0,000
Neuroticismo
1,155
0,250
Sociabilidad
-4,764
0,000
Psicoticismo
2,625
0,010
Extroversión
-1,024
0,307
Neuroticismo
2,996
0,003
Sociabilidad
-3,490
0,001
Sexo Masculino
Sexo Femenino
En el caso del auto concepto social hubo diferencia significativa en relación al rasgo psicoticismo en
ambos sexos, siendo que el grupo de niños con un
auto concepto social más elevado han tenido también
una frecuencia más alta en ese rasgo. Para las niñas,
ese fue el único rasgo estudiado que ha apuntado diferencias entre los grupos. A su vez, los varones han
indicado también en el rasgo neuroticismo diferencias, y aquellos con niveles de auto concepto social más
elevado fueron los que también han tenido un
promedio más alto en ese rasgo.
Tabla 6 – Valores de t y p en relación a los grupos
extremos de auto concepto social para cada sexo (N=264).
Rasgos de personalidad
t
p
Psicoticismo
-3,072
0,003
Extroversión
1,924
0,057
Neuroticismo
-3,344
0,001
Sociabilidad
0,499
0,619
Psicoticismo
-3,293
0,001
Extroversión
1,750
0,082
Neuroticismo
-1,365
0,174
Sociabilidad
1,713
0,089
Sexo Masculino
Sexo Femenino
Auto concepto y rasgos de personalidad: un estudio correlacional
DISCUSIÓN
Este estudio fue propuesto con base en el hecho de
ser bastante nítida la referencia de características de
los diferentes tipos de auto concepto en las descripciones
de las conductas que involucran los rasgos de personalidad. En eses términos, algunas hipótesis fueron
planteadas para investigarse a esas posibles asociaciones.
Sin embargo, desgraciadamente, no fueron hallados
estudios con los instrumentos que están en análisis, así
que se ha quedado imposibilitada la comparación con
los datos de investigación publicados.
Por los análisis hechos se ha verificado que los auto
conceptos personal y social fueron más altos en los niños
del sexo masculino. Por otro lado, las niñas mostraron
más auto concepto escolar. Los varones enseñaron aún
tener una incidencia más alta en los rasgos de
neuroticismo y sociabilidad, mientras las niñas indicaron,
aparentemente, una concentración más alta del rasgo
psicoticismo.
Dentro de las hipótesis estudiadas, la primera trataba
del rasgo extroversión, sobre el cual se esperaba
correlación positiva con todos los tipos de auto concepto,
teniéndose en cuenta las características de espontaneidad, apertura a relaciones, agresividad, optimismo
entre otras, comunes a esas personas. Así, esos niños,
por ser altamente sociables podrían favorecer a una
buena relación con los otros y tener una percepción de
si mismo en todos los contextos del auto concepto.
Esa hipótesis fue comprobada parcialmente, una vez
que solamente los auto conceptos escolar y familiar
mantuvieron correlaciones positivas con el rasgo en
cuestión para los varones, indicando que se ven bien
intelectualmente, sintiéndose como poseedores de cierto
liderazgo y más aceptados por los compañeros de
escuela. Además de eso, se perciben más adecuados
en sus familias. Pero si en una de las variables no está
bien, en la otra tampoco. Vale destacar que tanto los
varones como las niñas extrovertidos también mostraron
bajas puntuaciones en auto concepto social, haciendo
que no se vean tan bien intelectualmente, con sentimientos
de inferioridad en relación a sus amigos, no presentando
ganas de ayudar a los otros y no solicitando ayuda
cuando necesitan. Teniéndose en consideración las
definiciones de este rasgo, ese dato suena extraño, una
vez que a pesar de esos niños sentirse más optimistas,
sociables y abiertos a relaciones interpersonales, no se
23
perciben de esa forma. Ese hecho invita a nuevas
investigaciones. Por el análisis de grupos extremos de
los diferentes tipos de auto concepto se observó que
solamente los grupos de auto concepto familiar en los
varones diferenciaron el rasgo de extroversión.
Era esperado también que el rasgo neuroticismo se
correlacionara negativamente con todos los tipos de auto
concepto. A partir de los análisis hechos, solamente el
auto concepto familiar para las niñas confirmó esa
hipótesis. Así, características evidentes de ansiedad,
depresión, sentimiento de culpa, timidez, tristeza,
nerviosismo e inquietud tienden a rebajar el auto concepto
familiar de las niñas, haciendo que se vean adecuadas
al ambiente familiar. No obstante, no se sabe cual de
esas características puede influenciar más en esa
percepción negativa o se es el conjunto que provocaría
esas percepciones. Fueron verificadas también
correlaciones positivas con el auto concepto social para
los varones, de forma que el aumento de esas características nombradas, hace con que se vean bien
intelectualmente, con sentimientos de superioridad sobre
los amigos, teniendo ganas de ayudar a los otros y
solicitando ayuda cuando necesitan.
Además, el auto concepto personal se ha asociado a
ese rasgo en ambos sexos, indicando una mejor
percepción de si mismo, percibiéndose bien consigo
mismo, sin preocupaciones, miedos y ansiedades. Ese
dato es intrigante, pues, aparentemente, hay una
disonancia entre lo que esos niños realmente sienten y
como se perciben.
El análisis de grupos extremos ha confirmado algunas
de las asociaciones evidenciadas. El rasgo de
neuroticismo ha diferenciado los grupos de auto
concepto social para el sexo masculino y personal para
ambos sexos. Además de eso, los grupos de auto
concepto familiar en el sexo femenino también se han
distinguido.
Niños con rasgo de psicoticismo tienen características de despreocupación con los otros, soledad, tendencia
a la crueldad, falta de sensibilidad, hostilidad, depreciación
del peligro y placer en perturbar a los demás con pocos
indicios de socialización y empatia. A partir de eso, era
esperado que se presentasen asociaciones negativas con
auto concepto familiar, social y escolar bien como positivas con auto concepto personal. En los varones, ese
rasgo se ha asociado positivamente con auto concepto
personal, confirmando en parte la hipótesis planteada.
Así, esos niños tienderon a auto percibirse bien, sin
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 15-25
24
Débora C. Fernandes, Daniel Bartholomeu, Fabián J. Marín Rueda, Adriana C. B. Suehiro e
Fermino F. Sisto
preocupaciones, miedos y ansiedades. Asimismo, fueron
evidenciadas correlaciones positivas con auto concepto
social y negativas con familiar en ambos sexos.
Esos datos son sugestivos de que esos niños no se
perciben como adecuadas a su ambiente familiar, bien
como se perciben mejores intelectualmente, con
sentimientos de superioridad en relación a sus amigos,
teniendo más ganas de ayudar a los otros y solicitando
ayuda cuando necesitan y confirmando en parte las
hipótesis iniciales para ese rasgo. De esas características, una especialmente es paradoxal que es el hecho
de esos niños se perciben con ganas de ayudar a los
otros, cuando en verdad, las características de ese rasgo
afirman una hostilidad, falta de empatia y pocos indicios
de socialización. Se puede sugerir que esos niños no
ven de esa forma, o tienden a deformar la realidad a su
favor como también fue sugerido por la investigación
realizada por Sisto, y cols. (2003). Además de eso, los
pocos indicios de socialización también fueron evidenciados solamente en los varones en otra pesquisa
realizada por Sisto y cols. (2004).
El análisis de grupos extremos indicó diferencias
significativas para los grupos formados en el auto
concepto social y personal para los dos sexos. Más aún,
los grupos del auto concepto familiar también fueron diferenciados por ese rasgo, lo que confirma los resultados
encontrados.
Finalmente, se ha planteado que altas puntuaciones
en sociabilidad debiesen evidenciar correlaciones positivas con todos los tipos de auto concepto, pues que la
tendencia a comportarse por las reglas sociales ayudaría
las buenas relaciones y mejoraría la percepción de esos
niños en esos hechos. Al total, la única correlación positiva encontrada, en los dos sexos, fue con el auto
concepto familiar. Así, cuanto más se ve respeto a las
normas sociales en esos individuos, más tienden a
percibirse adecuados a sus familias, lo que, de cierta
forma, era esperado y confirma la hipótesis en parte.
Todavía, en el sexo masculino, el aumento de esa rigidez
a las reglas sociales se asoció a una percepción negativa de si mismo, caracterizada por preocupación, miedos
y ansiedades, característicos de un bajo auto concepto
personal. Los grupos extremos de auto concepto familiar
confirmaron en parte eses datos.
Se puede, finalmente, sugerir que nuevos estudios
investiguen más esas diferencias de sexo encontradas
en las variables apuntadas. Añádase a eso que los
aspectos emocionales asociados a los rasgos de
personalidad y también al auto concepto pueden
favorecer una mejor comprensión de ciertas relaciones
encontradas, ya que las dos variables envuelven
aspectos de esa naturaleza, de forma que vale la pena
que nuevos trabajos profundicen más en esas
cuestiones.
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Recebido em: 08/06/05
Revisado em: 29/06/05
Aprovado em: 30/06/05
Endereço para correspondência:
Débora Cecílio Fernandes: Calle Fernando de la Peña, 18 4o. E37005 – Salamanca – España – e-mail:[email protected]
Daniel Bartholomeu: Rua Alexandra Rodrigues Barbosa, 45 – CEP: 13251-900 – Itatiba - SP – e-mail: [email protected]
Fabián Javier Marín Rueda: Rua Alexandra Rodrigues Barbosa, 45 – CEP: 13251-900 – Itatiba - SP –
e-mail: [email protected]
Adriana Cristina Boulhoça Suehiro: Rua Alexandra Rodrigues Barbosa, 45 – CEP: 13251-900 – Itatiba - SP – e-mail: [email protected]
Fermino Fernandes Sisto: Rua Alexandra Rodrigues Barbosa, 45 – CEP: 13251-900 – Itatiba - SP –
e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 15-25
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1 27-35
CRIATIVIDADE NO TRABALHO DOCENTE SEGUNDO PROFESSORES DE HISTÓRIA:
LIMITES E POSSIBILIDADES
CRIATIVIDADE NO TRABALHO DOCENTE
Maria de Fátima Magalhães Mariani1
Eunice Maria Lima Soriano de Alencar2
Resumo
Foi objetivo do presente estudo investigar componentes da organização do trabalho pedagógico e elementos de caráter pessoal/individual que
agem como inibidores e facilitadores da expressão da criatividade do professor de História. Participaram do estudo 16 professores de História de 5ª
a 8ª séries do Ensino Fundamental de cinco escolas públicas e cinco escolas particulares de Brasília, Distrito Federal. Utilizou-se a entrevista semiestruturada na coleta dos dados. Realizou-se análise de conteúdo, elaborando-se categorias que abrangeram o conteúdo das respostas obtidas. Vários
aspectos foram identificados como estímulos e limites à criatividade no trabalho docente. Liberdade e a paixão pelo trabalho foram os facilitadores
mais enfatizados. Problemas no relacionamento professor-aluno foi um dos limites mais destacado. Este estudo contribui para desvelar aspectos que
impedem a expressão criativa do professor e outros relativos a um ambiente pedagógico favorável à criatividade docente.
Palavras-chave: Criatividade; Trabalho Pedagógico; Estímulos e Limites à Criatividade.
CREATIVITY IN TEACHING ACCORDING TO TEACHERS OF HISTORY: LIMITS AND POSSIBILITIES
Abstract
This study investigated pedagogical work organization’s components and personal/individual’s elements which act as facilitating or inhibiting
factors to the History teacher’s creativity expression. The tarticipants were 16 5th to 8th grade History teachers from 5 public and 5 private schools
in Brasília, Federal District. Data were obtained through semi-structured interviews. A content analysis was used to analyze the data. Several factors
that promote and limit creativity in teaching were identified. Freedom and passionate love for the work were the most outstanding facilitators.
Dificulties in the teacher-student relationship were pointed as the most frequent constraint. This study contributes to uncovering some aspects
which hinder teacher´s creative expression and others which characterize a favorable environment to the creativity expression of teachers.
Keywords: Creativity; Pedagogical Work; Incentives and Limits to Creativity.
INTRODUÇÃO
A
s pesquisas sobre criatividade no contexto educacional (Alencar, 1991, 1994, 1996, 2002; Necka, 1994;
Renzulli, 1992) têm apontado o professor, elemento principal da organização do trabalho pedagógico, como um
dos componentes indispensáveis para incentivar a
criatividade nos seus alunos. Entretanto, a criatividade
na escola é freada por inúmeras barreiras de natureza
emocional, social e cultural. Ademais, o sistema de trabalho pedagógico apresenta elementos que contribuem
1
2
para inibir as capacidades criativas do aluno. Os fatores
favoráveis ao desenvolvimento do potencial criativo são
reconhecidos como necessários por parte dos professores, mas o cotidiano escolar é cheio de limitações e dificuldades que emperram o processo de construção de
um ambiente favorável à criatividade.
Perrenoud (1995) aponta alguns fatores que induzem
um sistema de trabalho pedagógico pouco favorável à
criatividade. Um desses fatores é o peso das tarefas
Doutoranda em Sociologia na Universidade de Brasília e docente de História da FEDF.
Ph.D. em Psicologia pela Universidade de Purdue, EUA e docente da Universidade Católica de Brasília.
28
fechadas, dos exercícios e das rotinas marcadas por uma
relação utilitarista do trabalho.
Nesse sentido, Perrenoud (1995) considera um fazer
escolar cheio de limitações e com pouco grau de liberdade. As recompensas ou sanções externas, tais como, notas,
competição, promoção, punições, tornam-se
condicionantes do trabalho escolar. Um ambiente pedagógico desse tipo não permite que professores e alunos
manifestem “seus domínios de saberes e saber-fazer”.
Conforme assinala Alencar (1995), o que vai indicar
se um indivíduo é mais criativo que outro é a qualidade
do produto final do processo criativo, levando em
consideração uma série de fatores, internos e externos,
que tiveram em jogo durante este processo.
Tanto Alencar (1995) como Cerna (1999) enfatizam
que criatividade é algo que todos nós temos em diferentes medidas e que pode ser desenvolvida em diferentes
níveis. Desse modo, entende-se que todas as pessoas
possuem potencialidades criativas as quais podem ser
desenvolvidas e aprimoradas.
Observa-se que, no senso comum, predominam idéias errôneas a respeito do termo criatividade. Estas idéias acentuam os preconceitos e diferenças no contexto
social, sendo comum a predominância de rótulos personificados na família, na escola, no ambiente de trabalho,
tais como: “pessoas criativas e não criativas”, “pessoas
inspiradas e não inspiradas” , “mais e menos limitadas”.
Pesquisadores, tais como Torrance (1974, 1995),
Pagano (1979), entre outros, mostram que as diferenças de níveis de criatividade estão associadas a distintas condições que tendem a favorecer em maior ou menor
extensão o desenvolvimento e expressão das habilidades criativas. Estas condições, como mencionado anteriormente, são de natureza interna e externa ao indivíduo.
Dentre as primeiras destacam-se os traços de personalidade e os fatores motivacionais que podem contribuir
positivo ou negativamente para a expressão criativa.
Como fatores externos, que podem agir como
facilitadores ou inibidores do processo criativo, poderse-iam citar a sociedade com suas normas e convenções,
o processo político, a família, a escola, o ambiente de
trabalho e outros grupos dos quais o indivíduo faz parte.
Na escola o professor é apontado como a pessoa mais
importante na construção de um clima favorável à
criatividade na sala de aula, podendo contribuir, também,
para um ambiente refratário à expressão da criatividade.
Por outro lado, como sujeito ativo e interativo, com traços
de personalidade que identificam sua natureza pessoal, a
Maria de Fátima M. Mariani e Eunice Maria L. S. de Alencar
conduta do professor na sala de aula, ou seja, a sua prática pedagógica é permeada por uma complexidade de
fatores que agem como facilitadores e inibidores à
expressão das suas habilidades criativas.
Pensando no professor como agente da organização
do trabalho pedagógico, onde as “condições concretas”1
se articulam, influenciando no resultado do seu trabalho
e possivelmente na sua criatividade, é que se realizou
esta pesquisa. Assim, o presente estudo teve como
objetivo principal investigar os componentes do contexto
da organização do trabalho pedagógico e do contexto
pessoal/individual que agem como facilitadores e
inibidores da expressão da criatividade de professores
de História.
A preferência por professores de História para
constituir a amostra desta pesquisa, deveu-se ao fato da
primeira autora ser atuante na área como docente, com
mais de 15 anos de experiência. E neste processo docente tem observado a dificuldade em trabalhar a disciplina de forma criativa, de maneira a cultivar o interesse
do aluno pelas aulas de História.
Estudos realizados por Bittencourt (1998), Karnal
(2003), Nikitiuk (2001), dentre outros, refletem sobre as
dificuldades do professor na sala de aula com o enfoque
da História de forma interessante. Esses autores sugerem
a busca de uma alternativa didática inovadora com vistas
a tornar as aulas de História mais “atraentes”.
A organização do trabalho pedagógico foi analisada
com base nas reflexões de Freitas (1995) acerca da
didática contextualizada dentro da organização do trabalho escolar e na relação com o trabalho produtivo. A
concepção dialético-materialista do ensino veio
enriquecer a discussão a respeito da organização do trabalho pedagógico, bem como contribuir na trajetória da
pesquisa. O destaque foi dado para as ocorrências do
dia-a-dia da escola. O pesquisador deve estar atento às
situações desse cotidiano para desvelar as contradições
internas e a reconstrução da prática escolar. Aspectos
da Pedagogia Histórico-Crítica também foram
referenciados, destacando a práxis pedagógica na
relação com o “trabalho não-material”. O “trabalho não–
material” está relacionado com a produção do saber,
produção de idéias, conceitos, valores, símbolos, hábitos, atitudes, habilidades, etc . (Oliveira, 1992; André,
1993; Libâneo, 1996; Freitas, 1995).
A criatividade foi definida como “o processo que
resulta na emergência de um novo produto (bem ou
serviço), aceito como útil, satisfatório e/ou de valor por
29
Criatividade no trabalho docente segundo professores de história: limites e possibilidades
um número significativo de pessoas em algum ponto do
tempo” (Alencar, 1996, p. 15). No contexto do trabalho
pedagógico, a criatividade pode contribuir para a solução
do fracasso escolar, na construção de projetos e na
execução de programas para melhorar o desempenho
dos alunos, as relações interpessoais, entre outros.
Foram definidos como facilitadores os elementos que
contribuem para a expressão criativa e como inibidores
os elementos que bloqueiam tal expressão no trabalho
pedagógico. Estes elementos, que na percepção do professor limitam e/ou possibilitam a expressão da sua
criatividade, foram analisados considerando a prática pedagógica em dois aspectos: condições concretas da organização do trabalho pedagógico e fatores de caráter
pessoal ou individual que interferem na atuação docente.
MÉTODO
Participantes
Dezesseis professores de História de 5ª, 6ª, 7ª e 8ª
séries do Ensino Fundamental de cinco escolas públicas
e cinco escolas particulares localizadas em Brasília, Distrito Federal, participaram do estudo. Oito lecionavam
em escola pública e oito em escola particular, com experiência na disciplina de no mínimo dois anos, sendo o
tempo médio de 11,7 anos de magistério. Oito era do
sexo masculino e oito do sexo feminino, com idade variando de 24 a 53 anos (M= 35,6 anos).
Instrumento
Utilizou-se a entrevista semi-estruturada, com
questões referentes à percepção do professor com
relação aos elementos do contexto da organização do
trabalho pedagógico e outros de caráter pessoal/individual
favoráveis e/ou limitadores da expressão criativa em seu
trabalho docente.
Apresenta-se a seguir o roteiro de entrevista.
1. Você se considera um professor criativo? Justifique.
2. Você considera o trabalho que realiza na escola
criativo? Justifique.
3. Que elementos, dentro do contexto do trabalho
pedagógico, você considera importantes para tornar o seu trabalho criativo?
4. Com que elementos, dentro do contexto pessoal/
individual, você pode contar para tornar o seu
trabalho mais criativo?
5. No contexto do trabalho pedagógico o que
impede/limita o seu processo criativo?
6. No contexto pessoal/individual o que limita a
expressão de sua criatividade?
Procedimento e análise dos dados
Inicialmente foi feito um contato com cinco escolas
públicas e cinco escolas particulares de Brasília, Distrito Federal. Nesta oportunidade foram expostos o tema
e objetivos da pesquisa, solicitando a participação dos
professores de História. Em seguida, foram agendados
local e horário com cada professor para a entrevista.
Foi realizado um estudo piloto antes da coleta definitiva dos dados. Este estudo foi feito com professores
que não fizeram parte da amostra e teve como objetivo
verificar a clareza das questões propostas. Neste estudo
piloto observou-se que alguns entrevistados sentiram
necessidade de que certos aspectos relativos ao contexto
pessoal fossem exemplificados. Em função disso, a pesquisadora teve o cuidado, no decorrer da entrevista, de
explicar para os entrevistados o sentido dos termos abordados nas perguntas, seguindo a orientação constante
na revisão da literatura;
As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas verbatim. O tempo de cada
entrevista foi de aproximadamente 60 minutos.
Utilizou-se análise de conteúdo, seguindo as
orientações de Bardin (1995). Foi efetuada a categorização das respostas por meio de classificação das
unidades de significação, levantando-se, a seguir, a sua
freqüência.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Percepção do Professor de História com Relação
aos Elementos Favoráveis à Expressão Criativa em sua
Atividade Docente
Com relação ao contexto da organização do trabalho pedagógico os resultados obtidos apontaram vários
elementos considerados importantes pelos docentes
para a expressão criativa em seu trabalho: liberdade,
recursos materiais, possibilidade de trabalho em equipe,
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Maria de Fátima M. Mariani e Eunice Maria L. S. de Alencar
receptividade dos alunos, orientação efetiva, relação
professor-aluno, tempo disponível, valorização do professor (ver Tabela 1). A freqüência das respostas permite inferir que esses elementos exercem influência
mutuamente encorajadores, com perspectivas e habilidades diversificadas. Isso facilita uma maior fluência
das idéias e o seu desenvolvimento. Já Perrenoud (1995)
ressalta a relevância da cooperação entre colegas no
Tabela 1 - Elementos do Contexto da Organização do Trabalho Pedagógico Favoráveis à Expressão
Criativa na Atividade Docente dos Participantes do Estudo
Elementos
Freqüência
Porcentagem
Liberdade
6
37,5
Recursos materiais
5
31,2
Trabalho em equipe
4
25,0
Receptividade dos alunos
4
25,0
Orientação efetiva
4
25,0
Boa relação professor-aluno
4
25,0
Apoio dos colegas
3
18,7
Tempo
3
18,7
Valorização do professor
2
12,5
Nota. O total excede a 100%, uma vez que os entrevistados fizeram referência a mais de um elemento.
significativa na expressão das habilidades criativas, de
forma similar aos que aparecem em estudos realizados
por vários autores, como Amabile (1999) e Craft
(1998).
Com relação à liberdade, Amabile (1999) ressalta
que a autonomia no ambiente de trabalho não apenas
estimula a motivação intrínseca como proporciona um
melhor aproveitamento dos talentos básicos,
conhecimentos e técnicas, liberando o raciocínio criativo
das pessoas. Também Craft (1998) considera relevante
estimular a autonomia pessoal e a autoconfiança no trabalho pedagógico. Para a autora a criatividade se desenvolve mais facilmente num ambiente livre dos julgamentos e controle sociais.
Csikszentmihalyi (1997) ressalta a natureza sistêmica
do processo criativo enfatizando a influência das
condições de natureza pessoal e de ordem externa, como
os recursos tecnológicos e metodológicos adequados à
produção criativa. Por outro lado, Bruno-Faria e Alencar
(1996) identificaram a importância de equipamentos,
recursos financeiros e materiais diversos no processo
de produção e implementação de idéias.
A respeito do apoio do grupo de trabalho ou o trabalho em equipe, Amabile (1999), dentre outros, destaca a
relevância de se criar no ambiente de trabalho grupos
contexto do trabalho pedagógico, sugerindo a transformação das formas de exercício da autoridade para a
construção de uma maior autonomia e responsabilidade
das escolas.
Contar com uma receptividade positiva dos alunos
foi considerado pelos respondentes um estímulo à
criatividade. Cunha (citado em Castanho, 2000) destacou que ter o aluno como referência é um dos mecanismos metodológicos de um trabalho inovador.
Observou-se que outros elementos considerados
relevantes à expressão da criatividade no trabalho docente, nem sempre estão disponíveis na realidade dos
professores e se constituem como barreiras à expressão
criativa. Esses elementos foram ressaltados mais como
uma condição favorável do que como elementos
disponibilizados. Expressões como “seria ideal que
existissem”, “seria bom se contássemos” foram citadas
e associadas a melhores condições de vida e de trabalho. Tais condicionantes refletem anseios e ideais.
No que diz respeito aos elementos de caráter pessoal/individual, conforme mostra a Tabela 2, o elemento
mais ressaltado por professores de ambos os tipos de
escola foi a paixão pelo trabalho. Gostar da disciplina
que lecionam, melhor dizendo, da História, foi outro
aspecto enfatizado, tanto por professores de escola pú-
31
Criatividade no trabalho docente segundo professores de história: limites e possibilidades
blica como de escola particular. Alencar (1997), em seu
estudo com pesquisadores que se destacavam por um
alto nível de produção e criatividade, identificou que essas
pessoas indicaram ter em comum um intenso
envolvimento e dedicação com as atividades de pesquisa.
Outros fatores apontados por um menor número de
entrevistados foi a influência da formação familiar e
acadêmica e de algumas condutas pessoais vivenciadas
na infância. Esses dados apresentam pontos comuns
com os resultados de pesquisas realizadas por vários
Tabela 2 - Elementos de Caráter Pessoal/Individual Favoráveis à Expressão da Criatividade no Trabalho
Docente dos Participantes do Estudo
Elementos
Freqüência
Porcentagem
Paixão pelo trabalho
6
37,5
Gostar de História
5
31,2
Gostar de artes
5
31,2
Desinibição
5
31,2
Paixão pelo estudo
5
31,2
Formação acadêmica
2
12,5
Formação familiar
2
12,5
Disposições temperamentais
2
12,5
da infância
Nota. O total excede a 100%, uma vez que os entrevistados fizeram referência a mais de um elemento.
De forma similar, o gosto pelo estudo foi outro
aspecto muito pontuado, sendo ressaltada por alguns
professores a busca da transformação pessoal e profissional através do estudo. Enquanto uns destacaram o
desejo de atualização e informação contínua, outros
informaram gostar muito de ler e pesquisar.
Gostar de artes também foi outro aspecto destacado
e alguns docentes enfatizaram o seu talento em música
e em teatro. Possivelmente esse aspecto reflete a tendência de associação do conceito de criatividade com
as artes (Amabile, 1999; Miel, 1972). Por outro lado,
leva-se a pensar no conjunto das habilidades do pensamento criativo que inclui flexibilidade, originalidade, elaboração e sensibilidade e que são interdependentes.
Foram ressaltados com uma certa freqüência entre
professores de escola particular os seguintes elementos: espontaneidade, descontração e bom humor. Segundo
Wechsler (1993) o humor, a impulsividade, a
espontaneidade, a brincadeira, ajudam a aliviar as tensões e constrangimentos e, ainda, a dissipar a rigidez.
Esses elementos estão associados à criatividade porque
possibilitam a construção de um ambiente descontraído,
favorecendo a fluência de idéias, a troca de informações e experiências.
autores, tais como Csikszentmihalyi (1997) e Gardner
(1996) que destacam a importância da família, da escola,
do meio sócio-cultural na atividade criadora.
A Percepção do Professor de História com
relação aos Elementos que Impedem ou Limitam a Expressão Criativa em sua Atividade
Docente
No tocante a esse aspecto as respostas apontaram,
com uma maior freqüência, o aluno e a estrutura escolar
como inibidores da criatividade. Por outro lado, elementos
relacionados ao professor obtiveram uma freqüência menor.
Esse resultado foi observado também no espaço em que
os docentes relataram acerca de suas próprias condutas.
Os limitadores de ordem pessoal/individual aparecem em
menor número quando comparados com os demais
aspectos. Esses resultados serão comentados a seguir.
Os resultados obtidos, com relação ao contexto da
organização pedagógica, indicaram que um número
significativo de docentes, de escola pública e particular,
considera a conduta de alguns alunos um limitador da
sua expressão criativa (ver Tabela 3).
A falta de motivação, participação, responsabilidade
ou compromisso, a imaturidade, as brincadeiras na sala
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Maria de Fátima M. Mariani e Eunice Maria L. S. de Alencar
de aula, a agressividade e a timidez, apresentados pelos
alunos foram aspectos que, na percepção dos docentes,
frustram suas perspectivas de otimizar um trabalho dinâmico e inovador. Estes fatores refletem o embate
existente entre duas partes principais: professor e alu-
Conforme Perrenoud (1999), qualquer situação que
resulte na fragmentação do tempo e nas intervenções
do professor, interfere na regulação das aprendizagens,
comprometendo a qualidade do trabalho individualizado
e diferenciado. Uma conseqüência visível nessa proble-
Tabela 3 - Elementos do Contexto da Organização do Trabalho Pedagógico Limitadores da Expressão
Criativa na Atividade Docente dos Participantes do Estudo
Elementos
Freqüência
Porcentagem
Aluno
1
62,5
Sobrecarga de trabalho
0
37,2
Recursos materiais
6
31,2
Sistema educacional
5
31,2
Gerência e/ou direção
5
25,0
Falta de apoio ao aperfeiçoamento
4
18,7
profissional
3
12,5
Falta de apoio dos colegas
2
12,5
Falta de colaboração dos pais
2
12,5
Excesso de burocracia
2
12,5
Salário
2
12,5
Nota. O total excede a 100%, uma vez que os entrevistados fizeram referência a mais de um elemento.
no. O primeiro faz uso de sua autoridade visando a
emancipação do educando através da apropriação do
saber. O último cria estratégias defensivas visando
controlar a construção do sentido concreto de seu ofício, ou seja, tornar menos dependente dos programas,
regulamentos e normas impostos pela instituição
(Perrenoud ,1995).
A sobrecarga de trabalho, outro elemento considerado pelos professores do presente estudo como limitador
de sua expressão criativa, foi abordado nos seguintes
aspectos: quantidade de horas/aulas, necessidade de trabalhar em várias escolas tendo de agrupar suas aulas
em um único dia em cada instituição, exercício de várias funções como o de docência e coordenação pedagógica, excesso de alunos na sala de aula, excesso de
burocracia, sendo ressaltado o tempo que se gasta com
o preenchimento de diários e fichas de avaliação. Foi
enfatizado, por alguns docentes, que o intervalo entre os
turnos de trabalho é muito estreito, exigindo do professor muito esforço e resistência física e emocional para
atender a demanda da instituição.
mática é a característica “inacabada” das intervenções
e do processo de construção do professor. O docente,
muitas vezes, é impedido de aprofundar-se em suas
ações pedagógicas e de tomar caminhos alternativos por
ser requerido em outras urgências.
A falta de recursos materiais e/ou estrutura física deficitária da escola foi também apontada pelos participantes do estudo, sendo ressaltados os seguintes
aspectos: biblioteca com insuficiência de recursos para
atender os interesses de pesquisa, carência de sala com
recursos audiovisuais, espaço físico inadequado para a
realização de dinâmicas diferenciadas como teatro,
exposições de trabalhos, debates e brincadeiras.
A estrutura educacional foi apontada como um limite, e o distanciamento entre o discurso e a prática foi
um aspecto bastante enfatizado. Para os professores o
modelo teórico da organização do trabalho pedagógico
é progressivo e inovador e sua realidade prática permanece quase que inalterada.
A estrutura organizacional também foi citada como
uma barreira à criatividade e, o aspecto mencionado foi
33
Criatividade no trabalho docente segundo professores de história: limites e possibilidades
a pressão do administrativo sobre o professor com
relação ao cumprimento de normas e procedimentos
legais. Na percepção de alguns professores, essa pressão é um limite à produção criativa porque a maior parte dos seus projetos é indeferida ou impedida de ser
colocada em prática. A estrutura organizacional,
conforme Alencar (1996), é um aspecto bastante
enfatizado pelos estudiosos da inovação organizacional;
entre esses ressalta VunGundy que aponta, dentre as
dimensões dessa estrutura, os procedimentos rígidos, os
comportamentos padronizados e a baixa participação dos
funcionários no processo decisório. Essa estrutura inibe
a iniciação de inovações e a circulação de novas idéias.
Este aspecto é também enfatizado por Berger e
Luckmann (citado em Cunha, 1996).
O perfil da gerência e/ou direção da escola foi outro
limite à criatividade apresentado pelos docentes. Alguns
professores ressaltaram a ineficiência administrativa em
decorrência da falta de conhecimento e de experiência
das pessoas que dirigem a escola. Foi ressaltada a rigidez
com que a direção lida com os aspectos legais, reforçando o que alguns docentes percebem com relação à
estrutura organizacional.
A falta de apoio ao aperfeiçoamento profissional,
incluindo a possibilidade de realizar pesquisa na área de
História foi um outro elemento ressaltado como um limite
à criatividade. Os professores destacaram a carência
de bolsas de estudo, a oferta reduzida de cursos e o
elevado custo dos mesmos, a indisponibilidade e acesso
tanto a atividades culturais como a congressos e
conferências.
Outros limitadores indicados por um menor número
de professores foram: a falta de colaboração dos colegas,
a crítica negativa por parte desses, a falta de estímulo e
de reconhecimento com relação aos projetos e idéias, a
falta de colaboração dos pais (falta de acompanhamento
nas atividades escolares dos filhos e resistência aos novos
modelos de ensino por parte de alguns pais) e o salário
(má remuneração do professor que busca outras fontes
de renda, gerando a sobrecarga de trabalho, o desgaste
físico, mental e emocional).
A Tabela 4 apresenta os limitadores de ordem pessoal/
individual mais salientados. Alguns elementos estão
coerentes com os limites pontuados no contexto da
organização do trabalho pedagógico. Notou-se que alguns
docentes têm consciência de que certos limitadores de
ordem externa também são influenciados pela sua
conduta pessoal.
Na percepção da maioria dos docentes, a falta de
habilidade na relação com o aluno é um limite à sua
expressão criativa, sendo destacados os seguintes
aspectos: dificuldade na comunicação e na utilização da
linguagem adequada de acordo à faixa etária do aluno.
Outra dificuldade destacada é referente ao controle da
disciplina e uma outra diz respeito à inabilidade em
articular aulas diversificadas, tornando-as mais
prazerosas sem comprometer o conteúdo.
Alguns professores consideram o medo um elemento que limita sua expressão criativa, sendo
ressaltados: o medo de ser mal interpretado pelos
alunos e pelos pais desses, de passar uma
informação errada para o aluno, de não atingir os
objetivos propostos na aula e de ser criticado pelos
colegas. Esse resultado é similar ao encontrado em
estudo de Alencar e Martinez (1998), no qual foi
identificado no conteúdo das barreiras pessoais, o
Tabela 4 - Elementos de Caráter Pessoal/Individual Limitadores da Expressão da Criatividade no Trabalho Docente dos Participantes do Estudo
Elementos
Freqüência
Porcentagem
5
31,2
Medo
4
25,0
Arrependimento ou frustração
4
25,0
Falta de tempo
3
18,7
Idade
2
12,5
Problemas de saúde
1
6,2
Falta de habilidade na relação
como o aluno
Nota. O total excede a 100%, uma vez que os entrevistados fizeram referência a mais de um elemento.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 27-35
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medo de errar, do fracasso, da crítica, do ridículo e
de expor as próprias idéias.
O arrependimento e a frustração foram elementos
também abordados por alguns professores, com
ênfase a não realização do idealizado e, também, ao
insucesso com a aplicação das habilidades artísticas
na sala de aula. Também foi ressaltada a frustração
por se acomodar numa única escola, tendo a
consciência de que poderia expandir mais suas
habilidades e seu talento numa escola mais aberta.
O arrependimento foi apontado no sentido de que
deveria ter prosseguido nos estudos e aprimorado
as habilidades artísticas. Shaw (citado em Cropley,
1997), em seu estudo com engenheiros e físicos
criativos, observou que estes demonstram frustração
quando não obtêm o êxito esperado na atividade que
realizam.
Um outro elemento limitador que reflete uma relação
conseqüente com o destacado no contexto da
organização do trabalho pedagógico refere-se à falta de
tempo. O limite do tempo é apontado como uma das
conseqüências da sobrecarga de trabalho. Foi enfatizada
a falta de tempo para estudar, para planejar as aulas,
para trocar experiências com os colegas, para dialogar
mais com os alunos. Notou-se que esse aspecto diferencia do identificado no estudo de autoria de Alencar e
Martinez (1998) onde a falta de tempo foi apontada como
uma barreira de ordem social. No presente estudo esse
componente foi considerado uma barreira de natureza
pessoal.
Também foram apontados como um limite à
criatividade os problemas de saúde (alergias,
rouquidão e o cansaço) porque, na percepção de um
dos professores pesquisados, estas patologias geram
certa indisposição para ministrar aulas mais dinâmicas
e diferenciadas. Runco, Nelmiro e Walberg (1998)
identificaram os elementos indisposição, na categoria
que definiram como traços físicos, e a impaciência,
na categoria que chamaram de distúrbios de
personalidade.
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Maria de Fátima M. Mariani e Eunice Maria L. S. de Alencar
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos permitem traçar um quadro
ilustrativo da percepção dos professores de História de
escolas públicas e particulares com relação aos
facilitadores e inibidores da expressão de sua criatividade
no contexto da organização do trabalho pedagógico.
Esses resultados devem servir, como um referencial para
estudos posteriores, bem como auxiliar professores e
demais profissionais envolvidos nas relações pedagógicas, na identificação de alternativas de estímulo ao potencial criativo e na construção de um ambiente favorável à criatividade dos seus alunos.
Pôde-se constatar que os docentes percebem suas
habilidades criativas na relação com formas inovadoras,
visando otimizar a apropriação do conteúdo pelo aluno.
Isso permite inferir que, apesar de os mecanismos utilizados nas aulas serem considerados inovadores, a lógica do conhecimento se mantém.
O aluno é considerado facilitador e limitador da
expressão criativa no trabalho docente. Isso caracteriza
a complexidade das relações constituídas no contexto da
organização do trabalho pedagógico, relações essas decisivas na definição do “ofício” de alunos e professores.
A percepção do professor, com relação aos traços
de sua conduta pessoal, não permite fazer generalizações
de padrões que identifiquem professores criativos, pouco-criativos ou não-criativos. Tal percepção, no entanto,
ilustra a influência de traços de personalidade na
expressão das habilidades criativas. O mesmo ocorre
com relação aos de natureza externa.
Não foram observadas maiores diferenças entre professores dos dois tipos de escolas nas questões investigadas. Esse fator possibilita inferir a padronização dos
problemas pedagógicos. É possível que as diferenças
estruturais, de ordem física, como as que se referem
aos recursos materiais, não sejam significativas para
alterar as semelhanças existentes, tais como: os conflitos
relacionais entre alunos e professores e entre esses e
os imperativos institucionais.
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Recebido em: 28/11/03
Revisado em: 05/12/03
Aprovado em: 01/06/05
Endereços para correspondência:
Maria de Fátima Magalhães Mariani: Quadra II Cj B-2 bl A ap 206 – Ed Rio Araguari – CEP: 73015-202 – Sobradinho - DF –
e-mail: [email protected]
Eunice M. L. Soriano de Alencar: Programa de Mestrado em Educação, Universidade Católica de Brasília, SGAN 916
Módulo B, Asa Norte – CEP: 70790-160 Brasília – DF – e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 27-35
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1
37-46
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA UNIVERSIDADE
AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Katya Luciane de Oliveira 1
Acácia Aparecida Angeli dos Santos2
Resumo
Este estudo objetivou caracterizar quais os tipos de avaliação utilizados em cursos universitários e verificar quais deles os estudantes citam como
sendo os que seriam mais adequados para avaliar o seu desempenho. Participaram 270 alunos ingressantes dos cursos de administração, direito e
psicologia de uma universidade particular do interior paulista. Foi utilizado um questionário que investigava quais as estratégias de avaliação mais
freqüentemente empregadas. A participação foi voluntária e a aplicação do instrumento foi coletiva e em uma única sessão. Os resultados
evidenciaram que o tipo mais utilizado pelos docentes é a prova dissertativa individual e que tal estratégia aparece como a segunda mais citada pelos
universitários como a que eles julgam mais adequada para a avaliação de seu desempenho. Sugere-se que outros estudos sejam realizados com um
número maior de participantes de diferentes instituições para que o conhecimento sobre o tema possa ser ampliado.
Palavras-chave: Estratégias de avaliação; Universitários ingressantes; Ensino superior.
LEARNING EVALUATION IN THE UNIVERSITY
Abstract
This research studied the different kinds of evaluation most used in higher education and it was also analysed which of them the students believe
that were better to evaluate their academic performance. The participants were 270 freshman students from business, law and psychology courses
from a private university in São Paulo. The questionnaire used focalysed which were the assessment strategies more frequently applied. The
students’ participation was voluntary and the data was collected in a collective session. The results showed that the most common evaluation was
the individual dissertation, wich has also been appointed as the second more effective to measure their academic performance. It makes necessary
other researches with a bigger participants number from different universities to extend the scientific knowledge in this field.
Keywords: Assessment strategy; Freshman students; College.
INTRODUÇÃO
A avaliação da aprendizagem tem sido tópico de debates entre estudiosos da psicologia e da educação, mas poucas pesquisas vêem sendo desenvolvidas sobre o assunto.
Especialmente no Brasil, constata-se a falta de congruência
tanto no que se refere ao arcabouço teórico, com base nos
quais as questões têm sido geradas, como com relação aos
resultados dos poucos trabalhos realizados sobre o tema
(Almeida, 1992; Souza, 1995; Camargo, 1997; Martins, 1999).
Buriasco (2000) observa que a avaliação está presente nas diversas áreas da atividade humana e que, de
1
uma ou outra forma, todas as pessoas avaliam e são
inevitavelmente avaliadas. Qualquer forma de avaliação pressupõe fundamentalmente um julgamento, com
base em uma concepção explícita ou implícita. Ao longo da história, mesmo sem ter a noção exata do que
seja avaliar, o homem utiliza a avaliação para alcançar o
melhor resultado.
O ato de avaliar é algo antigo na história, desde 2205
A. C., na China, o imperador chinês Shun, examinava
seus oficiais com a finalidade de promovê-los ou demiti-
Psicóloga, Mestre em Psicologia pelo Programa de Pós-graduação Stricto-sensu em Psicologia, da Universidade São Francisco e Docente da
Universidade de Alfenas-MG.
2
Psicóloga, Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela USP, docente da graduação no curso de psicologia e no
Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia, da Universidade São Francisco-SP.
38
los. O termo avaliação da aprendizagem surge mais especificamente nos Estados Unidos da América no século
XIX, quando foi criado um sistema de testagem por
Horace Mann. Nesse momento houve a institucionalização da prova escrita e uma grande discussão sobre a
possibilidade de testar os programas educacionais em
grande escala, visando a promoção de algumas melhorias
no padrão educacional tradicional da época, tais como a
utilização de questões específicas ao invés de questões
gerais e a busca por padrões educacionais mais objetivos.
Desde então, avaliar tornou-se um termo empregado
em diversos contextos, com diferentes juízos, objetos e
significados (Pinto, 1996; Depresbiteris, 1997).
O homem emite dois tipos de juízos ao avaliar,
conforme ressalta Almeida (1997). O primeiro é o juízo
da realidade o outro, diz respeito ao juízo de valor. Com
o juízo da realidade, por meio da avaliação, o homem
atribui significado à realidade, como ele a percebe. Já o
juízo de valor, possibilita ao homem avaliar e emitir um
juízo sobre o significado daquilo que ele observa ou
vivencia. Buriasco (2000) considera que a emissão de
um juízo sobre algo, implica na utilização de padrões
estabelecidos, que são os fios condutores que direcionam
uma avaliação, fazendo com que ela não se afaste de
seus grandes eixos que são o ‘teórico metodológico’, o
‘ético’ e o ‘político’.
São três os objetivos da avaliação destacados por
Hadji (1994), que considera que pelo inventário pode-se
averiguar se o aluno tem bom domínio das competências
e habilidades necessárias para a aprendizagem de um
determinado conteúdo. O segundo, é o diagnóstico, que
assume o significado de situar o aluno no seu processo
de aprendizagem, identificando suas dificuldades. O último, é o prognóstico, cuja função é avaliar e orientar o
aluno nas escolhas e possíveis caminhos que decida
seguir em relação ao seu aprimoramento. Contudo, observa-se que o significado do termo avaliar está associado
a palavras que têm sentidos sinônimos, tais como, provas, testes, trabalhos e resultados alcançados.
Enfocando a avaliação na área escolar, Sousa (1995,
1997) afirma que a avaliação do rendimento permite
verificar se os objetivos de determinado curso foram
atingidos, considerando que é o planejamento e o ensino
que vai determinar o caminho a ser seguido. Para Almeida
(1992) há duas funções estabelecidas para a avaliação
do rendimento escolar. A primeira, diz respeito às funções
gerais que visam o planejamento, a tomada de decisão,
a seleção, a classificação e o ajuste das práticas peda-
Katya Luciane de Oliveira e Acácia A. Angeli dos Santos
gógicas. A segunda, engloba funções específicas que
buscam, por meio do diagnóstico, um avanço no processo pedagógico com o intuito de adequar e agrupar os
alunos em função dos resultados obtidos.
No que se refere aos modelos de avaliação do rendimento acadêmico, Almeida (1997) elege três modelos
como os mais importantes, a saber, a ‘avaliação tradicional’, na qual a ênfase está na verificação, apuração e
interpretação dos resultados alcançados, a ‘avaliação
por objetivos comportamentais’ que busca a verificação, a apuração e a interpretação das mudanças ocorridas no comportamento do aluno decorrentes do conteúdo ensinado e a ‘avaliação qualitativa’ que inclui as
funções diagnósticas e formativas.
Todavia, independentemente do modelo de avaliação adotado, Franco (1997) sugere que deve haver uma
redefinição desse construto, levando-se em consideração
o vínculo social e histórico do aluno, de forma a priorizar
a objetividade, sem descartar a subjetividade. Por um
lado, o aluno deve ser considerado como parte integrante
de uma estrutura social que tem uma parcela de influência no seu rendimento acadêmico. Por outro, o professor deve conhecer os motivos e objetivos da avaliação,
para que, com o resultado do processo avaliativo, ele
possa discutir com o aluno uma alternativa para melhorar
o desempenho de ambos.
Sobre esse aspecto, Esteban (2000) afirma que a
avaliação é a leitura que o professor faz do conhecimento do aluno, com base nas respostas dadas em uma
prova, o que a remete à classificação e à comparação
por padrões previamente definidos. O professor avalia
os erros que são interpretados como não saber e deficiência, e os acertos, que assumem o significado de saber
e conhecimento e indicam uma boa aprendizagem. Avaliando erros e acertos o professor obtém a medida do
que foi ensinado e do que foi efetivamente aprendido.
Dessa forma, restringe-se o caráter pedagógico da avaliação e configura-se uma relação de controle, visto que
impera uma conotação excludente, não havendo
consideração dos entornos estabelecidos pelos diversos
contextos sociais dos quais os alunos advêm.
Buriasco (2000) ressalta que os erros não são discutidos com o aluno e nem utilizados para que o professor
reformule sua metodologia e leve os alunos a um
resultado satisfatório. Tal atitude não respeita um dos
um dos principais papéis da avaliação que é a promoção
de um feedback, que tem a função de informar os
sujeitos avaliados, quanto ao seu progresso.
39
Avaliação da aprendizagem na universidade
No mesmo sentido, Bzuneck (2001) observa que o
feedback é importante para o processo de ensino-aprendizagem, sendo que a maneira e a forma de avaliação
constituem peças importantes na motivação do aluno.
Nesse contexto, o feedback que o professor fornece
deveria possibilitar ao estudante reconhecer os erros não
como fracasso, mas como algo que pode ser trabalhado
e melhorado, favorecendo seu crescimento pessoal e
social. Este tipo de avaliação auxiliaria o aluno a adquirir sua própria concepção do mundo, por meio da consciência daquilo que foi aprendido. Para tanto, deveria
levar em conta, além do conteúdo trabalhado, as aprendizagens que se deram fora do contexto escolar e o
contexto social no qual o aluno está inserido (Almeida,
1992, 1997; Silva, 2001).
A pesquisa realizada por Souza (1997) demonstrou
que, na concepção dos professores que dela participaram, a avaliação da aprendizagem dos alunos consiste
em verificar se os alunos aprenderam o que foi explicado.
O objetivo é que os alunos sejam capazes de reter o
conteúdo dado, sendo a nota um meio de controle. Ao
lado disso, faz com que os alunos realizem as tarefas
solicitadas durante o curso e funciona como elemento
de manutenção da disciplina.
Gronlund (1979) ressalta que o sistema de atribuição
de notas fundamenta-se no julgamento feitos por professores em relação ao desempenho do aluno, não
havendo como escapar dele. De forma geral, o desempenho dos alunos é resumido num escore final, que pode
ser emitido por símbolos diversos, que variam de uma
escala numérica (de 0 a 10 ou 0 a 100), letras (sendo as
mais empregadas A, B, C, D e E), ou ainda por conceitos
que se restringem a categorias do tipo ‘aprovado’ ou
‘reprovado’; ‘satisfatório ou ‘insatisfatório’. O desempenho do aluno pode ser julgado com referência à norma
(desempenho da classe), com referência ao critério (padrão de desempenho absoluto) e em função do potencial de aprendizagem do próprio aluno. Seja qual for o
critério adotado, grande parte dos estudiosos da avaliação consideram que o aluno fica em desvantagem, pois
cabe ao professor, que exerce a função de poder,
estabelecer qual a forma de avaliação a ser empregada.
O conhecimento do aluno é medido pelo professor
por meio da avaliação, que passa a ser, para o aluno, a
única alternativa para a obtenção da aprovação. A avaliação pode tornar-se, então, um fator interferente na
aprendizagem, pois o aluno estudará apenas os conteúdos
que serão cobrados, não se aprofundando em outros
assuntos. Para Buriasco (2000) os alunos dedicam-se a
decorar conteúdos para conseguirem obter boas notas,
o que resulta numa memorização pouco duradoura, visto que logo esquecem o que foi assim aprendido. A nota
não representa, nesse caso, o real conhecimento do aluno e a avaliação adquire um cunho negativo com os
professores cobrando, de um lado, e os alunos decorando, de outro.
Corroborando com essa idéia, Esteban (2000) e Kasai
(2000) declaram que a avaliação pode ficar presa a padrões pré-determinados e que deveria assumir um novo
sentido, enfatizando menos os erros e buscando entender
melhor o caminho adotado pelo aluno. Tais mudanças
poderiam favorecer a professores e alunos o êxito no
processo avaliativo.
Na concepção de Kasai (2000), as mudanças na
avaliação somente são possíveis, no dia a dia escolar,
com negociação, reflexão e auto-crítica da própria prática pedagógica. Para tanto, a alteração no parâmetro
de avaliação de aprendizagem poderá ocorrer à medida
que haja uma convergência de professores e alunos,
assumindo a responsabilidade por uma transformação
transparente e criteriosa, na qual prevaleça o diálogo. A
avaliação da aprendizagem funcionaria como um instrumento para alcançar a autonomia do aluno, assumindo
um papel ainda mais importante no ensino superior, que
inquestionavelmente é responsável pela formação técnica e profissional do aluno.
Muitos estudos, como Almeida (1992), Martins
(1999), Esteban (2000), Sordi (2000) e Silva (2001) apontam que a avaliação é importante para orientar tanto o
aluno quanto o docente, pois proporciona ao estudante a
revisão de sua atuação e ao professor uma contínua
melhora de sua metodologia. A avaliação é o primeiro
passo para que ocorra um diagnóstico do rendimento
escolar e do nível de conhecimento, sendo que sua
importância na educação superior é evidente.
No que concerne ao papel da universidade na avaliação dos alunos, Silva (2001) insiste que a instituição
deve assumir sua responsabilidade quanto ao fracasso
ou sucesso do aluno. A avaliação da aprendizagem
merece um lugar de destaque, visto tratar-se de uma
prática indispensável, especialmente, no nível superior,
no qual se espera domínio de conteúdo e de práticas
profissionais necessárias a quem pretende ingressar no
mercado de trabalho.
Camargo (1997) realizou uma análise do discurso
escolar sobre a avaliação no ensino universitário,
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 37-46
40
concluindo que certos tipos de avaliação geram
indignação nos alunos e os induzem a uma submissão
com a qual não concordam. Para Almeida (1992) é fato
que a avaliação gera insatisfação nos universitários,
sendo esse descontentamento observado pelas manifestações de desaprovação quanto às formas de avaliação que seguem o modelo tradicional, que estabelecem
uma relação de poder que exclui o diálogo. Desse modo,
muitos são os episódios em que alunos se unem e
recusam-se a realizar prova de determinada disciplina.
De acordo com Ronca e Terzi (1995), muitas vezes
os alunos recorrem à cola, que passa a ser um fenômeno
normal do cotidiano escolar, tornando-se até motivo de
orgulho e conquista, sendo usado, freqüentemente, com
impunidade. Os estudantes que recorrem à cola não
têm um desvio de personalidade, mas de conduta, que
foi eliciada pela situação aversiva que é a prova. O
momento da prova pode desencadear rigor e medo, especialmente quando acompanhado de postura restritiva
na sua aplicação, fazendo com que a avaliação perca a
sua essência e se configure em uma situação de conflito
entre professor e aluno.
Nesse sentido, Sordi (2000) destaca que no ensino
superior a avaliação deve assumir um papel de transformação, que proporcione ao aluno uma voz ativa, não
se submetendo ao seu controle e que o erro não deve
ser visto como uma forma de fracasso, mas como uma
possibilidade de melhora. O aluno deve deixar de centrar
no professor a figura de poder, para que a avaliação
seja vivenciada com tranqüilidade, pois conforme afirma Silva (2001) ela não deve ter um caráter negativo,
mas ser considerada como um processo que envolve
coletas de evidências, a fim de que sejam realizadas as
mudanças necessárias.
A avaliação deve ser entendida como um recurso
que requer referência a um padrão explícito, que
estabeleça os diversos níveis de aproveitamento,
havendo um canal de liberdade e comunicação na
relação professor/aluno. Observa-se, então, a necessidade de se caracterizar os tipos de avaliações mais
freqüentemente utilizados por docentes na universidade.
Verificar como a avaliação da aprendizagem dos diferentes conteúdos e disciplinas vem sendo realizada,
resulta em forma de controle eficaz da função do ensino,
verificando se esse está realmente sendo efetivo no seu
papel, que é a formação de um aluno com uma bom
conhecimento técnico e uma visão crítica, como se
espera de um estudante com nível universitário.
Katya Luciane de Oliveira e Acácia A. Angeli dos Santos
Ao final dessas considerações, há que se deixar claro
que existem múltiplas visões sobre a avaliação e que, de
um modo geral, seu foco tem sido voltado para as
implicações causadas no aluno. Procurou-se refletir aqui
sobre as contradições, incoerências e falta de entendimento existente no campo da avaliação da aprendizagem, o que inspirou a proposição deste estudo, buscando a ampliação do conhecimento sobre as questões aqui
abordadas.
Com base nessas questões, os objetivos deste trabalho foram caracterizar quais os tipos de avaliação mais
freqüentemente utilizadas pelos professores que ministram as disciplinas de conteúdos específicos em cursos
superiores, bem como, verificar quais os tipos de
avaliação que os universitários indicam como sendo
aquelas que eles acreditam que seu desempenho seria
melhor avaliado.
MÉTODO
Participantes
Participaram 270 alunos ingressantes de uma
universidade particular do interior paulista, dos cursos
de administração (27,8%; N=75), direito (29,3%; N=79)
e psicologia (43%; N=116), dos períodos diurno (10,4%;
N=28) e noturno (88,9%; N=240), vale ressaltar que dois
estudantes deixaram de colocar o período em que
estudavam.
A média de idade do curso de administração foi de
21 anos e seis meses (DP=4,1), do curso de direito foi
de 26 anos e três meses (DP=7,4) e do curso de psicologia foi de 22 anos e nove meses (DP=6,9). Portanto,
a média de idade dos estudantes dos três cursos
analisados foi de 23 anos e seis meses (DP=6,73), variando de 17 a 53 anos. Considerando o total da
amostra, 10% (N=27) dos estudantes do curso de administração eram do gênero masculino e 17,8% (N=48)
do feminino; 15,2% (N=41) dos estudantes do curso
de direito eram do gênero masculino e 14,1% (N=38)
do feminino; 5,6% (N=15) dos estudantes do curso de
psicologia eram do sexo masculino e 37,4% (N=101)
do feminino. Desse modo, o gênero masculino
representou 30,7 % (N=83) do total de estudantes e o
feminino 69,3 % (N=187). Desse modo, o gênero
masculino representou 30,7 % (N=83) do total de
estudantes e o feminino 69,3 % (N=187).
41
Avaliação da aprendizagem na universidade
Instrumento
Questionário elaborado pelas autoras que visou à
caracterização dos meios de avaliação freqüentemente
utilizados. As questões foram fechadas, contendo as formas de avaliação mais comuns no ensino superior, a saber:
apresentação de seminários em grupo, debates em sala
de aula, estudos de caso, participação em sala de aula,
provas dissertativas em grupo, provas dissertativas
individuais, provas objetivas (testes) em grupo, provas
objetivas (testes) individuais, provas orais em grupo, provas orais individuais, resenhas de livros, resumos de capítulos de livros, trabalhos dissertativos em grupo, trabalhos
dissertativos individuais. Havia também uma questão aberta com a seguinte afirmação: ‘Aponte uma estratégia
que você acredita que o seu desempenho seria melhor
avaliado nessa disciplina’.
Critério de Avaliação
Foi considerada a freqüência das respostas dadas
pelos alunos no questionário de caracterização dos meios
de avaliação mais utilizados pelos professores das disciplinas cursadas no semestre imediatamente anterior. A
cada alternativa assinalada era atribuído um ponto.
Procedimento
As provas foram aplicadas em uma sessão, em
horário de aula previamente cedida pelo professor, aos
sujeitos que assinaram o termo de consentimento
esclarecido. Depois de explicados os objetivos da pesquisa, solicitou-se aos alunos que assinalassem com um
X as estratégias de avaliação, das quais as notas nas
disciplinas cursadas foram predominantemente obtidas
(não havendo necessidade de apontar nenhuma ordem
de preferência). Ao lado disso, pediu-se aos estudantes
que respondessem a questão aberta no espaço em branco
disponível para tanto, caso isso fosse pertinente.
RESULTADOS
Os tipos de avaliação mais utilizados pelos professores que ministram as disciplinas de conteúdos específicos
nos cursos analisados podem ser observados na Tabela
1. Vale acrescentar que foi considerado como resposta
válida quando o sujeito assinalou até três alternativas
para cada disciplina.
Considerando-se as respostas dos alunos observase, em geral, que o tipo de avaliação mais indicado foi a
prova dissertativa individual. Verificou-se também que
o tipo menos utilizado foi a prova objetiva em grupo.
Utilizando-se o qui-quadrado verificou-se que a distribuição entre as citações não era eqüitativa [χ 2(10,
1533)=1,169,84; p<”0,001].
Tabela 1 – Freqüência e porcentagem das respostas correspondentes aos tipos de avaliação mais citados pelo total de
estudantes, como utilizados pelos docentes que ministram conteúdos específicos (N=270).
Tipos de avaliação
Número de vezes que
% correspondente ao número
foi escolhida
de vezes que foi citada
Provas dissertativas individuais
505
32,9
Provas objetivas (testes) individuais
163
10,6
Apresentação de seminários em grupo
154
10
Trabalhos dissertativos em grupo
140
9,2
Participação em sala de aula
118
7,7
Provas dissertativas em grupo
98
6,4
Trabalhos dissertativos individuais
97
6,3
Resumos de livros/capítulos
91
5,9
Debates em grupo em sala de aula
80
5,3
Estudo de caso
57
3,8
Provas objetivas (testes) em grupo
30
1,9
1533
100,0
Total de citações
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 37-46
Katya Luciane de Oliveira e Acácia A. Angeli dos Santos
42
Procurou-se também explorar as respostas dos alunos por curso, visto que poderia haver diferenças entre
eles em razão de características específicas que apresentavam. A análise das respostas sobre o tipo de avaliação mais utilizada pelos professores encontra-se ilustrada na Tabela 2.
escolhidas eram altamente significativas.
As respostas referentes à questão aberta, que
solicitava ao estudante que apontasse uma estratégia
pela qual o seu desempenho seria melhor avaliado em
cada disciplina, permitiram a identificação do tipo de
avaliação que o estudante acreditava ser mais adequa-
Tabela 2 – Freqüência e porcentagem dos três tipos de avaliação mais utilizados pelos professores, citadas pelos
alunos de cada curso (N=270).
Curso
N
Tipos de avaliação
Número de
citações
% correspondente
ao número de citações
vezes que foi citada
Administração
Direito
Psicologia
75
79
116
Provas dissertativas individuais
138
34,9
Trabalho dissertativo em grupo
49
12,4
Trabalho dissertativo individual
39
9,9
Provas dissertativas individuais
134
30,9
Participação em sala de aula
45
10,9
Apresentação de seminários em grupo
42
10,4
Provas dissertativas individuais
233
33,0
Provas objetivas (testes) individuais
94
13,3
Apresentação de seminários em grupo
87
12,3
Vale observar que foram consideradas apenas as
modalidades de avaliação mais citadas pelos alunos e
que o número de citações é muito maior que o número
de alunos porque cada um assinalava, pelo menos,
uma modalidade para cada uma das disciplinas.
Merece destaque o fato da prova dissertativa
individual ser a mais freqüentemente citada em todos
os cursos. Os tipos de avaliação que apareceram
como as segundas e terceiras mais citadas variaram
de curso para curso, possivelmente porque as escolhas
refletem as características das disciplinas específicas
neles ministradas.
Recorreu-se ao qui-quadrado para analisar se as
citações referentes a cada um dos cursos apresentavam uma distribuição eqüitativa. Assim, para o curso de
administração encontrou-se χ2(2, 229)=75,05; p<”0,001;
para o curso de direito obteve-se χ2(2, 266)=44,71;
p<”0,001; e, para o curso de psicologia observou-se χ2(2,
414)=98,28; p<”0,001. Os resultados demonstraram que
para todos os cursos as diferenças entre as alternativas
do para medir o seu desempenho e suas freqüências
estão ilustradas na Figura 1. Cabe acrescentar que só
foram consideradas válidas as respostas em que o sujeito
assinalava até duas alternativas.
Nota-se que o tipo de avaliação mais citado como
aquele cujo desempenho do aluno seria melhor avaliado
foi o trabalho dissertativo em grupo. É importante
ressaltar que a prova dissertativa individual não foi descartada pelo estudante, ficando em segundo lugar como
a mais citada, juntamente com a modalidade debates
em grupo em sala de aula.
Grande parte dos estudantes respondeu a questão
com um comentário que não se enquadrava em nenhum
tipo de avaliação. Ao invés de responder sobre o tipo de
avaliação que acreditava ser o mais adequado em cada
uma das disciplinas, o estudante escrevia comentários,
muito diversificados e, às vezes, bastante extensos. Ao
que parece, o estudante utilizou o espaço da questão
aberta para expor suas idéias e opiniões. Apesar dos
43
Avaliação da aprendizagem na universidade
Figura 1 – Distribuição percentual de freqüência, por curso, dos tipos de avaliação pelas quais os alunos
julgavam que seriam melhor avaliados (N=270).
comentários serem numerosos, eles não foram aqui
categorizados, considerando que merecerão uma análise
mais aprofundada e criteriosa a ser apresentada em um
trabalho futuro.
Novamente é importante destacar que foram
consideradas apenas as três modalidades de avaliação
mais citadas pelos alunos e que o número de citações é
muito maior que o número de alunos porque cada um
assinalava, pelo menos, uma modalidade para cada uma
das disciplinas. A análise da freqüência das respostas
em cada curso mostrou que para os alunos de administração os tipos de avaliação mais citados como aqueles
que julgavam ser os mais adequados para medir o seu
desempenho são totalmente diferentes daqueles mais
freqüentemente utilizado pelos professores para avaliálos. Este curso também foi o que apresentou um
percentual maior de comentários na questão aberta que
permitia essas considerações. Também para os
estudantes de direito as modalidades pelas quais julgam
que poderiam ser melhores avaliados são diferentes das
que aquelas mais utilizadas pelos professores. Cabe
observar que o trabalho dissertativo em grupo e os debates em grupo em sala de aula obtiveram a mesma
porcentagem de citações, ficando ambos em segundo
lugar como os mais citados. Mesmo assim, os
comentários foram menos freqüentes que os dos alunos
de administração. No curso de psicologia dois dos tipos
de avaliação mais citados coincidiram com as estratégias
já bastante utilizadas pelos professores (prova
dissertativa individual a apresentação de seminários em
grupo). Acrescenta-se o fato de que foram os alunos
que apresentaram o menor percentual de comentários,
o que poderia permitir a inferência de que são aqueles
que se sentem mais adequadamente avaliados pelos procedimentos habitualmente utilizados pelos professores.
DISCUSSÃO
No que concerne à caracterização dos tipos de avaliação mais freqüentemente utilizados pelos professores
que ministram as disciplinas de conteúdos específicos
nos cursos analisados, os resultados evidenciaram que
o tipo mais apontado pelo estudante como aquele que o
docente utiliza para mensurar o seu desempenho foi a
prova dissertativa individual e o menos utilizado foi a
prova objetiva em grupo. As atividades individuais foram mais utilizadas em relação às tarefas que exigiam
trabalho em grupo. Vale ressaltar que a prova dissertativa
individual foi o tipo mais citado em todos os cursos e na
maioria das disciplinas.
Certamente a prova dissertativa individual é um elemento primordial na avaliação do estudante, tendo em
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 37-46
44
vista que envolve um empenho individual do aluno e uma
produção escrita, a fim de formular uma resposta adequada. Esse tipo de prova evita uma situação referida
por Buriasco (2000), na qual os estudantes decoram o
conteúdo, para obter uma boa nota. Para formular uma
boa resposta os estudantes têm que recorrer à
criatividade e à crítica, de modo que a compreensão em
leitura está atrelada ao bom desempenho.
Com a utilização da prova dissertativa individual,
observou-se que os docentes enfatizam a realização de
uma avaliação tradicional, cuja ênfase está respaldada
na verificação, apuração e interpretação dos resultados
alcançados, tal como ressaltado por Almeida (1997). Esse
dado foi considerado positivo neste trabalho, pois a
objetividade, a mensuração e o estabelecimento de padrões devem ser encarados como desejável para uma
boa formação universitária.
Almeida (1992) e Martins (1999) observam que a
avaliação no ensino superior está relacionada às
experiências tradicionais que classificam o estudante e
que os docentes apresentam dificuldades em ser
coerentes quanto ao tipo de avaliação. Mas, o que foi
observado nesta pesquisa é que houve uma concordância
entre os docentes que ministram disciplinas específicas
nos cursos analisados, na qual prevaleceu um tipo de
avaliação, que foi a prova dissertativa individual. Acrescenta-se que toda avaliação, mesmo a de cunho subjetivo,
pressupõe uma classificação. A classificação é inevitável,
pois senão todos os estudantes poderiam ser
considerados medíocres, visto que não haveria
parâmetros para se comparar os desempenhos. Sugerese, porém, que a avaliação seja utilizada não somente
visando mensurar o desempenho do aluno, mas também
como uma perspectiva de prognóstico com o objetivo
final de orientar o estudante na melhor forma de aprimorar seu conhecimento (Hadji, 1994).
Resultados interessantes surgiram quando se solicitou,
na questão aberta, que o estudante apontasse uma
estratégia pela qual o seu desempenho seria melhor avaliado em cada disciplina. Surpreendentemente, os dados
mostraram que a prova dissertativa individual não foi
uma possibilidade desconsiderada pelo estudante, visto
que aparece em segundo lugar como a mais citada,
juntamente com debates em grupo em sala de aula. No
curso de psicologia, em especial, a prova dissertativa
individual aparece como a mais citada pelos estudantes.
Todos esses dados contrariam, de certo modo, o que
Almeida (1992) e Camargo (1997) afirmam, que certos
Katya Luciane de Oliveira e Acácia A. Angeli dos Santos
tipos de avaliações geram a indignação nos alunos o
que resulta em manifestações de desaprovação quanto
às formas de avaliação que seguem o modelo tradicional. Hipotetiza-se que a prova dissertativa individual seria
uma séria candidata a gerar o inconformismo nos
estudantes, que muitas vezes, preferem atividades em
grupo e de menor exigência. Entretanto, o que foi observado é que os estudantes não estão reprimidos, tão
pouco discordantes visto que quando lhes é perguntado
sobre formas de avaliação mais adequadas, respondem
que acreditam que o seu desempenho seria melhor avaliado por prova dissertativa individual. Assim, verificase que o estudante ainda considera este tipo de prova
(considerada como tradicional) a que melhor avalia seu
conhecimento sobre o assunto específico.
Cabe saber, entretanto, o rigor com que as provas
dissertativas individuais estão sendo elaboradas. Não se
pretende fechar a questão de que a prova dissertativa
individual é o melhor método para avaliar o conhecimento do aluno, visto que não há como ignorar que há
provas objetivas e trabalhos realizados em grupo que,
dependendo do grau de dificuldade, certamente podem
exigir mais conhecimentos do aluno.
Um aspecto que não pode deixar de ser considerado
é que não há uma coerência entre os estudiosos que
pesquisam a avaliação da aprendizagem. Parece haver
um descontentamento geral com a forma de avaliar,
sendo que os discursos, em sua maioria, tendem a
vitimizar o aluno, caracterizando-o como agente passivo no processo da avaliação. O professor, por sua vez,
é considerado o sujeito do poder que determina, sem
consultas, como ocorrerá a avaliação.
Todavia, é sabido que, principalmente no ensino
superior, os alunos são bem ativos no que concerne à
reivindicação de seus direitos. Muitos professores, que
não desejam criar atritos com seus alunos, procuram
abrir espaço para uma discussão com os alunos a melhor
forma de avaliação, sendo essa uma prática comum,
especialmente, em instituições privadas.
Assim, seria interessante que se repensasse o discurso sobre a passividade do aluno, bem como, que os
estudiosos da área buscassem pontos de convergência
sobre o conceito e a melhores formas de avaliação.
Atualmente, as sugestões são as mais diversas, mas ficam no campo das idéias, não são de fato soluções práticas que melhorem o dia a dia do professor e do aluno.
Em suma, a falta de coerência da área também foi observada por Souza (1995) em sua pesquisa sobre a ava-
45
Avaliação da aprendizagem na universidade
liação da aprendizagem nas pesquisas no Brasil de 1930
a 1980. A autora expõe que há uma urgente necessidade
de consolidação de referenciais teóricos que reflitam
uma concepção de avaliação que possa nortear as práticas pedagógicas decorrentes dela.
Verifica-se que há muitas críticas contundentes às
formas tradicionais de avaliação da aprendizagem mas
que as sugestões, em geral, ficam num âmbito muito
subjetivo. Os discursos falam de mudanças urgentes que
devem ser realizadas, porém a utilização de técnicas
inovadoras requer a respectiva fundamentação teórica,
para que não seja transformada em um modismo educacional a mais. Importante seria que os estudiosos da
área se debruçassem sobre as sérias questões aí
envolvidas, mostrando que a avaliação precisa ser
reconhecida como peça fundamental para a aprendizagem do estudante, sem a qual não é possível identificar
os pontos falhos do processo.
As respostas dadas pelos estudantes na questão aberta merecem destaque especial, considerando que muitos
estudantes aproveitaram tal espaço para manifestações
diversas. Mesmo não tendo sido categorizadas, visto não
ser o foco deste trabalho, os comentários abordavam,
muitas vezes, problemas ligados ao próprio aluno como
a falta de tempo para estudar, suas dificuldades no modo
como estuda, entre outros. Além disso, faziam críticas
às estratégias de ensino do professor ou mesmo à forma como lidavam com os alunos.
De forma geral, foi possível observar a necessidade
de se propiciar ao estudante a oportunidade de aprender sobre estratégias de aprendizagem, a organização
do tempo e condições motivacionais, entre outros
aspectos. Entende-se que uma postura preventiva, em
relação às dificuldades relatadas, poderia favorecer um
melhor desempenho e o êxito do estudante não só na
sua avaliação enquanto estudante, mas também, como
futuro profissional. Sugere-se que novas pesquisas relacionadas às questões levantadas ao longo deste trabalho sejam realizadas para ampliar o conhecimento sobre
essa importante temática.
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escolar (6. ed. pp. 83-108). Campinas: Papirus.
Recebido em: 19/10/04
Revisado em: 03/02/05
Aprovado em: 12/04/05
Endereço para correspondência:
Katya Luciane de Oliveira: Rua Maestro Sebastião Peranovich, 415 – Atibaia Jardim – CEP 12940-000 – Atibaia - SP –
e-mail: [email protected]
Acácia Aparecida Angeli dos Santos: Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 – CEP 13251-900 – Itatiba – SP –
e-mail: acá[email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1 47-57
COMPORTAMENTO SOCIAL NA ESCOLA: DIFERENÇAS ENTRE GÊNERO E SÉRIES
COMPORTAMENTO SOCIAL NA ESCOLA
Laura Fogaça Saud 1
Josiane Maria de Freitas Tonelotto2
Resumo
O objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento social em um grupo de escolares, e verificar as diferenças entre os mesmos tendo em vista
aspectos como sintomas emocionais, problemas de conduta, hiperatividade, problemas de relacionamento com colegas e comportamento prósocial, contemplados no instrumento SDQ (Strengths Difficulties Questionnaire) que avalia desordens psiquiátricas relacionadas ao comportamento
social. Participaram da pesquisa crianças com idade média de 9 anos e 6 meses, cursando a 3a e 4a séries do ensino fundamental de uma escola da rede
particular de ensino, sendo 24 do gênero feminino e 17 do gênero masculino. Os resultados demonstraram que para comportamento pró-social não
foram observadas diferenças quanto ao gênero. Com relação às médias obtidas em dificuldades sociais de acordo com a série, foram encontradas
diferenças em problemas de conduta, problema de relacionamento com colegas e total de dificuldades. Para comportamento pró-social, foram
observadas diferenças com relação à série, sendo que os escolares da 3 a série se auto-avaliaram como mais “hábeis socialmente”, com relação aos
estudantes da 4a série.
Palavras-chave: Comportamento Social; Diferenças entre gêneros; Interação escolar; Ensino Fundamental.
SOCIAL BEHAVIOUR IN SCHOOL: DIFFERENCES BETWEEN GENDERS AND GRADE
Abstract
The purpose of this study was to evaluate the social behavior in a group of students and verify the differences between the genders, considering
the aspects such as emotional symptons, problems of behavior, hyperactivity, problems of relationship with colleagues and pro-social behavior,
contemplated in the SDQ (Strenghts Difficulties Questionnaire) wich evaluates psychiatric disorders related to the social behavior. It took part of
the research children at the age of 9 years and 6 months, attending the 3rd and 4th grades of the elementary course in a private school, divided into
24 female and 17 male. The results showed us that concerning the pro-social behavior, differences were not observed. However, related to the
averages of social difficulties were found differences in behavior problems; problems about relationship with colleagues and total of difficulties.
According to pro-social behavior were found differences related to the grades, considering that the students from 3rd grade evaluated themselves as
more socially skillful than the students from the 4th grade.
KeyWords: Social behavior; Differences between the genders; Pertaining to school interaction; Elementary Course.
INTRODUÇÃO
O
ser humano nasce da relação de pessoas. Nessa
relação, ele é concebido e gerado na troca mútua e na
interação, cresce e desenvolve-se numa rede de relações
sociais que embora se modifiquem ao longo da vida o
acompanharão, e ele, será parte delas sempre.
Nos últimos anos tem aumentado o interesse de
pesquisadores pela forma com que as pessoas se
relacionam logo no início de seu desenvolvimento.
1
Observa-se que desde o nascimento o ser humano
identifica-se com um conjunto de padrões de
comportamento que lhe torna possível interagir e
adaptar-se ao ambiente em que vive. Mesmo antes
de ter adquirido comportamentos mais complexos,
existe uma predisposição para que a vinculação
afetiva e social se concretize (Carvalho &
Guimarães, 2002).
Mestre em Psicologia Escolar pela PUC-Campinas – Instituto de Ensino Santo Antônio – IDESA.
2 Doutora em Ciência Médicas pela UNICAMP e Docente da PUCCAMP.
48
Dois sistemas interacionais são destacados no processo de socialização infantil: o sistema adulto-criança
e o sistema criança-criança. Por intermédio dessas
interações a criança desenvolve suas habilidades inatas,
adquire linguagem, informações, aprende regras de
convivência e padrões de comportamentos aceitos e
valorizados pelo meio em que vive. Além disso, aprende
a expressar emoções e vivenciar experiências afetivas
(Carvalho & Guimarães, 2002; Ladd & Hart, 1992; Ladd,
Kochenderfer & Coleman, 1996).
Os comportamentos sociais podem ser manifestados
de forma positiva ou negativa. Manifestações positivas
são chamadas comportamentos pró-sociais e incluem
requisições, gratificações, presentes. Manifestações
negativas são denominadas comportamentos anti-sociais
que incluem agressões, censuras, ameaças, roubos.
De acordo com Ladd (1999) a forma pela qual as
crianças constroem seus relacionamentos tem grande
impacto sobre todo seu desenvolvimento. É na relação
com seus pares que a criança aprende a dividir, a aguardar
a vez e as melhores formas de respeitar e interagir com
o outro (Hartup, 1996).
Pesquisas sobre as relações interpessoais na infância
tiveram grande ênfase a partir de 1930, quando cientistas
sociais iniciaram estudos sobre grupos de crianças e
associação entre características sociais e posição
ocupada no grupo. Esse interesse se manteve em alta
até 1950 e durante os quinze anos seguintes não foi destacado. A partir de 1960 o tema voltou à tona com grande
destaque e a partir dos anos 70 as pesquisas se
intensificaram, sobretudo no que diz respeito ao papel
essencial que possui o relacionamento com colegas ou
iguais, no processo de socialização, na competência
interpessoal e no ajustamento social em longo prazo
(Ladd, 1999).
Miller-Johnson, Coie, Maumary-Gremaud e Bierman
(2002) destacam que pesquisas sobre comportamentos
sociais interessam tanto à área clinica quanto à do desenvolvimento. Kern (2001) justifica o interesse de educadores a partir da observação que muitos escolares
não exibem habilidades e repertórios comportamentais
necessários para que obtenham sucesso em situações
acadêmicas e sociais na escola.
Miller-Johnson e colaboradores (2002) estudaram o
comportamento social no desenvolvimento infantil e
concluíram que a agressividade é menos comprometedora do comportamento social do que a rejeição dos
colegas. Em contrapartida, o comportamento pró-social
Laura Fogaça Saud e Josiane Maria de F. Tonelotto
é menor em crianças que se apresentaram como agressivas e rejeitadas. Além disso, observaram que os
meninos apresentaram maior nível de agressão e as
meninas apresentaram-se como mais competentes
socialmente.
Wentzel e Caldwell (1997) estudaram o comportamento social de escolares, relacionando-os com gênero.
Verificaram que comportamentos anti-sociais têm maior
estabilidade no tempo, quando comparados com os comportamentos pró-sociais. Meninos apresentaram maior
número de comportamentos anti-sociais e as meninas
maior número de comportamentos pró-sociais. Além disso, verificaram correlação significativa negativa entre
agressividade e comportamentos pró-sociais.
Lewin, Davis e Hops (1999) apresentaram resultados
de um estudo com meninos e meninas a respeito de
preditividade do comportamento anti-social. Concluíram
que para as meninas o maior preditivo de comportamento anti-social é a presença de problemas de
escolaridade, enquanto para os meninos é a rejeição por
parte dos colegas.
A presença de hiperatividade pode favorecer comportamentos anti-sociais e habitualmente está acompanhada de impulsividade, imaturidade e agressividade,
e este conjunto de comportamentos produz impactos
negativos sobre a aceitação da criança por seus pais,
colegas e professores (Merrel, 2001). A maior incidência
de exibição de comportamentos hiperativos no gênero
masculino é apresentada em diversos estudos (BibouNakou, Kiosseoglou & Stogiannidou, 2002; Lindsay &
Dockrell, 2000).
Conforme afirma Topczewski (1999) há uma predominância nítida de sintomas hiperativos para o gênero
masculino, que chega à razão de 4:1. Embora a
hiperatividade se apresente de forma semelhante em
ambos os gêneros, o componente agressivo é a
característica que se evidencia mais no gênero masculino. Para Rohde e Benczik (1999) a proporção de 4:1 é
baseada em estudos realizados em serviços de saúde
mental, afirmando que na realidade a proporção é de
dois meninos para uma menina. Os resultados que privilegiam o gênero masculino baseiam-se no fato de que
as meninas costumam apresentar mais sintomas com
predomínio de desatenção, enquanto os meninos apresentam maiores problemas de comportamento. Assim,
por incomodarem mais, os meninos são mais
encaminhados para atendimento especializado.
Os comportamentos anti-sociais associados aos pro-
Comportamento social na escola: diferenças entre gênero e séries
blemas de desempenho acadêmico foram estudados por
Mcevoy (2000) que encontrou uma correlação
significativa e positiva entre ambos, concluindo que o
comportamento anti-social é um fator preditivo de baixo
desempenho escolar. Kashani e Orvaschel (apud
Marcelli, 1998) mencionam ainda outro fator ligado aos
comportamentos anti-sociais que interferem nas
situações escolares: são os estados ansiosos. A ansiedade, quando presente, tanto na criança pequena quanto
quando se torna mais velha, pode resultar em condições
negativas de relacionamento causadas mais freqüentemente pela angústia de separação patológica, que predomina no gênero feminino.
Sintomas emocionais constituem-se em fatores que
interferem na manifestação adequada dos comportamentos sociais. De acordo com o DSM-IV (1994);
surgem em decorrência de fatores estressores identificáveis, trazendo prejuízos para a vida familiar, acadêmica
e social. Manifestam-se sob a forma de depressão, choro,
impotência, inquietação, ansiedade, retraimento social e
queixas somáticas.
Segundo Grunspun (1999) os sintomas emocionais
se constituem na apresentação de queixas somáticas ou
sintomas físicos que incomodam a criança e a família.
Eles não são explicados por causas físicas/orgânicas e
a dimensão psicológica é prevalente. Nas crianças e
adolescentes, as queixas mais comuns são sintomas
dolorosos: dor de cabeça, dor no ouvido, dor de garganta,
dor de estômago, dor de barriga, dor ao urinar, dor nas
pernas, que são mais prevalentes no gênero feminino.
Avaliar o comportamento social não se constitui em
tarefa simples principalmente pela complexidade relativa
ao tema. No Brasil essa dificuldade é maximizada pelo
fato de faltar estímulos para construção de instrumentos
adequados e voltados para nossa realidade. Merecem
destaques os trabalhos de Del Prette e Del Prette (1999;
2001) referentes a revisões teóricas e construção de
instrumentos de medidas.
Em 1994 Robert Goodman, psiquiatra inglês, elaborou um questionário denominado Strengths Difficulties
Questionnaire (SDQ), que avalia desordens psiquiátricas relacionadas ao comportamento social. Sua finalidade
é medir comportamentos sociais adequados
(capacidades) e não adequados (dificuldades) em
crianças e adolescentes, na faixa etária de 3 a 16 anos.
O primeiro estudo de validação apresentado por
Goodman (1997) foi realizado com 403 crianças e adolescentes ingleses (4 a 16 anos), com e sem
49
acompanhamento psiquiátrico. Os resultados obtidos
foram comparados com os resultados do Questionário
de Rutter (já padronizado) e se verificou alta correlação
entre os resultados de ambos.
As vantagens na utilização do SDQ foram evidenciadas, principalmente em relação à formatação mais
compacta, maior focalização das capacidades e dificuldades, melhores informações sobre dificuldades de
atenção/hiperatividade, relação com colegas e comportamento pró-social. Além disso, o SDQ possibilita
avaliação de pais e professores em versões semelhantes
à utilizada com a criança e/ou adolescente.
O SDQ é um instrumento proposto inicialmente para
avaliar desordens psiquiátricas relacionadas ao comportamento social em crianças e adolescentes. Foi
padronizado e validado, suas capacidades psicométricas
foram destacadas, tanto para utilização com populações
de alto risco quanto de baixo risco de perturbações
psiquiátricas. É um instrumento novo e tem sido traduzido para diversos idiomas e utilizado com satisfatoriedade
em muitos países, com finalidade de avaliação clínica,
de identificação de traços, em estudos epidemiológicos
e principalmente com finalidade de pesquisa (Adams &
Snowiling, 2001; Bilanakis & colaboradores. 2000; Cury
& Golfeto, 2003; Diário de Navarra, 2000; Division of
Psychiatry-School of Community Health Sciences, 2000;
Fleitlich, Cortazár & Goodman, 2000; Garcia, Mazaira
& Goodman, 2000; Goodman, 1997; Goodman, 2001;
Goodman & colaboradores, 2000; Goodman & Scott,
1999; Goodman, Meltzer & Bailey, 1998; Goodman,
Renfrew & Mullick, 2000; Hepper & Garralda, 2001;
Klasen & colaboradores 2000; Koskelainen, Sourander
& Vauras, 2001; Lindsay & Dockrell, 2000; McMunn
& colaboradores 2001; Mathai, Anderson & Bourne,
2002; Saud & Tonelotto, 2002; Smedje, Broman & Hetta,
2001; Smedje & colaboradores, 1999; Thabet, Stretch
& Vostanis, 2000; Vostanis & colaboradores, 2001).
A maioria dos estudos publicados com o SDQ ainda
se refere à sua validação, grau de confiabilidade e
fidedignidade, sendo que as publicações com dados de
pesquisa, para que se efetuassem comparações mais
esclarecedoras ainda estão sendo produzidos (Fleitlich,
Cortazar & Goodman, 2000).
No Brasil, publicações sobre a utilização do SDQ são
ainda incipientes. Fleitlich e colaboradores (2000)
apontaram para pontos positivos da utilização do
“Suplemento de Impacto, que detalha há quanto tempo
as dificuldades do comportamento existem, e o quanto
Psicologia Escolar e Educacional, 2005 Volume 9 Número 1 47-57
50
Laura Fogaça Saud e Josiane Maria de F. Tonelotto
interferem no cotidiano familiar e escolar, concluindo que
seu uso leva a uma melhora importante do instrumento.
Cury e Golfeto (2002) utilizaram o SDQ numa pesquisa com 119 crianças (63% meninos e 37% meninas) provenientes de uma escola pública, com média de idade
igual a 8,18 e seus respectivos pais. Observaram pontuações elevadas e resultados considerados anormais para
sintomas emocionais (17,7%), hiperatividade (16,8%) e
para pontuação do total de dificuldades (18,7%).
Diante de todas as considerações apresentadas, o
objetivo principal dessa pesquisa foi explorar um
instrumento novo para avaliar o comportamento social
(dificuldades e capacidades), num grupo de escolares, e
verificar a presença de possíveis diferenças entre gêneros
e séries cursadas.
MÉTODO
Situação
Os dados da presente pesquisa foram coletados numa
escola de ensino infantil, fundamental e médio da rede
particular de ensino, situada numa cidade do Vale do
Paraíba, Estado de São Paulo. Freqüentam a escola
aproximadamente 1.980 (mil novecentos e oitenta)
alunos, distribuídos em salas de Educação Infantil, Ensino
Fundamental (1a a 8a série) e Ensino Médio (Comum e
Informática). Os alunos estão na faixa etária aproximada
de dois (dois) a 18 (dezoito) anos.
Participantes
Escolares - Dos 140 alunos convidados (3a e 4a
séries), 41 foram autorizados pelos seus responsáveis a
participar, sendo 24 do gênero feminino e 17 do gênero
masculino. Vinte e um participantes freqüentavam a terceira série (14 do gênero feminino e 7 do gênero
masculino) e vinte participantes freqüentavam a quarta
série (10 do gênero masculino e 10 do feminino). Os
escolares apresentaram uma média de idade de nove
anos e 6 meses.
Material
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido utilizado com a finalidade de fornecer informações a
respeito dos objetivos da pesquisa e a forma de
participação, além de assegurar o caráter sigiloso de
tratamento das informações obtidas.
Questionário de Capacidades e Dificuldades
(SDQ) (Goodman, 1999a) - O questionário apresenta três
versões, indicadas para serem respondidas pelos alunos,
seus pais ou responsáveis e por professores. Apresenta
inicialmente instruções para preenchimento (comportamento da criança com base nos últimos seis meses) e
dados identificação (iniciais e data de nascimento). As
questões são objetivas, distribuídas, respectivamente, por
escalas. O questionário é composto por 25 (vinte e cinco)
itens contidos em 5 (cinco) escalas: Sintomas Emocionais,
Problemas de Conduta, Hiperatividade, Problemas de Relacionamento com Colegas e Comportamento Pró-Social.
As alternativas para resposta são expostas em cada
questão, e apresentam como opções: falso, mais ou menos
verdadeiro e verdadeiro.
O instrumento possui uma segunda parte, somente
para os pais e professores, denominada Suplemento de
Impacto, com cinco (cinco) questões. Nesse estudo a
escala de impacto não foi utilizada por reconhecer-se
que se trata de dados que interessam mais a estudos
epidemiológicos ou com populações de risco, proposta
pelo autor posteriormente à criação da escala, como
acessório para melhor identificação do grau de dificuldades sociais.
Procedimento
Coleta de dados
A Escola foi informada da intenção de se realizar
uma coleta de dados em suas dependências, e para isso
foi formulada uma carta-pedido, solicitando autorização
para a realização do estudo junto aos alunos, professores e pais. Após a anuência dos diretores, outra cartapedido foi encaminhada aos pais dos alunos, solicitando
autorização e contendo informações e explicações sobre
o objetivo da pesquisa. Após autorização dos pais, quanto
ao envolvimento dos filhos na coleta de dados a mesma
foi posta em andamento.
Foram incluídas na coleta de dados, crianças de duas
turmas de cada série, ou seja, alunos que estavam
cursando a 3a série A e B e a 4a série A e B do ensino
fundamental. No total de alunos, somando-se as quatro
turmas, foram distribuídas 140 cartas-convite aos pais
ou responsáveis, contendo o termo de consentimento
livre e esclarecido. Retornaram, ao todo, 41 autorizações desta forma. A pesquisa foi realizada tendo como
participantes estes 41 alunos.
Comportamento social na escola: diferenças entre gênero e séries
A aplicação dos questionários dos alunos ocorreu em
sessão coletiva que foi organizada e realizada pela pesquisadora. Após uma conversa informal com os participantes, foram oferecidas informações necessárias para
que o questionário fosse respondido. Iniciada a aplicação e ao término dela não foram manifestadas dificuldades no preenchimento do questionário.
Análise dos dados
Os dados foram descritos e analisados por meio de provas estatísticas que oportunizaram a obtenção de
freqüências, comparação de médias e análise de correlação.
As cinco escalas que compõem o instrumento, quatro
de dificuldades (sintomas emocionais, problemas de
conduta, hiperatividade e problemas de relacionamento
com colegas) e de capacidades (comportamento prósocial) foram pontuadas (25 itens), e em seguida obtevese a Pontuação Total de Dificuldades conforme definido
por Goodman, 1999. Para a interpretação da pontuação
obtida em capacidades e dificuldades Goodman (1999)
definiu três categorias: normal, limítrofe e anormal.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise das pontuações gerais, normais, limítrofes
e anormais em relação às dificuldades, conforme apresentação na Figura 01, revelou que quanto aos sintomas
51
emocionais, que apenas escolares do gênero feminino,
tanto da terceira quanto da quarta série, pontuaram na
indicação limítrofe.
Pode-se, desta forma, observar que as meninas demonstram uma maior tendência a introjetar as dificuldades e
somatizá-las, quando comparadas suas respostas com as
dos meninos. Estes dados são compatíveis com os achados
na literatura a respeito de sintomas emocionais, conforme
afirmações de Marcelli (1998) e Grunspun (1999).
A observação de maior pontuação para sintomas
emocionais, por parte de escolares do gênero feminino pode
relacionar-se à possibilidade deste fato refletir características do meio cultural do tipo de sociedade em que os participantes estão inseridos, que provavelmente permita à
menina exibir maior número de queixas do que os meninos.
Não se pode desconsiderar que a aprendizagem das
regras sociais pelas meninas ocorre de forma diferenciada que para os meninos. Os pais ainda mantêm algumas regras diferenciadas para educar meninos e
meninas. Meninos são criados para serem fortes e
desaconselha-se que demonstrem seus sentimentos. Às
meninas permitem-se maiores comportamentos
emotivos e maior expressão de sentimentos. Desta forma há uma propensão em se criar formas de atuação
diferenciada para meninos e meninas, bem como de
comportamentos diferenciados para ambos de acordo
com o que afirmam Fontana (1991), Del Prette e Del
Prette (1999), Trad (1999) e Bierman (2001).
SEXO: feminino
10
8
6
4
2
0
SEXO: masculino
10
8
6
4
2
0
N orm al
Lim ítrofe
S E R IE : terc eira
A norm al
N orm al
Lim ítrofe
A norm al
S E R IE : quarta
Figura 01 – Distribuição dos participantes de acordo com as pontuações
normais, limítrofes e anormais em sintomas emocionais no SDQ, de
acordo com gênero e com a série.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005 Volume 9 Número 1 47-57
52
Laura Fogaça Saud e Josiane Maria de F. Tonelotto
Em relação aos resultados obtidos em problemas de
comportamento ou de conduta, conforme dados da Figura 02, os resultados na categoria normal são mais evi-
externalizados e avaliados como inadequados ou mesmo
agressivos que são mais característicos do gênero
masculino.
14
SEXO: feminino
12
10
8
6
4
2
0
SEXO: masculino
14
12
10
8
6
4
2
0
N o rm a l
L im ítro fe
A n o rm a l
N o rm a l
S E R IE : te rc e ira
L im ítro fe
A n o rm a l
S E R IE : q u a rta
Figura 02 – Distribuição dos participantes de acordo com as pontuações
normais, limítrofes e anormais em problemas de conduta no SDQ de
acordo com gênero e série.
denciados por escolares do gênero feminino da terceira
série, sendo que resultados anormais são mais observados
para escolares do gênero masculino da quarta série.
De acordo com os dados apresentados na Figura 02,
é possível observar que enquanto as meninas da quarta
série apresentaram maiores índices em sintomas
emocionais, os meninos desta série apresentaram
maiores índices em problemas de comportamento ou
conduta. Estes achados estão de acordo com os achados
relatados por Miller-Johnson e colaboradores (2002) e
Wentzel e Caldwell (1997) quanto aos comportamentos
Neste aspecto também é possível observar a
influência da cultura e da sociedade na forma diferenciada de educar meninos e meninas, permitindo número
maior de comportamentos agressivos aos meninos, o que
pode ser determinante para a observação das diferenças (Bierman 2001; Del Prette & Del Prette, 1999;
Fontana, 1991; Tradd, 1999).
Em hiperatividade, as pontuações normais foram
mais freqüentes para todos os escolares, mas
observaram-se alguns dados que revelam a ocorrência
de pontuações normais mais freqüentes em escolares
14
SEXO: feminino
12
10
8
6
4
2
0
SEXO: masculino
14
12
10
8
6
4
2
0
N o rm a l
L im ítro fe
S E R IE : te rc e ira
A n o rm a l
N o rm a l
L im ítro fe
A n o rm a l
S E R IE : q u a rta
Figura 03 – Distribuição dos participantes de acordo com as pontuações
normais, limítrofes e anormais em hiperatividade no SDQ de acordo com
gênero e série.
Comportamento social na escola: diferenças entre gênero e séries
do gênero feminino da terceira série, e quanto à pontuação anormal as freqüências são semelhantes para
escolares do gênero masculino da terceira e quarta
séries, e para o gênero feminino da quarta série.
Os resultados apresentados na Figura 03 apontam
para uma tendência, por parte dos meninos, a exibir mais
comportamentos ditos “inadequados” socialmente do que
as meninas, mas as meninas da quarta série foram as
que também pontuaram mais, confirmando que podem
estar vivendo uma fase que está favorecendo o aparecimento de sintomas. É preciso considerar que fatores
53
opinião de Topczewski (1999), Rohde e Benczik (1999),
Dumas e Pelletier (1999) e Lindsay e Dockrell (2000).
Em problemas de relacionamento com colegas,
também se constatou que as pontuações normais foram
mais freqüentes para todos os escolares, porém foi possível perceber que um maior número de resultados normais
foi detectado em escolares da terceira série com predomínio do gênero feminino, e que resultados anormais estiveram
mais presentes em escolares da quarta série, de ambos os
gêneros. Novamente o grupo de escolares da quarta série
foi o que apresentou maior número de pontuações anormais.
SEXO: feminino
12
10
8
6
4
2
0
SEXO: masculino
12
10
8
6
4
2
0
N o rm a l
L im ítro fe
A n o rm a l
N o rm a l
L im ítro fe
A n o rm a l
S E R IE : q u a rta
S E R IE : te rc e ira
Figura 04 – Distribuição dos participantes de acordo com as pontuações
normais, limítrofes e anormais em problemas de relacionamento com
colegas no SDQ de acordo com gênero e série.
como a ansiedade e a expectativa frente à próxima etapa escolar, a 5ª série, possam ser determinantes para os
resultados encontrados. A hiperatividade é uma
característica essencialmente masculina conforme a
Na Figura 04 é apresentada uma análise das pontuações gerais, normais, limítrofes e anormais em relação às
capacidades no que se refere ao comportamento prósocial. Observa-se que as pontuações normais foram
16
14
12
10
8
6
S E X O : fe m in in o
4
2
0
16
14
12
10
8
6
4
SE XO : m ascu
2
0
N o rm a l
L im ítro fe
S E R IE : te rc e ira
N o rm a l
L im ítro fe
S E R IE : q u a rta
Figura 05 – Distribuição dos participantes de acordo com as pontuações
normais, limítrofes e anormais em comportamento pró-social no SDQ de
acordo com gênero e série.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005 Volume 9 Número 1 47-57
54
Laura Fogaça Saud e Josiane Maria de F. Tonelotto
registradas para a maioria dos escolares independentemente de gênero e de série, apesar de ter-se detectado que a maior quantidade de resultados normais foram
obtidos por escolares da terceira série.
Dados da Tabela 01 permitem que sejam comparadas
as médias obtidas pelos escolares em comportamentos
sociais de acordo com o gênero. Diferenças foram
encontradas em sintomas emocionais com médias
superiores para o gênero feminino. Além disto, são apresentados dados referentes aos comportamentos
sociais de acordo com a série. Observaram-se diferenças entre problemas de comportamento ou conduta,
problemas de relacionamento com os colegas, total de
dificuldades e comportamento pró-social.
as meninas se apresentaram como mais competentes
socialmente. Além disso, no estudo de Adams e
colaboradores (1999) verificou-se que as meninas apresentaram maior número de problemas no relacionamento
com os colegas, fato não observado no presente estudo.
De forma geral os participantes fizeram uma autoavaliação positiva em relação ao comportamento prósocial. De 41 participantes de terceira e quarta série do
ensino fundamental, 17 eram do gênero masculino e 24
do gênero feminino, detectou-se uma média 9,0 para o
gênero feminino e 8,11 para o gênero masculino, sendo
que a 3a série obteve média 9,42 e a 4a série uma média
7,8, conforme mostrou a tabela 4, com diferença
significativa entre médias em relação à série, o que vale
Tabela 01 – Comparação das médias obtidas pelos participantes de acordo com o gênero e de acordo com a
série em dificuldades sociais no SDQ, utilizando-se o teste t de student.
Sintomas
emocionais
Gênero
FEM
MAS
4,56
2,81
Análise estatística
Série
a
Análise estatística
a
3.
3,5
4.
4,21
1,9
3,65
t= -0,39
p=0,694
t= -0,71
p=0,476
2,9
4,1
1,9
3,1
t=2,4
p=0,021*
p<0,05
t= -1,44
p=0,157
Problemas de
conduta
2,37
3,37
Hiperatividade
3,37
3,64
Problemas de
relacionamento
com os colegas
Total de
dificuldades
2,30
2,75
13,04
12,07
t=0,58
p=0,564
10,56
14,66
nove
8,11
t=1,834
p=0,074
9,42
7,8
Comportamento
Pró – social
Os resultados apresentados na Tabela 1 corroboram
os encontrados nos estudos de Marcelli (1998) e
Grunspun (1999). Em relação ao gênero masculino, os
resultados não acompanham o que traz a literatura,
quando apontam para maior freqüência de hiperatividade
e problemas de comportamento ou conduta para este
gênero (Bibou-Nakou, Kiosseoglou & Stogiannidou,
2001; Lindsay & Dockrell, 2000; Miller-Johnson &
colaboradores, 2002; Rohde & Benczik, 1999;
Topczewski, 1999; Wentzel & Caldwell, 1997).
Para comportamento pró-social não foram observadas
diferenças quanto ao gênero. Esses resultados contrastam
com os resultados apresentados por Adams e colaboradores
(1999) e Miller-Johnson e colaboradores (2002), no quais
t= -0,930
p=0,35
t= -2,745
p=0,009*
p<0,05
t= -1,834
p=0,742
t= -2,075
p=0,044*
p<0,05
t= -2,683
p= 0,0111*
p<0,05
t= 3,881
p=0,0003*
p<0,05
dizer que os escolares de terceira série se auto-avaliaram como mais “hábeis” socialmente.
Neste aspecto, não podemos desconsiderar que a
idade cronológica, mesmo que tendo uma diferença em
linhas gerais de apenas um ano, pode influenciar no julgamento de si mesmo e na forma de perceber-se em
relação ao ambiente, neste enfoque poderemos
mencionar o processo de autoconceitos que se
encontram de alguma forma mais elaborados, e assim,
as autodescrições tornam-se mais equilibradas, e a atribuição de valores positivos ou negativos aos próprios
atributos pessoais tornam-se mais consistentes, envolvendo uma auto-avaliação mais “amadurecida”,
conforme citado em Newcombe (1999).
Comportamento social na escola: diferenças entre gênero e séries
55
Cabe ainda, uma ressalva de extrema importância
para os achados do presente estudo. Apesar da
importância dos resultados encontrados e das relações
com a literatura consultada, não se pode esquecer que o
número de participantes é muito pequeno para que sejam
permitidas generalizações. Além disto, o número reduzido
de participantes pode ter influenciado de forma
significativa os resultados obtidos.
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Recebido em: 04/05/05
Revisado em: 08/06/05
Aprovado em: 14/06/05
Endereço para correspondência:
Laura Fogaça Saud: Av. Granadeiro Guimarães, nº 46 – Centro – CEP: 12020-130 – Taubaté – SP
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Psicologia Escolar e Educacional, 2005 Volume 9 Número 1 47-57
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1 59-70
RELAÇÃO ENTRE CRIATIVIDADE, INTELIGÊNCIA E AUTOCONCEITO EM
ALUNOS MONOLÍNGÜES E BILÍNGÜES
BILINGÜISMO E CRIATIVIDADE
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça 1
Denise de Souza Fleith2
Resumo
Este estudo teve como objetivo estudar a relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos bilíngües e monolíngües. Participaram
deste estudo 269 alunos, do gênero masculino e feminino, adolescentes e adultos, de uma instituição particular de ensino de língua inglesa, localizada
em Brasília. Os instrumentos utilizados foram o Teste Torrance de Pensamento Criativo - TTCT, Teste Não-Verbal de Raciocínio para Adultos TNVRA e Escala Fatorial de Autoconceito - EFA. Os alunos bilíngües apresentaram escores superiores nas medidas de criatividade verbal e figurativa
e de inteligência quando comparados aos alunos monolíngües. Os resultados indicaram, ainda, que os alunos do gênero masculino apresentaram
escores superiores aos do gênero feminino apenas na medida de originalidade verbal. Não foram observadas diferenças entre adolescentes e adultos
em relação à criatividade, inteligência e autoconceito. Foi observada uma correlação positiva entre criatividade e autoconceito para alunos
bilíngües.
Palavras-chave: Criatividade; Inteligência; Autoconceito; Bilingüismo.
RELATIONSHIP BETWEEN MONOLINGUALS AND BILINGUALS’
CREATIVITY, INTELLIGENCE, AND SELF-CONCEPT
Abstract
This study aimed at analyzing the relationship between creativity, intelligence and self-concept with bilingual and monolingual students. The
study had the participation of 269 students, male and female, adolescents and adults from a private English Binational Center in Brasília. The
instruments used included the Torrance Test - TTCT, the TNVRA, a Non-Verbal Intelligence Test, and a Self-concept Factorial Scale - EFA. Higher
scores in verbal and figural creativity and intelligence were obtained by bilingual students when compared to monlingual students. The results also
indicated that male sytudents presented higher scores than female students in verbal originality measure. No differences were observed between
adolescents and adults concerning creativity, intelligence and self-concept. A positive correlation was observed between creativity and self-concept
for bilingual students.
Keywords: Creativity; Intelligence; Self-concept; Bilinguals
INTRODUÇÃO
A
linguagem é, inquestionavelmente, a faculdade
de maior complexidade da mente humana (Genesee,
2001). A compreensão de como a linguagem é adquirida
tem se constituído em um desafio de imensas proporções
para pesquisadores e teóricos por mais de cinqüenta anos.
1
(Bates & Mac Whinney, 1987; Chomsky, 1997; Diaz,
1983; Mac Whinney, 1997; Pinker, 1994).
O aprendizado de uma segunda língua predomina na
maioria dos países industrializados. Com o mundo cada
vez mais globalizado, com o desenvolvimento mais rápido
Mestra pelo Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento.
Ph.D. em Psicologia Educacional e docente do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento do Instituto de Psicologia da
Universidade de Brasília.
2
60
de novas tecnologias, maior será a necessidade de aprendizado de uma segunda língua, a fim de favorecer o
intercâmbio econômico e social. Neste sentido, vários
estudos têm investigado a relação entre a proficiência
em duas línguas e diversas variáveis cognitivas e afetivas
(Fleith, Renzulli & Westberg, 2002; Lambert, Just &
Segalowitz 1970; Landry, 1974; Doyle, Champagne &
Segalovitz, 1978; Wang, 1982; Diaz, 1983; Koulos, 1986;
Kessler & Quinn, 1987; Branccini & Cianchi 1993).
Diversos têm sido os aspectos considerados nos estudos
da linguagem, como: o aprendizado da linguagem de
crianças e adultos, o aprendizado de uma primeira e uma
segunda língua, o aprendizado da linguagem oral e de
sinais e o aprendizado apenas de uma língua ou de muitas
línguas.
Além disso, as investigações sobre a aprendizagem
de mais de uma língua nos possibilita explorar os limites da linguagem na mente humana. Os seres humanos
estão singularmente preparados para a aquisição desta capacidade mais complexa (Pinker, 1994). Alguns
teóricos, como Chomsky (1997), defendem que esta
capacidade única da linguagem reside em um módulo
específico e inato no cérebro humano. Outros afirmam
que a linguagem é resultado da aplicação de mecanismos de aprendizagem ao domínio específico da linguagem (Bates & MacWhinney, 1987). O que de certo
sabemos é que muitos pesquisadores ainda buscam
uma melhor compreensão do processo de aprendizagem de duas ou mais línguas e suas implicações
(MacWhinney, 1997).
Por décadas, os pesquisadores têm investigado, por
exemplo, a relação entre a habilidade de expressão oral
ou escrita em duas línguas diferentes, também chamado
de bilingüismo, e a criatividade (Baker, 2001; Colina,
2002; Fleith, 1999; Hamers & Blanc, 2000; Kloosterman,
1997; Lopez, 2003; Martorell, 2000; Noels, Pelletier,
Clément & Vallerand, 2000; Ricciardelli, 1992). Diversos autores têm encontrado resultados que indicam uma
influência positiva do bilingüismo no desenvolvimento da
criatividade. Martorell (2000), por exemplo, investigou
a ligação entre a linguagem e expressão criativa e
concluiu que “o bilingüismo não é o único fator, mas um
fator benéfico e forte no desenvolvimento da
criatividade” (p. 95). Também Lasagabaster (2000)
afirmou que “no que diz respeito à relação entre
bilingüismo e criatividade, a maioria dos estudos são
semelhantes em afirmar que o bilingüismo aumenta a
criatividade” (p. 214).
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça e Denise de Souza Fleith
Segundo Lindholm (1995), “um número de estudos
foram conduzidos com crianças bilíngües mostrando que,
intelectualmente, as experiências de crianças fluentes
em mais de uma língua parecem resultar em flexibilidade
mental, superioridade na formação de conceitos e um
conjunto de habilidades mentais mais diversificado” (p.
274). Além disso, Baker (2001) ressaltou que:
As evidências sugerem que os bilíngües equilibrados,
isto é, aqueles que possuem habilidades na língua
materna, também denominada de L1, na mesma
proporção que na segunda língua (L2), possuem
habilidades de pensamento divergente superiores,
se comparados com bilíngües com habilidades não
equilibradas ou monolíngües. (p. 147)
Outras comparações entre crianças bilíngües e
monolíngües, como também comparações de crianças
bilíngües em diversos níveis de desenvolvimento, indicam
que o bilingüismo pode resultar em um desempenho
superior em várias habilidades intelectuais (Diaz, 1983).
Estas habilidades podem incluir o desempenho nos testes de inteligência, de análise de padrões visuais abstratos
e medidas de conscientização metalingüística. Apesar
das controvérsias no que diz respeito às condições sob
as quais estas vantagens em relação ao bilingüismo
ocorrem, como também aos mecanismos causadores
específicos, os pesquisadores concordam que os efeitos
observados são reais (Cummins, 1976; Diaz, 1985;
Hakuta, 1986).
As primeiras pesquisas sobre os efeitos do bilingüismo no desenvolvimento mental, ou na inteligência, datam do início do século 20 quando começaram a ser
utilizados os testes de QI e se intensificou o debate sobre
a política de imigração americana. Nesta época, os
pesquisadores acreditavam que o bilingüismo poderia
resultar em retardo mental, além de produzir diversas
outras conseqüências negativas (Hakuta, 1986). Com
base em resultados de pesquisas até o final da década
de 70, ficou evidente que as afirmações sobre o impacto
negativo do bilingüismo foram alarmistas e
fundamentadas, primariamente, no preconceito social em
relação aos novos imigrantes.
Por mais de trinta anos, observou-se um consenso,
entre os chamados construtivistas sociais, de que a
linguagem desempenhava um papel fundamental na
construção da identidade ou do autoconceito (May, 2001;
Shotter & Gergen, 1989). Este aspecto refletia um ponto
Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngües e bilíngües
de vista diferente acerca da importância da linguagem e
de como ela funcionava nas interações rotineiras. Ao
invés de considerar a linguagem como apenas uma ferramenta de representação de um mundo já existente ou
um instrumento de comunicação, os construtivistas
sociais apontam para as funções alternativas da
linguagem. Para estes teóricos, a linguagem é central
para a compreensão da identidade. Estes autores
chamavam a atenção para o fato de que, através da
linguagem, o sujeito poderia construir e desenvolver a
sua subjetividade de forma dinâmica. Portanto, a
linguagem apresenta um papel ativo no desenvolvimento
do indivíduo, não apenas como sua ferramenta, mas como
parte deste processo, proporcionando um auxílio na
construção do conceito que o indivíduo possui de si
mesmo.
A partir do século 20, educadores e psicólogos
(Brown, 1991; Cambourbe, 1993; Fiske, 1991; Harste,
1994; Resnik & Klopfer, 1989) passaram a valorizar a
educação como um processo que poderia contribuir para
a interação entre o indivíduo e o seu meio social, além
de reconhecerem a importância de se desenvolver
habilidades de construção de idéias novas e produtivas
para a solução de problemas e desafios emergentes.
Para Toffler (1990), já no século 21, os indivíduos com
um bom nível de educação necessitarão criar redes de
conhecimento e utilizar novos idiomas, imagens e
relações. Reich (1991) enfatizou também a importância
da análise simbólica, que permite ao indivíduo definir
problemas, assimilar dados, deduzir, induzir e encontrar
soluções para os problemas. O aprendizado passou a
ser visto como um processo construtivo, no qual os
alunos constróem o seu próprio conhecimento. Portanto,
cada aprendiz cria uma estrutura cognitiva única, diferente de todos os outros e completa de associações
pessoais.
Com um demanda crescente de alunos com a
necessidade de aprendizagem de uma segunda língua,
especialmente a língua inglesa, a importância deste estudo
reside na construção de um perfil deste aluno, adolescente e adulto brasileiro, no que diz respeito às relações
entre características cognitivas e afetivas deste indivíduo
e o processo de aprendizagem de uma segunda língua.
Além disso, poucos são os estudos dos efeitos do
aprendizado de uma segunda língua em nosso país, se
compararmos com os estudos sendo realizados em alguns
países, mais especificamente nos Estados Unidos
(Mendonça, 2003).
61
O atual conhecimento e compreensão do processo
de aprendizagem de uma segunda língua e o impacto
resultante deste aprendizado estão longe de ser
concluídos, mas o conhecimento existente aumentou
substancialmente nos últimos trinta anos. Este
conhecimento sobre o aprendizado de uma segunda
língua não pode ser totalmente separado dos avanços
em relação à compreensão geral existente entre
linguagem e aprendizagem. Também, como apresentado
por Graddol e Meinhof (1999), devemos estar cada vez
mais atentos à natureza da educação bilíngüe implementada em diversos países, inclusive no Brasil, uma vez
que a língua inglesa se espalha mundialmente, cada vez
mais rapidamente, como uma língua internacional, e não
mais como a língua mãe ou mestre.
Portanto, o presente estudo visou investigar a relação
entre criatividade, inteligência e autoconceito de alunos
bilíngües e monolíngües. Neste estudo, o bilingüismo é
compreendido como o domínio de uma segunda língua,
neste caso específico, a língua inglesa, mas sem que
aqueles que a dominam necessitem utilizá-la para o
funcionamento em contextos diários de comunicação
(Valdes & Figueroa, 1994). As questões de pesquisa
investigadas foram:
1. Existem diferenças entre alunos bilíngües e
monolíngües em relação à criatividade, inteligência
e autoconceito?
2. Existem diferenças entre alunos do gênero
masculino e feminino em relação à criatividade,
inteligência e autoconceito?
3. Existem diferenças entre alunos adolescentes e
adultos em relação à criatividade, inteligência e
autoconceito?
4. Existe interação entre nível de proficiência em
uma segunda língua, gênero e faixa etária em
relação à criatividade, inteligência e autoconceito?
5. Existe relação entre criatividade, inteligência e
autoconceito de alunos bilíngües e monolíngües ?
MÉTODO
Delineamento
Um delineamento fatorial 2x2x2 foi utilizado neste
estudo (Gall, Borg & Gall, 1996). As variáveis
independentes foram gênero (masculino e feminino),
nível de proficiência em uma 2a língua (bilíngues e
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
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monolíngues) e faixa etária (adolescentes e adultos). As
variáveis dependentes investigadas foram criatividade,
inteligência e autoconceito. Um delineamento
correlacional foi posteriormente empregado para
examinar a existência de relação entre criatividade,
inteligência e autoconceito de alunos bilíngües e
monolíngües.
Participantes
Participaram deste estudo 269 alunos de um
Centro Binacional Inglês-Português, instituição particular
de ensino de língua inglesa, localizada em Brasília,
Distrito Federal. Os alunos que freqüentam este centro
binacional são provenientes de nível sócio-econômico
médio e médio-alto. A idade média dos participantes do
estudo era de 22,41 anos, variando entre 14 e 57 anos.
Cento e vinte e um alunos eram do gênero masculino
(45%) e 132 do gênero feminino (49,1%).
Do total de alunos participantes, 190 estavam
matriculados no último semestre do curso avançado de
inglês e possuíam, no mínimo, 5 anos de estudo da língua
inglesa. Os alunos que atingem este nível possuem
proficiência em inglês nas habilidades escrita e oral,
sendo considerados neste estudo como bilíngües. Tal
proficiência é testada através de quatro testes escritos
e dois testes orais realizados ao longo do semestre. A
idade média destes alunos era de 20,93 anos, variando
entre 15 e 57 anos. Setenta e quatro alunos (38,9%)
eram do gênero masculino e 102 (53,7%) do feminino.
Os demais alunos participantes do estudo (n = 79)
foram selecionados em turmas de primeiro ou segundo
semestre do curso de inglês. Estes alunos apresentavam
muito pouco ou nenhum conhecimento da língua inglesa1,
sendo considerados, no presente estudo, como monolíngües. A idade média destes alunos era de 25,63 anos,
variando entre 14 e 53 anos. Quarenta e sete alunos
(59,50%) eram do gênero masculino e 30 (38%) do
feminino.
Instrumentos
Os instrumentos utilizados incluíram quatro subtestes
dos Testes Torrance do Pensamento Criativo TTCT(forma A), sendo dois verbais e dois figurativos
(Torrance, 1974).
Foram avaliados, através dos quatro subtestes, três
características do pensamento criativo: (a) fluência, o
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça e Denise de Souza Fleith
número de respostas e soluções diferentes que os alunos fornecem a uma situação-problema ; (b) flexibilidade, o número de diferentes categorias de idéias ou formas diferentes de enfrentar uma situação problema; e
(c) originalidade, que seria a capacidade de produzir idéias
raras ou incomuns, estatisticamente infreqüentes.
Os dois subtestes verbais utilizados no estudo foram:
(a) Aperfeiçoamento do produto, no qual os alunos devem pensar em maneiras interessantes e diferentes de
melhorar um elefante de brinquedo para que as crianças
se divirtam mais com ele e (b) Usos diferentes para
caixas de papelão, onde os alunos devem pensar em
usos diferentes e originais que estas possam assumir.
Os dois subtestes figurativos utilizados foram: (a)
Completando figuras, no qual os alunos devem juntar
linhas às figuras incompletas, a fim de produzirem
desenhos interessantes. É pedido que os alunos inventem
e escrevam títulos para cada um dos desenhos e (b)
Linhas, no qual os alunos devem produzir objetos ou
figuras utilizando pares de linhas retas que são
apresentados. Cada subteste deve ser realizado no
período máximo de 10 minutos. Quanto à validade e
fidedignidade do instrumento, Torrance (1974) obteve
coeficientes de fidedignidade do tipo teste-reteste
variando entre 0,60 a 0,93 para os vários subtestes.
Para a avaliação do nível de inteligência dos participantes, foi aplicado o Teste Não –Verbal de Raciocínio
para Adultos - TNVRA (Pasquali, 1998), um teste desenvolvido e validado no Laboratório de Pesquisa em
Avaliação e Medida - LabPam, da Universidade de
Brasília, Instituto de Psicologia. O TNVRA é composto
de 30 itens. Cada item apresenta uma configuração
geométrica na qual falta uma parte, que deve ser
completada por uma, dentre as seis alternativas possíveis
de resposta para cada item. Cada item corretamente
respondido recebe um ponto, num total de 30. O nível de
fidedignidade do TNVRA foi estabelecido através da
análise da consistência interna (alfa de Cronbach = 0,92).
Foi também aplicada neste estudo uma escala de
autoconceito, denominada Escala Fatorial de Autoconceito
- EFA, desenvolvida e validada para a população brasileira (Tamayo, 1981). Trata-se de uma escala bipolar (ou
seja, em suas extremidades são apresentados adjetivos
com significados opostos, como, por exemplo, anárquico
e organizado) de sete pontos, sendo que o número 1
significa “se aplica muito”, o número 2 “se aplica bastan-
1
Estes alunos, ao se inscreverem no curso de inglês do Centro Binacional, eram submetidos a uma avaliação para verificar que nível eles
deveriam cursar.
Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngües e bilíngües
te”, o número 3 “se aplica pouco”, o número 4 significa
“os dois extremos se aplicam igualmente”, o número 5
“se aplica pouco”, o número 6 “se aplica bastante” e o
número 7 significa “se aplica muito”. O coeficiente alfa
de fidedignidade obtido para a escala foi de 0,95.
A validade do EFA foi estabelecida através da análise
fatorial realizada com uma amostra de 893 sujeitos. Os
seis fatores gerados foram: self somático, pessoal
(segurança e autocontrole), social (receptividade e atitude social) e ético-moral.
O fator self somático contém 13 itens como esbelto,
elegante, sexy, arrumado etc. O self somático pode ser
considerado como a percepção que o indivíduo tem do
seu próprio corpo, da sua aparência corporal. O self
pessoal abrange dois fatores: estabilidade e autocontrole.
Os 16 itens que compõem o fator estabilidade expressam
a idéia de segurança pessoal e de confiança em si mesmo.
Estes itens incluem adjetivos como firmeza, estabilidade,
coragem e persistência. O autocontrole é composto de
17 itens como anárquico-organizado, desligado-ligado,
distraído-atento, desordenado-sistemático, traduzindo o
domínio do indivíduo sobre o seu comportamento,
refletida em autodisciplina e autocontrole pessoal.
O self social se subdivide em receptividade e atitude
social. A receptividade é representada por 22 itens como
retraído-expansivo, inibido-desinibido, que expressam um
conjunto de traços bipolares de personalidade que, dependendo da direção, facilitam ou dificultam o
relacionamento social. A atitude social é composta de
12 itens tais como agressivo-gentil, preocupado-tranqüilo,
impaciente-paciente, que avaliam a atitude do sujeito com
relação aos outros e aos valores dos outros; diz respeito
à auto-percepção sobre a sua maneira geral de interagir
com os outros. Por último, o self ético-moral é composto
de 18 itens como desleal-leal, desonesto-honesto,
mentiroso-sincero, expressando as auto-avaliações
relativas aos princípios éticos fundamentais de
honestidade, justiça, bondade, autenticidade e lealdade.
Procedimentos
Inicialmente foram explicados à direção do Centro
Binacional os objetivos da pesquisa e procedimentos para
coleta de dados. Após obtida a autorização da direção
para a realização do estudo, foi enviada, a cada professor
dos níveis envolvidos na pesquisa, uma carta explicativa.
63
Após o esclarecimento das dúvidas apresentadas, pelos
professores, agendou-se dia e horário para aplicação dos
instrumentos, de modo a não prejudicar o cronograma de
atividades de cada professor. Só participaram do estudo
aquelas turmas cujo professor responsável concordou e
deu permissão para a coleta de dados. Alguns professores recusaram o convite, por já estarem com os seus
cronogramas de aula comprometidos.
Os testes foram, em seguida, aplicados coletivamente
em duas etapas. A primeira etapa envolveu a aplicação
do Teste Torrance de Pensamento Criativo, que levou,
em média, 40 minutos. Os alunos responderam, ainda,
imediatamente após realizarem o TTCT, a um pequeno
questionário sobre dados demográficos como idade,
gênero, estado civil, local de residência, nível de
escolaridade e tempo de estudo da língua inglesa.
Na segunda etapa, realizada uma semana após a
primeira etapa, foi aplicado o Teste Não-Verbal de
Raciocínio para Adultos-TNVRA. Em média, os alunos
levaram 35 minutos para a realização do teste. Em
seguida, os alunos responderam à Escala Fatorial de
Autoconceito-EFA. A aplicação deste instrumento durou cerca de 15 minutos. Todos os instrumentos foram
aplicados pela primeira autora no período de outubro de
2002 a maio de 2003.
Análise de Dados
O Programa SPSS foi utilizado na versão 10.0 para
efetuar a análise dos dados. As questões de pesquisa 1,
2, 3 e 4 foram examinadas por meio de uma análise de
variância multivariada (MANOVA).
As variáveis dependentes foram criatividade,
inteligência e autoconceito. As variáveis independentes
foram nível de proficiência em uma 2a língua (bilíngüe e
monolíngüe), gênero (masculino e feminino) e faixa
etária (adolescentes e adultos)2. Antes da MANOVA
ter sido efetuada, foram examinadas os requisitos
necessários para a realização da análise, tais como
normalidade, linearidade e homogeneidade de variância.
Para analisar a questão de pesquisa 5, foi utilizada a
Correlação de Pearson a fim de se examinar a relação
entre inteligência e criatividade e autoconceito de alunos
bilíngües e monolíngües. Foi também verificado se a
distribuição dos dados atendia aos requisitos necessários
para se efetuar esta análise.
2
Neste estudo, os alunos com idade inferior a 21 anos foram considerados adolescentes e os alunos com idade igual ou acima de 21 anos foram
considerados adultos. Esta idade foi utilizada como ponto de corte por se tratar da idade em que o indivíduo atinge a maioridade. Além disso,
segundo Becker (1985), podem ser considerados adolescentes indivíduos na faixa entre 10 e 20 anos.
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Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça e Denise de Souza Fleith
RESULTADOS
Questão de Pesquisa 1
Os resultados da análise multivariada indicaram diferenças significativas entre os dois grupos (bilíngües e
monolíngües) em relação às variáveis criatividade,
inteligência e autoconceito (Wilks’ Lambda=0,745,
F[12,105]=2,653; p<0,01). Procedeu-se, em seguida, à
análise univariada a fim de se verificar em quais variáveis dependentes foram observadas diferenças entre os
alunos bilíngües e monolíngües.
Os resultados da análise univariada apontaram diferenças significativas entre alunos bilíngües e monolíngües
em relação à criatividade verbal (F[1,113]=11,262;
p<0,001), fluência verbal (F[1,113]=13,485; p<0,001),
flexibilidade verbal (F[1,113]=13,507; p<0,001) e
originalidade verbal (F[1,113]=9,015; p<0,01). Os alunos
bilíngües apresentam desempenho superior aos
monolíngües em todas as medidas de criatividade verbal, conforme médias apresentadas na Tabela 1. Os
resultados indicaram ainda diferenças significativas entre
os dois grupos no que diz respeito à criatividade figurativa (F[1,113]=15,463; p<0,001), fluência
figurativa(F[1,113]=8,697; p<0,01), flexibilidade figurativa (F[1,113]=13,403; p<0,001) e originalidade figurativa (F[1,113]=8,930; p<0,001). Os alunos bilíngües apresentaram desempenho superior aos monolíngües em
todas as medidas de criatividade figurativa, conforme
exposto na Tabela 1. Além disso, observou-se diferença significativa entre os dois grupos em relação à
inteligência (F[1,113]=4,621; p<0,05). Os alunos bilíngües (M=19,7; DP=8,96) apresentaram desempenho
superior nos teste de inteligência, quando comparados
aos alunos monolíngües (M=16,63; DP=7,61). Não foram observadas diferenças significativas entre os dois
grupos nas medidas de autoconceito.
Questão de Pesquisa 2
Os resultados da análise multivariada indicaram haver diferenças significativas entre os dois grupos nas
variáveis investigadas (Wilks’ Lambda=0,781,
F[12,105]= 2,181; p<0,05). Os resultados da análise
Tabela 1 - Média, Desvio-Padrão e Valor F de Alunos Monolíngues e Bilíngües com Relação à Criatividade,
Autoconceito e Inteligência
Monolíngüe
Bilíngüe
(n = 39)
(n = 76)
M
DP
M
DP
F
Criatividade Verbal
41,2
16,78
51,1
13,88
11,262***
Fluência Verbal
14,1
7,57
20,4
9,24
13,485***
Flexibilidade Verbal
9,0
3,46
12,2
4,68
13,507***
Originalidade Verbal
3,1
3,18
4,9
3,05
9,015**
Criatividade Figurativa
26,2
12,52
37,5
15,45
15,463***
Fluência Figurativa
18,6
7,79
22,5
6,13
8,697**
Flexibilidade Figurativa
13,7
5,01
17,1
4,50
13,403***
Originalidade Figurativa
8,9
4,73
11,5
4,19
8,930**
Autoconceito Geral
5,3
0,80
5,1
0,70
1,119
Atitude Social
5,0
1,09
4,9
1,12
0,187
Segurança
5,1
1,34
4,7
1,19
2,387
Autocontrole
5,3
0,92
4,9
1,03
3,705
Ético- social
6,2
0,70
6,0
0,96
1,970
Somático
5,1
1,01
5,2
1,14
0,175
Receptividade Social
5,1
1,11
5,1
0,93
0,191
Inteligência Não-Verbal
16,3
7,61
19,7
8,96
4,621*
*p < 0,05. **p < 0,01. ***p < 0,001.
Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngües e bilíngües
univariada indicaram diferenças significativas entre alunos do gênero masculino e feminino em relação à
originalidade verbal (F[1,113]=4,515; p<0,05). Os alunos (M=4,9; DP=3,66) apresentaram escores superiores
às alunas (M=3,7; DP=2,58). Não foram observadas
diferenças significativas entre os dois grupos com relação
ao autoconceito e inteligência (veja Tabela 2).
Questão de Pesquisa 3
Os resultados da análise multivariada de variância
não indicaram diferenças significativas entre os dois
grupos em relação à criatividade, inteligência e
autoconceito (Wilks’ Lambda=0,843; F[12,105]= 1,428;
p>0,05).
Questão de Pesquisa 4
Para verificar se havia interação entre nível de proficiência em uma segunda língua, gênero e faixa etária
em relação à criatividade, inteligência e autoconceito, a
MANOVA foi utilizada. Os resultados indicaram que
não havia interações significativas entre proficiência em
65
uma segunda língua e gênero; entre proficiência em uma
segunda língua e faixa etária; entre gênero e faixa etária;
e entre proficiência em uma segunda língua, gênero e
faixa etária (veja Tabela 3).
Questão de Pesquisa 5
Para verificar a relação entre inteligência, criatividade
e autoconceito de alunos bilíngües e monolíngües, utilizouse a Correlação de Pearson. Foram observadas correlações
positivas significativas entre criatividade verbal e
responsabilidade social (r=0,25; p<0,01), fluência figurativa e responsabilidade social (r=0,22; p<0,05), flexibilidade
figurativa e responsabilidade social (r=0,29; p<0,01),
originalidade figurativa e responsabilidade social (r=0,20;
p<0,05) e flexibilidade verbal e inteligência (r=0,20; p<0,05).
Para verificar se existiam relações entre criatividade, autoconceito e inteligência de alunos
monolíngües, efetuou-se também uma análise de
Correlação de Pearson. Não foram observadas
correlações significativas entre criatividade, autoconceito e inteligência de alunos monolíngües. Da mesma
Tabela 2 - Média, Desvio-Padrão e Valor F de Alunos dos Gêneros Masculino e Feminino com Relação à
Criatividade, Autoconceito e Inteligência
Masculino
Feminino
(n = 56)
(n = 59)
M
DP
M
DP
F
Criatividade Verbal
46,7
13,60
48,8
17,29
0,530
Fluência Verbal
18,4
9,53
18,1
8,92
0,029
Flexibilidade Verbal
11,7
4,64
10,6
4,41
1,815
Originalidade Verbal
4,9
3,66
3,7
2,58
4,515*
Criatividade Figurativa
35,0
16,43
32,3
14,42
0,865
Fluência Figurativa
20,9
6,24
21,4
7,61
0,177
Flexibilidade Figurativa
15,3
4,43
16,5
5,32
1,730
Originalidade Figurativa
10,5
3,91
10,8
5,07
0,187
Autoconceito Geral
5,2
0,73
5,2
0,74
0,137
Atitude Social
4,9
1,07
4,9
1,15
0,005
Segurança
4,9
1,25
4,7
1,26
0,892
Autocontrole
5,1
1,02
5,0
1,00
0,185
Ético-social
5,9
0,97
6,2
0,78
2,943
Somático
5,1
1,08
5,2
1,12
0,189
Receptividade Social
5,0
1,02
5,2
0,96
1,458
Inteligência Não-Verbal
18,6
9,10
18,7
8,30
0,070
* p < 0,05.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 59-70
66
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça e Denise de Souza Fleith
Tabela 3 - Valor de Wilk’s Lambda, Valot F e Nível de Significância das Interações entre Proficiência em
uma Segunda Língua, Gênero e Faixa Etária dos Participantes
Interações
Wilks’ Lambda
F
p
0,924
0,845
0,895
0,914
0,597
1,327
0,847
0,676
0,851
0,211
0,610
0,782
Proficiência x Gênero
Proficiência x Faixa Etária
Gênero x Faixa etária
Proficiência x Gênero x Faixa etária
forma, foi investigado se havia correlação entre
criatividade, autoconceito e inteligência de alunos bilíngües. Os resultados indicaram correlações positivas significativas entre autoconceito geral e flexibilidade figurativa (r=0,24; p<0,05), responsabilidade
social e criatividade verbal (r=0,30, p<0,01),
responsabilidade social e fluência figurativa (r=0,24;
p<0,05), responsabilidade social e flexibilidade figurativa (r=0,37; p<0,001), responsabilidade social e
originalidade figurativa (r=0,22; p<0,05) e entre atitude social e flexibilidade figurativa (r=0,23; p<0,05).
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos no presente estudo
confirmam os apresentados por Baker (1988, 2001),
Bialystok (2001), Hamers e Blanc (1989),
Lasagabaster (2000) e Ricciardelli (1992), dentre
outros, que apontam para o desempenho superior de
bilíngües nos testes de criatividade em comparação
com os monolíngües. Para estes autores, o aprendizado de uma segunda língua estimula o desenvolvimento da criatividade, tanto verbal quanto figurativa.
Soares e Grosjean (1984) explicam que os
indivíduos bilíngües transitam em um contínuo
lingüístico único e podem, até certo ponto, ativar e
desativar uma língua de acordo com a situação na
qual se encontram. Grosjean (1989, 1997) acrescenta
que este contínuo, no qual podem ocorrer mudanças
espontâneas de códigos, combinação de linguagens,
compartilhamento de símbolos diferentes, favorece
diversos aspectos da cognição. Também Valdes e
Figueroa (1994) relatam que os indivíduos bilíngües
apresentam um perfil lingüístico mais variado e
complexo, diferente dos monolíngües. Esta visão
enfatiza o caráter funcional do bilingüismo.
Cummins (1976) sugere, ainda, que devemos distinguir entre bilingüismo aditivo e subtrativo. No
bilingüismo aditivo, uma segunda língua é adquirida
em adição a primeira língua, relativamente bem desenvolvida, como é o caso dos participantes do presente estudo. No bilingüismo aditivo, o indivíduo possui mecanismos de suporte sociais e econômicos fora
do contexto educacional. No bilingüismo subtrativo,
elementos de uma segunda língua substituem elementos da primeira língua. Cummins levantou a hipótese de que a forma aditiva resulta em um aumento
do funcionamento cognitivo, ao passo que a forma
subtrativa resulta em uma redução deste funcionamento. Neste sentido, seria relevante a realização
de estudos comparativos envolvendo um grupo de
alunos bilíngües, que emigraram ou estão residindo
temporariamente em outro país, alunos que adquirem uma segunda língua em seu próprio país e um
grupo de alunos nativos que são proficientes apenas
na sua língua materna.
Os resultados do estudo indicaram, também, que
os alunos bilíngües apresentaram escores superiores
aos monolíngües no teste de inteligência,
corroborando os dados obtidos por Peal e Lambert
(1962) e Lambert (1990), que sugerem que a aprendizagem de uma segunda língua favorece o desenvolvimento intelectual dos indivíduos.
Os resultados deste estudo não indicaram diferenças significativas entre alunos do gênero masculino e
feminino em relação à inteligência, autoconceito e
criatividade, com exceção, apenas, da variável
originalidade verbal, em que os alunos apresentaram
melhor desempenho do que as alunas. Estes dados
não convergem com os encontrados na literatura
(Koulos, 1986; Landry, 1974; Price-Williams &
Ramirez III, 1977). Ou seja, esta questão continua
sendo um ponto de divergência entre os pesquisadores da área. É importante ressaltar, ainda, que, mais
Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngües e bilíngües
recentemente, educadores e psicólogos têm procurado alertar pais e professores acerca da influência de
estereótipos sexuais na educação de crianças e adolescentes, em especial os do gênero feminino. A divisão acentuada dos papéis sexuais tende a limitar o
comportamento exploratório e a inibir o desenvolvimento do nível de criatividade e da auto-imagem positiva destes indivíduos (Alencar & Fleith, 2003).
Os resultados do presente estudo revelaram uma
correlação positiva entre criatividade, verbal e figurativa, e responsabilidade social, bem como entre flexibilidade verbal e inteligência para os participantes,
independente do grupo (bilíngüe ou monolíngüe). Estes
resultados confirmam os dados obtidos em estudos
anteriores conduzidos por Goldsmith e Matherly
(2001) e Smith e Tegano (1992). É interessante observar que o teste de inteligência utilizado neste estudo
é um teste não-verbal de raciocínio.
Examinou-se, também, a relação entre criatividade, inteligência e autoconceito para alunos bilíngües e monolíngües separadamente. Notou-se que
enquanto não foram encontradas correlações
significativas entre as variáveis para os monolíngües,
foram encontradas, para os bilíngües, correlações
positivas entre criatividade (verbal e figurativa) e
autoconceito (atitude social e responsabilidade
social), resultado semelhante ao que foi obtido para
a amostra total. Tal observação sugere que as
relações entre criatividade e autoconceito parecem
ser mais desenvolvidas em alunos que apresentam
proficiência em uma segunda língua. Neste sentido,
seria interessante investigar se o nível de criatividade
e autoconceito estaria associado ao número de línguas em que o indivíduo apresentasse proficiência.
Entretanto, é importante ressaltar que o presente
estudo apresenta um delineamento não experimental,
impossibilitando, portanto, estabelecermos uma
relação de causa e efeito.
Os resultados do presente estudo, bem como de
outros conduzidos anteriormente, apontam para o
desempenho superior de alunos bilíngües em tarefas que exigem criatividade e raciocínio lógico. Neste
sentido, sendo a escola uma das responsáveis em
prover este tipo de educação, deveria haver, por
parte desta instituição, uma preocupação em desenvolver um ensino sistematizado e de qualidade de
uma segunda língua. Também, é importante promover estudos que investiguem a relação professor-
67
aluno e aluno-aluno em salas de aula de instituições
de ensino de uma segunda língua, pois grande parte
dos estudos na área é de natureza quantitativa.
Baker e Jones (1999) relatam que a educação
bilíngüe pode ter um papel central no estabelecimento
da identidade em nível local, regional e nacional.
Além de todas as vantagens do aprendizado de uma
segunda língua já apresentadas, a educação bilíngüe
implica ganhos no mercado de trabalho, onde o domínio de uma segunda língua já é visto como prérequisito para qualquer posição de destaque. A
aquisição de uma segunda língua também expande
as opções de leitura, disponibilizando a literatura
estrangeira, sejam estas por motivos acadêmicos,
profissionais ou apenas de lazer.
Para Francis e Reyhnner (2002), a educação bilíngüe desenvolve uma melhor compreensão de outras
culturas, como também uma visão mais solidária dos
diversos valores e credos, permitindo, assim, o entendimento das diferenças associadas à linguagem
e, reduzindo, portanto, a disseminação de idéias
estereotipadas acerca de vários grupos sociais.
Também Genesee e Gándara (1999), em estudos
de avaliação e comparação de programas bilíngües
no Canadá e nos Estados Unidos, ressaltaram
indicativos de redução do preconceito e discriminação, favorecendo uma maior conscientização cultural
e melhor relação entre grupos. Estes resultados
sugerem a existência de um vínculo importante entre
o aprendizado de uma segunda língua e mudanças
culturais e sociais.
Neste sentido, sugere-se como pesquisas futuras,
por exemplo, a condução de um estudo comparativo
com grupos de alunos provenientes de nível sócio-econômico desfavorecido e abastado, ambos proficientes
em uma segunda língua, em relação à criatividade,
inteligência e autoconceito; a investigação da relação
entre bilingüismo e outras variáveis como motivação
ou rendimento acadêmico; bem como o desenvolvimento de um estudo sobre a relação entre criatividade e
inteligência de alunos bilíngües e monolíngües de diferentes faixas etárias, incluindo crianças, adolescentes,
adultos e indivíduos na terceira idade. Finalmente, é
relevante ressaltar a importância da realização de
estudos interdisciplinares, envolvendo a Psicologia,
Antropologia, Sociologia, Educação e Lingüística, que
possam contribuir para uma melhor compreensão do
fenômeno do bilingüismo.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 59-70
68
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Recebido em: 17/06/04
Revisado em: 25/08/04
Aprovado em: 12/10/04
Endereço para correspondência:
Patrícia Villa da Costa Ferreira Mendonça: SQN 111, Bloco D, apto. 105 – CEP: 70754-040 – Brasília – DF
e-mail: [email protected]
Denise de Souza Fleith: SQN 202 , Bloco H, apto.504 – Asa Norte – CEP: 70910- 900 – Brasilia – e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1 71-86
PARTILHANDO FORMAÇÃO, PRÁTICA E DILEMAS: UMA CONTRIBUIÇÃO AO
DESENVOLVIMENTO DOCENTE
PARTILHANDO FORMAÇÃO, PRÁTICA E DILEMAS
Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla 1
Mariana Wisnivesky 2
Paula Saretta2
Fernanda Costa Paulucci2
Carolina Pasquote Vieira2
Carolina de Aragão Escher Marques2
Resumo
O presente trabalho objetivou analisar momentos que caracterizam a prática, a formação e os dilemas cotidianos do profissional práticoreflexivo, buscando compreender suas crenças. Foram realizados 23 encontros entre seis professoras e uma psicóloga. As falas transcritas, divididas
em 11 categorias, foram submetidas a entrevistas recorrentes. Os resultados indicaram a necessidade de vincular, na formação e no cotidiano do
professor, teoria e prática, a partir da reflexão sistemática, cotidiana, democrática e compartilhada entre os pares. Isto tendo em vista a formação
docente como um processo multifacetado, pautado em diversas dimensões, que acabam sendo edificadoras de muitos dos saberes docentes.
Palavras-chave: Reflexividade; Crenças Docentes; Formação de Professores.
SHARING FORMATION, PRACTICE AND DILEMMAS: A CONTRIBUTION TO THE PROFESSOR DEVELOPMENT
Abstract
This paper aimed to analyse the moments that characterize the practice, the formation and the quotidian dilemmas of the practical-reflecting
professional on trying to understand his beliefs. Twenty-three meetings involving six teachers and one psychologist were held. The transcribed
speech was divided into 11 categories and, then submitted to recuring interviews. The data analysis indicated the need of linking theory to practice
in the teacher’s formation and daily routine, through a systematic, quotidian, democratic and shared reflection among the partners, understanding
the teacher’s formation as a multifaceted process, based on many dimensions which end in being constructors of much of the teacher’s knowledge.
Keywords: Reflection; Teacher’s Belief; Teacher’s Formation
INTRODUÇÃO
FORMAÇÃO, PRÁTICA E DILEMAS DOCENTES: UMA APROXIMAÇÃO
A perspectiva da reflexão na formação dos
professores
Quando se busca promover a reflexividade é importante que se considere o fato que ao se propor a um
grupo de docentes que analise sua atuação profissional
1
significa deflagrar uma discussão, preferencialmente
coletiva, sobre determinados aspectos fundamentados
teoricamente. O que ocorre a partir desta proposição é
um fenômeno que não pode ser observado, uma vez
que está diretamente relacionado ao pensamento do-
Psicóloga. Doutora em Educação. Docente do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da Universidade Estadual
de Campinas. Pesquisadora coordenadora da pesquisa.
2
Psicóloga. Foi bolsista de iniciação científica apoiada pela Fapesp no período de realização desta pesquisa.
72
Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
cente. O grupo, por sua vez, permite que sejam
esclarecidas suas dificuldades individuais, rompendo com
estereótipos e possibilitando a identificação dos obstáculos que possam impedir seu desenvolvimento, além
de auxiliar na resolução ou enfrentamento de seus próprios problemas, possibilitando a produção de conhecimento.
A linha de pesquisa sobre o pensamento do professor surgiu nos Estados Unidos em 1974, com o
nascimento da ISATT (International Study Association
on Teacher Thinking). Lee Shulman é considerado o
“pai” dessa linha de investigações, a partir da
coordenação de um dos dez painéis apresentados no
Congresso do National Institute of Education, em
1975. O painel coordenado por Shulman denominavase “O ensino como processamento clínico de
informação” e objetivava descrever a vida mental do
professor, concebido como um agente que toma decisões, reflete, emite juízos, tem crenças e atitudes
(Sadalla, 1998).
A pesquisa sobre as teorias implícitas dos professores constitui uma parte menor e mais recente da literatura sobre o pensamento do professor. Os estudos sobre
as crenças e teorias do professor têm em comum a idéia
de que a cognição docente é guiada por um sistema
individual de crenças, valores e princípios.
Raymond e Santos (1995) apontam que as crenças
são as idéias fundamentais das pessoas a respeito de
suas experiências de vida, e afetam diretamente as suas
ações, quer se admita conscientemente estas crenças,
quer não. Esta é a definição aqui utilizada.
Neste cenário, passa-se a privilegiar o professor em
sua própria formação, em um processo re-significação
de saberes iniciais em confronto com sua prática
vivenciada a partir de uma reflexão na e sobre a prática. Entretanto, refletir sobre a prática não é apenas
analisá-la, mas buscar em teorias psicológicas e/ou educacionais os seus fundamentos. Ser um profissional prático-reflexivo significa, pois, apropriar-se de teorias que
buscam analisar o fenômeno estudado, tomar consciência delas e debruçar-se sobre o conjunto de sua ação,
refletindo sobre seu ensino e sobre as condições sociais
nas quais suas experiências estão inseridas.
Desta forma, os pesquisadores desta linha de
pensamento consideram que as premissas que
fundamentam a racionalidade técnica (que consideram
o professor como cumpridor de tarefas) desfavorecem
uma conduta reflexiva dos profissionais diante das
situações de conflito e de indagações que vão surgindo
ao longo do desenvolvimento profissional.
A revisão bibliográfica a respeito das pesquisas
referentes ao pensamento do professor mostrou-se especialmente importante ao revelar que numerosos
estudos têm-se voltado para a investigação sobre as teorias e crenças que fundamentam o pensamento do professor e suas implicações para a ação docente (Flavell,
Miller e Miller, 1999; Borsatto, 1999; Sadalla, 1998;
Pacheco, 1995; Agne, Greenwood e Miller, 1994, Lynott
e Folk, 1994; Agne, 1992; Sapon-Shevin, 1991; Kagan,
1991; Elbaz, 1990; Marcelo, 1987; Yinger, 1986; Marrero,
1986; Pérez, 1986). Estudos mais recentes foram desenvolvidos com o objetivo não só de compreender o
sistema de crenças, mas também analisar suas
implicações para o processo ensino-aprendizagem
(Fregoneze, 2000; Martini, 1999; Sadalla, Davoli e
Schmidt, 1999; Calderhead, 1996; Krüger, 1993).
As pesquisas enfocando o professor prático-reflexivo
têm sido formas de desenvolver e aprofundar a compreensão sobre a prática educacional. Através de
mudanças que ocorrem em suas crenças, professores e
outros profissionais da educação podem produzir
mudanças em suas práticas a fim de serem efetivamente
mediadores de conhecimento, deste modo, podem, também, ser considerados professores-pesquisadores.
Fischer (1996 apud Zeichner e Noffke, 1998) aponta
que esses professores freqüentemente possuem seus
próprios interesses em sua sala de aula. São sugeridas
categorias para entender algumas razões que podem
levar o docente a se engajar na pesquisa, tais como
interesse em conhecer mais sobre como seus alunos
estão aprendendo; tentativas de aplicar alguns
conhecimentos novos para inovar seu conteúdo
programático; desejo de mudança, deixando de ser um
a mais a ensinar; e tentativas de conexões significativas
entre os significados de seu trabalho.
Zeichner e Noffke (1998) acrescentam outros
objetivos relacionados ao cotidiano do professor que
busca pesquisar: aperfeiçoar a prática; compreender
melhor um aspecto de sua prática; melhor compreender
sua prática de um modo mais geral; promover, nos alunos, mais eqüidade em relação à participação; e,
finalmente, influenciar as condições sociais nas quais
aquela prática está inserida.
Schön (1987 apud Alarcão,1996) defende essa idéia
afirmando que na medida em que o profissional conversa
com a situação e ouve o que ela tem a dizer, verbaliza
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
os seus próprios processos de reflexão. Ao descrever o
processo da reflexividade, Schön evidencia que o
conhecimento produzido pelo profissional práticoreflexivo é um conhecimento baseado em sua prática
individual e ultrapassa, portanto, os limites da
investigação acadêmica.
Sadalla (1998) acrescenta que ao tomar decisões e escolher atitudes para resolver problemas, o
professor faz mais do que escolher uma determinada
forma de ação ou um caminho a seguir. Ele considera e
avalia as alternativas estabelecendo critérios para
selecionar a melhor opção. Faz-se, portanto, necessário
que o professor esteja preparado para lidar com estas
situações, pensando e analisando suas crenças, valores
e teorias a respeito do processo de ensino-aprendizagem,
o que lhe possibilitará reorganizar seu pensamento,
fundamentado numa base sólida de conhecimentos.
Reflexão sobre dilemas docentes
O cotidiano do professor é constituído de uma
sucessão de pequenas decisões mais ou menos importantes, as quais, muitas vezes, levam-no a deparar-se
com situações a serem gerenciadas imediatamente, tendo
pouco tempo para refletir simultaneamente à ação.
Assim, o professor deve ter em mente que estas devem
estar fundamentadas em algo que funcione como um
eixo de ação, de postura em sala de aula, para que ele
não fique agindo apenas nas situações de emergência.
Nada deixa o professor mais perdido do que ter que
tomar alguma decisão imediata quando ele não tem muita
clareza de onde ele quer chegar. Deste modo, o docente
deve ser auxiliado a refletir a respeito não só do que
acontece naquele momento referido, mas, também, nos
futuros acontecimentos que poderão surgir a partir da
sua tomada de decisão.
Por mais que as estratégias de aula tenham sido
previstas, os conteúdos organizados de forma a promover a aprendizagem dos alunos, a dinâmica dos grupos,
as relações interpessoais dentro da sala de aula podem
alterar completamente o que havia sido planejado,
obrigando o professor a buscar meios de resolver os
eventuais problemas. O docente serve-se, então, do
conhecimento que tem sobre sua sala de aula, muito
mais do que do raciocínio ou dos modelos de ação. Essas
decisões nem sempre são conscientes para o professor.
Perrenoud (1993) acrescenta que o trabalho docente
acaba seguindo uma rotina que o professor põe em ação
de forma relativamente consciente e racional, mas sem
73
precisar avaliar o seu caráter arbitrário; logo, ele nem
sempre escolhe ou controla verdadeiramente sua ação.
Este mesmo autor aponta que ao se fecharem as portas
da sala de aula, 80% do que lá ocorre não foi planejado
pelo professor, e, como já foi referido, ele deve tomar
decisões importantes que muitas vezes produzem os
chamados dilemas. Segundo Pacheco (1995) os dilemas são situações problemáticas que se apresentam às
pessoas, constituindo-se como objeto de preocupação e
de reflexão constantes.
A grande ênfase no surgimento dos dilemas é dada
devido à dificuldade de o professor conseguir unir dois
aspectos muito importantes: a teoria que possui e a
sua prática cotidiana. O dilema surge quando esse profissional se defronta com a prática e absorve estas
questões tão importantes quanto aquelas aprendidas
em outros contextos. Esse profissional sente que tudo
aquilo que foi concretizado como “a maneira correta
de agir” está sendo questionado pelas questões com
as quais se depara. Ao mesmo tempo em que luta para
apreender estas informações, sente que a prática talvez não seja uma fonte confiável de aprendizado, por
se caracterizar como sendo inconstante e individual.
Então, busca um caminho que seja capaz de solucionar
o dilema que está sendo vivenciado e descobre que a
maneira ideal de unir as duas fontes é a teorização da
prática. Isso implica na articulação dos saberes pessoais e dos outros, de reconhecimento das formas de
atuação próprias e transformação das mesmas em
esquemas de pensamento e de ação, surgindo então
um novo procedimento (Perrenoud, 2001). Como o
cotidiano do professor é algo inconstante, visto que este
profissional depara-se com situações difíceis a cada
dia, ocorre um questionamento intenso e contínuo sobre
sua prática.
Não há como fazer da concepção teórica algo menos
importante do que ela realmente é. O professor precisa
de um embasamento, de um referencial que o guie nas
suas atividades e durante o curso de seu papel
profissional. Mas, apesar de necessária, não se pode
considerar a teoria suficiente para a execução de uma
prática adequada. Estudar concepções e aplicá-las é algo
muito importante, pois pode modificar a ação docente.
Mas a transformação da prática, bem como a
modificação de uma realidade já estruturada só é possível
através da atuação. Porque é durante a ação que surgem
os obstáculos, que são passíveis de mudança somente
através de tentativas.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
Assim, busca-se transformar a relação do professor
com a teoria que fundamenta suas idéias. Isto significa
que não é possível que se possa formar o professor para
que ele seja capaz de prever a conseqüência de cada
um dos atos em sala de aula. Mas, ao contrário, pode-se
contribuir para que ele, municiado de uma teoria com a
qual comungue, seja capaz de atuar na direção daquilo
que pretende alcançar.
A formação do professor prático-reflexivo tem
apontado na direção de que ele deve ser auxiliado a ter
consciência da fundamentação de suas ações. Isso não
quer dizer que se volte a esquemas antigos de considerar
que lhe devam ser administrados cursos de capacitação,
reciclagem ou similares. Estudos têm demonstrado a
ineficácia desses procedimentos (Gatti, 2000; Andaló,
1995). Alguns especialistas em educação têm oferecido
ao professor teorias sobre temas específicos, que muitas
vezes são até mesmo consideradas interessantes pelos
docentes. Acontece que isso é só uma forma de dar
uma roupagem nova a velhos esquemas de
“capacitação”. Deve-se considerar que não é disso que
o professor precisa, até porque ele muitas vezes detém
as teorias. O que ele não sabe é como aplicá-las na
hora em que necessita delas.
PARTILHANDO FORMAÇÃO, PRÁTICA E DILEMAS:
UM ESTUDO DE CASO
As formas de pensar do professor e as ações que
resultam dessas reflexões são o ponto de partida para
esta pesquisa realizada com um grupo de professores da
rede pública municipal, coordenado por uma psicóloga,
tendo o seguinte objetivo: identificar, descrever e analisar
os momentos que caracterizam a prática do profissional
prático-reflexivo, buscando compreender as crenças a
respeito de formação docente, bem como os dilemas
cotidianos que permeiam sua atividade profissional. Além
disso, objetivou-se promover, nas professoras, o
reconhecimento de suas crenças a respeito dos temas
emergentes. De modo mais detalhado, os objetivos
específicos desta pesquisa foram buscar compreender de
que forma se dá o processo de desenvolvimento do
profissional prático-reflexivo, voltando-se para o
reconhecimento de suas crenças a respeito de sua atividade profissional; o pensamento das professoras sobre
formação docente em geral, reconhecendo-se como
docentes que atuam na formação e desenvolvimento profissional de seus pares; os dilemas cotidianos do professor enquanto atuante na sala de aula junto a seus alunos,
bem como naquelas situações em que é responsável pelo
desenvolvimento profissional de seus pares.
É mister apontar que esta pesquisa utilizou uma abordagem qualitativa dos dados desde a constituição do
grupo de professores até a análise final. Na segunda
etapa deste estudo, buscou-se promover junto às professoras o reconhecimento das crenças e teorias que
foram surgindo a partir dos temas arrolados pelo próprio grupo.
MÉTODO
A constituição do grupo de participantes
A Rede Municipal de Ensino de Campinas possibilitava a alguns docentes, apontados por especialistas
como competentes para auxiliar na formação de seus
pares, o planejamento e a execução de cursos fornecidos a profissionais da Rede (equipe técnica, docentes e
monitores) sobre temas considerados fundamentais para
a melhoria do processo ensino-aprendizagem.
No início do ano uma das autoras desta pesquisa foi
procurada por um grupo de seis docentes da Rede
Municipal de Ensino com a solicitação de que as
auxiliasse no trabalho de Formação Profissional desenvolvido junto a seus pares. Deste modo, encontros
semanais de duas horas de duração entre aqueles professores e a autora ocorreram no período de fevereiro a
outubro daquele ano letivo.
Os docentes recebiam o que eles denominavam de
assessoria técnica e neste grupo buscava-se conhecer
suas experiências enquanto formadores de profissionais
da educação, objetivando a sua própria formação
enquanto um profissional prático-reflexivo.
Dos seis docentes, cinco possuíam formação superior,
sendo três em Psicologia e dois em Pedagogia, e um
deles concluiu o Curso de Magistério. Sua idade variava
de 25 a 30 anos.
Procedimento
A coleta de dados desta pesquisa foram utilizados
dois procedimentos descritos a seguir.
Procedimento de áudio gravação
A opção pela gravação dos encontros com as
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
professoras deveu-se à possibilidade que as transcrições dessas gravações oferecem: ter em mãos um
registro confiável ao qual o pesquisador retorna na medida
em que desenvolve suas hipóteses (Silverman, 1994).
Além disso, visto que os próprios sujeitos tiveram acesso
às transcrições feitas, este método viabilizou o contato
do profissional com suas próprias elaborações mentais
‘intuitivas’, permitindo-lhe confrontar aquilo que pensa
com aquilo que realmente diz e faz . Este movimento é
facilitado pelo procedimento em questão, na medida em
que torna perene a fala, viabilizando assim a reflexão
sobre crenças e ações.
Através da gravação de suas falas o sujeito tem a
oportunidade de ouvir-se e avaliar-se como os outros o
fazem, o que possibilita o aumento do nível de consciência
nas tomadas de decisões que ocorrem durante o trabalho (Bhsher, Clarke, Taggart, 1988). Além disso, a
linguagem não verbal e os dados extralingüísticos são
deixados como fundo, trazendo-se ao primeiro plano as
concepções, processos cognitivos e disposições
atitudinais do docente, o que leva o sujeito a ter que
construir verbalmente o objeto de discussão, de modo a
poder compartilhá-lo.
Neste contexto, o diálogo é fundamental para tornar
possível a reflexão, pois é na interlocução com os pares
que o indivíduo se apropria de sua prática, construindo
modelos para descrevê-la (Tickle, 1993).
Procedimento de entrevista recorrente
A entrevista recorrente é um procedimento descrito
por vários autores, entre eles Tunes (1981), Simão (1982a,
1982b e 1989), Zanelli (1992) e Larocca (1999). Estes
pesquisadores mostram que a utilização deste
procedimento permite a construção do conhecimento
sobre a situação referida.
A interação recorrente entre o pesquisador e o
participante, em torno de um tema específico, tem como
uma das resultantes o que Simão (1989, apud Zanelli, 1992),
denomina construção de conhecimento, ou seja, transformação e modificação das informações sobre o tema, que
ocorre na medida que as entrevistas vão sendo realizadas.
É mister apontar que este procedimento não tem um
roteiro pré-estabelecido de perguntas. Quase sempre, a
pergunta gira em torno de “O que você pensa acerca da
forma como foi redigida esta crença?” ou algo similar,
mas dando sempre ao participante a possibilidade de
alterar a redação da crença e a interpretação que se faz
de sua fala.
75
Zanelli (1992) afirma que esta postura frente ao ato
de pesquisar assume a ausência de neutralidade, já que o
conhecimento é gerado em um processo de participação
mútua e em um contexto de forças sociais e valores
individuais. A interação entre pesquisador e participante
pressupõe também autonomia de ambos os interlocutores,
que têm a possibilidade de transformação do fenômeno
estudado. Esta mudança está relacionada, para esta autora, à produção desse conhecimento ativo. Conhecimento
e ação, portanto, estão dialeticamente associados.
Simão (1982a) diz que este processo pode ser
compreendido como uma interação planejada entre um
“ator que pretende ‘conhecer’ o fenômeno e outro ator
que detém a experiência cotidiana daquele fenômeno”
(p.37), voltando-se à fonte original dos dados na medida
da necessidade de sua consulta, até que ele seja
considerado satisfatoriamente compreendido.
A partir da fala integral do participante, o pesquisador procede a busca de significado daquilo que foi
relatado até que ambos concordem com o que foi discutido. É mister lembrar que à medida que o pesquisador
categoriza o relato verbal do sujeito ele está operando
sobre sua fala, incluindo elementos do universo daquele
que está transcrevendo e categorizando (Zanelli, 1992).
Engelmann (1983 apud Zanelli, 1992) afirma que o
significado é algo que se encontra por trás da fala em
seu nível semântico e referir-se a este significado é fazer
alusão a algo que acontece dentro do indivíduo. Assim,
estudar a linguagem implica em tentar compreender
eventos que são de natureza privada, através do exame
exaustivo das verbalizações.
Zammumer (1981 apud Zanelli, 1992) relata que a
produção lingüística pode ser analisada, entre outros itens,
em termos da informação que expressa, a fim de
descobrir os objetivos ou para detectar as crenças e
atitudes da pessoa que fala ou escreve. Parte-se do
pressuposto de que, na linguagem cotidiana, o discurso
tem uma coerência possível de ser compreendida.
A linguagem, portanto, é um elemento central e
permeia todo o processo que se estabelece na interação
entre pesquisador e participante, até produzir um
conhecimento significativo para o contexto em que foi
construído (Zanelli, 1992).
Procedimento de organização dos dados
1ª etapa
No período de fevereiro a outubro daquele ano letivo,
foram realizados 23 encontros semanais de duas horas
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
de duração entre os docentes a psicóloga, que foram
áudio-gravados e, em seguida, transcritos. Após as
transcrições, realizadas à época por três auxiliares de
pesquisa, as falas dos membros do grupo eram lidas,
selecionadas e organizadas em categorias. Isto significa
que ao início de cada reunião semanal era apresentada
às professoras a síntese do encontro anterior para que
a partir daí fosse iniciado o próximo. Além disso, a
íntegra das falas transcritas também era fornecida para
que os membros pudessem refletir sobre o que fora
dito. Deste modo assegurava-se a possibilidade de os
participantes manifestarem-se, reformulando suas falas
de modo total ou parcial em relação à análise realizada
pela psicóloga, bem como resguardava aos membros
do grupo que não puderam comparecer àquele
encontro, o direito de conhecer na íntegra o que fora
discutido. É importante apontar que ao final dos 23
encontros obteve-se um total de aproximadamente 600
páginas transcritas de falas, tendo uma média de 25
páginas por encontro.
Este procedimento exigiu que, durante esta fase de
coleta de dados, se procedesse uma análise prévia dos
dados provenientes de cada encontro, organizando-os
de forma a reapresentá-los aos membros do grupo no
encontro seguinte. Fica pressuposto que ao transcrever
e categorizar os conteúdos das falas dos participantes,
a pesquisadora infere a respeito do que seus interlocutores verbalizaram, classificando-os dentro de seu próprio universo de teorias, crenças e valores.
2ª etapa
Buscando satisfazer os objetivos propostos, foi
realizada a análise das falas representativas obtidas na
primeira etapa. Estas falas representam as crenças ou
teorias das professoras a respeito dos temas do presente estudo (formação, prática e dilemas docentes). Ao
final da análise dos dados da primeira etapa, as
verbalizações selecionadas foram categorizadas, buscando-se identificar o que estava subjacente a elas, ou
seja, suas crenças e os elementos a elas relacionados.
O resultado desta análise foi organizado em três matrizes
referentes aos objetivos propostos que foram entregues
às docentes para que procedessem a leitura.
Durante a leitura individual do material, foi
resguardado às docentes a possibilidade de reformular
ou concordar com a análise preliminar realizada pelas
pesquisadoras. Após este momento, as seis professoras
participantes se dividiram em dois grupos, de acordo com
a disponibilidade de horários de cada uma delas, para a
realização das entrevistas recorrentes.
Nestas, as professoras foram solicitadas a opinar a
respeito das três temáticas já apontadas. Ao término
das entrevistas, procedeu-se a reformulação das matrizes
e do início da análise final dos dados.
RESULTADOS
Os dados coletados foram analisados a partir do
método de Análise de Conteúdo, que pode ser definido
por Bardin (1979) como
um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos,
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens, indicadores (quantitativos ou não)
que permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção/ recepção
(variáveis inferidas) destas mensagens (p.9).
Não se refere, portanto, a um instrumento, mas a um
conjunto deles, que pode ser utilizado de várias formas
para atingir o seu grande campo: as comunicações.
Entretanto, há um fator comum a este conjunto de
instrumentos- a inferência- oscilando entre “o rigor da
objetividade e a fecundidade da subjetividade” (Bardin,
1979, p.9).
Este método implica em categorizar os dados
(classificar elementos constitutivos do conjunto,
reagrupando-os segundo um critério previamente definido), fazendo recortes das verbalizações dos sujeitos.
Além disso, como a descrição literal não esgota a
análise, os elementos são ainda contextualizados no
conjunto das reuniões realizadas, considerando-se
eventos antecedentes e conseqüentes e, buscando-se
assim, estabelecer relações que viabilizem a compreensão e interpretação dos dados.
As categorias de análise
Após a transcrição dos encontros foi realizada uma
leitura detalhada dos mesmos, desconsiderando-se as
verbalizações ininteligíveis (aquelas que não foram
integralmente captadas pela gravação, ou que foram
interrompidas sem que houvesse informações suficientes
para apreender seu significado) e as verbalizações
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
paralelas (que não diziam respeito ao tema em pauta,
nem introduziam nenhum assunto novo para discussão).
Em seguida, fez-se uma classificação das falas,
separando-as em dois grandes grupos:
Falas descritivas: pertencem a este grupo todas as
verbalizações em que se descrevia alguma situação tendo
como objetivo levar o grupo a compreender o que havia
ocorrido. Expressam, portanto, a ocorrência de fatos,
ações ou situações.
Falas representativas: pertencem a este grupo todas
as verbalizações que representavam as crenças das
professoras a respeito de sua atividade profissional, a
formação docente em geral e seus dilemas cotidianos
enquanto atuantes na sala de aula junto aos alunos e
demais envolvidos neste contexto.
A partir disso, as falas descritivas foram desconsideradas, já que não contribuíam para a análise das
crenças implícitas das professoras. Por outro lado, as
falas que versavam sobre a atividade profissional foram
relidas e analisadas. A seleção destas obedeceu a um
critério de recorte em que foram escolhidas as
verbalizações que permitiam compreender o pensamento
das professoras a respeito de sua atividade profissional.
Estas foram, então, agrupadas segundo seu conteúdo,
buscando evidenciar o sentido implícito do que estava
sendo dito.
Foram realizadas várias tentativas de agrupamento,
buscando-se respeitar ao máximo o conteúdo e sentido
das falas, até que o sistema classificatório pudesse ser
considerado adequado para a realização da análise.
DISCUSSÃO
Inicialmente, ao reler a totalidade das verbalizações,
tudo parecia fundamental. Mas, o exercício de análise
buscando realizar as entrevistas recorrentes permitiu
desvendar e revelar muitos aspectos do pensamento das
docentes. Há, contudo, a certeza de que alguns aspectos
permanecem encobertos até mesmo após inúmeras
leituras de todo o material. Não há um momento de
esgotamento da análise quando se trabalha com análise
qualitativa, o que há é um momento em que é necessário
recortar a forma de olhar e buscar a satisfação e o gozo
das descobertas.
Depois das entrevistas recorrentes, a análise inicial
das crenças realizada pelas pesquisadoras foi repensada
77
e/ou modificada e as categorias finais estão arroladas a
seguir:
Prática do profissional prático-reflexivo (relações
entre concepção teórica e prática; reflexão sobre papéis sociais; atuação docente; o grupo de discussão;
contribuições dos encontros de desenvolvimento
profissional; e reflexões sobre a atuação em sala de aula)
Formação docente (formação docente em geral; e
formação de seus pares docentes)
Dilemas cotidianos (encontros de desenvolvimento profissional; concepção sobre ser docente; relações
entre concepção teórica e atuação prática; e relações
interpessoais)
A análise dos dados imbricados nas verbalizações das
professoras promoveu, nas pesquisadoras, um movimento
que ia de uma perplexidade inicial até a possibilidade de
fazer inferências, buscando compartilhar com as docentes
sua formação, sua prática e seus dilemas. No decorrer
do desenvolvimento dos encontros de discussão quando
as crenças das professoras iam sendo, de alguma forma,
inferidas pela psicóloga que coordenava os grupos de
reflexão, mas não do modo como surgem agora, a partir
do desemaranhado dos dados.
Buscar-se-á, a seguir, apontar o pensamento das
professoras acerca das três temáticas já referidas.
Prática do profissional prático-reflexivo
Os resultados revelaram ter as professoras um modo
de olhar para o seu desenvolvimento profissional e de
seus pares bastante especial. No que se refere às
relações entre concepção teórica e atuação prática, para
as professoras, a apropriação da teoria não implica,
necessariamente na transformação da prática. Pode-se
supor que haja uma compreensão, por parte das docentes,
de que não existe uma relação linear, de causa e efeito:
compreensão implica na transformação. Assim, há a
idéia de que a mudança da ação é um processo
multifacetado, no qual vários elementos estão em
relação, indo além dos conteúdos formais: exige a compreensão acerca da visão de homem, de educação e de
mundo. Para elas, a compreensão teórica adequada para
analisar a prática possibilita uma melhor atuação que
permite analisá-las.
Ao ponderar sobre os papéis sociais envolvidos no
processo ensino-aprendizagem fica claro que, para as
professoras, as condições sociais nas quais este processo
está inserido podem se constituir em um obstáculo para
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 71-86
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
a transformação e motivação em relação ao seu papel
enquanto docente.
Nota-se uma contradição quanto às funções do professor e da escola. Isto parece não estar muito claro
para estas docentes, uma vez que afirmam que é função
da escola ultrapassar os conteúdos formais, mas ao
mesmo tempo, limitam o papel do professor a estes
conteúdos. Isto pode provocar um grande dilema para o
professor que não tem clareza de seu papel profissional,
do que pretende transmitir a seus alunos e, certamente
haverá também uma incerteza em relação aos resultados
que terá.
Historicamente, como aponta Perrenoud (2001), a
escola desenvolveu um modelo de transmitir
conhecimentos específicos, enquadrando o aluno num
modelo restrito. Essa tendência unitária levou a um
“empobrecimento cultural”, fazendo com que todos
desenvolvessem a mesma forma de pensar, limitando todos os alunos a um único objeto. Fazendo com que as
pessoas não elaborassem nenhum conteúdo além daquilo
que estava sendo transmitido e recebido passivamente.
Sair do tradicional, do modelo transmitido através de
inúmeras gerações pode ser uma alternativa para o educador sentir que seu trabalho está tendo uma influência
significativa. Seria, portanto, uma prática inovadora, mas
que, sem dúvida, gera conflitos e dilemas.
A reflexão sobre papéis sociais deve ser considerada
como um elemento a mais no processo ensinoaprendizagem, no qual as docentes precisam refletir de
forma compartilhada com seus pares. Lembrando que
o professor é um dos mais importantes agentes
educacionais dentro da escola, se este não puder
ultrapassar as barreiras curriculares, o papel da escola,
de um modo geral, também ele estará restrito a estas
margens.
O pensamento das professoras a respeito da atuação
docente aponta que a coordenação do grupo determina
a maior ou a menor participação de seus integrantes.
Pode-se supor que, para elas, um grupo pode ser
conduzido de tal forma que seus membros não se sintam
à vontade ou estimulados a participar. É sabido que
existem reuniões nas quais os membros do grupo
recebem informações e formas de proceder, mas não
lhes é oferecido espaço para que o conteúdo transmitido seja discutido e refletido pelo grupo. O coordenador
de grupos deve facilitar o diálogo e estabelecer a
comunicação, incluindo o respeito aos silêncios
produtivos, aquele em que os participantes do grupo
possam estar se expressando também através do
silêncio. Deste modo, pode-se inferir que, para as professoras, uma vez viabilizada a participação dos membros
do grupo e facilitada a discussão, estas são enriquecidas,
permitindo a conscientização das teorias que
fundamentam a ação cotidiana.
Os diálogos entre os membros do grupo não foram
previstos e/ou planejados pelo coordenador, portanto, o
grupo deve ter claro seu papel e seus objetivos para que
o trabalho possa atingir resultados mais eficazes. As
docentes, entretanto acreditam que apesar de o
coordenador participar como facilitador das discussões
e não subestimar ou avaliar a opinião dos membros do
grupo, algumas vezes a exposição de dúvidas e a troca
de experiências nas discussões ocorridas nos encontros
de desenvolvimento profissional é cerceada pelo receio
da avaliação por parte dos pares.
As professoras identificam, também, que não é
necessário recorrer a técnicas inovadoras para garantir
a motivação do grupo. Pode-se supor que as professoras acreditem que o processo de motivação é algo que
ocorre intrinsecamente ao indivíduo, e que o que o
coordenador do grupo deve fazer é influenciar ou
estimular a motivação dos docentes, não podendo
garantir que eles sejam realmente motivados.
No que se refere ao pensamento das professoras a
respeito das reflexões ocorridas nos grupos é importante
lembrar que os encontros semanais ocorridos entre a
coordenadora e o grupo de discussão ao longo de todo o
ano foram precedidos de leituras das sínteses dos
encontros anteriores. Assim, para as docentes, a
oportunidade de realizar reflexões a respeito das
discussões ocorridas nos encontros anteriores,
possibilitava-lhes a consciência de suas verbalizações.
Pode-se supor que mesmo durante a leitura compartilhada do material verbalizado, ocorria a possibilidade
de retomada de aspectos ditos ou não no interior do grupo,
bem como a compreensão da teoria que estava sendo
discutida.
Quando esta reflexão não é compartilhada, não é
plenamente aproveitada. Alguns pesquisadores, por
exemplo, Zeichner (1993; 1995; 1998), Nóvoa (1992;
1995), consideram necessário e imprescindível que a
prática reflexiva aconteça entre os pares,
dialogicamente, para que este espaço seja propiciador
de fortalecimento para o desenvolvimento do trabalho.
Para esses autores, portanto, a prática do professor,
embora momentaneamente individual, estará sempre
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
carregada das condições político-sociais e institucionais
nas quais está inserida.
O pensamento das professoras a respeito da
importância da reflexão em grupos de discussão aponta
para o fato de que as professoras acreditam que quanto
maior o número de pessoas que efetivamente participar
de um grupo, mais rica e produtiva será a reflexão.
As docentes consideraram que os assuntos devem
ser retomados e partilhados para que a reflexão seja
suficientemente abrangente. Além disso, para as
professoras, a socialização do conhecimento e das dificuldades individuais, entre os membros do grupo, é
essencial para promover a reflexão e, conseqüentemente,
o desenvolvimento profissional. O próprio grupo, na
concepção das professoras, serve como exemplo para
que a teoria discutida seja compreendida e possa
fundamentar adequadamente o cotidiano da sala de aula.
As professoras, assim como alguns autores que
pesquisam o profissional prático-reflexivo (Zeichner,
1993; 1995; 1998) e Nóvoa (1992; 1995), consideram
que as discussões são enriquecidas quando se trabalha
em grupo e compreendem a necessidade do compartilhar,
de trocar experiências nos grupos, favorecendo o desenvolvimento profissional.
O pensamento das professoras a respeito das
contribuições dos encontros de desenvolvimento profissional para as docentes que os coordenam, aponta para
a crença de que o grupo constituído pelas docentes foi
sendo construído num caminho de vinculações,
resoluções de conflitos e empenhos em objetivos comuns.
Para as docentes envolvidas nesta pesquisa, a
possibilidade de coordenação dos encontros de desenvolvimento profissional permite que elas se avaliem como
docentes, tornando-se mais conscientes de suas
competências profissionais e responsáveis por uma parte
da formação de outros profissionais. Esta conscientização, segundo elas, juntamente com a reflexão a
respeito das ações docentes envolvidas na coordenação
destes grupos, promoveu seu desenvolvimento
profissional.
É interessante perceber que as discussões deflagradas nos encontros promovem, segundo o pensamento
das professoras, o desenvolvimento profissional de seus
participantes, uma vez que viabilizam a tomada de
consciência a respeito das teorias que fundamentam as
ações docentes. Assim, para as professoras, estas
discussões precisam ser retomadas cotidianamente na
sala de aula e repensadas de acordo com a situação
79
presente, para que as idéias resultantes das discussões
no grupo possam ser colocadas em prática.
Pode-se supor que as professoras concordam com
aquilo que é apontado na literatura a respeito do desenvolvimento do profissional prático-reflexivo: as discussões fazem parte da prática sistemática, devem ser
cotidianas, ocorridas de forma democrática e
compartilhada entre os membros de um grupo de
discussão.
O pensamento das professoras a respeito das
reflexões sobre a atuação docente em sala de aula deixa nítido que o professor é responsável não apenas pela
transmissão de conteúdos formais, mas também pela
formação de seus alunos enquanto sujeitos de seu
processo ensino-aprendizagem.
As professoras acreditam que devam influenciar, nas
crianças, a formação de suas crenças, para que suas
ações sejam cada vez mais autônomas e seguras. A
intervenção do educador que crê naquilo que comunica
e sente, faz com que as crianças percebam isso e o
respeite. Marcelo (1987) afirma que o educador tem
que ser capaz de ampliar seus horizontes, de perceber o
seu aluno enquanto indivíduo e ter talvez um pouco mais
de compreensão para entender diferentes formas de
aprendizado.
Além disso, pode-se inferir que para as professoras,
para que seu papel seja plenamente exercido, o professor
deve ter clareza de suas funções e consciência de seu
papel profissional. O professor deve se conscientizar
que aquilo que provoca as mudanças que tanto deseja
no processo ensino-aprendizagem é o fato de ser sujeito
participante de sua própria ação. Os docentes precisam
estar convencidos de que a teoria construída acerca de
pensamentos e discussões sobre sua própria prática é a
mais eficiente para que mudanças ocorram no processo.
Formação docente
No que diz respeito à concepção de formação, estas
professoras consideraram as influências recebidas pelo
profissional no curso de seu desenvolvimento, incluindo
aí, a epistemologia, a ideologia e a cultura. Isto significa
um desenvolvimento profissional nas mais diversas
dimensões, que acabam sendo edificadoras de muitos dos
saberes docentes. Pode-se supor que haja uma
compreensão, por parte das docentes, de que não se pode
mais considerar o desenvolvimento profissional como algo
estanque, mas, sim, como algo que possui uma
continuidade e que evolui, sendo, portanto, um processo.
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
Ao ponderar sobre o desenvolvimento profissional
docente, as professoras acreditam que é através do
investimento na formação docente que ocorre uma
melhoria na qualidade da educação. Esta formação,
por sua vez, vai muito além de um simples treinamento
de competências, que não atinge as reais necessidades
do professor. Refere-se a algo permeado pela vivência
de uma reflexão que o permita se educar enquanto
compartilha a prática cotidiana com seus pares, bem
como os saberes e crenças que estão entrelaçados à
ação docente.
Além deste aspecto, para elas, a chefia deve estar
atuando de forma bem fundamentada, tendo clareza
de seu objeto de estudo, para que possa realmente
influenciar seus pares em busca de uma meta comum,
auxiliando o professor a ter consciência da
fundamentação de suas ações, implicando, assim em
uma produção coletiva de conhecimentos. Deste modo,
pode-se inferir que as professoras acreditam que a
formação docente deve ser permeada pela reflexão,
sendo uma prática cotidiana, compartilhada com seus
pares e com a chefia, para que realmente seja
promovido um desenvolvimento profissional.
O pensamento das professoras a respeito da história
de formação aponta que as crenças a este respeito
são coerentes com aquelas apresentadas acerca da
concepção de professor. Para as professoras, não basta
concluir um curso de magistério para que o docente
seja capaz de colocar em prática todos os
procedimentos profissionais adequados. Pode-se supor
que, para elas, o máximo que estes cursos têm a
oferecer é uma boa base teórica na qual o docente
pode apoiar sua prática cotidiana. Embora seja de
fundamental importância que o professor tenha clareza
de uma determinada teoria, se ele não souber como
utilizá-la nas diferentes situações, imprevistos e dilemas da sala de aula, de nada lhe será útil. O professor
deve ser capaz de tomar sua própria ação como objeto
de reflexão, de análise e de desenvolvimento
profissional, e isto só se torna possível, por meio da
ação e da reflexão simultâneas..
Além disto, as professoras concebem o seu trabalho de formadoras de outros docentes como sendo
fundamental para o seu próprio desenvolvimento
profissional, diminuindo, assim, o suposto déficit
causado pela formação básica do magistério. Isto pode
ocorrer não de uma forma ingênua, mas se considerar,
principalmente, que ao se ministrar aulas, o mínimo
que o docente vai aprendendo é como resolver situações
dilemáticas com as quais ele convive cotidianamente,
bem como percebendo que sua trajetória exerce grande
influência na sua rotina docente.
Para estas professoras, estes cursos (encontros de
desenvolvimento profissional) promovem tanto para
quem ministra como para os professores que os
freqüentam, uma oportunidade de compartilhar angústias
e dúvidas. O professor não sai do curso sabendo tudo,
mas vai sendo capaz de se construir cotidianamente,
não se apoiando mais somente nos saberes prontos que
lhe foram e ainda serão repassados.
Nesta ótica, Pacheco e Flores (1999) acrescentam
que o professor que compartilha seus saberes jamais
deixa de aprender, uma vez que o ensino se torna uma
atividade que exige uma constante evolução e adaptação a novas situações.
O pensamento das professoras a respeito da relação
entre concepções teóricas e a atuação prática aponta
para o aspecto de que para as professoras, a rede
municipal de ensino possui uma determinada concepção
teórica para a atuação prática dos docentes que não é
explicitada e, conseqüentemente, não é completamente
compreendida por alguns deles. Porém, mesmo assim,
sem questioná-la ou buscar entendê-la, muitos docentes
a utilizam em sua prática profissional devido,
possivelmente, a uma aceitação das imposições
hierárquicas.
Assim, pode-se supor a partir das verbalizações que,
na concepção destas docentes, a prática cotidiana pode
também ser resultado do cumprimento de tarefas
sugeridas por especialistas. Isto, entretanto, é
contraditório com o que elas apresentam a respeito de
formação docente, quando afirmam que é fundamental
que se compreenda a teoria para que seja possível atuar
de modo eficaz e eficiente. Ao se partir do principio de
que as crenças interferem nas práticas cotidianas e estas
influenciam as escolhas pedagógicas, não é suficiente
uma ação em que se cumpre o que é ditado ou sugerido
por especialistas. Pode-se inferir, assim, que as docentes
estão iniciando um processo de alteração de suas
crenças, mas é necessário investir nisto para que seu
dia-a-dia não exija sugestões prescritivas (e não
reflexivas) por parte da coordenação.
As teorias já foram apontadas por elas como
exercendo grande influência no cotidiano do professor,
sendo, portanto, fundamental que ela seja bem entendida
para que seja colocada em prática. Mesmo tendo o
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
domínio da teoria, a prática exige do professor constantes
reflexões e análises de sua prática a partir de suas próprias teorias e saberes informais. Sem ter o completo
entendimento da concepção teórica utilizada, como é o
caso de muitos docentes, segundo as professoras em
questão, esta prática educativa e o ensino ocorrido em
sala de aula se tornam, portanto, ainda mais dificultados. A sabedoria docente que, conforme Dias-da-Silva
(1994), é construída ao longo dos tempos e portadora de
crenças, concepções, ideais, modos de ação,
procedimentos e hábitos, não necessariamente
condizentes com as teorias pedagógicas e acabam sendo,
praticamente, os únicos norteadores do dia-a-dia deste
professor e justificadores de suas ações.
Do mesmo modo como já foi anteriormente referido,
o pensamento das professoras a respeito da formação
de seus pares docentes aponta para a crença de que o
processo ensino-aprendizagem é construído
cotidianamente, não só a partir das teorias que
fundamentam sua ação, mas também a partir de
reflexões que são realizadas pelo grupo do qual elas
também são membros.
Desta forma, a partir das solicitações feitas pelas
docentes no decorrer dos encontros de desenvolvimento profissional é que se pode ir tendo clareza de que
está ocorrendo a apropriação do conteúdo ministrado, o
que pode ir, de alguma forma, dando suporte para
eventuais alterações tanto de estratégias como de metas
a serem atingidas.
Estas docentes consideram que a reflexão deve
permear a formação docente e que a ação de
compartilhar com os pares é a base estruturadora de
um desenvolvimento profissional. Estes cursos, portanto,
se tornam uma oportunidade rara no decorrer das
carreiras destes profissionais, de deixarem de lado o
modelo de executor de tarefas, para serem capazes de
se tornar, enfim, atores principais do cenário, aqui
referenciados sob o enfoque do professor práticoreflexivo.
Dilemas cotidianos
No que diz respeito à concepção de encontros de
desenvolvimento profissional, primeiramente pode-se
constatar um contraste de idéias e de ações em relação
às professoras e à chefia. A partir do momento que as
professoras teorizavam sobre sua prática e elaboravam
a maneira de executá-la, acreditavam estar realizando
seu trabalho de forma coerente com a proposta recebida.
81
Entretanto, essas mesmas teorizações não eram discutidas com a chefia, visto que estas não compartilhavam
a aplicabilidade do que era discutido pelas docentes.
Buscando evitar confrontos e discussões que
consideravam irrelevantes, já que acreditavam que o
trabalho realizado era correto, as docentes não
comunicavam suas decisões e encontravam-se em um
momento de executar aquilo que havia sido inicialmente
planejado por elas. A chefia não proporcionava momentos
de discussão sobre essas questões e, portanto, a prática
era executada sem um diálogo prévio sobre esta. Naquele
momento, surgiam questões referentes à validade do que
estava sendo executado e a chefia apresentava
justificativas que acabavam por inverter todo o processo,
modificando pensamentos e atitudes e gerando
sentimentos de revolta e incompreensão.
As professoras acreditavam que no momento da
prática, suas crenças não eram consideradas porque
tinham que executar aquilo que lhes era imposto. Segundo
Perrenoud (2001) os dilemas referentes a questões como
estas são comuns, visto que o profissional não sente que
tem autonomia suficiente para conciliar suas formulações
teóricas pessoais com sua atividade profissional. A maior
questão para essas docentes encontrava-se, portanto,
no contraste estabelecido entre acatar as ordens
recebidas pelas superioras e assim respeitar o referencial
teórico ou executar a prática da maneira como
acreditavam e agir de acordo com as suas experiências
apreendidas do cotidiano escolar. Se escolhessem a
primeira opção, as professoras estariam mais aliviadas
em relação às superioras, mas esse ato geraria nas
mesmas uma sensação de descredibilidade do trabalho
executado. Por outro lado, se optassem pela segunda
maneira de agir, teriam a certeza de estar realizando um
trabalho mais eficiente e condizente com a prática
reflexiva, mas enfrentariam situações com a chefia que
transformaria o trabalho a ser realizado em uma
obrigação e não mais fonte de desejo.
Impedir a prática dessas docentes da forma como
desejavam foi um ato da chefia que trouxe um sentimento
de exclusão nas mesmas, pois passaram a acreditar que
suas idéias não eram mais parte do projeto que se
buscava instalar na rede pública de ensino.
Quando o professor sente que suas idéias não são
consideradas, passa a definir a sua prática cotidiana
apenas pelas teorias que as embasam. E isso faz com
que a credibilidade na teorização da prática seja desfeita.
Inicia-se, portanto, uma crescente sensação de
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
estagnação. Segundo Pacheco (1995), é a constante
tomada de decisões sobre o que fazer que torna o professor um profissional ativo. Pensando acerca dessa
afirmação, conclui-se, portanto, que as docentes não
encontravam mais justificativa em seu trabalho. Isso
porque as decisões que tomavam previamente não
podiam ser efetivadas nos encontros, ou se fossem,
geravam polêmicas discussões sobre suas atitudes
enquanto profissionais. O sentido em ser um profissional
da educação passa, então, a ser questionado, visto que
não podiam agir de acordo com suas concepções e suas
crenças.
Independente da influência exercida pela experiência
cotidiana, qualquer profissional que use da reflexão sobre
seu trabalho precisa de um embasamento teórico sobre
aquilo que está praticando. Isso porque a prática deve
estar justificada, bem como ter como ser comprovada
caso ocorram questionamentos sobre ela. Um fato que
não se concretiza com as professoras, pois afinal, as
teorias que possuíam não poderiam ser usadas como
justificativas para sua prática cotidiana sendo que agiam
por determinações. As docentes não encontravam
maneiras para colocar em prática aquilo em que
acreditavam. Portanto, para elas, o que estavam fazendo
praticamente não tinha o menor sentido. Não era algo
em que acreditavam ou que tivessem subsídios para
explicar caso fossem questionadas a respeito. Há uma
quebra na dicotomia teoria e prática, e isso se deve ao
fato de que apenas uma parte dessa díade era elaborada
e estudada por elas. Só a teoria que essas professoras
possuíam era algo realmente delas, visto que a prática
era executada visando o cumprimento de ordens dadas
pelas suas superioras.
Segundo Pimenta (2001) é através da prática que o
ser humano sente que é um agente transformador do
mundo, seja ele que profissional for. A teoria é algo
que sustenta aquilo que está sendo realizado, mas não
pode e não deve ser a única via de atuação. Os aspectos
teóricos nos fornecem dados relevantes sobre a
situação, mas é muito importante lembrar que nenhum
momento é igual ao outro, portanto, uma solução que
foi utilizada num determinado contexto não
necessariamente poderá ser em um outro. O dilema
dessas profissionais instala-se na preocupação em
serem pessoas transformadoras na área da Educação
e sentirem através da prática que não estão sendo, nesse
determinado momento, capazes de alterar nem ao
menos os seus problemas cotidianos.
O professor precisa sentir que sabe aquilo que está
fazendo, que entende aquilo que executa e que tem
referencial teórico para embasar a sua atuação. Se isso
não acontece, ele sente que não há adequação nas suas
decisões pois vê-se determinado a agir diferentemente
de seus pensamentos..
No que se refere à concepção sobre ser docente, é
exatamente o maior dilema reportado pelas professoras, pois todos os fatores que as fizeram acreditar em
sua profissão estava agora sendo determinado por
pessoas que não compartilhavam de suas concepções e
que agiam arbitrariamente.
Para Pacheco (1995) o que guia as ações do
professor são os seus pensamentos acerca daquilo que
reflete e constrói. E tudo aquilo que as docentes
concretizavam como papel do professor estava agora
sendo desfeito pela falta de diálogo entre elas e as
superioras. O trabalho que realizavam não despertava
interesse da chefia a não ser quando estas sentiam que
suas ordens estavam sendo desrespeitadas.
As professoras foram gradativamente perdendo o
consenso daquilo que buscavam enquanto profissionais,
visto que sua concepção despertava novamente a
discordância e a discussão. Portanto, quando inseridas
no contexto da prática, o sentimento que surgia era
mesmo de impotência, sendo que as ações cotidianas
eram dirigidas por uma falsa concepção do que é ser
docente.
Ser professor implica, dentre outros aspectos, em ter
autonomia para buscar a sua profissionalização. Mas
isso não depende apenas do docente, sendo que a equipe
na qual está inserido tem um grande valor nesse
momento. O professor pode se auto-desenvolver profissionalmente, mas necessita do seu grupo para aperfeiçoar seu conhecimento adquirido, melhorando também os seus procedimentos. Como toda ação profissional exige mais do que saberes a respeito do que se está
fazendo, é muito importante que o docente discuta,
argumente, reflita e aprenda com a sua própria prática.
A troca de informações com demais professores e outros profissionais da área da Educação tende a contribuir
muito nesse desenvolvimento (Perrenoud, 2001).
Mas no caso da rede de ensino isso não é viável. O
desenvolvimento profissional das docentes era
coordenado pelas próprias professoras e por mais que
se encontrasse aprimorado, não estava passível de
concretização porque, para as dirigentes, a questão mais
importante era que tudo fosse seguido conforme o
Partilhando formação, prática e dilemas: uma contribuição ao desenvolvimento docente
cumprimento de suas instruções. Além do fato de que
se as professoras se interessassem em aperfeiçoar suas
práticas e tomarem conhecimento de aspectos novos
na área da Educação, teriam que fazê-lo sozinhas. E de
uma forma que parece contraditória, quando agiam de
acordo com suas crenças sentiam como se estivessem
ultrapassando regras e limites que estavam estabelecidos. Isso porque quando exerciam a prática conforme
suas concepções, tinham que explicar o que e por que
tinham agido daquela maneira.
Esse fato pode estar relacionado à falta de reflexão
das docentes acerca de seus papéis. a imposição acabava
sendo aceita por não encontrarem meios para compartilhar
a sua concepção sobre o papel do professor.
Conforme afirma Zeichner (1993), o docente analisa
e reflete sobre sua prática profissional, o que faz dele
sujeito de sua ação, que constantemente busca atingir
seus objetivos traçados inicialmente. O sentimento de
angústia surge nas docentes quando não se reconhecem
mais enquanto produtoras de suas ações e passam a
desconsiderar tudo aquilo que foi previamente proposto
para atingir objetivos previamente traçados pela chefia.
Quando percebem que deixaram de questionar o que é
mais relevante no papel que desempenham e
simplesmente passam a executar tarefas, as docentes
sentem que regrediram. Afinal, é no final da década de
60 e início da década seguinte que o cotidiano das escolas
era marcado pelo ideário tecnicista, que limitava a atividade docente.
No que se refere às relações interpessoais em relação
à chefia, as docentes demonstram uma desmotivação
crescente acerca de seu trabalho. Isso se deve principalmente ao fato de as decisões não serem compartilhadas, ficando nas professoras um sentimento de
imposição e arbitrariedade. A participação das mesmas
é cada vez mais escassa visto que são postas como
participantes passivas do processo na rede de
ensino.Não sentem que são consideradas nos momentos
de tomada de decisões, o que faz com que seu
sentimento de inferioridade aumente e interfira no
estabelecimento de relações interpessoais.
Um critério determinante para que exista uma equipe
pedagógica é a responsabilidade por um grupo determinado de alunos. se os interesses forem diferenciados
entre os profissionais, as concepções acerca do que deve
ser feito também se distanciam. Aí surge, nas equipes,
um único pensar, que se volta para a prática. Este passa
a ser o único elemento de preocupação de todos os
83
envolvidos, sendo que a equipe preocupa-se apenas com
resultados brutos e quantitativamente válidos. Esses
dados só podem ser obtidos através do intenso controle
e observação da prática (Pacheco, 2001).
Há, então, uma nova diferenciação entre chefia e
professoras. Enquanto as primeiras voltavam-se para a
solução dos problemas visando apenas colher resultados
através da prática, as docentes preocupavam-se com
os meios e estratégias a partir dos quais isso seria
conquistado.
No que se refere às relações interpessoais em
relação aos seus pares, verifica-se o enfraquecimento
pessoal das docentes, que surge com a minimização
de seus papéis, fator de grande interferência na
dinâmica do grupo formado por elas. Surgem, então,
as dúvidas sobre o seu desenvolvimento profissional,
visto que a fragmentação do grupo traz questões
referentes ao desejo de se submeterem às concepções
da chefia.
Surge nesse momento uma interferência muito grande
do que anteriormente só ocorria entre chefia e professora
entre as próprias docentes. A estagnação das ações
começa a interferir na motivação pessoal das docentes,
o que faz aumentar o quadro de revolta, o que também
traz a futura quebra do grupo.
Enquanto discutiam por uma causa maior no qual
todas acreditavam, as professoras ainda mantinham
esperanças de modificar o que estava sendo imposto.
Mas a partir do momento em que a discordância de
opiniões passa a refletir na relação das docentes, elas
adotam uma postura passiva perante às questões
educacionais.
Passam, então, a desacreditar de seus ideais e de
suas crenças pois percebem que o grupo está se
desagregando devido ao fato de algumas terem adotado
uma maneira diferente de pensar sobre as questões
relacionadas à Rede de Ensino.
Quando sentem que não compartilham mais as
mesmas opiniões percebem que chegou o momento da
separação. Fato que foi gerado previamente por uma
imposição arbitrária de opiniões de suas superioras, mas
que só se tornou irreversível quando foi capaz de penetrar
os pensamentos das companheiras e interferir nas
relações que no início eram consistentes e contavam
com opiniões compatíveis. A partir do momento que um
grupo não possui mais os mesmos objetivos, deixa de
ser um grupo para tornar-se apenas um conjunto de
pessoas.
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Ana Maria Sadalla, Mariana Wisnivesky, Paula Saretta, Fernanda Paulucci, Carolina Vieira e Carolina Marques
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa teve como ponto de partida e de
chegada a intervenção, a interação com as professoras
participantes, para que fosse possível promover a
reflexão e identificar suas crenças a respeito de sua
prática. O fato de as professoras terem solicitado a uma
psicóloga que as auxiliassem a discutir acerca de seu
cotidiano com outras professoras já é um indício de que
havia também uma idéia de que fossem discutidas possibilidades de buscar resolver problemas relativos ao seu
dia-a-dia. Assim, ao aceitarem transformar os encontros
de discussão em uma pesquisa favoreceu a consciência
de suas crenças.
Desde o seu título esta pesquisa tem a idéia de
partilhar, dividir, compartilhar crenças e os pensamentos
com as professoras participantes, podendo-se destacar
que os procedimentos utilizados favoreceram e promoveram a reflexão a respeito do que havia sido conversado
na semana anterior. Foi interessante perceber que os
resumos provocavam um certo impacto nas professoras,
visto que ao lerem aquilo que havia sido dito, mesmo
que não houvesse indicação nominal de autoria, as
professoras teciam comentários acerca da temática ou
mesmo do tempo gasto para discutir e comentar certos
aspectos de seu cotidiano, apresentando uma certa
surpresa, e em seguida, buscavam refletir sobre o que
havia sido discutido.
As entrevistas recorrentes tiveram também um
caráter de intervenção. Olhando para o que dizem os
resultados, pode-se dizer que este procedimento favoreceu a prática reflexiva das participantes, pois fez com
que elas entrassem em contato com suas crenças, que
as reconhecessem e que se achassem procedente tentassem alterar seu modo de agir, na direção de seu desenvolvimento profissional. Assim, tomar a conduta docente como objeto de reflexão e análise implica em
investigar seus fatores determinantes, de modo a viabilizar
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The Journal of Research Development in Education,
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o planejamento de ações futuras coerentes com as metas
traçadas.
Todo o caminho percorrido permitiu identificar alguns
aspectos que merecem um olhar mais atento no que se
refere aos três eixos temáticos contemplados, bem como
algumas possíveis generalizações para as discussões
aqui apontadas.
Uma discussão que aparece com muita ênfase no
decorrer de todo o trabalho é a necessidade de se vincular,
tanto na formação como no próprio cotidiano do
professor, a prática e a teoria. O importante é que, na
análise realizada junto com as professoras, não se perca
de vista que as práticas cotidianas influenciam as crenças
e as escolhas pedagógicas, por isto a consciência dos
pressupostos e das implicações educacionais das crenças
docentes deve ser sempre buscada.
É também importante apontar que este estudo foi
realizado durante três anos com um grupo bastante
específico de professoras e que as considerações aqui
feitas devem ser contextualizadas e considerados o lugar
e o espaço em que se davam as discussões acerca das
temáticas apontadas. Em nenhum momento as docentes
foram chamadas a discutir especificamente estas
temáticas. Houve, sim, um conjunto de 23 encontros em
que se buscava assessorar as professoras em relação
aos seus dilemas cotidianos, buscando, ao invés de
fornecer estratégias mágicas de solução, um espaço
privilegiado de discussão teórica sobre a prática. O fato
de ter havido uma seleção e uma categorização das falas
pode permitir ao leitor conhecer o que o grupo pensava
sobre estas temáticas. Entretanto, é fundamental apontar
que tudo o que ocorreu neste grupo (discussões mais ou
menos polêmicas, teorizações que foram sendo mais ou
menos apropriadas, relações interpessoais que foram
sendo construídas ao longo do ano letivo) sem dúvida
nenhuma, promoveu nestas professoras, bem como nas
pesquisadoras, o seu desenvolvimento profissional na
direção da reflexividade.
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Recebido em: 13/05/04
Revisado em: 22/09/04
Aprovado em: 11/04/05
Endereço para correspondência:
Ana Maria Falcão de Aragão Sadalla: Rua Engenheiro Alexandre Almeida Cavaleri, 160 casa 2
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Mariana Wisnivesky: Rua Engenheiro Alexandre Almeida Cavaleri, 33 Jardim das Palmeiras
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Paula Saretta: Rua Cuba, 159 ap 52 - Bairro Girassol
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Fernanda Costa Paulucci: Rua Clóvis Bevilaqua, 550 bl F 3 - apto11 - Guanabara.
CEP: 13075-040 - Campinas - SP – e-mail: [email protected]
Carolina Pasquote Vieira: Rua 14 de dezembro, 55 - apto 720 – Centro
CEP: 13015-13 - Campinas - SP – e-mail: [email protected]
Carolina de Aragão Escher Marques: Rua José de Toledo, 17 - apto 52 – Jardim do Trevo
CEP: 13040-034 - Campinas - SP – e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1
87-93
CLÍNICA-ESCOLA: LEVANTAMENTO DE INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO
PROCESSO PSICODIAGNÓSTICO
CLÍNICA-ESCOLA: LEVANTAMENTO DE INSTRUMENTOS
Fernanda Andrade de Freitas 1
Ana Paula Porto Noronha2
Resumo
O presente trabalho teve como objetivo fazer um levantamento da freqüência e da categoria dos testes psicológicos utilizados durante o
psicodiagnóstico em uma clínica-escola. O levantamento baseou-se em 32 prontuários do arquivo. Os resultados apontaram que os instrumentos
psicológicos mais utilizados foram HTP, CAT - A, T.A.T., e DFH. Quanto às faixas etárias dos sujeitos, verificou-se que as avaliações de crianças
envolveram mais técnicas psicológicas, do que as de adolescentes, adultos e idosos. Ainda em relação aos dados, percebe-se que há pouca variação
na utilização dos testes psicológicos, pois alguns deles foram usados em diferentes faixas etárias.
Palavras-Chave: Testes Psicológicos; Avaliação Psicológica; Clínica-Escola.
SCHOOL PSYCHOLOGY CLINIC: A SURVEY OF INSTRUMENTS USED IN PSYCHODIAGNOTICS PROCESS
Abstract
This study aims a survey about the frequency and category of the psychological tests used during the psychodiagnosis in a school psychology
clinic. The survey based on 32 patients’ report cards from the file. The results indicated that the most used psychological instruments were HTP,
CAT - A, T.A.T., e DFH. Related to the group age, the assessment carried out with children had involved more psychological techniques than in the
assessment carried out with teenagers, adults and elderly. There are few variations in the use of psychological tests because several of them carried
out with different age groups.
Keywords: Psychological Tests; Psychological Assessment; School Psychology Clinic.
INTRODUÇÃO
Testes psicológicos
Os testes psicológicos são instrumentos de uso privativo dos psicólogos, com base na Lei nº 4.119/62 (CFP,
2001). Esses instrumentos podem ser utilizados em vários contextos de atuação do psicólogo como em
instituições (escolas, empresas e clínicas-escolas de
universidades) com fins diagnósticos e interventivos.
A avaliação psicológica em contexto clínico é denominada de psicodiagnóstico que, por sua vez é definido
1
como processo científico, limitado no tempo que utiliza
métodos e técnicas psicológicas, para entender problemas à luz de pressupostos teóricos, assim como para
identificar e avaliar aspectos específicos (Cunha, 2000).
Ocampo, Arzeno, Felzenswalb e Piccolo (1986) definem psicodiagnóstico como
um processo que configura uma situação com papéis bem definidos e com um contrato onde uma
Psicóloga, Mestre em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Docente do
curso de graduação em Psicologia, da Universidade São Francisco.
2
Doutora em Psicologia: ciência e profissão pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Docente do Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Psicologia, da Universidade São Francisco. Bolsista Produtividade em Pesquisa CNPq.
88
Fernanda Andrade de Freitas e Ana Paula Porto Noronha
pessoa (paciente) pede que ajudem e outra (o psicólogo) aceita o pedido e se compromete a satisfazêlo na medida de suas possibilidades. É uma situação
bi-pessoal (psicólogo-paciente ou psicólogo-grupo
familiar), de duração limitada, cujo o objetivo é
conseguir uma descrição e compreensão,o mais profunda e completa possível, da personalidade total
do paciente ou do grupo familiar....Abrange os
aspectos passados, presentes (diagnóstico) e futuros (prognósticos) desta personalidade, utilizando
para alcançar tais objetivos certas técnicas
(entrevista semidirigida, técnicas projetivas,
entrevista de devolução) (p. 17).
Nesse sentido, os testes psicológicos, compreendidos
por esses autores como uma técnica, são utilizados no
psicodiagnóstico a fim de classificar e descrever o comportamento dos sujeitos com o objetivo de enquadrá-lo em
tipologias, permitindo ao profissional tirar conclusões sobre
os outros e, estabelecer prognósticos (Pasquali, 2001).
Os testes psicológicos apresentam características diferentes das outras técnicas, pois são compreendidos como
“uma medida objetiva e padronizada de uma amostra de
comportamento” (Anastasi & Urbina, 2000, p. 18). Essas
características dos testes psicológicos, a saber,
objetividade, uniformidade de procedimento com base
numa amostra de comportament, são as que os diferem
de outras técnicas, tais como, entrevista, observação, dinâmicas de grupo ou de outras, por serem menos objetivas.
O psicodiagnóstico compreende várias etapas que
envolvem a entrevista inicial, a administração dos testes e,
por último a entrevista de devolução (Nunes, conforme
citado por Cunha, 2000). A administração dos testes
caracteriza um momento peculiar do processo de avaliação devido à possibilidade de obter dados sobre a pessoa
em questão, a fim de conhecer sua história mais
detalhadamente, assim como buscar informações relacionadas ao desenvolvimento, à escolaridade, às relações familiares, aos aspectos profissionais, sociais, entre outros.
No que se refere ao ensino de psicodiagnóstico também denominado de avaliação psicológica, Quelho,
Munhoz, Damião e Gomes (1999) afirmam que a disciplina (psicodiagnóstico) é um dos pilares fundamentais
do curso de Psicologia, cujo objetivo é desenvolver no
aluno a integração dos conhecimentos. Nas clínicasescolas, o processo de avaliação psicológica é subdividido
em teoria e prática, reservando ao aluno a oportunidade
de experenciá-lo, desde a compreensão das queixas
relatadas pelo cliente até ao encaminhamento para a
terapia psicológica ou outro tratamento, se necessário.
A prática do aluno está, necessariamente, embasada
em disciplinas, como a Psicopatologia e Técnicas de
Exames Psicológicos (TEP), consideradas imprescindíveis
no processo de aprendizagem (Quelho & cols. 1999;
Yukimitsu, 1999). Elas, por sua vez, abordam a
administração e os testes e técnicas, a integração de dados e a compreensão dos transtornos mentais.
Vale destacar que o aluno, em relação à parte prática do psicodiagnóstico, tem como respaldo o estágio
supervisionado no qual o elemento central é a supervisão
(Campos, 1995). Aos supervisores responsáveis pelo
conteúdo prático do psicodiagnóstico, são atribuídas as
responsabilidades de planejar as supervisões, para que
o supervisionado tenha o mínimo de experiência e
competência para a livre prática profissional, uma vez
que a supervisão fornece uma orientação formalizada
para suprir as necessidades de formação dos alunos
(Archanjo & cols. 1998).
DIFERENTES CONTEXTOS EM AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Problemas na formação do profissional na área de
Avaliação Psicológica foram identificados pelo Fórum
de Discussão promovido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP, 1997), sobretudo no que se refere à deficiência e carência de fundamentação teórica. Um retrato
dessa deficiência pode ser descrito por Quelho e cols.
(1999) quando levantaram as concordâncias e
discordâncias junto aos supervisores, em relação ao processo de ensino da disciplina de psicodiagnóstico. Os
argumentos dos sete supervisores foram organizados em
objetivos de curso, pré-requisitos e dificuldades dos alunos. A partir disso, foram apontadas as dificuldades dos
alunos no que se refere à incapacidade de associar
informações advindas de diversas fontes, além da falta
de prática para associar teoria e prática para lidar com
materiais de testes. A disciplina Técnicas de Exames
Psicológicos é um dos pré-requisitos para o estágio
supervisionado em psicodiagnóstico, e ainda os
supervisores descrevem aspectos gerais da utilização
de testes no psicodiagnóstico, a saber, o fato deles utilizarem os testes psicológicos de forma padrão, indicarem
teste de acordo com a necessidade do cliente e nem
sempre fazer uso deles.
Clínica-escola: Levantamento de instrumentos utilizados no processo psicodiagnóstico
Nesse sentido, a formação profissional deve ser eficiente e garantir uma preparação adequada aos futuros
psicólogos, pois se espera que diante da utilização dos
testes psicológicos, os psicólogos tenham competência
suficiente para aplicar e interpretar com adequação os
resultados da avaliação. Sob esta perspectiva, vale destacar que a maioria das críticas aos testes não se refere
apenas às suas características intrínsecas, mas também
ao uso inadequado dos resultados de testes por usuários
não qualificados (Anastasi & Urbina, 2000).
Com a preocupação de retratar o ensino das técnicas de exames psicológicos no Brasil, Alves, Marques e
Alchieri (2001) fizeram levantamento de 65 programas
de disciplinas da área de Avaliação Psicológica por meio
dos coordenadores de diversas universidades e também
pelos professores que ministram as disciplinas
relacionados a Técnicas de Exames Psicológicos (TEP).
Os resultados revelaram que em 8 cursos há apenas
uma disciplina destinada à Avaliação Psicológica, sendo
que o Instituto de Psicologia da Universidade São Paulo
- (USP) e a Universidade Gama Filho, são os cursos
com maior números de disciplinas destinadas à Avaliação Psicológica, 12 e 8 respectivamente.
Os pesquisadores também identificaram que os testes e técnicas mais ensinados no caso da avaliação da
inteligência são: Raven (70%), WISC (69,2%), Colúmbia
e o Goodenough-Harris (41,5%); dentre os testes
projetivos destacam-se o T.A.T. (75,4%), CAT e o HTP
(69,2) e Rorschach (58,5%); já dentre os testes de personalidade estão o PMK (47,7%), 16 PF (38,5%), MMPI
(27,7%) e o Palográfico (16,9%). Na categoria de aptidões específicas, a Bateria CEPA e o DAT são os mais
ensinados, ambos, com 47,7%; em relação aos testes
de interesse Angelini (41,5%), Kuder (36,8%) e o LIP
(24,6%). O Teste de Bender (69,2%) e o Teste
Metropolitano de Prontidão (18,5%) também se destacaram dentre os mais ensinados. A média total de
instrumentos ensinados por curso é de 18,7.
Em contraste ao ensino de testes psicológicos,
Noronha, Oliveira e Beraldo (2003) listaram os
instrumentos mais conhecidos e utilizados por profissionais e alunos de Psicologia cursando o último ano. As
autoras constataram que os alunos conhecem em média
37,82 instrumentos (DP 36,87), o que representa
21,82% dos 169 listados pelas autoras, enquanto os
profissionais conhecem média maior do que os alunos,
ou seja, 48,79 da relação apresentada a eles. As autoras concluíram que alguns dos instrumentos mais
89
conhecidos são também os mais ensinados nos cursos
de formação em psicologia, demonstrando a tendência
de reproduzir o conhecido, bem como a pequena abertura para o novo.
Em outro contexto, Noronha e cols (2002b) investigaram os instrumentos mais conhecidos por estudantes do
sul de Minas Gerais. Os resultados apontaram que o
WISC é o mais citado, seguido do PMK, Bender, Raven
- Escala Geral, CAT - Animais, CAT - Humanas, Bateria Fatorial CEPA, Rorschach, O Desenho da Figura
Humana, Colúmbia, Wartegg, DAT, Inventário de
Interesses, Teste da Árvore e o T.A.T. As autoras
questionam a falta de critérios para a eleição dos
instrumentos que deveriam ser ensinados.
Ainda no que se refere aos testes mais conhecidos/
utilizados, Oliveira e Castro (2000) realizaram levantamento
das queixas apresentadas pelos pacientes e das técnicas
de exames psicológicos mais utilizadas nos atendimentos
em uma clínica-escola na prática de psicodiagnóstico, de
acordo com 60 prontuários analisados. Os resultados
revelaram que os testes mais utilizados com crianças são:
CAT (43%), WISC (27%), HTP (13%), Desenho-História
(13%), Bender (10%), Raven (10%), DFH (10%), Colúmbia
(7%) e o IAR (4%). Os testes de inteligência foram os
mais usados, seguidos dos testes de personalidade. No caso
da avaliação de adultos, os instrumentos mais usados foram: T.A.T. (47%), Rorschach (23%), DFH (13%),
Wartegg (10%) e o Desenho-História (4%).
A presente pesquisa levantou a freqüência e as
categorias dos testes e técnicas mais utilizadas no
Psicodiagnóstico de uma clínica-escola e observou se
há diferença no número de instrumentos utilizados nas
diferentes faixas etárias dos respectivos clientes.
MÉTODO
Fonte de dados documental
Para a realização dessa pesquisa foram consultados
32 prontuários dos 76 mantidos no arquivo de uma clínicaescola de uma universidade particular do interior de São
Paulo. Importante destacar que os prontuários levantados correspondiam aos arquivamentos realizados em dois
semestres, correspondentes ao segundo semestre do ano
de 2001 e ao primeiro semestre de 2002, sendo 53%
(F=17) dos prontuários relativos ao primeiro ano e 47%
(F=15), do segundo.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 87-93
90
Fernanda Andrade de Freitas e Ana Paula Porto Noronha
Procedimento
O trabalho consistiu no levantamento de todos os
prontuários que tivessem o processo de psicodiagnóstico
completo ou semicompleto, ou seja, o completo implicava
na realização da sessão devolutiva, enquanto o
semicompleto, na ausência dela. As autoras, com base
em cada prontuário, anotavam os testes psicológicos
(CAT-A, CAT-H, HTP, Zulliger, Fábulas, DFH, Bender,
Symonds, Wartegg, G-36, T.A.T.) utilizados e também
outras técnicas como a entrevista (inicial, com a mãe e
a devolutiva), anamnese, Hora do Jogo.
RESULTADOS
Frente aos achados desse estudo, verificou-se que a
maioria dos clientes que procurou por atendimento na
clínica-escola era do sexo feminino (F=18), enquanto
F=14 era do sexo masculino, não observada diferença
significativa entre as variáveis gênero e semestre [X2
(1, N=32) = 0,395, p=0,530]. De acordo com a Tabela
1, a maioria dos sujeitos freqüentava o ensino
fundamental 53% (F=17), e uma minoria tinha o ensino
superior 3,1% (F=1). Em relação ao número de sessões
realizadas, constatou-se que em média foram efetuadas
cinco sessões, variando de uma a 13 (DP= 2,86).
Tabela 1. Freqüência do nível de instrução dos sujeitos
referentes aos prontuários.
Nível de Instrução
F
F%
Infantil I e II
3
9,4
Creche
1
3,1
Ensino Fundamental
17
53,1
Ensino Médio
7
21,9
Ensino Superior
1
3,1
Sem dados
3
9,4
Total
32
100
Na Tabela 2 encontram-se os testes psicológicos
mais usados, a saber, HTP, CAT-A, CAT-H e Zulliger.
Ainda em relação aos testes, 66,7% (F=8) eram de avaliação da personalidade, 16,7% (F=2) de inteligência,
8,3% (F=1) de prontidão para alfabetização e 8,3% (F=1)
visomotores, totalizando 12 testes utilizados.
Quanto à freqüência com que os testes eram utilizados, o mais requisitado foi o HTP, sendo que seis
terapeutas-estagiários fizeram uso dessa técnica de
avaliação. Em seguida encontrou-se o CAT-A
(41,6%, F=5), o T.A.T., (33,3%, F=4) e o DFH (25%,
F=3). O HTP e o T.A.T. tiveram maiores freqüências
de utilização na terceira sessão e o CAT-A, na quinta
sessão. As sessões em que mais se aplicaram testes psicológicos, durante o processo de
psicodiagnóstico, foram da terceira sessão (3S) até
a sexta sessão (6S).
Tanto na primeira como na segunda sessão, observou-se uma freqüência maior de técnicas psicológicas
para iniciar o processo de avaliação, tais como, entrevista
inicial, e entrevista com a mãe, hora do jogo e anamnese,
sendo as mais freqüentes a entrevista inicial com o paciente e a entrevista com a mãe. Já a partir da sexta
sessão em diante, percebeu-se que a freqüência de utilização dos testes psicológicos e ainda o uso das técnicas, bem como a entrevista inicial, hora do jogo e
anamnese.
Para melhor organização da distribuição dos testes
psicológicos por idade, as autoras definiram o grupo 1
correspondente a faixa etária (1 - 12 anos), na qual,
concentra-se o maior número de pessoas (F=17), já no
grupo 2 (13 – 20 anos) com F= 6, seguida do grupo 3
(21 - 40) com F=7 e por último o grupo 4 (41 anos em
diante) com F=2 (Tabela 3).
Nota-se que o grupo 1 (1 – 12 anos) utilizou mais
técnicas, a saber, hora do jogo, entrevista inicial,
entrevista com a mãe e a entrevista devolutiva. Os
testes mais utilizados foram CAT-A, CAT-H, HTP,
Fábulas, DFH e Bender. Já no grupo 2 (13 – 20 anos)
a utilização da entrevista inicial, se deu numa
freqüência menor em comparação com o grupo 1.
O uso dos testes psicológicos, distinguiu-se bastante do grupo 1, em função da população atendida,
sendo mais utilizados o T.A.T. (F=3), HTP (F=1),
Symonds (F=1).
No grupo 3 (21 – 40 anos), a entrevista foi a técnica mais utilizada (F=16). Os testes psicológicos para
esse grupo foram o HTP e T.A.T., Zulliger e o Bender.
As técnicas utilizadas no grupo 4 (41 anos em diante)
obtiveram a mesma proporção comparado ao grupo
3, como: a entrevista inicial, anamnese e devolutiva
(F=2). Enquanto os testes T.A.T., HTP e Zulliger apareceram com maior freqüência no grupo 4. Vale
ressaltar que diante da amostra de 32 prontuários
coletados, somente 13 deles, apresentaram o psicodiagnóstico completo.
Clínica-escola: Levantamento de instrumentos utilizados no processo psicodiagnóstico
91
Tabela 2. Distribuição da freqüência dos instrumentos e testes psicológicos utilizados por sessão.
Técnicas/Testes
S1
S2
S3
S4
S5
S6
S7
Entrevista Inicial
13
13
10
7
4
1
2
Entrevista com a mãe
13
2
1
1
1
Hora do Jogo
5
4
4
1
1
2
1
7
3
1
1
1
5
1
1
S8
S9
S10
S11
S12
S13
TOTAL
Psicológicos
Anamnese
Devolutiva
http
3
CAT-A
1
T.A.T.
3
1
50
18
1
18
1
4
14
1
1
1
2
2
1
14
6
1
5
1
4
DFH
1
CAT-H
1
1
2
Zulliger
1
1
2
Fábulas
1
1
Bender
1
Symonds
1
Wartegg
1
2
1
2
1
2
1
1
G-36
1
1
1
Teste Metropolitano
1
1
Tabela 3. Levantamento das técnicas e testes psicológicos por idade/grupo.
Técnicas e
testes utilizados
Entrevista Inicial
Anamnese
Entrevista com a mãe
Hora do Jogo
CAT-A
CAT-H
HTP
Zulliger
Fábulas
DFH
Bender
Symonds
Wartegg
G-3
TAT
Devolutiva
TOTAL
Grupo 1
F
%
19
38
10
71,4
13
72,2
19
100
5
100
2
100
2
33,3
0
0
2
100
2
100
1
50
0
0
0
0
0
0
0
0
7
50
17
Grupo 2
F
%
13
26
0
0
3
16,7
0
0
0
0
0
0
1
16,7
0
0
0
0
0
0
0
0
1
100
0
0
0
0
3
42,9
3
21,4
6
Grupo 3
F
%
16
32
2
14,3
2
11,1
0
0
0
0
0
0
2
33,3
1
50
0
0
0
0
1
50
0
0
1
100
1
100
2
28,6
2
14,3
7
Grupo 4
TOTAL
F
%
F
2
4
50
2
14,3
14
0
0
18
0
0
19
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32
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 87-93
92
Fernanda Andrade de Freitas e Ana Paula Porto Noronha
DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS
O levantamento de dados permitiu visualizar uma
homogeneidade, ou seja, pouca variação na escolha de
testes, mesmo considerando as diferentes faixas etárias.
O teste HTP, por exemplo, é utilizado nos diferentes
grupos de idade, o T.A.T. encontra-se em adolescentes
e adultos, enquanto o Bender (avaliação percepto-motora
e emocional) foi descrito como sendo utilizado em
crianças e adultos.
Os achados estão em concordância com os de Castro
e Oliveira (2000), à medida que os autores afirmam que
os testes mais utilizados em crianças são o CAT, HTP e
Bender, e com adultos, T.A.T., Zulliger e Rorschach.
Ainda nesse sentido, observou-se que os mesmos testes aparecem como sendo utilizados tanto com crianças
quanto com adultos. O estudo de Alves e cols. (2001)
retrata resultados semelhantes ao abordar as técnicas e
os testes mais ensinados na disciplina de TEP no curso
de Psicologia. A respeito disso, Noronha e cols. (2003)
afirmam que alguns dos instrumentos mais conhecidos
são também os mais ensinados nos cursos de formação
em psicologia.
Os testes projetivos são os mais utilizados nessa
realidade de clínica-escola. Para Alves (1997) há
pertinência na sua aplicação no processo de avaliação,
pois eles têm ampla aplicação para investigação e diagnóstico da personalidade. Em contrapartida, reconhecese que outras formas de avaliar a personalidade, tais
como inventários, escalas, questionários podem ser
igualmente eficientes, considerando que os padronizados “oferecem vantagens em relação aos não estru-
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Noronha, Sartori, Freitas, Ottati, 2002, p. 144).
Contrariamente ao que se afirmou até agora, ou seja,
que os instrumentos mais usados são os ensinados na
graduação em Psicologia, o teste Zulliger usado no processo Psicodiagnóstico desse estudo, não tem sido identificado como ensinado nos cursos de Psicologia, assim
como não figura dentre os mais conhecidos por profissionais e estudantes de Psicologia (Oliveira & Castro,
2000; Alves & cols. 2001; Noronha & cols. 2003).
No que se refere à formação profissional
estudos têm apontado para a sua relação com o
uso adequado dos instrumentos de medida. Nesse
sentido, Noronha (2002), Anastasi e Urbina (2000),
Cunha (2000) e Prieto e Muñiz (1999) endossam a
tese de que a Psicologia, assim como qualquer outra área de conhecimento, necessita de profissionais competentes que realizem ações seguras e
pontuais. Além disso, cursos de “reciclagem” desses profissionais, assim como palestras de atualização desenvolvidas por órgãos e associações de
classe podem colaborar na disseminação de informações atualizadas.
Sabe-se que esse trabalho não respondeu todas as
questões e nem poderia fazê-lo, considerando as muitas
necessidades que a área de avaliação ainda possui no
Brasil atualmente. Sugere-se que novos estudos posam
abordar a relação entre a natureza da queixa (psicodiagnóstico) associada à faixa etária e aos instrumentos
mais utilizados, assim como a análise da relação entre
técnicas e testes empregados e abordagem teórica.
Archanjo, C. M. A., Güntter, A. E. V., Camargo, C., Fabriani, C.,
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Recebido em: 17/11/04
Revisado em: 28/04/05
Aprovado em: 20/05/05
Endereço para correspondência:
Fernanda Andrade de Freitas: Rua Luís Nunes, 324 - Bairro Jacaré – CEP: 13318-000 – Cabreúva - SP
e-mail: [email protected]
Ana Paula Porto Noronha: Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 – CEP 13251-900 – Itatiba - SP
e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 87-93
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1
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PSICOLOGIA ESCOLAR EM EDUCAÇÃO INFANTIL: REFLEXÕES DE UMA ATUAÇÃO
PSICOLOGIA ESCOLAR E EDUCAÇÃO INFANTIL
Tatiana Vokoy1
Regina Lúcia Sucupira Pedroza2
Resumo
O modelo de Educação Infantil tem sido alterado à medida que a criança passa a ser vista como sujeito de educação, com necessidade de
atendimento qualificado. O trabalho do psicólogo escolar permeia questões relacionadas ao desenvolvimento integral da criança, abrangendo
aspectos cognitivos, afetivos e motores. A pesquisa foi desenvolvida em uma instituição de Educação Infantil de Brasília com objetivo de conhecer
a prática educativa e a atuação do psicólogo escolar. Foram realizadas entrevistas com a equipe psicopedagógica e observações de atividades da rotina
escolar. Concluímos que o modelo de atuação do psicólogo deve ser fundamentado no paradigma interdisciplinar, contextual e crítico. Este estudo
vislumbra novas possibilidades para repensar o processo de construção do papel do psicólogo escolar na Educação Infantil.
Palavras-chave: Psicologia Escolar; Educação Infantil; Desenvolvimento infantil.
SCHOOL PSYCHOLOGY IN CHILDHOOD EDUCATION: PROFISSIONAL INTERVENTION´S REFLEXIONS
Abstract
The model of childhood education has been modified as that the child is seen as the subject of education, who needs qualified attendance. The
work of the school psychologist involves questions related to the whole development of the child, including cognitive, affective and motor aspects.
The research was developed at an institution of childhood education in Brasilia with the purpose to get to know both educational practices and the
work of the school psychologist. Interviews with the pedagogical team and observations of school routine activities have been carried through. We
conclude that the model of work of the psychologist must be based on a contextual, critical and interdisciplinary paradigm. This study intends to
provide new possibilities to rethink the process of constructing the role of the school psychologist in childhood education.
Keywords School Psychology; Childhood Education; Child Development
INTRODUÇÃO
Conforme a análise histórica feita por Campos
(2001), constata-se que a concepção de Educação
Infantil vem se constituindo a partir de movimentos
sociais que acarretam mudanças na visão da criança,
do seu desenvolvimento, da família e do papel da mulher
na sociedade. Com isso, o modelo de educação
caracterizado anteriormente pela “creche” vem sofrendo
mudanças na qualidade do atendimento e na abrangência
de aspectos psicopedagógicos enfatizados nessa nova
concepção.
A criança se insere, atualmente, no sistema educacional cada vez mais cedo. Muitas das mudanças
1
2
referidas foram provocadas por uma maior participação feminina no mercado de trabalho, alterando a rotina
de cuidados e a educação dos filhos. Esse fato é
relacionado com a criação das creches. Nesse sentido,
a creche estava sempre associada a um caráter
assistencialista e se preocupava apenas com a alimentação, a higiene e a segurança física.
Para Campos (2001), com o enfraquecimento da visão estigmatizante e assistencialista da educação,
instaurou-se um movimento social e governamental pelo
atendimento de novas demandas, que resultou no recente
reconhecimento da educação infantil em creches e pré-
Graduanda em Psicologia pela Universidade de Brasília .
Professora adjunta do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.
96
escolas como um dever do Estado e um direito da
criança, legalmente estabelecido no artigo 208, inciso
IV, da Constituição Federal de 1988. Essa mudança foi
reafirmada nos anos de 1990, pelo Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA), e em 1996, pela Lei n° 9394
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Com a LDB, surge a Educação Infantil, com novos
objetivos, que engloba as crianças entre 0 e 6 anos. A
Educação Infantil passa a olhar o momento de desenvolvimento da criança, vendo-a como sujeito integrado,
sem dissociar aspectos cognitivos, afetivos, expressivos,
motores ou simbólicos.
Portanto, o modelo de Educação Infantil tem sido
alterado à medida que a concepção de educação da
criança de 0 a 6 anos atinge objetivos diferenciados,
com propostas educacionais explícitas fundamentadas
em teorias psicológicas do desenvolvimento infantil. A
criança nessa idade passa a ser vista como sujeito de
educação, com necessidade de atendimento qualificado
que vise o seu desenvolvimento integral.
O desenvolvimento infantil de 0 a 6 anos
Tendo em vista a proposta do atendimento à criança
na Educação Infantil que engloba os aspectos funcionais
e relacionais, é necessário que a escola e o educador
conheçam os diferentes momentos do desenvolvimento
da criança de 0 a 6 anos.
Segundo Wallon (1934), a criança deve ser estudada
na sucessão das etapas de desenvolvimento
caracterizadas pelos domínios funcionais da afetividade,
do ato motor e do conhecimento, entendidos como sendo
desenvolvidos primordialmente pelo meio social.
Os estágios do desenvolvimento propostos por Wallon
(1934) têm início na vida intra-uterina, caracterizada por
uma simbiose orgânica. Após o nascimento, apresentase o estágio impulsivo- emocional no qual prevalece a
emoção, caracterizado como o período da simbiose
afetiva. No período seguinte, que vai até os 2 anos de
idade, a criança encontra-se no estágio sensório-motor
e projetivo, voltando-se para a exploração do mundo
físico. Gradualmente, com a aquisição da marcha e da
linguagem, a criança apresenta modificações no seu
padrão de interação com o mundo.
A partir dos 3 anos, ocorre o estágio do personalismo, momento da constituição do eu, no qual a criança
em seu confronto com o outro passa por uma verdadeira
crise de personalidade, caracterizada pelas mudanças
nas suas relações com o seu entorno e pelo aparecimento
Tatiana Vokoy e Regina Lúcia Sucupira Pedroza
de novas aptidões. Wallon (1953) considera esse estágio,
que vai até os 6 anos de idade, como sendo muito
importante para a formação da personalidade.
Nesse sentido, considerando a idade compreendida
na Educação Infantil, ressaltam-se as características
desse momento do desenvolvimento da criança como
forma de oferecer subsídios para a atuação do educador e do psicólogo escolar nesse contexto. Partese do princípio da necessidade de que a escola e todos aqueles envolvidos com a Educação Infantil
tenham consciência de que suas ações têm conseqüências não só no momento atual do desenvolvimento
da criança, como também nos posteriores. É também
nesse momento que a criança está mais propensa à
formação de complexos, ou seja, atitudes que podem
marcar de forma prolongada seu comportamento em
relação ao meio (Deldine & Vermeulen, 1999;
Mahoney, 2002).
Ao ingressar na escola, a família ainda se constitui no
grupo por excelência para a criança. No entanto, a escola
proporciona uma diversificação dos grupos nos quais a
criança poderá se inserir. O papel do grupo formado por
crianças da mesma idade passa a ser o de favorecer a
aprendizagem social, ou seja, o convívio com os padrões
e regras sociais. Durante esse estágio, o grupo permitirá
à criança diferenciar-se dos outros e descobrir sua autonomia e sua originalidade (Wallon, 1953).
O estágio do personalismo divide-se em três períodos distintos, todos com o objetivo de tornar o eu mais
independente e diversificado. São eles: período da
negação, idade da graça e período da imitação. No
primeiro, o da negação, surge na criança a necessidade
de se autoafirmar, de impor sua visão pessoal e lutar
para fazer prevalecer sua opinião.
No período seguinte, o da idade da graça, por volta
dos quatro anos de idade, a criança desenvolve maneiras
de ser admirada e chamar a atenção para si através da
sedução, com uma necessidade de agradar cujo objetivo
é obter a aprovação dos demais. A criança passa a se
considerar em função da admiração que acredita poder
despertar nas pessoas. Ressalta-se a importância da
oferta de oportunidades de expressão espontânea da
criança, através de atividades como a música, a dança,
artes, etc. Exercitar na criança as habilidades de
representação do seu meio, ou seja, através do faz-deconta ou do uso da linguagem, contribui para que ela
adquira uma precisão maior na expressão de seu eu
(Galvão, 1992).
Psicologia escolar em educação infantil: Reflexões de uma atuação
O terceiro período, o da imitação, por volta dos 5
anos, é marcado por uma reaproximação ao outro,
manifestada pelo gosto por imitar, que possui um papel
essencial na assimilação do mundo exterior. O professor
deve observar que sua figura geralmente desperta o
desejo de identificação no aluno, devendo estar
consciente de tal fato para estabelecer sua conduta.
Wallon (1939) entende a imitação como uma
“necessidade de identificar-se com a realidade percebida
para identificá-la melhor” (p.231).
A partir dessas considerações, verifica-se que a
Educação Infantil possui um papel importantíssimo na
formação da personalidade da criança, visto que permite
a sua adaptação à vivência em comunidade, em grupos
que vão além dos limites familiares, e contribui para a
formação do eu psíquico. A escola pode estimular o
desenvolvimento de valores saudáveis nas interações,
tais como a cooperação, a solidariedade, o
companheirismo e o coletivismo. As atividades em grupo
devem alternar-se com atividades individuais fazendo
assim uso das alternâncias comuns nesse estágio para
promover o desenvolvimento de mais recursos de
personalidade (Wallon, 1937).
A Psicologia Escolar e a Educação Infantil
A atuação do psicólogo escolar na Educação Infantil,
assim como em outras áreas, vem sendo discutida a
partir do crescimento das demandas nas diferentes
instituições sociais. Conseqüentemente, o profissional de
psicologia ao repensar seu modo de atuação, busca novas
perspectivas para sua intervenção e questiona o
conhecimento psicológico e seus instrumentos tradicionais, adaptando-os aos novos contextos, levando em
consideração as limitações inerentes às instituições.
Segundo Patto (1984), a psicologia escolar tem como
base do seu desenvolvimento os estudos que deram origem
ao nascimento da psicologia como ciência com uma
demanda de prover conceitos e instrumentos “científicos”
de medida. A primeira função desempenhada pelos
psicólogos na escola foi a mensuração das habilidades e
classificações das crianças quanto à capacidade de
aprender e de progredir nos estudos. Além disso, outra
forma de atuação adotada pelos psicólogos na escola foi
a de orientação basicamente clínica no sentido de
diagnóstico e tratamento de distúrbios.
Ao reconhecer a importância da psicologia no
contexto escolar, junto aos alunos, às suas famílias e
aos professores, Souza (1997) aponta a necessidade de
97
mudança na atuação do psicólogo. Historicamente, ele
vem desenvolvendo suas atividades pautado na
individualidade do aluno e na queixa do professor da
falta de condições de trabalho e das deficiências e dificuldades de aprendizagem das crianças. Dessa forma,
as relações sociais existentes na escola não são
consideradas como constituintes dos processos de
desenvolvimento e aprendizagem.
Souza (2000) afirma que não existem modelos préconcebidos para se trabalhar na escola, mas “princípios
norteadores de uma prática a serviço da superação da
exclusão, da estigmatização e da desigualdade” (p.136).
Sayão e Guarido (1997) também salientam a necessidade
da mudança do foco da atuação do psicólogo escolar,
para não ser restrito à orientação psicológica sobre as
crianças, mas envolver os aspectos da relação entre a
equipe e os educadores, contemplando os conflitos, as
insatisfações e contradições inerentes às práticas sociais.
A partir das idéias dessas autoras, podemos apontar como
“princípios norteadores” dessa prática os seguintes
pontos: trabalho com os professores; a etnografia como
metodologia; interdisciplinaridade; trabalho junto às
famílias; e trabalho com a criança.
O psicólogo escolar deve ter como objetivo junto aos
professores encorajá-los a desenvolver cada vez mais
um papel ativo no processo educacional. Nesse processo,
é imprescindível a estimulação do pensamento crítico, a
fim de uma melhor compreensão da sua atuação
profissional.
De acordo com a proposta da educação libertadora
de Freire (1986), a prática educativa deve ser
problematizadora, realizando a superação entre as
contradições existentes nas relações professor-aluno.
Neste caso, a investigação é realizada de forma crítica,
possui caráter reflexivo e realiza um constante
desvelamento da realidade. A prática crítica contribui
para o diálogo, para a criatividade e para a desmistificação de estigmas nas relações pedagógicas.
Vários autores vêm estudando a questão da formação
do professor. Oliveira (2001) e Pedroza (2003) entendem
essa formação em termos dos processos de desenvolvimento pessoal do educador, levando em consideração
seus valores, crenças, hábitos, atitudes e formas de se
relacionar. Enfatiza-se, portanto, a necessidade de uma
formação psicológica, a fim de desenvolver recursos de
personalidade que promovam uma maior sensibilidade,
criatividade e segurança, que possibilitem uma atuação
em que o professor assuma as próprias contradições e
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 95-104
98
as da escola e busque a construção do novo. Além disso, é preciso garantir com esses profissionais um espaço
para reflexão de sua prática educativa. O psicólogo
escolar ao contribuir para a formação pessoal do
professor, numa perspectiva teórica e metodológica,
possibilita a compreensão das relações de extrema
complexidade e contradição que envolvem o cotidiano
da escola.
Novas metodologias devem ser empregadas a fim
de contemplar os fenômenos históricos existentes na
escola. Para Machado e Souza (1997) o psicólogo
escolar, ao invés de realizar anamnese familiar ou utilizar predominantemente testes, deveria conhecer como
o professor entende os problemas do aluno, colher
informações sobre a sala de aula e a história escolar de
cada criança.
Souza (1997) nos fornece sugestões de métodos
etnográficos na área educacional que visam estudar a
vida diária na escola, as redes de relações e a maneira
como os educadores concebem a sua atuação. Dessa
forma, a autora sugere uma convivência com as crianças
e com a escola, a partir de observação participante,
entrevistas abertas, visitas domiciliares e participação
em espaços lúdicos, com objetivos de estabelecer vínculo
de confiança, criar possibilidades de escuta e
oportunidades de dar voz aos educadores e aos alunos.
Esses espaços são preconizados por diversos autores como sendo essenciais para que os membros da
escola expressem seus conflitos, repensem as relações
hierárquicas e busquem determinantes históricos para
os fenômenos escolares (Mamede, 2001; Aragão, 2001;
Souza, 1997; Sayão & Guarido, 1997; Machado, 2000).
Criam-se condições para o estabelecimento de trocas
de idéias e promoção de mudanças de atuação frente
às dificuldades relacionais. Sendo assim, os autores do
presente estudo consideram a metodologia etnográfica
mais adequada no trabalho do psicólogo escolar porque
contribui para evitar a fixação de ideologias naturalizantes
e de discursos institucionalizados e cristalizados, além
de permitir inovações pedagógicas, por meio da reflexão
e do diálogo.
Propõe-se a construção de uma intensa interseção
entre os diversos saberes que possam contribuir para a
compreensão dos fenômenos escolares, criando e
desenvolvendo um espaço interdisciplinar, em especial,
entre a Psicologia e a Pedagogia. As relações entre essas
diferentes áreas podem parecer óbvias; no entanto, são
complexas e envolvem vários aspectos, tanto
Tatiana Vokoy e Regina Lúcia Sucupira Pedroza
concordantes como de oposição. A posição da psicologia na sua relação com a pedagogia tem sido muitas
vezes de autoridade, ultrapassando os limites de sua
competência. Conforme preconizado por Wallon (1937),
não é função da psicologia normatizar a ação pedagógica,
como também não é ação pedagógica uma aplicação da
psicologia. A presença do psicólogo no dia-a-dia da escola
constitui-se de grande necessidade para criar espaços
de diálogo e reflexão a fim de contribuir para a
construção de uma escola mais democrática. A presença
dos diferentes profissionais deve ser de complementaridade e não de exclusão (Pedroza, 2003).
A escola deve reconhecer a importância da família
na constituição do sujeito, sem, no entanto, considerá-la
como a única determinante dessa constituição. O trabalho junto às famílias deve questionar a atribuição das
causas dos problemas de aprendizagem à dinâmica
familiar. Família e escola não podem ser vistas como
momentos de oposição ou de disputa na educação das
crianças. São instituições diferentes e necessárias na
constituição do sujeito, exigindo, pois, uma relação de
apoio sem transferência de responsabilidades. Para
Machado (2000), no trabalho junto aos pais, o psicólogo
ao explicar e defender os objetivos educacionais, não
deve impor sua visão de educação, mas orientá-los no
sentido do entendimento da sua intervenção,
possibilitando a formação de grupos de expressão e
comunicação, para um melhor conhecimento da
realidade da criança.
O psicólogo escolar deve atuar junto à criança de forma
problematizadora, dando-lhe voz a fim de construir sentidos
históricos aos fenômenos que a envolvem, como queixas
de comportamento, dificuldades de socialização, etc. A
culpabilização do sujeito tem sido uma tendência de tornar
natural aquilo que é historicamente determinado.
O trabalho a ser desenvolvido pelo psicólogo deve
ter como objeto as relações nas quais a criança circula.
No entanto, existem crianças que precisam de
atendimento individual pois podem estar sofrendo ou até
mesmo encontrarem-se paralisadas. Contudo, não é
possível estabelecer-se uma relação direta de causa e
efeito entre as dificuldades escolares e suas capacidades
(Machado, 2000). Uma outra possibilidade de atuação
do psicólogo junto à criança é promover atividades
verticais, que envolvam grupos de idades variadas. De
acordo com Mamede (2001), esse tipo de atividade
favorece trocas entre os adultos e as crianças e entre
as próprias crianças, exigindo um ajustamento de seus
Psicologia escolar em educação infantil: Reflexões de uma atuação
comportamentos e aprendizados, o que contribui para o
processo de desenvolvimento.
Assim sendo, a partir desses “princípios norteadores”,
entendemos que o papel do psicólogo na escola, desde a
Educação Infantil, ultrapassa as funções tradicionalmente
atribuídas, tais como, medir habilidades e classificar
crianças quanto à capacidade de aprender e de progredir
pelos vários graus escolares. Ele passa a exercer as
funções de: consultor, especialista em educação,
ergonomista, modificador do comportamento,
pesquisador, estendendo sua ação à comunidade,
conforme apresentado em Patto (1984). Dessa forma,
a atuação do psicólogo escolar não se limita a uma ação
psicometrista e clínica, no sentido de diagnóstico e tratamento, a serviço de uma ideologia de ajustamento, de
eficiência, de prevenção, de adaptação e de alienação.
Pode-se acrescentar ainda sugestões para a atuação
do psicólogo em instituição escolar, vistas em Meira
(2000), tais como: contribuir com a construção e/ou
manutenção de uma gestão escolar democrática
viabilizando um trabalho coletivo e solidário; ampliar a
participação da comunidade na escola; e auxiliar na
escolha de materiais didáticos que estimulem o
pensamento crítico e criativo dos alunos.
De acordo com o exposto sobre o desenvolvimento
infantil, segundo Wallon (1937), o psicólogo, junto com
os educadores, deve procurar entender esse processo
na sucessão das etapas e dos conflitos provocados pelas
crises que pontuam o crescimento. Essa etapa do
desenvolvimento na Educação Infantil compreende o
movimento da construção do eu psíquico e o
entendimento desse processo deve auxiliar os educadores no cotidiano da sua prática pedagógica.
Tendo em vista a importância da atuação da
Psicologia Escolar nesse nível de escolarização, objetivouse com o presente trabalho entrar em contato com a
prática educativa de uma instituição de Educação Infantil
a fim de investigar o papel do psicólogo escolar.
MÉTODO
Participantes
Psicóloga escolar que atua em uma escola de
Educação Infantil no Plano Piloto de Brasília, que
funciona como uma Associação de pais e professores,
sem fins lucrativos. Foi fundada em 1982 por um grupo
99
de pais insatisfeitos com o modelo tradicional existente
de pré-escola. Pela ligação com os novos movimentos
culturais da época, ficou conhecida pela expressão
“escola alternativa”. A estrutura administrativa da
Associação tem como instância soberana a Assembléia
Geral de todos os associados; uma Diretoria Executiva
eleita anualmente, composta pelos associados; Conselhos
Fiscal e Pedagógico; e Comissões de Trabalhos (Espaço
Físico, Higiene e Saúde, Eventos, Comunicação e o
“Pequenas Notas”, que é um informativo mensal). A
equipe profissional conta com 24 professores, com
formação ou em processo de formação acadêmica em
diferentes áreas do conhecimento; duas coordenadoras
(Psicóloga e Pedagoga); sete colaboradores na equipe
de apoio, uma secretária e uma administradora. A escola
funciona nos períodos matutino e vespertino, com 12
turmas, sendo 6 em cada período. Atende a 126 alunos
e o máximo por sala é de 16 crianças As turmas, todas
com dois professores, são denominadas de Ciclos
correspondentes às idades de dois a seis anos.
Instrumentos
Roteiro de entrevista semi-estruturada; gravador de
áudio; notas de campo.
Procedimento
A fim de conhecer o trabalho desenvolvido pela
psicóloga da escola foram realizadas três entrevistas e
sete observações em diferentes tipos de atividades da
rotina escolar.
A primeira entrevista foi realizada com a psicóloga e
teve por objetivo levantar informações sobre sua
formação profissional e sua atuação na escola. A
entrevista aconteceu no galpão da escola e foi registrada
em áudio e posteriormente transcrita. A segunda
entrevista foi realizada com a administradora objetivando
levantar dados acerca da estrutura organizacional e
funcionamento da Associação. Por último, foi
entrevistada a coordenadora pedagógica para conhecer
o funcionamento e as atividades desenvolvidas por todos os profissionais da escola.
As observações foram feitas em diferentes
momentos: duas na sala de aula (roda de histórias, trabalho corporal, atividades plásticas, utilização de
combinados); duas no parque e uma de atividade vertical
(lanche coletivo, colagem de bandeirinhas para festa
junina). Além disso, observaram-se duas reuniões de
professores com a psicóloga e a construção conjunta
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Tatiana Vokoy e Regina Lúcia Sucupira Pedroza
entre professores e psicóloga de texto sobre a agressividade infantil.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
De acordo com a publicação da Associação Pró Educação Vivendo e Aprendendo (1999) e com o que
foi observado na escola, podemos constatar que o principal objetivo da escola é desenvolver as potencialidades
da criança, no que diz respeito aos aspectos físico,
intelectual, psicológico, afetivo, motor, artístico e social,
valorizando suas formas de expressão e ajudando-a a
se sentir mais segura e feliz. Além desse objetivo, a escola
visa a criação de condições para a socialização, a autonomia e o equilíbrio emocional da criança. Proporcionase a especulação e exploração dos materiais apropriados ao desenvolvimento da criança, integrando sociabilidade, representação e organização do pensamento, através da expressão verbal, corporal e criadora.
O embasamento teórico da proposta pedagógica da
escola foi sendo desenvolvido a partir das contribuições
das teorias sócioculturais, passando pela influência do
construtivismo e da psicanálise. Atualmente, existe uma
forte presença das idéias de Wallon (1937) sobre o
desenvolvimento da criança. Um dos princípios básicos
da escola é o respeito à capacidade de responsabilidade
da criança. Para tanto, antes do estabelecimento de
regras, tudo é combinado entre professores e crianças.
Os combinados são resgatados a cada situação de
conflito ou de transgressão às regras, procurando-se o
estabelecimento dos limites e das possibilidades de
relações crianças-adultos e crianças-crianças. O
professor encoraja a empatia, o colocar-se no lugar do
outro, a conversa e estimula a expressão do “eu não
gostei”. Aos poucos, a criança internaliza formas de lidar
com situações de conflito baseadas nas noções de
respeito e justiça, se tornando mais autônoma para
superá-las.
Nesse contexto, verificou-se que o professor exerce
um papel de organizador das relações sociais no espaço
educativo, além de estimular as experiências do grupo,
acompanhando as transformações deste, conforme
proposto por vários autores.(Kramer, 2000; Sayão &
Guarido,1999). Os professores procuram dar
oportunidades às crianças de manifestarem suas opiniões,
decidirem o que fazer, desde a arrumação da sala até a
disciplina do próprio grupo. Tudo isso é feito dentro de
uma rotina que compreende uma atividade de
concentração seguida de uma de expansão. Uma vez
por semana as turmas se encontram no parque e fazem
um lanche coletivo e uma atividade vertical, comum a
todas as turmas. Ao proporcionar uma rotina com base
no conhecimento do ritmo da criança, próprio ao seu
estágio de desenvolvimento, coloca-se a questão do outro, do grupo, do social e da relação com os colegas e
com os professores. A rotina é um limite e um caminho
que indica uma outra forma de satisfação das
necessidades da criança (Rego, 1996). Ela conhece o
espaço da escola, seu limite físico e social e suas regras
de relacionamento. Sendo assim, auxilia-se a organização do seu pensamento, possibilitando planejar ações a
serem realizadas futuramente, imaginar eventos e a lidar com ações seqüenciais.
As crianças são avaliadas diariamente por meio da
observação e registro no diário do professor. São feitos
relatórios individuais e do grupo que são entregues
bimestralmente aos pais e discutidos em reuniões, com
a presença da coordenadora pedagógica e da psicóloga.
A atuação da psicóloga nesse contexto consiste no
trabalho em equipe pedagógica, composta pelos
professores, coordenadora pedagógica e equipe de apoio.
A partir da entrevista com a psicóloga, verificamos que
sua atuação é permeada pelos ideais da escola e pela
utilização de várias áreas da psicologia, tais como:
desenvolvimento, clínica, psicologia escolar propriamente
dita e organizacional. Como referencial teórico, ela aponta o construtivismo de Piaget, a perspectiva sóciohistórica de Vygotsky e de Wallon e contribuições da
psicanálise. Esses vários conhecimentos são utilizados
para dar conta da complexidade que envolve o seu trabalho, visto que atua diretamente com as crianças, com
os professores, com os pais, com a comunidade e com a
equipe pedagógica.
Com formação na Universidade de Havana, Cuba, e
validação do diploma pela Universidade de Brasília, a
psicóloga vem atuando na escola desde 2001, com uma
carga horária de 25 horas semanais. As atividades
desenvolvidas pela psicóloga relatadas na entrevista
foram:
Observações em sala de aula
Como metodologia de trabalho, a psicóloga utiliza-se
da observação participante para colher informações
sobre a sala de aula e a história escolar de cada criança.
Essas observações são realizadas de forma
Psicologia escolar em educação infantil: Reflexões de uma atuação
assistemática. Essa metodologia está de acordo com o
apresentado anteriormente no item sobre etnografia
(Machado & Souza,1997). Nessas observações, são
levados em consideração diversos aspectos, enfatizandose as relações com os adultos e com os colegas, as
atividades pedagógicas, a sociabilidade e o
desenvolvimento psicomotor e emocional da criança. É
a partir das informações resultantes dessas observações
que a psicóloga faz o seu planejamento de atuação junto
à equipe pedagógica.
Orientação de professores
Com o objetivo de auxiliar no desenvolvimento de
sua prática pedagógica, a psicóloga promove discussões
com os professores sobre diferentes temas que surgem
no dia-a-dia escolar, tais como, limites, atuações criativas
e autoritarismo do professor. De acordo com os
“princípios norteadores” referidos anteriormente neste
trabalho, constatamos que sua atuação promove a
formação continuada e pessoal do professor, como
propõem Oliveira (2001) e Pedroza (2003), e possibilita
a problematização e questionamento dos conflitos
existentes nas relações com os alunos e toda a
comunidade escolar. A psicóloga, nessas discussões,
também relaciona as atividades pedagógicas com os
aspectos do desenvolvimento infantil ao questionar seus
objetivos e a sua relevância para o grupo e para cada
criança individualmente.
Nessas reuniões, a psicóloga cria um espaço de escuta
e acompanhamento do cotidiano do professor,
propiciando um conhecimento de suas necessidades.
Além dessas reuniões com a dupla de professores, também são realizados encontros quinzenalmente à noite
para reunir a equipe pedagógica. Nesse momento, são
levantados temas para realização de palestras,
discussões sobre leituras de textos previamente indicados
e planejamento das atividades pedagógicas, festivas e
da Associação.
Atendimento individualizado de criança
A partir da rotina de trabalho de observação em sala
de aula, com o objetivo de conhecer as relações
estabelecidas na turma, pode-se verificar uma
necessidade de atendimento individual a uma determinada criança. Esse atendimento é realizado por meio do
diálogo, da utilização de desenhos e de brincadeiras que
permitem à criança expressar possíveis sofrimentos ou
dificuldades de socialização. Dessa maneira, a psicólo-
101
ga atua de forma problematizadora, conforme apontado
por diversos autores (Machado, 2000; Mamede, 2001;
Meira, 2000). Quando a demanda transcende o trabalho da psicóloga no espaço escolar, ela encaminha ao
profissional especialista, por exemplo, psiquiatra,
neurologista, fonaudiólogo.
Atendimento aos pais
Ao matricular um filho na escola, os pais são
chamados para uma entrevista com a psicóloga com o
objetivo de promover a integração da escola com a
família. Nessa entrevista, é criado um espaço onde os
pais podem relatar a história de vida da criança e a
dinâmica da família e expressar suas expectativas em
relação à escola. Nesse momento, os pais são
incentivados a contribuir nas atividades da escola, de
acordo com seus interesses profissionais, e são
convidados a participar de uma das Comissões da
Associação.
Além dessas entrevistas iniciais, a psicóloga atende
os pais para orientações sobre demandas trazidas pelos
professores ou mesmo a pedido da família; também
indica leituras para os pais, de acordo com as
necessidades. Desse modo, nota-se que o trabalho
realizado pela psicóloga contempla a visão de que família
e escola devem ser vistas como momentos de união que
assumem conjuntamente as responsabilidades pela
formação das crianças (Machado, 2000).
Reunião pedagógica bimestral
Os relatórios individuais e de grupo são discutidos
nas reuniões bimestrais, junto com os professores, os
pais e a coordenadora pedagógica e a psicóloga, que
circulam nos diferentes Ciclos. A participação da psicóloga é relatada como uma atividade fundamental para o
conhecimento do desenvolvimento da criança e do
grupo. Também se torna um momento de intervenção
para a formação dos pais, principalmente em relação ao
projeto pedagógico proposto pela escola.
A psicóloga comenta que há freqüentemente dúvidas e anseios sobre o papel da Educação Infantil,
especialmente no que se refere ao processo de alfabetização. Esses anseios refletem a preocupação dos pais
focalizada apenas no desenvolvimento cognitivo,
representado como sendo a função mais importante da
escola. Ao trabalhar com a concepção de
desenvolvimento total, torna-se necessário um trabalho
de esclarecimento de questões relacionadas aos dife-
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 95-104
102
rentes aspectos da formação da pessoa, como o
psicomotor, a cognição, o afeto e o relacional. Nesse
sentido, o processo de alfabetização é visto, nessa proposta, como integrado a todos esses processos.
A psicóloga relatou que a única dificuldade vivenciada
na sua atuação é a grande demanda de trabalho, uma
vez que sua permanência na escola não é de tempo
integral. Em relação às atividades desenvolvidas, não
se queixa, pois percebe um amplo reconhecimento por
toda a equipe da importância do papel do psicólogo
escolar. Mesmo assim, a psicóloga considera necessário
ter sempre clara a definição do seu trabalho,
fundamentando sua atuação nas teorias que construíram
a proposta pedagógica da escola.
Foi possível observar dois encontros da psicóloga com
o grupo de professores, reunidos com a equipe
pedagógica. No primeiro encontro, a intervenção da
psicóloga referiu-se a orientações sobre temas sugeridos
pelos professores, tais como comportamentos de alunos
dentro e fora de sala de aula, agitação, violência, além
de dificuldades encontradas no dia-a-dia de sala de aula,
que vão desde a atuação pedagógica até a relação com
a família. A psicóloga forneceu orientações aos
professores que abrangeram questões relacionadas à
necessidade de uma atuação mais criativa e menos autoritária em sala de aula, a fim de transformar os
acontecimentos cotidianos que geram conflitos em
momentos pedagógicos. Essa atuação condiz com as
idéias de Wallon (Pedroza, 1993). Também se discutiu a
percepção dos professores sobre a falta de
comprometimento de alguns pais com a educação dos
seus filhos bem como estratégias para aumentar o
vínculo deles com a escola. A queixa principal dos
professores diz respeito à frustração gerada pelo distanciamento da família, que acarreta em uma construção
de uma relação de cobrança mútua.
Outro assunto levantado foi a inclusão de alunos com
necessidades especiais. Os professores relataram as
dificuldades encontradas em flexibilizar sua prática
docente para atender essas necessidades e pediam ajuda
para encontrar estratégias de intervenção em sala de
aula assim como encaminhamento a outros profissionais.
Após a escuta dos problemas expostos pelos
professores, a psicóloga propôs uma discussão com a
equipe a fim de encontrar respostas a partir das
experiências de cada profissional. Deixou claro que as
soluções para essas dificuldades seriam construídas no
coletivo, nos diferentes momentos, tais como as reuniões
Tatiana Vokoy e Regina Lúcia Sucupira Pedroza
pedagógicas e os encontros individuais com os professores que trouxeram aquela demanda específica e estudo
de textos sobre o assunto.
No segundo encontro, observou-se a construção
grupal de um texto sobre a agressividade infantil. Essa
atividade explicita o caráter de coletividade da equipe
pedagógica. A psicóloga indicou uma bibliografia sobre
o tema para que os professores pudessem se preparar
para a elaboração final do texto. O tema da agressividade
infantil suscitou a discussão sobre o papel do professor
como mediador, assim como o desenvolvimento da moral
infantil e de valores como justiça, regras e limites.
Reconheceu-se a necessidade de acolher as crianças
envolvidas em uma situação de agressão, possibilitando
o diálogo, a verbalização dos fatos e das emoções, numa
conversa sem julgamento e que favoreça um espaço
para se pensar alternativas de soluções que exclua o
confronto físico. Dessa maneira procura-se evitar rótulos
de agressor e de vítima e estimula-se a introjeção do
“eu não gostei”. Foi discutida a necessidade da postura
do professor frente essa situação para não se envolver
emocionalmente, não assumir o papel de juiz e nem
cristalizar o conflito. Foi possível observar a constante
lembrança da necessidade de se repetir os “combinados”
junto aos alunos, com o objetivo de reforçar as regras
que regem as relações na escola.
A construção desse texto em conjunto fornece uma
oportunidade de reflexão, de troca de experiências e de
discussão entre os profissionais da escola, em busca de
soluções coletivas mediadas pela intervenção da psicóloga escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das entrevistas e das observações sobre a
atuação da psicóloga escolar em uma instituição de Educação Infantil, pôde-se constatar a importância da presença desse profissional no desenvolvimento das
atividades nesse contexto. A observação do trabalho dessa
psicóloga evidencia a relevância da contribuição da Psicologia sem, no entanto, corroborar a noção da onipotência
dessa profissão frente aos demais profissionais.
Considerou-se relevantes as características particulares dessa instituição para o desenvolvimento do
trabalho dessa psicóloga. Contudo, percebemos que
esse trabalho evidencia a possibilidade de uma
Psicologia escolar em educação infantil: Reflexões de uma atuação
103
intervenção condizente com as nossas propostas de
atuação da Psicologia Escolar, fundamentadas numa
perspectiva sócio-histórica. A partir dessa perspectiva, acredita-se que o psicólogo escolar deve refletir
criticamente sobre as condições sociais para não
recorrer ao mecanismo da naturalização como justificativa dos fenômenos psicológicos. Esse modelo
mais crítico de atuação deverá substituir o modelo
clínico de intervenção. Dessa forma, o modelo clínico
deve ser superado por um paradigma interdisciplinar,
subjetivador e contextual. Sua atuação deve contemplar todos os envolvidos no complexo relacional
existente na escola, como professores, funcionários,
família e comunidade. Considerou-se a escola como
um espaço em que os diversos saberes são complementares de forma a maximizar a interdisciplinaridade,
principalmente na intersecção entre o trabalho dos
profissionais da psicologia e da pedagogia.
Conclui-se que é fundamental a atuação do Psicólogo
na Educação Infantil, a fim de contribuir para o desenvolvimento de recursos da personalidade das crianças, visando
a formação de indivíduos autônomos, críticos e solidários.
Concordamos com Souza (1997), quando aponta a
necessidade da presença do psicólogo no dia-a-dia da escola
para criar espaços de diálogo e reflexão a fim de contribuir
para a construção de uma escola mais democrática.
Considerou-se a relevância deste estudo por vislumbrar novas possibilidades para a construção do papel do
psicólogo escolar na Educação Infantil, numa perspectiva teórica e metodológica que permita a compreensão
das relações de extrema complexidade e contradição
que envolvem o cotidiano da escola.
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Recebido em: 04/06/04
Revisado em: 29/10/04
Aprovado em: 17/11/04
Endereço para correspondência:
Tatiana Yokoy: QN 07 conjunto 09 casa 21– CEP: 71805-709 – Riacho – Fundo-DF
e-mail: [email protected] ou [email protected]
Regina L.S. Pedroza: Colina Bloco H – apto. 302 – CEP: 70.910/900 – Brasília -DF
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Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 105-115
INCLUSÃO ESCOLAR: VISÃO DE ALUNOS SEM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS
INCLUSÃO ESCOLAR
Nilza Sanches Tessaro1
Ana Sayuri Ribeiro Waricoda²
Renata Cristina Marques Bolonheis²
Ana Paula Barletta Rosa2
Resumo
O presente estudo trata de questões referentes à inclusão de alunos com deficiência em classes comuns do ensino regular. Teve por objetivo geral
verificar a visão de alunos sem necessidades educativas especiais sobre a inclusão escolar. Participaram da pesquisa 40 alunos de escolas públicas de
ensino básico com vivências diferentes quanto à inclusão (20 alunos que participavam da inclusão escolar e 20 que não participavam). Foi utilizado
um questionário composto por três questões abertas. Os dados foram examinados mediante análise de conteúdo e análise estatística (qui-quadrado).
Tais resultados revelaram que a maioria dos participantes demonstrou credibilidade à inclusão escolar, e apontaram várias dificuldades envolvidas
nesse processo, destacando-se a discriminação social. Os sentimentos decorrentes da inclusão que predominaram entre os participantes foram
positivos.
Palavras-chave: Educação; Aluno; Excepcionalidade
SCHOLAR INCLUSION:
VIEW OF STUDENTS WITHOUT SPECIAL EDUCATIVE NECESSITIES
Abstract
The present study refers to the inclusion of students with special needs in classrooms of regular schools. The purpose was to assess the opinion
students without disability have about inclusive education. A total of 40 students with different experiences regarding inclusion (20 from special
schools and 20 from public primary schools) participated in the research. A questionnaire containing three open questions was employed to collect
data. The data was examined for content and statistical significance (chi-squared). The results revealed that most of the students have a satisfactory
opinion about inclusion. However they have pointed out several difficulties regarding inclusion, in particular, social discrimination. The feeling of
most students towards inclusion were positive ones.
Keywords: Education; Student; Disability.
INTRODUÇÃO
O
preconceito e a discriminação dos indivíduos diferentes, fundamentalmente os portadores de deformidades físicas e mentais, podem ser observados no decorrer
de toda história da humanidade (Bernardi, 2004). Segundo
Moussatché (1997), nas sociedades primitivas os deficientes eram condenados à morte. Na Europa medieval,
ora eram considerados enviados do divino, ora como obras
do demônio. Já no fim da Idade Média os deficientes foram livrados do assassinato, mas se tornaram culpados
1
2
pela própria deficiência. Pessoti (1984) lembra que no
período anterior a era cristã os deficientes eram
considerados como “coisas” e não como pessoas, sendo
negligenciados, maltratados e até eliminados.
No final do século XVIII, conforme discute Amiralian
(1986), surgiram atitudes mais humanitárias, que, por
meio de estudos e pesquisas, buscavam compreender
as especificidades do indivíduo portador de necessidades
especiais. Bernardi (2004) aponta que os hospícios, nessa
Doutora em Psicologia e docente do curso de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá.
Acadêmicas do 5º ano do curso de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá.
106
Nilza Sanches Tessaro, Ana Sayuri R. Waricoda, Renata Cristina Marques Bolonheis e Ana Paula Barletta Rosa
época, passaram a abrigar não só os deficientes, mas
todos aqueles que causavam incômodo à sociedade.
Ainda nesse período, iniciou-se uma defesa pelo direito
à educação dos desprezados e excluídos pela família e
sociedade; com isso, a educação especial, visando a
escolarização de crianças anormais, desponta nesse
contexto.
De acordo com Karagiannis, Stainback e Stainback
(1999a), durante o século XIX e grande parte do século
XX, a educação especial para alunos com deficiência
ocupou lugar de destaque, observando-se uma tendência muito grande à segregação para o controle dos deficientes, consideradas pessoas “indesejáveis”. Já nas
últimas décadas do século XX, em função das modificações nas concepções envolvendo a deficiência e a
educação especial, foi surgindo uma nova forma de
entender a problemática dos deficientes na perspectiva
pseudoeducativa. Assim, por volta das décadas de 80 e
90 do século passado, a educação inclusiva, em busca
de um único sistema educacional para todas as pessoas, ganha repercussão.
Visando melhorias para as condições educacionais,
documentos como a Declaração Mundial de Educação
para todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994)
foram criados. Esses documentos têm como objetivo
garantir o atendimento das necessidades de aprendizagem de todas as crianças e proporcionar a inserção da
educação especial dentro da estrutura ampla da educação (Sant’Ana, 2003).
Segundo Fonseca (1995), só se pode falar de
integração quando há uma efetiva interação entre deficientes e não deficientes. Os programas de ensino
especial devem estar compatibilizados com os do
ensino regular; faz-se necessário o convívio social entre
os alunos, professores e demais profissionais da escola;
e a participação da família é importante nesse processo.
A integração é um processo complexo que envolve a
adaptação de todas as partes: população geral,
profissionais, familiares e a própria pessoa a ser
integrada.
Torna-se importante, então, não se ter uma visão
simplista da educação inclusiva. Sartoretto (2001) a
compreende como um processo muito amplo de reforma
do sistema escolar. A escola deve abrir espaço para a
diversidade humana; os professores devem estar
continuamente em busca do aprendizado sobre como
se deve ensinar, para que possam proporcionar um
ensino de qualidade a todos. Infelizmente como alerta
Santos (2001), ainda hoje muitos entendem,
erroneamente, a inclusão como simplesmente a prática
de colocar pessoas com deficiência estudando com outras não portadoras de necessidades especiais.
Vale ressaltar que o princípio básico da educação
inclusiva implica na possibilidade de que todas as
crianças aprendam juntas, independentemente de suas
dificuldades ou diferenças. As escolas devem
reconhecer e responder às diversas necessidades dos
alunos, acomodando tanto estilos como ritmos de aprendizagem, assim assegurando um ensino de qualidade a
todos (Mendes, 2002).
Para Glat, Magalhães e Carneiro (1998) a escola
inclusiva apenas poderá se concretizar a partir de
condições muitos especiais de recursos humanos e pedagógicos. Para esses autores, o despreparo dos professores para receber o aluno com deficiência em sua
sala de aula constitui um dos principais óbices para a
efetiva inserção desse aluno no sistema regular de
ensino. Tesini e Manzini (1999) alertam que integração/
inclusão envolve professores mais capacitados em
relação às necessidades especiais, bem como uma pedagogia que se ajuste às necessidades de cada criança
e a definição de uma política que venha subsidiar princípios e práticas para as necessidades educativas
especiais.
Para Gotti (1998), inclusão escolar significa um novo
marco conceitual e ideológico, o qual precisa envolver
políticas, serviços sociais e comunidade. Implica
considerar, aceitar e reconhecer a diversidade na vida e
na sociedade, isto é, identificar que cada indivíduo é
único, com suas necessidades, desejos e peculiaridades
próprias.
Atualmente existem várias pesquisas que abordam
a temática da inclusão escolar do deficiente. Faleiros
(2001), em seu estudo sobre educação inclusiva, verificou que os alunos incluídos apresentaram ganhos
quanto à socialização e a aprendizagem, contudo, a
escola não fornece o apoio necessário para a inclusão
desses alunos.
Uma pesquisa desenvolvida por Hemmingson e
Borell (2001), com escolas que tinham alunos com deficiência física estudando em classes comuns, mostrou a
falta de estrutura das mesmas para atender esse tipo de
aluno. Os resultados revelaram barreiras físicas ao
acesso às dependências das escolas, representadas pela
falta de rampas, elevadores e portas com trinco automático. Também apontaram que muitos alunos tinham
Inclusão escolar: Visão de alunos sem necessidades educativas especiais
sua participação nas atividades escolares restringida;
eram excluídos de algumas atividades manuais, de
esporte ou atividades ao ar livre. Concluiu-se, assim,
por meio dessa pesquisa, que a maneira como são
organizadas as atividades, na maioria das vezes, não
conseguem promover a participação de alunos com deficiência física.
Martins (1997) aponta, como resultado de sua
pesquisa sobre a inclusão do aluno portador de
Síndrome de Down, a necessidade de se desenvolver
planos e projetos que enfatizem a integração social
e escolar dessas crianças, a preparação da
comunidade escolar para compreender e atuar frente
às diferenças individuais, e a sensibilização da
comunidade em geral quanto à integração escolar e
social desses indivíduos. Mattos (2000) observou em
seu estudo a existência de uma inadequação do
paradigma da inclusão e a ausência de um trabalho
participativo, entre os educadores e a família, que
oriente e esclareça o processo de inclusão de deficientes. Esta autora acredita que este processo se
apresenta inadequado a quem necessita dele, e
compromete a proposta do sistema escolar brasileiro,
que visa assegurar a todos uma educação que
considera a cultura da adversidade.
Pesquisas têm evidenciado diferenças de opiniões
entre alunos não deficientes quanto à inclusão escolar.
Sacaloski (2001), ao investigar as opiniões de alunos
deficientes auditivos, de alunos ouvintes, de pais e de
professores sobre inclusão de alunos deficientes auditivos, verificou que a maioria dos participantes é favorável à inclusão escolar, expressando que os deficientes auditivos devem estudar em classe comum e podem
trabalhar e ser bem-sucedidos. Em contrapartida, o
estudo desenvolvido por Cambra (2002) mostrou
resultado diferente, ou seja, os alunos não deficientes
manifestaram que os surdos poderiam ser mais bem
assistidos numa escola especial, e expressaram que
eles não tinham o mesmo desempenho mostrado pelos
ouvintes.
Uma pesquisa desenvolvida por Batista (2001), que
envolveu alunos de 1ª série do ensino fundamental que
tinham alunos com deficiência mental incluídos em sua
sala, também revelou que o aluno não deficiente tem
dificuldades em aceitar e conviver com os alunos deficientes. Os resultados desse estudo revelaram que os
alunos deficientes são aceitos com menos freqüência,
passam a maior parte do tempo sozinhos, demonstrando
107
dificuldades tanto para iniciar como para manter e
finalizar o contato com os colegas.
Esses dados revelam o quanto ainda se faz necessário
pesquisas na área. É imprescindível ampliar o
conhecimento, desenvolver e testar formas que
realmente viabilizem a inclusão escolar. Deve-se ter claro
que inclusão não significa apenas transferir o aluno da
escola ou da classe especial para a classe comum.
Significa, como muito bem expõem Karagiannis,
Stainback e Stainback (1999b), incluir todas as pessoas,
independentemente de seu talento, deficiência, nível
socioeconômico ou cultural, em salas de aula com todas
as suas necessidades sendo atendidas.Com isso, pensar
em uma escola inclusiva significa, em um primeiro
momento, pensar em uma escola para cada um, isto é,
em uma escola em que cada aluno seja atendido de
acordo com suas necessidades e dificuldades, com
recursos e metodologias que propiciem o seu aprendizado
e desenvolvimento (Miranda, 2001).
Pode-se afirmar que a educação inclusiva é algo
que vem se efetivando, mesmo que a duras penas,
buscando superar toda uma história de isolamento,
discriminação e preconceito. Tem provocado muitos
questionamentos, principalmente quando se pensa na
escola regular e sua infra-estrutura física e particularmente de recursos humanos. O interesse das autoras
pelo tema surgiu, então, a partir de alguns questionamentos que estão presentes principalmente no meio
acadêmico (curso de Psicologia), como: a escola possui
infra-estrutura adequada para participar da inclusão
escolar? Qual é a opinião dos alunos que não possuem
deficiência sobre inclusão escolar? Os alunos estão
preparados para fazerem parte da inclusão escolar?
Os professores estão capacitados para educação
inclusiva etc.
O tema discutido neste trabalho esteve então centrado
na expectativa de responder a algumas destas questões,
bem como contribuir para o processo de inclusão escolar
e para o bem-estar das pessoas com deficiência. Para
tanto, procurou-se conhecer pesquisas, estudos e
discussões sobre essa temática, como também verificar
a visão de alunos sem necessidades educativas especiais
sobre o processo de inclusão escolar, identificando quais
são suas expectativas em relação a esse processo, o
que pensam acerca das dificuldades envolvidas na
inclusão escolar e como se sentem diante da inserção
do aluno com deficiência na classe comum do ensino
regular.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 105-115
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Nilza Sanches Tessaro, Ana Sayuri R. Waricoda, Renata Cristina Marques Bolonheis e Ana Paula Barletta Rosa
MÉTODO
Participantes
Para a realização dessa pesquisa foi utilizada uma
amostra constituída por dois grupos, num total de 40
participantes. O primeiro grupo (G1) foi formado por 20
alunos sem deficiência, que estudavam no ensino regular
e participavam da inclusão em escolas públicas de ensino
básico de um município localizado no interior do Estado
do Paraná. Cinco desses participantes tinham em sua
sala de aula colega com deficiência mental, cinco
possuíam colega com deficiência visual, cinco tinham
colega com deficiência auditiva e cinco estudavam com
colega com deficiência física. Dos participantes desse
grupo, 50% eram do gênero feminino e 40% do
masculino, com idades entre 10 a 20 anos (um
participante), sendo que 50% deles encontravam-se na
faixa de idade entre 10 e 15 anos e 50% entre 16 e 20
anos. Quanto à escolaridade cinco (25%) cursavam a
3ª série do ensino fundamental, igual número estava
cursando a 5ª série do ensino fundamental, cinco o 2º
ano do ensino médio e igual número o 3º ano do ensino
médio.
O segundo grupo (G2) foi constituído por igual
número de alunos, que também não possuíam deficiência e que estudavam em classes sem inclusão do
ensino básico do mesmo município. Destes alunos,
50% eram do sexo feminino e os demais do masculino,
com idades que variavam entre 18 (N=9) a 22 anos
(N=2). Todos cursavam o 3º ano do ensino médio.
Esses participantes foram selecionados pela própria
direção das escolas a que pertenciam, com base no
interesse e disponibilidade de cada um em participar
da pesquisa.
Material
Foram utilizados durante a pesquisa documento de
anuência da escola, solicitando a autorização da
Direção para a coleta dos dados. Termo de
consentimento livre e esclarecido, entregue aos pais
ou responsáveis dos alunos com menos de 18 anos e
aos alunos que já haviam atingido a maioridade, para
que pudessem confirmar o recebimento de
informações sobre o objetivo do estudo e dar o seu
consentimento para a participação na pesquisa e uma
ficha de identificação dos participantes, por meio da
qual foi possível obter dados relativos à idade, sexo,
grau de escolaridade etc.
Além disso, foi utilizado um questionário,
solicitando a opinião sobre a inclusão escolar (o que
pensam em relação à inclusão de alunos com deficiência em salas de aula do ensino regular), a opinião
sobre as dificuldades envolvidas no processo de
inclusão escolar (dificultadores do processo) e a
manifestação dos próprios sentimentos em relação à
inclusão (como se sentem diante da inclusão –
sentimentos positivos, sentimentos negativos e
sentimentos às vezes positivos).
Procedimento
Primeiramente foram realizados os contatos com
as direções das escolas, solicitando a autorização para
a coleta dos dados e explicando o trabalho que se
pretendia realizar. Após a autorização do Comitê de
Ética, para avaliação de pesquisas envolvendo seres
humanos, foram feitos os contatos com os participantes
ou responsáveis, por meio dos quais foram explicados
os objetivos do trabalho. Posteriormente ao
consentimento de cada um deles, foi entregue o
questionário, o qual foi respondido individualmente na
presença da pesquisadora.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados foram organizados com base nos questionários aplicados e examinados mediante análise de
conteúdo. Dentre as várias técnicas que contemplam
a análise de conteúdo, a análise categorial foi a
empregada para trabalhar com os dados desta
pesquisa. Destarte, dados foram categorizados,
apresentados em tabelas e trabalhados quantitativamente por meio de teste estatístico, no nível de 0,05
como margem de erro.
Para a validação da categorização foram usados
dois juízes independentes, fazendo-se o cálculo de
correlação entre suas avaliações (Siegel, 1956). Foi
obtido como resultado uma alta concordância entre os
juízes.
Opiniões sobre inclusão escolar
Dimensões
1- Aspectos negativos: incluíram as respostas dos
participantes que apontaram problemas e dificuldades e negaram a inclusão como forma de
Inclusão escolar: Visão de alunos sem necessidades educativas especiais
solução. Exs.: “a escola do ensino regular não
está preparada”, “ruim”, “errado” etc.
2- Aspectos positivos: dimensão em que os participantes apresentaram as vantagens, os benefícios,
à aceitação da inclusão escolar. Exs.: “ótimo”,
“Ideal”, é “Importante”, “Forma de perceber que
a deficiência não é impedimento” etc.
3- Às vezes é positivo: dimensão em que o participante indicou uma condição ou uma parcialidade
envolvendo a questão da inclusão. Exs.: “alguns
casos sim”, “com deficiência profunda não”, “mais
ou menos”, etc.
4- Aspecto legal: dimensão em que os participantes
se referiram aos direitos, aos deveres etc. da
pessoa deficiente, tanto no âmbito social como
no cultural. Exs.: “é um direito”, “está previsto na
lei”, “educação para todos” etc.
109
alunos deficientes incluídos na sala de aula
comum. Exs.: “é gritante o pouco investimento
na educação”, “falta de estrutura física”.
Os dados que pertencem à Tabela 1 mostram que
55,3% das respostas apresentadas pelos participantes
sobre o que acham de incluir aluno com deficiência na
classe comum do ensino regular referem-se à dimensão
aspectos positivos, que incluiu as vantagens, os benefícios, credibilidade e aceitação da inclusão escolar,
seguida de 32,4% para a dimensão aspectos negativos,
referentes a problemas, dificuldades, falta de credibilidade e aceitação da inclusão escolar. Por meio do teste
de homogeneidade, verificou-se que as respostas
emitidas pelos grupos nas dimensões são similares, sendo
χ²o = 0,88 para o χ²c = 3,84; portanto, a Ho não foi
rejeitada.
Tabela 1: Opinião sobre inclusão escolar entre os alunos.
Dimensões
G1
G2
Total
F
%
F
%
F
%
1- Aspectos negativos
2- Aspectos positivos
3- Às vezes positivo
4- Falta de estrutura da escola
e investimento na educação
5- Falta de preparo/capacitação
profissional
6- Aspecto legal
22
30
1
1
35,5
48,4
1,6
1,6
15
33
1
1
28,8
63,5
1,9
1,9
37
63
2
2
32,4
55,3
1,8
1,8
3
4,8
–
–
3
2,6
5
8,1
2
3,9
7
6,1
Total
Média das respostas
62
3,1
100
–
52
2,6
100
–
114
2,9
100
–
5- Falta de formação/capacitação profissional:
incluiu as respostas em que os participantes
mencionaram o despreparo dos profissionais para
participarem da inclusão escolar. Exs.: “a maioria
dos profissionais não são especializados nessa
função”, “os professores do ensino regular não
estão preparados” etc.
6- Falta de estrutura da escola e investimento
na educação: essa dimensão envolveu as
manifestações em que os participantes
apontaram as dificuldades, os problemas, a
pouca estrutura e investimento na escola para
poder realizar um trabalho adequado com os
Ao considerar cada grupo isoladamente, observase que a dimensão prevalente nos dois grupos (G1 e
G2) foi aspectos positivos. A prevalência foi de 48,4%
para o grupo dos alunos que participavam da inclusão
e 63,5% para o grupo dos alunos que não participavam
da inclusão. O teste de homogeneidade aqui utilizado
mostrou que as respostas emitidas pelos participantes
dos dois grupos são muito similares nesta dimensão
(sendo χ²o = 1,32 para o χ²c = 3,84).
Esses dados sugerem que a maioria dos alunos que
participaram da pesquisa se mostrou confiante e
favorável à inclusão escolar. Resultado similar a esse
foi identificado por Sacaloski (2001) em um estudo
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Volume 9 Número 1 105-115
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Nilza Sanches Tessaro, Ana Sayuri R. Waricoda, Renata Cristina Marques Bolonheis e Ana Paula Barletta Rosa
desenvolvido com alunos ouvintes sobre inclusão escolar,
em que os mesmos acreditavam que os deficientes auditivos deveriam estudar na classe comum, pois poderiam
ter um bom desenvolvimento.
O fato de a maioria dos alunos sem necessidades
educativas especiais demonstrar credibilidade na
educação inclusiva pode ser entendido como positivo,
principalmente quando se considera que inclusão
representa também respeito e aceitação à diversidade.
Nesse momento, é imprescindível destacar que só se
pode falar em integração, como aponta Fonseca (1995),
quando há uma efetiva interação entre deficientes e não
deficientes. Para tanto se faz necessário o convívio social
entre os alunos, professores e demais profissionais da
escola. A integração é um processo complexo que
envolve a adaptação de todas as partes: população geral,
profissionais, familiares e a própria pessoa a ser
integrada.
Torna-se importante destacar que educação inclusiva
trata-se de um processo complexo que, segundo Gotti
(1998), envolve um novo paradigma conceitual e ideológico, o qual precisa envolver políticas, programas, serviços
sociais, comunidade etc. Com isso, é necessário aceitar e
reconhecer a diversidade na vida e na sociedade, isto é,
identificar que cada indivíduo é único, com suas
necessidades, desejos e peculiaridades próprias.
Acredita-se, portanto, que a inclusão de alunos
com necessidades educativas especiais em classe
comum do ensino regular apenas terá condições de
se concretizar quando realmente houver respeito e
aceitação à diferença; ou seja, quando não existirem
mais o preconceito, a discriminação e a ignorância.
Enfim, quando as pessoas que não possuem
necessidades educativas especiais conseguirem
aceitar, conviver, interagir e acreditar que os deficientes possuem não apenas limites, mas também
potencialidades.
Opiniões sobre os dificultadores da inclusão
Dimensões
1- Falta de estrutura das escolas: dimensão em
que os participantes indicaram as dificuldades, os
problemas, ou seja, a falta de estrutura das escolas
para participar da inclusão escolar. Exs.: “falta
de estrutura física da escola”, “número elevado
de alunos em sala”, “espaço físico inadequado”,
“salas lotadas” etc.
2- Falta de preparo/capacitação dos profissionais: incluiu as dificuldades, ou seja, o pouco
preparo dos profissionais para trabalhar com
alunos deficientes em sala de aula comum. Exs.:
“falta de esclarecimento do professor sobre a
deficiência”, “falta de preparo do professor”, “falta
de preparo do diretor” etc.
3- Falta de preparo dos demais alunos: dimensão em que as emissões verbais evidenciaram
as dificuldades, os problemas, ou seja, o
despreparo, o pouco conhecimento do aluno não
deficiente sobre a inclusão e sobre o deficiente
e a deficiência. Exs.: “a não-preparação do
aluno sem deficiência quanto à integração”,
“falta de preparo dos alunos para receber o
aluno deficiente” etc.
4- A não-aceitação da inclusão: essa dimensão
incluiu as manifestações indicativas de resistência
ou oposição à inclusão do deficiente no ensino
regular. Exs.: “resistência do pai”, “a falta de
aceitação” etc.
5- Discriminação social: refere-se às respostas que
versaram sobre as situações que evidenciam a falta
de aceitação, ou seja, o preconceito com o deficiente e a deficiência. Exs.: “a rejeição”, “o fato do
aluno se ver como diferente”, “a ignorância de
certas pessoas”, “discriminação”, “preconceito”
etc.
6- Não sei e nada: incluiu as respostas em que
os participantes não mencionaram nenhum
dificultador da inclusão. Exs.: “não sei”,
“nada”.
7- Falta de apoio dos colegas: dimensão em que
o participante apontou como barreia à inclusão a
falta de apoio dos colegas aos alunos deficientes.
Ex.: “falta de apoio dos alunos” .
Os dados apresentados na Tabela 2 revelam que
56,3% das respostas emitidas pelos participantes sobre
os dificultadores/barreiras da inclusão escolar referemse à dimensão discriminação social, seguida da dimensão falta de preparo dos profissionais (14,1%) e da
dimensão falta de estrutura das escolas (9,4%). Os
grupos também emitiram respostas que pertencem a
outras dimensões, como pode ser observado na
respectiva tabela. Para testar a significância destas
ocorrências, recorreu-se ao teste de homogeneidade, em
que os resultados mostram serem as respostas emitidas
Inclusão escolar: Visão de alunos sem necessidades educativas especiais
111
Tabela 2: Opiniões sobre os dificultadores da inclusão escolar entre os alunos.
Dimensões
G1
G2
Total
F
%
F
%
F
%
1- Falta de estrutura das escolas
2- Falta de preparo dos profissionais
3- Falta de preparo dos demais alunos
4- Discriminação social
5- Falta de apoio/auxílio dos colegas
6- A não-aceitação da inclusão
7- Não sei
8- Nada
4
5
5
21
2
1
–
–
10,5
13,2
13,2
55,2
5,3
2,6
–
–
2
4
–
15
–
2
13,8
2
7,7
15,4
–
57,7
–
7,7
1
7,7
6
9
5
36
2
3
1,5
2
9,4
14,1
7,8
56,3
3,1
4,7
Total
Média das respostas
38
1,9
100
–
26
1,3
100
–
64
1,6
100
–
pelos grupos similares - o χ²o = 2,26 para o χ²c = 3,84;
portanto, a Ho não foi rejeitada.
Esses resultados evidenciam que a maioria dos participantes considera a discriminação social como o principal empecilho para efetivação da inclusão escolar. O
fato dos participantes terem considerado a discriminação social como o principal óbice ao processo de inclusão
escolar torna-se muito interessante, principalmente
quando se considera que nesse estudo eles se mostraram
confiantes e favoráveis à inclusão escolar. Talvez esse
resultado possa ser justificado pelo fato dos participantes identificarem quão preconceituosas ainda são as
pessoas que não possuem necessidades educativas
especiais e quanta dificuldade elas têm para aceitar e
conviver com a diversidade.
Acredita-se, ainda, que a discriminação social foi
apontada pelos participantes como o principal dificultador
da inclusão escolar pelo fato de o deficiente ainda ser
visto como incapaz e limitado. Torna-se importante
ressaltar que o preconceito e a discriminação dos
indivíduos diferentes, fundamentalmente os portadores
de deformidades físicas e mentais, conforme alerta
Bernardi (2004), podem ser observados no decorrer de
toda história da humanidade. As atitudes em relação às
pessoas com deficiência na maioria das vezes foram
negativas. No período anterior a era cristã, os deficientes, como mostra Pessotti (1984), nem mesmo pessoas
eram considerados, mas sim “coisas” que não possuíam
alma. É no século XX, mais especificamente a partir da
segunda metade, que se verifica uma melhor aceitação
do deficiente, bem como uma tendência à sua inserção
na sociedade.
3,1
Ao aplicar o teste de homogeneidade para testar a
significância entre as respostas emitidas pelos grupos
em cada dimensão, verificou-se que os grupos emitiram
respostas semelhantes na maioria das dimensões. A
exceção foi a dimensão falta de preparo dos demais
alunos (χ²o = 5,0 para χ²c = 3,83). Esse resultado revela
que as respostas emitidas pelos grupos nessa questão
não são semelhantes. Apenas o G1 apresentou respostas
que pertencem a essa dimensão.
Um aspecto que também deve ser considerado é o fato
de boa parte dos participantes acharem que o principal óbice
ao processo de inclusão escolar é a não-capacitação dos
profissionais. Assim como esses participantes, verificamse autores, como Glat e colaboradores (1998), Tesini e
Mazini (1999), que também apontam a falta de preparo
dos profissionais/professores como o principal dificultador
da inclusão escolar. Esses autores são categóricos ao
afirmar que a inclusão escolar apenas terá possibilidade de
acontecer se essas barreiras forem superadas.
Destarte, parece evidente que um projeto dessa
natureza requer, no mínimo, escolas bem estruturadas e
professores capacitados para lidar e atender as
necessidades e especificidades de cada aluno. Tornase claro que se essas barreiras/dificultadores não forem
eliminadas a inclusão não deixará o plano imaginário.
Manifestação do próprio sentimento quanto à
inclusão escolar
Dimensões
1- Sentimento negativo: envolveu as respostas em
que os participantes manifestaram sentimentos
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
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112
2-
3-
4-
5-
Nilza Sanches Tessaro, Ana Sayuri R. Waricoda, Renata Cristina Marques Bolonheis e Ana Paula Barletta Rosa
“desagradáveis” emergidos da inclusão. Exs.:
“medo”, “mal”, “angustiada”, “impotente”,
“insegura” etc.
Sentimento positivo: Incluiu as respostas em
que os participantes se mostraram receptivos
e favoráveis à inclusão escolar. Exs.:
“tranqüila”, “uma proposta interessante”,
“acho normal” etc.
Sentimentos às vezes positivos: dimensão em
que o participante indicou uma condição ou uma
parcialidade quanto ao sentimento sobre inclusão
escolar. Exs.: “se aluno possui potencial acho
bom”, “tem que ser muito bem avaliado caso a
caso”, “depende da família” etc.
Falta de preparo dos profissionais: aglutinou
as respostas em que os argüidos manifestaram
preocupação com a formação e capacitação dos
professores, diretores, ou seja, de todos os
envolvidos nesse processo. Exs.: “professores
sem habilidade para trabalhar” , “ professores
não capacitados” etc.
Não sei: aglutinou-se as respostas em que os
participantes não conseguiram manifestar
nenhum sentimento.
dimensões, portanto a Ho não foi rejeitada, sendo χ²o
= 0,66 (χ²c = 3,84).
Os alunos, ao serem indagados sobre seu próprio
sentimento em relação à inclusão escolar, apresentaram
também respostas que se referem à dimensão falta de
preparo do professor (5,5%), o que evidencia sua
preocupação com essa questão. Ao considerar cada grupo,
observaram-se algumas diferenças que podem ser
consideradas significativas. O grupo dos alunos que não
participavam da inclusão (G2) obteve um percentual menor
na dimensão sentimentos negativos (12,1%) do que o
grupo de alunos que participavam da inclusão (37,5%). Ao
aplicar o teste de homogeneidade verificou-se que os grupos
emitiram respostas diferentes nesta dimensão, portanto a
Ho foi rejeitada, sendo χ²o = 6,36 (χ²c = 3,84).
Esse resultado sugere que um número maior de
alunos que participavam da inclusão (G1) possuem
sentimentos negativos em relação à inclusão escolar.
Talvez isso tenha ocorrido pelo fato de que os alunos
do G2 não tiveram a experiência de estudar com alunos
deficientes, portanto, não sentiram de perto o quanto
ainda se discrimina e exclui o aluno com necessidades
educativas especiais em uma sala de aula, que na
maioria das vezes não foi preparada para recebê-lo e
Tabela 3: Manifestação do próprio sentimento sobre inclusão entre os alunos.
G1
G2
Total
Dimensões
F
15
18
2
2
%
37,5
45,0
5,0
5,0
F
4
22
2
2
%
12,1
66,6
6,1
6,1
F
19
40
4
4
%
26,0
54,8
5,5
5,5
3
7,5
3
9,1
6
8,2
Total
40
100
33
100
73
100
Média das respostas
2,0
1,8
-
1234-
Sentimento negativo
Sentimento positivo
Às vezes positivos
Falta de preparo
profissional
5- Não sei
Os dados da Tabela 3 revelam que as respostas
prevalentes entre os participantes pertencem à dimensão sentimentos positivos (54,8%), sugerindo que os
alunos, ao expressarem esses sentimentos, sentemse bem com a inclusão escolar. No entanto, vale destacar que um número significativo de respostas
(26,0%) pertence à dimensão sentimentos negativos.
O teste de homogeneidade aqui aplicado mostra que
os grupos emitiram respostas semelhantes sobre as
1,7
-
muito menos para lhe possibilitar um bom
desenvolvimento acadêmico. Merece destaque aqui um
estudo desenvolvido por Batista (2001) com alunos
portadores e não portadores de deficiência de uma
escola de ensino fundamental. O estudo observou que
os alunos deficientes não eram bem aceitos pelos
demais colegas e passavam a maior parte do tempo
sozinhos, apresentando dificuldades tanto para iniciar
como para finalizar contatos com os colegas.
Inclusão escolar: Visão de alunos sem necessidades educativas especiais
Outro aspecto digno de nota é o fato de um percentual
significativo de respostas dos participantes pertencerem
à dimensão sentimentos negativos (26,0%). Isso indica
que, apesar de um número alto de alunos se sentirem
bem com a inclusão escolar, um número considerável
deles manifestou sentimentos negativos. Portanto, não
se pode generalizar e afirmar que os alunos sem deficiência se sentem bem com a inclusão escolar.
Esses resultados deixam evidente a complexidade
de se efetivar a educação inclusiva. Autores como
Santos (2001), Carvalho (1997) Sartoretto (2001)
dentre outros, também apontam essa complexidade.
Sartoretto (2001) é categórica ao afirmar que
educação inclusiva envolve um processo muito amplo
de reforma do sistema escolar. Para essa autora, a
escola deve abrir espaço para a diversidade humana;
os professores devem estar continuamente em busca
do aprendizado sobre como se deve ensinar, para
que possam proporcionar um ensino de qualidade a
todos.
CONCLUSÃO
O estudo apresentou dados que permitem algumas
reflexões sobre o processo de inclusão de alunos com
deficiência em classes comuns do sistema regular de
ensino. Pois o intuito desse trabalho foi conhecer a visão
de alunos sem necessidades educativas especiais de
escolas públicas de ensino básico sobre educação
inclusiva.
Os principais resultados indicam que a maioria dos
alunos que participaram dessa pesquisa se mostrou favorável à inclusão escolar, demonstrando credibilidade
nesse processo. Os participantes expressaram várias
dificuldades envolvidas no processo de inclusão de alunos
com deficiência no sistema regular de ensino, destacando-se: a discriminação social e falta de preparo dos
profissionais. Os sentimentos decorrentes do processo
de inserção do aluno com deficiência em classe comum
do ensino regular que predominaram entre os
participantes do estudo foram positivos do tipo: “é
normal”, “tranqüilo” .
Esses resultados evidenciam que a maioria dos alunos
sem necessidades educativas especiais é favorável à
inclusão escolar e possuem sentimentos positivos em
relação a esse processo. O que é muito interessante do
113
ponto de vista da inclusão escolar, a aceitação e a
credibilidade dos alunos sem necessidades educativas
especiais no processo de inserção do aluno com
necessidades educativas especiais no ensino regular é
sem dúvida importante e imprescindível para o sucesso
desse processo.
Entretanto, os dados deixam explícitos que ainda
se faz necessário muito investimento, bem como
estudo e conhecimento. Isso porque a inclusão é um
processo complexo que, conforme lembra Tesini e
Manzini (1999), necessita da definição de uma
política que subsidie princípios e práticas para as
necessidades educativas especiais, construindo
normas uniformes sobre a igualdade de
oportunidades para as pessoas portadoras de deficiência, além de uma pedagogia que atenda as
necessidades de cada aluno.
Torna-se importante destacar que um processo
dessa natureza requer não apenas a aceitação e a
credibilidade das pessoas, mas também que as escolas
se preparem, ou seja, se estruturem tanto no âmbito
físico como de recursos humanos para receber um
aluno com necessidades educativas especiais. O
professor, no contexto da educação inclusiva, como
aponta Glat e colaboradores (1998), deve estar
preparado para lidar com as diferenças, com a
singularidade e a diversidade de todos os alunos.
Deve-se ter claro que os princípios norteadores da
inclusão defendem que as escolas devem estar
preparadas para identificar e responder às diversas
necessidades de seus alunos, acomodando tanto estilos
como ritmos diferentes de aprendizagem, assim
garantindo uma educação de qualidade a todos
(Mendes, 2002).
Conclui-se, assim, que a inclusão de alunos com
necessidades educativas especiais em classe comum
do ensino regular pode ser viável, desde que se tenha
presente à complexidade de tal processo, o qual
requer muito investimento e comprometimento,
principalmente dos órgãos governamentais.
Igualmente se faz necessário muito estudo e pesquisa
para ampliar o conhecimento, desenvolver e testar
formas que viabilizem a verdadeira inclusão escolar.
Enfim, este estudo deixa evidente a complexidade e
a abrangência do tema, sendo por isso impossível
encerrá-lo, ou melhor, esgotá-lo nas dimensões desse estudo, sugerindo-se que outras pesquisas sejam
feitas.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 105-115
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REFERÊNCIAS
Nilza Sanches Tessaro, Ana Sayuri R. Waricoda, Renata Cristina Marques Bolonheis e Ana Paula Barletta Rosa
Karagiannis, A.; Stainback, W. & Stainback, S. (1999b).
Fundamentos do ensino inclusivo. Em S. Stainback (Org.),
Inclusão um guia para educadores (pp. 21-34). Porto
Amiralian. M. L. T. M. (1986). Psicologia do excepcional. São
Alegre: Artes Médicas Sul.
Paulo: EPU.
Martins, L. A. R. (1997). Integração escolar do portador da
Batista, M. W. (2001). Inclusão escolar e deficiência mental:
Síndrome de Down – um estudo sobre a percepção dos
a análise da interação social entre companheiros.
educadores. Tese de Doutorado não publicada,
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Recebido em: 22/09/04
Revisado em: 20/10/04
Aprovado em: 29/10/04
Endereço para correspondência:
Nilza Sanches Tessaro: Av. Parigot de Souza, 184 – apto 101 – CEP: 87013-300 – Maringá - Paraná
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Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 105-115
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
O PROFESSOR E O ALUNO EM LIBERDADE ASSISTIDA:
UM ESTUDO EXPLORATÓRIO
PAPEL DO PROFESSOR
Jeyse Martins 1
Caroline Catozzi1
Flávia Sayegh1
Isabel Cristina Dib Bariani2
Resumo
Liberdade Assistida é uma medida sócio-educativa que visa reintegrar na sociedade o adolescente que cometeu ato infracional e, como critério
para essa condição, é necessário que esse adolescente esteja freqüentando regularmente uma instituição escolar. Diante disso, esse trabalho
investigou as possíveis dificuldades identificadas por professores na relação com esse aluno em situação especial. Participaram dessa pesquisa oito
informantes, todos professores de alunos em Liberdade Assistida (LA), de ambos os gêneros e com consciência prévia da condição legal do aluno,
aos quais foi solicitado que respondessem individualmente a um questionário com 12 perguntas. As informações obtidas foram analisadas quantitativa
e qualitativamente. Os resultados indicam que os professores encontram dificuldades na relação com o adolescente em LA, explicitando, nesse
sentido, a necessidade de cursos de orientação para esses professores, além de um investimento maior de pesquisas relacionadas a essa problemática.
Palavras-chave: Medidas Sócio-educativas; Relação Professor-aluno; Adolescentes
TEACHER AND THE STUDENT IN ASSISTED FREEDOM: AN EXPLORATORY STUDY
Abstract
Assisted freedom is a social-educational measure that has the purpose of reintegrating the violator teenager in the society and, as a criterion
for this condition, this teenager must be attending in a regular school. Therefore, this work investigated the possible difficulties which were
identified by the teachers in the relationship with these students in Assisted Freedom condition. The eight teachers of both genders who participated
in this research, working with students in Assisted Freedom, who were previously aware of the student’s legal condition, were asked to answer a
questionnaire with 12 questions individually. The information obtained was analized quantitative and qualitatively. The results indicate that the
teachers have difficulties in the relationship with the violator teenager, which emphasize the necessity of guidance to these teachers, in adition
more investment in researches related to this problem.
Keywords: Social-educational Measure; Student-teacher Relationship; Teenagers
INTRODUÇÃO
De acordo com Sêda (1998) o adolescente que
transgredir a lei deverá ser julgado de acordo com a
gravidade de seu ato, podendo ser designado a cumprir
uma das seis medidas sócio-educativas previstas pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), das quais
duas são ministradas em meio fechado (internação em
unidades de semiliberdade e reclusão em casa de
1
2
internação) e quatro em meio aberto (advertência,
obrigação de reparação ao dano, prestação de serviço à
comunidade e Liberdade Assistida).
O ECA foi implantado em 1990, incorporando novos
princípios, tais como a desestatização -atribuindo a
responsabilidade por seu cumprimento ao governo e
comunidade-; desjudicialização -criando conselhos de
Graduandas do curso Psicologia da PUC-Campinas.
Doutora pela Faculdade de Educação da UNICAMP e docente da Faculdade de Psicologia da PUC-Campinas.
118
Jeyse Martins, Caroline Catozzi, Flávia Sayegh e Isabel Cristina Dib Bariani
direito da criança e do adolescente, os quais devem
controlar como as políticas públicas cumprem ou não
aquilo que foi convencionado- e descentralização municipalizando e favorecendo que possíveis questões
sejam resolvidas ao nível mais próximo da comunidade
(Cecom, 2000).
Além disso, ele propicia aos jovens que infringiram a
lei a possibilidade de readaptação social, ao afastar o
adolescente do Código Penal e adotar uma liberdade
vigiada, longe das prisões de adultos e criminosos comuns
(Moreira, 1997). Assim, a Liberdade Assistida é uma
medida sócio-educativa, prevista nos artigos 112, 118 e
119 do ECA, que tem como objetivo reintegrar à
sociedade os adolescentes que transgrediram a lei.
Segundo esse mesmo estatuto, verificada a prática do
ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar
ao adolescente a medida de Liberdade Assistida, que
será adotada sempre que se afigurar como a mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente. Ao definir a medida que deverá ser
aplicada, a autoridade levará em conta a capacidade do
adolescente em cumpri-la, as circunstâncias e a
gravidade da infração (CMDCA, 2000).
Caso se decida pela Liberdade Assistida, será
designada uma pessoa, o orientador, capacitada para
acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por
entidade ou programa de atendimento. O orientador, com
o apoio e supervisão da autoridade, deve promover
socialmente o adolescente e sua família, fornecendolhes orientação e inserindo-os, se preciso, em programa
oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; deve
promover sua matrícula escolar, supervisionar a
freqüência e o aproveitamento acadêmico do adolescente; além disso, deve, também, incentivar a profissionalização e a sua inserção no mercado de trabalho. Por
fim, o orientador tem o encargo de apresentar o relatório
do caso às autoridades competentes (CMDCA, 2000).
Segundo dados da Fundação Estadual do Bem Estar
do Menor (FEBEM), há apenas 200 técnicos para trabalhar com cerca de 15 mil adolescentes em Liberdade
Assistida no Estado de São Paulo; assim, em tese, cada
profissional precisaria orientar 75 jovens; no entanto, na
cidade de São Paulo esse número sobe para 133, pois
mais da metade dos infratores em Liberdade Assistida
estão nessa cidade (Squeff, 2000).
O programa de Liberdade Assistida é uma alternativa
considerada progressista para ressocializar o jovem que
cometeu ato infracional dentro da sua comunidade. O
programa cresceu muito no Estado de São Paulo, porém,
enfrenta um sério problema, pois para funcionar é
necessário uma estrutura de atendimento personalizado
e constante: acesso à escola, trabalho e apoio familiar.
De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF), não há, no Brasil, alguma instituição
que possa ser apontada como modelo ideal para a
recuperação de jovens. Isso ocorre, pois a prática é diferente do que está definido no arcabouço teórico e na
proposta de funcionamento dessas instituições, como por
exemplo, a FEBEM. Essa instituição foi denunciada pela
Anistia Internacional como centro de tortura sistemática;
ainda, outras entidades afirmam que os jovens são tratados como presos adultos, amontoados e sem
acompanhamento especializado (Squeff, 2000).
Dados da FEBEM indicam que, entre 1997 e 1999, o
número de mortes de adolescentes no seu programa de
Liberdade Assistida cresceu 68%; em 1997 81 jovens
morreram, contra 136 em 1999. A instituição justifica o
aumento do número de mortes e reincidentes pelo
crescimento do número de jovens no programa. Em 1997,
eram 12.145 adolescentes atendidos e em 1999 eram
16.665. Dezenas de jovens em Liberdade Assistida estão
sendo assassinados a cada mês. De maio de 1999 a
maio de 2000 foram 184 mortes, sendo que desses, 67
teriam sido mortos por envolvimento com drogas e 13
pela polícia. Segundo Conceição Paganele, presidente
da Associação de mães da FEBEM, essas mortes são
reflexo da dificuldade dos adolescentes em arrumar um
emprego devido ao preconceito que sofrem (Squeff,
2000).
A Fundação Telefônica, desde janeiro de 2005,
desenvolve um projeto com cerca de 50 adolescentes
em cumprimento de medidas sócio-educativas, com idade entre 12 e 18 anos, na cidade do Guarujá/SP. Esses
adolescentes contam com o apoio do projeto “Medida
Legal – Inclusão Digital”, cujo objetivo é promover a
inclusão digital favorecendo a inclusão social, para isso
oferece acompanhamento individual, apoio sóciofamiliar, encaminhamento escolar, matricula em cursos
de iniciação profissional, além de disponibilizar um
laboratório de informática, com 12 computadores, ligados
em rede e com acesso à internet (Fundação Telefônica,
2004).
Em Londrina/PR, tem sido implementado o projeto
“Murialdo”, o qual tem por objetivo integrar jovens que
cumprem medidas sócio-educativas à escola. A iniciativa
desenvolvida com professores da rede pública atende
O professor e o aluno em liberdade assistida: Um estudo exploratório
250 adolescentes em conflito com a lei na prestação de
serviços à comunidade, na inserção em cursos
profissionalizantes e na reintegração desses ao ensino
regular. Desde sua implementação em março de 2005,
o projeto acompanhou 90 casos, sendo que desses houve
apenas três reincidências (Avancini, 2005).
Sabe-se que a Liberdade Assistida pode ser uma
medida válida para reintegrar o adolescente que transgrediu a lei. No entanto, de um modo geral, vê-se a
necessidade de uma melhor reorganização e empenho
para que a medida traga ainda mais benefícios, tanto ao
adolescente quanto à sociedade.
O adolescente que cometeu ato infracional
Sabe-se que o indivíduo não se torna infrator
aleatoriamente, ele é impulsionado ao mundo do crime
por diversos fatores, dentre eles: êxodo rural, migração
interna, crescimento demográfico, desagregação familiar,
pobreza e os meios de comunicação de massa. Esse
conjunto de situações acaba contribuindo para que, determinados adolescentes, tenham uma percepção falha
da realidade, dessa forma, eles são expostos
constantemente aos perigos da sociedade que os
incorpora no mundo do crime (Queiroz, 1984).
A maioria dos adolescentes que cometem ato
contrário à lei provém de famílias paupérrimas e
desorganizadas. O pai é, em geral, uma figura ausente,
principalmente devido ao alcoolismo, abandono, prisão,
uso de tóxicos e falecimento. Já a mãe é uma figura
mais presente, no entanto, os casos de ausência dessa
decorrem de abandono, falecimento, prostituição, psicose
e prisão (Violante, 1984).
Diante dessa estrutura familiar, o adolescente
vivencia agressões e pressões para trabalhar e ajudar a
família, o que o leva a buscar na rua a complementação
das carências sofridas dentro de casa (Edmundo, 1987).
É nesse momento que convive e incorpora valores
ilegitimados socialmente e inicia-se em pequenos crimes.
Ainda, há adolescentes que são apresentados ao mundo
do crime por seus próprios familiares (Queiroz, 1984).
O adolescente que cometeu ato infracional, além de
ser um retrato da sociedade marginalizada do sistema
capitalista, representa também uma resposta à esse
sistema, agindo muitas vezes por meio de condutas antisociais (Violante, 1984). Sabe-se que é característica
do sistema capitalista o acúmulo de riquezas, assim, o
adolescente influenciado pela mídia, tem a necessidade
de fazer parte dessa sociedade de consumo que lhe
119
“garante” a conquista de sua felicidade. Dessa forma,
pertencendo a uma classe social marginalizada e sem
recursos financeiros, a saída encontrada por esse adolescente, muitas vezes, é o ingresso na criminalidade
(Queiroz, 1984).
Após essa explanação sobre o contexto em que se
insere o adolescente transgressor da lei, é interessante
destacar a sua vivência dentro de uma instituição como
a FEBEM, cuja principal proposta é isolá-lo, recuperálo e reintegrá-lo a sociedade, colocando-o dentro dos
considerados padrões normais de comportamento
(Edmundo, 1987).
A vivência do adolescente na FEBEM é determinada por um processo de ressocialização que enfatiza a
educação e a profissionalização por meio da disciplina e
punição. É importante apontar que, nem sempre, a
profissionalização garante ao adolescente sua reinserção,
apesar dela ser uma alternativa individual e corresponder
a uma oportunidade de trabalho. Ademais, a rapidez do
avanço tecnológico contribui para a obsoletização dessa, visto que não existem programas de reciclagem
profissional para os egressos da instituição (Queiroz,
1984).
Nessa instituição, o adolescente está sujeito
constantemente à agressões físicas, morais e
psicológicas por parte dos monitores. Surge, nesse
contexto, a imposição da chamada lei do silêncio, ou
seja, os adolescentes não delatam o monitor que cometeu
maus tratos, pois esse e sua equipe são os responsáveis
pela avaliação de sua conduta. Instala-se, assim, um
processo educativo bastante diferente do divulgado na
teoria. (Queiroz, 1984). Frente a essa realidade, não é
surpreendente que o adolescente tenha uma visão
negativa da instituição, conforme é explicitado nas suas
próprias falas:
...A FEBEM não recupera ninguém, ao contrário,
aqui se aprende coisas com os outros... e pelo tratamento que dão ao menor.... Não recupera porque
não tem educação certa... ninguém se importa com
o menor, não há compreensão, troca de idéias.... A
gente sai com bronca, depois de levar uma vida de
cachorro, preso, de apanhar, dá vontade de aprontar
mais..... ...Isso não é jeito de tratar, a borrachada
...os caras saem pior, mais revoltados.... ...Se
recupera, recupera lá fora.... A FEBEM não está
com nada... é uma besteira! (falas de acordo com
Violante, 1984, p. 166).
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
120
Jeyse Martins, Caroline Catozzi, Flávia Sayegh e Isabel Cristina Dib Bariani
Por sua vez, a visão que os funcionários da instituição
têm dos adolescentes é que eles são provenientes das
dificuldades da vida, da situação financeira da família,
do mundo das drogas e de problemas psicossocias
genéricos (Queiroz, 1984). Além disso, os técnicos da
instituição, em geral, apresentam um forte sentimento
de estar lidando com pessoas de alta periculosidade, fato
esse comprovado no momento da avaliação individual
do adolescente, que, na maioria das vezes, é realizada
com as portas abertas (Violante, 1984).
A egressão desses é marcada, principalmente, por
um estigma permanente de criminoso. A representação
sócio-cultural é caracterizada por órgãos de repressão
e falta de assistência no processo de reintegração desse adolescente. A própria família e a vizinhança reforçam
sentimentos de rejeição e conflitos psicológicos. Em
consequência, ele interioriza uma visão negativa de si e
desacredita que com o trabalho honesto conseguirá o
sucesso sonhado, ou seja, a participação nos benefícios
da sociedade (Cunha, 1999).
A polícia representa um importante papel no processo
de marginalização do adolescente que cometeu ato
infracional. Isso porque ela incentiva e é cúmplice na
prática criminal, aceitando e, às vezes, solicitando
suborno para ocultar crimes e soltá-los da delegacia
(Edmundo, 1987). A polícia é vista, pelo adolescente que
cometeu ato infracional, como aquela que o persegue e
o ameaça com a lei e a força. Essa situação justifica
sua forma de vida contraditória, isto é, ele acredita que
se não fosse perseguido, estigmatizado, se tivesse uma
família boa, se alguém o ajudasse, ele poderia estudar e
trabalhar para vencer na vida. Essa explicação sempre
vem acompanhada por outra: que ele não suporta a
escola. Isso pode ser observado na fala de um adolescente: “... não se aprende nada, só leva bronca da
professora...” (Queiroz, 1984, p. 112).
Esse autor aponta que, o que os jovens odeiam,
fundamentalmente, é o não reconhecimento de sua
humanidade, de sua potencialidade como ser humano.
Tal rejeição se expressa por meio de suas carências
mais variadas: afetivas (não conhecem a amizade
desinteressada, o amor sem interesse), sociais (são vistos
como marginais, bandidos ou pobres, desclassificados),
psicológica (não impõem respeito, nem despertam
simpatias, respeito “só de arma na mão”) e material (não
têm acesso aos bens de consumo necessários à sua
sobrevivência e à caracterização de um estilo de vida
digno perante a sociedade).
Assim, uma breve discussão sobre a relação do
professor-aluno e, em especial do adolescente em LA,
é abordada a seguir com o intuito de compreender de
forma mais abrangente essa visão do adolescente para
com a escola e vice-versa.
A Relação Professor-Aluno
A sala de aula não se resume apenas a um espaço
de transmissão de conhecimento, pois nela ocorrem
interações de caráter social, político, econômico,
filosófico, psíquico e teológico (Moraes, 1996). No
entanto, nem sempre essas interações ocorrem de forma
consciente, sendo que, o professor, às vezes, até rejeita
a idéia de que exerce influência no seu fazer pedagógico
(Cunha, 1989).
Existe, entre o aluno e o professor, um jogo de
expectativas relacionadas aos respectivos desempenhos.
Parte da relação professor-aluno já é pré-determinada
socialmente e isso é explicado pela teoria da representação social,
...que são saberes populares do senso comum,
elaboradas e partilhadas coletivamente, com a
finalidade de construir e interpretar o real. Por serem
dinâmicas, levam os indivíduos a produzir comportamentos e interações com o meio, ações que, sem
dúvida modificam os dois... (segundo Oliveira e
Werba, 1998, p. 105).
Nesse sentido, supõe-se uma expectativa
negativa do professor em relação ao adolescente que
cometeu ato infracional, podendo esse relacionar a
figura do aluno com o atual quadro de violência no
Brasil.
Além disso, sobre o professor e o aluno há todo o
peso das relações institucionais (Cunha, 1989). Há,
ainda, os estereótipos, que são idéias pré-concebidas
com pouca ou nenhuma base real, sendo que ambos,
estereótipos e expectativas, levam ao agir de forma a
provocar nos outros reações que os confirmam e
validam (Maia, 1995). Segundo Coll e Miras (1996),
existe uma “profecia de autocumprimento”, ou seja,
um conjunto de expectativas que o professor tem sobre
o aluno ideal, a saber: atenção, participação, motivação,
responsabilidade, interesse pelo trabalho, constância,
respeito às normas de relação com os colegas e com o
professor.
O professor e o aluno em liberdade assistida: Um estudo exploratório
Outros fatores que interferem no comportamento do
professor estão especialmente ligados ao contexto social
e institucional. De acordo com Cunha (1989) as principais
influências dos professores são: a vivência do professor
enquanto ex-aluno, a sua experiência profissional, a sua
formação pedagógica e a sua prática social mais ampla
(sua história de vida, seus valores, sua atuação política partidária ou engajamento associativo - e suas atitudes
perante a atual realidade social).
O que produz uma diferença qualitativa de uma sala
de aula para outra é o grau de consciência do professor
acerca da realidade das relações (informais) das pessoas
em grupo e a conseqüente utilização dela como
instrumento de promoção do crescimento integrado dos
alunos (Hernandez, 1997). Outras diferenças qualitativas
no desempenho do docente são o domínio do conteúdo,
a capacidade de interpretá-lo e localizá-lo histórica e
socialmente, a preocupação que a instituição escolar tem
com sua própria competência, o gosto pelo estudo e
honestidade no trato do conhecimento e dos alunos
(Cunha, 1989).
Em relação ao aspecto econômico, a variável que
pode interferir na prática docente é a questão salarial.
Segundo muitos professores a baixa remuneração é
apontada como maior desestímulo para a constituição
de um professorado competente e entusiasta, o que
remete a uma desvalorização profissional. Segundo
Cunha (1989) as condições de trabalho, tais como local
inadequado para as atividades escolares, material
disponível, principalmente bibliotecas, e imobilismo da
própria escola enquanto instituição social, são apontadas
como fatores de dificuldade na atuação do profissional.
Contudo, uma pedagogia baseada na relação entre
as pessoas se apresenta como uma tentativa de síntese
entre o trabalho de instrução e de socialização dos
indivíduos, que utiliza o grupo como uma alavanca da
formação e, ao mesmo tempo, como o objetivo dessa
formação em si. Dessa maneira, o temor respeitoso
do estudante pela autoridade, representada pelo
professor, e/ou sua rebelião contra a mesma serão
gradativamente substituidos pelo efetivo respeito e
pela cooperação à medida que for desvelado que
professores são, afinal de contas, igualmente humanos
(Hernandez, 1997). Nesse sentido, as propostas em
geral privilegiam a idéia de que é necessário um
professor consciente das questões sociais e
competente tecnicamente para engajar-se na luta em
favor da melhoria das condições de vida da população
121
(Cunha, 1989). Diante desse quadro teórico fica claro
que a Liberdade Assistida é uma boa alternativa no
processo de reintegração do adolescente que cometeu
ato infracional, desde que coordenada e planejada por
profissionais capacitados e sensíveis à realidade social
do país.
No Brasil, onde existe uma grande discrepância
entre as classes sociais, é comum que o índice de
criminalidade seja alto. Dessa forma, também, não se
torna incomum a presença de crianças e adolescentes
envolvidos no mundo do crime. É nesse contexto que
a Liberdade Assistida adquire um caráter alternativo,
pois, estando sob esse regime, o adolescente,
obrigatoriamente, terá que freqüentar a escola durante todo o processo.
Assim, sabendo-se que o professor representa um
importante papel no desenvolvimento e formação sóciocognitivo-emocional do aluno, é evidente que será um
grande precursor e motivador na regeneração do adolescente que cometeu ato infracional.
O objetivo deste trabalho foi identificar e descrever
as possíveis dificuldades que professores encontram na
relação com alunos em Liberdade Assistida,
considerando-se o autoconceito, as perspectivas de
futuro e o conceito que o adolescente, que cometeu ato
infracional, tem sobre as instituições sociais e vice-versa;
e a importância da relação professor-aluno.
MÉTODO
Participantes
O critério adotado para a participação nesse estudo
foi que os professores de alunos em regime de Liberdade
Assistida (LA) tivessem conhecimento prévio da
condição desses. Assim, contou-se com a colaboração
de oito professores, com idade média de 34,8 anos, os
quais tinham como alunos adolescentes que cometeram
ato infracional, provenientes de diversas séries da escola
regular e que estavam em regime de Liberdade Assistida.
Todos trabalhavam em um externato, sem fins lucrativos,
de uma cidade do interior paulista, que mantém um
programa sócio educativo de LA, oferecendo cursos
profissionalizantes a adolescentes, em horário oposto ao
que freqüentam a escola regular. Desses professores,
somente um era do gênero masculino, ou seja, 87,5%
dos informantes eram do gênero feminino.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
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Jeyse Martins, Caroline Catozzi, Flávia Sayegh e Isabel Cristina Dib Bariani
Material
O instrumento utilizado na presente pesquisa foi
construído após a revisão da literatura, sendo que optouse pela elaboração de um questionário, com questões
fechadas e abertas, devido à praticidade de utilização
dessa técnica frente ao assunto tratado e a escassa
disponibilidade de tempo dos profissionais. A fim de
verificar a clareza do material, foi realizada uma
testagem piloto com cinco professores da rede pública,
os quais afirmaram ser o instrumento inteligível e coerente
aos objetivos propostos.
O questionário contém um total de 17 questões, que
buscam atender aos objetivos propostos nesse trabalho, sendo 12 são fechadas e cinco abertas. Essas
questões permeiam assuntos como: dados pessoais;
realização de curso (aperfeiçoamento, especialização
ou pós-graduação); tempo de experiência como
professor; tempo de experiência como professor de
aluno em Liberdade Assistida; instituições que adquiriu
experiência como professor de adolescentes em
situação de Liberdade Assistida; participação de curso
que visava ajudá-lo a lidar com alunos em Liberdade
Assistida; aspectos positivos e negativos quanto à
formação e preparo profissional para o trabalho com
adolescentes em Liberdade Assistida; percepção de
diferenças entre os alunos em Liberdade Assistida em
relação aos demais; influências do professor na vida
dos seus alunos; influência do professor na vida do
adolescente em Liberdade Assistida, da mesma forma
e sob os mesmos aspectos que na vida dos demais
alunos; completar a frase: Para mim, o adolescente
em regime de liberdade assistida é ...; dificuldades para
lidar com o aluno em situação de Liberdade Assistida;
ter informação sobre o crime cometido pelo adolescente infrator em Liberdade Assistida; inserção do
aluno em situação de Liberdade Assistida na
sociedade”.
Procedimento
A aplicação do questionário ocorreu individualmente,
em lugar reservado e em horário previamente agendado
com cada professor. Antes de responder ao questionário
foi solicitado que cada informante assinasse um Termo de Consentimento para Participação da Pesquisa,
conforme recomendação da Resolução nº 196/96 do
Ministério da Saúde (Conselho Nacional de Saúde,
1996), a respeito de pesquisas envolvendo seres
humanos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Constatou-se que 87,5% dos participantes trabalharam em apenas uma instituição com alunos em Liberdade
Assistida e, desses, 42,8% participaram de algum curso
de orientação e aperfeiçoamento para lidar com esse
adolescente, ou seja, apenas três professores realizaram
esse tipo de preparação.
Nas questões relativas à experiência profissional,
notou-se que o tempo médio de experiência como
professor foi de 9,3 anos (vale ressaltar que apenas
dois dos sujeitos tinham experiência superior a 15
anos) e o tempo médio de experiência como professor
de adolescentes em Liberdade Assistida foi de 1,4
anos.
Embora os dados obtidos indiquem que 62,5% dos
informantes afirmaram não encontrar dificuldades no
trabalho com adolescente em Liberdade Assistida (LA),
75% apontaram que esses alunos são diferentes dos
outros, caracterizando-os como inseguros, agressivos,
revoltados, com grande necessidade de chamar atenção,
além de pertencentes a um ambiente familiar problemático, no qual existe uma dificuldade de estabelecer
e respeitar limites, conforme observa-se em suas
afirmações:
“São mais revoltados”; “Eles querem sempre
chamar a atenção”; “A dificuldade está no espaço
em que os mesmos foram criados, onde eles
fazem o que bem entendem, não havendo
limites”
Os comportamentos acima apontados pelos
professores como uma diferenciação entre o aluno em
Liberdade Assistida e os demais, são indicados por
Queiroz (1984) como atitudes que expressam as
carências mais variadas desses adolescentes.
Os demais professores (37,5%), que afirmaram
encontrar dificuldades no trabalho com alunos em LA,
indicaram, no geral, a falta de motivação e o preconceito
social sofrido pelos mesmos como fatores que dificultam seu trabalho. Isso pode ser observado na resposta
de um dos informantes ao referir-se à participação
desses estudantes às atividades escolares:
“Na maioria das vezes eles participam devido à
situação com a justiça, não vestindo a camisa”
O professor e o aluno em liberdade assistida: Um estudo exploratório
A partir das dificuldades indicadas pelo professor
pode-se concordar com Coll e Miras (1996) quando esse
afirma que a “profecia de autocumprimento” está
presente na relação ensino-aprendizagem.
Segundo a maioria dos informantes, o adolescente
em LA é uma pessoa que errou em algum momento,
mas deve ter a chance de redimir-se de seu erro. Isso
pôde ser identificado em frases, tais como:
“Para mim o adolescente em regime de liberdade
assistida é igual a todos os outros, que um dia errou
e tenta se reabilitar, contando com a ajuda de todos
nós”; “O adolescente em regime de liberdade
assistida é uma pessoa com o direito de reestruturarse socialmente e psicologicamente”
Pode-se notar que apesar das representações sociais
descritas por Oliveira e Werba (1998) presentes na
interação entre o professor-aluno em LA, esses educadores acreditam na possibilidade de reabilitação desses
adolescentes, buscando, de alguma forma, auxiliar sua
reinserção social; mesmo assim, é possível identificar
no professor comportamentos e sentimentos que
demonstrem expectativas negativas em relação ao adolescente que cometeu ato infracional conforme citado
acima. Nesse sentido, é provável que esses professores
relacionem a figura de seus alunos ao atual quadro de
violência no Brasil.
Foi solicitado que os professores apontassem aspectos
positivos de sua formação profissional, no entanto,
apenas 25% responderam adequadamente à essa
questão e, desses, todos indicaram a realização de curso
de graduação como um aspecto positivo. Responderam
sobre os aspectos negativos 62,5% dos informantes;
todos citaram o pouco conhecimento sobre diversos
aspectos que tangenciam as questões do adolescente
em LA e problemas na graduação (falta de estudos sobre
o tema especificamente, falta de preparo prático e
insegurança).
Quando questionados sobre as principais influências
do professor sobre a vida de seus alunos em geral, todos apontaram de que modo influenciam esses alunos.
Assim, 37,5% dos informantes apontaram o amor, a
paciência, o respeito e a confiança como formas de
aproximar o aluno do professor e assim influenciá-lo
positivamente. A maioria das respostas (62,5%) indicou
que o professor é um modelo para o aluno, conforme
explicitado nas seguintes frases dos informantes:
123
“O professor deve ser o segundo pai ou mãe;
mostrando para o aluno a importância do estudo na
vida” “O professor, muitas vezes, serve como
exemplo (bom ou mal). Cabe a nós (professores)
saber usar esses “benefícios” a favor da educação”
“No caso do aluno em LA, eles procuram
referência”
Também, foi questionado se eles acreditam
influenciar o adolescente em Liberdade Assistida da
mesma forma e sob os mesmos aspectos que os demais
alunos. Nesse caso, 75% das respostas foram
afirmativas e 25% disseram que esse aluno busca
alguma referência, podendo ele, enquanto professor,
contribuir ainda mais para sua formação. Vale ressaltar
que a maioria dos informantes (75%) afirmou que não
busca identificar qual o crime cometido pelo adolescente em LA.
Hernandez (1997) indicou que o que diferencia
qualitativamente as produções na sala de aula é a
existência das relações informais entre as pessoas
do grupo, e os professores dessa pesquisa apontaram
que a criação de vínculos afetivos favorece sua
influência sobre os alunos. Conforme indicado acima,
62,5% dos informantes disseram que o professor é
um modelo para os estudantes utilizando como
justificativa, na maioria dos casos, que esses adolescentes provém de famílias desestruturadas, sem
muita referência. Nesse sentido, esses docentes
apresentaram uma visão bastante próxima à dos
funcionários da FEBEM identificada por Queiroz
(1984) e apontada no estudo de Violante (1984), ou
seja, eles acreditam que esses adolescentes são
usuários de substâncias psicoativas, e que provêm
das dificuldades da vida e da situação financeira da
família.
Todos responderam que o professor deve
promover a inserção do adolescente em LA, sendo
que 43% indicaram que isso deve ocorrer pela
criação de novas oportunidades de estudo e trabalho; 28,6% sugeriram que essa inserção é
favorecida na ausência de preconceitos e 28,6%
mostraram que o bom desempenho de seu papel
de professor (promoção de atividades extraclasse, orientação de trabalhos em grupos,
reforçamento de comportamentos adequados) já
é suficiente para promover a inserção do adolescente em LA.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
124
Jeyse Martins, Caroline Catozzi, Flávia Sayegh e Isabel Cristina Dib Bariani
Verificou-se que a totalidade dos informantes
afirmou que promovem a inserção do adolescente em
LA, sendo que 25% não explicaram como o fazem,
outros 25% afirmaram levar para a sala de aula
anúncios com propostas de emprego, 37,5% realizam
atividades em grupo para promover a sociabilidade, e
12,5% oferecem atividades extra-classe (concursos,
passeios, etc). Portanto, não foram observadas
discrepâncias quando questionados sobre o que eles
acreditam que possa ajudar na reintegração social do
aluno e o que realmente é feito por eles.
Levando-se em consideração o objetivo desse trabalho, os resultados obtidos demonstram que os
professores apresentam-se despreparados, de alguma
forma, pela falta de orientação direcionada para o trabalho com Liberdade Assistida, sendo que todos
apontaram a falta de conhecimento sobre o assunto
como um aspecto negativo em seu trabalho. Esse fato
pode estar relacionado tanto à recente criação dessa
medida sócio-educativa, quanto, conforme apontado por
Cunha (1999), à escassez de produção científica acerca
do assunto, dificultando, assim, a criação de cursos e
palestras eficazes sobre o tema especificamente.
Como consta na literatura, a sala de aula não é um
espaço apenas para transmissão do conhecimento, é,
também, um local onde ocorrem interações, trocas de
conhecimento e vivências entre o professor e o aluno
(Moraes, 1996). Observou-se que o professor tem esta
consciência: de que deve influenciar e exercer um papel
importante na reintegração social do adolescente em
Liberdade Assistida. Ainda, Hernandez (1997) coloca a
necessidade de se ter um professor consciente de seu
papel e das questões sociais para uma melhoria de toda
a população.
Com base nesse trabalho pode-se afirmar que,
conforme apontado por autores como Moreira (1997) e
por instituições como CMDCA (2000) a Liberdade
Assistida é uma forma bastante interessante e viável de
reabilitação do jovem que cometeu ato infracional. No
entanto, fica claro na presente pesquisa que todos os
professores desses adolescentes encontram dificuldades
nessa interação. Tratando-se de uma relação social é
necessário a conscientização por parte do professor e do
aluno para que exista um convívio mais produtivo e
saudável, sem conflitos e estereotipias; ademais, é
necessária uma maior preparação profissional e emocional
do professor para lidar com esse tipo de situação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com esse trabalho, um primeiro passo foi dado no
sentido de sistematização de dados sobre uma
importante realidade – a educação formal de adolescentes em Liberdade Assistida – constituindo-se na
abertura de um campo promissor para pesquisas teóricas e aplicadas. Dentre as diferentes possibilidades e
necessidades de investigações pode-se apontar a
necessidade de pesquisas que analisem as expectativas
de um número maior de professores nessa condição,
de diferentes instituições, que adotem variadas
propostas pedagógicas; pesquisas longitudinais, que
descrevam a trajetória educativa desses alunos, seus
anseios e realizações; e pesquisas aplicadas, que
verifiquem o efeito nos adolescentes em LA de diferentes condições de ensino-aprendizagem.
Considerando que a Liberdade Assistida é uma
medida sócio-educativa, é mister destacar a necessidade de se preparar adequadamente os profissionais
responsáveis pelo processo de readaptação social dos
adolescentes submetidos a essa medida. Em particular,
destaca-se a importância de criação de cursos de
reciclagem profissional, que propiciem o aperfeiçoamento de professores que recebem alunos em LA,
que os auxiliem a compreender a condição do aluno e
a possibilidade de sua reinserção social, o que,
conseqüentemente, favorecerá a realização de um trabalho educativo de qualidade. No entanto, frente à
situação salarial do professorado brasileiro, considerase que o ideal seria que tais cursos fossem viabilizados
financeiramente por instituições governamentais e
disponibilizados, especialmente, em áreas de maiores
incidências de casos de Liberdade Assistida.
Em suma, o término do presente estudo evidenciou que, à despeito da relevância, o tema aqui
abordado é carente de investimentos. Espera-se,
portanto, que os resultados aqui apresentados sirvam
para alertar profissionais da área e para encorajar
outros pesquisadores a se aprofundar na problemática.
O professor e o aluno em liberdade assistida: Um estudo exploratório
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Violante, M. L. (1984). O dilema do Decente Malandro. São
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Recebido em: 11/01/05
Revisado em: 08/06/05
Aprovado em: 23/06/05
Endereço para correspondência:
Jeyse Martins: Av. Presidente Kennedy, 299 – Vila Suíça – CEP: 13334-170 – Indaiatuba – SP
e-mail: [email protected]
Caroline Catozzi: Avenida Washington Luis, 2700 – apto. 81 – Bloco B – CEP: 13043000 – Campinas – SP
e-mail: [email protected]
Flavia Sayegh: Rua Cap. Pinto Ferreira, 65 – apto. 61– CEP: 01423020 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Isabel Cristina Dib Bariani: Rua Uruguaiana, 646 – apto. 72 – CEP: 13026001 – Campinas – SP
e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1
127-134
TELEAVALIAÇÃO DA HABILIDADE DE LEITURA
NO ENSINO INFANTIL E FUNDAMENTAL
TELEAVALIAÇÃO DA HABILIDADE DE LEITURA
Elizeu Coutinho de Macedo1
Fernando César Capovilla2
Carolina Cunha Nikaedo3
Fernanda Tebexreni Orsati3
Katerina Lukasova3
Alessandra Gotuzo Seabra Capovilla4
Cléber Diana3
Resumo
O desenvolvimento da Internet possibilitou criar instrumentos computadorizados para avaliação psicológica no contexto escolar, porém é
necessário verificar a eficácia dessas tecnologias. Este estudo avaliou a viabilidade de aplicar via Internet o Teste de Competência de Leitura
Silenciosa On-line para avaliar a habilidade de decisão lexical. Participaram 415 crianças de Ensinos Infantil (EI) e Fundamental (EF), com idade
média de 8,24 anos (DP=1,23). O teste foi aplicado via Internet e os dados armazenados automaticamente. Resultados mostram que a pontuação
aumentou em função da série, com diferenças significativas entre séries sucessivas, exceto entre 3a e 4a série. Análise dos erros em função do tipo
de itens revelou que crianças de EI3 apresentaram dificuldade de acesso ao léxico ortográfico. O padrão de respostas na aplicação via Internet foi
semelhante ao da versão tradicional. Tais resultados mostram que é viável usar a Internet para coletar dados de testes baseados em constructos
teóricos.
Palavras-chaves: Leitura; Avaliação; Computadores; Internet.
LONG DISTANCE ASSESSMENT OF READING ABILITY IN SCHOOLARS
Abstract
Technological advances have permitted devising new Internet-mediated psychological assessment tools for the school context. It is necessary
to evaluate the efficacy of such instruments. This study analyses the validity of The Silence Reading Skills Test-On-line for assessing lexical
decision skills. The study involved 451 children with mean age of 8,24 (SD=1,23) from pre-school and primary school. The test was administered
through Internet with automatic result recording. Results showed that scores increased significantly over successive school levels (except from 3rd
to 4th grade). Error analysis revealed that pre-school children have difficulty with orthographic lexicon. The Web-based application produced
response patterns equivalent to those obtained in the typical paper and pencil application. Results corroborated the feasibility of using the Internet
for collecting data of tests based on theoretical constructs.
Keywords: Reading; Assessment; Computers; Internet.
1
Doutor em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo e Docente Faculdade de Psicologia e Programa de Mestrado em Distúrbios
do Desenvolvimento, Universidade Presbiteriana Mackenzie.
2
PHD em Psicologia pela Temple University, Livre docente em Psicologia Clínica pela USP e Docente do Programa de Psicologia Experimental
da Universidade de São Paulo.
3
Mestrandos em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
4
Doutora e Pós-Doutorada em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo e Docente do programa de Avaliação Psicológica da
Universidade São Francisco.
128
Elizeu Macedo, Fernando Capovilla, Alessandra Capovilla, Carolina Nikaedo, Fernanda Orsati, Katerina Lukasova e Cléber Diana
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento da Internet e o uso de
instrumentos computadorizados como ferramentas pedagógicas possibilitaram criar programas de ensino e
avaliação de habilidades acadêmicas à distância
(Alderson, 2000). O ensino por meio de computadores,
conhecido como e-learning, permite aprender em
contextos dinâmicos sem limites temporais e espaciais
(Asselmeyer, 2004). Watts e colaboradores (2004),
usando conceitos de e-learning, conduziram um estudo
para avaliar a eficiência do programa “Expresso Para
Escolas”. Desenvolvido com a finalidade de aumentar
habilidades literárias, esse programa era transmitido por
Internet via satélite para escolas. Resultados revelaram
um aumento nas habilidades avaliadas pelo programa e
na autonomia de execução pelas crianças avaliadas.
Psicólogos e psicometristas podem usar a Internet para
conduzir coleta de dados à distância de modo eficaz e
compreensivo (Buchanan 2002; Maheu & Gordon,
2000), seguro e preciso (Naglieri col al., 2004),
econômico e rápido (Epstein & Klinkenberg, 2001), além
de amplo e compreensivo. A Internet permite avaliar
simultaneamente, de maneira rigorosamente precisa, um
vasto número de habilidades de um grande número de
pessoas distribuídas num vasto território, e obter os
resultados em tempo real; tudo a um custo muito baixo.
A elevada acessibilidade à população e o baixo
consumo de recursos materiais e humanos requeridos
por esse tipo de avaliação decorrem da facilidade de
aplicação. Esta pode ser feita a partir de qualquer
computador conectado a rede, além da análise
automática dos resultados em tempo real (Birnbaum,
2004).
A elevada precisão da avaliação computadorizada
decorre de características como a padronização das
instruções, interação entre o conteúdo do teste e seu
delineamento, tabulação e análise automática dos
resultados por meio da aplicação de tabelas de dados
normativos previamente armazenadas (Epstein &
Klinkenberg, 2001). A coleta à distância também permite
assegurar o anonimato, além de um menor impacto da
situação de avaliação.
Dentre as desvantagens no uso da Internet destacam-se a necessidade de recursos tecnológicos nem
sempre universalmente acessíveis, a ansiedade gerada
no contexto de aplicação e a falta de familiaridade com
o computador, principalmente por indivíduos de nível
socioeconômico e cultural baixos (Buchanan, 2002).
Outras dificuldades dizem respeito à menor garantia de
representatividade amostral, uma vez que não há registro
central dos usuários; falta de controle sobre o ambiente
experimental e sobre o estado psicológico dos
participantes; possível variação na forma de
apresentação de acordo com tipo de computador e
versão de software; risco na integridade dos dados, já
que são enviados On-line e possibilidade de violação na
segurança (Epstein & Klinkenberg, 2001).
Estudos comparativos entre as formas tradicional e
computadorizada de avaliação vêm sendo conduzidos a
fim de minimizar as desvantagens do uso da Internet
(Bressani & Downs, 2002; Epstein col al., 2001). Epstein
e Klinkenberg (2001) descrevem estudos que obtiveram
altas correlações entre as versões tradicional e computadorizada de instrumentos que avaliam a habilidade de
leitura por meio do Children´s Reading Skills Test; a
inteligência por meio do teste WAIS (Wechesler Adult
Inteligence Scale); a personalidade por meio do
Inventário Multifásico Minnesota de Personalidade; bem
como uma série de funções neuropsicológicas (Duchesne
& Mattos, 1997; Macedo col al., 2002).
Nos últimos anos, o número de computadores nas
escolas brasileiras tem aumentado de modo significativo
e o acesso à Internet tem sido garantido a um número
cada vez maior de alunos. Dados do ProInfo revelam
que, em 2002, existiam 400 mil computadores nas escolas
públicas e particulares, com metade deles permitindo
acesso à Internet (www.proinfo.gov.br/upload/img/
relatorio_died.pdf). A ampla disponibilidade de
computadores nas escolas e de testes computadorizados
de leitura e escrita (e.g., Capovilla col al., 2004; Macedo
col al., 2004) baseados em constructos teóricos torna
possível a avaliação de leitura e escrita de crianças
brasileiras por meio da Internet.
Na avaliação da leitura são relevantes a precisão e a
fluência da decodificação grafofonêmica, bem como a
compreensão do significado do texto (Capovilla col al.,
2005; Grégoire & Piérart, 1997). De acordo com Santos
e Navas (2002), a análise do tempo consumido pela
criança na leitura de palavras permite avaliar as
competências lingüísticas relacionadas com a
prevalência de rota ao longo das séries escolares.
Segundo modelo de “dupla rota”, a leitura pode ser feita
por meio da rota fonológica ou da lexical (Capovilla &
Capovilla, 2004). A leitura pela rota fonológica envolve
mediação pela fala interna e se caracteriza pelos
processos de segmentação da seqüência grafêmica,
Teleavaliação da habilidade de leitura no ensino infantil e fundamental
conversão dos grafemas em fonemas, e junção fonética,
sendo que a pronúncia é construída segmento a
segmento. Em contraste, a leitura pela rota lexical não
envolve mediação pela fala interna, se caracteriza pelo
reconhecimento visual direto da representação
ortográfica de palavras familiares previamente
armazenada no léxico ortográfico, sendo que a pronúncia
é resgatada como um todo a partir do léxico.
Crianças em séries iniciais tendem a ler de forma
mais lenta uma vez que o processamento se dá pela
rota fonológica de conversão grafema-fonema.
Contudo, à medida que elas vão se tornando
decodificadoras fluentes e lendo a velocidades cada
vez maiores, elas passam a ler mais e acabam se
familiarizando com a forma visual geral das palavras
que tendem a encontrar mais freqüentemente. Ou seja,
a familiaridade com as palavras acaba por constituir
progressivamente um léxico ortográfico que contém a
representação ortográfica das palavras mais familiares,
e lhes permite passar a fazer reconhecimento visual
direto dessas palavras, sem a necessidade de
decodificação grafofonêmica para a construção da
pronúncia e o acesso ao significado.
A fim de avaliar o processamento de leitura, Capovilla
e colaboradores (2004) desenvolveram a versão de papel
e lápis do Teste de Competências de Leitura de Palavras
(TCLP). O TCLP é um instrumento psicométrico e
neuropsicológico cognitivo utilizado para o diagnóstico
diferencial de distúrbios relacionados à aquisição de
leitura. Como teste psicométrico, é acompanhado de
tabelas normativas que permitem avaliar o grau de desvio
entre o padrão de leitura de um examinando e o padrão
de leitura normal de seu grupo de referência, de acordo
com o nível de escolaridade. Como teste neuropsicológico, permite interpretar dados do padrão de leitura
específico apresentado por cada criança no que
concerne ao modelo do desenvolvimento de leitura e
escrita e inferir o estágio de desenvolvimento em que a
criança se encontra.
O TCLP foi normatizado para leitores surdos e
ouvintes. A validação para surdos foi feita a partir da
avaliação de 805 crianças, jovens e adultos surdos de 6
a 45 anos de idade, estudantes da 1a série do Ensino
Fundamental até a 1 a série do Ensino Médio. Já a
validação para ouvintes foi feito a partir da avaliação de
1000 crianças da 1a a 3a série do Ensino Fundamental.
Capovilla, Capovilla, Macedo e colaboradores (no prelo)
compararam o padrão de respostas entre leitores surdos
e ouvintes na versão lápis e papel.
129
Macedo e colaboradores (2004) desenvolveram a versão
computadorizada do TCLP que faz parte de uma Bateria de
Avaliação de Leitura e Escrita para Internet (BALS Online). A bateria é composta por sete testes, sendo que cada
um deles avalia componentes específicos de leitura ou escrita.
O objetivo do presente trabalho foi verificar a
funcionalidade da aplicação do TCLP via Internet a partir
da análise do padrão de respostas e da comparação com
dados normativos de 1000 crianças obtidos na versão papel
e lápis (Capovilla, Capovilla, Macedo col al., no prelo).
MÉTODO
Participantes
Participaram 415 crianças (211 meninas e 204
meninos) provenientes de escolas particulares da grande
São Paulo, e de cinco séries (3a série do Ensino Infantil
e 1a a 4a séries do Ensino Fundamental). A idade média
das crianças foi de 8,24 anos (DP=1,23).
Instrumento
Teste dec competência de Leitura de Palavras –
TCLP On-line (Macedo col al., 2004) contém 78 itens,
cada qual composto de uma figura e uma palavra ou
pseudopalavra escrita abaixo, além das opções “CERTO”
e “ERRADO”. Destes 78 itens, os oito primeiros itens
são de treino. Os demais 70 itens são divididos em sete
tipos, com dez itens cada, sendo dois tipos com itens
corretos e cinco incorretos. Os tipos com itens corretos
são: 1) palavras corretas regulares (CR), como FADA
sob a figura de uma fada; 2) palavras corretas
irregulares (CI), como TÁXI, sob a figura de um táxi.
Os cinco tipos com itens incorretos são: 3) palavras
semanticamente incorretas, que diferem das figuras
às quais estão associadas, ou seja, vizinhas semânticas
(VS), como TREM, sob a figura de um ônibus; 4)
pseudopalavras estranhas (PE), como RASSUNO
sob a figura de uma mão; 5) pseudopalavras
homófonas (PH), como PÁÇARU sob a figura de um
pássaro; 6) Pseudopalavras pseudo-homógrafas com
trocas fonológicas, ou seja, vizinhas fonológicas (VF),
como CANCURU sob a figura de um canguru; 7)
Pseudopalavras pseudo-homógrafas com trocas visuais,
ou seja, vizinhas visuais (VV), como CAEBÇA, sob a
figura de uma cabeça. A tarefa da criança consiste em
criança clicar com o mouse sobre a opção de “CERTO”
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
130
Elizeu Macedo, Fernando Capovilla, Alessandra Capovilla, Carolina Nikaedo, Fernanda Orsati, Katerina Lukasova e Cléber Diana
ou “ERRADO” conforme o julgamento sobre a
correspondência da palavra e da figura. Assim, como
há sete subtestes, cada qual com um tipo de par, e dez
itens por subteste, a pontuação por subteste é de 10
pontos, e a pontuação máxima no teste é de 70 pontos.
Destes 70 pontos, 20 pontos devem ser obtidos por
aceitação apropriada de itens corretos (i.e., CR e CI) e
50 pontos devem ser obtidos por rejeição apropriada dos
itens incorretos (i.e., VS, VF, VV, PH e PE).
TCLP On-line foi desenvolvido em linguagem de
programação PHP (Hypertext Preprocessor) utilizando Macromedia Flash MX® com a base de dados
MySQLTM (http://www.reabcognitiva.com.br/teste).
O teste foi aplicado nas crianças que apresentaram o
termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelos
pais. Todas as crianças freqüentavam aulas de informática
na escola e tinham familiaridade no uso do computador.
As aplicações coletivas foram realizadas com a presença
de um dos autores nos laboratórios de informática das
escolas durante os meses de junho e agosto de 2004.
RESULTADOS
O desempenho dos 412 estudantes variou de 24 a 70
pontos, com média de 60,77 pontos (DP=8,05). A análise
de variância do escore total como função da série escolar
revelou efeito significativo da série F (4,408) = 54,983,
p<0,000). Conforme sumariado na Tabela 1, a pontuação
média no teste aumentou em função da série escolar.
Análises post hoc indicaram diferença significativa entre
todas as séries, exceto entre a 3a e 4a série. Assim, a
pontuação aumentou da seguinte forma:
3aEI<1aEF<2EFa<3aEF=4aEF. Em termos de detecção
correta das malformações ortográficas e semânticas em
função do grupo de palavras, o teste t de medidas repetidas
(p<0,001) revelou que o grau de dificuldade dos grupos
variou, das mais fáceis para as mais difíceis na seguinte
ordem: PE>VS>CR>VV>CI=VF>PH.
Embora a pontuação total do teste tenha discriminado
as séries, análises post hoc (p<0,05) foram conduzidas
a fim de identificar a contribuição de cada grupo na
pontuação total do teste entre as séries.
A freqüência de acerto dos alunos da 3ª série do EI foi
semelhante à da 1a série do EF para todos os grupos, com
exceção das palavras corretas irregulares. A freqüência
de acerto dos alunos da 3ª série do EI foi significativamente
menor que as da 2ª, 3ª e 4ª séries do EF em todos os grupos,
exceto para itens do tipo VS, quando comparado com a 2a
série. A comparação dos julgamentos corretos dos alunos
da 1a série do EF foi menor que as demais séries do EF (2ª,
3ª e 4ª) em todos os tipos de pares. A freqüência de acerto
dos alunos da 2ª série do EF foi menor que as dos alunos
Tabela 1: Número médio de itens corretos e desvio-padrão em função da série escolar e dos tipos de subteste: Corretas
Regulares (CR); Corretas Irregulares (CI); Vizinhas Semânticas (VS); Pseudopalavras Estranhas (PE); Pseudopalavras
Homófonas (PH); Vizinhas Visuais (VV); e Vizinhas Semânticas (VS).
3ª série EI
1ª série EF
2ª série EF
3ª série EF
4ª série EF
Total
Comparações
CR
8,06 (1,75)
8,56 (2,18)
9,45 (0,77)
9,57 (0,70)
9,25 (1,06)
9,21 (1,30)
b, c, d, e, f, g
CI
4,88 (2,00)1
7,23 (2,14)
8,72 (1,20)
8,80 (1,33)
8,85 (1,45)
8,36 (1,79)
a, b, c, d, e, f, g
VS
8,94 (1,75)
8,97 (1,96)
9,36 (1,07)
9,58 (1,01)
9,60 (0,74)
9,40 (1,23)
c, d, e, f, g
PE
8,94 (1,25)
9,10 (1,97)
9,77 (0,63)
9,81 (0,48)
9,85 (0,50)
9,66 (1,02)
b, c, d, e, f, g
PH
3,41 (1,77)2
4,51 (2,70)1
6,29 (2,71)
7,78 (2,57)
8,95 (1,65)
7,01 (2,92)
b, c, d, e, f, g, h, i, j
VV
7,41 (1,97)
7,87 (1,88)
8,75 (1,46)
9,24 (1,05)
9,15 (1,54)
8,78 (1,59)
b, c, d, e, f, g, h, i
VF
6,59 (2,43)
7,01 (2,64)
8,09 (2,35)
9,02 (1,59)
9,03 (1,53)
8,35 (2,18)
b, c, d, e, f, g, h, i
MDP
48,23(5,07)
53,26(8,97)
60,43(6,23)
63,79(5,41)
64,64(6,15)
60,78(8,06)
a, b, c, d, e, f, g, i
Comparações de pares (Bonferroni): a) 3ª série EI X 1ª série EF; b) 3ª série EI X 2ª série EF; c) 3ª série EI X 3ª série EF; d) 3ª série
EI X 4ª série EF; e) 1ª série EF X 2ª série EF; f)1ª série EF X 3ª série EF ; g) 1ª série EF X 4ª série EF ; h) 2ª série EF X 3ª série EF
; i) 2ª série EF X 4ª série EF ; j) 3ª série EF X 4ª série EF ; p<0,05. 1) Número de erros em nível do acaso; 2) Número de erros maior
que o acaso.
Teleavaliação da habilidade de leitura no ensino infantil e fundamental
de 3a e 4a do EF nos itens do tipo PH, VF e VS. A única
diferença entre alunos de 3ª e 4ª séries do EF foi em itens
do tipo PH.
O poder discriminativo de cada um dos subtestes de
discriminar entre as séries, de modo geral, foi proporcional
ao grau de dificuldade do subteste, de modo que subtestes
mais difíceis discriminaram mais que os mais fáceis. A
ordem decrescente do poder de discriminação dos itens
foi: VS<PE=CR<CI<VF=VV<PH. O subteste de itens
do tipo PH discriminou entre todas as séries, exceto entre
a 3a série do EI e a 1a série do EF.
Como a chance de acerto ao acaso de cada um dos
subtestes é de 50%, foram conduzidos Testes t para uma
amostra a fim de avaliar, para cada série, se o número de
acertos para cada um dos subtestes foi acima do acaso.
131
A análise de variância do tempo total como função da
série escolar revelou efeito significativo da série, F
(4,407)=151,572, p<0,000. O tempo médio de execução do
item foi uma função decrescente da série escolar. O tempo
de execução total do teste aumentou significativamente da
3ª série do EI para a 1a série do EF e desta para todas as
demais. Não foram observadas diferenças significativas
no tempo de execução entre as séries mais avançadas.
Em termos de tempo de execução dos itens em
função do tipo de subteste, o teste t de medidas
repetidas (p<0,001) revelou que o tempo despendido
em cada tipo de subteste variou, dos mais difíceis para
os mais fáceis na seguinte ordem: PH > CI = VV >
PE = VF > VS > CR. A fim de identificar a
contribuição de cada tipo de subteste para o tempo de
Tabela 2: Tempo médio dos itens (em segundos) e desvio padrão em função da série e do tipo de subteste: Correta Regular
(CR); Correta Irregular (CI); Vizinha Semântica (VS); Pseudopalavra Estranha (PE); Pseudopalavra Homófona (PH); Vizinha
Visual (VV); e Vizinha Semântica (VS).
3ª sérieEI
1ª série EF
2ª série EF
3ª série EF
4ª série EF
Total
Comparações
CR
11,56(4,82)
5,74(2,78)
3,91(1,86)
3,72(1,79)
3,38(1,59)
4,33(2,73)
a, b, c, d, e, f, g
CI
15,28(5,50)
6,55(3,34)
4,56(2,24)
4,18(2,38)
3,47(1,59)
4,93(3,48)
a, b, c, d, e, f, g, i, j
VS
16,37(6,57)
6,26(3,68)
3,77(1,66)
3,53(1,49)
3,05(1,33)
4,44(3,61)
a, b, c, d, e, f, g, i
PE
16,76(5,63)
7,02(4,01)
4,14(1,84)
3,67(1,57)
3,31(1,40)
4,79(3,71)
a, b, c, d, e, f, g, i
PH
15,82(3,93)
7,50(3,94)
5,05(2,37)
4,38(2,03)
3,75(1,84)
5,36(3,59)
a, b, c, d, e, f, g, i
VV
15,62(6,04)
7,34(4,03)
4,62(2,22)
3,67(1,35)
3,33(1,43)
4,92(3,64)
a, b, c, d, e, f, g, h, i
VF
16,20(5,88)
6,55(3,27)
4,24(1,91)
3,79(1,52)
3,39(1,54)
4,76(3,48)
a, b, c, d, e, f, g, i
MDP
16,59 4,27
7,09 3,64
3,64 1,98
3,94 1,54
3,57 1,48
4,81 3,56
a, b, c, d, e, f, g
Comparações de pares (Bonferroni): a) 3ª série EI X 1ª série EF; b) 3ª série EI X 2ª série EF; c) 3ª série EI X 3ª série EF; d) 3ª série
EI X 4ª série EF; e) 1ª série EF X 2ª série EF; f) 1ª série EF X 3ª série EF ; g) 1ª série EF X 4ª série EF; h) 2ª série EF X 3ª série EF
; i) 2ª série EF X 4ª série EF ; j) 3ª série EF X 4ª série EF ; p<0,05.
Resultados revelam que o número de acertos foi próximo
ao acaso para o subteste com itens do tipo CI da 3a série
do EI , e para o subteste com itens do tipo PH da 1a série
do EF. Já o número de erros da 3a série do EI para subteste
com itens do tipo PH foi maior que o esperado ao acaso.
O tempo médio de resposta aos subtestes variou de
1,04 a 25,63 segundos, sendo os tempos menores
observados nas séries mais avançadas. O tempo médio
de resposta a cada item foi de 4,81 segundos (DP=3,56).
O tempo total do teste foi de 6 minutos e 15 segundos.
A Tabela 2 sumaria os tempos médios para cada um
dos subtestes em função do tipo de item.
execução médio foram conduzidas análises post hoc
(p<0,05). O tempo de execução foi significativamente
maior na 3ª série do EI e na 1ª série do EF do que nas
demais séries. O tempo de execução na 2ª série do EF
foi significativamente maior do que na 3ª série do EF
apenas para o subteste com itens do tipo VV. No
entanto, comparando a 2a série do EF com a 4ª série
do EF foram notadas diferenças para todos os tipos de
subteste, exceto para o subteste com itens do tipo CR.
Foram observadas diferenças entre a 3ª série do EF e
a 4ª série do EF apenas para o subteste com itens do
tipo CI.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
132
Elizeu Macedo, Fernando Capovilla, Alessandra Capovilla, Carolina Nikaedo, Fernanda Orsati, Katerina Lukasova e Cléber Diana
A fim de comparar os resultados obtidos a partir da
versão computadorizada via Internet com os dados
normativos de 1000 crianças da 1a a 3a série, os dados das
crianças da 3ª série do EI e da 4a série do EF foram excluídos.
Analisando a distribuição de acertos nos subtestes
computadorizados e comparando a distribuição de acertos
de 1000 leitores ouvintes de 1a a 3a série, foi encontrado
que o padrão de escore na versão computadorizada (i.e.,
[PE=9,61] > [VS=9,34] > [VV]=8,71] > [VF=8,17] >
[PH]=6,41]) foi similar ao da versão papel e lápis (i.e.,
[PE=9,23] > [VS=8,81] > [VV=7,94] > [VF=6,92] >
[PH=5,90]). Embora o padrão de escore tenha sido similar,
a pontuação na versão computadorizada foi em média de
0,69 pontos, sendo as maiores discrepâncias observadas
para VF (1,25) e VV (0,77).
DISCUSSÃO
O desenvolvimento da Internet nos últimos anos tem
possibilitado construir instrumentos para avaliar diversas
dimensões psicológicas. Instrumentos computadorizados
têm sido desenvolvidos e validados para avaliação
vocacional, forense, clínica (Kaldo col al., 2004; Carlbring
& Andersson, no prelo), atitudes de professores (Joly &
Silveira, 2003), além de funções neuropsicológicas (Erlanger
col al., 2003) e para recursos humanos (Salgado col al.,
2003). Além da avaliação nestes contextos, a aplicação de
testes de leitura e escrita via Internet abre espaço para
novas pesquisas em avaliação psicológica. No entanto, tais
instrumentos devem ser criados com base em modelos teóricos do desenvolvimento das habilidades de leitura e
escrita, tais como o Teste de Competência de Leitura de
Palavras On-line (TCLP On-line) descrito neste estudo.
O modelo teórico de processamento cognitivo de leitura
subjacente ao TCLP On-line preconiza que subtestes
avaliam diferentes habilidades de processamento de
palavras isoladas, como a logográfica, a fonológica e a
lexical (Capovilla col al., no prelo). Assim, as diferenças
de erros dos subtestes ao longo das séries podem ser
explicadas como função de diferentes habilidades.
O desempenho nos testes, avaliado em termos de
freqüência de acerto e do tempo de execução dos testes, discriminou entre as séries escolares sucessivas.
Crianças das séries iniciais apresentaram menores escores e maiores tempos de execução no teste. No entanto,
não foram observadas diferenças entre a 3a e a 4a séries
do EF em decorrência de efeito de teto já a partir da 3a
série do EF. Capovilla e colaboradores (2004) avaliaram
850 crianças surdas na versão papel e lápis, e não
encontraram tal efeito nem mesmo nos estudantes da 8a
série do ensino fundamental. No presente estudo, a
consecução da pontuação máxima já na 3a série do EF
decorre da procedência dos alunos avaliados, todos de
escolas particulares, e do nível socioeconômico e cultural
dos pais que, em sua maioria, têm curso superior.
Segundo Capovilla e colaboradores (no prelo) os sete
subtestes avaliam o uso diferencial das três diferentes
rotas de leitura de palavras isoladas, a logográfica, a
fonológica e a lexical. Assim, diferentes padrões de
falhas nos subtestes, podem revelar: 1) ausência de
qualquer tipo de processamento de leitura; 2) leitura no
nível meramente logográfico; 3) leitura no nível
meramente perilexical, com falta de acesso ao léxico
ortográfico; bem como 4) falta de acesso semântico.
A ausência de qualquer tipo de processamento de leitura
é revelada por falha em obter pontuação significativamente
acima do acaso no subteste com itens do tipo PE, isto é, por
falha em rejeitar apropriadamente pseudopalavras estranhas
que não têm qualquer semelhança, quer de natureza visual,
quer de natureza fonológica, com palavras reais que fazem
parte do léxico da Língua Portuguesa. No presente estudo,
mesmo as crianças da 3a série do EI apresentaram freqüência
de acerto significativamente acima do acaso.
Não foi observado para nenhuma das séries leitura
no nível meramente logográfico, com falta de processamento perilexical de decodificação, pois não foi
observada falha em obter pontuação significativamente
acima do acaso no subteste com itens do tipo VV, isto é,
por falha em rejeitar apropriadamente essas pseudopalavras cuja gestalt (i.e., aspecto visual global) guarda
certa semelhança geral com a de palavras reais que
fazem parte do léxico da Língua Portuguesa.
A leitura no nível meramente perilexical, com falta
de acesso ao léxico ortográfico, é revelada por falha
em obter pontuação significativamente acima do acaso
no subteste com itens do tipo PH, isto é, por falha em
rejeitar pseudopalavras homófonas; e é, também,
revelada por falha em obter pontuação significativamente acima do acaso no subteste com itens do tipo
CI, isto é, por falha em aceitar palavras corretas
irregulares, as quais só podem ser lidas pela leitura
lexical de reconhecimento das formas ortográficas. Tais
expectativas foram efetivamente confirmadas no
presente estudo pelas crianças da 3a série do EI, sendo
Teleavaliação da habilidade de leitura no ensino infantil e fundamental
133
que a freqüência de acertos no subteste com itens do
tipo CI foi no nível do acaso e no subteste com itens do
tipo PH a freqüência de erros foi até maior do que
esperado ao acaso.
Em suma, a pontuação total do TCLP aplicado via
Internet em estudantes dos Ensinos Infantil e Fundamental de escolas particulares, discriminou entre séries
escolares sucessivas na faixa da 3a série do EI até a 3a
série do EF. As freqüências dos tipos de erros observadas na aplicação pela Internet foram semelhantes àquelas
observadas na aplicação papel e lápis (Capovilla col al.,
no prelo). Assim, a aplicação via Internet, além de
apresentar resultados similares aos da aplicação tradicional, possibilita o registro de medidas importantes como
o tempo que a criança leva para ler as palavras.
Além do TCLP On-line, outros testes fazem parte da
Bateria de Avaliação de Linguagem On-line (Macedo et
al., 2004). Novos estudos de aplicação do TCLP On-line,
juntamente com os demais testes que compõem a bateria,
possibilitarão analisar correlações do TCLP com provas
como os Testes de Nomeação de Figuras por Escolha e
por Escrita; o Teste de Competência de Leitura de
Sentenças e o Teste de Vocabulário Receptivo. Além disso, essa bateria permite conduzir em todo o território nacional
e em países de Língua Portuguesa, de modo a acompanhar
o desenvolvimento dos escolares em todos os estados da
federação e obter, assim, subsídios para o aperfeiçoamento
constante de procedimentos e materiais para a alfabetização
e a elaboração de procedimentos, materiais e métodos que
possam ser usados no contexto escolar.
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compreensão de leitura de sentenças em surdos do Ensino
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 117-125
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Recebido em: 22/03/2005
Revisado em: 19/05/2005
Aprovado em: 16/06/2005
Endereço para correspondência:
Elizeu Coutinho de Macedo: Rua da Consolação, 876; Prédio Amantino Vassão, sala 62 – CEP: 01302-907 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Fernando César Capovilla: Av. Prof. Mello Moraes, 1721 – Psicologia Experimental – Cidade Universitária – CEP: 055508-900
– São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Carolina Cunha Nikaedo: Rua da Consolação, 876 – Prédio Amantino Vassão, sala 62 – CEP 01302-907 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Fernanda Tebexreni Orsati: Rua da Consolação, 876 – Prédio Amantino Vassão, sala 62 – CEP 01302-907 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Katerina Lukasova: Rua da Consolação, 876 – Prédio Amantino Vassão, sala 62 – CEP 01302-907 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Alessandra Gotuzo Seabra Capovilla: Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 – CEP: 13251-900 – Itatiba – SP
e-mail: [email protected]
Cléber DianaRua da Consolação, 876 – Prédio Amantino Vassão, sala 62 – CEP 01302-907 – São Paulo – SP
e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9
Número 1
135-145
CULTURA DA PAZ E PSICOLOGIA ESCOLAR
NO CONTEXTO DA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA
CULTURA DA PAZ E PSICOLOGIA ESCOLAR
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi1
Claisy Maria Marinho de Araújo2
Marisa Maria Brito da Justa Neves3
Resumo
O presente artigo visa estabelecer uma interface entre a Cultura da Paz declarada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e a Psicologia
Escolar, enquanto área de pesquisa e prática no contexto das instituições educativas. A Cultura da Paz é definida, conforme as considerações da ONU,
como processo construtivo e dinâmico. A instituição escolar é abordada como espaço de relevo para a promoção do desenvolvimento humano e
canalização cultural. Apresenta-se, também, as contribuições e atribuições da Psicologia Escolar no desenvolvimento de seus objetivos educativos
e formativos, especificamente no que compete ao conhecimento psicológico. A interface entre a Cultura da Paz e a Psicologia Escolar apontou
concepções e estratégias convergentes e complementares, de âmbito preventivo e interventivo, promotoras de reflexões e ações construtivas de
uma Cultura de Paz no ambiente escolar.
Palavras- chave: Relações interpessoais; Socialização; Aprendizagem.
PEACE CULTURE AND SCHOOL PSYCHOLOGY IN THE CONTEXT OF EDUCATIVE INSTITUTIONS
Abstract
The following article aims to establish an interface between the Peace Culture declared by the United Nations (UN) and School Psychology, as
research and practical areas in the context of educative institutions. The Peace Culture is defined, in agreement with the considerations of the UN,
as a constructive and dynamic process. The school institution is approached as an important location to the promotion of human development and
cultural canalization. It is presented, also, the contributions and attributions of School Psychology in the development of its educative and
formative objectives, specifically in what concerns psychological knowledge. The interface between the Peace Culture and School Psychology
showed convergent and complementary conceptions and strategies, with preventive and interventionist scope, promoters of reflections and
constructive actions of a Peace Culture in the school environment.
Keywords: Interpersonal relations; Socialization; Learning.
INTRODUÇÃO
O
presente artigo objetiva estabelecer uma
interface entre a Cultura da Paz, difundida pela
Organização das Nações Unidas (ONU) e a Psicologia
Escolar, enquanto área de pesquisa e prática no contexto
da instituição educativa.
A Cultura da Paz será apresentada sob sua ótica
construtiva, tal como definida nos documentos oficiais
1
2
3
da ONU. A Psicologia Escolar, cuja atuação visa à
coerência dos discursos e práticas dos diferentes atores
educacionais, apresenta-se como área de conhecimento interfaceada com as proposições de construção de
uma Cultura de Paz no contexto da escola.
Visto que “as guerras nascem na mente dos homens,
e é na mente dos homens que devem erguer-se os balu-
Psicóloga da Secretaria de Educação do Distrito Federal e Mestranda em Psicologia pela Universidade de Brasília.
Doutora em Psicologia e professora adjunta da Universidade de Brasília, Instituto de Psicologia.
Doutora em Psicologia e professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal e da Universidade de Brasília.
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Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi, Claisy Maria Marinho de Araújo e Marisa Maria Brito da Justa Neves
artes da paz”, conforme preconiza a Declaração sobre
uma Cultura de Paz (ONU, 1999, nº 53/243), ressaltase, nesse trabalho, a necessidade do estudo acerca da
constituição do sujeito e da construção dos processos
que possibilitam sua vivência pacífica com o mundo. A
escola, enquanto palco de desenvolvimento subjetivo do
indivíduo, e a psicologia, enquanto área de conhecimento incluída no processo escolar, evidenciam-se como
espaços e meios promotores da construção da Cultura
de Paz.
Cultura de Paz
A Declaração dos Direitos da Criança, proclamada
em 20 de novembro de 1959 pela Assembléia Geral das
Nações Unidas, constitui uma enumeração dos direitos
a que, segundo o consenso da comunidade internacional,
faz jus toda e qualquer criança. Aos pais, às organizações
voluntárias, às autoridades locais, aos governos e a todos os indivíduos, apela-se no sentido de reconhecer os
direitos enunciados visando ao empenho efetivo para
sua concretização e observância.
O Princípio 2º da citada Declaração, referindo-se às
crianças, aduz que “(...) ser-lhe-ão proporcionadas oportunidades e facilidades, por lei e por outros meios, a fim
de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, de forma sadia e normal e em
condições de liberdade e dignidade” (Declaração dos
Direitos da Criança, ONU, 1959).
Ressaltando os direitos humanos fundamentais, a dignidade e o valor do ser humano, as Nações Unidas
alertam quanto à necessidade da criança criar-se “num
ambiente de compreensão, de tolerância, de amizade
entre os povos, de paz e de fraternidade universal (...)”
(Declaração dos Direitos da Criança, ONU, 1959, Princípio 10º – grifo nosso).
A Declaração sobre o Direito dos Povos à Paz (ONU,
1984, nº 39/11) proclama solenemente que os povos do
planeta têm o direito sagrado à paz, declarando que proteger tal direito e fomentar a sua realização constitui
uma obrigação fundamental de todo o Estado, o qual
deve promover ações de “cooperação bilateral e
multilateral” com outros Estados (item II-b), tal como
consta da Declaração sobre a Preparação das
Sociedades para Viver em Paz (ONU, 1978, nº 33/73).
A Resolução nº 53/243, referente à Declaração sobre
uma Cultura de Paz, foi aprovada pela Assembléia Geral
da ONU em 1999 como expressão de profunda preocupação com a persistência e proliferação da violência e
dos conflitos nas diversas partes do mundo, reconhecendo
a necessidade de se eliminar todas as formas de discriminação e manifestação de intolerância. Tal Declaração foi solenemente proclamada com o objetivo de que
os Governos, as organizações internacionais e a
sociedade civil pudessem orientar suas atividades por
suas disposições, a fim de promover e fortalecer uma
cultura de paz no novo milênio.
A paz é reconhecida não somente como a ausência
de conflitos, mas como um processo positivo, dinâmico
e participativo em que se promove o diálogo e a solução
dos conflitos em um espírito de entendimento e
cooperação mútuos. A cultura de paz é definida como
um conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida baseados no respeito pleno à
vida e na promoção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, propiciando o fomento da paz entre
as pessoas, os grupos e as nações (Declaração sobre
uma Cultura de Paz, ONU, 1999, artigos 1 e 2).
A paz envolve uma visão de construção, de ação e
de investimento pessoal na auto-transformação e na
transformação do meio com vistas à dignidade e ao desenvolvimento. Desta forma, a paz não corresponde
apenas a um intervalo entre guerras (Milani, 2004), mas
a um processo ativo de interação saudável com o meio
social, no qual o sujeito se insere como importante agente
de transformação e de ação cidadã.
Abordando a cidadania para a conquista da paz, Milani
(2000) aponta as restrições decorrentes de uma postura
reativa, na qual cobram-se direitos e exigem-se soluções
de problemas sociais pelo governo, ressaltando a necessidade de se exercer uma cidadania proativa, definida como uma postura individual caracterizada pelo
exercício consciente de seus direitos e deveres, pela
participação ativa no processo de busca de melhorias
coletivas e pela responsabilidade para com tudo o que
afeta a sua vida e/ou as vidas de outras pessoas.
A paz passa a ser construída nas ações e interações
cotidianas, das mais simples às mais elaboradas, envolvendo as relações consigo, com o outro e com o
ambiente, caracterizando um movimento não reduzido
ao ‘combate à violência’, mas ampliado à ‘promoção da
cultura da paz’.
Conforme afirma Milani (2000), ser um cidadão de
paz transcende a visão de não ser um indivíduo violento, visto que fazer o bem assume um caráter mais
amplo que não fazer o mal. Segundo o autor, a prática
da paz implica o envolvimento de cada cidadão, família,
Cultura da paz e psicologia escolar no contexto da instituição educativa
organização e comunidade na vivência e construção de
relações baseadas no respeito, na unidade na diversidade e na empatia.
O vínculo existente nas relações sujeito-ambiente
torna a construção e a vivência da paz a sua mais
efetiva e eficaz forma de promoção e difusão.
A Instituição Escolar e a sua Função
Construtiva de Paz
Referindo-se à educação, o Princípio 7º da Declaração dos Direitos da Criança (ONU, 1959) aborda:
...Ser-lhe-á propiciada uma educação capaz de
promover a sua cultura geral e capacitá-la a, em
condições de iguais oportunidades, desenvolver as
suas aptidões, sua capacidade de emitir juízo e seu
senso de responsabilidade moral e social, e a tornar-se um membro útil da sociedade.
À escola, enquanto instituição formativa, compete a
tarefa da promoção da paz, de sua vivência e difusão
através de metodologias específicas, bem como através
de ações efetivas que representem as práticas preconizadas no Princípio 7º da Declaração supracitada. O Artigo
4 da Declaração sobre uma Cultura de Paz reafirma a
posição educacional, considerando-a como um dos meios
fundamentais para a edificação da cultura de paz, particularmente na esfera dos direitos humanos.
O contexto escolar, enquanto espaço de manifestação e vivência da realidade subjetiva do sujeito, a despeito do reconhecimento e da relevância dos demais
campos nos quais esse se insere, apresenta-se como
locus privilegiado de observação e intervenção frente a
esta realidade. Espaço de formação e aprendizagem, a
instituição educativa envolve uma ação para além do
aspecto cognitivo ou da prática curricular, constituindo
um campo de interações sociais, crescimento integral e
construção cultural.
A cultura, segundo Cole (1992), atua como
mediadora no desenvolvimento humano, contribuindo
fundamentalmente na constituição do sujeito. Para este
autor, a cultura surge sob a forma de sistemas semióticos
e conceituais, práticas e instituições sociais, promovendo determinadas formas de comportamento.
Segundo Valsiner (2001), a cultura é uma qualidade
da relação em curso entre pessoas e ambientes, não
correspondendo a uma ‘entidade’, mas a uma construção
de estruturas conceituais por atividades de pessoas,
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incluindo-se símbolos, significados e maneiras de ação.
Considerando as dimensões cognitiva e afetiva nas
relações estabelecidas entre o indivíduo e o meio, o autor
faz referência aos ‘modelos de ação’ externalizados no
ambiente e promovidos pelas diversas instituições sociais.
Trazendo as contribuições do construtivismo históricocultural, Vygotsky (1994) afirma que o ambiente não
pode ser considerado como uma condição que,
objetivamente, determina o desenvolvimento da criança,
mas deve ser estudado do ponto de vista do relacionamento que existe entre esta e seu meio específico, em
determinado estágio do seu desenvolvimento. A dimensão sociocultural do desenvolvimento humano envolve
a cultura enquanto ‘palco de negociações’, caracterizando um processo dinâmico de interação entre o mundo
cultural e o mundo subjetivo individual. Segundo o autor,
o homem é um ser histórico-social que, sem os processos
de interação com a sócio-cultura, não poderá desenvolver as características que tem sido construídas ao longo
da evolução da humanidade. A culturalização, sob a
perspectiva sócio-construtivista, é concebida não como
um processo de absorção passiva, mas como um
processo bidirecional de transformação.
Valsiner (1989, 1994a), ampliando tal perspectiva na
direção de incluir o papel do sujeito ativo e construtivo,
assegura que o desenvolvimento psicológico é social,
relacionado às – mas não determinado pelas – interações
sociais que o indivíduo estabelece ao longo do seu desenvolvimento. Em ambos os aspectos - biológico e
social - o desenvolvimento consiste na transformação
de uma organização, em um processo através do qual
novas formas de organização surgem das que as precederam no tempo. Dessa forma, as influências ambientais
e as condições internas do organismo participam do processo de desenvolvimento, possibilitando-o ou dificultando-o, a depender das interações específicas de tais
condições em cada momento.
Os participantes do processo de transmissão cultural
transformam ativamente as mensagens culturais,
organizando e reorganizando as informações que perpassam uma experiência social, caracterizando um
modelo de transmissão bidirecional da cultura. O processo de internalização/externalização representa um
processo ativo de alternância entre as culturas pessoal
– singular e original do indivíduo – e coletiva – indicativa
de uma rede de significados historicamente construídos
e coletivamente partilhados pelo grupo social (Martins
& Branco, 2001).
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A participação na escola, dessa forma, possibilita à
criança o contato com um mundo de relações
interpessoais, inseridas em uma rede de significados,
crenças e valores culturalmente estabelecidos e
socialmente compartilhados (Valsiner, 1989). Como processo bidirecional, o aluno oferece, igualmente, à escola,
um mundo subjetivo que vem a enriquecer-lhe a ‘cultura
escolar’ e, conseqüentemente, as interações que lá se
estabelecem.
Segundo Lima (1992), a experiência escolar se insere
em um processo contínuo de desenvolvimento do sujeito,
iniciado antes de sua entrada na instituição, tornandose, a escola, cada vez mais, uma das possibilidades de
desenvolvimento para o ser humano. Conforme afirma
a autora, “a escola não é um espaço independente de
socialização e aprendizagem, mas um espaço que vem
se somar aos outros nos quais o ser humano transita”
(p.4), para onde a experiência acumulada do sujeito é
levada e irá influenciar a sua inserção no contexto. Ressalta-se, assim, a co-construção do processo de escolarização: o indivíduo constrói a sua relação com a escola
com base nas suas experiências, ao passo que a escola
constrói a sua relação com o indivíduo com base nas
elaborações sociais das experiências culturais.
Lima (1992) ainda destaca que:
enquanto as aprendizagens na vida cotidiana trazem inerentes a si mesmas seus significados, uma
vez que decorrem das práticas sociais e culturais,
das condições de vida e da organização de cada
coletivo humano, as aprendizagens na escola
encontram seu significado na história das idéias e
no complexo processo de desenvolvimento da
consciência humana. (p.5)
Desta forma, a importância do conhecimento se guia
pelos elos estabelecidos entre os processos de construção
dos conceitos e o processo global do desenvolvimento,
devendo-se considerar o eixo epistemológico da
escolarização como “resultante da articulação entre
desenvolvimento, aprendizagem, socialização e formação da personalidade” (Lima, 1992, p.7).
Araújo (2003) aborda o espaço educacional e os
vínculos estabelecidos entre a Educação, a escola e os
professores, ressaltando a amplitude da ação educativa,
que não se limita aos conhecimentos, informais ou
científicos, mas envolve inúmeros outros aspectos ligados às construções afetivas, relacionais e criativas.
“Entender que a escola não é nem a fonte essencial
das desigualdades sociais, nem reflete passivamente
a ideologia dominante (...) é defender que há, na
instituição escolar, intencionalidades, finalidades,
utilidades que lhe permitem re-interpretar e resignificar a ideologia ao difundi-la ou transmiti-la.”
(Araújo, 2003, p.21)
Esse encontro representa o momento da construção
e resignificação cultural, que pode aproximar-se ou afastar-se dos preceitos de paz e valores sociais, a depender das construções já existentes e das condições
ambientais promotoras de sua transformação.
A instituição escolar assume a dimensão mediadora
da ações oriundas do processo educativo em função das
complexas e multideterminadas influências ideológicas,
históricas, econômicas, políticas e sociais, constituindo
um local privilegiado de contradições e antagonismos,
bem como de articulação dos interesses sociais mais
justos, democráticos e solidários (Araújo, 2003). De
acordo com a afirmação da autora:
A contribuição da escola à redução das desigualdades sociais não se efetivará sem o enfrentamento
crítico e corajoso dos inúmeros impedimentos que
se colocam à construção da cidadania e que
comparecem tanto no interior dos muros da escola
(pelo currículo – formal, real, oculto), quanto fora
dela, por meio de políticas públicas que atestam o
descaso com necessidades, desejos e demandas
concretas oriundas no contexto escolar. (p.23)
Branco (2003) ainda ressalta a importância de se
estabelecer uma recognição recíproca entre os indivíduos
acerca da aceitação das diferenças étnicas e culturais
enraizadas “que vão realçar as possibilidades de respeito
mútuo e da co-construção de uma sociedade mais rica
em termos de alternativas criativas para resolver os difíceis problemas que surgem, e acima de tudo, aumentar
as possibilidades de um mundo pacífico” (p.252).
Milani (2004) identifica e analisa práticas exitosas
desenvolvidas por organizações educacionais brasileiras, cujo trabalho focalizou a prevenção da violência
interpessoal e/ou a promoção da cultura de paz aos adolescentes. Nessa pesquisa, o autor pôde constatar diferentes modelos de prevenção e priorização de estratégias
de ação, destacando a necessidade de uma intencionalidade educativa consciente através do engajamento
Cultura da paz e psicologia escolar no contexto da instituição educativa
efetivo dos atores sociais. Segundo o autor, os processos
dialógicos e interacionais, bem como os conteúdos
programáticos das experiências estudadas, oportunizaram a reflexão e o exercício de valores, como o respeito
às diferenças e o serviço à coletividade, por meio do
fortalecimento da identidade pessoal e cultural.
Tais contribuições somam-se às considerações de
Meira (2000), quando afirma que “a Educação, enquanto
um processo ao mesmo tempo social e individual,
genérico e singular, é uma das condições fundamentais
para que o homem se constitua de fato como ser humano,
humanizado e humanizador” (p.60).
Freire (1996), abordando acerca do papel da
instituição escolar no mundo presente, afirma que:
o mundo não é. O mundo está sendo. Como
subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na
objetividade com que dialeticamente me relaciono,
meu papel no mundo não só o de quem constata o
que ocorre mas também o de quem intervém como
sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da
História mas seu sujeito igualmente. No mundo da
História, da cultura, da política, constato não para
me adaptar mas para mudar. (p. 76-77)
Dessa forma, assumindo-se como agente de transformação social e como palco privilegiado de negociações culturais e de desenvolvimento humano, a instituição
escolar ocupa posição de relevo para a vivência,
promoção e difusão da Cultura de Paz.
A Psicologia Escolar
Historicamente, a Psicologia esteve vinculada à Educação desde o seu início no Brasil através das Escolas
Normais e Institutos de Educação, sendo respaldada e
construída, prioritariamente, por um visão médica. Os trabalhos de atendimento psicológico desenvolvidos no âmbito
educacional eram realizados e/ou orientados por médicos,
com forte influência da ciência experimental e da
psicometria, caracterizando uma migração, para o interior
da instituição escolar, de um modelo clínico de atuação.
Conforme bem descreve Araújo (2003), tal situação
garantiu o destaque da Psicologia na Educação, ao passo que evidenciou a fragilidade do conhecimento psicológico acerca da ação educacional. Caiu-se na armadilha,
não da Psicologia, tampouco da Educação, mas dos vácuos resultantes de espaços mal articulados entre ambas
as áreas, de explicar o fracasso escolar em concepções
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deterministas e reducionistas sustentadas pela
causalidade biológica, organicista, psicológica ou
ambientalista, não se assumindo a natureza multideterminada da dificuldade de aprendizagem e as inúmeras
articulações profissionais para combatê-la.
A figura do psicólogo escolar ou psicólogo educacional surgiu, desta forma, com uma identidade tênue,
pouco definida, marcada por tendências adaptacionistas
e por subjugação ideológica aos interesses hegemônicos
do poder capitalista. Discursos críticos por parte de psicólogos favoreceram, historicamente, uma reorganização
social e política da sociedade brasileira e promoveram
uma atuação diversificada da Psicologia em relação à
Educação através de novas reflexões teóricometodológicas.
A partir deste histórico, intensificam-se as reflexões
com vistas a uma maior criticidade quanto à formação e
atuação do psicólogo escolar, de forma coerente e
condizente com a demanda que se apresenta, visando
contribuições efetivas para o estreitamento do vínculo
entre ambas as áreas.
A Psicologia Escolar constitui, atualmente, uma área
de conhecimento e prática em construção. Historicamente, verifica-se um posicionamento da Psicologia com
a escola na busca de soluções das demandas existentes.
Veio a lotar-se na escola, ocupando os então existentes
espaços de ação clínica na tentativa de sobrepor a
Psicologia à Educação, e a trabalhar para a instituição
escolar, prioritariamente para o aluno, na busca de
intervenções eficazes. Assumir-se, contudo, como
profissional da escola, como recurso humano pertencente ao quadro, real e subjetivo, da instituição educativa,
representa um passo significativo na construção da identidade, formação e atuação do psicólogo escolar.
A história dessas preposições e conjunções apontanos um movimento progressivo similar ao processo de
construção da identidade escolar: da exclusão à
integração, da integração à inclusão. Sentir-se parte da
totalidade escolar simboliza, atualmente, a base que
sustenta a ponte (em construção) entre a Psicologia e a
Educação, áreas de conhecimento interdependentes e
complementares, que visam ao desenvolvimento e ao
sucesso do aluno, do professor e da escola.
Segundo Lima (1990), “não cabe à Psicologia
normatizar a ação pedagógica” (p.17), mas compreender
as condições e motivos que constituem a conduta do
indivíduo na instituição escolar em sua especificidade.
Quando encarada como ciência em movimento, com
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paradigmas caminhando para a complexidade, a Psicologia assume um compromisso teórico e prático com a
Educação na busca da compreensão do e atuação no
processo de constituição do indivíduo, em particular de
sua vivência na instituição educativa. A autora afirma
que “não será através da aplicação de uma determinada teoria ou um determinado conhecimento sociológico,
antropológico, genético, psicológico ou médico, parcialmente considerado, que a questão educacional poderá
ser encaminhada” (p.3), alertando quanto à
interdisciplinaridade e complementaridade necessárias
para a compreensão do processo de desenvolvimento e
educação.
Araújo (2003) afirma que:
a relação entre a Psicologia e a Educação deve
refletir, nas produções e atuações contemporâneas,
uma interdependência entre processos psicológicos
e processos educacionais referendada em um
conjunto teórico que privilegia essa concepção
histórica da constituição humana.” (p.10)
Essa autora defende que a identidade do Psicólogo
Escolar se constitui a partir da sua imersão na escola,
enquanto locus privilegiado para a ocorrência do processo de canalização cultural, enquanto espaço
institucional de efetivação da condição humana dos
sujeitos participantes e, ainda, enquanto campo de
incoerências que desafiam e formam o psicólogo escolar.
Mostra-se possível e necessário, portanto, articularse interesses sociais refletores da justiça, da democracia e da solidariedade em um espaço que tende a
explicitar contradições e antagonismos, por meio de um
enfrentamento fundamentado na criticidade, coragem e
cidadania.
Analisando-se as relações entre o currículo e a
ideologia, a cultura e o poder, através da face oculta
e subliminar dos discursos, pode-se verificar que estes
aspectos permeiam o cotidiano escolar sem a
criticidade necessária por parte dos vários segmentos
envolvidos.
São muitas as contradições que constituem o fundo
sobre o qual as ações figurativas se manifestam. E é
exatamente este fundo subjetivo que deverá surgir nos
espaços de interlocução escolar visando a uma consciência do processo no qual seus membros estão inseridos,
bem como à construção de competências para uma
atuação coerente.
Legitimar mediações que não só explicitem a desigualdade e a divergência presentes na escola, mas,
também, vislumbrem sua transformação, é sustentar
ações no interior do sistema educacional, revisitando
práticas, criticando limites coercitivos, orquestrando
vozes nos espaços de interlocução, denunciando a
opressão e a desigualdade nas oportunidades.
(Araújo, 2003, p.28)
Para tanto, Araújo e Almeida (2003) afirmam que a
formação acadêmica, tanto inicial quanto continuada,
deve direcionar-se a capacitar o psicólogo para as
especificidades que a atuação na área escolar exige,
sugerindo que a ação formativa contemple:
o a conscientização das possibilidades e competências em desenvolvimento, em função das habilidades prospectivas;
o a construção de capacidades de iniciativa e autonomia frente a situações de conflito ou decisões;
o o desenvolvimento das capacidades de análise,
aplicação, re-elaboração e síntese do conhecimento psicológico relativo ao contexto de intervenção profissional;
o a clareza da relação entre as concepções teóricas sobre o conhecimento psicológico e o trabalho a ser adotado;
o a postura crítica, lúcida e reflexiva acerca do
homem, do mundo e da sociedade, no contexto
social em que está inserido;
o o planejamento de estratégias interdisciplinares
de comunicação e ação que integrem e legitimem
a intervenção; e
o o comprometimento com o exercício de uma
função político-social transformadora de sua
profissão, exercendo-a eticamente no campo
educacional.
A ética profissional na atuação da Psicologia Escolar
pressupõe a revisão de crenças, conceitos e concepções
sobre a especificidade da ciência psicológica que,
efetivamente, proporcione o desenvolvimento de novas
atitudes e comportamentos. A capacitação continuada
dos psicólogos busca articular a expressão e a manifestação das competências necessárias com orientações e
propostas de intervenção prioritariamente preventivas
(Araújo & Almeida, 2003).
Segundo Araújo (2003), “o psicólogo escolar, ao aprofundar competências para sua atuação, estaria se
Cultura da paz e psicologia escolar no contexto da instituição educativa
preparando para uma dupla responsabilidade: a autocapacitação e a capacitação dos professores e equipe
escolar” (p.109).
Com base nas considerações expostas, Araújo e
Almeida (2003) apontam a necessidade de uma vinculação política e ética a favor da consolidação da especificidade da Psicologia Escolar no cenário sócio-políticonacional, a fim de se construir uma identidade e favorecer
uma participação ativa (e interativa) de sujeitos conscientes de seus papéis e funções.
A Cultura de Paz e a Psicologia Escolar
Estabelecendo uma interface com a Cultura de Paz,
a Psicologia Escolar prima por uma coerência de ações
que promovam a sua construção no contexto escolar
através da articulação das vozes escolares e da criação
de um espaço de escuta para re-significação de suas
concepções e práticas.
Segundo Milani (2003), o primeiro passo de qualquer
educador ou unidade escolar que deseje atuar de forma
eficaz e consistente na promoção da Cultura de Paz, é
identificar as premissas que fundamentam o seu modelo
mental a respeito dessa temática. Visto que, na maioria
das vezes, o indivíduo não está consciente das premissas
sobre as quais seu próprio raciocínio e comportamento
são construídos, faz-se imprescindível questionar os
pressupostos que, explícita ou implicitamente, servem de
fundamento a algumas das posturas e propostas de ação.
Reconhecendo a importância de se construir uma
Cultura de Paz, Milani (2003) afirma que “para que
relações de paz, respeito e cooperação prevaleçam numa
escola ou comunidade não bastam boas intenções e belos discursos” (p.31), mas transformações indispensáveis
para que a paz seja o princípio governante de todas as
relações humanas e sociais. O autor alerta quanto ao
discurso da paz que permeia o senso comum, que tende
a assumir o caráter abstrato de um ideal que todos desejam mas que raros se dispõem a construir:
Quando isso acontece, a proposta corre o risco de
tornar-se uma mera expressão de boas intenções,
ingênua em sua consistência e reduzida, em sua
abrangência, à ação do indivíduo nas suas relações
interpessoais. (p.39)
Com vistas à construção da Cultura de Paz no
contexto educativo, Milani (2003) destaca a necessidade
de se analisar os discursos escolares e a forma como
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seus atores compreendem e enfrentam o fenômeno da
violência. O autor apresenta três abordagens que,
implícita ou explicitamente, estão presentes nos discursos dos diversos atores sociais – a da repressão, a
estrutural e a da cultura de paz - abordagens estas
que servem de base às explicações que professores e
diretores dão ao fenômeno da violência intra-escolar e,
consequentemente, às estratégias adotadas pelas
instituições de ensino. A repressão, adotada como
solução para o problema da violência, constitui medidas
de força, como o policiamento, o endurecimento das
regras, a expulsão de alunos com comportamentos
indesejáveis, dentre outras ações que tendem a desconsiderar as especificidades de cada aluno, da escola ou da
situação, oferecendo uma aparente resolução de
problemas.
A segunda abordagem enfoca a estrutura socioeconômica como causa da violência, assumindo-se uma
posição acomodativa, impotente e determinista frente a
uma realidade ‘inevitável’. O autor destaca que alguns
professores e atores escolares se apegam a tais crenças
de modo a não reconhecer as diversas possibilidades à
sua disposição e as inúmeras experiências exitosas de
escolas que, a despeito das dificuldades e limitações,
cumprem sua missão, formando crianças e adolescentes cidadãos.
O terceiro paradigma constitui a cultura de paz, que
“propõe mudanças inspiradas em valores como justiça,
diversidade, respeito e solidariedade, por parte de
indivíduos, grupos, instituições e governos” (Milani, 2003,
p.38). Esse modelo enfatiza a viabilidade de se reduzir
os níveis de violência através de intervenções fundamentadas na educação, saúde, participação cidadã e melhoria
da qualidade de vida.
Desta forma, enquanto o primeiro enfoque tende a
interpretar a violência como uma expressão exclusiva
de pessoas incapacitadas para o convívio social; e o
segundo tende a considerar o indivíduo violento como
vítima da sociedade; o terceiro, correspondente ao
modelo da Cultura de Paz, analisa a violência como “um
fenômeno multidimensional e multicausal, que se manifesta por expressões individuais, grupais e/ou institucionais, e cujo enfrentamento exigirá mudanças – culturais,
sociais, econômicas, morais – de parte de todos” (Milani,
2003, p.39).
Um dos aspectos da atuação da Psicologia Escolar
refere-se à criação de espaços para a conscientização
de professores e atores escolares sobre os seus papéis,
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
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Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi, Claisy Maria Marinho de Araújo e Marisa Maria Brito da Justa Neves
funções e responsabilidades, promovendo uma ação
reflexiva e intencionalmente direcionada à construção
de relações e estratégias coerentes com a demanda e
os objetivos educacionais. As concepções de sucesso e
fracasso, paz e violência permeiam os discursos e as
práticas cotidianas, cujas vozes necessitam ser validadas, ‘devolvidas’ e ‘ecoadas’ de forma a promover a
conscientização das ações e do caráter sintomático dos
comportamentos no contexto escolar. Neste sentido, as
relações interpessoais constituem uma unidade de
análise da prática pedagógica, criando com e entre os
professores um espaço de interlocução que promova a
conscientização das complexas redes interativas que
permeiam o contexto escolar (Araújo, 1995).
Segundo Kupfer (1997), a Psicologia busca atender
à demanda escolar de forma a recolocar as palavras
em circulação, a “oxigenar” os organismos da educação, a escutar a linguagem como forma do indivíduo
ouvir a e estruturar-se com sua própria fala. Segundo a
autora, a falta de circulação do discurso é o início e o
fim da instituição, ao passo que sua circulação possibilita uma participação ativa e responsável do profissional
pela sua ação e pelo seu discurso.
Conforme afirma Meira (2000), o sujeito consciente
assume um papel ativo no processo histórico, visto que
“as tendências objetivas que se apresentam no curso da
história por si mesmas não provocam transformações,
motivo pelo qual necessitam da ação humana para se
concretizarem (...)” (p.51).
A observação, o estudo, a análise e o conhecimento
da realidade da escola, realizados pelo psicólogo escolar
através de um mapeamento institucional, favorecem
o levantamento das necessidades e expectativas de seus
diferentes atores, possibilitando a identificação das demandas e uma intervenção eficaz, promotora de reais
transformações no contexto escolar. Conforme apresentado por Araújo (2003) e Araújo e Almeida (2003), o
mapeamento e a reflexão sobre os aspectos institucionais
evidenciam as convergências e incoerências em
aspectos como: influências ideológicas e filosóficas presentes na proposta pedagógica; concepções de desenvolvimento e aprendizagem, educação e ensino,
subjacentes aos planejamentos, projetos e práticas educacionais; concepção de currículo e sua expressão através das rotinas, atividades e projetos; experiências de
gestão coletiva e participativa através das relações
estabelecidas entre os grupos da escola; e análise documental comparativa das normas, valores, procedimen-
tos e formas de avaliação previstos em estatutos e
regimentos internos. A identificação das incoerências e
a busca das compatibilidades ampliam,
consideravalmente, a consciência do contexto e do poder de ação dos diferentes atores escolares.
Machado (2000) afirma que o próprio aluno pode
aparecer, sintomaticamente, como o mobilizador de um
conflito de ambigüidades escolares já existentes previamente, tornando-se o sinalizador de que algo incoerente
se apresenta em um sistema maior e que necessita de
reparos. Weiss (1992) ressalta que “quanto mais a escola
fizer a sua auto-avaliação, quanto menos mantiver
estereótipos e ambigüidades, mais ela livrará o aluno de
ser o responsável pelo fracasso em sua aprendizagem”
(p.104). O aluno, nesta concepção, deixa de ser ‘o
problema’ para ser o ‘indicador de um problema
existente’ e, a partir deste enfoque, muda-se o objeto e
a forma de intervenção. É sob esta perspectiva que
Neves e Almeida (2003) ressaltam a necessidade de se
integrar modalidades de atuação, essencialmente
preventivas, que visam à promoção da saúde e do
sucesso escolar.
A ação eficaz da Psicologia Escolar, através da
desmistificação de ações psicologizantes (Meira, 2000)
e da diluição de discursos e práticas cristalizados
institucionalmente deve, segundo Almeida e cols. (1995),
abranger aspectos formativos que subsidiem sua prática,
envolvendo a análise das relações entre desenvolvimento
e aprendizagem; a relação professor-aluno; o papel da
afetividade na transmissão e aquisição do conhecimento;
as representações sociais do sucesso/insucesso escolar;
a relação família-escola-comunidade; as práticas pedagógicas do professor; as teorias e metodologias
educacionais; os procedimentos teórico-metodológicos
de atendimento psicopedagógico; a análise crítica e
reflexiva sobre teorias e práticas psicológicas; a
sensibilidade para atitude interdisciplinar; e as habilidades
criativas e de comunicação.
A abordagem da Cultura de Paz, por sua vez, ressalta
algumas estratégias que tendem a viabilizar a sua prática
na instituição escolar, conforme apresentadas por Milani
(2003):
uma relação educador-educando fundamentada no
afeto, respeito e diálogo; um ensino que incorpore a
dimensão dos valores éticos e humanos; processos
decisórios democráticos, com a efetiva participação
dos alunos e de seus pais nos destinos da comunidade
Cultura da paz e psicologia escolar no contexto da instituição educativa
escolar; implementação de programas de capacitação continuada de professores; aproveitamento
das oportunidades educativas para o aprendizado
do respeito às diferenças e a resolução pacífica de
conflitos; abandono do modelo vigente de
competição e individualismo por outro, fundamentado na cooperação e trabalho conjunto... (p.39).
Destacando a Cultura de Paz como cultura
promotora da diversidade pacífica Boulding (apud
Milani, 2003), complementa e questiona:
“As melhores vacinas para a violência dentro da
escola são uma boa relação educador-educando, baseada
em afeto, diálogo e respeito mútuo, normas de convívio
resultantes de discussão e consenso entre todos
integrantes da comunidade escolar, justiça e
imparcialidade por parte da direção no trato com alunos
e professores, participação máxima dos pais,
envolvimento com a comunidade, e um ambiente de
valorização, alegria e flexibilidade. Isso demora mais e
dá mais trabalho de que as medidas repressivas, mas só
assim a escola cumprirá a sua missão. Se desistirmos
dela, o que nos restará?” (p.51)
Milani (2003) apresenta, ainda, alguns programas que
se tendem a promover a Cultura de Paz, como o fortalecimento da identidade pessoal e cultural; a promoção
do auto-conhecimento e auto-estima; o desenvolvimento
da comunicação interpessoal; a educação para o
exercício da cidadania; a vivência e reflexão a respeito
de valores éticos universais; o reconhecimento da
alteridade e respeito à diversidade; a sensibilização em
questões de gênero; a sensibilização em questões étnicas;
o aprendizado da prevenção e resolução pacífica de
conflitos; a promoção do protagonismo juvenil; a
mobilização e participação comunitária em prol do bemestar coletivo e com métodos não-violentos; e a educação
ambiental.
O trabalho em prol da promoção de uma Cultura de
Paz implica, desta forma, um processo de transformação individual e social, exigindo ações em níveis micro e
macro (Milani, 2003). O nível micro refere-se às transformações intra e inter-relacionais, envolvendo valores,
atitudes, estilos de vida e ações pacíficas cotidianamente
evidenciadas em diferentes contextos. A atuação em
nível macro implica repensar os processos sociais, definir estratégias de mudança coletiva e criar políticas
públicas, estruturas institucionais e programas educativos
condizentes com os valores da paz, nível que exige a
143
qualificação e a capacidade de articular e integrar
esforços dos mais diversos atores sociais.
Assim sendo, aponta-se, como importante
estratégia na elaboração de medidas conscientes e
eficazes no processo de construção de uma Cultura
de Paz, a capacitação por competências, concebendose competência como a capacidade de agir de forma
reflexiva e eficaz em um determinado tipo de situação,
apoiada em um conjunto articulado e dinâmico de
conhecimentos, saberes, habilidades, esquemas
mentais, atitudes e posturas (Perrenoud, 1999b). Visto
que, no contexto escolar, a atuação do psicólogo
escolar envolve intervenções voltadas ao desenvolvimento de competências individuais e coletivas, a
capacitação para a prática dos diferentes atores de
forma reflexiva, intencional e planejada, articulada aos
conhecimentos, habilidades e saberes, tende a
promover a construção da competência nas inúmeras
zonas indeterminadas da prática (Plantamura, 2002)
que clamam por ações pontuais, promotoras de
soluções pacíficas.
No que tange à construção da Cultura de Paz, as
habilidades interpessoais, pessoais e éticas destacamse frente às necessárias articulações demandadas nos
contextos sociais. As habilidades interpessoais, conforme
apresentadas por Araújo (2003), envolvem
características de relacionamento social desdobradas em
ações coletivas e na construção de espaços férteis de
interlocução através da disponibilidade de colaboração
e socialização de saberes e respeito aos diferentes pontos
de vista. As habilidades pessoais representam recursos
individuais, envolvendo a disponibilidade para rever a
sua própria atuação, o empenho continuado para
aperfeiçoamento e o desenvolvimento de estilos e atitudes que permitam vencer desafios de forma planejada e
intencional. As habilidades éticas, por sua vez, abrangem
a capacidade de identificar as várias verdades existentes
da intersubjetividade das relações, o desenvolvimento
da sensibilidade para considerar a singularidade das
situações e a disponibilidade para o questionamento e a
interrogação reflexivos, críticos e constantes sobre suas
próprias decisões, ações e atitudes, “exercitando a ética
da tolerância e da solidariedade” (Araújo, 2003, p. 104).
Tais habilidades constituem importantes ferramentas
a serem ampliadas e desenvolvidas continuamente,
favorecendo a construção de relações intra e interpessoais significativamente pacíficas e capazes de
articulações promotoras de transformações culturais.
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 135-145
144
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi, Claisy Maria Marinho de Araújo e Marisa Maria Brito da Justa Neves
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se, desta forma, a coerência entre
instrumentos, programas e ações oferecidos pela
Psicologia e pela Cultura da Paz no contexto educativo,
favorecendo a construção de estratégias que visem ao
sucesso escolar em sua totalidade. Aponta-se uma
convergência de enfoques, de âmbito preventivo e
interventivo, em direção ao desenvolvimento de seus
diferentes atores, aos seus processos intra e
intersubjetivos, e à instituição educativa enquanto órgão
de promoção social e de construção da cidadania.
Sua ação transcende espaços institucionais e
intervenções pontuais, constituindo estratégias que
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objetivam, primordialmente, a coerência entre
posicionamentos ideológicos e práticas verdadeiramente
educativas.
A Psicologia Escolar apresenta-se, desta forma,
como uma área de atuação promotora da Cultura de
Paz no contexto educativo, por meio de construções,
em níveis micro e macro, de ações direcionadas ao
respeito pleno à vida, aos Direitos Humanos, à dignidade
e ao desenvolvimento.
Paz esta que, co-construída pelos demais atores
sociais, caracteriza um importante passo “entre as
pessoas, os grupos e as nações” (Declaração sobre uma
Cultura de Paz, ONU, 1999, nº53/243) rumo à “paz e
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Recebido em: 02/04/2005
Aprovado em: 05/06/2005
Endereço para correspondência:
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi: Universidade de Brasília – Instituto de Psicologia – Campus Universitário Darcy Ribeiro,
ICC Sul – Cep: 70910-900 – Brasília/DF
e-mail: [email protected]
Claisy Maria Marinho De Araújo: Universidade de Brasília – Instituto de Psicologia – Campus Universitário Darcy Ribeiro,
ICC Sul – Cep: 70910-900 – Brasília/DF
e-mail: [email protected]
Marisa Maria Brito Da Justa Neves: Universidade de Brasília - Instituto de Psicologia – Campus Universitário Darcy Ribeiro,
ICC Sul – Cep: 70910-900 - Brasília/DF
e-mail: [email protected]
Miriam Lúcia Herrera Masotti Dusi: (61) 3202-6200 / 8124-4080 – SQN 311 – Bloco A – apto. 307 – Cep: 70757-010 – Brasília/DF
e-mail: [email protected]
Psicologia Escolar e Educacional, 2005
Volume 9 Número 1 135-145
Resenhas
PRÁTICAS EM PSICOLOGIA ESCOLAR
Antunes, M. A. M. & Meira, M. E. M. (org.) 2003. Psicologia Escolar: Práticas Críticas. São Paulo:
Casa de Psicólogo, 128 p.
A Psicologia Escolar é considerada não somente uma
área de estudo da Psicologia, mas também de atuação e
formação do psicólogo, tendo o contexto educacional
como foco de sua atenção. A revisão crítica dos
conhecimentos da área tem possibilitado a superação
de indefinições teórico-práticas que se colocam nas
relações entre a Psicologia e Educação.
O livro escrito por Maria Eugênia M. Meira, Mitsuko
Aparecida M. Antunes e colaboradores, apresenta o
resultado de um trabalho de reflexão teórico-prática
desenvolvido ao longo de trajetórias marcadas pelo
compromisso de colocar a Psicologia a serviço da transformação social. Os textos mostram possibilidades de
intervenção que se constituem em expressões concretas
do pensamento crítico já construído em Psicologia escolar
e educação, indicando direções para que os psicólogos
escolares possam ajudar à escola a cumprir sua função
social. O livro é composto por quatro textos, escrito por
autores ligados à área da Psicologia e Educação, que
elucidam claramente o conteúdo tratado.
No primeiro texto, A Atuação do Psicólogo como
Expressão do Pensamento Crítico em psicologia e
Educação, as autoras Elenita de Rício Tanamachi e
Marisa Eugênia Melillo Meira apontam possibilidades
de intervenção que se constituem em expressões do
pensamento crítico construído em Psicologia e Educação.
O psicólogo escolar é situado como mediador no processo
de elaboração das condições necessárias para a
superação da queixa escolar que se trata de uma
demanda freqüente. Este item é abordado no sentido de
descrição e análise da relação entre processo de
produção da queixa escolar e os de subjetivação e
objetivação dos indivíduos nele envolvidos, como
mediação necessária à superação das histórias de
fracasso escolar, exemplificando um caso. E por último
as autoras destacam a atuação do psicólogo em
instituições de ensino, como o encontro entre os sujeitos
e a educação. A finalidade central do seu trabalho é a
de contribuir para a construção de um processo
educacional, sendo capaz de socializar o conhecimento
histórico acumulado e de contribuir para a formação ética
e política dos sujeitos.
O segundo texto, Os psicólogos trabalhando com a
escola: intervenção a serviço do que?, Adriana
Marcondes Machado, apresenta um exemplo do percurso
traçado pelo serviço de Psicologia Escolar do Instituto de
Psicologia da Universidade de São Paulo, por meio de trabalhos realizados em escolas publicas da cidade de São
Paulo visando problematizar a função estabelecida na
relação entre psicólogos e escolas. A autora apresenta
algumas intervenções realizadas junto a crianças portadoras
de queixas escolares, a alunos de classe especial e um
trabalho com estudantes encaminhados para avaliação
psicológica. Dessa forma, a autora e os profissionais da
instituição tinham como objetivo problematizar as
concepções, as práticas e as políticas presentes nos casos,
nas histórias e nos discursos analisados, referindo-se ao
funcionamento da instituição como um todo.
Intervenção junto a professores da rede pública:
potencializando a produção de novos sentidos, o terceiro texto, apresenta algumas reflexões sobre a
formação de professores segundo a concepção das autoras Verusk Galdini e Wanda Maria Juqueira Aguiar.
Basearam-se na experiência que tiveram em estágios
que orientaram na área de psicologia educacional. São
apresentados pressupostos teóricos e metodológicos que
fundamentam o trabalho fazer-agir em educação junto
a professores. A tarefa de formar e capacitar professores
requer a clareza de que qualquer pratica que vise à
atuação sobre a realidade escolar implica numa profunda
reflexão sobre as concepções de homem, escola,
educação. Isto posto uma vez que a escola, local onde
as atividades docentes acontecem, é um espaço
institucional e de mediação social.
148
No quarto texto, A Psicologia Escolar na implantação
do projeto Político-Pedagógico da Rede Municipal de
Ensino de Guarulhos: construindo um trabalho
coletivo, Mitsuko Aparecida Makino Antunes e
colaboradores, relatam o trabalho em psicologia escolar
que vem sendo realizado na rede municipal de ensino do
interior paulista. O projeto Político-pedagógico fundamentase no princípio de que todos têm direito à escolarização e
que esta deve garantir efetivo acesso aos bens culturais
produzidos historicamente pela humanidade. Este, segundo
as autoras, só pode ser efetivado se alicerçado num processo
sistemático e contínuo de formação dos educadores nele
envolvidos. Alguns relatos de ações desenvolvidas pelos
profissionais que compõem os núcleos de educação infantil,
educação fundamental, educação de jovens e adultos e
educação inclusiva, são apresentados e revelam que esses
núcleos funcionam num intercâmbio constante.
Resenhas
A leitura é indicada a estudantes e profissionais das
áreas de Psicologia e Educação devido ao seu atual e
articulado embasamento teórico e prático. Além de um
posicionamento crítico claro e enriquecido com muitas
experiências práticas. Pode-se notar a clareza com que
os autores participantes descrevem os assuntos,
colaborando para torná-los de grande valia, dando uma
boa visão do construto e de suas implicações em diversos contextos. Desse modo, o livro pode ser
recomendado, sendo uma fonte de referência importante
para reflexões e como parâmetro para o desenvolvimento
de projetos voltados à Psicologia Escolar.
Nayá Bellintani Caparrotti
Mestranda em Avaliação Psicológica no
Programa de pós-graduação stricto sensu em
Psicologia da Universidade São Francisco
PROCESSOS PSICOLÓGICOS E SOCIAIS NA APRENDIZAGEM
Boruchovitch, E.; & Bzuneck, J.A. (orgs.) (2004). Aprendizagem: Processos Psicológicos e o
Contexto Social na Escola., Petrópolis: Editora Vozes.
A aprendizagem envolve uma integração de fatores
contextuais e internos do aluno que podem tanto
favorecer como afetar de maneira negativa o processo
de aprender. Assim, o presente livro apresenta uma
coletânea de temas da Psicologia Educacional com o
objetivo de analisar e discutir os processos psicológicos
e sociais na aprendizagem, dentro de uma perspectiva
cognitiva e sociocognitiva. Fornece dados de pesquisas,
bem como uma vasta revisão de literatura a respeito do
assunto, tratando-se, portanto, de uma referência bastante
contemporânea e valiosa para aqueles que estão
envolvidos na educação. No livro, os aspectos internos
do indivíduo são privilegiados e o estudante deixa de ser
visto como passivo e receptor de informações e passa a
ter uma participação mais ativa no próprio processo de
aprendizagem.
De uma forma geral, o livro traz a tona a discussão
de que a escola não é apenas um ambiente para a
aprendizagem formal, mas também uma rica fonte de
experiências emocionais e sociais para os alunos. A partir
dessa idéia, o conjunto de capítulos aborda tanto os
aspectos intra-individuais na aprendizagem como
variáveis sociais do contexto escolar.
O livro reúne nove capítulos que estão organizados
em duas partes, sendo que os cincos primeiros capítulos
discutem importantes aspectos relacionados aos
processos intra-individuais na aprendizagem, enquanto
a segunda se concentra na análise de fatores
relacionados ao contexto social que exercem forte
influência no processo de aprendizagem. Embora os
contextos social e individual estejam divididos no livro,
vale ressaltar que se tratam de aspectos estreitamente
relacionados e essa inter-relação é cuidadosamente
contemplada na obra.
No primeiro capítulo, a teoria do processamento da
informação é discutida considerando a literatura na área.
O desenvolvimento histórico, bem como todo o processo
pelo qual a informação se processa são detalhadamente
descritos por José Aloyseo Bzuneck.
Evely Boruchovitch descreve, no capítulo 2, o conceito
de auto-regulação de acordo com as diferentes
abordagens teóricas, com atenção especial à teoria do
processamento da informação. Além disso, a autora discute a auto-regulação nas faixas etárias, particularmente
entre as crianças da pré-escola e do ensino fundamental,
enfatizando a importância da aprendizagem auto-regulada
desde o início da escolarização. A autora aponta algumas
sugestões para a promoção da aprendizagem autoregulada que podem ser empregadas pelos educadores.
No capítulo 3, Maria Aparecida Gomes e Evely
Boruchovitch exploram as possibilidades do uso de jogos
segundo o referencial teórico da psicologia cognitiva,
baseada no processamento da informação. Primeiramente, as autoras discutem o emprego de jogos como
um recurso de diagnóstico, bem como de intervenção
psicopedagógica. Em seguida as autoras focalizam a
utilização do jogo para uma aprendizagem mais
consciente e auto-regulada.
A importância da compreensão de leitura em
universitários é analisada no capítulo 4 pelas autoras
Acácia Aparecida Angeli dos Santos e Katya Luciane
de Oliveira. Formas de avaliação da compreensão de
leitura e suas conseqüências na aprendizagem dos
estudantes de ensino superior são discutidas pelas autoras. Analisam o importante papel das universidades no
desenvolvimento de bons leitores.
As dificuldades de aprendizagem são apontadas pela
literatura como condições adversas que podem prejudicar
o desenvolvimento infantil. Sob a perspectiva de uma
abordagem desenvolvimentista Sonia Regina Loureiro
e Paula Cristina Medeiros discutem, no capítulo 5 que a
dificuldade de aprendizagem, quando presente no período
inicial da escolarização pode favorecer a vulnerabilidade
ao desenvolvimento infantil, sendo necessário a
150
elaboração de programas de suporte visando o
enfrentamento de tais situações consideradas críticas
para o desenvolvimento. Dessa forma, conceitos como
vulnerabilidade, resiliência e fatores de proteção são
analisados neste capítulo. Em um segundo momento
deste capítulo, aspectos relacionados as dificuldades de
aprendizagem como as crenças de auto-eficácia são
avaliados. A partir disso, as autoras relatam também os
benefícios de uma intervenção psicopedagógica
realizada em pequenos grupos e de curta duração com
crianças brasileiras que apresentam dificuldades de
aprendizagem.
Assim como os processos internos ao indivíduo são
extremamente relevantes para uma aprendizagem de
qualidade, as interações sociais têm sido apontada pela
literatura como um fator essencial para o aprender. A
segunda parte do livro é composta pelos quatro capítulos
finais, sendo que nos capítulos 6 e 7 são focalizadas as
interações sociais enquanto processo facilitador do
desenvolvimento humano, e mais especificamente, da
aprendizagem. Sueli Edi Rufini Guimarães, no capítulo
6, inicia o texto com aspectos teóricos relativos à
necessidade de pertencer e de estabelecer vínculos para
o desenvolvimento humano. Alguns resultados de
pesquisas sobre o tema são relatados e discute algumas
alternativas para propiciar um ambiente escolar seguro
e facilitador de interações sociais positivas.
O importante papel desempenhado pela escola no
desenvolvimento social dos estudantes é apresentado
Resenhas
por Carolina Lisboa e Silvia Helena Koller no capítulo
7. As autoras discutem que o papel da escola transcende a aprendizagem de conteúdos, devendo a escola ser
também um contexto que favoreça o desenvolvimento
emocional e social de seus alunos. Temas como amizade,
vitimização e rejeição são abordados neste capítulo.
No capítulo 8, Fermino Fernandes Sisto aborda,
dentro de uma vertente construtivista piagetiana, as
relações entre relacionamento social, aprendizagem e
desenvolvimento social. O autor apresenta resultados
de um conjunto de pesquisas, principalmente relacionados
ao papel da intervenção psicoeducacional.
O livro é finalizado com o capítulo 9 de José Aloyseo
Bzuneck e Sueli Edi Rufini Guimarães, no qual são
apontadas a competitividade no contexto escolar e as
crenças que os professores possuem em relação a
competição. Muitas vezes, a competição é vista como
uma estratégia motivadora, no entanto as conseqüências
negativas dessa prática são apresentadas neste capítulo.
Percebe-se, durante toda a obra, a expectativa de se
otimizar a aprendizagem humana, valorizando o
desenvolvimento psicológico e social do aluno, sendo este
um dos importantes papeis da escola. Dessa forma,
acredita-se que o presente livro possa contribuir para
aqueles que se preocupam com a aprendizagem do aluno
e mais especificamente, valorizam o indivíduo enquanto
uma pessoa única, sendo, portanto recomendado para
professores, educadores e pesquisadores da área da
educação e psicologia.
Miriam Cruvinel
Doutoranda em Educação pela Unicamp
DESENVOLVIMENTO DAS HABILIDADES DO PENSAMENTO ACADÊMICO
Zwiers,J. (2004). Developing Academic Thinking Skills in grades 6 – 12: a handbook of multiple
intelligence activities. Newark: IRA, xii + 260 p.
Jeff Zwiers é consultora e professora que trabalha
com linguagem e leitura estando envolvida com formação
de professores especialmente em termos de
desenvolvimento da linguagem acadêmica e de conteúdos
específicos.
O livro aqui resenhado tem um suporte teórico
conceitual mas é predominantemente prático.
Constituído por prefácio três partes, apêndices e índices
é uma ferramenta de grande utilidade para professores
não só de leitura mas de todas as matérias que integram
o currículo. A validade de tecnologias e procedimentos
que apresenta esta livre de cegueira teórica o que indica
uma posição moderna, atitude eclética e um grande
potencial de generalização. São formas de assegurar
o desenvolvimento de habilidades cognitivas
importantes na formação não apenas do leitor, embora
a ênfase no livro seja as suas relações com a vida
acadêmica. A preocupação de Zwiers é com as
habilidades a serem ensinadas e como ensiná-las, o
que faz com clareza e competência. Cabe aos
professores a tarefa de propiciar o desenvolvimento
destas habilidades nos seus alunos.
A primeira parte do livro é constituída por dois
capítulos de cunho teórico sendo que no primeiro deles é feita uma apresentação comparativa entre
linguagem e pensamento acadêmicos. Há consenso na
maioria dos pesquisadores de que existem muitas
habilidades de pensamento e que elas devem ser
desenvolvidas na escola. Para tanto, há necessidade
de instrumentar os docentes não só com informações
sobre estas habilidades e como elas se relacionam entre
si mas como fazer para que se desenvolvam. Vale
lembrar que pensamento, linguagem e aprendizagem
de conteúdo são simbólicos, devendo haver uma
adequação da vida acadêmica. As habilidades de pensar
não são igualmente requeridas nas várias áreas de
conteúdo sendo necessário recorrer a formas distintas
para que se desenvolvam adequadamente em Ciências,
História, Estudos Sociais e nas várias linguagens. As
principais habilidades do pensamento acadêmico são:
analisar, comparar, identificar causa e efeito,
categorizar e classificar, solucionar problemas,
persuadir, empatizar, sintetizar, interpretar, avaliar,
comunicar, e aplicar. Seqüências e atividades diversas
específicas de cada área de conhecimento são
consideradas em cada caso.
No segundo capitulo são enfocados os hábitos que
um professor precisa ter para que possa propiciar ao
aluno o desenvolvimento requerido. As pesquisas
mostram que os hábitos docentes mais poderosos e
necessários para o desenvolvimento das habilidades de
pensar academicamente são: (1) ir da avaliação para a
instrumentação; (2) oferecer possibilidade de escolhas
para aprender; (3) relacionar o novo com o já existente;
(4) modelar o pensamento; (5) gradualmente passar a
responsabilidade para o aluno (modelagem); (6) dar miniaulas sobre pensamento acadêmico e linguagem; (7) usar
linguagem acadêmica apropriada para eliciar e cultivar
o pensamento acadêmico; (8) estabelecer transição entre
as lições e atividades; (9) cuidar tanto dos aspectos
verbais como dos não verbais do ensino e (10) manter
uma coleção crescente de exemplos das melhores
práticas acadêmicas.
A parte seguinte do livro enfoca 12 habilidades do
pensamento acadêmico, sendo a maior e a mais central
da obra. O capitulo 3 traz informações básicas sobre o
analisar e como desenvolver esta habilidade no
pensamento acadêmico, como por exemplo a análise de
modelos de escrita, o uso de organizadores e mapeamento semânticos, cartas biológicas e outras técnicas
de ensino de eficiência já comprovada.
O capítulo 4 enfoca as habilidades de fazer comparações e, após breve conceituação, várias tecnologias são
disponibilizadas para que o professor possa ter êxito.
152
Pode-se exemplificar com a grade de comparação, uso
de simulações de sinestezias, uso de músicas e textos.
Categorizar e classificar implica em uma habilidade
básica na vida sendo necessário desenvolvê-la de forma
útil às diversas áreas de conteúdo, nas várias tarefas
acadêmicas. Sugere o uso de colunas de classificação,
classes de sentenças e orações, estocagem da idéia
principal, classificação de músicas etc.
No capitulo seguinte são feitas propostas que condições
para que os alunos aprendam e desenvolvam a habilidade
de pensar sobre causa e efeito. Entre elas aparecem:
criação de diagramas, uso de organizadores visuais,
levantamento de hipóteses, uso da linha do tempo etc.
A habilidades de solução de problemas é o foco
do sétimo capítulo no qual são sugeridas atividades
como uso dos lados direito-esquerdo do cérebro,
planejamento de vídeo games, solução de
classificações, solução por emparelhamento, solução
pelo método científico, entre outros.
Como bem lembra Zwiers (p: 105) a vida é cheia de
persuasão “sendo necessário desenvolver esta habilidade
nos alunos”. Para tanto, recomenda estratégias como:
balão cheio de ar quente, reestruturação, reconstrução,
busca das razões etc. (capitulo 8).
No capitulo 9 é enfocada a habilidades de empatia,
útil não só para as habilidades sociais uma vez que
perpassa toda a capacidade de pensar e se sair bem na
escola. Ela tem sido uma habilidade muito valorizada na
aprendizagem de conceitos, na compreensão de outras
pessoas e de como pensam e sentem. Pode ser
desenvolvida recomendando estratégias como
desempenho de papéis, cadeira quente, encontro para o
chá, redação científica, interpretação e análise de texto
literário.
Fazer síntese é a habilidade complexa considerada
no décimo capitulo. Implica em extrair informações de
diferentes fontes, combiná-las com as já conhecidas,
fazendo emergir novos padrões e conceitos. É
considerada uma das habilidades mais criativas do
pensamento e possivelmente uma das mais difíceis de
ensinar. Entre as atividades propostas para desenvolver
a habilidade de síntese aparecem: criar jogos
educacionais, reformular jogos e regras, fazer notas de
síntese, transformar texto etc.
A interpretação (capitulo 11) é uma habilidade
requerida constantemente na vida posto que é usada
para dar sentido tanto a pequenos como a grandes
indícios, criando o mundo pessoal de cada um. A
Resenhas
interpretação é muito requisitada na vida acadêmica
enfocando textos, dados observáveis, figuras, números,
mapas etc. Práticas que a desenvolvem são: arte de
interpretação triangular, técnica de interpretação de
figura, representação de metáforas (textos ou outra
forma) etc.
No capitulo seguinte, a avaliação é o foco da atenção.
Ela é importante para que o aluno tenha êxito na vida
acadêmica, implicando em saber atribuir valor a alguma
coisa ou parte dela de acordo com algum critério, o que
é ao mesmo tempo sua característica mais marcante e
difícil de ser estabelecida. Pode ser desenvolvida pelo
uso de gráficos, pontuações de avaliações, diagramas,
simulações diversas.
O objeto de atenção do capitulo 13 é a comunicação,
a qual como lembra Zwiers, nem sempre aparece nas
listas de habilidades do pensamento. Todavia, muito do
pensamento e da criatividade requer a habilidade de fazer
comunicação oral, escrita ou não verbal. Está diretamente ligada ao desenvolvimento da linguagem
acadêmica (processo e produto). Pode ser desenvolvida
usando-se várias técnicas de trabalho em grupo, de
experiências verbais, de discussões de diversos tipos,
técnica do professor “não veio”, pares de pensadores,
código colorido de escrita, entre outras.
O último capítulo da segunda parte trata da
aplicação que requer saber o que, o quanto e o como
aplicar o que se aprendeu. Tem papéis diferentes nas
várias áreas de conhecimento mas é considerada o
coração ou responsável pelo êxito das habilidades do
pensar. Sem aplicação do aprendido não se pode dizer
que o processo se completou. Procedimentos diversos de generalização auxiliam no desenvolvimento
desta habilidade. Exemplo: desempenho em tarefas
planejadas com o auxilio dos estudantes, projetos no
mundo real, ensinar estudantes mais jovens,
desempenho de papéis etc.
A terceira parte contém uma série de documentos,
fichas, esquemas, quadros que o professor tem autorização para reproduzir e usar em suas aulas, facilitando
o emprego das sugestões e orientações para o
desenvolvimento das atividades propostas no livro. Elas
também facilitam dispor de material para pesquisar as
técnicas e procedimentos. Como são atividades não
exploradas no Brasil, sem dados científicos colhidos em
sua realidade social cultural e educacional, seria muito
importante pesquisar a validade, a precisão e a eficácia
nas escolas brasileiras.
Resenhas
Os três apêndices são muito úteis para se repensar o
processo educativo. O primeiro traz um rol de atividades
para o desenvolvimento das inteligência múltiplas nos
campos artísticos-viso-espacial, musical, cinestésicocorporal, socio-interpessoal, auto-intrapessoal,
matemático-lógico, científico-natural e verbal. O segundo
apêndice arrola questões para trabalhar tópicos
controversos filosóficos, culturais, verbais, históricos,
políticos, científicos e comerciais. O último apresenta uma
lista de sons que podem servir de base para canções.
As referências usadas incluem clássicos mas
predominam obras recentes, várias publicadas em
153
periódicos, que poderiam ser em maior número, mas se
justifica pelo caráter predominantemente prático da obra.
Há ainda uma relação com obras literárias citadas e
outra com sugestões de textos complementares para
quem desejar se aprofundar.
A consulta à obra é facilitada por um índice de autores e conteúdo e por uma lista das atividades organizadas
por capítulos e por ordem alfabética.
O livro abre perspectiva para ensino e pesquisa,
sugestões devidamente sustentadas em dados podem
renovar substancialmente a educação. Cabe formar
docentes com competências para tanto.
Geraldina Porto Witter
Universidade Mogi das Cruzes
O ALUNO UNIVERSITÁRIO E SUAS QUESTÕES
Joly, M.C. R. A., Santos, A. A. A. & Sisto, F. F. (orgs.), (2005). Questões do Cotidiano
Universitário. São Paulo: Casa do Psicólogo, 264 p.
Tendo como pressuposto que todos os envolvidos
com o processo de aprendizagem no ensino superior
devem assumir a responsabilidade de fazer não apenas
o possível, mas o melhor, os organizadores deste livro
Maria Cristina R. A. Joly, Acácia Angeli A. dos Santos
e Fermino F. Sisto, apresentam por meio dos 12
capítulos que compõem o livro, pesquisas recentes
conduzidas por profissionais de Psicologia e áreas
afins. Estas desvelam questões do atual cotidiano do
ensino superior e suas relações com estudante
universitário.
Na apresentação os organizadores tecem reflexões
sobre a atual crise da educação superior, que passa por
transformações na busca de uma nova identidade
envolvendo seus principais atores, a saber alunos e
professores. Destacam que as escolhas feitas para
compor os capítulos do livro foram norteadas pelo
objetivo de convidar o leitor a pensar no espaço
universitário não tão somente como um transmissor de
conteúdo e práticas, mas primordialmente um local de
formação profissional.
O capítulo inicial “Barreiras a criatividade e traços de personalidade em universitários”, de autoria
dos organizadores, relata pesquisa realizada com alunos
universitários, tendo como pressuposto teórico que
personalidade e criatividade estão correlacionados. Os
resultados indicam que os fatores tempo, falta de
oportunidade e inibição/timidez criam barreiras a
criatividade, pois dificultam a expressão da mesma.
Quanto ao traço de personalidade verifica-se que os
estudantes ingressantes apresentam tendência a serem
amistosos, apresentando alta pontuação no fator
extroversão.. O tema continua no capítulo 6
“Investigando barreiras à criatividade com universitários
ingressantes”, no qual as autoras Paula B.C. Guerra e
Maria Cristina R. A. Joly, relatam a investigação das
barreiras à criatividade em universitários ingressantes.
Destaca-se que dentre os fatores identificados, o fator
tempo aparece novamente como uma das mais
importantes barreiras externas que influenciam a
criatividade.
O uso de estratégias de aprendizagem com o
objetivo de melhorar a competência e a compreensão
em leitura dos alunos é apresentado em “Avaliação
do uso de estratégias de aprendizagem e a
compreensão em leitura de universitários”, titulo
do capítulo dois. O assunto volta a ser discutido no
capítulo 12 “Estratégias de Aprendizagem:
Contribuições para a formação de professores nos
cursos superiores”. Nestes as autoras enfocam a
importância das estratégias metacognitivas, tanto na
identificação do seu uso pelos alunos, como
apresentam ao leitor os princípios gerais de um modelo
de intervenção em estratégias de aprendizagem, que
os professores podem ensinar aos alunos, para ele
possa escolher as estratégias que se adequam ao seu
perfil pessoal e usá-las para o melhor entendimento
dos textos acadêmicos.
“Estilos cognitivos dependência e independência de campo: análise de sua relação com a
compreensão da leitura”, é o título do capítulo 3. O
estilo cognitivo dependência de campo caracteriza o
individuo que prefere uma estrutura externa de
referência. Já os indivíduos que dão preferência a uma
independência de campo, contam com uma estrutura
interna de referência. A habilidade de compreensão
em leitura entre universitários e a possibilidade dela
estar relacionada com os estilos cognitivos pessoais,
neste capítulo as autoras exploram as relações entre
estes dois construtos.
Preocupados com o cenário que os professores
universitários se deparam no que tange a dificuldade
dos alunos em debater, criticar, ler e produzir textos utilizando um raciocínio coerente e bem elaborado, no
156
capítulo 4 “Produção de texto e inteligência fluída”,
os autores apontam as possíveis relações entre as
medidas de produção de texto e a escala de inteligência
fluida. A escrita é também o assunto do capítulo seguinte
“Habilidade em escrita: um estudo com universitários
ingressantes”. Os autores relatam estudo realizado com
universitários ingressantes, neste confirmaram o que a
literatura sobre a área apontava, detectaram que os alunos
que chegam ao nível com sérios problemas quanto as
habilidades de produção escrita, apresentando grandes
e elevados números de erros gramaticais em suas
produções.
No capítulo 7 “Condutas agressivas e gênero: Uma
questão de estilo de agressividade”, os autores trazem contribuições provenientes da literatura e de estudo
realizado sobre a agressividade com estudantes
universitários, cabe destacar que neste nível escolar são
poucas as pesquisas realizadas no Brasil e quando
realizadas geralmente é o professor que discorre sobre
as condutas agressivas dos alunos, neste estudo foram
os próprios alunos que relataram suas condutas. O
estudo indica que as condutas agressivas autopercebidas
pelos universitários homens são importunar outras
pessoas, destruir coisas que não lhe pertencem, enganar
e violar regras, desrespeitar a segurança própria e a
alheia. Entre as mulheres estudantes as principais
características são a manipulação, a irritabilidade,
ataques de birra para alcançar os objetivos, brigas
excessivas, humor deprimido e baixa tolerância a
frustrações.
Identificar como universitários os ingressantes
vivenciam o processo de integração acadêmica nas
dimensões pessoais, interpessoais e institucionais,
possibilita aos envolvidos na condução do ensino superior
uma melhor compreensão e condução da transição do
aluno do ensino médio para o nível superior, buscando
sua melhor adaptação, permanência e realização
acadêmica. Esta é a contribuição que os autores do
capítulo 8 “Questionário de vivência acadêmica: estudo
de consistência interna do instrumento no contexto
brasileiro” nos trazem.
O capítulo seguinte “Percepção de estudantes
evadidos sobre sua experiência no ensino superior”
descreve a percepção que os estudantes evadidos têm
sobre sua experiência no ensino superior. A pesquisa
das autoras aponta que a evasão do ensino superior é
um processo que envolve complexas interações entre
fatores relacionados ao estudante, a instituição e aos
Resenhas
eventos externos. O conhecimento e identificação destes fatores possibilitarão a universidade promover um
ambiente que desperte no estudante confiança, empenho
e bom rendimento, buscando diminuir o alto índice de
evasão no ensino superior.
“Concepção e prática do lazer em alunos
universitários” é o titulo do capítulo 11. Nele diante
da escassez de pesquisa no Brasil sobre o tema nesta
área, Miguel Cardozo do Lago e Fermino Fernandes
Sisto apresentam os resultados de pesquisa realizada
com estudantes da área de Educação Física. Para
os universitários deste curso o lazer é considerado
um fator de grande importância, relatam que praticam
atividades de lazer até duas vezes ao dia, média
acima do verificado em pesquisas com estudantes
de outras áreas, destaca-se no entanto, que devido
as características do próprio curso a atividade física
teve maior conotação dentre as demais categorias
de lazer, destoando do que é sugerido na literatura
para que haja um equilíbrio entre as atividades de
lazer manual, intelectual, social, artístico, físico e
turístico.
O capítulo seguinte “A motivação dos alunos em
cursos superiores”, é resultado de um levantamento
bibliográfico realizado pelo autor José Aloyseo Bzuneck.
Baseado nos resultados de um conjunto de pesquisas
sobre motivação escolar, é traçado um esboço da
produção cientifica no Brasil e exterior, identificando suas
contribuições e limitações. Constata-se que nos estudos
internacionais os construtos mais focalizados são metas
de realização, motivação intrínseca e motivação
extrínseca, o mesmo ocorre no Brasil. Como
contribuições destacam-se os dados descritivos, a relação
encontrada entre motivação e estratégias de
aprendizagem, e o fato de as pesquisas contemplarem
diversos cursos superiores. No âmbito das limitações é
apontado no aspecto metodológico a ausência de
observações diretas, o largo uso de escalas likert, com
tendência à analise fatorial e aplicação do alpha de
Cronbach.
Questões do cotidiano universitário é um livro que
revela a preocupação dos pesquisadores em
compreender as dificuldades que os estudantes
apresentam ao chegar ao nível superior e seus déficits
escolares, propõem ações efetivas que melhorem o
desempenho acadêmico, mas que acima de tudo, que
possibilitem a estes que ao concluírem seus cursos,
possam integrar plenamente o mercado de trabalho.
Resenhas
É notória a preocupação dos autores de todos os
capítulos de tratar os assuntos com profundidade,
localizando suas fontes, permitindo ao leitor ampliar
os temas discutidos. Constitui-se de um instrumento
157
de informação útil a docentes, coordenadores e
administradores do ensino superior, pesquisadores e
todos os interessados no processo de ensinoaprendizagem.
Janete Ap. Silva Marini
Mestranda do Programa de Pós-graduação em
Psicologia da Universidade São Francisco.
História
ENTREVISTA COM ELCIE APARECIDA FORTES SALGADO MASINI
Entrevistadora: LUCICLEIDE MARIA DE CANTALICE
Entrevista com a professora Elcie Aparecida
Fortes Salgado Masini para a ABRAPEE
Profª Elcie Aparecida Fortes Salzano Masini é livre
docente em Educação Especial pela Universidade de
São Paulo. Atualmente, compõe a equipe do Programa
de Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, onde ministra
as disciplinas “Metodologia de pesquisa em Ciências
Humanas” e “Deficiências Sensoriais – percepção e
cognição”; coordena os cursos lato sensu deste
Programa “Psicopedagogia” (criado em 1998) e
“Formação de Educadores de Pessoas com Deficiências sensoriais e múltiplas” (criado em 2000 - curso
este realizado em convênio com o “Programa Hilton
Perkins para a educação do surdocego e da pessoa
com múltipla deficiente sensorial”). Iniciou a sua
prática na Pedagogia como orientadora educacional num
colégio vocacional, sendo convidada posteriormente a
lecionar no curso de Psicologia. Aprofundou seus estudos
nessa área ampliando – os com trabalhos na Psicologia
da Comunicação, na Avaliação do Deficiente Visual e
Orientação Educacional do Deficiente Visual. A partir
de 1983 seu trabalho direcionou-se a formar professoras
especializadas no ensino do deficiente visual. Aposentouse em 1994 na USP, porém, continuou a participar
ativamente do Laboratório Interdisciplinar de Estudos
sobre as Deficiências (LIDE), do qual é sócia fundadora,
locado no Instituto de Psicologia da USP. Sua atuação
em Psicologia Educacional concentra – se no ato de
aprender e na área da excepcionalidade: e continua
orientando doutorados e mestrados na USP e mestrados
no Mackenzie; desenvolvendo pesquisas junto ao CNPq
e Mackpesquisa, e publicações em livros e artigos,
merecendo destaque pelas suas valiosas contribuições.
Lucicleide: Profª Elcie, por que escolheu a
Pedagogia por profissão e direcionou seu trabalho
para a área de psicologia escolar educacional?
Profª Elcie: Minha escolha pela Pedagogia, creio,
irrompeu de motivos profundos que emergiram de diversas vivências: de minha experiência no início da
escolarização, que ficou emersa em tons sombrios,
conservando em mistério passagens da própria vida e
160
em esquecimento processos próprios importantes, como
por exemplo o de aprender a ler; da propulsão de destrinçar o que transforma, na escola, uma criança plena
de excitação e curiosidade pelo que a rodeia em alguém
passivo e entediado; da crença de que a escola poderia
ser um ambiente em que o aluno se sentisse bem e as
condições favorecessem seu desenvolvimento, ampliasse
suas potencialidades e respeitasse sua maneira própria
de organizar, elaborar e realizar.
A Pedagogia encontra seus fundamentos na
Sociologia, História, Biologia, Psicologia, Filosofia.
Embora o conhecimento dessas áreas fosse indispensável
e, no meu Curso os professores das disciplinas fossem
autoridades reconhecidas, cada uma das áreas
permanecia em um domínio isolado. Naquela época as
três áreas de atuação do pedagogo eram: a da
administração escolar, que se voltava a atividades ligadas
à direção cuidando da estrutura organização e
funcionamento da instituição; a área do ensino que se
voltava a atividades ligadas à coordenação pedagógica,
didática e práticas dos professores; a área da orientação
educacional focalizando o aluno, (por meio de atividades
com grupos de estudantes, de professores, de pais) para
acompanhamento do seu processo de participação,
relacionamentos e aprendizagem. Optei pela orientação
educacional.
Comecei a atuar como orientadora educacional, após
uma especialização de dois anos na Faculdade de
Educação da USP. Na função de orientadora educacional
tive o privilégio de compor a equipe do Colégio
Vocacional “Oswaldo Aranha”- colégio experimental
estadual - sob a coordenação geral da educadora Maria
Nilde Mascellani. Esse colégio propiciava condições
educacionais realizando um trabalho interdisciplinar que
surgia de planejamento das áreas e discussões da equipe
de professores para ministrarem os conteúdos levando
os alunos a refletirem sobre o contexto social e
problemática da comunidade em que estavam inseridos;
respeitava – se a individualidade, ampliando as
potencialidades do aluno organizar, elaborar e atuar
coletivamente. Tive aí oportunidade de compartilhar da
formação de jovens, hoje cidadãos de meia idade, que
prestam serviços significativos em diferentes áreas como
Jornalismo, Medicina, Educação e muitas outras. São
exemplos vivos de que a sociedade pode contar com
homens de responsabilidade, mentalidade independente
e atuantes, quando são oferecidas condições
educacionais, que consideram os alunos em suas
História
individualidades e as características do contexto social
e da sua época. Aprendi muito nesse trabalho sobre
condições requeridas para o desenvolvimento e
psicologia educacional.
Devido a essa minha atuação no Colégio Vocacional,
fui convidada a lecionar no Curso de Psicologia da antiga
Faculdade Sedes Sapientiae, na formação do psicólogo
escolar; na Faculdade de Psicologia São Marcos, hoje
Universidade São Marcos; e no Curso de Psicologia da
PUCSP. A partir daí passei a aprofundar meus estudos
na área de Psicologia.
Lucicleide: Conte-nos um pouco de sua
trajetória profissional.
Profª Elcie: Durante aproximadamente 15 anos (de
1972 a 1986) estive participando da formação de
psicólogos. A preocupação central era de que estes tivessem uma visão crítica sobre o significado de sua
atuação na escola, no uso de recursos, técnicas e
instrumento frente ao papel da escola pública no contexto
social, dos anos 70 a meados de 80. Organizei dados
dessa experiência de trabalho no livro que publiquei em
1978 “Ação da Psicologia na Escola”, prefaciado pelo
Dr. Joel Martins, e re editado em 1982.
As questões que os alunos traziam em supervisão
dos estágios realizados nas escolas mostraram – me a
necessidade de aprofundar meus estudos, o que me levou
ao Mestrado em Psicologia Educacional e ao Doutorado em Psicologia (área de concentração Educação). Na
tentativa de superar o despreparo referente aos
processos de aprendizagem, que encontrei entre
professores da escola pública, como também entre os
psicólogos formados e os que lecionavam na
Universidade, optei por este tema em minha Dissertação.
Fiz a sistematização da Teoria da Aprendizagem
Significativa (TAS) de Ausubel e sua aplicação em sala
de aula numa pesquisa em escola pública estadual de
São Paulo. (publicada no livro “Aprendizagem
Significativa – a teoria de David Ausubel” em co – autoria com Marco Antonio Moreira, em 1982). As
conclusões dessa investigação, bem como sua utilização por professoras nas escolas, assinalaram dúvidas
quanto a segurança de atingir com a sistematização e
aplicação da TAS o que Ausubel considerava o fator
isolado mais importante para a aprendizagem “aquilo
que o aprendiz já sabe”. Elucidou – se na prática, que
o “saber” em Ausubel ficava restrito ao aspecto
História
intelectual (denotativo) e o “saber” que o aluno dispõe
vem de sua experiência, composta de sentimentos,
emoções, valores, hábitos (conotativo/existencial). Essa
constatação levou – me no Doutorado a buscar a forma
requerida para o “aproximar – se” do aluno e de seu
“saber” (conotativo/existencial), fundamentada na
Daseinsanalyse - interpretação de Boss e Spanoudis
sobre a Análise Existencial de Heidegger.
Do entrelaçamento das experiências de investigação
fundamentadas na TAS e do “aproximar – se”
daseinsanalítico surgiu o conceito de “Äprendizagem
Totalizante”, publicado em livro com o mesmo título,
em 1999.
Em 1980, fui convidada pela Dra Elza Dias Pacheco
para ministrar Psicologia da Comunicação, na Escola
de Comunicações e Artes (ECA), na USP. Foi uma
experiência desafiadora participar da formação de
futuros comunicólogos ( jornalistas/ cineastas/
programadores de atividade de rádio e TV/ publicitários
) e das questões éticas a serem enfrentadas e discutidas conforme segue. Como discutir teorias de
personalidade e as necessidades básicas que movem o
homem com aqueles alunos que teriam nas mãos os
recursos para manipular o público a partir dessas
necessidades? Como examinar os ideais da cultura do
século XX, de Morin e a utilização desses ideais nos
meios de divulgação, introduzindo outro referencial de
valores além dos da habilidade técnica e do sucesso?
Ministrar essa disciplina ampliou minha visão sobre
questões psicológicas imbricadas na cultura de massas:
a relatividade da autonomia das escolhas, os recursos
de persuasão e manipulação, a cooperação e a
competição com a educação formal e o processo de
aprendizagem dos alunos. Foi uma experiência bastante
rica, que deixei em 1983, quando fui convidada a assumir
aulas nas disciplinas “Avaliação do deficiente visual” e
“Orientação educacional do deficiente visual”, na
Faculdade de Educação da USP
Minha experiência com deficientes visuaisinício de minha carreira profissional - estava muito distante. Parecia – me, por um lado, temerário reassumir
encargos ligados à Educação Especial, por outro lado
desafiante saber no que minha experiência e
conhecimentos, com alunos sem deficiência visual,
poderiam contribuir para a educação e o desenvolvimento
de pessoas com deficiência visual. A linha central da
programação das disciplinas sob minha responsabilidade
enfatizava: ter clareza sobre as especificidades do
161
desenvolvimento da pessoa com deficiência visual, sobre
os recursos para avaliá-lo para definir a orientação
educacional apropriada. A consulta à bibliográfica
especializada nacional e estrangeira, bem como a
consulta a especialistas em deficiência visual para
compor meu planejamento das disciplinas causou – me
enorme impacto: o referencial de desenvolvimento e de
aprendizagem utilizados em pesquisas e atendimento da
pessoa com deficiência visual eram os utilizados com
pessoas videntes (sem deficiência visual). Assim a
pessoa com deficiência visual permanecia oculta, ao ser
estudada por um referencial comparativo. Daí nasceu a
pergunta diretriz de minha pesquisa de livre docência,
inspirada na “Fenomenologia da Percepção” de Merleau
- Ponty: como saber sobre a percepção do deficiente
visual, sobre seus processos de organização e elaboração
de dados, para um orientação educacional apropriada?
A partir de meu concurso de Livre Docência na USP,
em 1990, estive formando professoras especializadas
no ensino do deficiente visual enfatizando a importância
de partir do referencial perceptual do aluno deficiente
visual para que ele possa compreender e elaborar dados do mundo que o cerca e das informações recebidas.
Aposentei – me em 1994.
Continuei, porém, a participar ativamente do
Laboratório Interdisciplinar de Estudos sobre as Deficiências (LIDE), do qual sou sócia fundadora, locado no
Instituto de Psicologia da USP. Entre atividades de
eventos, debates de pesquisas, projeção e discussão
sobre filmes, publicação de livro junto à equipe do LIDE
realizei, também, várias investigações junto ao CNP,
sobre aprendizagem e condições para a inclusão escolar
do aluno com deficiência visual.
Em 1998, a convite da Dra Maria Eloisa Famá
D‘Antino, passei a compor a equipe do Programa de
Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento, da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, onde ministro as
disciplinas “Metodologia de pesquisa em Ciências
Humanas” e “Deficiências Sensoriais – percepção e
cognição”; coordeno os cursos lato sensu deste
Programa “Psicopedagogia” (instalado em 1998) e
“Formação de Educadores de Pessoas com Deficiências sensoriais e múltiplas” (instalado em 2000 curso este realizado em convênio com o “Programa
Hilton Perkins para a educação do surdocego”)
Neste programa venho realizando pesquisas, financiadas
pelo CNPq e pelo Fundo de Pesquisa Mackenzie, sobre
aprendizagem de pessoas com deficiências sensoriais e
162
História
sem deficiências sensoriais. Sobre as área de atuação e
pesquisa nesta Universidade de 1998 até o momento
temos realizado eventos e publicações (seis livros e
organização de duas revistas da pós – graduação).
sua pergunta e à questão que me parece prioritária para a
realidade educacional brasileira: a Psicologia Educacional
tem contribuído para o desenvolvimento e aprendizagem dos
alunos das escolas públicas?
Lucicleide: Se pudesse refazer a trajetória de
sua vida profissional, escolheria outra área da
Psicologia para atuar? Por quê?
Lucicleide: Qual a contribuição que a Psicologia
Escolar pode dar à sociedade brasileira?
Profª Elcie: Não mudaria minha área. A Psicologia
Educacional tem respondido ao meu interesse em
compreender o ser humano - como percebe, sente,
organiza, elabora e age. Há ainda muito a caminhar e
aprofundar, porém sem mudar os velhos rumos.
Lucicleide: O que considera mais marcante no
estágio atual da Psicologia Escolar no Brasil?
Profª Elcie: Não tenho acompanhado o que está sendo
realizado em psicologia nas escolas, portanto não me sinto
com autoridade para opinar. Tenho tido, apenas, oportunidade
de emitir parecer a respeito de projetos de pesquisas
encaminhados pelo CNPq. Há projetos de pesquisa bem
estruturados, com metodologia coerente com a
fundamentação, apresentando continuidade na investigação.
Porém, não tenho dados, nem condições para responder à
Profª Elcie: Sem desconsiderar a necessidade de
mudanças básicas na educação, envolvendo a estrutura
social- política – econômica, para beneficiar um número
maior de crianças e jovens, as questões sobre o
desenvolvimento e aprendizagem na escola é um dos
maiores desafios que o psicólogo pode enfrentar.
Realizar um trabalho no contexto escolar, junto à equipe
de técnicos e professores, assessorando – a, e lidando
com as relações conflitantes nessa instituição para a
realização de um trabalho compartilhado da equipe
técnica e docente e dos discentes não é tarefa fácil.
Creio, porém que a contribuição da psicologia escolar
só poderá ser avaliada a partir de dados de registros
longitudinais de atividades desenvolvidas no contexto da
escola. Parece- me que a psicologia escolar brasileira
terá sua identidade se for desenvolvida na instituição
escolar pública. Assim registrará sua própria história e
as diretrizes para o seu futuro.
Sugestões Práticas
FOCOS DE INTERVENÇÃO EM PSICOLOGIA ESCOLAR
Edla Grisard Caldeira de Andrada1
Atualmente o Psicólogo Escolar é um profissional
muito requisitado por educadores, equipe escolar e
famílias, porém, é ainda compreendido, na maioria das
vezes, como “aquele que pode tratar os alunos
problemas e devolvê-los à sala de aula bem ajustados”.
Essa visão caracteriza e fundamenta a intervenção
clínica, uma prática que precisa ser abolida das Escolas,
e revela a necessidade do estabelecimento de matrizes
teóricas que fundamentem a prática deste profissional
tão requisitado e tão pouco compreendido. Entre as
tarefas descritas pelo CFP na resolução nº 014/00 destaco as seguintes possibilidades de atuação do psicólogo
escolar:
a) aplicar conhecimentos psicológicos na escola,
concernentes ao processo ensino-aprendizagem,
em análises e intervenções psicopedagógicas;
referentes ao desenvolvimento humano, às
relações interpessoais e à integração famíliacomunidade-escola, para promover o desenvolvimento integral do ser;
b) analisar as relações entre os diversos segmentos
do sistema de ensino e sua repercussão no processo de ensino para auxiliar na elaboração de
procedimentos educacionais capazes de atender
às necessidades individuais.
A partir das possibilidades acima descritas, alguns
focos de intervenção na escola revelam-se como
fundamentais e precisam estar embasados em
conhecimentos da psicologia científica, tal qual propagada no curso de Psicologia.
FOCO 1 - As implicações do fazer pedagógico:
Todo fazer pedagógico precisa estar embasado em
teorias do desenvolvimento e da aprendizagem, sendo
1
2
que a prática do educador precisa estar coerente com
tais teorias. Isso implica em material e atividades adequadas, clima de sala de aula, papel do professor e do
aluno e concepção de ensino. Assim, o psicólogo escolar
precisa estar atualizado quanto às teorias do desenvolvimento e da aprendizagem, especialmente com aquelas
que embasam o corpo teórico da escola em que trabalha, focalizando os processos cognitivos.
Conhecimento necessário: Teorias do desenvolvimento e aprendizagem - inatismo, ambientalismo,
construtivismo e psicologia histórico-cultural (Santos,
1997; Zanella, 2001; Davis & Oliveira, 1994).
Possibilidade de intervenção
• Uma reunião inicial com a equipe pedagógica
(orientadores e supervisores e direção, assim como
professores) é mais que necessária. Faz-se importante deixar claro qual visão de sujeito o psicólogo tem (Andrada, 2005), o que pensa acerca
da aprendizagem e quais estratégias diferenciadas tem a oferecer além do esperado atendimento individual na sala do psicólogo.
• Faz-se necessário conhecer o Projeto Político
Pedagógico da Escola e participar da sua atualização.
• Trabalhar junto à equipe pedagógica em espaços
semanais ou quinzenais de diálogo com os professores (intervenção mediada) a fim de juntos
criar novos significados as situações cotidianas
de sala de aula, eliminando a possibilidade de
estigmatizar os alunos com dificuldade de aprendizagem (Curonici & MacCulloch, 1999).
• Criar espaços de discussão acerca das teorias
de aprendizagem em Paradas Pedagógicas,
sempre vislumbrando o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola e a prática pedagógica.
Psicóloga e docente da Universidade Federal de Santa Catarina
Estudante do Curso de Psicologia da USF e bolsista da iniciação científica PROBAIC-USF.
Sugestões Práticas
164
FOCO 2 - O envolvimento de pais e educadores
no processo de formação e educação das
crianças e adolescentes:
Quando pensamos em processo de formação dos
alunos não podemos excluir a participação ativa das
famílias e, certamente, dos educadores. Envolver a
família, co-responsável no processo de educação de seus
filhos e filhas, a fim de que se possa colher dados acerca
do outro sistema direto em que participa o aluno é mais
que necessário (Andrada, 2003).
Conhecimento necessário: história das famílias
no Brasil (Costa, 1983); teorias sobre a dinâmica familiar
e teorias sobre o desenvolvimento das famílias (Carter
& Mcgoldrick, 1995).
Possibilidade de Intervenção
• Em entrevista com a família levantar dados
acerca das seguintes questões: autonomia X dependência; limites; autoritarismo X autoridade;
relacionamento cognitivo e emocional na família,
com o objetivo de resignificar os relacionamentos
intra-familiar (Papp, 1992; Minuchin, 1982).
• Junto com a família, em encontros sistematizados, refletir
sobre a função da dificuldade de aprendizagem neste
momento do ciclo de vida familiar (Carter & Mcgoldrick,
1995), criando estratégias com pais e cuidadores que
possibilitem o sucesso escolar da criança.
• Confrontar família e professor quando necessário,
criando um espaço de dialogo franco acerca das
dificuldades de todos, não só do aluno, diluindo no
s sistemas a “culpa” pelo fracasso escolar. Assim,
outra armadilha é enfraquecida: “a culpa sempre
é da família”.
• Unir pais e professores no processo educacional
das crianças em estratégias cognitivas que contem
com a participação de ambas as partes.
• O Psicólogo Escolar, questionador, curioso e
acima de tudo assumindo uma posição investigativa, pode criar junto à equipe uma estratégia
de intervenção colaborativa, na qual todos têm
influência sobre o aluno, assim como sofrem
influência mutuamente (Andrada, 2005; Curonici
& McCulloch, 1999).
FOCO 3 - O esclarecimento das dimensões
psicológicas implicadas no processo de
ensino e aprendizagem.
O processo de ensino e aprendizagem implica em
várias áreas do conhecimento humano, sendo que
nenhuma área se sobrepõe a outra. A educação é um
fenômeno muito complexo para ser vislumbrada somente
pela pedagogia, ou pela psicologia, ou medicina. Dessa
forma, é preciso reconhecer que a dificuldade de
aprendizagem tem origem, causas e desenvolvimento
múltiplos o que exige do profissional pesquisa em áreas
distintas do conhecimento (Polity, 2001; Fernandez,
1990). Faz-se necessário um trabalho que considere todas as dimensões implicadas, dentre as quais a psicologia
se faz presente.
Conhecimento necessário: Processos cognitivos;
teorias sobre memória, atenção, concentração,
apropriação do conhecimento e linguagem (Antunes,
1998; Rezende, Tronca & Tronca, 2004; Antunes, 2002).
Problemas de aprendizagem: hiperatividade, déficit de
atenção, dislexia, dislalia, disgrafia, entre outros (Ciasca,
2003; Neves & Almeida, 2003).
Possibilidades de intervenção
• Diagnóstico e encaminhamento das crianças com
suspeita de dificuldades de aprendizagem para
especialistas da área.
• Acompanhamento do processo de aprendizagem
dos alunos com dificuldades de aprendizagem.
• Criação de estratégias psicopedagógicas junto à
equipe escolar e professores envolvidos.
• Ouvir os professores, suas demandas e fazê-los
participar em alguns dos atendimentos com as
crianças, repensando novas práticas e novos
olhares sobre o aluno que chama de “problema”.
• Participar das reuniões e conselhos de classe, nas
quais o psicólogo poderá estabelecer novas
maneiras de perceber o processo educacional dos
alunos, evitando rótulos, diagnósticos imprecisos
e hipóteses únicas e fechadas.
FOCO 4 - Os sistemas de interações existentes
no interior da Escola.
Os problemas de aprendizagem podem ser fruto
de falhas nas inter-relações do sistema direto do qual
a criança participa. A criança precisa ser compreendida dentro de seu sistema social de interação, como
parte inseparável do seu sistema social, o qual inclui
família, escola, entre outros. Dentro da escola, fazse necessário procurar entender os problemas que a
criança está apresentando relacionando-os aos diferentes sujeitos envolvidos, com o objetivo de planejar
as intervenções necessárias (Del Prette, 2001; Souza,
1997).
Sugestões Práticas
Conhecimento necessário: Teoria sistêmica
(Vasconcellos, 2002; Moraes, 1997); teoria de grupos,
papéis e atitudes sociais (Gayotto, 1992; Osório, 2003;
Yozo, 2001).
Possibilidade de intervenção
Criar espaços para escutar as demandas dos sujeitos
da escola e pensar maneiras de lidar com situações que
são cotidianas. Faz-se necessário circular pelos
corredores, estar atento aos movimentos dos sujeitos.
REFERÊNCIAS
Andrada, E.G.C. (2003). Família, escola e a dificuldade de
aprendizagem: intervindo sistemicamente. Em: Psicologia
Escolar e Educacional, Associação Brasileira de
Psicologia Escolar e Educacional, v.7, n.2, jul-dez,.
Antunes, C. (2002). A memória: como os estudos sobre o
funcionamento da mente nos ajudam a melhorá-la:
fascículo 9, Petrópolis, RJ: Vozes.
Antunes, C. (1998). As inteligências múltiplas e seus
estímulos. Campinas, SP: Papirus.
Carter, B., & Mcgoldrick,M. (1995). As mudanças do ciclo de
vida familiar. POA: Artes Médicas.
Ciasca, S.M. (org.) (2003). Distúrbios de aprendizagem:
proposta de avaliação interdisciplinar. SP: Casa do
Psicólogo.
Costa, J.F. (1983). Ordem médica e norma familiar. 2ed, Graal.
Curonici, C., & McCulloch, P. (1999). Psicólogos e Professores:
uma visão sistêmica acerca dos problemas escolares.
SP: EDUSC.
Davis, C; Oliveira, Z. (1994). Psicologia na Educação, 2ed.;
SP: Cortez.
Del Prette, Z.A.P. (org.) (2001). Psicologia Escolar e
Educacional, saúde e qualidade de vida. SP: Editora
Alínea.
Fernández, A. (1990). A Inteligência Aprisionada. 2.ª ed, Porto
Alegre: Artes Médicas.
Gayotto, M.L.C.(Org) (1992). Creches: desafios e contradições
da criação coletiva da criança pequena. São Paulo: Ícone.
165
• Criar formas de reflexão em conjunto com todos
os sujeitos (alunos, professores e especialistas)
para que se possa trabalhar com suas relações e
paradigmas (Andrada, 2003).
• Faz-se necessário ouvir os alunos, o que
pensam sobre sua escola e sua turma. Isso
pode ser feito através de desenhos, entrevistas,
ou mesmo que escrevam o que pensam,
sentem, como percebem sua turma e sua
escola.
Minuchin, S. (1982). Famílias, funcionamento e tratamento.
POA: Artes médicas.
Moraes, M. C. (1997). O Paradigma Educacional Emergente.
Campinas, SP: Papirus.
Neves, M.M.B.J; Almeida, A.F.C. (2003). A atuação da psicologia
escolar no atendimento aos alunos com queixas escolares. Em:
Almeida, S.F.C. (org) Psicologia Escolar: ética e competências
na formação e atuação profissional. SP: Ed. Alínea.
Osório, .L.C. (2003). Psicologia Grupal. Porto Alegre: Artmed
Papp, P. (1992). O processo de mudança. Porto Alegre: Artes
Médicas.
Polity, E. (2001). Dificuldade de Aprendizagem e Família:
Construindo Novas Narrativas. São Paulo; Vetor.
Rezende, E.S., & Tronca, F.Z.; Tronca, G.A. (2004). A ciência
psicopedagógica: pressupostos fundamentais para o
trabalho transdisciplinar. Tubarão: Ed. UNISUL.
Santos, M.A. (1997). Psicologia escolar no Brasil: fazeres e
saberes. Dissertação de mestrado, Programa de Pósgraduação em Educação. UFSC/SC.
Souza, M.P.R. (1997). Psicologia Escolar: em busca de novos
rumos 3ed. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Vasconcellos, M. J. E. (2002). Pensamento Sistêmico: o novo
paradigma da ciência. Campinas, SP: Papirus.
Yozo, R.Y.K. (1996). 100 Jogos para Grupos: uma abordagem
psicodramático para empresas, escolas e clínicas. 5ed,
SP: Ágora.
Zanella, A.V., & Vygotsky, L. (2001). Contribuições à
psicologia e o conceito de Zona de Desenvolvimento
Proximal. Itajaí: Univali.
Endereço para correspondência:
Edla Grisard Caldeira de Andrada: Largo Benjamin Constant, 691 – apto 403 – CEP 88015-390 – Florianópolis - SC
e-mail: [email protected]
Informativo
NOTÍCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Almeida,M.(2004), Escola e modernidade. Campinas: Alínea,
203p. Em uma perspectiva de história da educação enfoca
aspectos relevantes para o educador tais como a evolução
da escola secundária, o ensino de língua, a modernidade,
a legislação e a tecnologia de ensino.
Ellery, V. (2005). Creating strategic readers. Newark: IRA.
Apresenta técnicas para o desenvolvimento de
competência em consciência fonológica, fonêmica,
vocabulário, fluência verbal e compreensão. Trata-se de
obra de grande utilidade para psicólogos escolares,
fonoaudiólogos escolares e professores. São tecnologias
fáceis de adaptar ou já usadas e testadas para outras
línguas, inclusive a portuguesa.
Hutz, C. S. (org.). (2005). Violência e risco na infância e adolescência: pesquisa e intervenção. São Paulo: Casa do Psicólogo,
224 p. O livro trata de assunto atual e de grande relevância,
contando com autores que fazem análises interessantes
envolvendo pais e família, o problema da adoção, a orientação
profissional, o enfrentamento da agressão, estratos sociais e
modelos de intervenção parental.
Joly, M. C. R. A., Santos, A. Ap. A. dos, Sisto, F. F. (orgs.).
(2005). Questões do cotidiano universitário. São Paulo:
Caso do Psicólogo. Trata-se de livro de interesse para
administradores, docentes e pesquisadores de vida
universitária. Enfoca criatividade, personalidade, estratégias de compreensão, estilos cognitivos, produção de
texto, inteligência, agressividade, vivência acadêmica,
evasão, lazer, motivação e estratégias de aprendizagem.
Roser, N. L., Martinez, M. G. (orgs.). (2005). What a character!:
character study as a guide to literary meaning making
in grade 8. A importância dos personagens, especialmente
os principais, tem conduzido pesquisadores e educadores a estudar a questão do impacto dos mesmos em
crianças e adolescentes. O presente livro reflete esta
preocupação, pesquisas e tecnologias desenvolvidas.
Mais especificamente trata da importância dos
personagens, de sua criação, técnicas para ajudar as
crianças a compreendê-los, analisá-los e perspectivas
futuras para a área de ensino e pesquisa enfocando os
personagens de obras literárias.
Wheatley, J. P. (2005). Strategic spelling: moving beyond word
memorization in the middle grades. Newark: IRA, x +
140p. A soletração é uma prática de ensino muito usada
em vários países notadamente os de língua inglesa,
germânica e francesa. No Brasil é uma tecnologia ignorada.
O presente livro mostra como ela pode ser uma estratégia
útil para melhorar não só o domínio das palavras mas a
competência para pensar, analisar, discutir, criar. Traz
muitas formas de usar estas estratégias úteis não só para
professores de inglês, mas para todos que atuam na
educação, especialmente, com crianças com problemas
de linguagem.
Informativo
169
INFORMES
Julho/2005 – dias 1e 2
V CONGRESSO IBEROAMERICANO DE EVALUACIÓN PSICOLÓGICA
Local: Buenos Aires, Argentina
Contato: www.aidep.org
Julho/2005 – dias 14 a 16
7º FÓRUM DE ESTUDOS: LEITURAS DE PAULO FREIRE
Local: São Leopoldo, RS
Contato: e-mail - [email protected]
Julho/2005 – dias 17 a 22
57ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC
Local: Fortaleza, CE
Contato: www.sbpcnet.org.br/eventos/57ra
Agosto/2005 – dias 27 a 30
IV CONGRESSO MUNDIAL DE PSICOTERAPIA
Local: Buenos Aires, Argentina
Contato: www.4cmp.org.br
Setembro/2005 – dias 8 a 10
V CONGRESSO BRASILEIRO DE PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
Local: IPUSP, SP
Contato: www.sbpd.org.br
Outubro/2005 – dias 26 a 29
XXXV REUNIÃO ANUAL DE PSICOLOGIA - SBP
Local: PUC Paraná – Curitiba, PR
Contato: www.sbponline.org.br
Novembro/2005 – dias 7 a 10
CONGRESSO BIENAL DE PSICOLOGIA
Local: SANTIAGO DE Cuba, Cuba
Informativo
171
Forma de Apresentação dos Manuscritos
Psicologia Escolar e Educacional adota as normas da APA (4a edição, 1994), exceto em situações
específicas onde há conflito com a necessidade de se assegurar o cumprimento da revisão cega por pares,
regras do uso da língua portuguesa, normas gerais da ABNT, procedimentos internos da revista, inclusive
características de infra-estrutura operacional. A omissão de informação no detalhamento que se segue implica
em que prevalece a orientação da APA. Os manuscritos devem ser redigidos em português, espanhol, inglês e
francês nas seguintes categorias:
1. Artigos – trabalhos originais teóricos, de revisão de literatura e de relatos de pesquisa (até 25 laudas);
Comunicação de Pesquisa – relatos originais sucintos de pesquisas realizadas;
Resenhas – apresentação e análise de livros publicados na área nos últimos dois anos (até 5 laudas)
2. História – reimpressão ou impressão de trabalhos ou documentos de difícil acesso relevantes para a
pesquisa e a preservação da história da Psicologia Escolar; entrevistas com personagens relevantes da área e
trabalhos originais sobre esta história;
3. Sugestões Práticas – apresentação de procedimentos, tecnologias, propostas de trabalhos úteis para
a solução de problemas psicoeducacionais ou para a atuação do psicólogo escolar, de vivência do autor de
novos instrumentos e de outras sugestões relevantes para a área (até 5 laudas);
4. Registro Informativo – dados sobre eventos, publicações na área, assuntos diversos de interesse de
psicólogos escolares e educacionais (até 2 laudas);
5. Cartas dos leitores – inclui cópias de cartas, ou parte de cartas de leitores à direção da revista e aos
seus autores, bem como respostas aos mesmos.
Os manuscritos originais deverão ser encaminhados em quatro vias impressas em papel e uma em disquete,
digitadas em espaço duplo, em fonte tipo Times New Roman, tamanho 12, não excedendo o número de laudas
da categoria em que o trabalho se insere, paginado desde a folha de rosto personalizada, a qual receberá
número de página 1. A página deverá ser tamanho carta ou A4, com formatação de margens superior e inferior
(no mínimo 2,5 cm), esquerda e direita (no mínimo 3 cm).
Em caso de reformulação, a nova versão deve ser encaminhada em três vias em papel e uma via no
formato de disquete, sendo que a formatação de texto e de página deve obedecer às mesmas características
indicadas para a primeira versão.
Todo e qualquer encaminhamento à revista deve ser acompanhado de carta assinada pelos autores, na
qual deve estar explicitada a intenção de submissão ou re-submissão do trabalho a publicação. Além disso,
devem conceder à Psicologia Escolar e Educacional o direito autoral do artigo, se publicado, bem como
responsabilizando-se pelos procedimentos éticos necessários quando da realização de pesquisas com seres
humanos. A apresentação dos trabalhos deve seguir a seguinte ordem:
Informativo
172
1. Folha de rosto despersonalizada contendo apenas:
1.1. Título pleno em português, não devendo exceder 12 palavras.
1.2. Sugestão de título abreviado para cabeçalho, não devendo exceder 4 palavras.
1.3. Título pleno em inglês, compatível com o título em português.
2. Folha de rosto personalizada contendo:
2.1. Título pleno em português.
2.2. Sugestão de título abreviado.
2.3. Título pleno em inglês.
2.4. Nome de cada autor, seguido por afiliação institucional e titulação por ocasião da submissão do
trabalho.
2.5. Indicação de endereço para correspondência postal e eletrônica, seguido de endereço completo, de
acordo com as normas do correio de todos os autores.
2.6. Indicação de endereço para correspondência com o editor sobre a tramitação do manuscrito, incluindo
fax, telefone e, se disponível, endereço eletrônico.
2.7. Se necessário, indicação de atualização de afiliação institucional.
2.8. Se apropriado, parágrafo reconhecendo apoio financeiro, colaboração de colegas e técnicos, origem
do trabalho (por exemplo, anteriormente apresentado em evento, derivado de tese ou dissertação, coleta de
dados efetuada em instituição distinta daquela informada no item 2.4), e outros fatos de divulgação eticamente
necessária.
2.9 Endereço postal completo e endereço eletrônico de todos os autores.
3. Folha contendo Resumo, em português.
O resumo deve ter o máximo de 150 palavras para trabalhos na categoria de Artigos. Ao resumo
devem-se seguir 3 a 5 palavras-chave para fins de indexação do trabalho - devem ser escolhidas palavras que
classifiquem o trabalho com precisão adequada, que permitam que ele seja recuperado junto com trabalhos
semelhantes, e que possivelmente seriam evocadas por um pesquisador efetuando levantamento bibliográfico.
No caso de relato de pesquisa, o resumo deve incluir: descrição sumária do problema investigado,
características pertinentes da amostra, método utilizado para a coleta de dados, resultados e conclusões, suas
implicações ou aplicações.
O resumo de uma revisão crítica ou de um estudo teórico deve incluir: tópico tratado (em uma frase),
objetivo, tese ou construto sob análise ou organizador do estudo, fontes usadas (p. ex. observação feita pelo
autor, literatura publicada) e conclusões.
4. Folha contendo Abstract, em inglês, compatível com o texto do resumo.
O Abstract deve obedecer às mesmas especificações para a versão em português, seguido de key words,
compatíveis com as palavras-chave.
Informativo
173
5. Texto propriamente dito.
Em todas as categorias de trabalho original, o texto deve ter uma organização de reconhecimento fácil,
sinalizada por um sistema de títulos e subtítulos que reflitam esta organização. No caso de relatos de pesquisa o
texto deverá, obrigatoriamente, apresentar: introdução, metodologia, resultados e discussão. As notas não
bibliográficas deverão ser reduzidas a um mínimo e colocadas ao pé das páginas, ordenadas por algarismos
arábicos que deverão aparecer imediatamente após o segmento de texto ao qual se refere a nota. Os locais
sugeridos para inserção de figuras e tabelas deverão ser indicados no texto. As citações de autores deverão ser
feitas de acordo com as normas da APA, exemplificadas ao final deste texto. No caso de transcrição na íntegra
de um texto, a transcrição deve ser delimitada por aspas e a citação do autor seguida do número da página
citada. Uma citação literal com 40 ou mais palavras deve ser apresentada em bloco próprio, começando em
nova linha, com recuo de 5 espaços da margem, na mesma posição de um novo parágrafo. O tamanho da fonte
deve ser 12, como no restante do texto.
6. Referências, ordenadas de acordo com as regras gerais que se seguem. Trabalhos de autoria única e
do mesmo autor são ordenadas por ano de publicação, a mais antiga primeiro. Trabalhos de autoria única
precedem trabalhos de autoria múltipla, quando o sobrenome é o mesmo. Trabalhos em que o primeiro autor é
o mesmo, mas co-autores diferem são ordenados por sobrenome dos co-autores. Trabalhos com a mesma
autoria múltipla são ordenados por data, o mais antigo primeiro. Trabalhos com a mesma autoria e a mesma data
são ordenados alfabeticamente pelo título, desconsiderando a primeira palavra se for artigo ou pronome, exceto
quando o próprio título contiver indicação de ordem; o ano é imediatamente seguido de letras minúsculas.
Quando repetido, o nome do autor não deve ser substituído por travessão ou outros sinais. A formatação da lista
de referências deve ser apropriada à tarefa de revisão e de editoração - além de espaço duplo e tamanho de
fonte 12, parágrafo normal com recuo apenas na primeira linha, sem deslocamento das margens; os grifos
devem ser indicados por um traço sob a palavra (p. ex., sublinha). A formatação dos parágrafos com recuo e
dos grifos em itálico é reservada para a fase final de editoração do artigo.
7. Anexos, apenas quando contiverem informação original importante, ou destacamento indispensável
para a compreensão de alguma seção do trabalho. Recomenda-se evitar anexos.
8. Figuras, incluindo legenda, uma por página em papel, ao fina do trabalho. Para assegurar qualidade de
reprodução as figuras contendo desenhos deverão ser encaminhadas em qualidade para fotografia; as figuras
contendo gráficos não poderão estar impressas em impressora matricial. Como a versão publicada não poderá
exceder a largura de 8,3 cm para figuras simples, e de 17,5 cm para figuras complexas, o autor deverá cuidar
para que as legendas mantenham qualidade de leitura, caso redução seja necessária.
9. Tabelas, incluindo título e notas, uma por página em papel e por arquivo de computador. Na publicação
impressa a tabela não poderá exceder 17,5 cm de largura x 23,7 cm de comprimento. Ao prepará-las, o autor
Informativo
174
deverá limitar sua largura a 60 caracteres, para tabelas simples a ocupar uma coluna impressa, incluindo 3
caracteres de espaço entre colunas da tabela, e limitar a 125 caracteres para tabelas complexas a ocupar duas
colunas impressas. O comprimento da tabela não deve exceder 55 linhas, incluindo título e rodapé(s). Para
outros detalhamentos, especialmente em casos anômalos, o manual da APA deve ser consultado.
TIPOS COMUNS DE CITAÇÃO NO TEXTO
Citação de artigo de autoria múltipla
1. Dois autores
O sobrenome dos autores é explicitado em todas as citações, usando e ou & conforme abaixo:
“ A revisão realizada por Guzzo e Witter (1987)” mas “a relação do psicólogo-escola pública foi descrita
com base num estudo exploratório na região de Campinas” (Guzzo & Witter, 1987)”
2. De três a cinco autores
O sobrenome de todos os autores é explicitado na primeira citação, como acima. Da segunda citação em
diante só o sobrenome do primeiro autor é explicitado, seguido de “e cols.” e o ano, se for a primeira citação de
uma referência dentro de um mesmo parágrafo:
Vendramini, Silva e Cazorla (2000) verificaram que [primeira citação no texto]
Vendramini e cols. (2000) verificaram que [citação subsequente, primeira no parágrafo]
Vendramini e cols. verificaram [omita o ano em citações subsequentes dentro de um mesmo parágrafo]
Na seção de Referências todos os nomes são relacionados.
3. Seis ou mais autores
No texto, desde a primeira citação, só o sobrenome do primeiro autor é mencionado, seguido de “e
cols.”, exceto se este formato gerar ambigüidade, caso em que a mesma solução indicada no item anterior deve
ser utilizada:
Primi e cols. (2001).
Na seção de referências todos os nomes são relacionados.
Citações de trabalho discutido em uma fonte secundária
O trabalho usa como fonte um trabalho discutido em outro, sem que o trabalho original tenha sido lido
(por exemplo, um estudo de Taylor, citado por Santos, 1990). No texto, use a seguinte citação:
Taylor (conforme citado por Santos, 1990) acrescenta que a avaliação da compreensão em leitura...
Na seção de Referências informe apenas a fonte secundária, no caso Santos, usando o formato
apropriado.
Informativo
175
Exemplos de Tipos Comuns de Referência
1. Trabalho apresentado em congresso, mas não publicado
Serpa, M.N.F. & Santos, A.A.A. (1997, outubro). Implantação e primeiro ano de funcionamento do
Serviço de Orientação ao Estudante. Trabalho apresentado no XI Seminário Nacional das Universidades
Brasileiras, Guarulhos - São Paulo.
2. Trabalho apresentado em congresso com resumo publicado em publicação seriada regular
Tratar como publicação em periódico, acrescentando logo após o título a indicação de que se trata de
resumo.
Silva, A.A. & Engelmann, A. (1988). Teste de eficácia de um curso para melhorar a capacidade de
julgamentos corretos de expressões faciais de emoções [Resumo]. Ciência e Cultura, 40 (7, Suplemento), 927.
3. Trabalho apresentado em congresso com resumo publicado em publicação especial
Tratar como publicação em livro, informando sobre o evento de acordo com as informações disponíveis
em capa.
Todorov, J.C., Souza, D.G. & Bori, C.M. (1992). Escolha e decisão: A teoria da maximização momentânea
[Resumo]. Em Sociedade Brasileira de Psicologia (Org.), Resumos de comunicações científicas, XXII Reunião
Anual de Psicologia (p. 66). Ribeirão Preto: SBP.
Witter, G.P. (1985). Quem é o psicólogo escolar: Sua atuação prática. [Resumo]. Em Sociedade Brasileira
de Psicologia (Org.), XVII Reunião Anual de Psicologia, Resumos (p. 261). Ribeirão Preto: SBP.
4. Teses ou dissertações não publicadas
Polydoro, S.A.J. (2001). O trancamento de matrícula na trajetória acadêmica do universitário: Condições
de saída e de retorno à instituição. Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP.
5. Livros
Solé, I. (1998). Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artes Mdicas.
6. Capítulo de livro.
Anderson, R.C. & Pearson, P.D. (1984). A schema-theoretic view of basic processes in reading
comprehension. Em P.D. Pearson, R. Barr, M.L. Kamil & P. Mosenthal (Orgs.) Handbook of reading research
(Vol. 1, pp 251-291). New York: Longman.
Pasquali, L. (1996). Teoria da resposta ao item - IRT: uma introdução Em L. Pasquali (Org.), Teoria e
métodos de medida em ciências do comportamento (pp. 173-195). Brasília, INEP.
7. Livro traduzido, em língua portuguesa
Salvador, C.C. (1994). Aprendizagem escolar e construção de conhecimento. (E.O. Dihel, Trad.) Porto
Alegre: Artes Médicas. (Trabalho original publicado em 1990)
História
176
Se a tradução em língua portuguesa de um trabalho em outra língua é usada como fonte, citar a tradução
em português e indicar ano de publicação do trabalho original.
No texto, citar o ano da publicação original e o ano da tradução: (Salvador, 1990/1994).
8. Artigo em periódico científico
Kintsch, W. (1994). Text comprehension, memory, and learning American Psychologist, 49 (4), 294-303.
9. Obra no prelo
Não forneça ano, volume ou número de páginas até que o artigo esteja publicado. Respeitada a ordem de
nomes, é a ultima referência do autor.
Sonawat, R. (no prelo). Families in India. Psicologia: Teoria e Pesquisa.
10. Autoria institucional
American Psychiatric Association (1988). DSM-III-R, Diagnostic and statistical manual of mental disorder
(3a ed. revisada). Washington, DC: Autor.
A remessa de manuscritos para publicação, bem como toda a correspondência de seguimento que se
fizer necessária, deve ser enviada para a Revista Psicologia Escolar e Educacional, conforme endereço
abaixo ou enviada para o endereço eletrônico [email protected] :
Universidade São Francisco
Programa de Estudos Pós Graduados em Psicologia
Profª Drª Maria Cristina Joly
Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45
13251-900 – Itatiba/SP
Procedimentos de submissão e avaliação dos manuscritos
Os manuscritos que se enquadrarem nas modalidades de trabalho especificadas acima, passarão pelo
seguinte procedimento:
1. Encaminhamento para emissão de parecer a membros do Corpo Editorial da revista e/ou consultores
ad hoc
2. Recepção dos pareceres, com recomendação para aceitação (com ou sem modificações) ou rejeição.
No caso de aceitação com modificações, os autores serão notificados com a maior brevidade possível das
sugestões (cópias dos pareceres serão enviados aos autores, exceto quando houver restrição expressa por
parte do consultor).
História
177
3. No caso de aceitação para publicação, o Conselho Editorial reserva-se o direito de introduzir pequenas
alterações para efeito de padronização conforme os parâmetros editoriais da Revista.
4. O processo de avaliação utiliza o sistema de revisão cega por pares, preservando a identidade dos
autores e consultores.
5. A decisão final acerca da publicação ou não do manuscrito é sempre do Conselho Editorial.
Direitos autorais
Os direitos autorais das matérias publicadas são da revista Psicologia Escolar e Educacional. A
reprodução total ou parcial (mais de 500 palavras do texto) requererá autorização por escrito do Editor.
O autor principal da matéria receberá três exemplares da edição em que esta foi publicada. Os originais
não-publicados não serão devolvidos.
FORMULÁRIO PARA PAGAMENTO DA ANUIDADE 2005
Nome: _________________________________________________________________________________________
Forma de pagamento:
( ) Cheque nº__________________________Banco nº__________________Data ________/________/_______
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( ) Depósito em conta bancária: Banco Itaú - ag. 1025 CC: 04716-6 - VALOR: R$ ______________________
(enviar cópia do recibo do depósito com esta ficha).
A anuidade da ABRAPEE é de R$95,00 para sócios efetivos e associados. Para sócios aspirantes (estudantes de
graduação e pós-graduação) o valor da anuidade é de R$45,00.
Obs: esses valores são validos até o dia 01/05/2005 após essa data os valores são de R$50,00 (estudantes) e
R$100,00 (profissional).
O cheque deve ser enviado para o núcleo da ABRAPEE no estado de sua residência, ou para a central nacional no
seguinte endereço:
ABRAPEE
Av. Nossa Senhora de Fátima, 1128 – Bloco. 32 – CEP 13090-001 – Campinas-SP . Fone: (19) 9127-9566 –
[email protected]
Data _______/________/________
assinatura
sócio
__________________________________________
____________________________________________________________
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Endereço: ______________________________________________________Bairro:__________________________
Cep:_________________________Cidade:____________________________________________UF:_____________
Tel.: (_____) ____________________________________Fax: (_____) _____________________________________
CRP nº: ___________________________________________ (para atualização do cadastro)
E-mail: ______________________________________________________________________(incluir ou atualizar)
(PARA USO DA ABRAPEE)
————————————————————————————————————————————
(Devolveremos o recibo após carimbo e assinatura da Secretaria da ABRAPEE)
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOLOGIA ESCOLAR E EDUCACIONAL
CNPJ 66 068 818 / 0001- 54
RECIBO DA ANUIDADE DE 2005
Recebemos de ____________________________________________________________CODAB_______________
o valor de R$
______________________________________________________________________________________________,
referente à anuidade de 2005.
Campinas, ________de ______________________ de 2005.
Tesouraria da ABRAPEE
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ALGUNS TÍTULOS DA CASA DO PSICÓLOGO
Título
Autor/Organizador
Educação, Pedagogia
Cinco Estudos de Educação Moral
Computador no Ensino e a Limitação da Consciência
Crianças de Classe Especial
Crianças Querem Saber, e Agora?, As
Difusão Das Idéias de Piaget No Brasil, A
Encontros com Sara Paín
Ensaios Construtivistas
Era Assim ... Agora Não
Ética e Valores: Métodos para um Ensino Transversal
Formas Elementares da Dialética, As
Guia de Orientação Sexual
Histórias de Indisciplina Escolar
Introdução à Psicologia Escolar
Jean Piaget Sobre a Pedagogia
Oficina Criativa e Psicopedagogia
Pelos Caminhos da Ignorância e do Conhecimento
Professores e Alunos – Problema: um círculo vicioso
Produção do Fracasso Escolar, A
Programa de Leitura Silenciosa
Psicanálise e Educação – Laços Refeitos
Psicologia e Educação
Psicologia Escolar: em Busca de Novos Rumos
Psicopedagogia: Uma Prática, Diferentes Estilos
Saúde e Educação. Muito prazer!
Quatro Cores, Senha e Dominó
Quatro Cores, Senha e Dominó – Caderno para Atividades
Reunião de Pais: Sofrimento Ou Prazer?
Tecnologia no Ensino:Implicações para a Aprendizagem, A
Macedo, Lino de (Org.)
Crochik, Jose Leon
Machado, Adriana
Costa, Moacir
Vasconcelos, Mario Sérgio
Parente, Sonia Maria
Macedo, Lino de
Scarpa, Regina
Puig, Josep Maria
Piaget, Jean
Gtpos – Abia – Ecos
Cíntia Copit Freller
Patto, Maria Helena S.
Parrat, Sílvia
Allessandrini, Cristina
Parente, Sonia Maria
Mantovanini, Maria Cristina
Maria Helena S. Patto
Condemarin, Mabel
Bacha, Márcia Neder
Marilene Proença
Machado, Adriana M. (Org.)
Rubinstein, Edith
Maria Salum e Morais; Beatriz Souza (Orgs.)
Macedo, Lino (Org.)
Macedo, Lino (Org.)
Althuon, Beate G.
Joly, Maria Cristina Rodrigues (Org.)