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Projetando o entendimento de modelos de processos
públicos de prestação de serviço
Priscila Engiel 1,2, Renata Araujo1,2, Claudia Cappelli1,2
1
Programa de Pós Graduação em Informática, 2Núcleo de Pesquisa e Prática em
Tecnologia
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
{priscila.engiel, renata.araujo, claudia.cappelli}@uniriotec.br
Abstract. This paper suggests the use of process models as a way to improve
communication and transparency between public organizations and their
customers (citizens). It is proposed the design of the organization process
models aiming to increase their understanding by users outside the
organization. This design is based on a catalog containing features that
contributes to process models understanding and ways to design them in these
models. The use of the catalog is described using a real scenario application.
Resumo. Este artigo sugere o uso de modelos de processo como instrumentos
capazes de promover a comunicação e a transparência entre organizações
públicas e seus clientes (cidadãos). Propõe-se o projeto de modelos de
processo organizacionais visando o aumento do entendimento destes modelos
para usuários externos à organização. A adaptação é baseada em um
catálogo contendo características, operacionalizações e mecanismos que
podem ser implementados nestes modelos de processo de modo a contribuir
para o entendimento dos mesmos. O uso deste catálogo é descrito através de
um cenário real.
1 Introdução
As organizações estão cada vez mais interessadas em autoconhecimento, com o objetivo
principal de reduzir custo e tempo para execução de suas atividades [HINRICHSEN,
2005]. Um dos principais desafios para o alcance deste objetivo é tornar os processos da
organização entendidos pelos envolvidos em sua execução. Para tal, diversas
organizações vêm utilizando métodos e técnicas com a finalidade de construir modelos
que representem seus processos de negócio fazendo com que estes venham a servir à
disseminação de conhecimento sobre seu funcionamento entre os envolvidos com sua
gestão e execução [BARJIS, 2008]. Neste cenário, a apresentação de processos de
negócio através de um modelo tem se tornado uma importante forma de comunicação
entre os envolvidos (gestores, executores e usuários) [MELCHER et al,
2009][FERREIRA, et al , 2010].
Atualmente, as organizações públicas têm sido cobradas por sua capacidade de
oferecer transparência sobre seu funcionamento, desempenho e resultados. Tal
capacidade tem sido vista como um passo adiante na oferta de serviços eficientes por
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estas organizações. No Brasil, foi criada a Lei da Transparência [Projeto de Lei, 2009]
[Lei 131, 2009] que tem feito com que haja uma crescente disponibilização de
informações sobre as organizações em seus sites institucionais. Uma conseqüência disso
é, por exemplo, a Carta de Serviços [Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão],
que se tornou uma ferramenta obrigatória para órgãos do Poder Executivo Federal que
prestam atendimento direto ao público.
A transparência dos processos de prestação de serviços é um passo para a
ampliação da democracia e participação cidadã em assuntos públicos [DIIR ET AL
2010], [ENGIEL, ARAUJO, CAPPELLI, 2010], [DIIRR, ARAUIJO, CAPPELLI,
2009]. Tendo em vista que os modelos de processos são fonte de informação sobre o
funcionamento organizacional, este trabalho argumenta que os modelos de processos
também podem ser vetores essenciais para promover a transparência de processos de
uma organização pública. Entretanto, a apresentação dos serviços através destes
modelos de processo pode ser difícil entendimento pelos cidadãos, pois os mesmos
usualmente não detêm conhecimento sobre as técnicas para representação de processos.
Este público alvo tem a necessidade de utilizar o processo para obter o serviço prestado
e, em última instância, opinar a respeito do serviço, mas para isso, é necessário que haja
o menor número possível de barreiras para o entendimento destes modelos.
Desta forma, este trabalho propõe o projeto de modelos de processo elaborados
em iniciativas de gestão de processos nas organizações, para o entendimento de seus
usuários/cidadãos. Para guiar o projeto, este trabalho propõe a especialização do
catálogo de transparência definido em [CAPPELLI, 2009] para a criação de um
catálogo contendo características e formas de implementação de entendimento em
modelos de processos de prestação de serviços públicos. Este catálogo torna-se então o
instrumento a ser utilizado pelos analistas no projeto de adaptação de modelos de
processo de serviços públicos a serem apresentados aos cidadãos.
Este trabalho está organizado da seguinte forma: a seção 2 apresenta os objetivos
da gestão de processos de negócio e sua relação com a transparência organizacional; na
seção 3 é apresentado o catálogo de transparência que foi utilizado como base para a
definição de um catálogo de entendimento de processos de serviços públicos; na seção 4
é apresentado o catálogo de entendimento proposto. Na seção 5 é demonstrada uma
forma de aplicação do catálogo em um contexto real. Por fim, na seção 6 é apresentada
a conclusão do trabalho.
2 Gestão e transparência de processos de negócio
Com o objetivo de aumentar sua produtividade e conseguir destaque em sua área de
atuação, as organizações públicas e privadas estão, cada vez mais, investindo na gestão
de seus processos [PAIM et al, 2009]. A gestão de processos é vista como uma
atividade fundamental nas organizações, pois visa definir, aperfeiçoar e tornar mais
eficientes os seus processos operacionais. Esta atividade compreende um conjunto de
métodos e técnicas que auxiliam a organização na modelagem e gestão do seu negócio,
além de permitir a execução de um ciclo de melhoria contínua destes processos
[BALDAM et al, 2007]. O ciclo de melhoria contínua é composto pelas fases de
planejamento das atividades de gestão, modelagem e otimização de processos, execução
de processos e controle e análise de dados [BALDAM et al, 2007], como demonstrado
na Figura 1. A gestão de processos auxilia o acompanhamento dos processos, gerando
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dados históricos e indicadores, que ajudam o repensar desses processos a fim de tornálos mais eficientes. Além disso, o modelo do processo de negócio que está sendo gerido
pode ser usado como um instrumento de comunicação do seu funcionamento para a
organização [MELCHER et al, 2009][FERREIRA, et al 2010].
Este trabalho argumenta que uma organização que necessite dar transparência
sobre seu funcionamento para o mundo externo e que possua seus modelos de processo
construídos, poderia imaginar em divulgar diretamente estes modelos aos seus clientes,
como forma de prover transparência. No entanto, a transparência não se atinge somente
com a divulgação dos processos, dado que transparência não se dá somente
disponibilizando informação, mas, principalmente, fazendo com que a informação
disponibilizada seja compreensível [CAPPELLI, 2009] [FUNG, GRAHAM, WEILD,
2007][CAPPELLI, LEITE, 2008].
Neste trabalho trata-se entendimento como sendo a habilidade de
conscientemente reproduzir com suas próprias palavras uma informação que foi obtida
[CHAITIN, 2006]. Embora um estudo mais aprofundado sobre o assunto possa ser
necessário, é natural supor que as formas de apresentação de processos usualmente
utilizadas na modelagem de processo dificultem a capacidade de cidadãos comuns em
compreender e reproduzir as informações contidas nos modelos. Isto porque o foco da
maioria destas formas de apresentação está na representação de aspectos técnicos dos
processos.
No caso de empresas públicas, os cidadãos, são os clientes dos serviços
representados nos processos. Este público não está preocupado com aspectos e
finalidades técnicas do processo, como sua melhoria e automação, mas em entender
como o processo funciona de forma que ele possa ter o seu serviço prestado, fazendo
uso do mesmo, bem como contribuir com sua crítica/avaliação [DIRR, ARAUJO e
CAPPELLI, 2011a]. Para isso, é necessário que o modelo de processo gerado permita o
entendimento, sem que o cidadão necessite de conhecimento prévio de modelos de
apresentação ou notações para entendê-lo.
Para isso, faz-se necessário que os modelos que foram construídos com
finalidades internas de gestão organizacional sejam transformados a ponto de serem
entendidos pelos cidadãos. Este trabalho propõe a inserção de atividades de projeto dos
modelos de processo visando especificamente a transparência dos mesmos. Nestas
atividades o analista deverá incorporar ao modelo características de entendimento
(figura 1).
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Figura 1 - Projeto de modelagem com vistas ao entendimento pelos cidadãos
3 Catálogo de Transparência de Processos Organizacionais
Para se realizar um projeto de transformação de modelos organizacionais em modelos
que possam ser entendidos pelos cidadãos, é necessário definir quais as características
que tornarão esse modelo mais inteligível e conseqüentemente mais transparente.
Cappelli (2009) definiu o conceito de transparência organizacional. Na sistematização
deste conceito, Cappelli (2009) propôs um modelo composto de cinco graus para
transparência, onde cada um destes graus reúne um conjunto de características: i)
acessibilidade (possibilidade de acesso as informações), ii) usabilidade (uso das
informações oferecidas); iii) informativo (fornecimento das informações com
qualidade); iv) entendimento (entendimento dos processos e informações fornecidas); v)
auditabilidade (capacidade de realizar um exame crítico das informações fornecidas).
A reunião destas características que contribuem para transparência compõem o
Catálogo de Transparência [CAPPELLI, 2009]. Esse catálogo organiza as
características de transparência, indicando quais características são necessárias para
atingir cada grau e conseqüentemente a transparência. Catálogos são representações que
podem ser utilizadas para capturar conhecimento em várias situações. Além de
armazenar o conhecimento, também possibilitam o reuso do conhecimento armazenado
[CYSNEIROS, YU E LEITE, 2003], sendo utilizado como instrumento de design. Os
catálogos são considerados um artefato em constante evolução, podendo incorporar
novos conhecimentos provenientes de situações não vivenciadas anteriormente
[CYSNEIROS, YU E LEITE, 2003].
Em Engenharia de Software, catálogos têm sido normalmente utilizados para
armazenar características de qualidade e elementos para definição de requisitos não
funcionais. Definem uma forma sistemática para a decomposição desses requisitos,
além de um método para priorizar, operacionalizar e tratar interdependências entre eles
[CHUNG et al, 2000]. Catálogos reúnem também operacionalizações - conjunto de
práticas para serem seguidas com o objetivo de inserir determinada característica no
44
contexto desejado. Operacionalizações tornam-se realidade através de mecanismos de
implementação.
O catálogo de transparência foi criado seguindo a representação através de SIGs
(Softgoal Interdependency Graph). O SIG é uma estrutura hierárquica, onde as
características/tipos são representadas através de nuvens (softgoals). Softgoals são
conectados por links de interdependência, onde um softgoal “filho” contribui para o
alcance de softgoals “pais”. Em um SIG podem ser também representados os tipos de
contribuição entre os softgoals. Estes tipos de contribuição podem ser de “BREAK”
(contribuição negativa suficiente para que a característica superior não seja atendida),
“HURT” (contribuição negativa parcial para não atendimento da característica
superior), “UNKNOWN" (não se sabe se a contribuição é negativa ou positiva),
“HELP” (contribuição positiva parcial para atendimento da característica superior) e
“MAKE” (contribuição positiva suficiente para que a característica superior seja
atendida) como representado na Erro! Fonte de referência não encontrada.2 .
Cada característica que representa um determinado grau de transparência
[CAPPELLI, 2009][Cappelli e Leite, 2008] foi desdobrada em outras características que
contribuem para seu alcance, como apresentado na figura 2. Cada uma das
características foi por sua vez detalhada em operacionalizações em diagramas similares,
figura 3.
Figura 2 SIG de Transparência [CAPPELLI 2009]
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Figura 2- SIG de operacionalizações da característica de adaptabilidade [Cappelli, 2009]
4 Catálogo de características de entendimento para processos de
prestação de serviço público
O catálogo de transparência tem como objetivo definir as características que devem
permear os processos e informações de uma organização de modo a torná-la mais
transparente. Como neste trabalho, o objetivo é atingir o entendimento de modelos de
processos públicos de prestação de serviço, foi necessária a construção de um catálogo
específico de características de entendimento para este contexto. Esta seção apresenta a
definição deste catálogo, tendo como base o catálogo de transparência descrito na seção
anterior. A especificação deste catálogo incluiu as ações relacionadas a: a) identificar as
características de transparência relevantes para processos públicos; b) analisar as
interdependências entre elas, representando-as em um SIG; c) derivar
operacionalizações/implementações destas características.
4.1. Identificação de características relevantes
Como entendimento é o quarto grau do modelo de transparência proposto por
Cappelli (2009) e, segundo o modelo, algumas características de graus inferiores são
necessárias para a implantação degraus superiores, faz-se necessário alcançar algumas
características que compõe os graus anteriores como acessibilidade, usabilidade e
informativo para que se possa atingir o grau entendimento. Sendo assim, esses níveis e
as características que compõe o SIG de transparência (Figura 2) foram analisadas, sendo
identificadas as que contribuem diretamente ou que são necessárias ao entendimento de
processos de prestação de serviços públicos. São elas: adaptabilidade, amigabilidade,
clareza, concisão, intuitividade, simplicidade e uniformidade (tabela1).
Tabela 1 - Características de entendimento de processos públicos de prestação de
serviços
Característica
Descrição
Justificativa
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Adaptabilidade
Capacidade de mudar a apresentação
do processo de acordo com a
necessidade dos envolvidos
É necessário permitir mudanças na
apresentação do processo. O público
alvo dos processos de prestação de
serviços público pode ser composto
de diferentes perfis e cada perfil
pode ter interesses diferentes em
diferentes partes do processo sendo
necessário adaptar o processo ao
interesse do cliente em questão.
Amigabilidade
Capacidade de melhorar a interação
dos envolvidos com o processo
Intuitividade
Capacidade de apresentar o processo
aos interessados sem que estes
precisem de algum conhecimento
prévio sobre o domínio
Os clientes dos serviços públicos
podem ser usuários que não tem
conhecimento sobre a notação e do
domínio apresentado. O objetivo é
aproximar o processo desses
usuários, com isso a modelagem
desse processo não se preocupa com
as notações normalmente utilizadas,
alterando o modelo, por exemplo,
com o uso de metáforas para
apresentar os executores, eventos,
entradas, saídas, etc
Clareza
Capacidade
de
apresentar
conteúdo com nitidez
Simplicidade
Capacidade de apresentar o processo
a processo livre de obstáculos para o
entendimento
Concisão
Capacidade de resumir o conteúdo
do processo
Usuários normalmente sentem-se
mais satisfeitos com a obtenção
rápida da informação. A rapidez na
obtenção de informações relevantes
agiliza também a execução do
processo.
Uniformidade
Capacidade de fornecer ao processo
uma forma padronizada
Facilita o aprendizado:u ma vez
entendido um conceito relacionado
ao processo, na próxima vez que o
cliente se deparar com o modelo
com a informação da mesma forma,
ele irá fazer a correlação mais
facilmente,
não
necessitando
novamente realizar o mapeamento
do signo e de seu significado
o
Proporcionar o menor número de
obstáculos para o entendimento dos
processos
4.2. SIG
Apesar de todas as características identificadas terem uma contribuição positiva
para o entendimento (HELP), percebe-se que algumas características podem vir a ser
antagônicas entre elas. Por exemplo no caso de concisão e clareza, um modelo conciso
pode não ser claro dado que possa não conter todas as informações necessárias para seu
entendimento, o que poderia demonstrar uma contribuição negativa (HURT) entre essas
características. Na Figura 4, esta relação de contribuição negativa está representada.
Entre todas as demais características não foram identificadas através de suas definições
outras contribuições negativas. Sendo assim foram representadas entre elas somente
relações positivas (HELP).
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Figura 3 SIG de Entendimento para processos de prestação de serviços públicos
4.3. Operacionalizações
Foram criadas para cada característica, operacionalizações e mecanismos de
implementação. Na Tabela 2 são exemplificadas as operacionalizações e os mecanismos
para a característica de adaptabilidade.
Tabela 2 - Operacionalizações, mecanismos de implementação e justificativa da
característica de adaptabilidade
Característica: Adaptabilidade
Descrição
Capacidade de mudar a apresentação do processo de acordo com a
necessidade dos envolvidos.
Operacionalizações:
Permitir destacar as atividades importantes para as diferentes visões
necessárias.
Permitir visualizar diferentes elementos do processo em cada visão. Levar
em consideração quais os elementos importantes a serem demonstrados para
cada perfil de usuário.
Permitir adaptar a visão, dependendo do nível de detalhe que o cliente
necessita visualizar.
Mecanismos de implementação
Visão do cliente participante do processo - Destacar as atividades que ele
participa.
Visão do usuário - Apresentar o fluxo de execução do processo
Justificativa
Fornecendo mais destaque às atividades que o cliente participa ele dará pode
perceber mais rapidamente seu envolvimento com o processo.
Mostrar apenas os elementos do processo que são importantes para aquele
cliente, simplificando o modelo e facilitando a sua compreensão. Modelos
mais simples são melhor percebidos e a informação necessária é mais fácil
de ser compreendida.
5 Utilização do catálogo de entendimento
A proposta desse trabalho é que partindo dos modelos de processo já construídos na
organização, o analista de processos realize um projeto para transformar estes modelos
em modelos mais inteligíveis ao cidadão. Para tal ele usará como ferramenta o Catálogo
de Entendimento para Processos Prestação de Serviços Públicos (figura 5). A intenção é
que para cada característica presente no catálogo o analista de processos identifique as
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operacionalizações que podem ser implementadas e escolha para cada uma delas os
mecanismos apropriados para sua implementação dependendo do contexto de prestação
de serviços no qual está inserido. Espera-se que o resultado do projeto seja um modelo
mais inteligível a ser divulgado para o cidadão.
Figura 4 Cenário de uso do catálogo
Como premissa para a utilização do catálogo, os processos de prestação de
serviços públicos devem ter sido modelados utilizando a apresentação através de fluxo
de trabalho [Browining, 2009] [Aguilar-Saven,2004] [OMG, 2009]. A justificativa para
esta premissa é que o catálogo de entendimento foi estruturado através de
operacionalizações e mecanismos de implementação que consideram a existência de
elementos usuais deste tipo de apresentação: fluxo do processo, executores, atividades,
entradas, saídas entre outros.
Um estudo exploratório de utilização do catálogo foi realizado na Universidade
Federal do Estado de Rio de Janeiro (UNIRIO), uma instituição pública, que tem sido
exigida pelo Ministério do Planejamento e Gestão a melhoria de seus processos de
negócios (administrativos e acadêmicos). A Escola de Informática Aplicada (EIA) da
UNIRIO foi uma das unidades acadêmicas da UNIRIO a iniciar a modelagem de seus
processos. O diagrama apresentado na figura 6 compreende o processo de inscrição em
disciplinas da EIA. O processo foi modelado usando o eEPC (IDS SCHEER), uma
notação baseada em fluxos de trabalho.
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Figura 5 Modelo de processo de inscrição em disciplinas da EIA-UNIRIO
Para projetar um novo modelo, o analista deve selecionar, no catálogo de
entendimento (Figura 4), quais características são relevantes a serem consideradas neste
processo. Esta análise é subjetiva, onde o analista toma decisões baseado nos objetivos
da organização em tornar estes processos transparentes, nas características de seus
usuários, julgando quais aspectos tornam-se relevantes para a apresentação do modelo.
Os clientes para os quais a EIA-UNIRIO presta seus serviços são os alunos,
professores e técnico-administrativos do Curso de Bacharelado em Informática. Um
público alvo com alto nível de alfabetização e, em sua maioria, com raciocínio lógico
apurado. O objetivo da apresentação do processo é que os envolvidos conheçam melhor
o processo de inscrição, que ocorre 2 vezes por ano (ao início de cada período letivo), e
entendam suas regras de execução, evitando idas e vindas à secretaria e aumentando o
conhecimento dos alunos e professores em relação ao cuidado com a qualidade do curso
que justifica a presença de atividades, regras e papéis específicos, como o tutor. Neste
contexto, todas as características do catálogo foram consideradas importantes, já que o
público alvo é composto por diferentes perfis (adaptabilidade), não é conhecedor de
notação de processos (amigabilidade e intuitividade), não necessitam ter o
conhecimento dos detalhes do processo (concisão e simplicidade). Além disso, o
objetivo é que os usuários possuam o mínimo de obstáculos para compreender o
processo (uniformidade e clareza).
Para cada característica identificada, o analista deve avaliar as opções de
operacionalização definidas no catálogo, para sua implementação. No estudo
exploratório, foi proposta para a característica de adaptabilidade, por exemplo, permitir
a visualização de diferentes elementos do processo em cada visão.Como mecanismo de
implementação para esta operacionalização foi proposta a criação de duas visões
distintas: uma visão do cliente do processo (que pode não participar do processo, mas
deseja ter o serviço prestado), e uma do participante do processo (usuário executor do
processo). No caso da criação da visão do usuário do processo, algumas informações
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foram suprimidas, como por exemplo, a parte do processo que informa as atividades do
CPD, já que se acredita que os usuários só têm interesse em entender as tarefas que
possuem impacto direto na prestação do serviço solicitado. Para a visão do usuário
executor, as atividades no qual esse usuário é o responsável pela execução aparecem em
destaque. Além dessas atividades só aparecem no modelo as outras que tem ligação
direta com estas (recebendo ou enviando informação).
Para a característica de simplicidade, foi proposto como operacionalização
apresentar apenas as informações necessárias e utilizar poucos símbolos. A
apresentação somente do necessário já havia sido implementada na visão do usuário do
processo, quando foram suprimidas várias atividades do processo de modo a deixar
nesta visão somente as atividades que o usuário realiza. Além disso, suprimindo
algumas atividades, executores e caminhos alternativos, o modelo resultante passou a
possui um menor número de símbolos, contribuindo assim para a sua simplicidade.
Quanto à característica de amigabilidade, percebeu-se que a maioria da
audiência não era conhecedora das notações utilizadas para apresentação dos modelos
de processo. Assim, um dos mecanismos para aumentar a amigabilidade foi fazer uso
de relógios para representar os eventos de tempo. Outro mecanismo proposto foi o uso
de desenho de pessoas para representação dos papéis. Esses mecanismos também
aplicaram a característica de intuitividade ao modelo, já que tornou a linguagem mais
próxima do usuário.
O analista de processo também verificou que era necessário inserir a
característica de clareza no modelo de processo, pois se tinha como objetivo apresentar
o conteúdo com mais nitidez. Nesta característica, o catálogo sugere o uso de uma
linguagem do domínio do público alvo. Para isso foi utilizada uma linguagem do
domínio acadêmico e bastante direta, já que os profissionais da área de ciências exatas
são considerados muito objetivos. Outra operacionalização proposta foi o uso de um
padrão de descrição. Neste caso, o processo foi descrito simulando perguntas e respostas
de um FAQ. Foi também modificado o posicionamento dos executores deixando mais
explícita suas responsabilidades.
Outra característica incluída no modelo foi a uniformidade, pois facilitaria o
aprendizado. O catálogo de entendimento indicava como operacionalização a
padronização da notação e das informações textuais. Considerou-se então que esta
operacionalização já tinha sido realizada quando foi criado o padrão das descrições
textuais com o objetivo de inserção da característica de clareza. Outro mecanismo
implementado foi o uso de um glossário de termos, pois alguns alunos não estão
acostumados com a linguagem acadêmica
Por esse público ser bastante objetivo, foi aplicada também a característica de
concisão. A operacionalização proposta no catálogo para essa característica é o uso de
visões. Foi elaborada então a visão do fluxo de documentos. Nesta são apresentadas
apenas as entradas e saídas de cada atividade, retirando outras informações do modelo
como o fluxo, as regras e os executores. Outra visão elaborada foi a de regras de
negócio, mostrando as regras e suas relações com as atividades do processo, suprimindo
as informações de executores, fluxo, documento. O resultado desta transformação está
demonstrado na figura 7.
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Figura 6 Modelo de solicitação de inscrição em disciplinas adaptado
Uma observação direta e visual do modelo resultante aponta que este se tornou
menor que o modelo anterior. No modelo anterior existiam 15 atividades e 7 executores,
o modelo gerado possui apenas 7 atividades e 4 executores. Com a redução do tamanho,
imagina-se que sua a complexidade diminui. Detalhes envolvendo conectores e eventos
(importantes para a gestão de regras e automatização do processo) foram simplificados,
as responsabilidades ficaram mais evidentes, com a ausência das raias, e o texto está
completando o entendimento da figura, caso ainda existam dúvidas.
6 Conclusões
Esse artigo apresentou uma proposta para o projeto de modelos inteligíveis, a partir do
uso de um catálogo de características de entendimento de modelos de processo públicos
contendo características, operacionalizações e mecanismos de implementação. Este
catálogo torna-se um instrumento de design de modelos de processos organizacionais
em modelos de processos que podem ser entendido por cidadãos que não possuem
conhecimento sobre modelagem de processo e adaptados ao contexto do serviço
prestado e respectivo público alvo. A intenção é de que este instrumento possa ser
utilizado por organizações públicas prestadoras de serviço que já possuem seus
processos modelados para promover a transparência de seus processos ao cidadão.
O estudo exploratório apresentado neste artigo tinha o intuito de promover uma
avaliação preliminar da consistência do catálogo como instrumento capaz de organizar o
raciocínio para o projeto de um novo modelo. Como pesquisa futura, espera-se realizar
uma avaliação crítica do o uso do catálogo por diferentes analistas de processo que não
o próprio pesquisador. A ideia é realizar experimentações para validar o catálogo como
instrumento de design verificando o esforço de sua utilização e se o mesmo possibilita a
geração de modelos inteligíveis. Para verificar se os modelos resultantes se tornaram
inteligíveis, estes serão mostrados para os clientes e será verificada sua compreensão em
52
relação ao fluxo, regras, documentos, prazos. Outra pesquisa futura é aprofundar os
estudos sobre as contribuições entre as características do SIG de entendimento. Neste
caso deveriam ser avaliadas por outros pesquisadores as relações entre cada uma das
características.
Ainda como pesquisa futura espera-se avaliar a integração das contribuições
desta pesquisa com outros estudos em andamento no contexto do projeto Agora
(http://www.uniriotec.br/~agora). Em particular, sua integração com soluções para
promover conversas sobre processos de prestação de serviços públicos [DIIRR,
ARAUJO, CAPPELLI, 2011], visando à participação cidadã na melhoria de processos.
Agradecimentos
Este
trabalho
está
inserido
no
contexto
do
projeto
Ágora
(http://www.uniriotec.br/~agora) e no contexto do Instituto Nacional de Ciência da Web
(http://webscience.org.br/), sendo parcialmente financiado pela CAPES, FAPERJ e
CNPq.
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