Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 ESTUDO DOS NOMES DAS CIDADES DA 4ª COLÔNIA DE IMIGRAÇÃO ITALIANA DO RS Aline PEGORARO1 Vitalina Maria FROSI2 RESUMO: Este trabalho busca investigar a motivação e os sentidos dos nomes próprios das cidades da 4ª Colônia de imigração Italiana, localizada na região Centro-Oeste do Estado do RS. Para isso, julga-se necessário observar aspectos históricos, culturais e linguísticos neles compreendidos. Como não se tem conhecimento de estudos sobre o tema na referida região, esse trabalho pretende ser o primeiro a ser desenvolvido na perspectiva da Onomástica. Portanto, a presente investigação terá como base teórica a Onomástica e a Toponímia. Assim, buscar-se-ão princípios teóricos em Duzat (1926), Lognon (1920), Dick (1990, 1996), Carvalhinhos (2007, 2008), Frosi; Faggion; Dal Corno (2009), entre outros. Será feita uma categorização de acordo com o modelo apresentado por Dick para a realidade brasileira. O enfoque a ser dado será centrado na atividade de explicar a etimologia e a motivação dos nomes das nove cidades que compõem a 4ª Colônia de imigração Italiana do RS, relacionando com aspectos históricos da imigração na região. Entende-se que realizar uma retrospectiva histórica sobre o processo migratório na 4ª Colônia ajudará a entender melhor os fatores motivacionais que estiveram presentes na nomeação dos lugares derivados da área compreendida por essa Colônia. PALAVRAS-CHAVE: Topônimos; Etimologia; História. RESUMEN: Este trabajo busca investigar la motivación y los sentidos de los nombres propios de las ciudades de la 4ª Colonia de inmigración Italiana, ubicada en la región Centro-Oeste del Estado del RS. Para eso, se hace necesario observar aspectos históricos, culturales y linguísticos comprendidos durante la inmigración hasta hoy. Llevando en consideración que no hay informaciones de estudios sobre este tema en la región mencionada, ese trabajo pretiende ser el primer a ser desarrollado bajo la perspectiva de la Onomástica. Así siendo, esa investigación va a tener como base teorica la Onomástica – Toponimia, y serán buscados principios teoricos en Dauzat (1926), Lognon (1920), Dick (1990, 1996), Carvalhinhos (2007, 2008), Frosi; Faggion; Dal Corno (2009), etc. Será hecha una clasificación de acuerdo con el modelo presentado por Dick en la realidad brasileña y será dado enfoque en la actividad de explicar la etimología y la motivación de los nombres de las nueve ciudades que componen la 4ª Colonia de inmigración Italiana del RS, haciendo relación con los aspectos históricos de la región. Se comprende que, realizar un retroceso histórico sobre el proceso de inmigración en la 4ª Colonia, ayudará a comprender mejor los motivos que estuvieron presentes en el momento de la nominación de las partes originadas del área comprendida por esa Colonia. PALAVRAS CLAVE: Topónimos; Etimologia; Historia. 1 Mestranda em Letras, cultura e regionalidade na Universidade de Caxias do Sul, [email protected] Orientadora e Profª Drª. do Mestrado em Letras, Cultura e Regionalidade na Universidade de Caxias do Sul, [email protected] 2 1 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 1 Introdução Considerando-se que os estudos de Onomástica/Toponímia estão apenas iniciando no Rio Grande do Sul, atualmente, pelo que nos é dado saber, esses estudos se circunscrevem aos que estão sendo desenvolvidos pela equipe de pesquisadores do Projeto intitulado Toponímia da Antiga Colônia-1, comumente referido pela sigla-TOPAC-1, ligado ao Mestrado em Letras, Cultura e Regionalidade na Universidade de Caxias do Sul. O Projeto TOPAC-1 abrange os 12 municípios derivados da Antiga Colônia I (FROSI; MIORANZA, 1975, p. 54; 2009, p. 70). Por estar em desenvolvimento e constituir-se no primeiro Módulo de um Projeto maior, propicia o desdobramento de vários outros projetos. Dessa forma, abre espaço para novos projetos, como é o caso deste que busca estudar a toponímia da 4ª Colônia de Colonização Italiana, em sua origem, denominada Colônia Silveira Martins. Com referência à 4ª Colônia de Colonização Italiana este é o primeiro projeto de estudo a ser desenvolvido na perspectiva da Onomástica. Os nomes próprios de lugares carregam consigo a história desses lugares, portanto, este trabalho se propõe a descrever e explicar elementos linguísticos, culturais e históricos que foram determinantes na constituição dos nomes das cidades da 4ª Colônia de Imigração Italiana do estado do Rio Grande do Sul. Embora os nomes das cidades já sejam conhecidos e legitimados, seus significados são desconhecidos por grande parte dos habitantes dessas cidades. Com o passar do tempo, o signo toponímico se torna opaco. Desvelar essa opacidade é restituir ao signo toponímico sua transparência, propiciando, assim, aos habitantes dessas localidades, e às pessoas em geral, o conhecimento da relação estabelecida entre o nome, sua motivação e sentidos dos mesmos. No signo toponímico, estão implícitas tradições, crenças, valores e ideologias de um povo. Por isso, buscar a transparência dos topônimos é, ao mesmo tempo, revelar um conjunto de vivências singulares, explicitando a multiplicidade e diversidade alusivas aos povos habitantes daqueles locais. Este trabalho apresentará apenas resultados parciais, pois essa pesquisa vem se desenvolvendo na dissertação de mestrado. Ao final, buscar-se-á verificar quais sentidos têm os nomes próprios de lugares da Quarta Colônia de imigração Italiana, assim como qual a motivação do denominador ao dar determinados nomes e não outros. Será necessário observar também quais os aspectos históricos, culturais e linguísticos atuantes no processo de denominar os nomes próprios de lugares. Será necessário também para o desenvolvimento do trabalho a elaboração de uma lista dos topônimos e sua categorização de acordo com sua natureza física ou antropocultural, descrevendo e explicando trocas de nomes, possivelmente havidas, estabelecendo relações com o contexto cultural, fatos históricos e políticos, caso tenham influenciado o ato denominativo, assim como será necessário buscar o étimo desses topônimos. 2 Estudos onomásticos e toponímicos Em meados do século XIX, iniciam-se, formalmente, os estudos dos nomes próprios de todos os gêneros, centrados na atividade de explicar a etimologia desses nomes. Trata-se de estudos realizados à luz da ciência denominada Onomástica, considerada uma parte integrante da Linguística, mantendo, além disso, fortes ligações com a história e com a geografia (DICK, 1992). Na França, Auguste Honoré de Longnon, célebre arquivista, é considerado pioneiro com sua obra Noms de lieux de la France que veio a público em 1920, nove anos após sua morte. Ele é reconhecido como o fundador da toponímia francesa, desenvolvida com metodologia própria e com sistematicidade, características essas notáveis em todo o seu 2 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 trabalho. Começava, então, a pesquisa dos topônimos, centrada no estudo etimológico dos nomes próprios de lugares. Albert Dauzat e, depois, Charles Rostaing, dentre outros, dão prosseguimento aos estudos de Longnon, avançando significativamente com a produção de várias obras sobre o mesmo assunto. Em 1926, Albert Dauzat publica, em Paris, Les noms de lieux. Já na primeira página de sua obra, Dauzat (1926, p. 1) diz que, de modo mais notável do que acontece com os nomes de pessoas, “os nomes de lugares se apresentam a nós como palavras antigas, [...] cristalizadas e esterilizadas de modo mais ou menos rápido, esvaziadas de sentido original” 3. Dauzat chama a nossa atenção para o fato de que os nomes próprios, particularmente, os de lugares, são obscurecidos em sua carga semântica, às vezes também na forma, através de sua trajetória no tempo. Compara as camadas históricas com as “camadas geológicas dos terrenos sedimentares” caracterizando as primeiras como “bem mais numerosas” do que as segundas. Além disso, atribui aos estudos dos nomes de lugares uma origem mais remota do que a dos nomes de pessoas. “... enquanto os nomes de família mais antigos chegam apenas aos séculos XI e XII, na mesma época, a toponímia da Europa ocidental estava constituída em suas grandes linhas, afora os nomes de territórios mais recentes...” (DAUZAT, 1926, p. 2). Onomástica é palavra que deriva do grego onomastiké [téchnè] “arte de denominar.” No latim, essa palavra tem a forma onomasticon em que ónoma significa nome e conserva o mesmo significado que possuía em grego. Partindo disso, Carla Marcato (2009, p. 9-10) conceitua onomástica como “a ciência que estuda os nomes próprios nas mais diversas tipologias, também aqueles que pertencem a obras e gêneros literários.” A Onomástica compreende dois ramos igualmente importantes, isto é, a Antroponímia e a Toponímia. A primeira tem como objeto de estudo os nomes próprios de pessoa, a segunda ocupa-se do estudo dos nomes próprios de lugar. Esses termos são usados também com formas variantes: antroponímia convive com antroponomástica e toponomástica tem como equivalente toponímia. A grande maioria dos estudiosos situa, na Toponímia, os topônimos e hodônimos que, de acordo com sua constituição, são desdobrados em subcategorias e recebem denominações específicas como, por exemplo, hidrônimos (nomes dos rios e outros cursos d’agua); limnônimos (nomes dos lagos), orônimos (nomes dos montes e outros relevos); corônimos (nomes de subdivisões administrativas e estradas) fitotopônimos (nome de vegetais), antropotopônimos (nomes de pessoas ), conforme Dick (1992). A Antroponímia detém-se a estudar os prenomes, sobrenomes e apelidos, pois, possuem grande relevância para a história linguística, política e cultural de um país. O estudo dos antropotopônimos será efetuado, neste trabalho, caso apareça algum denominativo de lugar com utilização de nome de pessoa, uma vez que o foco deste trabalho é o estudo dos topônimos da 4ª Colônia de Colonização Italiana no Rio Grande do Sul. A seguir, serão expostos alguns princípios teóricos, indispensáveis para a análise dos dados da presente investigação. Por limites de tempo, não serão apresentados aqui, várias obras que contemplaremos, posteriormente, no decurso do estudo. Com referência ao estudo etimológico dos nomes de lugares, importa, ainda, explicitar o que diz Albert Dauzat (1926, p. 3): “Os nomes de lugares foram formados pela língua falada na região, na época de sua criação, e sofreram transformações de acordo com as leis fonéticas próprias dos idiomas que, eventualmente, suplantaram, pouco a pouco, o idioma original”. Embora a 4ª Colônia de Colonização Italiana tenha sua configuração em território brasileiro, sabe-se que ela foi fundada e desenvolvida por imigrantes italianos que falavam 3 Os textos de Dauzat (1926) que inserimos neste trabalho foram traduzidos do francês para o português pela pesquisadora Carmen Maria Faggion. 3 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 dialetos italianos. É provável que determinados nomes dessa área geográfica tenham tido, no passado, nomes cuja estrutura linguística tenha sido a dos sistemas dialetais de origem italiana, não a da língua portuguesa. Dauzat prossegue, pondo os estudos toponímicos em estreita relação com a história do lugar. “A toponímia, conjugada com a história, indica ou torna precisos os movimentos antigos dos povos, as migrações, as áreas de colonização, as regiões onde tal ou tal grupo linguístico deixou seus vestígios” (1926, p. 7). Mais adiante (p. 19-20), abordando a questão da categorização dos topônimos, diz que: A classificação das designações originais pode ser feita do ponto de vista de sua formação externa ou de seu sentido intrínseco. Vista pelo primeiro ângulo, a denominação é espontânea, obra mais ou menos inconsciente de uma coletividade, ou sistemática, quando ela se deve à ação refletida da autoridade, de um conquistador, de um fundador de cidade, etc. Ao contrário, se nos ocuparmos somente do sentido, os elementos da designação podem ser tomados de empréstimo quer à geografia (particularidades topográficas, etc.), quer ao homem (nome de um fundador, protetor, possuidor), quer a diversos aspectos abstratos ou de ordem histórica; elementos de natureza diversa podem entrar nos compostos” (DAUZAT, 1926, p.20). Dauzat reporta-se explicitamente às designações espontâneas atribuídas pelo povo da localidade. “Quando uma aglomeração, um rio, uma montanha foram denominados pela voz pública – esse foi, desde sempre, o caso mais frequente – o procedimento mais natural seria designar o lugar a partir de uma de suas particularidades topográficas mais chamativas” (1926, p. 21). Com referência a tais denominações espontâneas, de origem popular, Dauzat, nessa mesma página, acrescenta “os nomes de localidades merecem a esse respeito um exame mais atento. Os elementos de sua designação podem ser tomados de empréstimo à geografia física”. No Brasil, Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick (1990) retoma a modalidade de classificação proposta por Dauzat, faz uma sistematização das diferentes categorias, adaptando-as à realidade brasileira. Agrupa as diversas categorias de topônimos em dois blocos, reunindo-os de acordo com sua a natureza, ou de acidentes humanos, ou de acidentes físico-geográficos. Serão levados em conta estudos toponímicos do passado, por serem bastante esclarecedores de muitas questões atinentes a estudos dessa natureza. Principalmente, servirão de base para o desenvolvimento do presente estudo, os trabalhos de Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick, idealizadora do Atlas Toponímico do Brasil. Os princípios abordados por Dick ao longo de suas pesquisas são norteadores aos diversos Atlas Toponímicos em desenvolvimento nesse país. Carvalhinhos (2008) aponta alguns dados para melhor compreender como a toponímia vem sendo estudada no Brasil. Nesse sentido, destaca três posições principais dos estudos toponímicos após o século XIX. A perspectiva inicial, etimológica – ou seja, a toponímia como ferramenta para a reconstituição de línguas antigas; a segunda frente identifica-se no trabalho conjunto da toponímia com a geografia e cartografia, no sentido de se criar comissões normatizadoras para a terminologia geográfica; e a terceira perspectiva, uma mescla das duas perspectivas anteriormente descritas [...] Nos estudos realizados no Brasil cada vez mais há uma 4 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 aproximação à teoria lingüística, à dialetologia, sociolingüística, lexicologia, terminologia, cartografia, numa tentativa de se criar o que denominamos o texto toponímico (CARVALHINHOS, 2008, s/p). Como já mencionado, a Toponímia necessita apoiar-se na história, na sociologia e em outras áreas afins. É uma ciência de cunho interdisciplinar. A Toponímia “é um imenso complexo línguo-cultural, em que dados das demais ciências se interseccionam necessariamente” (DICK, 1996, p.15). A Toponímia, por si só, não explica o motivo que levou às denominações, essas explicações só serão descobertas após uma pesquisa que contemple também os aspectos extralinguísticos, os quais propiciarão elementos sobre a origem dos nomes. Uma análise toponímica pressupõe a busca de particularidades que não podem ficar apenas nas características mais evidentes apresentadas pelo nome, deve-se procurar, tanto quanto possível, ou seja, tanto quanto as fontes ou a documentação o permitirem, as origens mais remotas do denominativo [...] (DICK, 1996, p. 15). O verdadeiro sentido transcende o ato da nomeação, e o topônimo “é o instrumento dessa projeção temporal” (DICK, 1990, p. 22), ele retoma, muitas vezes, um passado talvez esquecido e permite através das suas características captar elementos próprios da mentalidade do povo da época. Carvalhinhos e Antunes (2007) mencionam que na maioria das sociedades ocidentais ocorre um esvaziamento semântico inerente á maioria das palavras. Em Toponímia esse fenômeno é denominado de “fossilização ou cristalização do topônimo” (s/p). Em países mais jovens, como o Brasil, existem muito mais nomes transparentes do que nomes o opacos. Para as autoras, isso ocorre por dois motivos: “O primeiro, mais óbvio, é por desconhecimento da língua em questão, o que leva à não decodificação ou não complementação do percurso decodificação daquele nome. No segundo motivo, o tempo e a sobreposição de camadas lingüísticas concorrem para a opacidade do nome [...]” (CARVALHINHOS e ANTUNES, 2007, s/p). Se o signo linguístico proposto por Saussure se define pela arbitrariedade, “visto que entendemos por signo a relação entre significante e significado, podemos dizer mais simplesmente: o signo linguístico é arbitrário” (SAUSSURE, 2000, p. 81), ou seja, “queremos dizer que o significante é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem nenhum laço natural na realidade” (SAUSSURE, 2000, p. 83). Na Toponímia, ele se apresenta motivado por diversos fatores. O estudo dos nomes dos lugares não se restringe ao conhecimento de sua significação linguística, mas também se estende às causas e origens da denominação que poderá remeter a outro idioma. Por isso, é necessário chegar à intenção do denominador no ato da nomeação, relacionando-a à motivação que levou o denominador a colocar o nome em questão. 3 Aspectos históricos Além dos estudos de Onomástica, de lexicologia e de etimologia, importam também abordagens de aspectos históricos, importantes para a 4ª Colônia de Colonização Italiana do Rio Grande do Sul. Uma retrospectiva histórica sobre o processo migratório na 4ª Colônia ajudará a entender melhor os fatores motivacionais que estiveram presentes na nomeação dos lugares derivados da área compreendida por essa Colônia. 5 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 As crônicas da colonização, escritas pelo Padre Luiz Sponchiado4 (1970), mencionam as grandes dificuldades pelas quais passava a população, por isso, a solução era migrar. De acordo com Frosi e Mioranza (1975), as lutas pela unificação da Itália agravaram os problemas econômicos e sociais principalmente nas regiões do norte, regiões essas de onde partiu a maioria dos imigrantes para o Brasil. Sponchiado (1996) faz menção à situação migratória na 4ª Colônia dando ênfase à cidade de Nova Palma e à importância das pesquisas realizadas constantes no Centro de Pesquisas Genealógicas. A partir de 1865, o Brasil passou a necessitar de mão de obra para trabalhar na agricultura. Dom Pedro II dá início à colonização cedendo terras devolutas à imigração. O governo brasileiro, sabendo da situação das lutas pela unificação da Itália e a situação de miséria em que o povo se encontrava, busca formas de incentivar e, de certa forma, iludir o povo italiano, para que, de fato, emigrasse. Assim que os imigrantes chegaram ao Rio Grande do Sul, nos portos de Rio Grande e Porto Alegre, havia um centro de convergência dos imigrantes, de onde eram, posteriormente, distribuídos para as Colônias. De Porto Alegre, seguiam para as Colônias de Conde d’Eu, D. Isabel, Caxias, Alfredo Chaves e, Silveira Martins. A criação de uma Colônia no centro da Serra, território pertencente à Santa Maria, é financiada pelo império. Os engenheiros mediram aproximadamente 716 lotes coloniais com 22 hectares cada um, e ali implantaram a sede provisória que se chamaria “Colônia de Santa Maria da Boca do Monte” por pertencer ao município de Santa Maria da Boca do Monte. Mais tarde, vai ser rebatizada por “Città Nuova” e, em 25 de abril de 1884, é denominada “Colônia Silveira Martins” 5. Em 20 de setembro de 1879, houve a suspensão dos auxílios para a imigração promulgados pelo Decreto 7.570. Porém, mesmo sem auxílios do governo, a corrente migratória continuou intensa, já que o os colonos que ali estavam aguardavam ansiosamente a vinda de seus patrícios, que haviam ficado na Itália, para um recomeço promissor. Na verdade, nem tão promissor assim, porém como não havia meios de voltar, a solução era de trabalhar e aguardar os que lá haviam ficado (SPONCHIADO, 1996). Em 19 de agosto de 1882, o Imperador assinou o decreto 8.644, determinando que a Colônia Silveira Martins fosse emancipada do regime colonial, passando ao regime da legislação comum a outros povos do Império. A partir dessa data, a Colônia passou a ser chamada oficialmente de “ex-Colônia” e passou a ser o 5º Distrito de Santa Maria. Foi a primeira Colônia da província a ser emancipada, já que as Colônias de Caxias, Conde d’Eu e Dona Isabel começaram a ser povoadas entre 1875 e 1884 e se emanciparam somente em 12 de abril de 1884 (SPONCHIADO, 1996). Superadas as dificuldades alusivas à chegada, os italianos dirigiram-se ao lote de terras compreendido pela Colônia Silveira Martins e começaram ali um longo processo de estabelecimento e permanência desses grupos. Muito tempo depois, dá-se o início da criação das cidades. As últimas, emancipadas nas décadas de 80 e 90. A 4ª Colônia possui como núcleo a Colônia Silveira Martins, nome dado em homenagem ao político Gaspar Silveira 4 Colhemos essas informações em escritos do Padre Luiz Sponchiado.Além dos compromissos ligados ao sacerdócio, ele foi um pesquisador que deu início aos estudos do Centro de Pesquisas Genealógicas da 4ª Colônia de imigração Italiana. O Centro de pesquisas se localiza na cidade de Nova Palma (cidade da 4ª Colônia). Nele, encontram-se documentos e informações históricas sobre a chegada e estabelecimento dos imigrantes na região. O padre também escreveu crônicas sobre a colonização, as quais foram publicadas no jornal “Voz do planalto”. Essas crônicas foram digitalizadas e estão disponíveis no Centro de Pesquisas Genealógicas de Nova Palma. 5 Informações obtidas no Centro de pesquisas genealógicas de Nova Palma. 6 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 Martins, por ter se empenhado junto ao governo na busca de auxílios financeiros para os imigrantes da Colônia. É sob esse viés da história que será dado enfoque aos aspectos migratórios, já que eles podem revelar informações imprescindíveis como determinantes na constituição dos topônimos que se encontram em processo de estudo. “À medida que um nome é identificado e seu sentido se torna transparente, ele permite que sejam ressaltados indicadores de identidade do local e de seus habitantes” (SARTORI, 2010, p. 12). Os nomes das localidades da 4ª Colônia que serão objetos desse estudo são nove: Nova Palma, Faxinal do Soturno, Ivorá, Dona Francisca, Agudo, Restinga Seca, Silveira Martins, Pinhal Grande e São João do Polêsine. Dentre os objetivos do estudo toponímico, está a categorização dos nomes e a motivação que envolve o ato denominativo. Para tanto, será aqui apresentada uma categorização prévia dos nomes das cidades segundo o modelo proposto por Dick (1990) e seguido pelos demais estudiosos brasileiros. 4 Um olhar histórico/onomástico sobre os nomes das cidades6 da 4ª Colônia de imigração Italiana O topônimo Nova Palma, por apresentar um elemento de indicação cronológica, isto é “Nova”, enquadra-se na taxionomia antropocultural. Quanto à sua natureza física é considerado um fitotopônimo por ser Palma um topônimo relativo ao nome de vegetais. Embora Dick (1990) saliente que é sempre o segundo termo que especifica o nome e dá a categoria, nesse caso, o primeiro termo também é relevante, pois a cidade de “Palma” já existia e, por isso, no momento da denominação oficial, não se repetiu, simplesmente, o mesmo nome, preferindo-se introduzir o adjetivo “Novo” precedendo ao nome “Palma” da cidade. Desta forma, foi preservado para a cidade o nome que indicaria uma homenagem à grande quantidade de coqueiros aí existentes e que eram chamados de “palmas” pelos imigrantes. A cidade de Nova Palma foi emancipada em 29 de julho de 1960, pela lei nº 3.933, publicada no diário oficial. Porém, é anterior a essa data a nomeação da cidade. Em 1907, a cidade já sofria a mudança de nomes, e recebia o nome de Nova Palma. Anteriormente, o território agora pertencente à cidade de Nova Palma, fazia parte do município de Julio de Castilhos. O topônimo Faxinal do Soturno é categorizado como um fitotopônimo da zona dos pinhais ou das araucárias. Os “faxinais”, mencionados por Dick (1990), caracterizam-se por apresentarem espécies mistas de vegetais de mata costeira e da zona das araucárias. Sabe-se que o nome da cidade foi motivado pelo fato de que, nos primeiros tempos havia grande extensão de pantanais ribeirinhos, campo coberto e escuro; Soturno deriva do fato de que era um local escuro e perigoso, principalmente, no inverno. Este município foi emancipado pela lei nº 3711 em 12 de fevereiro de 1959. Antes, esse território pertencia à cidade de Rio Pardo e o povoamento iniciou por volta do ano de 1884. Até o momento não foram encontrados documentos que comprovassem o fato de que a sede tenha sido antes “vila”. Sabe-se que Faxinal do Soturno foi elevada à categoria de cidade com a emancipação do município. Ivorá foi o núcleo norte distribuído entre as famílias de imigrantes que chegaram á Colônia Silveira Martins e que foi denominada Nova Udine, em homenagem à cidade italiana de origem dos imigrantes, isto é, Udine, na Itália. Posteriormente, o instituto histórico e geográfico deu o nome indígena Ivorá a uma das capelas construídas no núcleo, denominação 6 Algumas informações referentes aos nomes das cidades analisadas, foram retiradas do livro “Município: Teu NOME é um SUCESSO”, que busca expor sucintamente a motivação dos nomes das cidades do Rio Grande do Sul. 7 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 que significa “rio da praia formosa”. Em 1939, o núcleo norte passou à categoria de vila e sugeriu-se que os topônimos de procedência italiana fossem substituídos pelos de língua portuguesa, sendo o nome Udine, por esse motivo, substituído pelo denominativo Ivorá. Numa primeira categorização, é considerado corotopônimo por ser Udine o nome de uma cidade da Itália; a segunda denominação é hidrotopônimo porque é decorrente da presença aí de um rio. A criação do município se dá pela lei nº 8.597, de 9 de maio de 1988, mas o povoamento do local iniciou ainda em 1883, passando pelas troca de nome anteriormente referida. Anteriormente, esse território pertencia ao município de Julio de Castilhos. O topônimo Dona Francisca é homenagem à esposa de um colonizador, sendo dona Francisca Pereira Gonçalves Mostardeiro quem deu inicio à demarcação e fixou o “marco pião” que hoje se encontra na entrada do cemitério do município. Dona Francisca é um antropotopônimo. O município foi criado pela lei nº 4.993 de 17 de julho de 1965. Anteriormente a essa data o progresso já havia iniciado e, em 1959, Dona Francisca, distrito de Cachoeira do Sul, solicita sua emancipação, que ocorre cerca de seis anos depois. Agudo é um topônimo de natureza física, classificado como um geomorfotopônimo, pois o nome da cidade foi dado em decorrência de existir um morro de 629 metros de altura, localizado no oeste da cidade. A emancipação do município ocorre pela lei nº 3.718, de 16 de fevereiro de 1959, porém, o povoamento já havia iniciado por volta de 1857, período em que iniciam as primeiras nomeações e, por fim, é emancipado com o nome de Agudo. O território da atual cidade era pertencente às cidades de Cachoeira do Sul e Sobradinho. Restinga Seca é um geomorfotopônimo. O termo Restinga é devido a sua situação geográfica, por haver a presença de pedras em baixadas, à margem de arroios ou sangas; o termo Seca é originado de uma sanga que, em determinada época do ano, ficava com pouca água e cortava o curso. Este município foi criado pela lei nº 3.730, em 25 de março de 1959. Porém, o território antes pertencente ao município de Cachoeira do Sul, em 1982, passou a constituir o quarto distrito de Cachoeira. Mas só em 1959 houve a emancipação da cidade. Porém, manteve-se o nome dado ainda quando distrito. Silveira Martins é um antropotopônimo, pois o nome da cidade representa uma homenagem ao político Gaspar Silveira Martins, senador da república, no período da imigração, muito admirado pelos imigrantes. Martins é um antropotopônimo, apelido de família e também indica reverência a uma personalidade política do país. O município é criado pela lei nº 8.481 de 11 de dezembro de 1987, permanecendo o último nome dado ainda quando colônia de imigração italiana, pois, anterior a esse nome, houveram outras trocas de nomes. Antes da emancipação, Silveira Martins era distrito do município de Santa Maria. Pinhal Grande é um topônimo de natureza física. Pinhal é um fitotopônimo, pois o nome dado à cidade se deve à abundância de mata nativa, principalmente, pinhais (araucárias). Anteriormente, seu nome era São José dos Pinhais. O segundo denominativo é entendido como um exemplo típico do que pode ser considerado “o nome pelo próprio nome”; isso ocorre, muitas vezes, porque essa característica é aplicada em função de existir outro nome igual nas proximidades. Nesse caso, o termo que especifica o nome é o primeiro, pois foi Pinhal a motivação do nome da cidade. O município foi criado pela lei nº 9.600, de 20 de março de 1992. Já a ocupação do território iniciou por volta de 1813, quando iniciou o comércio de cavalos entre essa região e São Paulo. O território do município de Pinhal Grande, antes de sua emancipação, pertencia à cidade de Julio de Castilhos e Nova Palma. São João do Polêsine é um topônimo de natureza antropocultural; São João enquadrase na categoria dos hierotopônimos, subdividida em hagiotopônimo quando se refere ao nome de um santo da Igreja Católica, como é o caso de São e mitotopônimo, quando representado por uma entidade mitológica. Porém, a motivação do nome dá-se em homenagem à cidade de Polêsine, existente na Itália, devido à semelhança que possui com a 8 Anais do X Encontro do CELSUL – Círculo de Estudos Linguísticos do Sul UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná Cascavel-PR | 24 a 26 de outubro de 2012 | ISSN 2178-7751 cidade de planícies férteis do Vale do Rio do Pó, no norte desse país. Polêsine classifica-se como um corotopônimo por referir-se ao nome de uma outra cidade. O nome São João do Polêsine foi dado em decorrência da escolha do padroeiro São João Batista; então, uniu-se o nome do padroeiro São João com Polêsine (cidade italiana) e, daí resultando São João do Polêsine. Esse é mais um dos casos em que os dois termos são designativos do nome, prestando-se a uma dupla categorização. A emancipação do município se deu através da lei nº 9.601, de 20 de março de 1992. Anteriormente era território pertencente ao município de Faxinal do Soturno. 5 Considerações finais Longe de se fazer conclusões, pode-se dizer que esta pesquisa ainda está em fase de desenvolvimento e buscará considerar as questões históricas, culturais, lingüísticas, etc, aqui apresentadas. Assim, terá como parâmetro os estudos já desenvolvidos sobre Onomástica/Toponímia para realizar uma análise mais detalhada dos topônimos da 4ª Colônia de imigração Italiana no Rio Grande do Sul. Podemos dizer que os estudos toponímicos, quando aliados a uma pesquisa histórica, revelam importantes informações sobre o passado de um povo. Por isso, esse trabalho buscará expor através da análise dos topônimos, as escolhas feitas por uma comunidade, levando em consideração a origem étnica, o ambiente em que viviam antes de migrarem e, como isso se reflete nas escolhas dos nomes das cidades. Referências CARVALHINHOS, Patrícia de Jesus; ANTUNES, Alessandra Martins. “Princípios teóricos de toponímia e antroponímia: a questão do nome próprio”. Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Lingüísticos. Rio de Janeiro: CIFEFIL, 2007. Disponível em: http://www.filologia.org.br/xicnlf/2/09.htm. Acesso em: 27 de setembro de 2011. CARVALHINHOS, P.J. Estudos de Onomástica em língua portuguesa no Brasil: perspectivas para inserção mundial. In: Maria Célia Lima-Hernandes; Maria João Marçalo; Guaraciaba Micheletti; Vima Lia de Rossi Martin (Org.). A língua portuguesa no mundo. São Paulo: FFLCH-USP, 2008 (c). CD-ROM. Disponível em: http://www.fflch.usp.br/dlcv/lport/pdf/ slp14/01.pdf. Acesso em: 13 de setembro de 2012. 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