cusman
Ano 3 - Nº 9
Março/2015
COMPLIANCE
NA AMÉRICA
LATINA
Uma visão geral dos avanços e
desafios da área numa região
onde, com frequência, negócios e
relacionamentos caminham lado a lado
E MAIS:
Expectativas x realidade na carreira de compliance / Dá para calcular o impacto
da corrupção no balanço? / Uma entrevista com o novo ministro da CGU
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LEC
SUMÁRIO
6. Especial
Uma visão da área de compliance em alguns dos principais
mercados da América Latina.
14. LEC News
É nos países ricos que as
propinas mais são pagas.
21. Papo de Compliance
As tendências para ficar
de olho em 2015.
30. LEC News – Anticorrupção
O governo dos EUA conseguiu
enquadrar a Alstom.
36. Mercado
A nova diretoria de Governança,
Risco e Conformidade da
Petrobras é superlativa.
41. LEC News – RH
O recorrente problema das
terceirizações de mão de obra.
44 – LEC News – PLD
A Europa aperta o cerco contra a
lavagem de dinheiro.
18. Entrevista
O novo ministro da CGU, Valdir Simão,
fala com exclusividade à LEC.
24. Papo de Compliance
A carreira de compliance exige
muitos talentos que só podem ser
aprendidos com a vivência do dia
a dia. E os jovens profissionais
precisam aprender a lidar com isso.
33. Mercado
O dilema de oferecer ao mercado
e aos auditores um valor crível
para a corrupção.
38. Legislação
O estado de Goiás criou a sua
própria legislação anticorrupção.
O bom compliance officer
é pró-negócios.
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Diretora: Alessandra Gonsales
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REDAÇÃO E EDIÇÃO
42 – Setorial – Farma
As oportunidades no setor de
centros de saúde estão abertas
aos estrangeiros. Será que as
empresas daqui estão propntas
para aproveitá-las?
46 – PLD
50 – Pilares do Compliance
A primeira publicação de negócios
com foco em Compliance do Brasil
Os riscos de fazer parte de uma
operação criminosa devem servir
de alerta para novos setores da
economia sobre as políticas de PLD.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Fundador: José Luiz de Paula Jr.
Editor e Publisher: Aûani Cusma de Paula
Colaboraram nesta edição: Rafael Mendonça,
Beatriz Ces (Textos), Heloisa Barros (revisão)
e Eber Almeida (Arte)
Cusman Editora Especializada Ltda
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03
LEC
EDITORIAL
Oportunidades para
quem tem visão
A beleza da profissão de compliance officer é que ela te obriga a aprender e a se
reciclar permanentemente
A
América Latina é um lugar único para os profissionais de compliance. O ambiente corporativo é permeado pelas relações pessoais de
modo que parceiros de negócios se tornam
“melhores amigos” em pouquíssimo tempo.
O calor humano das pessoas dessa região certamente contribui para isso, tornando mais fácil a interação entre os
indivíduos e, no entanto, menos claras as relações de negócios, em muitos casos. Não que exista maldade sempre, mas
é inegável a possibilidade de ocorrer um maior número de
deslizes quando as relações são menos estritamente profissionais . Esse é apenas um dos aspectos que torna a América
Latina um campo fértil para os profissionais de compliance.
A este se somam uma tradição de governos intervencionistas, estatais de grande peso na economia, falta de capacidade para executar as legislações já existentes e por aí vai. Na
reportagem especial desta edição da LEC, você vai poder
entender a dinâmica de alguns mercados da região e descobrir que muitos dos problemas e desafios que os profissionais de lá enfrentam, já foram enfrentados por aqui.
De algum modo, isso reforça a liderança do Brasil na área,
mas não significa dizer que somos um celeiro de “craques” do
compliance. O potencial existe e a base que está sendo criada
- com muitos jovens correndo atrás do conhecimento especializado na área - é bastante promissora. Mas a formação de um
compliance officer demanda mais. A maturidade para tomar as
decisões difíceis, algo recorrente na profissão, vem com o tempo, das experiências vividas no dia a dia do negócio, de muita
sola de sapato gasta e, principalmente, da convivência com
pessoas de diferentes áreas e níveis hierárquicos. Infelizmente,
são habilidades que não podem ser aprendidas na escola. É
preciso viver para adquiri-las. E é isso que os jovens profissionais de compliance precisam compreender para serem bem-sucedidos em suas respectivas carreiras. Se focar no trabalho e
tiver humildade e paciência para aprender, em pouco tempo,
o mercado terá à disposição um profissional verdadeiramente
preparado para lidar com os desafios do compliance.
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Vítima ou cúmplice?
Em tempo. Será interessante ver num futuro próximo o “embate” conceitual (mas com reflexos bastante concretos) sob os
tratamentos conflitantes que serão oferecidos à Petrobras pela
Justiça brasileira e de outros países nos casos de corrupção.
As autoridades por aqui, inclusive a CGU, vêm dando a entender que a empresa estatal é exclusivamente vítima de uma
quadrilha que a dilapidou por mais de 10 anos.
Mas não é certo a estatal querer posar de santa a essa altura
dos acontecimentos. A Petrobras de fato teve o seu patrimônio
lesado por um grupo de corruptos. Ninguém discute isso. O
problema é acreditar que uma empresa do seu porte – com
ações em bolsas no Brasil e nos EUA e operando num setor
historicamente complicado – não dispusesse de controles mínimos para identificar esses problemas. Alguns deles, crassos.
Não são raros os que apresentam desafios à lógica e ao senso comum. O superfaturamento de obras como a Refinaria
Abreu e Lima era público, notório e evidente. Só a direção da
estatal, sofrendo de cegueira voluntária, não viu.
Para começar a reverter os estragos, entre outras medidas,
a petroleira criou uma diretoria de Governança, Risco e Conformidade. Sua estrutura será proporcional ao tamanho do
problema: serão 362 profissionais sob o guarda-chuva da nova
área. Mas, como até um principiante na área já sabe, para o
programa de compliance dar certo, o tom tem que vir do topo.
Será que agora ele virá?
Boa leitura!
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Alessandra Gonsales
Sócia-fundadora
[email protected]
Nº 09 - Março / 2015
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ESPECIAL
AMÉRICA LATINA
Terreno
fértil
Na América Latina,
os relacionamentos
interpessoais têm uma
importância na realização
de negócios de todos
os portes e naturezas
sem igual. Por isso a
abordagem sobre o
compliance para a região
é tão única e complexa
E
squeça a objetividade norte-americana,
a frieza e a sisudez
europeia e o formalismo dos asiáticos.
Na América Latina,
é sempre preciso
“quebrar o gelo” antes de entrar na
discussão de negócios propriamente
dita. Por isso, ainda que não exista
um vínculo pessoal minimamente
profundo entre as pessoas presentes,
6
elas querem saber como estão suas
respectivas famílias, como foi o final
de semana, o que se pensa sobre isso
ou aquilo... Em suma, nada muito
diferente do que acontece aqui no
Brasil.
Também há certa necessidade de
autoafirmação. Os latino-americanos
respeitam (ou temem) quem faz uso
da autoridade, muitas vezes confundida erroneamente com firmeza,
quando muitas vezes não é nada mais
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
do que uma falta de educação. Certo
gosto pelo autoritarismo não chega a
ser novidade numa região na qual todos os principais países sofreram com
ditaduras militares truculentas.
Mas as semelhanças não param
por aí. A intensidade das relações interpessoais no ambiente de negócios,
o que por si só já configura um risco
de deixar compliance officers do hemisfério Norte de cabelo em pé – até
que eles consigam nos entender –,
Nº. 09 - Março / 2015
PASSEO AHUMADA, EM
SANTIAGO, NO CHILE: o país é
um ponto fora da curva no ambiente
de negócios da América Latina.
se estende muitas vezes pelas esferas do poder público. E aí tudo fica
bem mais complicado. Boa parte da
economia da região está baseada em
recursos naturais como minérios e
metais, petróleo e produtos agrícolas.
Setores estes sempre muito regulados
pelo Estado. A soma dessa cultura de
relacionamentos pessoais, somada à
tradição estatal e intervencionista da
região, funciona como um rastilho de
pólvora. Não é à toa que tantos es-
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cândalos de corrupção aconteçam na
região e que Colômbia, México, Peru
e Argentina, quatro dos cinco países
cobertos por essa matéria, alcancem
colocações péssimas no ranking de
corrupção da Transparência Internacional. Todos eles estão ao redor da
100º posição. Ponto fora da curva,
o Chile está entre os 25 países menos corruptos do mundo e é líder na
América Latina. Apesar de altamente
dependente do cobre, o Chile estabe-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
leceu um modelo de governança econômica e administrativa, incluindo a
gestão de recursos públicos gerados
pelo metal, o que o diferencia na região. O Brasil está no meio do caminho entre as duas realidades.
Outro ponto de convergência é o
fato de os países latino-americanos
aprovarem boas leis, algumas até bastante sofisticadas do ponto de vista de
detalhamento e abrangência. Só que
na América Latina de maioria cristã,
o diabo vive nos detalhes e a execução
dessas leis parece ser um detalhe com
o qual os governos locais não se preocupam muito. Quando elas são sancionadas, surgem grandes discursos e
mobilização dos governos, e isso vem
acontecendo com mais frequência na
região. Mas, tão logo os holofotes se
apagam, a sensação é de que a nova
lei já cumpriu o seu papel, mas, na
prática, as leis acabam não sendo levadas tão a sério como poderiam.
Para entender melhor o estado
atual da área de compliance em quatro dos mais importantes mercados da
América Latina, LEC consultou profissionais renomados no assunto em
seus respectivos países. Nas próximas
páginas Fernando Cevallos, diretor
de Compliance da Control Risks, no
México; Hugo Sutil, gerente de Prevenção e Investigação de Fraudes da
EY Chile; Gabriel Cecchini, coordenador do Centro para Transparência
e Governança da IAE Business School, de Buenos Aires, na Argentina e
Sandra Orihuela, sócia da boutique
Orihuela Abogados, com escritórios
em Lima, no Peru e Miami (EUA)
compartilham suas opiniões e visões
sobre os avanços e também os desafios para a evolução do compliance
nesses mercados.
7
ESPECIAL
AMÉRICA LATINA
Foram feitos avanços importantes
na política pública de combate à
corrupção e à lavagem de dinheiro
nos países da América Latina?
Fernando Cevallos (México):
Sim, México, Colômbia e Brasil estão
amadurecendo nestes aspectos. No entanto, o que está em vigor ainda é pouco executado na prática. Esse será um
aspecto fundamental para sabermos o
nível real de comprometimento desses
governos em relação ao combate à corrupção e ao crime organizado.
Hugo Sutil (Chile): Nos últimos
anos, o Chile tem progredido nesse
aspecto com duas leis importantes,
como a Lei de Responsabilidade Criminal da Pessoa Jurídica (20.393) e a
Lei 19,913, que cria a UAF (Unidade
de Análise Financeira) e altera várias
disposições relativas à lavagem de dinheiro.
Gabriel Cecchini (Argentina):
Em 2011, o Código Penal argentino
foi alterado para incluir a lavagem de
dinheiro nas empresas. A Argentina é
membro e participante ativo da Convenção das Nações Unidas sobre Anticorrupção, bem como da Convenção
Interamericana contra a Corrupção
(MESICIC). O país também é membro da Convenção Anticorrupção da
OCDE, embora, neste caso, sua aplicação tem sido limitada. A Argentina
não conta com uma legislação como
o FCPA (EUA) ou a Lei da Empresa
Limpa (Brasil) – ainda que a OCDE
tenha recomendado recentemente que
o país sancionasse uma lei neste sentido. A mesma organização também
recomendou a introdução de uma legislação para proteger os denunciantes em casos de corrupção. Em 2012,
o governo federal criou uma unidade
especializada chamada Procelac, que
se encarrega de investigar e colaborar
em casos de lavagem de dinheiro, fraude e recuperação de ativos roubados.
Um portal online do governo federal
foi criado permitindo que indivíduos e
empresas possam localizar informações
úteis sobre os serviços públicos. E, por
fim, existe a Lei de Liberdade de Informação, uma legislação federal que
permite a visualização e a pesquisa de
dados públicos.
Sandra Orihuela (Peru): Alguns
avanços legais importantes para o combate à corrupção ocorreram recentemente no Peru. A Lei 30.111 que introduz a imposição de multas por crimes
de corrupção, a Lei 30.124, que altera a
definição penal do agente público, bem
como a Lei 30.161 e seus regulamentos
que exigem uma declaração juramentada dos rendimentos, bens e renda recebida pelos funcionários públicos foram
promulgadas. Além disso, várias entidades governamentais uniram esforços
para identificar e fornecer informações
sobre as ações e investigações judiciais
em curso envolvendo corrupção, terrorismo, tráfico de drogas e outros supostos crimes de candidatos políticos. Do
mesmo modo, um sistema de inscrição
online de visitantes exige que entidades governamentais publiquem, em
tempo real, os nomes de quem visitou
seus funcionários. São ações que contribuem para aumentar a transparência
e gerar mecanismos de controle social
no país.
Talvez o avanço mais significativo no
combate à corrupção é o esforço político liderado pela Comissão Anticorrupção para inserir o Peru na Convenção
da OCDE por meio de projetos legislativos que atribuam a responsabilidade
penal às empresas envolvidas em crimes de suborno. Segundo as leis peruanas, só a pessoa física que cometeu o
crime pode ser julgada – não a empresa
–, incluindo o crime de corrupção de
um funcionário público estrangeiro.
No momento, existem dois projetos de
lei para regular a responsabilidade penal das empresas envolvidas em crimes
de suborno. O primeiro foi aprovado
pela Comissão Anticorrupção em dezembro de 2013 e apresentado ao Congresso em 10 de setembro de 2014. Sob
o nº 3851/2014-CR, a “lei que regula
a responsabilidade criminal das empresas e impõe sanções a pessoas jurídicas
em matéria de corrupção” busca alterar
parcialmente o artigo 105 do Código Penal peruano. O projeto aguarda
aprovação pela Comissão Parlamentar
Mista de Justiça e Direitos Humanos.
Um segundo projeto de lei aprovado
pela Comissão Anticorrupção foi apresentado ao Congresso em 3 de dezembro de 2014, sob o nº 4054/2014-PE,
“lei que regula a responsabilidade penal autônoma para pessoas jurídicas em
crimes de corrupção”. Ele visa impor
O setor privado não parece apoiar os
projetos legislativos que visam regular a
responsabilidade penal autônoma para as
empresas envolvidas especificamente em
crimes de suborno. Sandra Orihuela
8
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº. 09 - Março / 2015
BOLSA DE VALORES DE BUENOS AIRES,
NA ARGENTINA: falta de clareza nas regras e
o modo como elas são executadas dificultam os
planos de longo prazo nas empresas.
RANKING DE
PERCEPÇÃO DA
CORRUPÇÃO
PAÍS
POSIÇÃO ÍNDICE
Chile
21º73
Brasil 69º43
Colômbia 94º
37
Peru 103º35
México 103º35
Argentina107º 34
Fonte: Transparência Internacional/2014
DOING BUSINESS 2015 ÍNDICE DE
O ranking leva em conta uma série
DESENVOLVIMENTO
de indicadores para classificar
HUMANO
a facilidade para fazer negócios
dentro dos diferentes países
PAÍS POSIÇÃOÍNDICE
Colômbia34º
72,29
Peru 35º72,11
México39º 71,53
Chile 41º71,24
Brasil 120º58,01
Argentina124º 57,48
Fonte: Banco Mundial
PAÍS
MEMBRO DA OCDE?
PAÍSSTATUS
ChileSim
MéxicoSim
Argentina Não. Mas é signatário da convenção de combate à corrupção
Brasil
Não. Mas é signatário da convenção de combate à corrupção
Colômbia Não. Mas é signatário da convenção de combate à corrupção
Peru
Não. Está em processo de adesão ao tratado de combate à corrupção
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O indicador da ONU surge
como um contraponto
ao tamanho do PIB,
avaliando os países não
só pela sua dimensão
econômica, mas também
por indicadores de saúde,
educação, sustentabilidade,
participação e renda.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
POSIÇÃO ÍNDICE
Chile
Argentina
México
Brasil
Peru
Colômbia
41º0,822
49º0,808
71º0,756
79º0,744
82º0,737
98º0,711
9
ESPECIAL
AMÉRICA LATINA
REGIÃO DO MERCADO CENTRAL EM
LIMA, CAPITAL DO PERU: o governo
quer o país como signatário da Convenção
Anticorrupção da OCDE. Mas o setor privado
não tem colaborado para isso.
responsabilidade penal à própria pessoa jurídica, dissociada da responsabilidade do agente individual. A lei seria
aplicável a todas as entidades privadas
– incluindo as associações não registradas, fundações e comissões e empresas
irregulares – envolvidas em crimes de
corrupção estabelecidos nos artigos
384, 387, 397-A, 398 e 400 do Código Penal peruano. Este projeto de lei
aguarda aprovação pela Comissão Parlamentar Mista de Descentralização,
Regionalização, governos locais e Modernização da Gestão Governamental.
Se aprovados, os projetos de lei poderão
ser apresentados na próxima agenda do
Congresso para sua revisão e eventual
aprovação ou rejeição.
Apesar de ambos os projetos de lei
aguardarem a aprovação pelas Comissões Parlamentares no Congresso peruano, o esforço político permitiu ao
país tornar-se membro participante do
Grupo de Trabalho da OCDE sobre
suborno em transações de negócios internacionais.
Os avanços são dignos, mas o país ainda
não foi capaz de avançar com importantes peças de legislação anticorrupção,
que abordam matérias significativas
como a imposição de responsabilidade
corporativa penal; a retirada de um estatuto de limitações para crimes de corrupção; a duplicação do prazo de prescrição em curso, chamada de “morte
civil”, para os devedores de pagamentos
de reparação por crimes contra o Estado; e a exigência de que lobistas devem
declarar os interesses que representam;
bem como os regulamentos para proteger denunciantes e testemunhas.
10
Qual é o papel das empresas privadas na divulgação dos temas relacionados à ética e compliance no
país? E como as empresas locais estão inseridas neste movimento?
Fernando Cevallos (México): Depois de viver e trabalhar por muitos
anos no Brasil e hoje vivendo no México, eu posso comparar os dois países. O México hoje é como o Brasil no
início de 2009, quando o tema compliance começou a aparecer, mas, ainda assim, era difícil escutar a palavra
corrupção publicamente em reuniões.
Este é um exercício que está em curso
e as multinacionais no México estão
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
tomando a liderança nessa onda do
compliance, algo muito semelhante ao
que aconteceu no Brasil. Nos outros
países da região, a Colômbia está se
inserindo nessa tendência, bem como
Peru em alguns aspectos. Já o Chile
está mais maduro e tem abordagens
mais públicas sobre ética e conformidade. Os outros países, incluindo os
da América Central, ainda estão em
estágio muito primário - ou mesmo
nulo - em alguns casos.
Hugo Sutil (Chile): O papel das
empresas privadas é fundamental nesta
matéria, uma vez que elas são o alvo da
maior parte desta nova regulamentação e têm a responsabilidade de impleNº. 09 - Março / 2015
e pequenas empresas locais. As ações
coletivas são outra ferramenta interessante que as empresas estão começando a usar localmente para nivelar
o campo de jogo em um setor específico ou por projeto. Funcionam como
um pacto de integridade, uma declaração anticorrupção ou um acordo de
princípios, estabelecendo que todas
as empresas envolvidas colaborem no
estabelecimento de novos padrões de
integridade de uma forma proativa,
ajudando a complementar os esforços
realizados no setor público.
Sandra Orihuela (Peru): As empresas locais têm sido incluídas nas
discussões do governo peruano para
buscar a adesão à Convenção da
OCDE. O setor privado não parece
apoiar os projetos legislativos que visam regular a responsabilidade penal
autônoma para as empresas envolvidas
especificamente em crimes de suborno. Atualmente, a lei peruana prevê
que apenas os indivíduos podem ser
criminalmente responsáveis por cometer um delito. As empresas não estão
sujeitas à responsabilidade penal; no
entanto, elas podem estar sujeitas a
certas sanções administrativas e de responsabilidade civil em casos de ações
relacionadas com a corrupção.
mentar medidas internas em relação a
esses aspectos éticos e de compliance
exigidos por lei.
Gabriel Cecchini (Argentina): As
subsidiárias das grandes multinacionais na Argentina desempenham um
papel crucial na promoção e na divulgação da ética e da conformidade por
meio da implementação de ferramentas e programas de compliance cada
vez mais sofisticados - com agentes de
compliance em tempo integral, treinamentos online e interativos, canais
de denúncia etc. Elas acabam definindo o padrão para o resto do ambiente corporativo, incluindo a sua cadeia
de negócios, como grandes, médias
www.lecnews.com.br
Existe alguma peculiaridade cultural importante no que diz respeito
à forma como os negócios são realizados no país e que, por desconhecimento, pode ser mal interpretada
pelos profissionais e empresas estrangeiras?
Fernando Cevallos (México): O
México é um país grande como o Brasil.
Na capital, Cidade do México, tudo é
mais formal e os negócios giram em torno do governo federal. É comum você
ver executivos tomando café da manhã
com qualquer figura política e isso não
quer dizer que eles estão tratando de
qualquer assunto suspeito, mas depen-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
O contexto cultural
(argentino)
apresenta seus
próprios desafios de
acordo com a cidade,
província e distrito
onde as empresas
operam e as partes
interessadas.
Gabriel Cecchini
dendo de como as pessoas percebem
aquele encontro e começam a especular
isso pode gerar um mal-entendido. Na
verdade, isso vai depender muito dos padrões da empresa e, ao final, dos valores e
do conceito de ética dos indivíduos. Em
outros estados e regiões do país, tudo é
sobre as conexões (pessoais) e como você
pode obter vantagem a partir dela. Isso
é muito comum não só no México, mas
na América Latina em geral.
Hugo Sutil (Chile): Às vezes as
empresas estrangeiras estabelecidas no
país não têm um conhecimento exato
do mercado local. Também acontece
de empresas estrangeiras, ao adquirir empresas locais, delegarem a gestão
11
ESPECIAL
AMÉRICA LATINA
O Chile tem
progredido com
leis importantes,
como a Lei de
Responsabilidade
Criminal da Pessoa
Jurídica e a Lei que
cria Unidade de
Análise Financeira.
Hugo Sutil
da companhia à equipe local, que, por
vezes, continua a funcionar da mesma
maneira como operava antes de ser adquirida. Em alguns casos, esta forma de
funcionamento não está alinhada com
uma gestão responsável e leal.
Gabriel Cecchini (Argentina): A
Argentina apresenta às empresas internacionais problemas comumente encontrados em outros mercados emergentes.
Legislações, normas e regulamentos
existem, mas frequentemente, não são
impostos pelas autoridades locais em diferentes níveis de governo e órgãos reguladores. Às vezes, a diferença entre o que
a legislação estabelece e a sua execução
12
prática em caso de infração é enorme e
de difícil compreensão para empresas
e profissionais estrangeiros. A fraqueza
das instituições, a volatilidade econômica, mudanças regulatórias imprevisíveis
e atualizações também são uma fonte de
preocupação para as empresas na hora
de avaliar suas decisões dentro de planos de longo prazo. O contexto cultural
apresenta seus próprios desafios de acordo com a cidade, província e distrito
onde as empresas operam e as diferentes
partes interessadas.
Sandra Orihuela (Peru): Infelizmente, a informalidade permanece
como a principal preocupação ao se fazer negócios no Peru. Embora a situação
tenha melhorado, a aceitação de práticas
de negócios “menos limpas” continua a
ser uma cultura tolerada no Peru.
Em sua opinião, quais os três principais desafios relacionados ao compliance que precisam ser superados
para construir uma cultura de conformidade que esteja presente no dia
a dia do país?
Fernando Cevallos (México): Saber
se os funcionários, em todos os níveis,
entendem a cultura de compliance da
empresa; como eles agem quando estão enfrentando um dilema de conformidade; e, uma vez que é reportado, se
a empresa realiza uma ação imediata e
independente para resolver o problema
e atenua o risco de que ele volte a acontecer no futuro.
Compliance é sobre ser um big brother:
depende de cada empregado e é um
equilíbrio entre o crescimento sustentável do negócio e práticas boas e transparentes. No entanto, na América Latina,
se você se apresenta de maneira muito
mole ou fraca, pode sofrer as consequências no futuro.
Hugo Sutil (Chile): Consciência. A
administração da companhia deve estar
consciente da necessidade de investir
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
tempo e recursos nas áreas de conformidade, e não considerá-la como um gasto
desnecessário ou, simplesmente, como
uma exigência. Ela precisa entender que
a não aplicação do compliance pode causar a exclusão da empresa do mercado.
Implementação: as empresas devem ser
capazes de implementar os sistemas de
compliance, por isso toda a companhia
precisa entender a importância desses
sistemas e a necessidade de convergir
com eles.
Desenvolvimento: cada empresa, dependendo do setor em que atua, do seu tamanho, atividade, etc., no futuro, deve
ser capaz de melhorar e desenvolver esses
sistemas de compliance.
Gabriel Cecchini (Argentina): O
compliance deve ser considerado não
apenas como um conjunto de regras e
normas baseadas numa estrutura punitiva. Mais importante é que ele sirva
como base para a criação de uma cultura
de integridade, gerando consciência sobre os riscos da corrupção e as estratégias que podem ser usadas para vencer
os dilemas práticos que são enfrentados
no dia a dia, em vez de apenas obrigar
Nº. 09 - Março / 2015
CAFÉ NA CIDADE DO MÉXICO:
na capital federal é comum o
convívio com políticos, o que às
vezes gera mal-entendidos.
O México hoje é como o Brasil no início
de 2009, quando o tema compliance
começou a aparecer, mas, ainda assim,
era difícil escutar a palavra corrupção
publicamente em reuniões. Fernando Cevallos
os funcionários a “internalizar” as normas e regras de um modo repetitivo e
monótono.
Os programas de compliance não devem
começar (e acabar) em códigos de conduta
e na sua assinatura pelos funcionários. Os
códigos são elementos muito importantes,
mas se o seu conteúdo não é permanentemente estimulado de forma abrangente e
por meio dos outros elementos do programa, o seu valor é limitado.
Conselhos de administração e diretoria
precisam mudar suas atitudes em relação
ao compliance e começar a considerá-lo
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como uma área-chave que cada vez mais
vai ter impacto nas suas decisões estratégicas de negócios. Eles precisam criar comitês específicos dentro dos boards para
abordar essas questões. Os compliance
officers também precisam se reportar diretamente a eles em uma base regular,
participando das reuniões do conselho e
dos comitês executivos.
Sandra Orihuela (Peru): O principal desafio continua a ser mudar a
mentalidade da maioria da população
em relação à corrupção. Embora tenha
havido progresso a esse respeito, parece
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
que a população ainda tem que reconhecer o valor de viver e fazer negócios em
um ambiente limpo, onde as pessoas e
as empresas são capazes de competir em
uma base uniforme e igual ao invés de
ganhar vantagem por meio de práticas
corruptas. Os peruanos têm visto a mudança dramática e a prosperidade econômica que o país alcançou, e há esperança
de que as novas gerações vão aprender
a associar a prosperidade atual do país
com um ambiente menos corrupto e
uma concorrência leal. A mudança cultural vai levar tempo, mas é possível.
13
LEC
NEWS
Mais riqueza, mais propinas
É
provável que, até pelo senso
comum, o leitor acredite que
a maior parte dos casos de corrupção internacional acontece
nos países em desenvolvimento. Mas um
estudo recém-divulgado pela Organização para o Desenvolvimento Econômico
(OCDE), que reúne principalmente países desenvolvidos, aponta para o oposto.
Os subornos internacionais são geralmente pagos por agentes de países ricos
para agentes públicos de países ricos,
especialmente para ganhar contratos de
empresas públicas ou controladas pelo
Estado nas economias avançadas.
O relatório de suborno estrangeiro
da OCDE analisou mais de 400 casos
de corrupção de funcionários públicos
estrangeiros envolvendo empresas ou
indivíduos de 41 países signatários da
Convenção Anticorrupção da OCDE.
Os casos ocorreram entre fevereiro de
1999 - quando a convenção entrou em
vigor - e junho de 2014.
De acordo com o estudo, a maioria
dos subornos internacionais é paga por
grandes empresas, geralmente com o conhecimento da alta administração. Em
41% dos casos, funcionários de nível
gerencial pagaram ou autorizaram o su-
14
borno. A participação do principal executivo das empresas aconteceu em 12%
das situações. Intermediários estiveram
envolvidos em três de cada quatro casos
de suborno estrangeiro. Para a organização, o uso intenso desses agentes reforça
a necessidade de uma diligência mais
eficaz, de fiscalização dos programas de
compliance das corporações, e de um
maior envolvimento dos executivos das
empresas a dar o exemplo no combate ao
suborno estrangeiro.
O VALOR DO PROBLEMA
A propina paga nos casos analisados, em
média, equivalia a 10,9% do valor total
da transação e a 34,5% dos lucros – que
alcançaram o equivalente a US$ 13,8
milhões por suborno. Mas a própria
OCDE reconhece que, dada a complexidade e a natureza oculta de transações
corruptas, os valores representam apenas
a ponta do iceberg.
Quatro setores concentram a maior
parte dos casos: a indústria extrativa, que
lida com recursos naturais quase sempre
controlados pelo Estado - além de altamente regulada - responde por 19% dos
casos. O mercado de construção civil
soma 15%, mesmo número da área de
transporte e armazenamento (15%). As
empresas de informação e comunicação,
setor que conta com inúmeras estatais
em países desenvolvidos – especialmente
na Europa e também bastante regulada
pelos governos - responde por 10% dos
casos analisados.
Empregados de empresas estatais foram o destino da propina em 27% dos
casos. Funcionários aduaneiros (11%),
as autoridades de saúde (7%) e funcionários da Defesa (6%) vêm na sequência.
Mesmo nos países mais desenvolvidos, o alto escalão da política está sempre disposto a receber (ou cobrar) por alguns favores. E quanto mais alto o posto,
maior o preço. Por isso, apesar de serem
o alvo de 5% das ofertas de propina, chefes de Estado e ministros arremataram
11% - ou mais do que o dobro do total
de subornos prometidos ou pagos.
LÁ COMO CÁ
Para os brasileiros, escaldados no assunto,
não chega a ser uma novidade que a maior
parte da corrupção - independentemente
de onde seja praticada - acabe tendo como
objetivo principal garantir contratos vantajosos com o governo. Em mais da metade dos casos analisados, os subornos
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº 09 - Março / 2015
Onde o crime não compensa
E
AVIÃO DA PORTUGUESA TAP:
maior parte das propinas é paga
nos países ricos.
foram pagos para a aquisição de contratos
públicos. A obtenção de facilidades aduaneiras, uma questão perigosíssima em
tempos de terrorismo transnacional crescente – que se financia muitas vezes com
a venda de produtos falsificados ou contrabandeados –, aparece, na sequência,
com 12%. A obtenção de benesses fiscais
– um aspecto sofisticado e quase sempre
de mais difícil investigação - foi a terceira
causa de suborno, com 6% dos casos.
Outra informação do estudo que dá
algum alento aos brasileiros, que esperam anos para ver casos de corrupção
ser efetivamente julgados é que o tempo
necessário para concluir os processos subiu drasticamente ao longo dos últimos
quinze anos. Para os casos concluídos
em 1999, foram necessários, em média,
dois anos. Atualmente, a média para
a conclusão dos casos é superior a sete
anos. Para a OCDE, isso pode refletir a
crescente sofisticação dos métodos adotados pelos corruptores e, também, a
complexidade para as agências nacionais
de aplicação da lei para investigar os casos em vários países.
“A prevenção do crime nos negócios
deve estar no centro da governança corporativa. Ao mesmo tempo, os contratos públicos devem tornar-se sinônimo
de integridade, transparência e responsabilidade”, disse o secretário-geral da
OCDE, Angel Gurría.
www.lecnews.com.br m Hong Kong, um território
semi-autônomo da China, mas
colonizado e aculturado pelos
britânicos até o ano de 1990, um jovem foi condenado a dois meses de
prisão por tentar subornar o seu examinador do teste de condução com
uma nota de 500 dólares de Hong
Kong (pouco menos de R$ 200,00).
Trabalhador de um depósito de
contentores, Leung Kin-Ming, de 22
anos, se declarou culpado de uma
acusação por oferecer vantagem
para um funcionário público, infringindo a Portaria de Prevenção à Corrupção. Cerca de três minutos após
o início do teste, quando o veículo
parou em um semáforo, o réu tirou
uma nota de 500 dólares de Hong
Kong e deu para o examinador, dizendo: “Senhor, para que você possa tomar um chá”. Apesar da recusa
do examinador em aceitar a nota, o
réu repetiu a oferta. O examinador
disse ao réu para dirigir o veículo de
volta ao centro de condução e, ao
chegar, chamou a polícia e contou
ao seu supervisor sobre o assunto.
No mesmo dia, Kin-Ming foi preso
pela polícia e o caso encaminhado
para o ICAC, a agência de combate
à corrupção de Hong Kong.
Ao passar a sentença, o magistrado disse que como subornar um funcionário público era um crime muito
grave, o tribunal teria de aplicar uma
TRÂNSITO EM HONG KONG: do suborno à
prisão em apenas dois dias.
pena de prisão imediata para o réu,
de modo a servir como um impedimento. O magistrado acrescentou
que depois de levar em conta vários
fatores, inclusive a confissão de culpa do réu e de sua pouca idade, ele
optou por reduzir a pena incial de três
meses na cadeia para dois meses.
O magistrado ainda repreendeu
o réu por tentar minar o sistema de
exame de condução, causando injustiça a outros candidatos e riscos
de segurança à população.
Detalhe que chama atenção: entre a prisão e o início do cumprimento
da sentença foram necessários apenas dois dias. E o valor oferecido pelo
réu ao examinador foi confiscado.
Edição atualizada
A Corregedoria-Geral da União
(CRG), braço da Controladoria-Geral
da União (CGU), disponibilizou na
internet o Novo Manual de Processo
Administrativo Disciplinar (PAD). A
publicação, elaborada em 2011, fornece aos servidores na área de correição
do executivo federal – como corregedores e ouvidores - o suporte e um
modelo de padronização que facilita
o desempenho das suas atividades.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Na seção “Atividade Disciplinar”, por
exemplo, é possível encontrar modelos
de documentos, slides das aulas e legislação relativa ao assunto.
A nova edição inclui um capítulo
dedicado à Lei de Acesso à Informação
(LAI), e novos textos acerca dos efeitos
do art. 137, da Lei nº 8.112/1990, no
caso de impedimento de retorno ao
serviço público, sob a hipótese de acúmulo de cargos.
15
LEC
NEWS
“Condução” criminosa
D
esde o início de 2010, uma
investigação do governo dos
EUA está desmontando vários
cartéis acusados de divisão de mercado,
fixação de preços e manipulação de propostas no setor de peças automotivas.
Até o momento, a investigação ainda
está em curso, e nada mais do que 33
empresas – a maior parte delas japonesa,
incluindo gigantes como Bridgestone,
Panasonic e Mitsubishi Eletric - se declararam culpadas ou concordaram em
se declarar culpadas perante os EUA.
As multas já somam mais de US$ 2,4
bilhões.
No desdobramento mais recente,
no início de fevereiro deste ano, dois
executivos japoneses foram indiciados
pelo governo norte-americano. De
acordo com o Departamento de Justiça
dos Estados Unidos, Hiroyuki Komiya
e Hirofumi Nakayama, executivos da
companhia japonesa Mitsuba Corporation, atuaram para fixar os preços de
várias peças automotivas, incluindo
sistemas de pára-brisa vendidos às fabricantes Honda, Nissan, Toyota, Chrysler
e Subaru, nos Estados Unidos e em outros lugares. A acusação alega que, por
volta de abril de 2000 até, pelo menos,
fevereiro de 2010, Komiya, Nakayama e
co-conspiradores participaram e dirigiram, autorizando ou consentindo com
a participação de subordinados em reuniões de conluio para combinar lances,
dividir o fornecimento e fixar o preço a
ser apresentado para os fabricantes de
automóveis.
Komiya e Nakayama também são
acusados de, consciente e corruptamente, tentar persuadir os funcionários da
Mitsuba para destruir documentos e
excluir dados eletrônicos que poderiam
conter evidências de crimes de cartel nos
Estados Unidos e em outros países. Em
6 de novembro de 2013, a Mitsuba se
declarou culpada e concordou em pagar
uma multa de US$ 135 milhões pelo seu
papel na conspiração, bem como obstrução da justiça.
Quando o cartel teve início, Komiya
era diretor de Vendas Automotivas da
Mitsuba. Em 2007, ele foi promovido
a vice-presidente de Vendas. Já Nakayama foi o gerente do escritório de Vendas
da Mitsuba Nagoya até 2005, quando
foi promovido a diretor de operações de
Vendas.
Pelos crimes de cartel, os dois podem
Cadeia sob investigação
A
dimensão da investigação não
é a mesma da norte-americana,
mas o CADE, órgão que defende a concorrência no mercado brasileiro,
abriu no último dia 13 de fevereiro três
processos administrativos para investigar
práticas de cartel nos mercados nacional
e internacional de peças automotivas. Os
segmentos potencialmente afetados são
os de revestimentos de embreagem; e sistemas térmicos, que incluem radiadores,
condensadores e sistemas de aquecimento, ventilação e ar condicionado e o de
limpadores de para-brisas.
O CADE verificou indícios de que
pelo menos 11 empresas e 51 pessoas físicas – cujas atuações estão divididas nos
respectivos mercados investigados nos
processos – mantinham contato perma-
SETORES SOB
INVESTIGAÇÃO:
fabricantes de limpadores
de para-brisas podem ter
atuado em conjunto para
combinar preços e dividir
o mercado.
16
nente com a finalidade de fixar preços e
condições comerciais, alocar pedidos de
cotações de clientes, dividir mercados
entre concorrentes e compartilhar informações comerciais sensíveis. Os indícios
apontam que os funcionários das empresas combinavam previamente quem
deveria ganhar os processos de cotação
das montadoras de automóveis e adotavam estratégias para direcionar o acordo
firmado entre eles. Essa prática teria restringido o caráter competitivo do processo de cotação e potencialmente afetado
negativamente os custos dos automóveis.
E esses não são os primeiros segmentos da cadeia de peças automotivas sob
investigação do CADE. Na verdade, eles
fazem parte de um conjunto maior de
investigações conduzidas pela Superin-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº 09 - Março / 2015
De olho na mordaça
AUTOMÓVEL DA TOYOTA: cartel de
fornecedores de autopeças nos EUA já
gerou multas de US$ 2,4 bilhões.
ser condenados à pena máxima de 10
anos de prisão e uma multa de US$ 1 milhão cada. Mas esta multa pode aumentar
até o dobro do ganho derivado do crime
ou o dobro do prejuízo sofrido pelas vítimas do crime, caso qualquer desses valores supere a multa máxima legal. A pena
máxima para obstrução da justiça é de 20
anos de prisão e uma multa de US$ 250
mil para os indivíduos.
Além dos dois japoneses, outros 52
suspeitos já foram acusados na investigação. O caso contou com a assistência da
Unidade de Corrupção Internacional do
FBI, a polícia federal norte-americana.
tendência-Geral do órgão no setor. No
segundo semestre de 2014, foram abertos processos para apurar cartéis no segmento de velas de ignição e rolamentos
antifricção. Em agosto do ano passado,
o CADE cumpriu mandados de busca e
apreensão para apuração de possíveis cartéis em companhias das áreas de iluminação automotiva (faróis, lanternas e luzes
de freio); interruptores de emergência
(pisca alerta e chave de seta); mecanismos
de acesso (jogos de cilindros, maçanetas,
fechaduras e travas de direção) e embreagens automotivas. A avaliação do material apreendido pode resultar em novos
procedimentos administrativos.
De acordo com as investigações, as
condutas anticompetitivas possivelmente
ocorreram desde a década de 90 até meados de 2012, o que pode indicar que o
cartel dos fabricantes de autopeças tinha
alcance global.
www.lecnews.com.br
D
esde 2010, quando a lei de reforma financeira Dodd-Frank o instituiu, o programa de denunciantes da SEC – a comissão que regula o
mercado de capitais nos Estados Unidos
– vem se apresentando com uma das
ferramentas mais efetivas no combate a
fraudes e corrupção no ambiente corporativo. Por conta disso, agências reguladoras estão incentivando cada vez mais
a prática, com uma política agressiva de
“recompensas” para funcionários que realizam denúncias anonimamente. Como
parte do programa, os informantes podem receber entre 10% e 30% da soma
das multas caso a denúncia feita leve a
uma ação da SEC com sanções superiores a US$ 1 milhão. No ano passado,
o programa concedeu um prêmio de
mais de US$ 30 milhões a um informante de fora dos EUA. Em 2014, a SEC
obteve 3.620 informações de possíveis
violações. O número é 21% superior ao
obtido em 2012.
Por outro lado, as empresas não estão nada felizes com esse tipo de abordagem por parte dos governos. Para
elas, ao incentivar a denúncia existe uma
mudança de foco que migra da possibilidade de corrigir o problema diretamente
para as investigações e punições.
De acordo com uma reportagem
do The Wall Street Journal, a SEC está
preocupada com a possibilidade de as
empresas estarem silenciando funcio-
nários - que poderiam fazer denúncias
contra elas e dar início a uma investigação – utilizando documentos solicitados
para diversas empresas para sua análise. Pelo que o jornal apurou, alguns
desses documentos incluem cláusulas
que impedem os empregados de contarem ao governo sobre infrações na
empresa ou outras violações em potencial da legislação de valores mobiliários, segundo advogados que lidam
com casos de denunciantes e alguns
parlamentares do Congresso americano. “Em alguns casos, as empresas
exigem que os funcionários concordem
em renunciar a qualquer benefício das
investigações do governo, efetivamente anulando o incentivo financeiro para
participar do programa da SEC”, diz a
reportagem. Os regulamentos da lei
Dodd-Frank proíbem empresas de interferir no relato que seus funcionários
venham a fazer para a SEC de potenciais infrações da legislação de valores
mobiliários.
“A agência pediu às empresas que
informem todos os acordos sigilosos,
de confidencialidade, de demissão e pagamento para encerrar processos que
fizeram com funcionários desde que a
lei Dodd-Frank entrou em vigor, assim
como documentos relacionados a treinamento corporativo sobre confidencialidade, segundo a carta e pessoas a par da
questão”, complementa a reportagem.
SESSÃO NO CONGRESSO
DOS EUA: a SEC está
preocupada com supostas
tentativas das empresas
de exercer pressão sobre
funcionários denunciantes.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
17
ENTREVISTA
VALDIR SIMÃO
O novo chefe
Em entrevista à LEC, o novo ministro da CGU Valdir Simão fala sobre
projetos, autonomia em relação à presidência, fiscalização das estatais
e da destinação de eventuais multas geradas pelo órgão
A
o longo dos 12 anos de existência, a Controladoria-Geral da União (CGU) nunca
se viu diante de um caso de
proporções (econômicas, legais e políticas) tão grandes como o gerado
pela corrupção na Petrobras. Responsável
pelos eventuais acordos de leniência, viabilizados pela Lei Anticorrupção, com algumas das maiores empreiteiras do País, a
CGU é alvo de pressão por todos os lados,
para agir o mais rápido possível e também
para não fazer nenhum desses acordos, dependendo de que lado vier a pressão.
A responsabilidade de liderar o órgão
nesse período desafiador caberá ao novo
ministro da pasta, o advogado Valdir Simão. Servidor de carreira da Receita Federal há 27 anos, Valdir foi secretário adjunto da Receita, secretário da Fazenda do
Distrito Federal e por duas vezes ocupou a
presidência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). De 2011 a 2013, foi
secretário-executivo do Ministério do Turismo. Na sequência, atuou por sete meses
na coordenação do Gabinete Digital da
Presidência da República, de onde foi recrutado para ser o secretário-executivo da
Casa Civil, pasta que ocupa papel central
na articulação política do governo. Por
conta disso, sua indicação foi alvo de questionamentos pela sua proximidade com o
ambiente político e com a presidente, que
tem se manifestado de maneira dúbia - no
mínimo - contra punições mais severas
para as empresas envolvidas, de olho no seu
impacto sobre a economia brasileira.
Por e-mail, o ministro respondeu as
questões enviadas por LEC.
18
VALDIR SIMÃO,
DA CGU: ele vai
liderar os primeiros
grandes casos
com base na Lei
Anticorrupção.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº. 09 - Março / 2015
Quais os projetos prioritários que
o senhor pretende tocar à frente da
CGU?
Como disse no dia da minha posse, é
necessário seguir avançando no desenvolvimento de mecanismos e processos
efetivos de controle da atuação do Estado brasileiro e do bom uso de recursos públicos. Em 12 anos de existência
da Controladoria, o tema de combate
à corrupção e da transparência foi colocado na pauta nacional e agora é necessário ampliar nossa atuação, torná-la
ainda mais efetiva. Meu principal objetivo é aprofundar a institucionalização
da CGU e suas funções de prevenção e
de combate à corrupção, de correição
e de ouvidoria. Acho indispensável o
fortalecimento e, sobretudo, a modernização dos mecanismos de governança, por meio da intensificação do uso
da tecnologia da informação. Em um
mundo cada vez mais digital, é mandatória a aplicação de ferramentas de TI
no monitoramento, na fiscalização e na
avaliação das políticas públicas.
Um dos trabalhos mais difíceis da
CGU é o de aculturar centenas de
milhares de servidores públicos - que
atuam em diversos órgãos - sob diferentes culturas “corporativas” e
com diferentes níveis de formação e
tempo de atuação no serviço público.
Tendo vindo de fora, como o senhor
avalia o trabalho da CGU nesse aspecto até aqui? E para onde ele deve
caminhar nos próximos anos?
Esse é um aspecto muito importante
para mim, pois considero um dos tripés
da boa gestão. As pessoas são fundamentais para o sucesso de uma instituição e precisamos, mais do que valorizar
o esforço individual de cada servidor,
investir na sua formação e capacitação
para que seja um elemento de transformação. Para um órgão como a CGU, é
um desafio permanente multiplicar entre todos os gestores públicos federais
essa cultura de ética, transparência e
compromisso com o interesse público.
Nós já temos um ótimo nível de interação com os gestores durante nossos
www.lecnews.com.br
trabalhos de auditoria e fiscalização,
mas é preciso disseminar a capacidade de atuar preventivamente sobre os
problemas e evitar que as irregularidades aconteçam, não apenas corrigi-las
após o fato consumado. Então, vamos
investir muito nesse sentido: de cooperar com as instituições públicas para a
melhoria de suas rotinas e dos seus instrumentos de gestão.
O número de servidores federais afastados do serviço público por casos ligados à corrupção vem aumentando
ano após ano. Isso é reflexo do maior
poder de fiscalização da CGU, de um
aumento no número de casos denunciados - com as pessoas perdendo o
medo de fazer as denúncias - ou do
aumento da corrupção?
O enfrentamento à impunidade é uma
das ferramentas e fortalecimento dos
órgãos responsáveis por combatê-la.
Existem planos internos da CGU
para realizar de maneira mais efetiva
o trabalho de prevenção e controle
nas estatais controladas pelo executivo federal?
Nós já estamos trabalhando no projeto de estruturação de um setor que
se dedicará ao acompanhamento das
estatais. O objetivo é realizar uma
atuação mais preventiva e propor
mudanças nos sistemas de compras
governamentais, além de aperfeiçoar as normas de licitação e contratos
utilizados pelas empresas controladas
pela União. Outras medidas a serem
avaliadas pelo novo setor são o fortalecimento de estruturas de Controle
Interno nessas entidades e a abertura
“O valor ressarcido em função de
eventual aplicação de multa pela Lei da
Empresa Limpa não será destinado à
CGU, mas sim aos cofres da União ou de
empresas públicas lesadas.”
das diretrizes prioritárias da Controladoria, e o aumento do número de
expulsões é um reflexo desse trabalho,
que tem investido muito também na
capacitação que a CGU realiza junto a
servidores do Poder Executivo Federal
que atuam na área de correição. Esses
fatores resultaram, até janeiro de 2015,
na aplicação de punições a 5.157 agentes públicos por envolvimento em atividades contrárias à lei. Ao todo, foram
registradas 4.314 demissões de efetivos;
468 destituições de ocupantes de cargos em comissão; e 375 aposentadorias
foram cassadas. Apesar de o número
de punições ser maior, não seria adequado afirmar que houve aumento da
corrupção. Acredito mais na ampliação
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
de informações, em vista das regras de
transparência pública.
No que diz respeito ao arcabouço legal para punir adequadamente a corrupção no setor público, o senhor enxerga gargalos importantes que ainda
precisam ser fechados? Existe a necessidade de o Executivo enviar novos
projetos nesse sentido, como a presidente Dilma Rousseff pretende fazer?
Nos últimos anos, o Brasil aprovou leis
de extrema importância para a promoção da transparência pública, da prevenção e do combate à corrupção. O país
tem hoje em sua base jurídica a Lei de
Acesso à Informação (LAI), a Lei de
Conflito de Interesses e Lei da Empresa
19
ENTREVISTA
VALDIR SIMÃO
NA TRANSMISSÃO
DO CARGO, COM O
ANTIGO MINISTRO
JORGE HAGE:
otimizar a força
de trabalho será
fundamental para
enfrentar o cenário de
contingenciamento.
Limpa. O aperfeiçoamento da legislação
é sempre necessário, mas precisamos fazer com que as normas já existentes sejam cumpridas de forma efetiva.
O ex-ministro Jorge Hage há tempos
reclamava da falta de pessoal, que a
CGU havia chegado ao limite e que o
Ministério do Planejamento contingenciava as contratações de pessoal
já concursado. Tendo vindo de fora,
qual a sua avaliação do quadro de
funcionários da Controladoria? Ele
é adequado às necessidades? Como
o senhor pretende lidar com essa demanda junto aos ministérios do Planejamento e da Fazenda?
Temos um desafio claramente colocado neste ano que é o da restrição orçamentária e a necessidade de trabalhar
com um cenário de contingenciamento. Por isso, precisamos racionalizar
ao máximo a força de trabalho disponível, ampliando o uso da tecnologia
da informação para potencializar nossos esforços. Fazer mais com menos.
Isso não significa que não vamos tra20
balhar pelo reforço das condições de
trabalho, sejam físicas ou de recursos
humanos. A CGU integra o comitê
recentemente criado para acompanhamento do gasto público.
A operação Lava Jato abriu uma janela de aplicação de multas milionárias pela CGU, com base na Lei
Anticorrupção. Já existe clareza da
destinação desses valores? Eles irão
para os cofres da CGU, assim como
acontece com as agências de fiscalização norte-americanas?
O valor ressarcido em função de eventual aplicação de multa pela Lei da
Empresa Limpa não será destinado à
CGU, mas sim aos cofres da União
ou de empresas públicas lesadas. Uma
coisa não tem relação com a outra. O
papel da CGU é de promover a responsabilização da empresa, mas sem qualquer tipo de ganho financeiro. Tudo o
que for contabilizado a título de ressarcimento será destinado a recompor
as perdas do órgão lesado. Não afeta o
orçamento da Controladoria.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Quando
indicado
para assumir a CGU,
o senhor atuava na
Casa Civil, um dos
principais
centros
da articulação política do governo
federal que, naturalmente, trata dos
impactos econômicos e políticos das
investigações. Essa
proximidade recente suscitou questões
sobre o grau de ingerência e controle que o Palácio do
Planalto pode exercer sobre a CGU,
que ainda que ligado à Presidência
da República, é um órgão que pela
natureza de sua atividade, demanda
bastante independência. Como fica
essa relação daqui para frente?
Apesar de a CGU estar vinculada à
Presidência da República, o órgão
tem autonomia e independência para
conduzir suas atividades com servidores de carreira altamente capacitados.
É isso que garante a eficácia de suas
ações e foi o que permitiu alcançar
a grande credibilidade que tem hoje
junto à sociedade. É assim que temos atuado e pretendemos continuar
atuando frente à CGU. Quando fui
convidado pela presidente Dilma para
chefiar a Controladoria, ela me pediu,
inclusive, para reforçar o controle e
ampliar a capacidade de atuação e o
nosso raio de ação. Isso me dá a certeza de que tenho a confiança dela e
uma grande responsabilidade, mas
também a garantia de autonomia para
fazer esse trabalho.
Nº. 09 - Março / 2015
TENDÊNCIAS
PAPO DE COMPLIANCE
Para onde
olhar em
2015?
1
Os temas e
demandas
que devem
permear as
discussões
e o trabalho
da área de
compliance
neste ano.
A SEGURANÇA
DA INFORMAÇÃO
NÃO É SÓ UMA
QUESTÃO DE TI
Um bom programa de compliance
parte sempre de uma análise dos riscos
enfrentados pela organização. E como
disse James Comey, diretor do FBI,
em uma entrevista no ano passado,
“quando se trata de segurança cibernética existem dois tipos de empresa:
aquelas que foram invadidas e as que
ainda não sabem que foram hackeadas”.
Apesar dessa realidade, muitos profissionais de compliance ainda enxergam a cibersegurança como uma preocupação unicamente da área de TI.
Mas, na medida em que aumentam
os casos de vazamento de informações
confidenciais de grandes empresas,
particularmente dados de clientes, é
preciso que a área de compliance esteja atenta à questão. A segurança de
dados é uma questão de ética e com-
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SEDE DA SONY PICTURES:
o vazamento de informações
da empresa gerou saias justas
com astros de Hollywood.
pliance, já que existe a responsabilidade de proteger as informações da organização e as de seus clientes.
Com novas tecnologias, ferramentas e dispositivos, os volumes e tipos
de dados de valor para uma organiza-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
ção que devem ser protegidos vão continuar a crescer. Com um ecossistema
digital cada vez maior, serão necessárias políticas de risco e governança
que suportem os negócios, a segurança
e a privacidade de dados.
21
PAPO DE COMPLIANCE
2
TECNOLOGIA
INTEGRADA
O avanço do ambiente digital traz novos riscos e responsabilidades para a área de
compliance. Mas esse ambiente é também
uma oportunidade única para o setor aperfeiçoar o seu trabalho. A profissão de compliance ainda se baseia muito em medidas
tradicionais como treinamentos, número
de chamadas para o canal de denúncias e
garantias de que o código foi lido. Daqui
para frente, os profissionais de compliance terão que se concentrar mais em gerir
o risco das interações e estabelecer relacionamentos com as outras áreas da empresa,
atividades que demandam tempo desses
profissionais. Isso exige novas tecnologias
para automatizar os processos de monitoramento, auditoria e mensuração dos resultados. A maior adoção da tecnologia também
vai contribuir para a definição de novas
metas e métricas modernas para avaliá-las.
A tecnologia nos processos de governança,
risco e compliance estará cada vez mais integrada e disseminada por todas as áreas da
empresa.
MAIS ESTRATÉGICO: uso mais intenso da
tecnologia vai liberar tempo dos profissionais para
atividades mais relevantes para o negócio.
22
TENDÊNCIAS
O PRESIDENTE DA UTC, RICARDO PESSOA: muitos dias de cárcere.
3 4
DESCENDO
A RÉGUA
Ainda que as grandes empresas sejam o
foco de atenção dos reguladores, é inegável
que a pressão sobre as pequenas e médias
empresas para que adotem um bom programa de compliance vai ficar cada vez mais
forte. De um lado, as grandes companhias
estão exigindo cada vez mais que os seus
parceiros estejam em plena conformidade
com o ambiente de ética nos negócios (e
correndo riscos, legais e reputacionais, cada
vez maiores caso não o façam). Ao mesmo
tempo, os próprios reguladores estão mais
atentos a casos envolvendo empresas menores em todo o mundo. Aqui no Brasil,
a maior parte das empresas consideradas
inidôneas pela CGU é de pequeno e médio porte. Definitivamente, um programa
de ética e compliance robusto vai emergir
como um tema sensível para os líderes desses negócios, ainda mais para aqueles que
esperam crescer rapidamente.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
COMPLIANCE
CRIMINAL
Primeiro foi o Mensalão. Agora o
Petrolão. O conceito tão difundido
de que no Brasil “rico” não vai para
a cadeia pode sofrer alguns abalos.
Nada é mais emblemático nesse sentido do que o cárcere de um seleto
grupo de empresários e altos executivos de algumas das maiores empreiteiras do país, presos desde o meio de
novembro do ano passado por conta
da operação Lava Jato. As implicações criminais de atos relacionados à
corrupção ainda são pouco debatidas
pelos profissionais de compliance,
mas certamente veremos uma demanda maior pelo assunto ao longo deste
ano, o que pode acarretar em revisões
de códigos de conduta empresarial e
na introdução de cláusulas específicas
sobre o tema nos contratos de trabalho de profissionais mais expostos.
Nº. 09 - Março / 2015
6 8
TODOS DE
OLHO NA
GENTE
CASAL GAY NOS EUA: novas relações familiares
têm impacto sobre a operação das empresas.
5
MUDANÇAS
SOCIOCOMPORTAMENTAIS
Boa parte do volume de trabalho de
um compliance officer está atrelado a
questões típicas de RH, como denúncias
de assédio, ofensas e conduta indevida. E
na era do politicamente correto em que
vivemos hoje, novos elementos podem
trazer nuances adicionais para os profissionais de compliance. A união civil de
pessoas do mesmo sexo, por exemplo,
pode exigir mudanças específicas em certos aspectos em regras ligadas a relacionamento entre profissionais nas empresas,
despesas com entretenimento, benefícios
e claro, conduta e respeito à diversidade.
A aprovação do uso recreativo da maconha em vários estados norte-americanos
e no Uruguai é outro exemplo das novas nuances culturais e comportamentais
com as quais a área de compliance vai ter
de lidar. Afinal, um funcionário da empresa levar o cliente para fumar um baseado, dependendo de onde eles estiverem,
pode ser tão legal juridicamente quanto
tomar uma dose de qualquer bebida durante um happy hour. As empresas estão
prontas para isso?
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Ainda que por um motivo feio,
o Brasil estará sob os holofotes do
mundo do compliance em 2015. A
Petrobras é, até onde a vista alcança,
o maior caso em potencial de corrupção envolvendo uma companhia
do momento. Além do escrutínio da
empresa no Brasil, será interessante
ver como os norte-americanos vão
lidar com a empresa, que para eles
não é vítima. O caso irá trazer elementos novos que poderão servir de
referência para investigações futuras
de empresas controladas pelo Estado
em outros países.
7
ALÉM DA
CORRUPÇÃO
TEM
QUE DAR
RETORNO
Em tempos de caixa curto – especialmente para nós, no Brasil - cada vez
mais as empresas querem saber qual o
retorno real de cada centavo que aplicam. Isso vem acontecendo com mais
frequência e para todas as áreas da
empresa. Com o compliance não é diferente. Os gestores da área vão precisar encontrar formas de tangibilizar o
impacto dos programas de compliance
sobre o negócio, estabelecendo indicadores de desempenho capazes de comprovar que o valor monetário investido
está gerando resultados concretos e que
eles podem ser mensurados e analisados
por toda a diretoria. O discurso de que
o programa é importante porque previne que a empresa tome uma multa
milionária, por si só, não será mais suficiente.
Embora esse seja o padrão lá fora,
aqui no Brasil o papel do compliance
ainda é muito ligado na prevenção à
corrupção. Até pelas circunstâncias
brasileiras neste momento, o combate à corrupção continuará gerando buzz e importância para divulgar
uma área com a qual só agora muitas
companhias começam a tomar contato. Mas o compliance engloba outros
elementos, em muitos casos, mais
relevantes para os negócios, como
análise e gestão de riscos, prevenção
à fraude, segurança da informação...
Estas habilidades serão cada vez mais
demandadas dos profissionais de
compliance no Brasil.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
23
PAPO DE COMPLIANCE
CARREIRA
A realidade
se impõe
O papel do compliance officer é na prática muito
mais amplo e estratégico do que muitos dos
jovens e novos profissionais da área entendem
ou acreditam. E a realidade do dia a dia é muito
diferente do que boa parte deles imaginou
Q
uem teve a oportunidade
de participar de reuniões de
comitês ou grupos de profissionais de compliance certamente já presenciou cenas de lamúrias,
lamentações, frustrações e choradeira
dos profissionais da área. Em alguns
casos, “revolta” é o termo que melhor
se aplica à situação. Os motivos, em linhas gerais, não diferem muito de um
caso para o outro: falta de atenção da
direção da empresa, boicote dos colegas
de outras áreas, ausência de recursos,
confrontos desiguais com as áreas de negócios da empresa... Em suma, o mundo ideal não existe para o compliance
officer – na verdade, ele não existe em
nenhuma área e em nenhum negócio.
Só que para aqueles que chegaram a este
campo recentemente, com uma imagem
e uma missão projetadas, sofrem, e sofrem muito quando se deparam com a
verdade nua e crua. Quem acredita que
por ser o novo compliance officer da
empresa vai chegar e fazer acontecer –
uma expectativa criada e comprada es24
pecialmente pelos jovens profissionais
– está bem distante da realidade.
Em um curto espaço de tempo, a
posição de compliance officer no Brasil
deixou o anonimato corporativo para
ser alçada a uma das profissões do futuro. Na esteira dos protestos de 2013 e
com a aprovação da Lei Anticorrupção,
um número considerável de empresas,
que até então pouco sabiam sobre o
assunto, saíram à caça de profissionais
para a área. A soma de ausência de mão
de obra qualificada com a necessidade
das companhias jogou mais luz sobre
a profissão. Nos cenários previstos, ela
ganharia cada vez mais participação nas
decisões estratégicas da empresa e a nobre missão de garantir que os negócios
fossem realizados “sempre com ética”.
Tudo isso é verdade. Assim como também é fato que a realidade do dia a dia
de um compliance officer é bem mais
complexa, desafiadora, dura e repleta de
nuances e sutilezas que demandam um
grau de maturidade só encontrado em
profissionais mais experimentados.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Do início ao fim do expediente, essa
realidade se impõe aos profissionais e faz
com que muitos deles, que por opção
ou arrebatamento dentro dos quadros
da empresa chegaram para atuar na área
de compliance, sintam-se frustrados. A
situação é especialmente difícil para os
mais novos, que se encantam com as
perspectivas do setor, mas, muitas vezes,
ainda não têm a experiência necessária,
especialmente no ambiente de negócios,
para conseguir executar a função de
compliance officer em sua plenitude e
engajar toda a empresa no assunto.
E aqui, vale uma observação. Grande
referência no assunto, os Estados Unidos
vêm desenvolvendo a área de compliance nas bases como a conhecemos hoje,
desde os anos de 1970, quando foi aprovado o Foreign Corrupt Practice Act, o
famoso FCPA: lei que coíbe a corrupção
internacional de agentes públicos estrangeiros por empresas que atuam nos Estados Unidos. Por mais de quatro décadas,
os profissionais que atuam naquele país
convivem e aprendem com o tema. E
Nº. 09 - Março / 2015
da equipe ou conhece muito bem o negócio da empresa. O mercado aqui no
Brasil começou a exigir dos profissionais
que atuam em compliance uma vivência
que eles não têm”, diz a especialista. “A
vivência conta muito e hoje você praticamente não encontra no mercado um
gerente com cinco, seis anos de formação, de atuação”, emenda Shin Jae Kim,
sócia da área de compliance da banca
Tozzini, Freire e também referência sobre o tema no Brasil.
O SEGREDO ESTÁ NO
NEGÓCIO, NÃO NAS LEIS
ÁREA DE COMPLIANCE
DA SIEMENS NO
BRASIL : grandes
estruturas de compliance
são exceções.
aqui estamos falando apenas do FCPA.
É preciso lembrar que os profissionais
de lá convivem há tempos com outras
questões como gestão de risco, lavagem
de dinheiro, danos morais, assuntos regulatórios, além da própria corrupção de
agentes públicos no mercado local. Com
isso, a clareza do papel do compliance
é muito mais elevada. Ainda assim, são
cada vez maiores as discussões sobre as
novas atribuições que o compliance officer deve assumir nas organizações norte-americanas (ver quadro na página 29).
Por aqui, a área está na sua primeira
infância. Do ponto de vista das empresas
– excluindo as do setor financeiro, que já
lidavam com o tema há mais tempo por
conta de regulações do Banco Central –,
ela só ganhou notoriedade nesta década.
De um lado, a expertise adquirida
com o tema nos Estados Unidos e em
alguns outros países da Europa ajudou
a encurtar o caminho dos profissionais
e das próprias empresas acerca do compliance. “É como se tivéssemos pegado
um elevador diretamente para o quarto
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andar”, diz Isabel Franco, sócia do escritório KLA Law e uma das mais experientes profissionais de compliance
do mercado. Para ela, o Brasil se beneficiou da grande presença de companhias
multinacionais que operam e exercem
um forte papel influenciador por aqui,
ajudando o país a alcançar patamares
elevados a passos muito mais largos na
comparação com outros países.
Só que do outro lado, a necessidade das empresas, somada à falta de mão
de obra qualificada e experiente, acabou por içar muita gente que, apesar de
conhecer o tema, não tinha a vivência
necessária para liderar uma área nova e
cuja função, em sua plenitude, ainda é
pouco compreendida pelas empresas e
pelos próprios profissionais. Para Isabel,
esse é o tipo de situação que acaba se
transformando em “oportunidade perdida” para o desenvolvimento do compliance no Brasil.
“Nos Estados Unidos, quando alguém é promovido a compliance officer,
essa pessoa já atuou na área, foi membro
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Empreender mudanças culturais é
sempre um grande desafio para qualquer líder ou gestor de uma empresa.
Elas precisam de tempo para maturar
e tornarem-se efetivas. Nesse contexto,
o ambiente cultural e de negócios do
Brasil é particularmente desafiador para
os profissionais de compliance. “É sabido que nós temos uma cultura de fazer
negócios baseada, muitas vezes, em relacionamentos cujos limites às vezes são
cinzentos. Não que exista alguma vantagem indevida ou corrupção. Mas existe,
sim, uma questão de relacionamento que alguns podem tratar como tráfico
de influência –, o que torna difícil fazer
uma mudança com a realidade de compliance. Isso é um fato”, explica Shin.
Ou seja, a missão do compliance officer,
para além das funções básicas como dar
treinamentos e elaborar os códigos e políticas da empresa, é muito mais encrencada e com nuances certamente muito
diferentes do que muitos dos profissionais recrutados ou que entraram na área
poderiam supor.
E aí entra um ponto que tanto Shin
como Isabel apresentam como um pilar
central do trabalho de qualquer executivo que vai atuar na área, não importando o porte, o setor ou a nacionalidade
da empresa na qual vai atuar: entender
profundamente do negócio da empresa. Esta tarefa vai muito além daquela
semana de integração pela qual o profissional passa quando chega a um novo
emprego e se torna um problema ainda
maior para aqueles que estão entrando
25
PAPO DE COMPLIANCE
CARREIRA
ALUNOS DO CURSO
LEC: a formação
especializada é só o ponto
de partida da carreira.
na área muito jovens, ou mesmo para
os recrutados mais experientes – quase sempre advogados que atuaram em
escritórios de Direito, mas sem grande vivência profissional em empresas.
“Você teve uma onda de profissionais
que fizeram cursos e se certificaram
como compliance officers. E é muito
lindo você aprender como funciona o
programa de compliance. Mas o real é
que você vai chegar numa empresa e vai
descobrir que aquele negócio não funciona daquele jeito. Você tem empresas
que não têm nem código. Aí você faz o
código e acha que as pessoas vão saber
fazer as coisas, mas não vão”, diz Shin,
para quem, não raro, o novo profissional de compliance também não sabe
exatamente como funciona .
Para Isabel Franco, do KLA Law, às
vezes a choradeira durante os encontros
e reuniões de compliance officers chega
a ser irônica. “Você olha para o profissional e vê que é ele quem está no lugar
errado (e não está preparado para assu26
mir a função). É como querer colocar
um parafuso redondo em um espaço
triangular. Não vai dar certo”, pontua.
Advogados que sempre atuaram pelo
lado dos escritórios e migraram para atuar no compliance de empresas estão entre os que mais sofrem com o dia a dia
da nova função. “Tive um chefe que dizia que para um escritório de advocacia
entrar numa área nova é muito simples,
bastava ler todas as resoluções daquele
setor. E funciona. Eu mesmo participei
de processos desse tipo montando do
zero uma nova área de Telecom”, lembra Isabel. “Mas, no compliance, isso é
impossível. Primeiro porque não existe
regulamentação. E depois porque você
precisa entrar e entender do negócio. E
cada negócio tem o seu modelo e as suas
peculiaridades”, diz. A própria Isabel reconhece que ter atuado por cinco anos
– ainda que como monitora – na Monsanto, uma das maiores companhias de
agronegócio do mundo, foi fundamental na sua formação em compliance. “Eu
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
passava um dia por semana na empresa,
convivendo e aprendendo com eles sobre os negócios, entendendo a dinâmica
da empresa.”
O profissional de compliance precisa
entender que ao chegar numa empresa
já existe uma dinâmica de trabalho, estrutura, processos, sistemas, uma cultura
corporativa que não vai simplesmente se
ajustar ao que ele, enquanto profissional, julga ser as melhores práticas para
que a empresa atue em compliance.
Essa é uma vantagem que profissionais que já atuam na companhia, ainda
que em outras áreas, quando promovidos à função de compliance officer, têm
sobre os outros novatos na área. Afinal,
ele já está aculturado na empresa e conhece as suas dinâmicas e peculiaridades. E se esse profissional tiver algum
grau de senioridade dentro da empresa, ele terá muito mais facilidade para
se movimentar e conquistar a atenção
dos seus pares, fundamental na área de
desenvolver o programa de compliance
Nº. 09 - Março / 2015
SHIN JAE KIM, DO
TOZZINI, FREIRE:
mercado exige dos
novos profissionais
de compliance uma
vivênciaque eles
não têm.
para toda a empresa. Por isso, é bastante
plausível supor que uma próxima leva
de compliance officers tenha origem nas
fileiras das próprias empresas.
ENTENDENDO O QUE O
PARCEIRO FAZ
“O compliance deve ser um parceiro
do negócio”. A afirmação, clássica em
apresentações de profissionais do setor,
representa a síntese do papel da área que
não é nada mais do que dar suporte para
que toda a empresa realize os seus negócios dentro de padrões éticos e legais,
com riscos diversos mitigados e com
eficácia. Tudo ocorrendo com naturalidade. Só que para oferecer esse suporte,
mais uma vez, é preciso entender como
a empresa opera e qual a dinâmica do
segmento onde ela atua, bem como cada
área da companhia funciona.
Para isso, não existe melhor caminho
do que ter a humildade de sair da cadeira e gastar sola de sapato para conversar
com as pessoas de diferentes áreas da
empresa, perguntar sobre o que fazem
e se colocar à disposição delas. Shin Jae
Kim acredita que perguntar é a primeira coisa que um compliance officer deve
fazer. “Ninguém deve ter medo de fazer
perguntas”, afirma. Ao mesmo tempo,
ela reforça que é preciso estar ciente de
que muita gente não vai ser tão legal
com você nesse processo. Mas é preciso entender como as coisas funcionam
para ser parceiro de fato. “Quem está
chegando agora não costuma ter sua voz
ouvida. Então é preciso tentar conversar
muito com as principais pessoas de cada
área. Quando você tem isso mapeado,
tudo funciona melhor. Ele (o compliance officer) tem de navegar em todas as
áreas, se colocar à disposição, saber o que
falar, ser propositivo. E não é auditoria,
que olha para o passado e o que foi feito,
mas sim dar ideias de como melhorar os
controles e os processos para que a empresa possa crescer em ambientes com
melhor gestão de risco, lucrando mais”,
acredita Shin. “Na medida em que você
passa a ser um questionador, e consegue,
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a partir desses questionamentos, oferecer feedbacks e soluções que contribuam
para a evolução dos processos, você passa
a ser um parceiro de verdade e as pessoas
começam a te respeitar e a te procurar”,
emenda.
POLÍTICA DO BEM
Além de entender como funcionam os
negócios, os novos profissionais de compliance precisam descobrir que são (ou
ais irregularidades), vai dar errado. Esse
profissional só vai conseguir monitorar
e detectar se ele estiver inserido no ambiente da empresa. Caso contrário, não
vai nem saber o que monitorar. Quem
nunca trabalhou não sabe como montar
uma área de compliance”, diz a advogada do Tozzini, Freire.
Outro ponto fundamental é abrir
um canal de comunicação direto com a
alta administração. Em muitos casos, o
Não existe melhor caminho do que ter
a humildade de sair da cadeira e gastar
sola de sapato para conversar com as
pessoas de diferentes áreas da empresa,
perguntar sobre o que fazem e se colocar
à disposição delas.
podem ser) os aliados que darão apoio
e suporte ao processo. Em empresas nas
quais a implementação do compliance
representa uma mudança cultural mais
drástica, ter essas pessoas ao seu lado é
ainda mais determinante. Como lembra
Shin, o profissional de compliance não
funciona se estiver isolado. “Se o profissional achar que o trabalho dele é só dar
sugestão, monitorar e detectar (eventu-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
compliance officer é um gerente, porém,
na prática, ele atua sozinho, sem ninguém acima dele. O profissional precisa
se fazer ser visto pelo seu trabalho. Mas,
no dia a dia da grande maioria das empresas, encontrar um espaço na agenda
dos principais executivos é motivo de
guerra, assim como é bem provável e natural que atender ao compliance officer
não esteja entre as principais prioridades
27
PAPO DE COMPLIANCE
desses executivos que têm de lidar com
assuntos de todas as áreas da empresa,
muitas delas mais importantes para a
sustentação do negócio do que a de
compliance.
Só que no mundo corporativo sempre vai existir um momento em que lhe
será dada a chance de aparecer. E aí é
aproveitar a oportunidade, ter o timing
correto e assunto suficiente para amarrar
a conversa ou a apresentação, como explica Shin: “Você tem de ter sensibilidade e astúcia para convencer esses aliados
a te ajudarem a viabilizar o seu projeto.
Se você fizer uma colocação que, no
mínimo, suscite um pensamento, uma
análise da parte de quem participou da
apresentação, para os profissionais que
estão começando na área é um grande
trunfo”. A atitude profissional, a maneira como o compliance officer expressa
sua posição é muito importante para
que a área ganhe magnitude dentro da
empresa.
NEGOCIAÇÃO PRÉVIA
Para evitar frustrações futuras, uma
dica é, sempre que possível, negociar na
entrada as condições de trabalho. Se a
empresa chama alguém por causa da lei,
esperando ter as vantagens que ela concede a quem mantém um programa, a
função desse novo profissional está determinada e ele terá uma ação limitada
a questões de corrupção, de elaboração
dos elementos mais básicos do programa
e só (ainda que as premissas apresentadas anteriormente continuem válidas,
mesmo com tais restrições de atuação).
Ele precisa entender porque a empresa o
está chamando. É importante conversar
isso desde o início para alinhar as expectativas. Com maturidade, experiência
e vontade de fazer a diferença, eles se
expandem e contribuem também para
expandir a visão da empresa sobre o assunto.
Compliance é muito mais do que
anticorrupção. É claro que para alguns
negócios esse é o aspecto fundamental.
Mas, para a maioria das empresas, de
fato, esse não é o ponto principal. Questões trabalhistas, fraudes internas, gestão
28
CARREIRA
ISABEL FRANCO, DO
KLA LAW: a vivência no
dia a dia de uma empresa
faz toda a diferença para
o compliance officer.
Compliance é muito mais do que
anticorrupção. É claro que para alguns
negócios esse é o aspecto fundamental.
Mas, para a maioria das empresas, de
fato, esse não é o ponto principal.
de risco, contratos com terceiros, condutas comerciais, regulação de mercados
e muitos outros temas estão sob a área de
ação de um compliance officer.
Mais uma vez, entender o que a empresa faz é fundamental para que o profissional possa mapear e ter clareza dos
principais riscos, e fazer uma avaliação
geral do que será prioridade. Por isso, o
risk assessment – que nem todos os novos
profissionais fazem ou sabem fazer – é
tão importante. Dependendo da empresa, o foco pode ser corrupção de agentes públicos, em outra, haverá questões
mais ligadas ao Recursos Humanos ou à
conduta de funcionários. Para conversar
com a alta administração é preciso saber de todos esses riscos e saber colocar
como cada um deles impacta o negócio.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
E a empresa terá de decidir o que fazer.
Com esse trabalho, o profissional poderá
ter uma atuação mais destacada.
Outro ponto de constante reclamação por parte dos jovens compliance
officers é a falta de recursos para a área.
Nesse caso, o segredo é sempre ter um
plano A e B. Até porque os motivos
que levam a empresa a contingenciar
os recursos são variados e eles podem
acontecer realmente. Em caso de corte,
o profissional precisa saber quais são as
necessidades básicas e prioritárias e gerir
a área com os recursos disponíveis.
GERINDO EXPECTATIVAS
Tudo o que foi dito até aqui representa um retrato fiel da realidade de um
compliance officer e dos desafios que
Nº. 09 - Março / 2015
os novatos precisam enfrentar no dia a
dia. Mas isso não significa que a profissão não ofereça as oportunidades, e
muito menos, que não possa proporcionar satisfação profissional e pessoal para
quem atua na área. Pelo contrário. As
oportunidades existem, e os novos profissionais, tão logo vençam a fase inicial
e mais dura do aprendizado na prática,
estarão prontos para voos mais altos e
com a demanda por talentos para a área
nas alturas.
Em uma pesquisa realizada pelo
Tozzini, Freire, 80 entre 100 empressas disseram que vão investir mais na
área de compliance na comparação
com o ano anterior. Por isso, é preciso controlar as expectativas atuais e
saber lidar com a ansiedade. “Os profissionais de compliance têm desafios
pela frente como em qualquer outra
função. A frustração talvez seja maior,
pois é preciso lidar com muitas mudanças, e sem uma virada de chave, a
coisa não funciona. E mesmo quando
se percebe a necessidade da mudança
nem sempre ela acontece na velocidade esperada pelo profissional. Não dá
para ser ansioso, afobado. É preciso dar
continuidade”finaliza Shin Jae Kim.
NOVOS PAPÉIS PARA OS CCO’s
Uma pesquisa realizada pela consultoria PwC no ano
passado revela o estado dos profissionais de compliance
nos Estados Unidos. E a conclusão é a de que a posição
de compliance officer caminha para um novo patamar, que
vai exigir dos profissionais novas habilidades e um
realinhamento do foco de atenção dos principais
executivos da área.
Segundo o estudo, os chefes de compliance
são muito qualificados para exercer suas
funções tradicionais como
dar treinamentos, definir
as políticas da área e gerir
os canais de denúncia da
companhia. Mas existem
oportunidades para que o
profissional de compliance
exerça um papel mais estratégico
no negócio na medida em que
consiga integrar a área de compliance
a toda a empresa. Para a PwC, assim como
os CFOs (chefes de finanças) e CIOs (de TI) são
responsáveis por supervisionar suas áreas em toda a
organização, independentemente de quem é o “dono”
daquele pedaço, os Chief Compliance Officers (CCO) devem
assumir o controle de medição e monitoramento dos
riscos do negócio, bem como da cultura ética. “Eles devem
concentrar-se menos na atividade de implementação e
de medição e mais na avaliação do impacto da execução
das medidas no próprio negócio. Como qualquer membro
integrante do C-suite, CCOs são - e devem ser - vistos
como peça fundamental para a execução da estratégia
organizacional”, diz o estudo.
O estudo da PwC traz quatro dicas para um CCO ser
mais estratégico para a empresa:
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CONSTRUA UMA VISÃO DE FUTURO: a organização tem
uma visão clara do que espera do seu CCO e de como
ele deve se relacionar com os negócios? Aprender com
a evolução dos “chefes” de outras áreas pode ajudar o
profissional a formatar um compliance que alcance
toda a empresa.
ESTABELEÇA UMA REDE DE
RELACIONAMENTOS
E UM CONJUNTO DE
HABILIDADES ALÉM DAS
FUNÇÕES DE APOIO:
tipicamente a área de
compliance atua muito em
conjunto com o jurídico,
o RH e a auditoria. Mas
os CCOs e suas equipes
devem se esforçar para estarem
mais próximos do negócio em
todos os níveis. Manter um conjunto
de ferramentas de análises e operações
na equipe de compliance vai permitir maior
envolvimento e melhor desempenho.
CONECTE-SE COM A ESTRATÉGIA: melhores habilidades
de negócios podem ajudar a melhorar a compreensão
da estratégia organizacional e os riscos de compliance
associados, além de permitir que o compliance apoie de
forma mais eficaz a busca por metas corporativas.
CRIE RELATÓRIOS RELEVANTES: aperfeiçoar os relatórios
de compliance pode ajudar a dar relevância ao trabalho
junto aos membros do conselho, líderes seniores e
parceiros de negócios.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
29
LEC
NEWS – ANTICORRUPÇÃO
Em segundo, por pouco
A
gigante francesa do ramo
da engenharia Alstom se
declarou culpada de manter um grande esquema
que resultou no pagamento de dezenas de milhões de dólares em propina
ao redor do mundo, incluindo países
como Indonésia, Egito, Bahamas e
Arábia Saudita. Como parte do acordo, a Alstom concordou em pagar
uma multa de US$ 772,2 milhões. A
cifra gigantesca coloca a companhia
francesa na vice-liderança das maiores multas por violação ao FCPA da
história. Bem pertinho dos US$ 800
milhões aplicados à alemã Siemens,
no caso que deu início à fase das
multas milionárias por corrupção estrangeira. Subsidiárias da Alstom na
Suíça e nos EUA também celebraram
acordos, admitindo que conspiraram
para violar as disposições anti-suborno do FCPA.
O caso é emblemático pelo tempo
investido e pelos recursos – humanos
e financeiros – alocados por diferentes divisões do governo dos Estados
Unidos para concluí-lo, o que virou
quase uma “questão de honra” para as
autoridades do país. O anúncio do encerramento do caso foi feito por altos
dirigentes do Departamento de Justiça
(DoJ) e também do FBI, a polícia federal norte-americana.
“O esquema de corrupção na Alstom foi sustentado por mais de uma
década e por vários continentes”, disse
o procurador-geral adjunto do DoJ,
James Cole. “(O caso) foi surpreendente na sua amplitude, na sua audácia e nas suas consequências em todo
o mundo. E é tanto minha expectativa
- e minha intenção - que a resolução
abrangente envie uma mensagem inequívoca para outras empresas em todo
o mundo: a de que este Departamento
de Justiça será implacável em erradicar
30
PATRICK KRON, CEO DA ALSTOM:
a demora da empresa em admitir o
crime e colaborar com as investigações
contribuiu para salgar o valor da multa.
e punir a corrupção em toda a extensão da lei, não importa a sua dimensão
ou quão assustadora seja a acusação”.
“Este caso é emblemático por
como o Departamento de Justiça vai
investigar e processar casos de violações ao FCPA - e outros crimes corporativos”, disse a procuradora-geral
assistente Leslie Caldwell. “Nós incentivamos as empresas a manter programas de compliance robustos, a divulgar voluntariamente e erradicar a má
conduta quando ela é detectada, e a
cooperar na investigação do governo.
Mas nós não vamos esperar as empresas agirem de forma responsável. Com
cooperação ou sem, o DoJ irá identificar a atividade criminosa em corporações usando todos os nossos recursos,
empregando todos os instrumentos de
aplicação da lei, e considerando todas
as ações possíveis, incluindo acusações
contra as corporações e indivíduos”.
“A resolução histórica é um lembrete importante de que o nosso mandato moral e legal para acabar com
a corrupção não para em qualquer
fronteira, seja ela municipal, estadual,
ou nacional”, disse o primeiro assistente do procurador-geral no estado
de Connecticut, Michael Gustafson.
“Uma parte significativa deste trabalho ilícito, infelizmente, foi realizada a
partir de escritórios da Alstom Power
em Windsor, no estado de Connecticut. Tenho esperança de que esta resolução, e em particular o acordo firmado com a Alstom Power, irá fornecer à
empresa uma oportunidade de remodelar a sua cultura e restaurar seu lugar
como uma corporação respeitada”.
“Esta investigação durou anos e cruzou continentes com agentes dos escritórios de campo do FBI em Washington
e New Haven realizando entrevistas e recolhendo provas em todos os cantos do
mundo”, disse Robert Anderson, diretor
executivo assistente do FBI. “O valor
recorde em dólares da multa é um impedimento claro para as empresas que se
envolvem em suborno estrangeiro, mas
um impedimento ainda melhor é que
vamos enviar os executivos que cometem esses crimes à prisão”.
De acordo com as admissões, a
Alstom, por meio de vários executivos e empregados, pagou subornos a
funcionários do governo e falsificou
registros em livros contendo projetos
de energia, rede elétrica e de transporte para entidades estatais em todo
o mundo. No total, a empresa francesa pagou mais de US$ 75 milhões
em subornos para obter US$ 4 bilhões em projetos ao redor do mundo, com um lucro para a empresa de
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº 09 - Março / 2015
aproximadamente US$ 300 milhões.
Um dos pontos que pesou contra
a empresa é que, durante quase todo
o período de investigações, a empresa
tentou esconder o esquema de suborno
por meio de consultorias supostamente contratadas para prestar serviços em
nome da Alstom e de suas subsidiárias.
Mas, na verdade, esses consultores serviram como canais para pagamentos
corruptos a funcionários do governo.
Documentos internos da empresa referem-se a alguns dos consultores em código, incluindo “Mr. Genebra”, “Mr.
Paris”, “London” e “velho amigo”. No
ano passado, em meio às denúncias
que se avolumavam em vários países
onde opera, a Alstom decidiu que não
iria mais usar consultores para intermediar seus negócios.
AJUDA NA MARRA
A cooperação da Alstom com as investigações só ocorreu após cobranças
públicas do DoJ a vários executivos da
empresa. Após esse chacoalhão, a companhia passou a atender as demandas
das autoridades com profundidade,
inclusive auxiliando a promotoria na
investigação de outras empresas e indivíduos. “Tivemos uma série de problemas no passado e nos arrependemos
profundamente disso. No entanto, o
acordo fechado com o DoJ nos per-
ROBERT ANDERSON, DO FBI: o
governo dos EUA empreendeu uma
verdadeira cruzada contra a Alstom.
mite deixar essa questão para trás e a
continuar nossos esforços para garantir que os negócios sejam realizados
de maneira responsável e consistentes
com os mais altos padrões de ética”,
disse o CEO da Alstom, Patrick Kron.
Segundo o executivo, a Alstom vem fazendo progressos significativos na área
de compliance ao longo dos últimos
anos. Segundo ele, o monitor externo
que acompanha o trabalho da empresa
por conta de um acordo com o Banco
Mundial feito em 2012 confirmou que
o programa de compliance da companhia está rodando.
Até o momento, o departamento
anunciou acusações contra cinco indivíduos, incluindo quatro executivos de
empresas da Alstom, por alegada conduta corrupta envolvendo esta.
Frederic Pierucci, o ex-vice-pre-
sidente das vendas globais de caldeiras da Alstom, David Rothschild e
William Pomponi, ambos ex-vice-presidentes de vendas regionais da Alstom Power, se declararam culpados de
conspiração para violar o FCPA, entre
2012 e 2014.
Lawrence Hoskins, o ex-vice-presidente sênior da Alstom para a região
da Ásia, foi acusado em um segundo
indiciamento em 30 de julho de 2013
e está pendente de julgamento no Distrito de Connecticut, marcado para
junho próximo. As acusações contra
Hoskins são apenas alegações, e ele
tem presunção de inocência, a menos
– e até – que se prove sua culpa.
Além disso, um membro do alto
escalão do parlamento indonésio foi
condenado por aceitar subornos da
Alstom. Ele está cumprindo pena de
prisão de três anos. Já Asem Elgawhary, gerente geral de uma entidade que
atua em nome da Egyptian Electricity
Holding Company, uma empresa estatal de eletricidade, se declarou culpado
em dezembro do ano passado em um
tribunal federal no Distrito de Maryland por acusações de lavagem de
dinheiro e fraude fiscal e por aceitar
propinas da Alstom e outras empresas.
Elgawhary concordou em passar 42
meses na prisão e a devolver cerca de
US$ 5,2 milhões em receitas.
O DESCASO QUE SAIU BEM CARO
As autoridades americanas fizeram questão de frisar os diversos aspectos da investigação que contribuíram para elevar
exponencialmente o valor da multa imposta aos franceses, entre eles:
l
l
l
NÃO COMUNICAR O CASO ÀS AUTORIDADES: ainda
que ciente da má conduta relacionada a uma filial nos Estados Unidos, que anteriormente já havia enfrentado acusações de corrupção pelo DoJ por um projeto de energia
na Itália, a Alstom não avisou às autoridades de que algo
poderia estar novamente errado em uma de suas empresas nos EUA;
FALTA DE COOPERAÇÃO: durante vários anos da investigação, a Alstom não cooperou plenamente com o DoJ;
ESCALA GLOBAL: a má conduta da empresa se esten-
www.lecnews.com.br deu por muitos anos, por vários países ao redor do mundo
e em várias linhas de negócios da empresa, além de envolver esquemas sofisticados para subornar funcionários
de alto nível nos governos;
l
SEM COMPLIANCE: a companhia não tinha um programa de
compliance efetivo nem um programa de ética no período em
que os crimes aconteceram;
l
HISTÓRICO DE PROBLEMAS: condutas criminosas anteriores já tinham custado à Alstom resoluções contrárias de vários
países e do Banco Mundial.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
31
LEC
NEWS – ANTICORRUPÇÃO
Não importa o tamanho
A
Smith & Ouzman Ltd.,
balho não remunerado e deverá
uma empresa britânica
cumprir três meses de reclusão.
cujas origens remontam a
Já Nicholas Charles Smith, di1845, foi condenada como resultaretor de Vendas e Marketing da
do de uma investigação do Serious
empresa, foi condenado a três
Fraud Office sobre pagamentos de
anos de prisão por três acusapropinas realizados a agentes públições de concordar em pagar sucos estrangeiros para obter contraborno. Os dois também ficarão
tos para a empresa.
legalmente impedidos de atuar
Os pagamentos ilícitos somacomo diretores da empresa por
ram 395 mil libras esterlinas e
seis anos.
foram feitos a funcionários públiA sentença da empresa,
cos para contratos de negócios no
condenada
pelos mesmos três
CHRISTOPHER JOHN SMITH (AO CENTRO), EM EVENTO
Quênia e na Mauritânia. A Smith
crimes, será proferida em outuNA SOMÁLIA: ainda que pequeno, nenhum negócio pode
atuar fora das regras do jogo.
& Ouzman é especializada em sobro deste ano.
luções de impressão de segurança
“Esta é a primeira condecomo cédulas de votação, talões de cheque, certificados e nação do SFO - efetivada após um julgamento - de uma
títulos de tesouro.
empresa por crimes envolvendo o suborno de funcionários
Dois diretores da empresa também foram condenados públicos estrangeiros. Essa criminalidade, seja ela praticada
no julgamento.
por empresas grandes ou pequenas, prejudica severamente
Seu presidente, Christopher John Smith, de 72 anos, foi a reputação comercial do Reino Unido e alimenta a govercondenado a 18 meses de prisão por duas acusações de con- nança corrupta no mundo em desenvolvimento. Estamos
cordar em pagar suborno. A pena ficará suspensa por dois muito gratos às autoridades quenianas pela sua assistência
anos. Ele também foi condenado a cumprir 250 horas de tra- neste caso”, comemorou o diretor do SFO, David Green.
Em cima dos militares
D
epois de “recolher” vários integrantes graduados e outrora
poderosos do governo chinês
e de empresas estatais (boa parte deles
composta por inimigos políticos), a batalha travada pelo presidente da China,
Xi Jinping contra a corrupção no país
asiático ganha um novo alvo.
O Partido Comunista Chinês, que
é de fato quem exerce o poder no país,
comunicou o lançamento de uma investigação pelo período de um ano sobre o salário dos militares. A informação foi divulgada pela imprensa oficial
após revelações de casos de corrupção
nas forças armadas virem à tona. A
32
Comissão Militar Central da China, liderada pelo presidente Xi Jinping, vai
conduzir a investigação que deve abarcar
todos os escalões da área militar. A supervisão ficará sob responsabilidade do chefe
do departamento de logística do exército,
Zhao Keshi. Segundo a imprensa oficial,
a apuração será focada em “toda a circulação de dinheiro, recibos e despesas”
a fim de encontrar provas de desfalque.
Segundo o partido, a corrupção é uma
ameaça chave à campanha de modernização militar, um processo que ao longo
dos últimos anos vem aumentando substancialmente o orçamento das forças armadas no país.
O PODEROSO ZHAO KESHI COM
O PRIMEIRO MINISTRO DA NOVA
ZELÂNDIA: investigações em um setor
bilionário e complicado.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº 09 - Março / 2015
BALANÇO
MERCADO
Resposta difícil
O caso da Petrobras mostra toda a dificuldade de se calcular o impacto
financeiro da corrupção nos negócios de uma empresa
D
entre todos os problemas que a Petrobras
enfrenta um é sintomático do caos que assola
a companhia. A maior
empresa brasileira, com vendas anuais
superiores a R$ 300 bilhões, não consegue o aval dos auditores independentes para o seu balanço do terceiro
trimestre e, naturalmente, para o do
quarto e do ano de 2014 também. Por
ter seus papéis negociados nas bolsas
de São Paulo e Nova York, obter o seu
balanço validado por uma auditoria independente é obrigatório. A situação a
um só tempo é tão crítica e vexatória
que a missão primordial do novo presidente da empresa, Aldemir Bendine, é
publicar o balanço da empresa - com o
aval dos auditores - até o final de março
deste ano.
Com base no que é público até o
momento, a celeuma em torno da não
validação por parte dos auditores está
no fato de que a PwC, auditoria da Petrobras, se recusa a assinar o documento enquanto a empresa não determinar
um valor no seu balanço para o que seria o custo da corrupção na companhia.
Durante a divulgação dos dados do terceiro trimestre, feita sem o aval da auditoria, a direção da Petrobras fez uma
estimativa de que a sobrevalorização de
um conjunto de ativos alcançara R$ 88
bilhões (e a então presidente Maria das
Graças Foster disse que o valor poderia
superar os R$ 100 bilhões). Apesar de
ter sido divulgado pela diretoria executiva, o conselho e principalmente o governo federal, controlador da empresa,
www.lecnews.com.br
COMPERJ, UM DOS ATIVOS
PROBLEMÁTICOS DA PETROBRAS:
dificuldade em separar o impacto da
corrupção na reavaliação dos ativos.
Foto: Agência Petrobras
não aceitaram esse número, que poderia ser atribuído – e do ponto de vista
político foi o que aconteceu – como o
valor desviado ou perdido para a corrupção na empresa.
Na verdade, para chegar ao número, os auditores e advogados externos
contratados pela Petrobras para atuar
nas investigações relacionadas à operação Lava Jato fizeram uma reavaliação
do valor de mercado de um conjunto
de ativos da companhia que, de alguma maneira, possam ter sido alvos de
desvios. Só que o valor dos ativos nessa
reavaliação foi impactado por fatores
e condições diversas que, no caso da
estatal, incluem a queda do preço do
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
óleo e o aumento do dólar, ou seja,
dois fatores que pesam demais na avaliação da viabilidade econômica dos
projetos. A corrupção é um elemento
adicional, mas nem de longe o único
e mais impactante nesse processo. Daí
a chiadeira do Palácio do Planalto pela
divulgação do número estimado, ainda
que não oficializado, durante a apresentação do balanço.
Para Marcos Sanches, sócio da
TG&C Auditores, a validação do balanço pela auditoria externa, ao menos
do ponto de vista contábil, não tem a
ver com mensurar o impacto ou provisionar perdas decorrentes da corrupção
na empresa. Ele explica que, de uma
33
MERCADO
BALANÇO
perspectiva técnica, a reavaliação dos
ativos – efetuada e divulgada durante a
apresentação dos resultados do terceiro
trimestre da empresa – está de acordo
com os princípios contábeis e, caso tivesse sido aprovada pelo conselho de
administração e a perda do valor desses
ativos tivesse sido lançada no balanço,
ele poderia muito bem ser validado pela
empresa de auditoria. “Agora, o que foi
divulgado é diferente do que estimar
quanto existiu de corrupção. O que está
se levantando é o impairment dos ativos
da Petrobras”, diz Marcos. Impairment
é o termo de mercado utilizado para determinar os valores recuperáveis dos ativos. Por meio dele, a empresa reconhece
as reduções nos valores de ativos a serem
considerados nas demonstrações contábeis das empresas.
O processo consiste, basicamente,
em avaliar as perdas de valor do capital
aplicado em casos de interrupção das
atividades, às quais se destinavam tais
bens; quando fica comprovado que os
bens não poderão produzir resultados
suficientes dentro de um período determinado de tempo para recuperar o
valor investido nesse ativo; ou ainda,
em uma eventual venda deste, levando
em conta o seu valor de mercado. A
avaliação de valor do ativo tem como
base sempre o custo do ativo e, como se
trata de um movimento contábil, não
existe impacto imediato sobre o caixa
da companhia.
O que acontece no caso da Petrobras é que, mesmo que o mercado
questionasse o crescente aumento dos
custos para a construção de ativos
como a Refinaria Abreu e Lima, em
Pernambuco e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, não fossem os
desdobramentos da operação Lava Jato
escancarando a corrupção endêmica na
estatal, seria bem provável que a empresa não precisasse enfrentar esse processo de maneira tão calamitosa como
está acontecendo agora.
APENAS O INÍCIO
Como o governo federal já indicou
que não deve aceitar simplesmente a
34
FERNANDO ALVES,
PRESIDENTE DA PWC: a
auditoria não aceita validar o
balanço sem que a diretoria da
estatal estabeleça um número
crível para as perdas da empresa.
reavaliação dos ativos como base para
a “conta da corrupção” na Petrobras, a
questão que persiste na busca por uma
resposta é: como determinar o valor
da corrupção?
“Se uma refinaria custasse 1.000,
e por um ato de corrupção, custou
1.200, você teria esse ativo lançado
por 200 a mais do que ele realmente
vale, por conta de desvios. Aí você poderia determinar uma baixa contábil
de 200 no valor desse ativo. Porém,
mesmo assim, é muito difícil mensurar o que houve de desvios no passado.
É certo que, caso o ativo tenha valor
inferior ao que está no balanço, será
preciso fazer o ajuste, diminuindo o
valor do ativo e, como contrapartida,
a diferença de valor é registrada como
perda no resultado. Mas, mais uma
vez, não exclusivamente por conta da
corrupção”, reforça Marcos. “No contrato de prestação de serviço constava
1.200 e é esse o preço que foi pago de
fato. A Petrobras pagou a quantia que
o contrato estabelecia”.
“Não vejo como chegar numa estimativa de quanto é corrupção nessa perda. Do ponto de vista contábil
é preciso ser objetivo. É complicado
fazer estimativa. Um contrato com a
empresa tal sofreu 3% de acréscimo
indevido, aí se faz a conta, mas é preciso saber como isso vai ser apurado,
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
se não é um chute de lá, um chute de
cá. É inédito, complexo e imprevisível”, complementa o sócio da empresa
de auditoria.
Se do ponto de vista contábil, para
determinar o valor direto do que foi
desviado, a dificuldade é imensa, é
preciso ainda ter em conta que essa
corrupção gerou impactos em cadeia.
Ou seja, a conta não parou no 1%,
2% ou 3% sobre o valor do contrato,
e aí fica realmente difícil de estipular
um número preciso. Esse talvez seja
um aspecto menos importante para
a auditoria que vai assinar o balanço,
mas é uma informação muito relevante do ponto de vista político, e também jurídico.
Para o advogado Giovanni Falcetta, sócio da área de compliance do
Aidar/SBZ, mesmo que o mercado
pressione por um número, só indo
mais fundo na investigação, linha por
linha, para ter noção exata do valor.
“Tem muita coisa que vai ser feita por
aproximação agora e que depois vai
ser ajustada na medida em que forem
concluídas as investigações. Acho que
isso é natural tendo em vista o que a
gente vê hoje. Com base no que temos
de informação já publicada, estamos
falando de corrupção endêmica, arraigada na companhia e que atuou em
vários setores”, pontua Giovanni.
POLÍTICO E LEGAL
Atribuir uma perda decorrente da corrupção, que seja aceita contabilmente
pela auditoria (ou assumir um impairment gigantesco dos ativos, com toda
a implicação política que isso teria), é
o problema mais imediato com o qual
a Petrobras tem de lidar. “A administração da empresa vai ter que determiNº. 09 - Março / 2015
nar um valor e submetê-lo ao crivo da
auditoria”, diz Marcos Sanches. Mas
isso é só o começo. Primeiro porque,
além de não ser definitivo, em qualquer situação ele será motivo de questionamentos por ser baixo demais ou
alto demais.
Como empresa de capital aberto,
numa indústria intensiva de capital e
com projetos de longo prazo de maturação, a Petrobras é o tipo de negócio
que tem um valor de mercado severamente afetado pela avaliação dos seus
ativos. As pessoas adquirem ações baseadas em vários indicadores como vendas, margens líquidas, geração de caixa,
e também no valor dos ativos, que geram uma estimativa futura de produção e vendas que impactam no valor do
papel da companhia. “A Petrobras tinha ativos valiosos que eram fontes de
investimento, como as refinarias que
não foram finalizadas e agora não têm
o valor de mercado que se imaginou.
E algumas se mostraram inviáveis. Aí
é prejuízo”, pontua o advogado do Aidar/SBZ. Ele explica que, no caso de
uma refinaria inviável, se comprovado
que ela já era inviável, mas ainda assim
foi feita para favorecer alguém, você vai
ter um ativo cujo valor vai ser reduzido a pó por conta de corrupção. Foi
a corrupção – junto com as falhas dos
controles internos da empresa – que
levou o ativo a ser aprovado. O valor
da companhia vai ser afetado e quem
comprou ações vai perder dinheiro,
porque aquele ativo deixa de fazer parte do balanço e o que se investiu ali foi
a fundo perdido, porque nada vai ser
gerado daquele ativo. “Isso é impacto
direto da corrupção”, afirma Giovanni.
Só que dificilmente a totalidade desse
prejuízo contábil - já que o prejuízo
de fato já impactou o caixa da empresa ao longo da construção desse ativo
- será atribuída à corrupção. “O que é
realmente desvalorização por conta da
queda de petróleo, do dólar e o que é
desvalorização por conta da má contabilidade, de corrupção e desvios? Esse
é o grande desafio na hora de avaliar o
valor dos ativos”.
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GIOVANNI FALCETTA, DO
AIDAR/SBZ: custo da corrupção
pode servir de base para processos
de ressarcimento para a estatal e,
também, contra ela.
PROBLEMA RESOLVIDO,
PROBLEMA CRIADO
Tão logo comecem a aparecer números oficiais do custo da corrupção na
empresa, outras batalhas devem ser
travadas na busca pelo ressarcimento
desses recursos. A própria Petrobras
poderá ir atrás dos valores desviados
dela. O governo brasileiro pode também, com base no que aconteceu,
multar a estatal – o que está no ar, mas
parece pouco provável – e também as
empresas envolvidas, sob o pedido de
ressarcimento.
Acionistas que se sentiram prejudicados pelo impacto dos casos de corrupção - derivados da negligência e de
controles internos falhos - vão tentar
reaver o prejuízo. Compradores de outros ativos baseados no valor de mercado da Petrobras também podem ir por
esse caminho. E, além disso, você pode
ter outros cenários, já que a petroleira
brasileira tem adotado uma postura de
que, na dúvida do envolvimento das
empresas em casos de corrupção, ela
não paga. E não tem pagado ninguém.
Outras empresas, que não têm culpa
no cartório, mas tiveram a atividade
inviabilizada por conta da restrição de
pagamentos da Petrobras, podem vir a
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
quebrar e, no fim, requerer o ressarcimento da Petrobras também.
E tudo isso é um cenário basicamente para o Brasil. É preciso lembrar
que o governo dos Estados Unidos já
tem uma investigação contra a empresa e lá, ao que tudo indica, ela não vai
ser vítima, ao contrário do que vem
indicando a postura das autoridades
brasileiras. Pelas proporções do caso, a
multa tende a ser exemplar. “Até porque os concorrentes dela que foram
sancionados vão fazer pressão para que
essas multas sejam exemplares também”, lembra Giovanni Falcetta. Outra dúvida é como o regulador norte-americano vai tratar as empresas que
fizeram parte desse esquema.
Além disso, deve haver ações individuais e coletivas contra a companhia
pela questão do registro de dados, que
não foi fiel nos seus books and records.
Para terminar, em algum momento a
Petrobras vai precisar provisionar no
seu balanço os recursos para as eventuais sanções das quais a estatal deverá ser alvo e para as despesas com as
investigações. Esses valores certamente
poderão ser atribuídos à “conta da corrupção” na empresa.
“É um caso paradigmático. O primeiro grande caso brasileiro. E mesmo
os norte-americanos vão aprender muito porque esse episódio traz elementos
que vão servir de referência para outras
investigações. Um caso com essa extensão e com essas peculiaridades, com
múltiplas empresas gigantescas de um
país, de um mesmo setor, com políticos e uma das maiores empresas do
mundo, controlada pelo estado. Nunca
vi algo tão peculiar”, conclui Giovanni.
Como se vê, a tão esperada publicação do balanço auditado é só o início
dos problemas.
35
MERCADO
INVESTIMENTOS
Do tamanho
do problema
Com a possibilidade de chegar a 362 funcionários,
a Petrobras está montando a maior estrutura de
compliance do Brasil. Mas encontrar tanta gente
com conhecimento sobre o tema não vai ser uma
tarefa fácil para a estatal
N
o último dia 24 de
fevereiro, a Petrobras
apresentou como irá
funcionar a estrutura
da sua nova Diretoria
de Governança, Risco
e Compliance (DGRC). Liderada pelo
executivo João Elek Júnior, recrutado
de fora dos quadros da empresa, a nova
área deverá contar com 362 integrantes,
divididas em três gerências executivas.
Com expectativa de ter 81 funcionários,
a gerência de Governança, Organização e
Gestão (GOG) será responsável por elaborar e monitorar a execução do modelo
de Governança Corporativa e Societária e
de organização e gestão, controlar a execução e o cumprimento das diretrizes e
regras relativas ao processo decisório da
companhia, além de planejar e executar as
atividades corporativas da nova diretoria.
Já a gerência de Riscos Empresariais foi
instituída com o objetivo de fortalecer a visão integrada dos riscos empresariais (que
não englobam os riscos relacionados à atividade de produção da empresa) por meio
da identificação, avaliação, monitoramento e gestão de riscos relevantes, em articulação com as diversas áreas e empresas do
Sistema Petrobras. No total, essa gerência
36
deve contar com 72 colaboradores. Por
fim, a gerência de Conformidade (Compliance) vai reunir 209 pessoas com a atribuição de planejar, orientar, coordenar e
avaliar atividades de controle e conformidade, incluindo a investigação e a redução
de riscos de fraude e de corrupção em todo
o Sistema Petrobras.
Com a nova estrutura formatada, algumas gerências que já existiam na empresa
também serão absorvidas pela DGRC, entre elas as de Controladoria e de Auditoria.
Segundo a empresa, todas essas atribuições
definem a principal característica da missão
da nova diretoria: a capacidade de identificar e analisar o que está de acordo ou em
conformidade com os requisitos e as regras
de cada negócio. “A DGRC tem uma
enorme responsabilidade. Nosso objetivo
é levar a empresa a se tornar referência em
governança, riscos e conformidade, assim
como ela sempre foi referência técnica, reconhecida mundialmente, na indústria de
óleo e gás”, disse João Elek Júnior, durante
a sua posse em janeiro deste ano.
DESAFIO PARA
PREENCHER AS POSIÇÕES
Questionada pela reportagem sobre o
modelo de contratação, a gerência de co-
municação da estatal disse ainda não saber se os novos funcionários serão oriundos dos próprios quadros da petroleira,
se será aberto concurso público ou se a
empresa irá recrutá-los no mercado. O
mais provável é que uma boa parte das
posições de liderança seja recrutada no
mercado, a exemplo do que aconteceu
com o próprio João Elek, dada a necessidade de profissionais muito especializados e que tragam uma visão externa
à Petrobras. Por outro lado, devido ao
grande volume de cargos a ser preenchidos, a empresa deve buscar profissionais
dentro dos seus quadros, além, é claro,
dos nomes que já atuavam nas áreas que
estarão agora sob a gestão da DGRC.
Em um mercado tão aquecido e com
falta de mão de obra suficientemente ex-
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
No. 09 - Março / 2015
Foto: Agência Petrobras
visibilidade. Mas você pode ir do Céu ao
Inferno caso a empresa, por fatores externos a você, não entre na linha. Acho que
são essas as duas grandes questões (que
podem motivar ou desmotivar) os profissionais”, explica Raul.
Se em situação normal, encontrar a
pessoa certa para a função já seria um grande desafio, é preciso adicionar à equação a
dinâmica atual do mercado de compliance
no Brasil, onde já existe um grande desequilíbrio de mão de obra, com alguns
poucos profissionais no topo e que atuam
como líderes da área; pouquíssimos de nível intermediário – geralmente a segunda
pessoa de compliance nas empresas – que
tem conhecimento e ainda muito potencial de crescimento; e muitos profissionais
na base, com interesse em conhecer, mas
ainda sem formação. “O problema de curto prazo é que compliance se aprende no
dia a dia e, portanto, será necessário tempo até que essa turma esteja preparada”,
pontua o sócio da Vittore. Ele explica que
desde a aprovação da Lei Anticorrupção,
houve um boom na busca por profissionais, e agora com a operação Lava Jato,
multinacionais e grandes empresas nacionais que ainda não implementaram a
área tornam a disputa por bons profissionais ainda mais acirrada, pressionando os
salários para cima. Nesse particular, por
necessidade e por ter condições, a Petrobras não deve ter problemas para cobrir as
ofertas salariais da concorrência, caso os
profissionais aceitem o desafio.
JOÃO ELEK COM A EX-PRESIDENTE DA ESTATAL,
GRAÇA FOSTER: quem vai topar estar ao lado dele
na nova estrutura de compliance da empresa?
periente para lidar com uma situação tão
complexa como a da Petrobras, não deve
ser fácil para a companhia encontrar nomes adequados para ocupar as três gerências executivas. “Vai ser uma disputa com
poucos profissionais”, preconiza Raul
Cury, sócio da Vittore Partners, empresa
de recrutamento especializada no segmento de compliance. “Para ocupar as posições
de liderança, estamos falando de profissionais que estão no topo da carreira, muito
bem empregados como principais executivos das áreas de compliance nas empresas.
Em outras palavras, devem ser profissionais que conheçam compliance de A a Z,
tenham fluência em língua estrangeira, habilidade para interagir e se relacionar com
todas as outras áreas da empresa e lidar com
a pressão das investigações”, diz o consul-
www.lecnews.com.br tor, que acredita em um universo em torno
de cinquenta profissionais com formação
e senioridade suficientes para ocupar uma
das três gerências. Nessa conta, ele inclui
especialistas da área de compliance e das
grandes empresas de auditoria, as chamadas BIG 4. “Para uma dessas cadeiras, especialmente para posições que envolvam a
área de riscos, eles devem olhar para profissionais desses segmentos”, acredita.
REFORÇO DE PESO
Até o momento, João Elek é o único executivo graduado da nova estrutura. Mas
ele terá um nome de grande peso e conhecimento na área dentro do conselho
de administração da estatal, que aprovou
o nome do advogado Luiz Navarro para
assumir o lugar de Márcio Zimmermann,
secretário executivo do Ministério de Minas e Energia. Navarro trabalhou por dez
anos na Controladoria-Geral da União
(CGU), onde foi secretário executivo,
secretário de Prevenção da Corrupção e
corregedor-geral. Atualmente ele ocupa
uma cadeira como consultor sênior do escritório Veirano Advogados.
CÉU OU INFERNO?
Para os especialistas convidados a assumir
o cargo, a grande questão deverá ser avaliar a exposição – para o bem e para o mal
- que esse cargo irá oferecer. “De um lado
você tem a possibilidade de realmente
mudar a maior empresa do país por meio
de uma posição de envergadura e grande
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
37
LEGISLAÇÃO
GOIÁS
Mais
próxima
da base
Com um histórico recente de
punições e a implementação de uma
Lei Anticorrupção própria, o estado
de Goiás chama a atenção das
empresas locais para o compliance
A
o longo das últimas
duas décadas, o estado
de Goiás se converteu
em um importante polo
industrial, com uma
presença maciça de grandes empresas
nacionais e regionais de setores como o
farmacêutico, de alimentos e celulose. O
estado também assumiu uma posição de
destaque como polo distribuidor, graças
à localização estratégica e uma política
agressiva de incentivos fiscais. Ao longo
desse período, grandes empresas locais e
regionais foram atraídas para o estado.
Mais recentemente, Goiás vem se
destacando também pela atenção e pela
visibilidade que tem dado no combate à
corrupção. E uma série de movimentos
e iniciativas do poder público no estado
está chamando a atenção das empresas
que operam por lá para a necessidade de
atuar preventivamente no que diz respeito às políticas de compliance.
38
Foto: Lailson Damasio
No final do ano passado, enquanto
alguns estados e grandes cidades brasileiras publicavam seus respectivos
decretos regulamentando a Lei Anticorrupção federal, o estado de Goiás
decidiu ir além e publicar uma lei estadual.
Além de permitir que a lei fosse
observada também pelos demais poderes constituídos no estado, a opção
pela publicação da lei própria, segundo o secretário-chefe da Controladoria Geral do Estado de Goiás, Adauto
Barbosa Júnior, permitiu que ela tivesse abrangência sobre as Organizações Sociais (OSs) e Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público
(Oscips), o que só poderia ser feito
mediante lei específica. “As fases procedimentais e recursais são bem mais
detalhadas do que a lei federal”, emenda o secretário. As multas decorrentes
dos processos instaurados em caso de
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
corrupção contra os órgãos/unidades
do estado serão destinadas ao Fundo
de Combate à Corrupção. Gerido pela
CGE, além das multas, o fundo terá
dotação orçamentária própria e receberá doações e repasses de convênios.
No caso da lei federal, a destinação
dos valores arrecadados com aplicações de multa pela CGU ainda é uma
questão sem resposta.
Como os processos abarcados pela
nova lei são aqueles originados de atos
praticados contra os órgãos e entidades
do poder público estadual, Barbosa Júnior não enxerga possibilidade de sobreposição com a lei federal.
A aprovação da lei estadual trouxe
novamente à tona o tema do compliance ao dia a dia das empresas goianas.
Para a advogada Nívea de Paula, do escritório Berquo Brom, um dos poucos
especializados na área no estado, depois
de uma procura inicial por conta da
Nº. 09 - Março / 2015
O GOVERNADOR
MARCONI
PERILLO
DURANTE
INAUGURAÇÃO
DE FÁBRICA DA
SAKURA:
presença de
grandes indústrias
no estado está
forçando as
empresas menores
a se adequarem
as regras de
conformidade.
aprovação da lei federal, com a Copa
do Mundo e as eleições na sequência, a
informação acabou não sendo tão disseminada. Já no final do último ano,
em dezembro, com a publicação da lei
estadual, aí sim as empresas começaram a se movimentar. E o ritmo segue
agitado desde então, ainda mais com
todos acompanhando os desdobramentos da operação Lava Jato. “Enquanto
só a lei federal estava em vigência, as
grandes empresas de Goiás já estavam
se preparando, mas as menores e locais
não estavam tão acesas. Agora, depois
da lei sancionada no estado, elas voltaram a nos procurar, com muitas dúvidas. Mesmo grandes empresários e executivos ainda não têm conhecimento”.
Para Nívea, a regionalização trouxe a
questão mais para a realidade de empresas e segmentos que talvez, só pela
lei federal, não desse a atenção necessária ao assunto.
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CONSTRUINDO
O ARSENAL
FISCALIZATÓRIO
A aprovação da nova lei, cuja regulamentação está sendo elaborada por
um grupo constituído especialmente
para essa finalidade, é a cereja do bolo
de um esforço bem mais amplo com o
objetivo de apertar o cerco à corrupção e capitaneado pela CGE.
Um bom exemplo do arsenal que
está sendo disponibilizado aos agentes
de fiscalização e controle do estado
são as trilhas eletrônicas. Elas consistem no cruzamento de diversas bases
de dados como Sistema Orçamentário
e Financeiro, Junta Comercial, Nota
Fiscal Eletrônica, Sistema de Pessoal
do Estado, INSS RAIS e Tribunal de
Contas dos Municípios com o objetivo de identificar indícios de irregularidades. Segundo o secretário, “a partir
desses indícios, de forma cirúrgica, os
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
auditores vão a campo obter comprovação para confirmar ou não o indício detectado. Se houver consistência,
a CGE abre auditorias para apurar o
problema e adotar as medidas legais
cabíveis”.
Outro movimento importante da
CGE no sentido de buscar mais eficiência é o projeto de lei que institui
a Fiscalização Prévia. O projeto modifica o fluxo de trabalho na área de
controle interno, principalmente na
fiscalização e no acompanhamento de
procedimentos licitatórios e na execução orçamentária e financeira dos
contratos. “Até então, a análise dos
processos com valor superior a R$
500 mil era feita após a publicação
do procedimento licitatório no Diário
Oficial do Estado. Com a mudança,
cria-se a fase consultiva, ou seja, antes
da publicação do edital, visando mitigar os riscos de falhas nas licitações
para que, na sua fase externa (publicação do edital), o processo tenha curso
regular, de forma mais célere”, pontua
Adauto Barbosa Júnior, da CGE. O
projeto foi encaminhado à Assembleia
do estado no meio de fevereiro.
Com essas medidas, o trabalho da
equipe da CGE - composta por 259
pessoas, sendo 143 delas agentes de
fiscalização e controles internos - é
direcionado com maior eficiência. O
secretário garante também que os investimentos são constantes na aquisição de equipamentos e sistemas de
Tecnologia da Informação, incluindo
um Sistema de Mapeamento de Risco
de Corrupção. Todos os sistemas de
controles são desenvolvidos internamente pela própria CGE. A consolidação da metodologia de mapeamento de riscos de corrupção nos órgãos
e entidades do poder público estadual, em caráter preventivo, é aliás, um
dos grandes objetivos da CGE para
os próximos anos.
SINAL AMARELO
A movimentação da CGE é turbinada pelas altas taxas de condenações
nos casos de corrupção em Goiás, que
39
LEGISLAÇÃO
GOIÁS
oferecem precedentes e casos concretos de indisponibilidade e bloqueio
de bens, por exemplo, além de muita
divulgação negativa dos casos na imprensa local. “Uma coisa é a lei sem
um resultado concreto. A outra são
decisões reais que mostram que ela
será aplicada e que quem não se adequar estará em risco. É um início de
mudança”, diz Nívea. Segundo ela,
“as empresas estão temerosas e prestando muita atenção. Elas chegam a se
assustar com a gravidade das penalidades que a lei prevê”, pontua.
Outro aspecto que gera preocupação nas empresas é que parte importante do atrativo econômico do estado
está justamente nos incentivos fiscais
oferecidos às indústrias, e que podem
ser anulados caso a empresa se envolva
em problemas relacionados à corrupção. Por esse motivo, o epicentro da
mobilização pelo compliance no estado é a cidade de Anápolis, principal
PIB industrial do centro-oeste com
plantas de empresas nacionais e multinacionais de grande porte como a
Hypermarcas, Ambev, Friboi, Vigor,
Saint-Gobain e Teuto/Pfizer. “Esse
movimento está vindo de lá [Anápolis], com os maiores se preparando e
os menores em cascata, tendo que se
adaptar. São as grandes empresas da
região que estão puxando os menores
para esse tema”, explica a advogada do
Berquo Brom, de Goiânia. Para ela
o processo de adequação à nova realidade já começou. “As empresas não
querem correr riscos. Em fevereiro, o
número de atendimentos foi muito
grande e esse movimento em cadeia,
com empresas fortes regionais e nacionais, algumas controladas ou com
participação de grandes grupos internacionais, sabem que não tem outro
caminho”. Por lá, os maiores riscos
são os relacionados aos processos de
fiscalização por agentes públicos.
Mas quem quer instituir a área
de compliance e contratar um profissional para administrá-la no estado
precisa ter paciência. A disponibilidade de mão de obra qualificada – um
40
ADAUTO
BARBOSA,
DA CGE-GO:
lei estadual é
mais ampla e
detalhada que a
federal.
problema mesmo nos grandes centros
– é ainda mais complicada na região
central do Brasil. “Tenho empresas
que me demandam profissionais para
ficar em tempo integral dentro da
companhia. Estamos treinando e nos
preparando, mas hoje, a saída é buscar
um profissional de fora do estado”, lamenta a advogada.
comunicação com o órgão. Atualmente o aplicativo está disponível apenas
para a plataforma Android, mas uma
versão para iOS, o sistema operacional
da Apple, está em desenvolvimento. O
Portal da Transparência do Governo
de Goiás também está sofrendo ajustes no seu layout para tornar o acesso às informações mais amigável. Na
Parte importante do atrativo econômico do
estado está justamente nos incentivos fiscais
oferecidos às indústrias, e que podem ser
anulados caso a empresa se envolva em
problemas relacionados à corrupção.
NA BOCA DO POVO
Baseado no tripé Transparência Pública/Controle Social/Controle Interno e
Correição, boa parte do planejamento
estratégico da CGE para os próximos
quatro anos está relacionada a projetos que facilitam o controle e, principalmente, a interação da população
com o órgão. Entre os destaques, está
a criação da Ouvidoria Digital, um
aplicativo para celulares que facilita a
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
mesma linha está o desenvolvimento
do projeto Acompanhe Cidadão, com
a oferta de informações sobre o andamento das despesas públicas. Nívea de
Paula confirma que a CGE vem ganhando visibilidade junto à sociedade
goiana e que toda essa movimentação,
incluindo desde palestras sobre o assunto até as operações de fiscalização,
tem servido para informar as empresas
sobre o trabalho do órgão.
Nº. 09 - Março / 2015
NEWS - RH
LEC
Como se os problemas fossem poucos
A
Petrobras está envolaviões no Aeroporto Afonvida em problemas
so Pena, em São José dos
de todas as ordens
Pinhais (PR). Em caso de
até a última gota de óleo
descumprimento, será codo pré-sal, incluindo sérias
brada multa de R$ 5 mil
questões sobre assumir ou
por trabalhador em situanão algum grau de responção irregular.
sabilidade com relação ao
De acordo com o minispagamento de funcionários
tro Cláudio Mascarenhas
(muitos já demitidos) de
Brandão, relator do caso,
empresas que prestavam ser“a empresa atua como forABASTECIMENTO DE AERONAVE: complicações trabalhistas.
viços ou tocavam obras para
necedora direta de produto
a empresa e que não estão
e serviço de abastecimento
recebendo da estatal. Mas
para as empresas de aviação,
como desgraça pouca é bobagem, a Sétima Turma do Tribunal tendo a função de técnico como parte da própria atividade
Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação da Petro- econômica da Petrobras Distribuidora. Não existe - ou não
bras por terceirização ilegal no abastecimento de aeronaves.
pode existir - triangulação, pois a relação é fornecedor-conA estatal foi acionada pelo Ministério Público do Traba- sumidor”. Brandão também ressaltou o fato de que a Pelho no Paraná (MPT-PR) pela utilização da empresa Mar- trobras mantém em seus quadros técnicos de abastecimento
lim Azul Comércio de Petróleo e Derivados para abastecer atribuições idênticas às dos terceirizados.
Assumindo a despesa alheia
O
Governo do Rio Grande do Sul terá de assumir o ta de comprovação do cumprimento de cláusulas do contrato
pagamento direto de trabalhadores terceirizados nos ou apresentação de comprovantes. De acordo com o Miniscasos em que houver retenção de verbas para as tério Público, parte das empresas contratadas não tem casuas prestadoras de serviços. A decisão foi dada pela 5ª Vara pital de giro sequer para pagar a folha dos empregados em
de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre após um único mês de contrato. Nestes casos, para receber os
ação civil pública do Ministério Público do Trabalho (MPT) valores devidos, o trabalhador passa a depender de ações
por conta de atrasos frequentes no pagamento de emprega- coletivas promovidas pelo sindicato de classe ou do ajuizados da Village Trabalhos Terceirizáveis. A empresa é respon- mento de reclamações individuais na Justiça do Trabalho.
sável pelos serviços de manutenção, limpeza, copeiragem e
Em outra ação, o MPT gaúcho disse que vai recorrer
conservação do Palácio Piratini,
da decisão para que o goversede do governo estadual. A deno seja obrigado a contratar
cisão atinge todas as terceirizasomente empresas com a míções da administração pública
nima capacidade financeira
estadual. Em caso de descumpara arcar com o pagamento
primento, o governo fica sujeito
dos funcionários. Também
à multa diária de R$ 10 mil por
será pedido ao estado que
obrigação infringida.
recolha, antes do início da
O procurador do Trabalho,
execução do contrato, caução
Ivo Eugênio Marques, explica
equivalente a dois meses de
que é comum o não pagamenprestação de serviços, além
to de funcionários terceirizados
de divulgar a sentença em
quando as prestadoras de ser- REUNIÃO NO PALÁCIO DO GOVERNO, NO RS: Governo vai ter
veículos de comunicação de
viços têm valores retidos por fal- que analisar a condição financeira dos seus prestadores de serviços. alcance regional.
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LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
41
SETORIAL
CENTRO DE DIAGNÓSTICO DO HOSPITAL
ALBERT EINSTEIN, EM SÃO PAULO: os centros
de atenção à saúde são negócios de alta tensão do
ponto de vista dos riscos de compliance.
FARMACÊUTICO
Teste de potencial
A aprovação da lei que permite a entrada de sócios estrangeiros nos
negócios de atenção à saúde abre boas perspectivas de negócios para as
empresas do setor. Mas será importante perceber o nível de maturidade do
Por Benny Spiewak
mercado em relação às políticas de compliance
A
amplitude e os impactos da corrupção na dinâmica dos negócios, sem dúvida, influenciam a percepção do investidor quanto à estabilidade e dinâmica de um mercado. Quanto maior a percepção
de corrupção, menos estável, mais arriscado e menos atrativo será o investimento. A noção é clássica, validada pela
Transparência Internacional e especialmente relevante na atração
de investimentos estrangeiros.
No Brasil, a efetividade desta premissa no setor da saúde
passou a ser testada a partir do último dia 20 de janeiro, com
a publicação da Lei 13.097/15. A norma, em síntese, permitirá a participação, direta ou indireta, de capital estrangeiro na
assistência à saúde brasileira, inclusive por meio da aquisição
do controle de empresas do setor. Em resumo, investidores estrangeiros poderão investir recursos financeiros nos centros de
42
atenção à saúde (CDS), incluindo hospitais e clínicas brasileiros.
O mercado dos CDS apresenta uma dinâmica de relacionamento única e que deverá evoluir para atrair os investimentos
agora permitidos pela lei. Intersecção de pacientes, profissionais
da saúde, médicos, prestadores de serviços e fornecedores, os
CDS concentram parte relevante da tensão própria dos aspectos
de compliance e de conduta de negócios.
Da visita dos propagandistas à contratação de equipamentos
médicos, passando pela interação de médicos-empregados com
a indústria da saúde e o desenvolvimento de pesquisas clínicas, é
nos CDS que os testes de conduta mais delicados são conduzidos,
especialmente aqueles relativos à gestão de conflitos de interesses.
A revisão e adaptação dos manuais, políticas e práticas de conduta continuarão a ser imperativos na atração de recursos financeiros estrangeiros e especializados na área da saúde.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº. 09 - Março / 2015
NEWS – FARMA
A participação dos recursos financeiros estrangeiros nos CDS
pode ser extremamente positiva na medida em que acarretará eficiência, redução de perdas e melhoria de processos. Contudo, a
participação ativa de interesses financeiros não poderá, de forma
alguma, sublimar a autonomia absoluta do médico e demais profissionais da saúde na escolha dos rumos terapêuticos e na tomada
de decisões profissionais.
CDS brasileiros, atentos à tramitação longa da Lei 13.097 e,
especialmente dos atos legislativos que a antecederam, se prepararam e continuam se preparando para essa realidade. No contexto destes preparativos, é importante destacar uma medida que
é continuamente avaliada pelo investidor estrangeiro, qual seja a
tomada de decisão.
Em muitos CDS, todas as decisões são concentradas em poucos indivíduos, sem observar regras e procedimentos, o que gera
conflitos. Contudo, essa realidade pode e precisa ser governada.
Para isso, destaca-se a importância do desenvolvimento de células
internas nos CDS, dedicadas a funções distintas e autônomas.
Por exemplo, a diretoria médica e outras frentes técnicas dos
CDS precisam ter absoluta autonomia no processo de seleção e
incorporação de melhores práticas terapêuticas, sem interferência
ou dependência de terceiros. Ainda, o relacionamento entre os
integrantes destas frentes técnicas com demais integrantes da cadeia de atenção à saúde deverá ser transparente, formal e passível
de acompanhamento.
CDS que mantêm um núcleo único de tomada de decisões
são mais propensos a concentrar interesses conflitantes. Na medida em que as decisões financeiras e outras não técnicas sejam
tomadas em esfera distinta daquelas predominantemente técnicas
e terapêuticas, permite-se, no mínimo, o diálogo e comparação de
propostas. Essa transparência é relevante.
Ainda, a autonomia dos núcleos técnicos permitirá que a decisão quanto à seleção de equipamentos, produtos e tecnologia seja
baseada em critérios técnicos pré-determinados. Será fundamental que os integrantes dos núcleos técnicos pautem suas decisões
nos mecanismos internos de eliminação de conflitos de interesse,
que se tornarão elementos básicos na gestão dos CDS.
Independentemente do número de integrantes e regras de
funcionamento, os núcleos de gestão de conformidade dos CDS
deverão garantir a autonomia dos médicos na tomada das decisões técnicas, bem como gerenciar eventuais pressões indevidas
sobre esses indivíduos.
Ao assegurar a independência dos médicos e profissionais de
saúde na tomada de suas decisões, os CDS demonstrarão ao potencial investidor estrangeiro o compromisso com a prestação de
serviços sem a influência de terceiros, pautada na eficiência e desenvolvimento do negócio. São esses os elementos que influenciarão o
investidor estrangeiro que almeja ingressar no mercado brasileiro.
Benny Spiewak é advogado especializado em Compliance para o
mercado farmacêutico e sócio do ZCBS Advogados.
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LEC
Multas pesadas
à frente
A
israelense Teva Pharmaceutical, maior fabricante de medicamentos genéricos do planeta,
disse em comunicado às autoridades que uma
investigação interna encontrou práticas de negócios
que “provavelmente” representam violação ao FCPA
e a outras legislações locais em operações da Rússia, Europa Oriental e América Latina. A investigação
interna da Teva começou, em 2012, depois de ter recebido da SEC e do DoJ intimações e outros pedidos
de informações relacionadas a suborno estrangeiro.
Em 2014, a farmacêutica já havia comunicado que
estava olhando para “problemas” em uma série de
países em todo o mundo que poderiam se converter
em violações à lei norte-americana de prevenção à
corrupção no exterior.
Esse não é o único problema legal com o qual a
Teva está lidando no momento. A companhia já comunicou que pode ter de pagar multas por investigações já avançadas relacionadas ao FCPA. Em outra
esfera, a empresa também disse que algumas filiais
em países abarcados pelo inquérito forneceram às
autoridades locais informações imprecisas ou alteradas sobre as práticas de marketing e promoção de
medicamentos da empresa.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
43
LEC
NEWS – PLD
PARQUE GUELL, EM
BARCELONA: a Espanha
avançou no combate à
lavagem de dinheiro.
Avanços
em meio
à crise
A
inda que se mantenha no furacão da crise econômica europeia,
a Espanha conseguiu criar um
sistema forte de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo,
mesmo que ainda se façam necessárias
melhorias em certas áreas-chave . Ao menos é o que diz um novo relatório sobre
o país europeu elaborado pelo Grupo de
Ação Financeira da OCDE (GAFI), órgão mundial responsável por estabelecer
e acompanhar as normas internacionais
sobre a luta contra o branqueamento de
capitais e o financiamento do terrorismo.
Na sua mais recente avaliação, apresentada no final de 2014, o GAFI aponta
que a Espanha enfrenta uma série de riscos
de lavagem de dinheiro, incluindo crime
organizado e tráfico de drogas, bem como
as atuais ameaças de terrorismo e o seu
financiamento. O GAFI confirmou que
os espanhóis possuem leis e regulamentos atualizados e instituições sólidas para
combater essas ameaças. Em particular, o
país dispõe de uma unidade de inteligência financeira forte, o que tem permitido
sucessos significativos na investigação e
repressão aos crimes de colarinho branco.
Por outro lado, as penas de prisão impostas foram consideradas baixas, disse o
relatório. E o GAFI também afirmou que
persistem lacunas na implementação das
sanções financeiras específicas para permitir o congelamento de bens relacionados ao terrorismo.
As medidas de combate à lavagem
de dinheiro praticadas pelos bancos são
CLIENTES
EM FEIRA DE
RELOJOARIA,
NA SUÍÇA:
mais rigor nas
transações feitas
em dinheiro
vivo na União
Europeia.
Fiscalização mais dura
A
s empresas na União Europeia
precisarão se preparar para enfrentar regras mais rígidas de prevenção à lavagem de dinheiro nos próximos anos. O Conselho da União Europeia
aprovou uma revisão das regras de PLD
para os países membros do bloco que
44
irá abranger um maior número de transações. No novo modelo, o corte para a
comunicação obrigatória de pagamentos
em dinheiro cai de 15 mil euros para 10
mil euros, o que afeta uma parcela mais
ampla do comércio de bens de consumo.
Pela nova diretiva, as empresas preci-
fortes, especialmente o sistema criado
para evitar o uso indevido de empresas.
Contudo, a aplicação em outros setores é
variável.
O presidente do GAFI, Roger Wilkins, disse que a Espanha merece os
parabéns pelos progressos realizados desde a sua avaliação de 2006. “O governo
espanhol tem feito grandes esforços para
atualizar suas leis e instituições a fim de
lidar com o branqueamento de capitais e
o financiamento do terrorismo. Essa avaliação do GAFI reconhece que, em geral,
a sua abordagem está funcionando. Mas,
claro, há sempre mais a fazer, e o GAFI
sublinhou uma série de ações prioritárias
para a Espanha tomar”.
sarão adotar uma abordagem baseada no
risco, a fim de melhorar os seus esforços
de fiscalização. Os bancos e outras entidades obrigadas precisarão realizar investigações em casos onde riscos percebidos
são maiores. Em compensação, nos casos tidos como de baixo risco pelas novas
regras, poderá ser adotado um processo
de due diligence simplificado. Já os prestadores de serviços de apostas – atividade
legal em boa parte do continente – precisarão realizar diligência para transações
superiores a dois mil euros.
As novas regras estipulam multas de,
pelo menos, o dobro do valor dos ganhos
resultante de uma violação de conformidade até o limite de um milhão de euros.
Para as instituições financeiras, as multas
para quem falhar com as diligências podem alcançar os cinco milhões de euros.
Os Estados-Membros terão dois
anos para implementar as novas regras
de PLD.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Nº 09 - Março / 2015
ANGEL GURRÍA, DA OCDE
E O SECRETÁRIO DO
TESOURO DA AUSTRÁLIA,
JOE HOCKEY: busca por
mais transparência fiscal
entre os países.
Harmonização global
O
s países membros da OCDE
e do G20 – o grupo das
20 maiores economias do
planeta - acordaram três
elementos-chave que permitirão a implementação de um projeto destinado a
mitigar a erosão da base de contribuintes e a transferência de lucros por multinacionais (BEPS).
Por meio do acordo será criado um
mandato para iniciar negociações sobre
um instrumento multilateral para agilizar a implementação de impostos relacionada às medidas do tratado BEPS;
um pacote de implementação com inquirição país a país em 2016 e um mecanismo de intercâmbio governo a governo, com início previsto para 2017. Além
da definição de critérios para avaliar se
os regimes de tratamento preferencial
para a propriedade intelectual (patentes)
são prejudiciais ou não.
“Estes são passos importantes que
demonstram que o progresso está sendo
feito em direção a um sistema fiscal internacional mais justo”, disse o secretário-geral da OCDE, Angel Gurría. “Estas decisões sinalizam o compromisso
inabalável da comunidade internacional
para pôr fim à erosão da base e transferência de lucros em linha com o cronowww.lecnews.com.br grama ambicioso aprovado pelos líderes
do G20”, completou o dirigente.
O Plano de Ação BEPS G20-OCDE
define 15 elementos-chave de regras
tributárias internacionais a serem apresentados no final deste ano. O projeto
tem como objetivo ajudar os governos
a proteger suas bases fiscais e oferecer
maior segurança e previsibilidade para
os contribuintes, bem como proteger as
empresas multinacionais contra novas regras tributárias domésticas, que incluem
dupla tributação, encargos de conformidade indevidos ou restrições às atividades
transnacionais legítimas. Sete dos 15 elementos já foram apresentados aos líderes
do G20 durante o encontro do grupo na
cidade de Brisbane, Austrália, em novembro de 2014. Os outros oito elementos
restantes devem ser mostrados em Antalya, na Turquia, em novembro de 2015.
Um desafio para a implementação
do Plano de Ação BEPS diz respeito aos
tratados fiscais bilaterais atualmente em
vigor. São mais de três mil em todo o
mundo. Apesar dos transtornos iniciais,
o grupo acredita que um novo instrumento multilateral irá oferecer aos países uma única ferramenta para atualizar
suas redes de tratados fiscais de uma forma rápida e consistente.
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Outro objetivo fundamental do projeto é aumentar a transparência utilizando melhores padrões de documentação
de preços de transferência, nomeadamente com a aplicação de um modelo de país
a país, relatando que as multinacionais
deverão dotar as administrações fiscais
com informações sobre receitas, lucros,
impostos vencidos e pagos, juntamente com alguns indicadores de atividade.
Empresas transnacionais com vendas superiores a 750 milhões de euros em seu
mercado local vão precisar fornecer estas
informações já em 2016. Se tudo der certo, a administração fiscal vai começar trocando os primeiros relatos país por país
em 2017. Alguns países têm enfatizado a
necessidade de proteger a confidencialidade das informações fiscais.
A orientação confirma que o método para o compartilhamento desses
relatórios entre as administrações fiscais
se dá por meio da troca automática de
informações nos termos dos mecanismos de governo a governo, como os
tratados fiscais bilaterais, a Convenção
Multilateral sobre Assistência Mútua
Administrativa em Matéria Fiscal, ou os
Tax Information Exchange Agreement
(TIEAS). Em casos excepcionais, métodos secundários, poderão ser utilizados.
45
PLD
GESTÃO
Exposição
de risco
A atuação junto a setores não obrigados,
mas expostos aos riscos da lavagem de
dinheiro, deve levar mais empresas a
enxergar as políticas de PLD com olhos
mais atentos no médio e no longo prazo
U
ma tendência cada vez
mais comum entre os órgãos de controle em todo
o mundo é o de transferir uma responsabilidade
que sempre foi dos Estados para a iniciativa privada: o poder de fiscalizar. E
para garantir que essa fiscalização seja
efetiva da parte das empresas, os governos – em suas diferentes esferas - contam
com um poder que é privativo deles: o
de criar leis, normas e regulamentos que
determinam a responsabilidade legal
dos agentes privados de fazer o processo fiscalizatório. Caso a empresa não o
faça, ou o faça de qualquer maneira, o
Estado pode entender que ela também
é responsável pelo crime. “Em termos
jurídicos, isso é chamado de responsabilidade penal por omissão. Você deixa de
fazer alguma coisa que era esperada que
você fizesse e por isso pode responder
pelo mesmo crime”, explica João Daniel
Rassi, sócio do escritório Siqueira Castro, de São Paulo.
46
A responsabilidade de fiscalizar certos aspectos dos negócios de parceiros,
sejam eles fornecedores ou clientes, não
é uma novidade para os profissionais de
compliance. Empresas de grande porte
já a assumiram há algum tempo e realizam análises e verificações amplas, due
diligence e auditorias sob diversos aspectos, e muitas mantêm programas de
qualificação. Além da obrigação legal,
esses procedimentos ajudam as companhias a mitigar eventuais danos operacionais e reputacionais, caso um desses
parceiros seja alvo de uma acusação de
corrupção ou de crimes ambientais, por
exemplo.
No caso das políticas de prevenção à
lavagem de dinheiro (PLD), os bancos
são os grandes “parceiros” dos governos
na fiscalização. Por isso, instituições financeiras investem bilhões de dólares
todos os anos para manter e ampliar os
seus programas de prevenção, melhorando, principalmente, os processos de
Know your Customer (Conheça o seu
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
Cliente). Para os bancos, a responsabilidade pela fiscalização e por informar situações de risco envolvendo lavagem às
autoridades está sob o império da lei e
determinado que eles têm obrigação legal de fazê-lo. O mesmo vale para agentes de outros setores obrigados (pelo
COAF, no caso do Brasil) como lojas de
artigos de luxo, corretores de imóveis e
concessionárias de automóveis que têm
a obrigação de comunicar certos tipos
de transações que podem ser consideradas suspeitas.
Mas se existe algo que, nesse momento, parece ser tão certo quanto a
morte é que no médio e no longo prazo
a responsabilidade de fiscalizar e conter
a lavagem de dinheiro se expanda para
outros mercados, obrigando empresas
de novos segmentos a olhar com mais
atenção para os programas de PLD,
principalmente para as políticas de Conheça o seu Cliente. “Os reguladores
estão olhando a cadeia com uma abordagem ‘siga o dinheiro’”, disse Micah
Nº. 09 - Março / 2015
POSTO DE GASOLINA BANDEIRA
BRANCA: no médio e longo prazo, é
provável que os distribuidores tenham
mais responsabilidade na prevenção à
lavagem de dinheiro no setor.
apreensão, as autoridades foram para
cima de empresas suspeitas de lavagem
de dinheiro. Os investigadores encontraram evidências de que muitas empresas aceitaram rotineiramente grandes
quantias de dinheiro provenientes de
organizações de tráfico de drogas com
base no México e na Colômbia. Los Angeles, que se tornou o epicentro para a
lavagem do dinheiro da venda de narcóticos e do comércio atacadista de moda
– setor que negocia grandes volumes
com o México -, tem sido utilizada para
converter os lucros do crime organizado
em mercadorias que podem ser exportadas para o México e vendidas em pesos. As investigações atingiram cerca de
metade dos quatro mil estabelecimentos que operam no Fashion District. E
nesse meio, é bem provável que parte
substancial deles financiou a lavagem de
dinheiro de drogas sem o menor conhecimento.
NEGÓCIOS MAIS EXPOSTOS
Willbrand, diretor global de produtos
de PLD da Nice Actimize, em entrevista publicada no AML Compliance:
2015 Update, um estudo publicado
pela revista norte-americana Compliance Week e pela consultoria KPMG. Para
ele, como o sistema bancário tradicional
fez um bom trabalho ao implementar
os controles de PLD e mantém os sistemas e controles internos em ordem, os
reguladores vão começar a olhar para os
pontos mais fracos do sistema financeiro, que cada vez mais conta com a presença de empresas que em nada se parecem com um banco tradicional. Apple
e Facebook, por exemplo, fazem transações em dinheiro. Grandes varejistas se
converteram em operadores financeiros,
recebendo depósitos e fazendo remessas de dinheiro para o exterior. Muitas
empresas não financeiras operam seus
próprios bancos, ou seja, existe uma miríade de novos negócios que já está sob
o olhar mais próximo dos reguladores.
Mas o impacto da tendência da res-
www.lecnews.com.br
ponsabilidade penal por omissão não
deve se restringir aos novos negócios
que, de algum modo, se assemelham
com certas atividades realizadas por instituições financeiras clássicas. Na verdade, ela pode alcançar setores da economia que hoje não fazem a menor ideia
dos riscos relacionados com a lavagem
de dinheiro nos seus negócios.
Em setembro de 2014, mais de
1.000 autoridades policiais dos governos federal, estadual e municipal fizeram
uma grande investida contra o ‘Fashion
District’, em Los Angeles, nos Estados
Unidos – uma região da cidade que reúne milhares de varejistas e atacadistas
independentes do ramo da moda - em
uma área de cerca de 100 quarteirões.
Guardadas as proporções, a região tem
uma dinâmica parecida com a de bairros
como o Bom Retiro e o Brás, na capital
paulista. Ou seja, em nada se assemelham ao que pode ser considerado como
varejo de artigos de luxo, por exemplo.
Munidos de mandados de busca e
LEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
O caso de Los Angeles é apenas um
exemplo de como o crime organizado
está sempre renovando o seu arsenal de
ações para branquear o dinheiro proveniente de atividades ilegais valendo-se,
muitas vezes, de negócios legítimos operados por terceiros sem conexão ou conhecimento dos criminosos. Isso, somado à tendência dos governos de transferir
as responsabilidades de fiscalização para
a iniciativa privada, impõe a empresas
que operam em diversos segmentos do
mercado novos desafios. E aqui não estamos falando das instituições, empresas e profissionais já obrigados a reportar informações para o COAF, aqui no
Brasil, ou para os órgãos equivalentes
em outros países. Esses são setores, que
de um jeito ou de outro, já estão sob
a égide da lei e, por isso mesmo, estão
conscientes da necessidade de estruturar
as práticas de PLD.
O que tende a acontecer daqui para
frente é um movimento pelo qual as
cadeias de negócios envolvidas em segmentos expostos – mas ainda não obrigados - serão olhadas mais de perto. E
47
PLD
GESTÃO
nesses casos a responsabilidade de fiscalizar pode cair sobre o elo mais forte
da cadeia. Pequenos varejos e atacados
de moda, salões de beleza, postos de gasolina, consultoras de venda direta, lavanderias, lava-jatos etc., em geral, são
todos pequenos negócios quase sempre
no setor de serviços cuja contabilidade
pode ser manipulada de maneira mais
fácil. São atividades difíceis de controlar, que ainda operam muito com pagamentos em dinheiro ou cheque, o que
facilita essa contabilidade criativa. “Os
restaurantes, por exemplo, que já foram
um negócio mais utilizado para lavagem, hoje estão menos expostos porque
quase todos os pagamentos são feitos
com cartões de débito e crédito, o que
dificulta fraudar a contabilidade”, diz
Nicole Dyskant, sócia da ACA Compliance Group, no Brasil.
Ao operar uma pequena rede infor-
tegração da receita ao negócio, já que,
ao contrário das operações com cartões,
a Receita Federal não tem como fazer os
cruzamentos automaticamente. Dos 40
mil postos de gasolina em operação no
Brasil, 40% deles são chamados de bandeira branca, ou seja, são independentes
e não operam sob as bandeiras tradicionais do mercado, como Petrobras, Ipiranga ou Ale. Por serem independentes,
eles compram combustível do fornecedor que melhor lhes convir. Segundo a
ANP – agência reguladora do setor de
petróleo -, existem 205 distribuidores de
combustíveis líquidos. Está claro quem
é o elo mais forte para fiscalizar a cadeia?
Sim, é muito mais fácil o governo exigir que 200 empresas – em sua maioria
de grande e médio porte - assumam a
responsabilidade de realizar a avaliação
dos seus clientes e instituir mecanismos preventivos para comunicar opera-
Ao operar uma pequena rede informal de
salões de beleza ou de lojinhas de bairro,
ou usar como laranjas revendedoras de
empresas de venda direta, organizações
criminosas podem lavar um volume
razoável de recursos sem chamar a
atenção das autoridades.
mal de salões de beleza ou de lojinhas
de bairro, ou usar como laranjas revendedoras de empresas de venda direta,
organizações criminosas podem lavar um
volume razoável de recursos sem chamar
a atenção das autoridades. Nesses casos,
quando o governo resolver fechar o cerco
contra a lavagem de dinheiro nessas cadeias produtivas, é natural que ele vá para
cima dos fornecedores desses pequenos
negócios. E aí, a coisa muda de figura.
Postos de gasolina recebem muito
dinheiro em espécie, o que facilita a in48
ções pagas em dinheiro vivo, checar se
o volume e a frequência com que um
determinado posto compra combustível encontram respaldo na realidade do
mercado e da região onde este opera e
até realizar eventuais diligências locais,
que permitam uma verificação real das
atividades do posto.
Parece muita responsabilidade adicional para uma operação criada para
distribuir combustível? E é mesmo.
Atualmente, o ponto central será ver
nos tribunais até onde vai a responsabiLEC - LEGAL, ETHICS, COMPLIANCE
NICOLE, DA ACA COMPLIANCE:
maior interesse das empresas para
estar dentro da lei também gera atenção
para os procedimentos de PLD.
lidade por omissão nesses casos. Mas,
dado o histórico recente, é plausível que
essa responsabilidade seja legalmente
transferida para as empresas no médio e
no longo prazo.
Por isso, empresas que forneçam
produtos para segmentos expostos precisam começar a pensar em mecanismos
para prevenir que os seus negócios não
sejam utilizados para fins escusos. E,
caso isso aconteça, que se possa provar
aos reguladores que você, ao menos,
adotou os procedimentos necessários
para tentar mitigá-los.
Antes até do aspecto legal, essa precaução também é importante para a
reputação da empresa. O segmento de
salões de beleza, outro que pode ser
enquadrado como exposto, é formado
por grandes corporações globais, como
a francesa L´Oréal, a norte-americana
P&G e a alemã Henkel, e também por
pequenas indústrias locais. Para todas
elas, a confiabilidade da marca é um
valor fundamental. Sem nenhum mecaNº. 09 - Março / 2015
NOVOS RISCOS PARA O NEGÓCIO: empresas de serviço, como os salões de beleza, que movimentam uma boa parcela de negócios em dinheiro vivo, e por
isso podem ter sua contabilidade mais facilmente alterada, oferecem novos riscos para as indústrias que vendem para esses negócios.
nismo de prevenção, a empresa pode se
ver de uma hora para outra como uma
financiadora indireta do tráfico de drogas. Ter que dar explicações sobre isso,
independentemente de não ter feito
nada de errado, certamente não é uma
boa publicidade para a marca. As empresas têm de se preocupar, portanto,
com uma eventual acusação de conivência ou omissão.
De volta aos aspectos legais, ainda
que não haja uma lei expressa que exija que empresas operem em setores não
obrigados pelo COAF, existem artigos
na legislação pelos quais a companhia
pode ser responsabilizada caso surjam
indícios concretos de que o produto ou
serviço vendido não seria utilizado para
tal finalidade, mas sim como fachada.
“A empresa dificilmente vai ser acusada
de lavagem de dinheiro, porque ela não
tem essa obrigação legal. Porém, pode
ser acusada de ter sido conivente”, ressalta Nicole.
Rassi, do Siqueira Castro, cita um
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exemplo de um negócio que não é obrigado, mas mesmo assim, está sendo levado a julgamento por omissão. “Uma
empresa de software de médio porte foi
procurada por uma empresa de representação comercial do sul do país que
queria que fosse desenvolvido um sistema comercial com recursos que permitissem a construção e a gestão de um caixa dois pelo sistema. Claro que o pedido
não foi tão explícito, mas a empresa que
vendeu o software tinha elementos para
saber que aquilo era caixa dois. A lei não
a obrigava a contar. No entanto, numa
situação concreta, se ficar demonstrado
que existiam elementos ou indícios de
que um crime ia ser praticado, poderá
haver a implicação”.
“Em última instância, seria preciso
ir até lá conferir, mas existe um limite.
Essa é uma obrigação que nem o Estado faz. E se pedir informação fiscal, o
cliente não tem a obrigação de passar. A
empresa vai ter de se certificar de outras
formas, olhar para os indícios, diante de
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certos indícios . Se a quantidade de produtos vendidos para um salão pequeno
é a mesma que de um salão grande, isso
é um indício que a empresa vai ter de
checar. O número de indícios que geram red flags de PLD vai subir. Para a
executiva, as empresas estão muito preocupadas com procedimentos de diligência em terceiros e também com corrupção. Porém, com relação à lavagem
de dinheiro, ela percebe um interesse
mais indireto. “As companhias querem
estar com os procedimentos redondos,
para não serem envolvidas em nenhum
tipo de escândalo, e aí entra também lavagem de dinheiro”, complementa.
A verdade é que cada negócio vai
precisar encontrar seus próprios critérios. E ter clareza sobre eles será importante. Como lembra Micah Willbrand,
“os reguladores raramente multam por
uma simples transação. Eles multam
porque os processos não funcionam
adequadamente ou porque você não tinha nenhum processo”, conclui.
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PILARES DO COMPLIANCE
DANIEL SIBILLE
A atuação do
profissional de
compliance
Por: Daniel Sibille (Latin America
Compliance Counsel na Oracle)
Encontrar soluções para viabilizar negócios com menos risco e não
negá-los. Essa é a essência do trabalho de um compliance officer
N
a mais recente aula sobre risk
assessment, proferida durante
o já tradicional Curso Preparatório de Compliance da
LEC, eu e os outros instrutores do curso
apresentamos aos alunos uma situação
concreta, na qual existia um risco importante para a operação. Pedimos aos alunos que mapeassem os riscos e, a partir
daí, trouxessem soluções para o problema. Pois bem, diante das respostas apresentadas pelo grupo, surgiu uma importante reflexão: qual é o limite de atuação
do profissional de compliance?
O papel do compliance, em minha opinião, vai muito além do
profissional que até pouco tempo
se caracterizava por ser uma barreira
para os negócios. Hoje em dia, o que se
vê na maioria das grandes corporações,
que investem para ter um programa robusto de compliance, com recursos e
autonomia para o trabalho, é que o papel do profissional transborda os limites
de funções tradicionais da área como
as aprovações de cortesias comerciais,
eventos de marketing e catalogação de
treinamentos. Sim, essas funções são importantes, mas o compliance moderno
exige do profissional um conhecimento
multidisciplinar e pró-negócios. A dinâmica atual do mundo dos negócios
requer que esse profissional tenha condições de avaliar o risco das transações
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não apenas pela ótica legal, mas também
considerando uma análise de aspectos de
auditoria, questões trabalhistas e previdenciárias, anticorrupção e, sobretudo,
dos riscos do negócio em si.
Voltando à sala de aula, uma parte
dos alunos defendeu que a existência de
riscos inviabilizaria a operação. Entretanto, a grande maioria defendeu que a
solução do problema seria a criação de
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ferramentas de controle capazes de avaliar os players envolvidos, os riscos
do país e do negócio em questão,
garantindo o entendimento da situação e um nível de controle suficientemente adequado a ela.
É exatamente essa a atitude que se
espera do profissional de compliance
moderno. Nessa profissão, como bem
diz o meu amigo e também instrutor do
curso, Fernando Palma (diretor executivo de Compliance Corporativo da EY),
não existem decisões fáceis, e é dessa
forma que deveremos costurar a nossa
análise de risco, levando em consideração os fatores extrínsecos e intrínsecos
de cada negócio, e encontrando soluções apropriadas (quando possíveis)
para cada um deles.
Como sugestão, fica a dica de que,
na grande maioria dos casos, é indispensável conduzir um risk assessment estruturado, com uma extensa due diligence
anticorrupção, análise documental e
entrevistas com todas as áreas envolvidas. A partir daí será possível estabelecer
os riscos e mitigá-los com ferramentas
contratuais apropriadas, cláusulas de
auditoria e de saída, gerando um maior
conforto para a situação.
“As opiniões desse artigo referem-se
exclusivamente ao ponto de vista do autor”
Nº. 09 - Março / 2015
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