5211 A ORGANIZAÇÃO DA INSTRUÇÃO PÚBLICA NAS CIDADAES DE UBERABINHA E PATOS DE MINAS-MG: EDUCAÇÃO E CIVILIZAÇÃO (1888-1930) Luciana Beatriz de Oliveira Bar de Carvalho Centro Universitário de Patos Minas Dermeval Saviani Universidade Estadual de Campinas RESUMO (Introdução) A utilização de documentação de caráter político tem sido de fundamental importância para o conhecimento e compreensão dos processos sociais. A partir destes dados foi possível recuperar, mesmo que parcialmente, os conflitos de poder, a formação das alianças, a ascensão e queda de grupos políticos, a ideologia dominante e algumas das principais representações da Primeira República. Mas esse manancial de dados não interessa apenas ao campo da política e da economia, liga-se, também, às preocupações de setores mais relacionados às questões culturais, como a educação ou, mais especificamente, a História da Educação.(Objetivo) A presente pesquisa tem como objetivo apresentar as primeiras iniciativas das Câmaras Municipais dos municípios de Uberabinha (hoje Uberlândia) e Patos de Minas, estado de Minas Gerais, Brasil; duas cidades que nasceram com a República e os seus poderes legislativos tomaram várias iniciativas no campo educacional. Deste modo, a pesquisa procura sublinhar como as políticas municipais foram concomitantes com aquelas tomadas pelo governo republicano e, de certa forma, também antecederam a própria legislação mineira. Assim, discute-se inicialmente o sentido da educação na Primeira República para, posteriormente, caracterizá-la no contexto da província de Minas Gerais. Finalmente, são apresentados os atos iniciais do poder legislativo uberabinhese e patense relativos à educação, salientando como eles trazem um certo “pioneirismo” neste campo. No entanto, a nossa preocupação primeira foi analisar e interpretar o percurso da História da Educação em Uberabinha, e Patos de Minas, no final do século XIX e até 1930, utilizando-se do estudo da documentação oficial, principalmente das atas da Câmara Municipal e de atos do executivo, complementados por reportagens da imprensa e da bibliografia especializada, compondo um quadro que esteja inter-relacionado com o processo educacional de Minas Gerais e do Brasil. (Fontes/Metodologia) A documentação utilizada na pesquisa foi ampla e extremamente rica. Os dados da análise estão contidos nos livros de atas da Câmara Municipal de Uberabinha, iniciando-se em 1888 e indo até 1930. Tanto em Uberabinha como também em Patos de Minas, encontraremos o debate sobre a educação manifestando-se de diversas formas. A formação dos municípios é quase simultânea à proclamação da República, apenas antecedendo-lhe em um ano. Trata-se, portanto, do que poderíamos chamar de cidades “legitimamente” republicanas. E, como tal, assumem e refletem os princípios defendidos pela nova ordem, inclusive a preocupação com o potencial altamente positivo de reordenamento contido nas instituições educacionais. Talvez a mais importante manifestação desse debate seja o conjunto de discussões que ocorre nas Câmaras Municipais, onde em algumas atas, já em 1892, discute-se a instrução pública, sendo apresentados projetos de leis relacionados à educação. Após várias discussões e emendas, foram aprovadas as primeiras medidas regulamentadoras da educação nos respectivos municípios. (Periodização) A data de 1888 é tomada como referência inicial por ser o ano de emancipação política de Uberabinha, sendo organizadas as instituições políticas específicas da cidade, como a Câmara Municipal e a ação do agente executivo. A década de 1880 é também muito significativa para a história do Brasil – e não apenas para a região –, uma vez que testemunhará importantes transformações na estrutura social brasileira, já que teremos em 1888 a extinção da escravatura e em 1889 a proclamação da República e a instauração de uma nova ordem nacional, implicando na substituição da Constituição e no estabelecimento de reformulações em praticamente todos os setores da vida político-econômico-cultural, inclusive da educação. Por outro lado, 1930 foi colocado como limite não por indicar o término de uma nova fase na periodização educacional mineira, mas por ser o ano de irrupção de um movimento nacional que levará à mudança dos 5212 grupos no poder – no Brasil, em Minas Gerais e nas cidades anteriormente mencionadas – e, conseqüentemente, a uma reestruturação da vida política nacional, inclusive com a elaboração de uma nova Constituição quatro anos depois, sem contar as reformas promovidas por Francisco Campos, agora no comando da educação nacional. (Conclusão) Portanto, cabia à educação um papel muito importante dentro da perspectiva republicana, isto é, não se poderia deixá-la sem um controle, pois caso contrário à mesma não iria contribuir para o desenvolvimento da sociedade, nutrindo nela os valores de ordem e de progresso, representações essas capazes de solidificar o ideário da positividade do trabalho, expressão maior do mundo civilizado. Nesse sentido, as Câmaras Municipais de Uberabinha e Patos de Minas tomaram medidas que sinalizam nessa direção, articulando-se com o cenário político-educacional brasileiro. TRABALHO COMPLETO Introdução A utilização de documentação de caráter político tem sido de fundamental importância para o conhecimento e compreensão dos processos sociais. A partir destes dados foi possível recuperar, mesmo que parcialmente, os conflitos de poder, a formação das alianças, a ascensão e queda de grupos políticos, a ideologia dominante e algumas das principais representações da Primeira República. Mas esse manancial de dados não interessa apenas ao campo da política e da economia, liga-se, também, às preocupações de setores mais relacionados às questões culturais, como a educação ou, mais especificamente, a História da Educação. Ao apresentar as primeiras iniciativas das Câmaras Municipais dos municípios de Uberabinha (hoje Uberlândia) e Patos de Minas, estado de Minas Gerais, Brasil; duas cidades que nasceram com a República e os seus poderes legislativos tomaram várias iniciativas no campo educacional. Deste modo, a pesquisa procura sublinhar como as políticas municipais foram concomitantes com aquelas tomadas pelo governo republicano e, de certa forma, também antecederam a própria legislação mineira. Assim, discute-se inicialmente o sentido da educação na Primeira República para, posteriormente, caracterizá-la no contexto da província de Minas Gerais. Finalmente, são apresentados os atos iniciais do poder legislativo uberabinhese e patense relativos à educação, salientando como eles trazem um certo “pioneirismo” neste campo. No entanto, a nossa preocupação primeira foi analisar e interpretar o percurso da História da Educação em Uberabinha, e Patos de Minas, no final do século XIX e até 1930, utilizando-se do estudo da documentação oficial, principalmente das atas da Câmara Municipal e de atos do executivo, complementados por reportagens da imprensa e da bibliografia especializada, compondo um quadro que esteja inter-relacionado com o processo educacional de Minas Gerais e do Brasil. República e Educação Ao ser implantado no Brasil, o regime republicano trouxe consigo, sob a égide do positivismo e do liberalismo, oriundos da Europa e Estados Unidos, idéias que exaltavam o nacionalismo e a formação de um novo homem que conseguisse conjugar as necessidades de seu tempo. Para tanto, fez-se necessário uma reestruturação em diversos setores da sociedade, incutindo, assim, os grupos sociais, os princípios éticos e morais do Estado Republicano. Politicamente, o Brasil apresentava-se sob o domínio do coronelismo, como elemento formador da base da estrutura do poder do país, reafirma-se, no Regime Republicano enquanto elemento retroalimentador das formações oligárquicas, alocando-se na então chamada “política de Governadores”. Embora o período republicano sinalizasse mudanças, pois estava sendo implantado um novo regime, Nagle afirma que: 5213 (...) A implantação do regime republicano não provocou a destruição dos clãs rurais e o desaparecimento dos grandes latifúndios, bases materiais do sistema político coronelista. Ainda mais instituindo a Federação, o novo regime viu-se obrigado a recorrer às forças representadas pelos coronéis, provocando o desenvolvimento das oligarquias regionais que, ampliando-se, se encaminharam para a “política dos Governadores”. Assim os “homens mais importantes do lugar”, pelo seu poderio econômico, político e social, mantiveram mais fortemente ainda como chefes como chefes das oligarquias regionais e , dessa forma atuaram como as principais forças sociais no âmbito dos governos estaduais e Federal. (NAGLE, 1974. p 4) Dessa maneira, as condições políticas estavam sendo perpetuadas, sinalizando assim a manutenção de um imobilismo estrutural que embora demonstre claros sinais de abalo, está longe de ruir-se, pois o Estado brasileiro, nesse período encontra-se entregue a uma composição de poder restrita e dominadora. Alastra-se pelo país uma política baseada nos jogos de poder e interesses que iria marcar a história do país. Paralelamente a esse quadro político, o Capitalismo e a industrialização começavam a ser implantados no Brasil, onde a sociedade brasileira, que era uma sociedade marcada pelas desigualdades, teve que ser reestruturada. Para isso, plantou-se a idéia liberal de igualdade para todos, pois essa nova ordem econômica necessitava da participação de todos, ao exaltar o espírito de igualdade e participação, em prol do desenvolvimento do país. O Período Republicano foi cenário de fervorosos debates que nortearam as idéias pedagógicas, que contribuíram para o avanço da educação no país. Segundo Carlos Henrique de Carvalho (2004), observar-se, pois, que esse período foi um dos mais importantes para a história da educação no Brasil, quando se delinearam e firmaram idéias pedagógicas que acabaram por orientar a evolução educacional e a busca de soluções para os problemas da educação, em que pode-se destacar: movimento contra o analfabetismo; busca da extensão quantitativa e da melhoria qualitativa da escolaridade; movimento pela profissionalização dos educadores e mobillização da sociedade pela difusão do ensino elementar. Entretanto, apesar de ter sido um período fértil, o país apresentava uma situação de escolarização bastante deficitária. (CARVALHO, 2004. p.40) Embora apresentou-se como um período de destaque no quadro educacional brasileiro, não podemos negar que a república também caracterizou-se por profundas desigualdades sociais. Devido a esse fato, a educação assumiu um caráter dualista, transformando-se em uma grande distorção, pois, não conseguiu aplainar as contradições políticas, econômicas e sociais. E na tentativa de reestruturar o modelo educacional, as reformas de ensino, embora consideradas importantes por sinalizarem mudanças expressivas na educação brasileira, reforçam o dualismo, ao legitimar os preceitos políticos que estavam sendo firmados em nome do desenvolvimento do país, fazendo com que as causas educacionais enquanto aspecto social não detivessem suas especificidades nesse campo, mas migrassem para o campo político e econômico, colocando-as a serviço do poder e usando-as para dar sustentabilidade a ordem e progresso tão almejadas pela elite dirigente do país. Buscava-se homogeneizar a cultura, através de um consenso de unidade nacional. E essa unidade só seria conseguida via educação, através da instrução. Porém, uma instrução mínima necessária, ou seja, a educação primária. Afinal, o país apresentava no início do séc. XX uma população composta de 80% de analfabetos e, nesse momento, todos os esforços estavam centrados em instrumentalizar a população para, atender às necessidades exigidas pelo novo contexto. 5214 Daí a necessidade de construir grupos escolares e promover reformas estaduais e federais. Vale lembrar aqui que o elemento usado para amalgamar esse novo tempo de profundas modificações e que se transforma em um eixo norteador para legitimar os preceitos da classe dirigente do país é a educação, que passa a ser usada como instrumento viabilizador de um processo civilizatório, buscando dessa maneira, formar o cidadão para uma sociedade “democrática” de direito aos moldes do liberalismo. A partir desse momento, inicia-se um intenso debate acerca da educação no país. Essa inquietação de idéias culminará em reformas educacionais que almejavam uma maior organização e estruturação do sistema educacional brasileiro. Desta forma, o espírito republicano, que teve seu fortalecimento com o fim do império, gradativamente penetra na sociedade brasileira e a educação passa a ser considerada pela primeira vez neste país como o “motor da história”, o que irá caracterizar paulatinamente o Entusiasmo da Educação e o Otimismo Pedagógico. Segundo Carvalho (2004), a educação passa a ser apresentada como uma verdadeira panacéia , dessa forma: o pensamento básico poderia ser explicado assim: todos os males estavam na ignorância reinante; a educação apresentava-se então como o problema principal do país e a solução de todos os problemas sociais, políticos e econômicos estaria na disseminação da instrução . (CARVALHO, 2004. p 34.) Neste sentido, inicia-se uma alteração nos instrumentos e conteúdos pedagógicos, pois até então, a questão da educação, enquanto instrução para o povo, sequer era discutida.E essas discussões em torno de uma estruturação educacional irá materializar-se no Otimismo Pedagógico e no Entusiasmo pela educação. Jorge Nagle, considera que o Entusiasmo pela Educação e o Otimismo Pedagógico, foram movimentos que alavancaram fervorosos debates acerca da educação em todo o país, culminando na criação da ABE que de acordo com suas observações teria surgido como desdobramento do Entusiasmo pela Educação. O entusiasmo pela educação e otimismo, que tão bem caracterizam a década dos anos vinte, começaram por ser, no decênio anterior, uma atitude que se desenvolveu nas correntes de idéias e movimentos políticos-sociais e que consistiam em atribuir importância cada vez maior ao tema da instrução, nos seus diversos níveis e tipos. É essa inclusão sistemática dos assuntos educacionais nos programas de diferentes organizações que dará origem aquilo que, na década dos vinte, está sendo denominado de entusiasmo pela educação e otimismo pedagógico. A passagem de uma para outra dessas situações não foi propriamente gerada no interior desta corrente ou daquele movimento. Ao atribuírem importância ao processo de escolarização, prepararam o terreno para que determinados intelectuais e “educadores” – principalmente os “educadores profissionais” que apareceram nos anos vinte – transformassem um programa mais amplo de ação social num restrito programa de informação, no qual a escolarização era concebida como a mais eficaz alavanca da História brasileira. (NAGLE, 1974. p 101.) Em 1924 surge a Associação Brasileira de Educação (ABE), formada por um grupo de intelectuais que tinham como objetivo sensibilizar o poder público e os educadores para os profundos problemas educacionais existentes no país. Nesse sentido, a ABE, embora representasse uma luta ideológica que atravessaria o tempo, apresenta-se segundo Marta Maria de Carvalho, como elemento restruturador dos mecanismos de controle da população urbana, reforçando assim, o “velho” em nome do “novo”. 5215 Assim, a ABE dissemina pelo país discursos cívicos buscando através da unidade nacional, introduzir via educação e em nome do progresso um novo modelo de “homem” que atendesse as atuais necessidades do novo tempo e para isso, seria necessário uma verdadeira campanha de saneamento, que extirpasse da sociedade brasileira todos os males. Sobre este aspecto, Marta Maria de Carvalho afirma que: Condensando os males do país da metáfora de um brasileiro indolente e doente e as esperanças da erradicação desses males na ação de uma “elite” dotada de poderes demiúrgicos, o discurso cívico da ABE é discurso profilático erigindo a questão sanitária em metáfora da situação nacional e a obra educacional em obra de saneamento. (CARVALHO,1998. p 145) Entretanto, toda essa luta ideológica, que consubstanciou-se com a criação da ABE, viria a culminar em dois acontecimentos de suma importância para a educação brasileira, a saber. O primeiro foi a Reforma Francisco Campos de 1931, a qual marcou o início de uma ação mais objetiva do Estado em relação à educação. Esta reforma assumiu para si a responsabilidade de conduzir o país no âmbito educacional, sendo a primeira a oferecer uma estrutura orgânica à educação. Cabe salientar que, pela primeira vez na história da educação brasileira, uma reforma estava sendo imposta em todo o território brasileiro, ou seja, a legislação de ensino teria que ter aplicabilidade em todo o país, fazendo assim, com que o problema educacional fosse discutido e resolvido de maneira ampla e não somente no interior dos estados, como vinha ocorrendo até então. Apesar da Reforma Francisco Campos, teoricamente ter sido uma reforma ampla, ela também representou um marco que iria consolidar o dualismo educacional, pois traz no seu âmago um conservadorismo exarcebado. Ao estabelecer o exame de seleção obrigatório como condição básica para ingressar no ensino secundário. Reforça uma educação elitista e discriminatória, aumentando a lacuna já existente entre o ensino primário e o secundário. E mais uma vez a expansão do ensino e sua renovação ficaram subordinadas ao jogo de forças oriundos da estrutura do poder. O segundo aspecto, e o mais relevante de todos, foi o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Esse manifesto, elaborado em 1932 por Fernando de Azevedo e assinado por 26 educadores brasileiros, líderes do movimento de “renovação educacional”, já de início, enfatiza a importância da relação dialética que deve existir entre educação e desenvolvimento e destaca a primeira como sendo fundamental, o carro chefe do desenvolvimento do País e um dos principais problemas da nação. Pois como diz o movimento, se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade. (Manifesto dos pioneiros da educação da Escola Nova, 1934.) Entretanto, o Movimento Renovador, teve suas vitórias e suas derrotas, pois apesar do Manifesto estar engajado na luta pela educação, estruturada e orgânica, e ter consciência da defasagem existente entre a escola e o desenvolvimento, comprometia-se na luta pela redução dessa defasagem. Fica claro que esse documento não questionava a nova ordem que estava sendo implantada, pelo contrário, ele propõe adequar o sistema educacional a ela, o que representa um avanço. Se por um lado o Manifesto proclamava a educação como direito individual que deve ser assegurado a todos, por outro, ele não se preocupou com a sistematização desse mesmo. Entretanto, essa racionalidade acaba gerando uma certa irracionalidade, embora lutasse por uma 5216 educação que fosse direito de todos, não havia condições de permanência, dentro do modelo de ensino, que estava sendo implantado a partir dos anos 30. Embora o Manifesto ao refletir sobre as incoerências de seu tempo, e por essa razão apresentar-se inconsistente e romântico em alguns momentos, ele também “representou a reivindicação de mudanças totais e profundas na estrutura do ensino brasileiro, em consonância com as novas necessidades do desenvolvimento da época”. (ROMANELLI, 1978, p.150). Porém, devido a questões políticas o movimento renovador da educação entrou em hibernação por um longo período, ao menos no campo das idéias, pois no campo efetivo os educadores continuaram sua luta. E no auge dessa hibernação e uma década depois da reforma Francisco Campos, foi decretado a lei Orgânica do Ensino Secundário, ponto central da chamada Reforma Capanema, implantada a partir de 1936. Essa reforma apresentou-se como sendo o prosseguimento do trabalho de expansão do ensino secundário no país, iniciado por Francisco Campos, mas reforçava o dualismo expresso na primeira. Entretanto com um diferencial, a reforma Capanema vem enfatizar a necessidade do ensino profissionalizante. A configuração das cidades de Patos de Minas e Uberabinha. Com base em alguns memorialistas conseguimos identificar elementos que configuraram a constituição da cidade de Patos de Minas. A partir da análise de documentos publicados por FONSECA (1974) recolhemos os seguintes dados. Em 1832, através de edital baixado pela Câmara de Paracatu é criado o distrito. Dessa maneira, a antiga povoação denominada “Os Patos”, passa denominar-se Santo Antônio da Beira do Paranaíba. O pedido de elevação do distrito à categoria de vila foi formalizado em 25 de dezembro 1856. Entretanto, a espera durou dez anos, pois somente em 30 de outubro 1866 seria promulgada a carta emancipatória através da lei 1291. E somente em 29 de fevereiro de 1868 se deu a efetiva instalação do município do Santo Antônio dos Patos. É importante ressaltar que a instalação da vila consubstanciou grande luta da população. Segundo FONSECA (1974), no pedido para a elevação de Santo Antônio dos Patos à vila constava: O Arraial de Santo Antônio dos Patos, banhado por um grande rego de excelente água, mais de cento e noventa casas habitadas, cuja Freguesia tem perto de 4.000 almas, é situada em alta e aprazível planície, entre a Mata da Corda e o Rio Paranaíba, na estrada que se dirige para o Sertão dos Alegres, Santo Antônio do Garimpo, Paredão, Arraial da Catinga, Ouro-Cuia, e para a cidade do Paracatu, cujos lugares são abastecidos pelos víveres e tabaco, que superabunda a agricultura de que trata o crescido número de fazendeiros desta Freguesia, e que além dos precitados atributos, também a importação aproximada é de 120:000$000 rs... e a exportação de 200:000$000 rs.. anualmente. (...) Os representantes esperam das mãos benéficas da Digníssima Assembléia a deliberação pretensa, como epítema eficaz dos males que sofrem, não só acerca do expendido, como até da falta de polícia, que será reparada logo que haja uma casa de custódia, ao passo que prospera a educação pública. Deus vos guarde. Freguesia de Santo Antônio dos Patos, 25 de dezembro de 1856. (FONSECA, 1974, 77 e 78) Ainda dos documentos publicados por Fonseca temos: em 24 de maio de 1892, o governo eleva a “toque de caixa” à categoria de cidade todas as vilas-sedes de comarcas. Dessa maneira, a vila de Santo Antônio de Patos foi uma das elevadas, pois encontrava-se na condição de sede de comarca. 5217 Assim estava concebida a cidade de Patos de Minas que começava a encorpar-se, dando sinais de sua emancipação. Embora, podemos observar que todo o ato de “emancipação” emanava do poder central; logo a autonomia das regiões estava condicionada às elites dirigentes do país que a despeito dos interesses dos habitantes exercia um forte controle social e determinava as diretrizes a serem seguidas. Neste sentido, a direção política da cidade de Patos, encontrava-se nas mãos dos “homens bons” que almejando o progresso da cidade conduzia o povo rumo à urbanização. E sob o julgo daqueles que concentravam em torno de si maior poder econômico e conseqüentemente maior poder político, configurou-se juntamente com o crescimento da cidade, a hierarquia do poder. Concomitantemente à urbanização, surgem necessidades urgentes de desenvolvimento em todos os setores da sociedade. E o discurso progressista conclamado pelas elites, apelava para a ampliação do transporte, comunicação, saúde e educação objetivando assim, a criação de uma infra-estrutura que desse sustentáculo ao desenvolvimento e ao progresso. Surgem então, em 1825, a escola de primeiras letras. Entretanto, existem aí elementos que, segundo Fonseca, caracterizavam-se como dificultadores do processo educacional: A vastidão da Província, escassos meios de comunicação, as distâncias que medeavam entre os habitantes constituíam alguns dos fatores, pelos quais o governo dava maior atenção ao ensino nas regiões de formação populacional mais compacta. Outro fator, o maior, era mesmo a falta de mestres, capazes de preencher as exigências do ensino. Ainda, a pouca disposição que os mais capacitados tinham de arredar pé das cidades ou vilas mais importantes: Ouro Preto, Sabará, Barbacena, São João Del Rei e outras. (FONSECA, 1974, p.123) A oficialização do ensino em Patos de Minas data 1853, ocasião em que é criada a primeira “cadeira de instrução primária” tendo como primeiro professor Francisco de Paula e Souza Bretas, nomeado em 13 de maio de 1853, permanecendo no cargo até 1957, ano em que, devido a interesses políticos locais pede demissão. No que se refere à instrução, o governo enfrentou sério problemas, pois era muito difícil encontrar professores disponíveis ou devidamente habilitados para ensinar em lugares distantes e em vilas de maior importância e constituiu problema de maior dimensão a falta das cadeiras do sexo feminino. Apesar das dificuldades, a nomeação da primeira mestra, Maria Madalena de Negreiros Maciel, ocorreu em 1868. A partir de dados levantados por FONSECA (1974), observamos que: O presidente da Câmara de Patos, Dr. Marcolino de Barros informava em 1912, o número de escolas mantido pelo legislativo municipal. Quatro escolas, sendo 3 do sexo masculino e 1 de ambos os sexos. Nas 3 primeiras, estudavam 154 alunos. Na escola mista,36 alunos e 11 alunas. Na mesma época funcionavam 4 escolas particulares, sendo 2 do sexo masculino com 31 alunos, 1 do feminino com 23 alunas, e 1 mista com 39 alunos e 24 alunas. (...) O recenseamento de 1920 apurou, 1.088 mulheres sabendo ler e escrever na sede do município. (...). (FONSECA, 1974, p.134) Representando um grande avanço no campo educacional e apresentando-se como imponente elemento do progresso em Patos de Minas, o Grupo Escolar Marcolino de Barros é instalado em 4 de junho de 1917, tendo como diretor o professor Modesto de Mello Ribeiro. Dessa maneira, paulatinamente, o cenário educacional de Patos de Minas começa a firmar-se enquanto palco de manifestações culturais que anunciavam paradigma de conduta e posturas individuais em nome da harmonia coletiva, tão almejada pelos benfeitores de Patos; incasáveis “guardiões do progresso” que tomam para si a missão de guiar o povo para a edificação da cidade civilizada. Idéia essa, amalgamada pelos princípios da moral e dos bons costumes. 5218 A elite, tomando para si os “louros” do progresso da cidade conduzia o povo rumo à modernidade, através da disciplinização, articulando mecanismos de controle com o intuito de moralizar a mesma; fazendo com que o povo assimilasse suas idéias sentindo-se como parte constitutiva e indispensável do processo de modernização. Assim, vários elementos são utilizados para disseminar a idéia de progresso, que atinge em cheio a vida cotidiana e o imaginário das pessoas. Isto posto, surge em Patos de Minas da elite para as elites, a imprensa, processo que não poderia ser diferente, uma vez que o povo não tinha instrução para encabeçar a criação de um evento de tamanha magnitude, tarefa atribuída a homens letrados como foi o caso de Fortunato Pinto da Cunha que, segundo FONSECA (1974), cria o primeiro jornal de Patos de Minas, “O Trabalho”, lançando o primeiro número a 15 de agosto de 1905. Se a cidade de Uberabinha possuía cerca de 11.856 habitantes, no final do século XIX, já 1920, somava uma população de aproximadamente 24.420 moradores1, desde 14.073 eram analfabetos, o que resulta em torno de 10.347 habitantes alfabetizados. Verifica-se, que o número de alfabetizados na população de Uberabinha estava próximo do percentual de 42,37%. Esses dados foram publicados pelo jornal A Tribuna, Uberabinha possuia em 1920 inclusive de Santa Maria 4390 em edade escolar de 07 a 14 anos, 1228 das quaes estudavam, 3505 que não estudavam. O número de analfabetos era de 14.073, 1959 das quaes cabiam ao distrito de Santa Maria. Nesta época a nossa população orçava por 24.420 habitantes dos quais 14.195 do sexo masculino, 1060 estrangeiros. A nossa produção bovina sem a taxa de deficiência orçava por 54.984, cabendo a Santa Maria uma contribuição econômica de 14.812 cabeças2. Os números obtidos a partir do recenseamento de 1920, no Brasil e no Estado de Minas Gerais, apresentavam, respectivamente, 75,0% e 79,3% de analfabetos. Outra análise possível, diz respeito aos dados sobre o número de analfabetos da população de Uberabinha na faixa etária entre 07 a 14 anos, estando em torno de 3.505, de um total de 4.390 crianças, que alcançava o percentual de 79,84%. Comparada com os percentuais da população de crianças analfabetas entre 07 a 14 anos, do país e do Estado de Minas Gerais, respectivamente, 80,2 % e 84,3%, possibilitou constatar um fato novo: Uberabinha possuía um percentual menor de analfabetos em relação ao números do Estado de Minas Gerais e do país, conforme a quadro abaixo. Quadro 1 - Comparativo de Percentuais de Analfabetos e da População de 07 A 14 Anos, entre Uberabinha, Minas Gerais e Brasil, em 1920: DESCRIÇÃO UBERABINHA MINAS GERIAS BRASIL POPULAÇÃO TOTAL 1 24.420 * % 5.888.174 ** % 30.635.605* * % CENSO de 1920. A Tribuna. Uberabinha, 22 Set. 1925, Ano VIII, nº 305. p. 1. O número de habitantes do município de Uberabinha em 1920, obtido na imprensa local é de 24.420. O valor deste número Cf. SENNA In: Brandão Apud SOARES, 1995: p.67 é de 27.956. O valor deste número segundo dados do censo de 1920 do IBGE era de 22.956. Optou-se pela dado veiculado pela imprensa escrita, por estar próximo à média dos três valores apresentados, em torno de 25.110 habitantes e incluso os dados sobre a população alfabetizada. 2 UBERABINHA. A Tribuna, Uberabinha, 22 Set. 1925, Ano VIII, nº 305, p.1. 5219 POPULAÇÃO DE ANALFABETOS POPULAÇÃO TOTAL 14.073 * 57.6 2 4.671.533 ** 79,33 23.142.248* * 75,54 4.390* % 1.318.365 ** % 6.582.917* * % 3.505* 79,8 4 1.112.073 ** 84,35 5.282.886* * 80,25 07 A 14 ANO POPULAÇÃO DE ANALFABETOS 07 A 14 ANOS Fontes: * Dados extraídos do Jornal A TRIBUNA, Uberabinha, 22 Fev. 1925, p. 1. * * Dados extraídos do IBGE. 1941: 590 3. Pode-se considerar que diante deste quadro há uma massa de analfabetos espalhados em todo o país, e de uma minoria que sabe ler e escrever, entre estes, os considerados alfabetizados, provavelmente, alguns com mínimas habilidades de leitura e escrita. Todavia a cidade de Uberabinha, se comparada com os dados estatísticos apresentados, em relação ao Estado de Minas Gerais e do país, apresentava um maior número de alfabetizados, em comparação às médias estadual e nacional. Portanto, para sustentar situação educacional, a sociedade uberabinhense sob os princípios de progresso e desenvolvimento, proclamados pela elite local, empreenderam esforços para a cada nova geração oferecer maiores oportunidades de acesso e de permanência no processo de escolarização as futuras gerações. Assim, entre 1919 a 1922, no final do segundo período administrativo do Agente Executivo de Uberabinha, Sr. João Severiano Rodrigues da Cunha, o número de estabelecimentos de instrução subiu de 6 para 8. O desenvolvimento dos estabelecimentos (são as escolas isoladas) municipais de Ensino Primário direcionavam-se, principalmente, para atender grupos em média de 50 crianças na área rural, e caracterizam-se por terem um funcionamento instável, em razão de diversos fatores, como falta de prédios próprios, baixa remuneração dos professores e a freqüência inconstante dos alunos que estava, oficialmente, vinculada ao utilização dos alunos no período de colheita agrícola. Os estabelecimentos institucionais do Estado, bem como de particulares, estavam situados na área urbana de Uberabinha. Entre estes, se destacavam, pelo Estado, o Grupo Escolar Júlio Bueno Brandão, que funcionava com maior regularidade, do que os estabelecimentos do município, atendiam neste período, mais de oitocentos alunos, e cada ano aumentavam o número de matrículas, indicativo do crescimento populacional do município. O estabelecimento de instrução particular, de propriedade de Sr. Antônio Luiz Silveira, denominado Gymnásio de Uberabinha, oferecia o Ensino Primário e Secundário na cidade, a mais de duzentos alunos, incluindo dez alunos, cujos estudos eram subvencionados pela Câmara Municipal do município. Após 1922, houve em Uberabinha um surto do crescimento no número de estabelecimentos escolares, marcando de fato os anos vinte. Resultado da convergência de ações, tanto de agentes público, quando privados, os quais estavam para se constituir como especialista na área educacional. Essa preocupação é percebida durante a última gestão, entre 1918 a 1922, do Agente Executivo da Prefeitura de Uberabinha e Presidente da Câmara Municipal, o Sr. João Severiano Rodrigues da Cunha, no governo no período de 1911 a 1922, foi promulgada a Lei nº 230 de 21 de novembro de 1919, que isentou de impostos e liberou material básico para a construção dos novos prédios destinados à instrução em Uberabinha, porém, destinada a iniciativa privada. A Lei 230 de 21/11/1919 foi publicada no A Tribuna, com a seguinte redação: “LEI Nº 230, DE 21/11/ 1919”. 3 IBGE., 1941, p. 590. 5220 A Câmara Municipal, por seus Vereadores Directores e eu sancionamos a seguinte lei: Art.1º. Fica concedida a insenção de impostos municipais, por quinze annos, sobre o prédio que a sociedade ‘Progresso de Uberabinha’ pretende construir nesta cidade, para um estabelecimento de instrução. Art.2º. A Câmara Municipal fornecerá de sua Pedreira as pedras necessárias para a construção do edifício. Art.3º.Revogam-se as disposições em contrário. Mando, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da presente lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir tão inteiramente como nella se contém. Paço da Câmara Municipal de Uberabinha, em 21 de Novembro de 1919. O Presidente da Câmara e Agente Executivo Municipal J. S. Rodrigues da Cunha 4. Por decisão do governo municipal, a Sociedade Anonyma Progresso de Uberabinha, receberia o benefício de isenção de impostos e pedras para a construção do edifício, e apenas aguardava, a planta do referido prédio escolar, que estava sendo elaborada em São Paulo, conforme A Tribuna, registra por meio de artigo, em 14 de setembro de 1919, quatro meses antes da publicação da Lei 230, Deve chegar, por estes dias a planta do prédio para Collégio, que a Directoria da Sociedade Anonyma ‘Progresso de Uberabinha’ mandou executar em São Paulo. Sabemos que tão logo essa planta chegue, os serviços serão iniciados. Os directores daquella Sociedade empenhamse em levar a cabo o mais breve possível os trabalhos, pois conhecem bem a extraordinária falta que o prédio vem gazendo sentir em virtude do crescente número de estudantes que de várias localidades alfuem a nossa terra. O terreno está comprado, e só esperam a chegada da planta para iniciarem os trabalhos 5. Associam-se as ações do governo municipal, as da iniciativa privada, que também contribuem para o desenvolvimento da instrução em Uberabinha. Entre essas ações encontra-se a de particulares movidos, ao certo, pelo compromisso de minimizar o grave problema da nação, caracterizada pelo elevado número de analfabetos, fator este, considerado um dos grandes obstáculos para o desenvolvimento e modernização da sociedade, que ainda estava, economicamente, alicerçada no comércio, principalmente, de carnes e cereais. Todavia as iniciativas particulares de intelectuais em Uberabinha foram reconhecidas até pelo Presidente do Estado de Minas, que na pessoa do Sr. Dr. Affonso Penna Júnior (19221926), Secretário do Interior do Estado de Minas Gerais, congratulou-se às iniciativas das professoras Alóre Ribeiro, Violeta Guimarães, Juvenilia Ferreira dos Santos e Antônia Avelina Franco, e expediu assim, telegrama de menção honrosa para as mesmas, conforme registro publicado no jornal A Tribuna. “MENÇÃO HONROSA”. O ilustre Sr. Dr. Affonso Penna Júnior digno Secretário do Interior, do nosso Estado, com o propósito de animar a iniciativa particular no combate ao analfabetismo, endereçou às dignas docentes a circular abaixo, que honra o auctor e muitos as homenageadas, Exº, Sr. Meus Cumprimentos 4 5 LEI Nº 230 de 21/11/ 1919. A Tribuna, Uberabinha, 21 Dez. 1919, Ano I, nº 15, p.3. PRÉDIO para collegio. A Tribuna, Uberabinha, 14/091919, Anno I, nº 3, p.1. 5221 Vejo, pelos relatórios do Regional que V.S. mantém nesta cidade, por iniciativa própria uma escola primária, e que a elle se consagra com prazer e operosidade. Cumpro o grato dever de aplaudir e louvar essa sua collaboração no problema da educação, que é hoje a questão vital para o paiz não podendo ter em paz a consciência, como patriota, quem não contriubui, por qualquer forma, para extinguir a triste vergonha do analphabetismo. Creia na sincera estima e alto apreço do Co. Att. Obr. Affonso Penna Júnior As professoras particulares, elogiadas na circular do dr. Secretário do Interior, dr. Affonso Penna Júnior são as seguintes: Senhoritas Alóre Ribeiro, Violeta Guimarães, d. Juvenilia Ferreira dos Santos e Antônia Avelina Franco6. Ressalta-se que esta "triste vergonha do analphabetismo", segundo as palavras do Dr. Afhonso Penna Júnior, localizava-se em, aproximadamente, 75% da população brasileira, que forma uma massa de analfabetos, herança de um longo processo de extrativismo de riquezas do país para a Europa e outras partes do mundo, conduzido por estrangeiros. Associado este, ao cultivo da instrução dualista, uma para “dizer”, reservado a minoria da população, à classe dominante, e outra “serviente”, para a servidão, para o fazer, conduzido pelos dirigentes do país, inculcada, primeiramente, pedagogia jesuítica e continuada pela católica, tanto no período colonial, quanto no Império. Em razão de a educação ser considerada, pelos intelectuais republicanos, como uma das alavancas para o progresso da sociedade, recebeu contribuição dos governos municipal e estadual, e num percentual menor da iniciativa privada. Obteve-se, neste período, quase o dobro do número de estabelecimentos de ensino. O aumento de escolas fora acompanhado também, de uma elevação substancial do número de alunos. Deste modo, percebe-se que o maior número de estabelecimentos de Instrução pública em Uberabinha ocorre entre 1911 a 1929, as quais passaram a atender as necessidades de escolarização das crianças das áreas localizadas nas zonas rurais, porém, em número de vagas, os estabelecimentos urbanos, na maioria de agentes privados, abarcavam o maior número de alunos. A respeito dessa expansão do ensino e sobre a necessidade de criação de novas cadeiras de docentes para o ensino público, A Tribuna publicou a seguinte reportagem: A elevada frequencia que tem tido o grupo escolar desta cidade, accrescida agora com os alunnos matriculados na Segunda quinzena de junho, obrigou o Sr. Director desses estabelecimento a installar uma classe extraordinaria até que a secretaria do Interior resolva sobre o caso, provalvemente creando mais uma cadeira. O numero de docentes do grupo tornou-se insufficiente para o grande numero de alumnos, attendendo se ao argmento da população e ao interesse com que todas as familias procuram educar seus filhos. Esse facto consolador sob todos os pontos de vista, acarreta maiores responsabilidades para os institutos de ensino, e para os estabelecimentos publicos, como o grupo escolar, importa em aumento de despezas, a que o governo não pode, todavia, se recusar, sob pena de resultarem inuteis os esforços dos que trabalham em prol da instrução. Desde o anno passado, a frequencia do nosso grupo vem exigindo a creação de mais cadeiras, repletas, como se acham as 6 MENÇÃO honrosa. A Tribuna. Uberabinha, 16/11/1919. Anno I, nº10, p.1. 5222 classes, algumas funccionando com quantidade de alunnos superior ao maximo do regulamento. E' intuitivoque essa plethora prejudica a efficiencia do ensino, visto como, não se falando na transmissão das materias estudadas, as professoras têm que dispender o dobro da actividade normal para a simples manutenção da disciplina. Neste mez, com acrescimento, a que nos referimos, da matricula supplementar, foi absolutamente impossivel a distribuição dos discentes pelas cadeiras do instituto, tornando-se forçada a providencia da installação de mais uma classe. Assim, o grupo que consta de 8 cadeiras e um lugar de adjunto, está funccionado com 10 classes, todas grandemente frequentadas7. A análise do balancete da Câmara Municipal de Uberabinha, em relação à receita do município e as despesas dele com a instrução, referente ao período entre 1919 a 1930, e transformados em percentuais, em valor arrecadado por ano, possibilitou a compreensão, com maior clareza, da existência da preocupação com a instrução no município, conforme está apresentado pelo gráfico abaixo8. 16,00 14,00 12,00 10,00 8,00 6,00 4,00 2,00 0,00 14,21 GASTOS DESPENDIDOS 10,06 6,78 8,16 9,09 5,00 7,64 3,49 3,60 2,36 3,29 1,77 1,66 3,45 2,38 1,28 1,95 2,40 1,44 7,02 GASTOS ORÃADOS 4,91 1,44 1,82 0,05 19 19 19 20 19 21 19 22 19 23 19 24 19 25 19 26 19 27 19 28 19 29 19 30 PERCENTUAL PERCENTUAIS DE DESPESAS COM INSTRUÇÃO DA CAMÂRA MUNICIPAL DE UBERABINHA- 1919 - 1930 ANOS FONTE: VIEIRA, Flávio César Freitas. Movimentos Educacionais em Uberabinha: Entusiasmo pela Educação e Otimismo Pedagógico (1919 a 1930) .V Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas "História, Sociedade e Educação no Brasil", FE-UNICAMP. Agosto 2001: p.15. CD ROM. A análise do gráfico revela que o gasto com a instrução, no município, esteve em média de 3,5% ao ano, e que o orçamento estimado para a instrução, efetivamente, quase dobrou em uma década. Em 1919 previa-se um percentual gasto em torno de 3,49% da receita com a instrução, porém gastou-se apenas 2,38%. Já nos anos de 1924, 1925 e 1926, os percentuais, efetivamente, gastos foram acima das estimativas, superando, respectivamente, os 3,45%, os 5,00% e os 9,09%, e de fato, foram gastos 3,60%, 8,16% e 10,06%. O aumento de verbas relaciona-se ao empenho do poder municipal de implementar ações para cumprir a Lei nº 278, de 07 de Março de 1923, a qual previa a ampliação do número de escolas no município. Esta inquietação, do poder público local, centra-se na intenção de promover o desenvolvimento da 7 PELA INSTRUCÇÃO. A Tribuna. Uberabinha, 16/06/1922, Anno III, nº 148, p.05 Cf.VIEIRA, Flávio César Freitas. Movimentos Educacionais em Uberabinha: Entusiasmo pela Educação e Otimismo Pedagógico (1919 a 1930).V Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas História, Sociedade e Educação no Brasil, FE-UNICAMP. Agosto 2001: CD ROM. 8 5223 cidade, tendo na instrução um de seus instrumentos mais importantes e eficazes para alavancar o progresso de Uberabinha. Considerações Finais Ao analisarmos o período proposto, podemos observar que a elite dirigente do país, ao implantar o Regime Republicano, tomou para si a responsabilidade de alcançar a passos largos, o progresso da nação, usando como elementos de sustentação, os princípios liberais de democracia e cidadania e os preceitos harmônicos do positivismo. Esses elementos, iriam contribuir para disseminação dos ideais de civilidade e da ordem e progresso por todo o país. Para atingir seus objetivos, era necessário que os governantes, reestruturassem a sociedade aos moldes do novo regime. Para tanto, deveriam criar um novo homem que em consonância com o novo tempo, contribuiria de maneira efetiva para a constituição de uma nação. Nesse sentido, o regime republicano fez da educação o instrumento ideal para amalgamar as massas, recrutando o povo, via instrução para a grande marcha em prol de desenvolvimento do país. Todo este processo, deveria propiciar o ajustamento do indivíduo que inserido em uma sociedade que buscava a ordem e o progresso, não poderia destoar da estampa coesiva que ilustrava a nação, sob pena de transformar-se em um grande mal, que deveria ser estirpado da sociedade, para não comprometer a harmonia vigente. Entretanto, para que estas concepções educativas penetrassem no imaginário das pessoas e se transformasse em um corpus social, era necessário sua disseminação. Dessa forma, a imprensa e as Câmaras Municipais apresentam-se como principais elementos propagadores dos ideais republicanos. Nesse sentido, o pensamento divulgado pela imprensa patense e uberabinhense, iam de encontro aos setores dominantes nacionais, ao divulgar a necessidade de criação de escolas na região, enfatizando com caráter de urgência, a importância da instrução para o processo de civilidade e chamando para participar da condução do país em direção a modernidade. Portanto, a educação foi considerada um fator de promoção social. Sua função era o enquadramento dos indivíduos à vida social, considerando-os como seres individualizados, desvinculados dos grupos sociais a quem pertenciam. Assim, o fracasso ou o sucesso de cada um dependia dele mesmo, de suas tendências inatas. Todos tinham acesso às mesmas condições educacionais, e só não obtinham sucesso quem não respeitasse as suas inclinações naturais. Sua fala vinha de encontro ao interesse de se organizar as cidades de Patos de Minas e Uberabinha, dentro da proposta positivista de civilidade, já que as sociedades evoluiriam naturalmente e deveriam acompanhar essa evolução, conformando-se às novas condições sociais, fruto do crescente processo de urbanização que ocorria no país. E para institucionalizar esse ajustamento, foi utilizado como instrumento, a educação.