CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS CAMPUS TIMÓTEO Processos Industriais Módulo Aço Parte 3: Da análise térmica ao diagrama das fases (parte 1: O processo do alto-forno e a produção de aço; parte 2: Entender o diagrama das fases do aço; disponíveis no site http://www.timoteo.cefetmg.br/site/sobre/cursos/quimica/repositorio/artigos/) Prof. Armin Isenmann 2. DA ANÁLISE TÉRMICA AO DIAGRAMA DAS FASES 2.1. Análise térmica A matéria feita de pequenas moléculas ou de átomos (no caso dos metais) apresenta-se em diversos estados, que podem grosseiramente ser classificados em sólido, líquido e gasoso. As transições sólido líquido gasoso geralmente são bem visíveis, já que são acoplados a mudanças drásticas das interações entre as moléculas/átomos. Essas atrações intermoleculares/interatômicas, por sua vez, são responsáveis pelas viscosidades típicas dos estados mencionados. Sendo assim, podemos colocar uma substância molecular (orgânica) numa capilar e observar nitidamente seu ponto de fusão, já que a viscosidade do cristal é muito alta e do líquido muito baixa. Mas conhecemos também materiais com estados intermediários (consistência de couro, elasticidade de borracha, géis) onde a transição entre os estados não se evidencia tão obviamente. Essas transições, tipicamente observadas em materiais poliméricas, se devem à formação ou quebra, de ligações entre (pequenos) grupos ou segmentos das cadeias macromoleculares, ainda bem antes das cadeias inteiras se soltem uma da outra. Também mencionamos a transição entre fases sólidas de estruturas cristalinas distintas (“polimorfismo”) – onde podemos incluir também as mesofases dos cristais líquidos. E ainda, há estados incomuns no dia-a-dia, tais como superlíquidos, matéria em estados supercríticos, supercondutores, para mencionar alguns. Enfim, para caracterizar tais estados e seus limites de existência, certamente não é suficiente observá-los de olho nu. Muitas vezes as viscosidades dos dois estados físicos envolvidos na transição térmica são muito altas – o que impede sua observação num aparelho de ponto de fusão, por exemplo. A alta viscosidade da matéria condensada também é a causa para o ajuste do equilíbrio termodinâmico retardado. Até mesmo hoje conhecemos transições que são puramente cinéticas, entre elas especialmente os fenômenos em estados superaquecidos e/ou supersaturados. Para detectar as transições mais sutis entre as fases, temos diversos fenômenos e ferramentas analíticas: ópticos, reológicos, dimensionais, elétricos e térmicos. Sobre os últimos vamos falar neste texto. A importância da análise térmica para a caracterização de materiais sólidos, plásticos, borrachosos e até líquidos, justifica uma discussão breve destes métodos, nas quais se destacam: 1 A Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC; do inglês: Differential Scanning Calorimetry) e A Calorimetria Diferencial de Temperatura (DTA; Differential Thermal Analysis); essas muitas vezes em combinação com A termobalança (TG = Thermo-Gravimetry), que mede a perda irreversível de voláteis durante o primeiro aquecimento do material. 2.2. Estados físicos da matéria e ordem das transições térmicas Antes de apresentar as funções termodinâmicas de estado e suas dependências térmicas, vamos diferenciar entre verdadeiras transições das fases e as relaxações térmicas. Em uma transição térmica o material se encontra em equilíbrio termodinâmico, tanto abaixo como acima do ponto de transição. Esse estado equilibrado não é influenciado pela velocidade de aquecimento/resfriamento, nem pela velocidade das deformações mecânicas. Uma transição térmica em uma substância uniforme a nível molecular se destaca por um ponto nítido (temperatura, pressão, volume) onde ocorre a transição para outro estado. Por exemplo, um único ponto de fusão. Outras transições deste tipo são a ebulição de líquidos, a transição entre fases em cristais líquidos (nemática, esméctica, colestérica) e, claro, a inversa da fundição, a cristalização. Fig. 1. Esquema da organização em cristais líquidos (LC): (a) organização tridimensional em cristais; (b) organização bidimensional (= em camadas) em LC esmécticos; (c) organização unidimensional em LC nemáticos; (d) perda total da organização em fluidos isotrópicos. 2 Relaxações, por outro lado, são fenômenos cinéticos, quer dizer, variam ao longo da escala do tempo. São, portanto, sensíveis à frequência com que o método analítico trabalha. Relaxações ocorrem quando partes da molécula começam a movimentar-se. Ao contrário das transições verdadeiras, o sistema não se encontra em equilíbrio abaixo da temperatura de relaxação – muitas vezes nem acima dela. E mais uma: o fenômeno da relaxação é acoplado a um método analítico específico, sendo que não tem caráter universal. Alguns métodos analíticos, no entanto, trabalham com tais frequências (baixas) que a relaxação aparece como se fosse uma transição térmica verdadeira. O exemplo mais famoso é a transição vítrea, Tg, medida com os métodos calorimétricos de aquecimento lento. Na transição vítrea ocorre uma mudança da maioria das qualidades mecânicas do material, sendo duros, vidrosos, quebradiços abaixo da Tg e mais moles, flexíveis e borrachosos acima da mesma. Erroneamente, por muito tempo as transições vítreas eram consideradas transições térmicas verdadeiras. Note que ainda há outras transições térmicas onde não se tem certeza sobre a sua natureza cinética. Um estado termodinâmico pode ser descrito adequadamente através da sua energia livre de Gibbs, G, ou então por suas primeiras derivadas parciais pela temperatura T ou pela pressão p: H G TS G T G T S G p V G T (1) p (2) p (3) T As segundas derivadas parciais da energia de Gibbs levam à capacidade calorífica isóbara, Cp, ao coeficiente de expansão cúbica térmica, , e à compressibilidade cúbica isotérmica, : H T Cp 1 V T p V T 1 V S T 2 T p G T2 (4) p (5) p V p (6) T Especialmente a primeira grandeza, Cp, é de suma importância nesta discussão, já que ela representa a quantidade de calor Q que um corpo recebe em um pequeno intervalo térmico T: C (T ) lim T 0 Q . T (7) 3 Isso é justamente o que os aparelhos da análise térmica estão medindo. A partir do valor experimental de Cp se calcula uma grandeza de alta importância teórica, a capacidade calorífica isócora, CV (quer dizer, a volume constante): CV Cp T V 2 . (8) Somente para esclarecer as terminologias acerca da capacidade calorífica: ao dividir pelo número de mols envolvidos, recebe-se a capacidade calorífica molar (unidade: J.mol-1.K-1); dividir pela massa leva à capacidade calorífica específica (unidade: J.g-1.K-1). Transições térmicas se caracterizam pela mudança característica de uma função do estado. Devem existir equilíbrios termodinâmicos em ambos os lados da temperatura de transição. A ordem de uma transição térmica pode ser classificada, segundo Ehrenfest (mais tarde refinado por Landau que aplicou a teoria dos grupos à termodinâmica), como aquela derivada da energia de Gibbs que ainda é uma função contínua (o matemático fala em diferenciável). Já a próxima derivada faz um pulo (= inclinação infinita) no momento da transição. Transições térmicas verdadeiras são classificadas sendo da ordem N, quando a (N-1)-ésima derivada da energia livre de Gibbs mostra um vinco, a N-ésima derivada um pulo, e a (N+1)ésima derivada um pico nítido e infinitamente alto. Por exemplo, em transições da primeira ordem se observam pulos nas funções volume V, entropia S e entalpia H, ver equações (1) a (3). Uma descontinuidade nítida pode-se esperar na fusão de um cristal perfeito e grande. As primeiras derivadas de H e V pela temperatura levam à Cp, CV e ; a primeira derivada pela pressão ao (equações 4 a 6). Essas funções devem então mostrar um pico infinito na temperatura (pressão) desta transição. A fusão de um cristal macroscópico, para um líquido, é uma típica transição das fases de 1ª ordem. Para derreter o cristal é necessário fornecer energia – sem que a temperatura aumente. Essa “energia latente” é usada, somente para aumentar o grau dos movimentos moleculares, no ponto da transição das fases. Portanto, H(T) faz um pulo neste ponto. No entanto, observamos uma degeneração das descontinuidades de H, S e V, para curvas em forma de S, quando os cristais são pequenos e/ou imperfeitos. E os picos agudos de CV, e se arredondam para curvas de sino. Esses casos são mostrados na Fig. 2, parte esquerda. 4 Fig. 2. Funções do estado termodinâmico, V, H, S, e CV, para transições verdadeiras de 1ª ordem: fusão de cristais (imperfeitos); 2ª ordem: transição esméctica-nemática em cristais líquidos, um efeito intermolecular cooperativo. Em comparação: a transição vítrea, que é uma relaxação (= situação fora do equilíbrio termodinâmico). Transições térmicas verdadeiras da 2ª ordem se caracterizam por pulos nas segundas derivadas da energia de Gibbs pela temperatura; estas são e CV. Exemplos são a transição (“lambda”) do He líquido a 2,2 K, as transições de rotação em sais cristalinos de amônio e o desaparecimento do ferromagnetismo no ponto de Curie. Em todas essas transições se mantém a mesma fase – uma característica das transições verdadeiras de 2ª ordem. Outras transições da 2ª ordem são observadas em polímeros LC (= Liquid Crystal), entre diferentes fases esmécticas ou da fase esméctica para nemática (ver Fig. 1). A Fig. 3 mostra as funções características da termodinâmica e seu comportamento, durante transições verdadeiras de 1ª e 2ª ordem, em comparação. 5 Fig. 3. Transição das fases e as funções termodinâmicas do estado (adaptado de http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Phase_transition_first_and_second_order_ de.svg#mediaviewer/File:Phase_transition_first_and_second_order_de.svg) Chegando de altas temperaturas, uma amostra passa pelo ponto de fusão e fica, em primeira instância, numa forma sólida de energia mais alta. Essa forma sólida, especialmente em polímeros, pode transformar-se em seguida, quando a temperatura for abaixada, em modificações sólidas menos energéticas. Os processos moleculares envolvidos nestas transformações sólido-sólido são rotações de segmentos da cadeia polimérica. Em casos de cadeias frouxamente empacotadas, uma rotação deste tipo facilmente, isto é, requer pouca energia, portanto a transição é observada em baixas temperaturas. As rotações geralmente são cooperativas, mas são de natureza intramolecular. Quanto mais defeitos cristalinos, mais fáceis as rotações. Por outro lado, caso houver um empacotamento mais denso, as cadeias vizinhas devem participar neste movimento, ou seja, tem cotações cooperativas (= sincronizadas) de natureza intermolecular. As transições térmicas típicas em amostras poliméricas são resumidas na Fig. 4. Note que a linha-base raramente fica na mesma altura em ambos os lados da transição, já que a capacidade calorífica do material geralmente é diferente, abaixo ou acima da temperatura característica. A forma geométrica da curva e a altura dos sinais dependem, além disso, da velocidade de aquecimento. Sendo assim, pode acontecer que a transição vítrea mostra, em vez de um simples degrau, um pico endotérmico (não mostrado na Fig. 4). Além disso, uma quantidade de amostra maior leva a um gradiente térmico maior e um nivelamento da temperatura mais demorado. 6 Fig. 4. Esquema de um termograma de aquecimento, de um polímero parcialmente cristalino. Índices usados: SS = sólido I – sólido II; G = transição vítrea; LL = líquido I – líquido II (transição incerta); cryst = formação de cristais mais perfeitos; M = fusão; react = reação química, tipicamente uma oxidação, ramificação ou vucanização; decomp = degradação ou carbonização da amostra. Fig. 5. Dependência térmica da entalpia: mostrada para uma amostra com duas modificações cristalinas. Note que a energia para a evaporação é muito maior, do que H das outras transições. 7 Fig. 6. Dependência térmica da entropia, mostrada para uma amostra com duas modificações cristalinas. Fig. 7. Dependência térmica da capacidade calorífica isóbara, mostrada para uma amostra com duas modificações cristalinas. As transições verdadeiras de primeira ordem se evidenciam como picos agudos. 2.2.1. DTA Na DTA se registra, por meio de termopares, a diferença entre as temperaturas de duas tigelas, enquanto uma contém a amostra e a outra uma substância inerte que não mostra nenhuma anomalidade (amolecimento, fusão, decomposição química, etc) dentro da faixa térmica estudada. As duas tigelas são aquecidas, geralmente no mesmo forno, a uma taxa 8 constante de 10 a 20 °/min. Como referência para amostras cerâmicas e outros materiais inorgânicos (registro geralmente entre temperatura ambiente e 1200 °C) se aprovou α-Al2O3 (corúndio ou corindo, em forma de pó fino e seco); para as amostras metálicas (ligas) pode-se optar também por um pedaço de metal puro e sólido, por exemplo, molibdênio. A exatidão do método é melhor quando tigela de amostra e tigela de referência tenham aproximadamente as mesmas massas. Medições de DTA são geralmente realizadas sob uma atmosfera de gás inerte (Ar, He, N2); No entanto, é também possível provocar a reação química da amostra com um gás reativo (por exemplo, oxidação / redução). 9 Fig. 8. Aparelho de DTA. Em cima: esquema do forno, com porta-amostras e termopares. No meio: arranjos típicos das tigelas dentro do forno da DTA. Em baixo: aparelho comercial. O arranjo dos termopares na estufa é em forma de dois pinos verticias, em cima dos quais se coloca as tigelas (que podem ser de corúndio ou de metal) para amostra e referência. Desta maneira se coloca as substâncias na proximidade dos fios metálicos do termopar sem que estes sejam contaminados por contato direto. É medida a diferença das temperaturas atuais ( T na ordenada; unidade µV) ao longo do tempo (abscissa; unidade min). Como o aquecimento é bem controlado, a unidade da abscissa pode em seguida ser transformada em temperatura T. Enquanto não tiver anomalidades térmicas na amostra, a cuva T verso T é uma reta (geralmente de pouca inclinação). O início de uma discontinuidade da curva, geralmente localizado com bastante exatidão por meio de extrapolação (ver Fig. 10), marca a temperatura “onset” de uma transição térmica dentro da amostra. Isso pode ser interpretado como começo de uma reação química ou uma transformação física (mudança da fase cristalina; transição vítrea, fusão, etc.). Fig. 9. Curva típica de DTA. Em cima: histórico térmico de oxalato de cálcio; Em baixo: marcar as temperaturas “onset”, “peak” e “offset”, mostrado para uma transição exotérmica de primeira ordem, durante o aquecimento. 10 Caso ocorra uma reação endotérmica, a temperatura da tigela com a amostra fica temporariamente abaixo da temperatura da referência, e a curva apresenta uma depressão. Em caso de um processo exotérmico a curva mostra um deslocamento para cima (ver Fig. 9b). O ponto fraco neste método é que o calor da reação (entalpia específica, em kJ.g-1) somente pode ser indicado de maneira indireta, por meio de aferições. Este procedimento prejudica a exatidão da DTA, o que a qualifica para um método apenas semi-quantitativo. Fora disso, podemos atribuir à DTA um grande valor analítico, especialmente na Identificação de transições de fases, Cinética de reações, Caracterização da estabilidade térmica de misturas (reativas), Comportamento térmico de plásticos, Existência de modificações cristalinas, Reatividade de substâncias instáveis. A aplicação mais prominente da DTA, todavia, é o estudo de ligas metálicas e materiais cerâmicos. 2.2.2. Termogravimentria (TG ou TGA) Chama-se de termogravimetria o monitoramento da massa de uma amostra durante um programa controlado de temperatura, geralmente o aquecimento com velocidade constante. Sendo assim, a escala do tempo pode facilmente ser convertido em temperatura. O instrumento consiste de uma escala sensível que se encontra dentro de uma estufa. A atmosfera dentro da estufa é rigorosamente controlada. Para facilitar a interpretação da cruva termogravimétrica pode-se fazer, por meios eletrônicos, a primeira derivada do tempo do sinal original (= curva DTG). Isso é especialmente útil em perdas lentas de massa, que fornece uma curva bastante rasa, difícil de interpretar. Já a derivada desta curva original deixa aparecer o acontecimento de forma mais acentuada, onde é mais fácil determinar o começo (Tonset) e o fim (Toffset) de uma reação. O máximo da curva DTG corresponde à temperatura onde a velocidade da reação térmica, (dm/dt)max, é máxima. Também reações mais complexas e de várias etapas podem ser identificadas e analisadas separadamente através da curva DTG. Termogravimetria somente faz sentido em amostras que reagem com a atmosfera ou então desprendem componentes voláteis. Os processos físicos e químicos envolvidos são evaporação, sublimação, dissociação, adsorção - dessorção, decomposição e oxidação – redução. Isso indica os campos típicos de aplicação da TG: Determinação de umidade na amostra (minérios, fármacos, alimentos, etc.). Investigação de processos de secagem em geral. Caracterizar sublimação, evaporação e vaporização, a partir de líquidos ou sólidos. Simulação dos processos de calcinação (porcelana; barros, vidros, etc.). Análise de resíduos de calcinação (sais, metais, géis e polímeros inorgânicos, etc.). Identificar produtos de decomposição, solventes e solvatos. Investigação do envelhecimento térmico em polímeros e vidros. Caracterização e monitoramento de processos de pega, endurecimento e envelhecimento de materiais de construção (concreto, gesso, carbonatação de cal, etc.). 11 Comportamento da amostra em atmosferas corrosivas (exposição a diferentes vapores e gases). Caracterização de elastômeros e borrachas (restos de vulcanizador, solventes de inchaço, teor em negro de fumo, materiais de carga de natureza inorgânica, etc.). Secagem de tintas e esmaltes (teor e qualidade dos solventes). Natureza e teor de aditivos de baixo peso molecular em termoplásticos, (plastificantes, lubrificantes, solventes, filler, estabilizante, etc.). Determinação de fórmulas químicas de compostos. Análise quantitativa de materiais compostos (umidade, recheios, plastificantes, solventes, teor de polímeros, etc.) Estabilidade térmica e decomposição térmica de substâncias, Cinética de decomposições térmicas Estudo de processos de combustão Adsorção e dessorção de gases. Caracterizar materiais higroscópicos (adsorção e dessorção de umidade) Fig. 10. Curva termogravimétrica do oxalato de cálcio, com determinação da perda em massa via extrapolação. A termogravimetria caracteriza a variação da massa de uma amostra submetida a um programa de aquecimento ou arrefecimento. A medição é feita em atmosfera controlada (gases inertes / reativos) e sob condições definidos de fluxo de gás (estático / dinâmico) ou até sob vácuo. 12 A calibração da termobalança é feita utilizando uma substância de referência, ou um padrão. Uma mudança da força de sustentação durante o aquecimento ou resfriamento causa pequenas variações de massa na curva TG. Estas podem ser coletadas em um teste cego com a amostra de referência e depois compensadas por meios eletrônicos. Uma amostra sólida de volume V, percebe uma força de sustentação Fsus em um gás da densidade Fsus V g (9) A densidade do gás diminui com o aumento da temperatura, o que pode ser descrito com boa aproximação (gás ideal; condições isobáricas): (T0 ) T0 (T ) T (10) Das equações (9) e (10) resulta para a variação de massa temperatura de T0 para T: m m(T0 ) m(T ) V (T0 ) 1 T0 T m durante a mudança de (11) 2.2.3. Análise Térmica Simultânea (STA) Sob análise térmica simultânea se entende a combinação de DTA com TG, mais recentemente também de DSC com TG. Este método permite a medição simultânea dos efeitos térmicos e das alterações de massa na amostra. Isto são informações valiosas sobre a natureza dos processos e reações químicas que ocorrem durante as transições térmicas. Fig. 11. Equipamento de DTA combinado com TG. 13 O registro contínuo da variação da massa permite uma determinação precisa da variação de entalpia. A STA não está sujeito a erros, incertezas e falta de exatidão que podem ocorrer em experimentos de DTA e TG separados, causados Pela geometria da amostra, Falta de homogeneidade da amostra ou Imprecisões de temperatura. Caso uma reação térmica gerar gases, estes podem ser caracterizados em termos quantitativos e qualitativos, pelo acoplamento da STA a um espectrômetro de massas ou um cromatógrafo de gás. As áreas de aplicação da STA são extraordinariamente diversificada. As mais importantes para indústria e pesquisa são mencionadas abaixo: Caracterização de transições térmicas (fusão, cristalização, transições de fases sólidas e transições vítreas), Elaboração de diagramas de fases (medição da temperatura de equilíbrio invariante e da curva liquidus, principalmente) A caracterização do comportamento térmico de materiais (decomposição, oxidação, redução, corrosão), Testes de pureza (controle de qualidade), Análise da cinética das reações químicas, Otimização de reações (sínteses energéticas, combustões, tratamentos térmicos), Determinação dos componentes em misturas. Existe um grande número de diagramas das fases (temperatura T verso composição) para diversos materiais compostos e misturas binárias, resumidos nas obras-padrões (por exemplo, Landolt-Börnstein). Tab. 1. Processos térmicos que podem ser caracterizados por STA. Processo Natureza exo/endo Fundir física endo Cristalização física exo Evaporação física endo Sublimação física fortemente endo Transição vítrea física não há pico, apenas um degrau Adsorção de pequenas moléculas física exo Dessorção física endo Quimissorção química exo Dessolvatação, desidratação química endo 14 Reações redox química exo Reações catalíticas química exo 2.2.4. DSC A Calorimetria Exploratória Diferencial (Differential Scanning Calorimetry, DSC) é um método mais recente, desenvolvido com base de 50 anos de experiência na DTA. Os primeiros modelos da DSC, conhecidos como DSC de “compensação de energia”, são constituídos de dois fornos autônomos, um para a amostra e outro para a referência. Ambos os fornos são aquecidos por resistências elétricas cujo consumo em energia é registrado. O aquecimento acontece de tal maneira que: A rampa térmica fica constante (geralmente são aplicados em 10 graus por minuto, mas para propósitos especiais podem ser escolhidos entre 2 e 300 graus por minuto). As duas estufas tenham sempre temperaturas idênticas. Esse é o diferencial mais marcante da DSC para a DTA clássica. Assim feito, a DSC fornece uma informação muito importante para o químico, que é a energia envolvida numa transição térmica. Ela é fornecida pelo aparelho em mW por g de substância, mas através de aferição pode fornecer a entalpia específica em kJ/g, com alta exatidão. Por outro lado, a DTA “somente” fornece uma diferença em temperatura – que não pode ser transformada em entalpia com tanta facilidade. O sinal de medição, isto é, a área sob o pico da curva DSC [diferença de fluxo de energia verso o tempo], é diretamente proporcional ao calor absorvido ou libertado. Fig. 12. A DSC da primeira geração, de “compensação de energia”, trabalha com dois fornos separados, onde tanta energia é fornecida/retirada para manter as temperaturas idênticas. 2.2.5. Funcionamento da DSC de fluxo de calor Ao longo dos anos foram desenvolvidos aparelhos mais simples e mais confortáveis de DSC. Em vez de compensar a energia para duas estufas diferentes, hoje é possível construir aparelhos com apenas uma estufa. O aparelho conhecido como DSC de “fluxo de calor” (alemão: Wärmefluss-DSC; inglês heat flow DSC) é mais barato, mais robusto e, provavelmente a vantagem principal, pode ser combinado com a termobalança (TG). Dentro da DSC de compensação de calor pode-se diferenciar ainda, de acordo com o arranjo dos termopares, entre a DSC "clássica" e DSC “Tian-Calvet”. 15 Na DSC de fuxo de calor, os dois cadinhos, amostra e referência (o último geralmente é um cadinho vazio), são colocados em cima de um porta-amostra condutor, bem centralizado nesta estufa. A resistência ao calor, K, do porta-amostra é conhecida através de calibração. A estufa é então aquecida com uma rampa dT dt constante. Este aquecimento requer um controle (computadorizado) especialmente rigoroso. O mesmo vale para a rampa do resfriamento e até para paradas (ensaios isotérmicos; têmpera). O calor produzido pela estufa cilíndrica aquece amostra e referência, por meio de condução. O fluxo do calor para a amostra, no entanto, é maior devido à capacidade calorífica CP deste material. A diferença neste fluxo, q , induz uma pequena diferença em temperatura T que é medida através de termopares bastante sensíveis, diretamente abaixo dos cadinhos. Resulta um sinal que é proporcional à capacidade calorífica 1: T K dq dt K q . K CP (12) Quando de repente acontece uma transição térmica na amostra, isso se percebe numa anomalia na curva de T. Calor é excessivamente consumido ou liberado pela amostra, e a curva T verso o tempo faz um pico: dq dt f (t , T ) . CP (13) A área abaixo deste pico da curva (função da capacidade calorífica) é indêntica com a entalpia, já que H T Toffset CP p H C P dT . (14) Tonset E a temperatura onset indica o começo da transição térmica (por exemplo, a temperatura de fusão). 1 Note que esta relação está em toda conformidade com a lei de Ohm, no fluxo elétrico: V R dQ dt R Q R I 16 Fig. 13. Abb Princípios e modelos comerciais de DSC do tipo “fluxo de calor”: Em cima: esquemas da estufa, onde o porta-amostra é posicionado central e simetricamente. Embaixo: porta-amostra da Netzsch DSC 214 e TGA/DSC 2 da Mettler-Toledo. Uma célula de medição DSC consiste de um forno e um sensor integrado com posições designadas para os cadinhos de amostra e referência. Mais difundidos são os sensores de chapas lisas (tipo Boersma), em cima dos quais se coloca cadinhos com fundo liso, para maximizar o contato condutor entre sensor e amostra. As áreas do sensor estão conectadas aos termopares ou podem até mesmo ser parte do termopar. Isto permite a gravação tanto da diferença de temperatura entre o lado da amostra e a referência (Sinal DSC) e a temperatura absoluta do lado da amostra ou da referência. Com essas características a DSC de fluxo de calor tem mais semelhança com a DTA, do que com sua irmã, a DSC de compensação de energia. Todavia, notamos que a DSC de fluxo de calor de hoje é superior em todos os aspectos do que a antiga DTA. Devido ao calor específico (Cp) da amostra, o lado da referência (usualmente um cadinho vazio) geralmente aquece mais rapidamente do que o lado da amostra durante o aquecimento de uma célula de medição DSC; isto é, a temperatura de referência (TR, verde) aumenta ligeiramente mais rápido do que a temperatura da amostra (TP, vermelho). As duas curvas apresentam comportamento paralelo durante o aquecimento a uma taxa de aquecimento constante – até que uma reação ocorra na amostra. No caso mostrado aqui, amostra começa a fundir no tempo t1. A temperatura da amostra não varia durante a fusão; A temperatura do lado da referência, entretanto, permanece inalterada e continua apresentando um aumento linear. Quando a fusão é completada, a temperatura da amostra também começa a aumentar novamente e, começando com o ponto no tempo t2, novamente apresenta um aumento linear. 17 Fig. 14. Temperaturas simultâneas de amostra (P) e referência (R) e determinação da entalpia da transição dentro da amostra. Fonte: http://www.netzsch-thermalanalysis.com/pt/landing-pages/principio-funcional-de-um-fluxo-de-calor-dsc.html A curva DSC representa então a dependência térmica da capacidade calorífica, dC P dT (exemplo dado na Fig. 7 e Fig. 14). É uma curva monôtona, constante e quase reta, enquanto não ocorrem transições térmicas dentro da amostra. Por outro lado, quando começa uma transição que envolve calor, evidenciam-se desvios característicos da linearidade nesta curva. O sinal da diferença das duas curvas de temperaturas (ΔT) é mostrado na parte debaixo da imagem. Na seção do meio da curva, o cálculo da diferença gera um pico (na Fig. 14 em azul) representando o processo de fusão endotérmico. Dependendo se a temperatura da referência foi subtraída da temperatura da amostra ou vice versa durante este cálculo, o pico gerado pode estar orientado para cima ou para baixo no gráfico. A área debaixo do pico (= integral da curva Cp) é o teor de calor da transição, isto é, a entalpia H em J/g, conforme descrito pela equação (4), na p. 3. A DSC de fluxo de calor ainda tem outras vantagens que tornam este método mais universal: com a “Flash DSC 1” da Mettler-Toledo, por exemplo, podem ser feitos aquecimentos e resfriamentos-choque, com até 2,4 milhões K/min e 240.000 K/min, respectivamente! Isso representa uma nova dimensão nos estudos de processos de cristalização, reorganização e relaxação, tanto em polímeros orgânicos como em material vitrificado inorgânico. Uma cristalização ou organização em estruturas líquido-cristalinas pode ser impedida sob estas condições extremas. E assim, importantes processamentos de termoplásticos, tal como a injeção ou a extrusão, podem ser simulados com este aparelho – o que foi difícil em aparelhos DSC mais lentos. Outro desenvolvimento e a DSC modulada (MDSC; principalmente desenvolvida pela TA Instruments), onde além da rampa térmica é aplicada sempre uma pequena oscilação da temperatura. Um tratamento matemático do sinal da MDSC (onde é feita a derivada) leva a um método mais sensível do que a DSC clássica. Além disso, a capacidade calorífica específica da amostra, Cp, se torna uma observável direta com esta técnica – o que na DSC tradicional somente foi possível indiretamente, através do tratamento matemático da curva 18 experimental. E, finalmente, pode-se obter dados sob variações muito pequenas da temperatura – o que facilita um ensaio quase-isotérmico, condições que facilitam muito as interpretações termodinâmicas da amostra. Limitações físicas da DSC: 1. Não é possível minimizar a sensibilidade e maximizar a resolução, no mesmo aparelho e no mesmo experimento. 2. A curvatura, alta inclinação e variações irregulares da curva do branco (= linha-base, registrada com portas-amostra vazias) delimita a sensitividade – o que dificulta detectar transições fracas. 3. A interpretação da curva é muitas vezes difícil, devido ao acontecimento de diferentes transições simultâneas, na mesma faixa térmica. A DSC somente registra o fluxo de calor sumário de todas as transições. Todavia, um software moderno (por exemplo, da TA Instruments) já consegue separar quantitativamente picos mesclados, através de um algoritmo chamado de “Deconvolution”. 4. A determinação do grau de cristalinidade em polímeros, através da DSC, muitas vezes é afetado por erros, devido a faltas no registro da cristalização durante a fase de aquecimento. 5. A DSC não funciona sob condições isotérmicas (no entanto, com a MDSC já chegamos muito perto desta situação, conforme descrito acima). Aplicações da DSC As áreas de aplicação da DSC se sobrepõem parcialmente com as da DTA. Mas a lista dos dados térmicos da DSC é muito mais longa: Comportamento e anomalias na fusão Cristalização (ou vitrificação) Polimorfismo (= transições entre diferentes fases sólidas) Elaboração de diagramas de fases. Transição vítrea (especialmente de polímeros orgânicos; termoplásticos; borrachas) Outras transições rígido-tenaz-elástico-viscoso. Caracterização das mesofases em cristais líquidos. Temperatura de Curie e transições magnéticas. Entalpias de mistura, de reação química, de conversão entre fases, de vaporização, de sublimação. Reações de ramificação em resinas e na vulcanização de borrachas (exotérmicas). Reações de oxidação Capacidade calorífica específica (Cp) e sua dependência da temperatura. Análise da cinética e progressão de reações químicas; Determinação da pureza; controle de qualidade. A DSC é eminentemente adequado para a determinação da temperatura de fusão ou solidificação de plásticos, que podem então ser utilizados para identificar os polímeros. Nos 19 termoplásticos e elastómeros se identifica a faixa térmica da transição vítrea (Tg). Nesta região térmica muda drasticamente o comportamento mecânico: abaixo da Tg o material se torna duro, com alto módulo de elasticidade, ao mesmo tempo quebradiço quando deformado além de 1%, tipicamente. Acima da Tg se observa módulos mecânicos inferiores, no entanto aumenta bastante a elasticidade. Neste estado o objeto pode ser largamente deformado sem quebrar, portanto formou-se a expressão “termoplásticos” para tais materiais. Sendo assim, podemos afirmar que a transição vítrea é de suma importância em aplicações técnicas destes materiais poliméricos. Um aumento considerável na resistência ao impacto (toughness; impact strenght) de um termoplástico se consegue por meio da mistura física com uma pequena alíquota de material borrachoso. Importante neste caso é uma boa compatibilidade, ou seja, mistura a nível molecular, entre as bolinhas de borracha e a matriz do termoplástico. Esse tipo de misturas heterogêneas (polymer blends) podem ser caracterizadas por DSC. A análise das temperaturas Tg dos seus componentes serve para caracterizar a compatibilidade entre as fases: quanto mais próximas as temperaturas Tg, maior a compatibilidade entre as fases. No caso de compatibilidade completa se observa apenas uma única transição vítrea, localizada entre as temperaturas Tg dos componentes isolados. A descrição mais simples, para um sistema binário, foi dada por Fox (outras são de Gordon-Taylor, Couchman e Pochan e de Kwei 2): 1 Tg x1 Tg ,1 1 x1 . Tg , 2 (15) Um papel central tem a transição vítrea em todos os materiais que chamamos de “plásticos”. Muitas vezes sua matriz polimérica se apresenta, à temperatura ambiente, em estado duro, rígido e quebradiço. Neste estado podemos afirmar que as cadeias poliméricas e seus segmentos são fixos – os átomos e agrupamentos apenas podem exercer ligeiras vibrações em volta do seu lugar de repouso. Transição vítrea significa que pequenos segmentos das cadeias poliméricas recebem mais liberdade para movimentos, os mais conhecidos são as rotações livres de pequenos segmentos dentro da cadeia polimérica, de comprimentos típicos de aproximadamente 10 distâncias interatômicas. O que pode provocar essa nova liberdade é, além da expansão térmica do material, um elevado grau de irregularidade dentro da cadeia polimérica (muitas ramificações, baixas massas molares e assim muitos finais de cadeia) e entre as cadeias (presença de solventes, aqui mais conhecidos como plastificantes). Esses fenômenos se articulam num abaixamento da transição vítrea, para temperaturas menores. Quando se consegue deslocar a Tg de um material polimérico, para abaixo da temperatura de uso (temperatura ambiente, geralmente), ele se apresenta menos duro, mais flexível e mais elástico, enquanto sua viscosidade ainda é pequena. A análise térmica é, portanto, um dos mais importantes instrumentos para caracterizar materiais plastificados. 2 W. Brostow et al., Prediction of glass transition temperatures: Binary blends and copolymers. Materials Letters 62 (2008) 3152–3155 20 Tab. 2. Comparação entre DSC e DTA valores indicados podem variar largamente, dependendo da fábrica e do modelo) Critério DTA DSC Sensibilidade/exatidão boa muito boa Quantidade de amostra 50 mg 20 mg até 2000 °C até 700 °C Não Sim (até –180 °C) ar ou gás inerte gás inerte seco tigela de corúndio ou metal (reutilizável) panelinhas de alumínio com tampa (descartável) Sim Não Indica a entalpia específica? Não Sim Quantifica cp e H? Não Sim Faixa térmica Medição abaixo temperatura ambiente? Atomosfera Porta-amostra Disponível termobalança (= TG) ? com Robusteza mecânica Conforto de manuseio / Regular; operação de rotina rápida. Altamente sensível; mais demorada Software, avaliação interpretação e Regular Mais diversificada Investimento típico aparelho novo (R$) do 50.000 140.000 / baixos médios a altos Metalurgia; cerâmicas e vidros, mineralogia, química inorgânica; alimentos. Plásticos e borrachas, materiais compostos, química orgânica, farmacêutica, alimentos. Custos operacionais manutenção Aplicações típicas 2.2.6. Fatores que influenciam no termograma Vários parâmetros influenciam na qualidade do termograma e podem, em caso de desrespeito e/ou desconhecimento levar a dados termodinâmicos errados. Uma análise cuidadosa dos seguintes fatores é a condição para uma interpretação confiável. Particularidades da amostra: Pureza química /pureza da fase, Em caso de fases mistas: homogeneidade e finura dos diferentes cristais, Dependência de um efeito calórico, do tamanho médio do grão e da densidade (= perfeição) do empacotamento, Histórico térmico da amostra (por exemplo, em vidros, cerâmicas, polímeros), que foram resfriados por choque, fora do seu equilíbrio térmico, Reações de sinterização, efeitos “premelting” durante o aquecimento da amostra, 21 Efeitos cinéticos (um problema em todos os equilíbrios lentos). Dependências do aparelho: O sinal depende tanto da massa da amostra, como da taxa de aquecimento, A atmosfera dentro do forno (tipo de gás, taxa de admissão; pressão total) influencia no sinal, devido sua condutividade, Os processos condução, convecção e radiação contribuem em proporções diferenciadas à transmissão do calor, especialmente a temperaturas mais altas. Desvios da linearidade na taxa de aquecimento. Identificam-se as seguintes fontes de erros experimentais: Calibração insuficiente ou faltando, dentro da região térmica do experimento Contaminação do aparelho por amostras examinadas anteriormente (sublimação, decomposição térmica, tigela mal lavada, etc.) Arranjo assimétrico das células; Contato entre amostra e tigela insuficiente (o ar funciona como camada isolante) Reações químicas da amostra, ou com a atmosfera ou com o material da tigela (isso inclui os casos gás de purga de pureza insuficiente e vazamentos na estufa). Interferem na TG: Efeitos de sustentação, causadas por reação química ou convecção térmica (calibração, ver equação (11), na p. 13); Exatidão dos termoelementos é naturalmente limitada, por exemplo, o termopar Pt / Pt-Rh disponível comercialmente é indicado por ±5 °C a 1000 °C; quanto mais quente maior a tolerância. 2.3. Construção do diagrama das fases, a partir dos dados térmicos O conhecimento dos diagramas das fases 3 se deve a mudanças características de grandezas termodinâmicas, ao submeter um material a um programa térmico, quer aquecimento ou resfriamento, em velocidades típicas de 10 a 20 K.min-1. A fusão de qualquer material puro a pressão constante ocorre em uma única temperatura. Desta forma, fases líquidas e sólidas coexistem apenas nesta temperatura. Quando resfriado, a temperatura de um material líquido irá decrescer gradualmente até ser atingido o ponto de fusão. Neste instante o material começará a cristalizar, levando ao envolvimento de um calor latente na interface sólido-líquido, mantendo a temperatura constante ao longo do material. Uma vez que o material esteja completamente sólido, o resfriamento gradual é reiniciado. O 3 descritos no artigo “Entender o diagrama das fases Fe-C”, disponível http://www.timoteo.cefetmg.br/site/sobre/cursos/quimica/repositorio/artigos/ (acesso em 10/2014). no site 22 patamar de solidificação permite que o ponto de solidificação do material seja identificado em uma curva da temperatura verso o tempo. temperatura Tfus tempo Resf riamento de uma substância pura A maioria dos sistemas que possuem dois ou mais componentes exibem um intervalo de temperatura no qual as fases líquida e sólida estão em equilíbrio. Ao invés de uma temperatura de fusão, o sistema agora tem duas temperaturas diferentes, e assim a temperatura líquidus (TL) e a temperatura sólidus (TS) são necessárias para descrever a mudança de líquido para sólido. A temperatura líquidus é a temperatura acima da qual o sistema está inteiramente líquido, a temperatura sólidus, por sua vez, representa o ponto abaixo do qual todo o material está sólido. Entre estes dois pontos os estados líquido e sólido estão em equilíbrio. Quando a temperatura líquidus é atingida, a solidificação começa, e ocorre uma redução na taxa de resfriamento causada pelo calor latente e uma conseqüente redução do gradiente da curva de resfriamento. temperatura TL TS tempo Resf riamento de um sistema binário (idealizado) Quando a solidificação aproxima-se ao final a taxa de resfriamento é novamente alterada, permitindo que a temperatura sólidus seja determinada. Como pode ser visto no diagrama abaixo, esta última mudança é mais suave do que a curva ao redor da TL; portanto, na prática a TS deve ser determinada por extrapolação (ponto offset). 23 Quando é resfriado um material de composição eutética, a solidificação de toda a solução ocorre em apenas uma temperatura. O resultado em uma curva de solidificação é similar à curva obtida pela solidificação de um componente puro. temperatura TEu tempo Resf riamento de uma mistura eutética Quando ligas hipoeutéticas e hipereutéticas são solidificadas, o primeiro sólido a ser formado é uma fase com uma composição diferente da composição do líquido. Isto faz com que ao longo do resfriamento a composição do líquido se aproxime à composição eutética. Quando o líquido alcança a temperatura do eutético, terá também a composição eutética e irá solidificar, formando um sólido de duas fases. A formação do eutético faz com que o sistema cesse o resfriamento até que a solidificação seja completa. A curva resultante mostra dois estágios de solidificação, o primeiro é caracterizado pela redução do gradiente de solidificação, e o segundo caracterizado por um plateau onde a fase eutética está solidificando. 24 temperatura TL TEu tempo Resf riamento de uma mistura hipo ou hipereutética Na prática os pontos TL, TS e TEu são mais sutis e muitas vezes difícil de detectar na curva T(t). Uma ferramenta matemática, no entanto, facilita a leitura destes pontos característicos: a dT derivada desta curva, (= a inclinação em cada ponto da curva original) mostra as dt descontinuidades mais claramente do que a própria curva T(t). Muitos aparelhos, portanto, oferecem ao usuário a interpretação dos dados térmicos a partir desta derivada, como será mostrado no próximo gráfico. Tomando uma série de curvas de solidificação para o mesmo sistema, ao longo de um intervalo de composições, pode-se determinar as temperaturas líquidus e sólidus para cada composição, permitindo que um diagrama de fase seja mapeado. Costuma-se anotar as curvas da termoanálise na vertical (viradas por 90°C). Isso tem a vantagem de fazer leitura da temperatura na ordenada – o que corresponde à representação gráfica do diagrama das fases final. Fig. 15. Construção do diagrama das fases. As curvas de DTA ( dT dt ; linhas sólidas) foram registradas para 6 diferentes composições. Ao juntar-se os pontos onset das transições obtém-se o diagrama das fases (linha tracejada). Dois exemplos: 25 Abaixo estão as curvas de solidificação ou resfriamento, de um sistema binário a 11 diferentes composições. Foram registradas as temperaturas das amostras, ao longo do tempo experimental. As regiões vermelhas indicam onde o material é líquido, as regiões em azul indicam onde o material está completamente sólido. As regiões verdes representam o momento da transição líquido → sólido, durante o qual os estados líquido e sólido estão em equilíbrio. Isto é, uma parte da amostra é líquida, outra parte já se transformou em cristais. Observa-se para os compostos puros (0% e 100%) que a linha verde é horizontal, ou seja, a temperatura não cai durante a transição. Isso é típico para compostos puros com ponto de fusão definido. Por outro lado, as curvas no meio (10% a 90%) mostram um trecho verde com ligeira inclinação negativa. Essas misturas dispõem então de uma faixa de fusão, com temperaturas inicial e final. O início dos trechos verdes identificamos como curva líquidus, e o final (offset extrapolado, ver acima) representa a curva sólidus. Removendo-se o eixo do tempo e substituindo-o pelas composições. Isto permite que as temperaturas sólidus e líquidus sejam plotadas de forma a produzir um diagrama de fase: 26 Um exemplo mais sofisticado: Para uma liga metálica feita pelos metais A e B, foram registradas as seguintes curvas DTA em resfriamento lento. Note que no gráfico a seguir as curvas de DTA foram colocadas na vertical. A partir destas pode-se concluir um diagrama das fases com eutético e compatibilidade parcial. Na proximidade dos compostos puros tem-se compatibilidade, ou seja, formação de cristais mistos. Na faixa do meio deste diagrama a liga torna-se imiscível (= lacuna de miscibilidade), onde temos uma mistura de finos cristais das composições e . Essa mistura ainda dispõe de um ponto eutético (= ponto mais baixo de fusão). 27 Literatura: H.G. Elias, Organic and macromolecular chemistry, Volume 3, Wiley-VCH W. Wendlandt, Thermal Analysis, 3. Ed., JW & Sons, 1986 J.H. Haines, Thermal Methods of Analysis, 1. Ed, 1995. M.E. Brown, Introduction to Thermal Analysis, Chapman and Hall, 1988. J.P. Sibilia (Editor), A Guide to Materials Characterization and Chemical Analysis, VCH, 1988 28