Cuidados ao paciente dependente e hospitalizado Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación CUIDADOS DE ENFERMAGEM AO PACIENTE DEPENDENTE E HOSPITALIZADO NURSING CARE FOR DEPENDENT HOSPITALIZED PATIENTS CUIDADOS DE ENFERMERÍA AL PACIENTE DEPENDIENTE Y HOSPITALIZADO Silvia da Silva Santos PassosI Dora SadiguskyII RESUMO: Trata-se de um estudo qualitativo e descritivo, cujo objetivo foi analisar e descrever os cuidados básicos de enfermagem referentes à alimentação, higiene e mobilidade de pacientes dependentes hospitalizados. O estudo foi realizado em um hospital público na Bahia, no período de abril a junho de 2006. Os dados foram coletados através de uma entrevista semiestruturada e observação não participante, realizada com sete enfermeiros e 10 técnicos de enfermagem. Os dados coletados foram submetidos à análise de conteúdo temático, à luz dos pressupostos sobre o cuidar de Colliére, evidenciando-se duas categorias: identificando as necessidades de cuidados, composta pelas subcategorias: visita diária, observação e supervisão, passagem de plantão; e a categoria prestando os cuidados, composta pelas subcategorias: cuidados higiênicos, administração de alimentos, mudança de decúbito e massagem de conforto. Constatou-se que os cuidados básicos geralmente são desvalorizados e delegados aos acompanhantes dos pacientes devido à sobrecarga de trabalho dos profissionais da enfermagem. Palavras-chave: Cuidado; assistência ao paciente; enfermagem; hospitalização ABSTRACT ABSTRACT:: This qualitative, descriptive study analyzed and described the basic nursing care for dependent hospitalized patients as regards feeding, hygiene and mobility. It was carried out at a public hospital in Bahia State from April to June 2006. Data were collected through semi-structured interview and non-participant observation involving 7 nurses and 10 technicians. The data collected were submitted to Thematic Content Analysis based on Colliére’s care assumptions, which highlighted two categories: identifying the care needs, divided into the subcategories: daily visit, observation and supervision, change of shift; and the category providing care, divided into the subcategories: hygiene care; food management; decubitus change and comforting massage. Routine care was found to be usually undervalued and delegated to patients’ companions, due to the work overload on nursing professionals. Keywords: Care; patient assistance; nursing; hospitalization. RESUMEN: Se trata de un estudio cualitativo y descriptivo, cuyo objetivo fue analizar y describir los cuidados básicos de enfermería referentes a la alimentación, higiene y movilidad de pacientes dependientes hospitalizados. El estudio fue realizado en un hospital público de Bahia-Brasil, en el período de abril a junio de 2006. Los datos fueron recolectados por medio de entrevista semiestructurada y observación no participante, aplicada a siete enfermeros y 10 técnicos de enfermería. Los datos obtenidos fueron sometidos al análisis de contenido temático, a la luz de los presupuestos sobre el cuidar de Colliére, evidenciándose dos categorías: identificando las necesidades de cuidados, compuesta por las subcategorías: visita diaria, observación y supervisión, pasaje de plantón; y la categoría prestando los cuidados, compuesta por las subcategorías: cuidados higiénicos, suministración de alimentos, cambio de decúbito y masaje de conforto. Se constató que los cuidados básicos básicos generalmente son devaluados y transferidos para los acompañantes de los pacientes debido a la sobrecarga de trabajo de los profesionales de la enfermería. Palabras clave: Cuidado; asistencia al paciente; enfermería; hospitalización. INTRODUÇÃO O ambiente hospitalar é estressante, barulhento, com normas e rotinas próprias. Neste ambiente, o paciente perde sua identidade, privacidade e sua percepção de liberdade1. A hospitalização traz para os pacientes e seus familiares sentimentos de insegurança que se acentuam quando estes pacientes possuem dependência para os cuidados básicos de enfermagem, como alimentação, higiene e mobilidade física. I É neste momento que a equipe de enfermagem tem a oportunidade de focalizar suas ações no ser humano, receptor dos cuidados, ou seja, fazer uma conexão integrada entre as tarefas normatizadas pela instituição e aquelas voltadas para o processo de cuidar. Os graus de dependência para os cuidados básicos de enfermagem, apresentados pelos pacientes hospitalizados, irão indicar a real necessidade do cuidado por Professora Assistente da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Campus de Santo Antonio de Jesus. Bahia, Brasil. Email: [email protected]. Professora Associada II da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia. Bahia, Brasil. Email: [email protected]. II p.598 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 out/dez; 19(4):598-603. Recebido em: em: 18/08/2010 22.02.2011 – Aprovado em: 20.07.2011 Recebido 18/02/2011 Passos SSS, Sadigusky D Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación parte dos envolvidos2. Dessa forma, a ação da enfermeira frente ao paciente hospitalizado com dependência determina a eficiência dos cuidados básicos de enfermagem realizados por sua equipe. Os cuidados básicos prestados ao paciente com dependência da assistência de enfermagem representam o objeto deste estudo, que teve como objetivo analisar e descrever os cuidados básicos de enfermagem referentes à alimentação, higiene e mobilidade a pacientes dependentes hospitalizados. REFERENCIAL TEÓRICO O hospital é um cenário complexo, onde se conjugam transformações tecnológicas e ambientais, e são visíveis as novas proposições do cuidar, verificadas nas relações de trabalho. Essas transformações tecnológicas, econômicas e sociais deram origem ao trabalho intelectual e manual. Na enfermagem, essas transformações deixaram de lado o caráter religioso atribuído, originalmente, às suas práticas, onde as leigas e religiosas foram substituídas por profissionais de enfermagem que parcelam suas atividades, dividindo-as entre os mais e menos qualificados. Os atos técnicos e socialmente mais qualificados, herdados por sua vez dos atos médicos, ficam com os enfermeiros, que gerenciam o cuidado e o supervisionam, os técnicos e auxiliares de enfermagem, de nível médio, executam o trabalho menos complexo, com mais tempo junto aos enfermos. Além de conviver mais tempo com os enfermos, os técnicos e auxiliares os acompanham mais de perto, anotam suas reações ao tratamento, cumprindo a estratégia de vigiar a vida e a morte dos internados, que é, em si, a atribuição de todos no hospital3. Essa hierarquia e tecnicidade crescente nas instituições hospitalares transformaram os cuidados de enfermagem em execução de tarefas, seguindo protocolos, normas e rotinas previamente instituídas, dificultando as relações interpessoais mais enfáticas entre o ser que cuida e o ser cuidado. Esse modo de trabalho, institucionalizado, tem promovido o distanciamento da verdadeira arte de cuidar, provocando fragmentação na execução de tarefas previamente prescritas, sistematizadas e robotizadas. As ações técnico-assistenciais por si só, não são suficientes para atender às necessidades dos pacientes internados e, nesse sentido, Collière4, quando cita Florence Nightingale, enfatiza que administrar medicações e fazer curativos não são suficientes para garantir a sobrevivência dos pacientes. É preciso tomar consciência de que os danos causados pela doença são universais, não se limitam a um determinado tempo e espaço, mas assumem características existenciais bem claras e distintas em diferentes contextos - familiares, sociais, culturais, econômicos e sociais. Assim, é preciso procurar desvelar os sentimenRecebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011 tos e conhecer as situações vivenciadas pelos clientes para viabilizar maneiras concretas de cuidar5. Cuidar significa tomar conta, um ato de vida, e representa uma variedade de atividades que visam manter e sustentar a vida. Esse cuidar é um ato individual, quando prestado a si mesmo, e um ato de reciprocidade quando prestado a outras pessoas que, temporária ou definitivamente, têm necessidade de recebê-lo para manter seu estado vital4. Os cuidados são divididos em cuidados de manutenção e cuidados de reparação. Os cuidados de manutenção são os quotidianos, que representam todos aqueles mais simples e básicos, como, beber, comer, evacuar, lavar-se, levantar-se, mexer-se, deslocar-se, bem como tudo que contribui para o desenvolvimento e sobrevivência do ser humano, construindo e mantendo o corpo e sua imagem e suas relações com o meio4. Já os cuidados de reparação têm como finalidade limitar a doença, lutar contra ela e combater suas causas. Privilegia as causas orgânicas, isolando as causas psíquicas e socioeconômicas, fragmentando o homem, sem considerar o ser humano e o seu relacionamento com o meio em que vive4. Os cuidados de manutenção ou cuidados básicos prestados aos pacientes hospitalizados são os mais evidentes e importantes para a prática da enfermagem como profissão autônoma. Esses cuidados são aqueles considerados menos complexos e são, usualmente, delegados aos técnicos e auxiliares de enfermagem, enquanto a enfermeira tem-se voltado cada vez mais para outras tarefas administrativas e burocráticas. METODOLOGIA Estudo descritivo com abordagem qualitativa que se fundamentou no cuidar/cuidado que pressupõe “[...] não ser em torno da doença que se desenvolvem as práticas dos cuidados, mas a volta de tudo que permite sobreviver”6:25. Esta visão de cuidar está centrada nas necessidades básicas dos indivíduos, em que “[...] o campo de competência da enfermagem tem como finalidade mobilizar as capacidades da pessoa, e dos que a cercam, com vistas a compensar as limitações ocasionadas pela doença e suplementá-las, se essas capacidades forem insuficientes”4:290. Participaram deste estudo sete enfermeiras e 10 técnicos de enfermagem atuantes na clinica médica e clínica cirúrgica de um hospital geral público de grande porte da cidade de Feira de Santana – Ba. A clínica médica possui 46 leitos, com pacientes de variados graus de dependência para os cuidados de enfermagem. Trabalham na clínica médica 24 técnicos de enfermagem e quatro enfermeiras, sendo quatro técnicos para o período diurno e três para o período noturno, e duas enfermeiras para cada período diurno. A clínica cirúrgica é Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 out/dez; 19(4):598-603. • p.599 Cuidados ao paciente dependente e hospitalizado composta de 48 leitos de pré e pós-operatório de cirurgias de várias especialidades. Atuam nesta unidade quatro enfermeiros diaristas (duas por turno) e 28 técnicos de enfermagem, em média cinco técnicos durante o período diurno e quatro no período noturno. A escolha dos sujeitos foi aleatória, entre os que atuavam no cuidado direto ao paciente. Os entrevistados têm em sua maioria cinco anos de serviço, estão na faixa etária entre 20 e 40 anos de idade e são predominantemente do sexo feminino. Na coleta dos dados foi utilizada a entrevista semiestruturada e observação estruturada com registro diário, no período de abril a junho de 2006, após a autorização do Comitê de Ética e Pesquisa sob Protocolo no 008/2006, CAAE 0003.0.059.000-06 da Universidade Estadual de Feira de Santana. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido observou o que preconiza a Resolução no 196/967. Para a análise dos dados foi utilizada a análise de conteúdo temático8. Para a análise de conteúdo temático, foram observadas as etapas do tratamento das informações constantes das entrevistas. Na pré-analise, foram destacadas nas falas dos sujeitos, os cuidados básicos de enfermagem ao paciente dependente hospitalizado, através da leitura flutuante de todo material coletado. Na fase de organização, foi procurado o tema ou regularidade recorrente, que envolveu a extração das unidades de registro das entrevistas. Partindo desses recortes, foi elaborado um sistema de categorização que consistiu no agrupamento dos dados semelhantes e diferentes dos conteúdos das falas. Assim, a categorização possibilitou definir duas categorias e respectivas subdivisões – as subcategorias. A primeira categoria - identificando as necessidades de cuidados foi composta pelas subcategorias: visita diária, observação e supervisão; e passagem de plantão. A segunda categoria prestando os cuidados compreendeu as subcategorias: cuidados higiênicos; administração de alimentos; mudança de decúbito e massagem de conforto. Para a identificação dos sujeitos entrevistados, foi utilizada a letra E para as enfermeiras e TE para os técnicos de enfermagem, seguindo-se a ordem numérica sequencial das entrevistas. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os cuidados básicos de enfermagem ao paciente dependente hospitalizado foram analisados segundo as categorias e subcategorias temáticas emergentes deste estudo. Categoria I - Identificando a necessidade de cuidados Identificar os cuidados é tornar reconhecível a sua natureza, os elementos que participam na sua elaboração, os conhecimentos e instrumentos que utilizam4. A p.600 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 out/dez; 19(4):598-603. Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación identificação das necessidades de cuidados, nesta categoria, foi apreendida em duas subcategorias. Visita diária, observação e supervisão A visita diária aos pacientes é uma atividade de rotina da equipe de enfermagem e subsidia o processo de identificação dos cuidados básicos, principalmente para alimentação, mobilidade e higiene corporal. Esta atividade é executada tanto pelo pessoal técnico quanto pelas enfermeiras, conforme evidencido nas falas: Identificamos os cuidados através da visita, a cada um, individualmente, leito a leito. Identificamos tanto o cuidado físico como o psicossocial. (E17) Primeira coisa que temos que fazer ao chegar na unidade, é fazer a visita dos pacientes, para identificar as necessidades de cuidados básicos. (TE2) A visita diária como instrumento de identificação de cuidados será terapêutica se a equipe de enfermagem estiver consciente de sua importância no processo de cuidado, pois, através dessa interação, os mínimos detalhes podem ser observados, e definem a qualidade do cuidado que será prestado9. Entretanto, a visita ao leito do paciente, por vezes, ocorre de forma rápida, principalmente se o paciente não apresentar problemas evidentes. Esta prática é utilizada para a atualização da listagem de pacientes, o que desfavorece a identificação das necessidades de cuidados. Embora a visita seja uma atividade comum a todos os membros da equipe, a observação e supervisão como meio de identificação das necessidades de cuidados foram evidenciados apenas na fala das enfermeiras: A necessidade de cuidado pode ser identificada através da observação e da supervisão das atividades realizadas pelos técnicos de enfermagem. (E16) O emprego da observação pode ser feito em maior ou menor grau a depender da complexidade das funções de cada um, dentro da equipe, mas deve ser aplicada durante o trabalho para permitir o desempenho eficiente de suas funções10. A supervisão é caracterizada como atividade administrativa, e tem a função de favorecer o planejamento dos cuidados. Envolve a identificação das necessidades, definição das prioridades e do tempo previsto para sua execução, descrição dos objetivos e das atividades a serem realizadas para o seu alcance e determinação do agente que executará o plano proposto pela enfermeira responsável pela unidade11. Durante a observação das pesquisadoras, foi verificado que a enfermeira executa a supervisão das ações de sua equipe de trabalho quando são solicitadas pelos técnicos ou se existem pacientes em estado crítico. A passagem de plantão A passagem de plantão surgiu como subcategoria para a identificação dos cuidados básicos de enfermagem, como descrito na fala: Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011 Passos SSS, Sadigusky D Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación Através da passagem de plantão, as colegas informam o paciente que a gente vai ficar e é feita visita ao leito dos pacientes (TE7) A passagem de plantão é um dos instrumentos utilizados pela enfermagem para assegurar o fluxo de informações, garantindo assim a continuidade e qualidade da assistência. É responsabilidade da enfermeira a coordenação da passagem de plantão12. Esse é o momento em que as informações em relação aos cuidados prestados, as tarefas realizadas, os encaminhamentos e as intercorrências são transmitidos para os turnos seguintes, oportunizando o acompanhamento das condições do paciente13. No entanto, apenas os técnicos de enfermagem se referiram a essa prática. Durante a observação realizada, verificou-se que a enfermeira não tem participado nem coordenado a passagem de plantão como rotina da instituição. língua, o uso do fio dental, além de cuidados com dentaduras e pontes móveis15. Apesar dos benefícios da higiene oral, durante o período de observação não se verificou o oferecimento deste cuidado pela enfermagem aos pacientes dependentes. Quanto à outra prática de higiene evidenciada, o banho foi o que mais se destacou como se pode observar no depoimento a seguir: [...] aqueles que têm banho no leito têm que dar. [...] chamamos uma colega para ajudar, se o paciente está em uso de oxigênio, chamamos a enfermeira para nos orientar, não deixamos o paciente fazer nada sozinho, porque a responsabilidade é nossa. (TE2) Categoria II - Prestando os cuidados Para se avaliar o tipo de banho necessário a um paciente, deve-se observar sua capacidade para o autocuidado e determinar não só o que o paciente pode fazer, mas como o fará, levando-se em consideração suas características individuais16. Os sujeitos do estudo descrevem como realizam os cuidados básicos a pacientes dependentes: Administração de alimentos [...] procuramos não deixar pendência, o tempo às vezes é curto, pois são muitos pacientes para um só profissional. Orientamos os técnicos de enfermagem sobre a mudança de decúbito e higiene. (E11) [...]às vezes fica complicado, a gente não oferecer uma assistência 100%, nosso desejo era ofertá-la. Tem poucos funcionários, mas eu tento fazer o máximo que posso. (TE4) Fica evidente nas falas o desejo de cuidar, cujo significado nasce de um interesse, de uma responsabilidade, de uma preocupação1. Nesse sentido, o cuidado não se limita à realização de uma tarefa ou procedimento. Inclui o fazer sem obrigação e o componente emocional, o aspecto cognitivo, a percepção, o conhecimento e a intuição. O cuidado humano não é apenas uma atividade ou tarefa, mas uma forma de expressão, de relacionamento com o outro ser e com o mundo14. Outro fator identificado que dificulta a execução do cuidado foi o tempo para o cuidar, justificado pela sobrecarga de trabalho, pois são muitos os pacientes para apenas um profissional. Os cuidados básicos foram apreendidos em três subcategorias, que são discutidas a seguir. Cuidados higiênicos Apesar das variações das práticas de higiene, foram evidenciadas como práticas comuns o banho e a higiene oral, sendo esta última encontrada em apenas uma das falas. [...] o banho no leito e a higienização oral, os pacientes que conseguem tomar banho sozinho, eu encaminho até o banheiro, aqueles que estão acamados a gente dá o banho no leito mesmo. (TE7) A higiene oral é uma prática utilizada para limpar a cavidade bucal, em especial os dentes e a língua. Tal higiene deve incluir a escovação dos dentes, limpeza da Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011 A alimentação administrada ao paciente dependente da enfermagem é o cuidado mais ressaltado. Nesta subcategoria foram evidenciados dois tipos de alimentação: administrada através de sonda nasoenteral e a por via oral, conforme a fala seguinte: [...] alimento através da sonda, se não tem sonda a gente ajuda ele a sentar, ou até mesmo deitado com a cabeceira mais elevada faz a alimentação na seringa, suco ou qualquer outra dieta liquida. (TE6) A alimentação administrada por sonda é a alimentação por via enteral, comum em pacientes com dificuldades para deglutição e/ou que necessitem aumentar o suporte nutricional frente às baixas ingestas, cirurgias ou patologias que impeçam a deglutição e/ou digestão por via oral ou gástrica. A alimentação administrada por seringa é uma prática utilizada, na instituição estudada, em pacientes que conseguem se alimentar por via oral, ou seja, mantêm a capacidade de deglutição, mas possuem dificuldade para a mastigação. A enfermeira tem papel fundamental no atendimento das necessidades nutricionais do paciente hospitalizado, pois, por meio do contato diário com o paciente, deve estar atenta a esses problemas e encaminhálos ao nutricionista para a implementação da dieta adequada à prestação dos cuidados17. A atribuição de contactar outros profissionais da equipe de saúde sobre as dificuldades de alimentação dos pacientes dependentes é observada nos discursos das enfermeiras: [...] sinalizamos para a nutrição que o paciente tem dificuldade e vai precisar de uma dieta especial. (E3) Eu sinalizo para o médico a dificuldade de alimentação do paciente, porque, muitas vezes, ele nem percebe que o paciente precisa de uma sonda nasoenteral. (E17) Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 out/dez; 19(4):598-603. • p.601 Cuidados ao paciente dependente e hospitalizado Percebe-se a importância da enfermeira na identificação da necessidade de alimentação especial para a manutenção da vida e recuperação da saúde do paciente hospitalizado. Entretanto, algumas enfermeiras revelam a dificuldade em participar desse cuidado, delegando-os para os técnicos de enfermagem e envolvendo-se em cuidados mais complexos: A gente não pode estar auxiliando na alimentação desses pacientes [...]. Na verdade atuo na passagem de sonda enteral e sonda gástrica. (E9) A enfermeira tem se inclinado à obtenção de habilidades técnicas, e essa inclinação tem refletido de maneira decisiva na sua atividade diária, na carga de trabalho e, também, na delegação de tarefas mais simples. Entre essas atividades delegadas aos técnicos de enfermagem está a administração de alimentos a pacientes dependentes hospitalizados18. Durante o período de observação, verificou-se que a necessidade de alimentação nem sempre é valorizada, pois as dietas enterais, entregues nas unidades pelo serviço de nutrição, não são administradas nos horários, se o paciente não tiver acompanhante. Algumas dietas se estragam e são desprezadas pela enfermagem. Quando a alimentação é feita por via oral, o pessoal de enfermagem delega essa tarefa para os acompanhantes. Quando os pacientes não têm acompanhantes, eles não são alimentados, pois os profissionais nem sempre têm tempo para oferecê-la aos pacientes, devido à demora em deglutir, o que requer maior tempo e atenção. Desse modo, a dieta por via oral, também, não segue os horários e não recebe a devida atenção por parte da equipe de enfermagem, ficando, muitas vezes, o paciente sem se alimentar e o alimento na mesinha de cabeceira. No entanto, o compromisso da enfermagem é com o cuidado e a falta de disponibilidade do profissional não isenta da responsabilidade pelo cuidado19. Mudança de decúbito e massagem de conforto Outros cuidados apreendidos foram a mudança de decúbito e a massagem de conforto, conforme verificado na fala: Quando o paciente não se movimenta sozinho, temos que ajudá-lo, se não conseguimos, chamamos uma colega, e o viramos de decúbito de 2 em 2 horas. (TE2) A mudança de decúbito traz vários benefícios para o paciente acamado ou com dificuldades para movimentar-se, e essas mudanças devem obedecer a uma frequência estipulada para favorecer a circulação sanguínea, as trocas orgânicas e prevenir complicações no organismo. A mudança de decúbito tem a finalidade de prevenir ou evitar o agravamento das úlceras por pressão, como evidenciado na fala: A gente faz a mudança de decúbito para evitar escaras, virar na hora do banho. Aqueles que já têm escaras [...], sempre virando de um lado para o outro. (TE7) p.602 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 out/dez; 19(4):598-603. Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación A mudança de decúbito é realizada (de forma preventiva) no momento do banho, o que de certa forma contradiz a outra entrevistada que informa efetuar as mudanças a cada duas horas. Quando o paciente já possui lesão cutânea, como uma ulcera por pressão, ele é mudado de posição corporal com mais frequência. Essa afirmativa foi verificada durante o período de observação das pesquisadoras. Nem sempre a enfermagem consegue realizar os cuidados básicos dos pacientes dependentes, e esses cuidados são delegados a outro cuidador, o familiar/acompanhante. O cuidado prestado pelo acompanhante, no ambiente hospitalar, aparece como elemento importante, e, em determinados momentos, eles assumem, completamente, os cuidados conforme é evidenciado a seguir: [...] o cuidado é feito pelo acompanhante, nós sabemos que essas funções são da enfermagem, que ela não deve ser transferida para o acompanhante, mas ele também é um aliado muito grande da enfermagem [...]. (E3) A família é o primeiro cuidador e, no espaço institucional durante a hospitalização dos seus entes queridos com dependência da assistência de enfermagem, a sua participação nas atividades de cuidado é de fundamental importância, para tanto é preciso orientála e ensiná-la sobre o cuidado no hospital e no domicilio, após a alta. Os cuidadores necessitam iniciar o aprendizado durante a hospitalização, onde a enfermeira esclarece as possíveis dependências dos pacientes e os cuidados iniciais que as famílias deverão tomar para si, assumindo com ela uma relação de cooperação e apoio20. [...] solicito ajuda aos acompanhantes, eles são muito colaboradores, e estão sempre presentes, a gente permite a permanência deles, não que seja da responsabilidade deles, mas muitas vezes eles acabam assumindo [...]. (E16) As principais atividades realizadas pelos acompanhantes no hospital foram aquelas que tinham por objetivo atender às necessidades humanas básicas do paciente internado, como, por exemplo, dar água, dar comida, pentear o cabelo, trocar fraldas5. A permanência da família junto ao paciente, durante a hospitalização, tem papel decisivo na sua recuperação, visto que o estresse provocado pela situação de saúde pode ser amenizado quando ele encontra apoio emocional de pessoas com as quais possua vínculo afetivo relevante. É um desafio para a enfermagem a inclusão do paciente e da família no planejamento e efetivação dos cuidados, e que eles deixem de ser vistos como objetos e passem à condição de sujeito dessas ações5. Observou-se, no campo do estudo, sobrecarga de trabalho das enfermeiras e dos técnicos de enfermagem, pois estes últimos assumem, por plantão, em média, os cuidados de 10 a 12 pacientes com todos os tipos de dependência assistencial. Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011 Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación CONCLUSÃO Neste estudo, foram analisados os cuidados básicos de enfermagem ao paciente dependente hospitalizado, considerando os depoimentos dos profissionais investigados, enfermeiras e técnicos de enfermagem. No discurso, os sujeitos reconhecem a importância desses cuidados para os pacientes e estão cientes de que estes são atribuição da equipe enfermagem. Entretanto, a responsabilidade por certos cuidados é comumente delegada para os acompanhantes. As enfermeiras e os técnicos de enfermagem justificam a delegação dos cuidados, destacando a sobrecarga de trabalho, pois o número de pacientes com dependência para essas necessidades é grande e a quantidade de pessoal insuficiente. Verificou-se, na observação estruturada, que duas enfermeiras são responsáveis por todos os cuidados e, ainda, gerenciam as unidades, assumindo atribuições técnico-administrativas, enquanto os técnicos de enfermagem assumem, em média, por plantão, de 10 a 12 pacientes com todos os tipos de dependências. Conclui-se que, apesar dos cuidados básicos para a higiene corporal, alimentação e mobilidade serem essenciais para a manutenção da vida, eles estão sendo considerados de menor valor pela equipe de enfermagem. Os acompanhantes dos pacientes estão sendo utilizados como mão de obra gratuita e responsabilizados por uma atribuição que não lhes compete. Uma das principais limitações deste estudo refere-se à amostra e ao período de observação, mas essas limitações devem servir como ponto de partida para outros estudos sobre a temática. REFERÊNCIAS 1. Waldow VR. Cuidado humano: o resgate necessário. 4a ed. Porto Alegre (RS): Sagra Luzatto; 2004. 2. Fabrício SCC, Rodrigues RAP. Percepção de idosos sobre alterações das atividades da vida diária após acidentes por queda. Rev enferm UERJ. 2006; 14:531-7. 3. Pitta AMF. Hospital: dor e morte como oficio. 3a ed. São Paulo: HUCITEC; 1999. 4. Collière MF. Promover a vida: das práticas das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. Lisboa (Po): Lidel Técnica; 1989. 5. Dibai MBS, Cade NV. A experiência do acompanhante Recebido em: 18/08/2010 – Aprovado em: 18/02/2011 Passos SSS, Sadigusky D de paciente internado em instituição hospitalar. Rev enferm UERJ. 2009; 17:86-90. 6. Colliere MF. Cuidar... a primeira arte da vida. 2a ed. Lisboa (Po): Lusociencia; 2003. 7. Ministério da Saúde (Br). 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