Material didático para o ensino das relações solo – água – contaminação do ambiente Michele Dubow1 (IC)*, Luciana da S.C. Lima1 (IC), Gilberto Strieder1 (IC), Luis Eduardo A.S. Suzuki1 (PQ), Pablo Rostirolla1 (IC), Gilberto L. Collares1 (PQ), Mauricio Dai Prá1 (PQ), Samuel Beskow1 (PQ), Irani P.M. Iannarella1 (TC) 1 Universidade Federal de Pelotas, Campus Porto, Rua Gomes Carneiro, n. 01, Bairro Centro, CEP 96010-610, Pelotas/RS. E-mail: [email protected] Palavras-chave: Experimentação, Garrafa pet Área temática: Educação Ambiental (EA) Resumo: O desenvolvimento de ferramentas ou materiais didáticos que facilitem os estudantes a entenderem os fenômenos que ocorrem na natureza é uma prática importante na Educação Ambiental. Este trabalho teve como objetivo propor algumas ferramentas ou materiais didáticos para uso na Educação Ambiental, utilizando-os para abordagem de alguns temas relacionados ao meio ambiente. Foram propostas três atividades complementares na abordagem da relação entre o solo, a água e a contaminação do ambiente, e uma quarta atividade relacionada à avaliação das atividades e conhecimento adquirido. Os materiais didáticos propostos são simples, de baixo custo e de fácil confecção, pois a idéia é que os materiais didáticos possam ser difundidos e utilizados pelos mais diversos segmentos da educação. A abordagem pode ser direcionada ao ensino médio ou, com uma linguagem diferenciada e com maior profundidade no assunto, também pode ser direcionada ao ensino superior. Introdução A preocupação com o meio ambiente tem sido cada vez mais intensa, considerando as ocorrências de desastres naturais e impactos pela ação antrópica no ambiente. Mais do que falar sobre meio ambiente, é imprescindível que as pessoas sejam orientadas e conscientizadas sobre questões relacionadas a este tema e tenham conhecimento dos diferentes compartimentos ambientais. Dentro deste contexto, a Educação Ambiental talvez seja o melhor caminho para atingir as pessoas e sensibilizá-las. Gaudiano (2005) cita vários exemplos de declarações e resoluções que mencionam a conscientização como um dos propósitos da Educação Ambiental. O autor cita a Carta de Belgrado (1975) que define seis áreas em que a educação ambiental deve trabalhar: 1) conscientização: auxiliar os indivíduos e grupos sociais a sensibilizarem-se e a adquirirem consciência do meio ambiente global e suas questões; 2) conhecimento: ao adquirirem diversidade de experiências e compreensão fundamental sobre o meio ambiente e seus problemas; 3) comportamento: ao comprometerem-se com uma série de valores, a sentirem interesse pelo meio ambiente, participarem da proteção e melhoria do meio ambiente; 4) habilidades: ao adquirirem as habilidades necessárias para identificar e resolver problemas ambientais; 5) capacidade de avaliação; 6) participação: ao proporcionar a possibilidade de interagir ativamente, tendo como objetivo a resolução dos problemas ambientais. A Lei nº. 9.795, de 27 de abril de 1999, que instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental, foi regulamentada pelo Decreto nº. 4.281, de 25 de junho de 74 2002, e definiu a Educação Ambiental como "os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade". A finalidade da Educação Ambiental é proporcionar ao ser humano o entendimento do universo e de sua participação nele, principalmente em relação à conservação do meio ambiente e uso sustentável dos recursos naturais, com o objetivo de formar cidadãos aptos a utilizar o ambiente em que vivem, conservandoo para as gerações presentes e futuras (Floriano, 2006). Os problemas ambientais podem conduzir a educação para um novo caminho, pois não se trata de transmitir conteúdos, conceitos, mas sim aprender a olhar e ler a natureza, entendendo a ciência com criatividade e atividade que permite integrar a arte e os diferentes conhecimentos (Almeida e Oliveira, 2007). Diante do exposto por Almeida e Oliveira (2007), o professor ou qualquer outro indivíduo responsável pela Educação Ambiental deve falar neste tema pensando em multidisciplinaridade, sendo necessária a busca do conhecimento dos diferentes compartimentos que integram o ambiente. Em uma pesquisa realizada em um colégio federal no Município do Rio de Janeiro, constatou-se que para a maioria dos alunos, a educação ambiental significa proteger e preservar o meio ambiente, assim como a necessidade de promover a conscientização em relação ao mesmo (Fonseca et al., 2005). Segundo levantamento destes mesmos autores, 87% dos professores e 61% dos alunos relataram nunca terem participado de qualquer projeto ambiental, por falta de oportunidade e 56% dos alunos desconheciam qualquer projeto ambiental em andamento no Rio de Janeiro. A Educação Ambiental representa uma importante área dentro do currículo escolar da educação primária, considerando os problemas ambientais que se caracterizam como uma das crises do mundo contemporâneo (Gaudiano, 2005). Embora as pessoas tenham a preocupação ambiental como parte do seu cotidiano, a percepção do ambiente e seus componentes ainda é deficiente, especialmente no que se refere ao componente solo. Diante dessa deficiência da maioria das pessoas frente ao solo, a educação se faz ainda mais necessária, no sentido de se promover uma mudança de valores e atitudes. Isto se conquista por meio da realização de trabalhos que buscam ampliar a percepção do solo como um componente essencial do meio natural e humano (Muggler et al., 2004). O desenvolvimento de ferramentas ou materiais didáticos que facilitem os estudantes a entenderem os fenômenos que ocorrem na natureza é uma prática importante na Educação Ambiental. Este trabalho teve como objetivo propor algumas ferramentas ou materiais didáticos para uso na Educação Ambiental, utilizando-os para abordagem de alguns temas relacionados ao meio ambiente. Confecção dos materiais didáticos e procedimentos de uso Os materiais didáticos que serão propostos são simples, de baixo custo e de fácil confecção, pois a idéia é que as ferramentas ou materiais didáticos possam ser difundidos e utilizados pelos mais diversos segmentos da educação. 75 Serão desenvolvidas três atividades complementares na abordagem da relação entre o solo, a água e a contaminação do ambiente, e uma quarta atividade relacionada à avaliação das atividades e conhecimento adquirido. Para isso, a primeira atividade será denominada de “O solo e a esponja: o solo como um sistema poroso”, a segunda de “Retenção e infiltração de água no solo” e a terceira atividade “Escoamento superficial do solo e da água”. A quarta atividade será denominada de “O conhecimento adquirido”. A seguir será demonstrada a confecção de cada material didático e o procedimento de uso desses materiais e desenvolvimento das atividades. a) O solo e a esponja: o solo como um sistema poroso Para esta atividade utiliza-se uma esponja e uma vasilha com água. A esponja é mergulhada na vasilha com água (Figura 1a) e em seguida levanta-se a esponja (Figura 1b), onde será observado que o excesso de água será drenado e parte da água ficará retida na esponja. Ao comprimir a esponja, mais água será drenada, mas ainda assim a esponja terá água aderida (Figura 1c). (a) (b) (c) Figura 1. Procedimento para realização da atividade: mergulho da esponja na vasilha com água (a); levantamento da esponja e drenagem da água (b); compressão da esponja e nova drenagem da água (c). b) Retenção e infiltração de água no solo Para esta ação será necessário duas garrafas pet, um pedaço de pano e um elástico. Deve-se cortar o fundo de uma garrafa pet (polietileno tereftalato) e no lugar da tampa (boca da garrafa) deve-se colocar um pano preso por um elástico. A boca da garrafa presa por um pano deve ser virada para baixo, e essa garrafa deve ser preenchida com solo pelo fundo cortado, deixando aproximadamente cinco centímetros sem ser preenchido com solo (Figura 2a). Uma outra garrafa deve ser cortada na sua parte superior. Essa garrafa servirá de suporte para aquela que recebeu o solo (Figura 2b). Confeccionado esse material, deve-se adicionar uma volume conhecido de água na garrafa com solo. Após a drenagem, a água coletada na garrafa pet utilizada como suporte deve ser quantificada quanto ao seu volume. 76 (a) (b) Figura 2. Procedimento para realização da atividade: corta-se o fundo de uma das garrafas pet e na boca da garrafa coloca-se um pano preso a um elástico, e preenche-se a garrafa com solo (a); para confecção do suporte da garrafa, corta-se sua parte superior (b). c) Escoamento superficial do solo e da água Serão necessárias para desenvolvimento desta ação duas garrafas pet e uma vasilha. Com uma garrafa pet deitada, cortá-la no sentido horizontal e preencher com solo (Figura 3a). Esta garrafa deve ser levemente inclinada para que ocorra o escoamento do sedimento após o início do experimento. Na ponta da garrafa devese ter uma vasilha para coleta do sedimento após o início do seu escoamento (Figura 3b). Outra garrafa pet deve ter seu fundo cortado e a tampa perfurada com pequenos furos. Essa garrafa servirá como uma espécie de regador (Figura 3b). Preparado o material, a garrafa utilizada como regador deve regar o solo presente na garrafa pet cortada ao meio. (a) (b) Figura 3. Procedimento para realização da atividade: corte da garrafa pet e preenchimento da garrafa com solo (a); aplicação da água no solo presente na garrafa pet e coleta do sedimento (b). d) O conhecimento adquirido Com o intuito de avaliar o conhecimento adquirido com o desenvolvimento das atividades, um questionário pode ser aplicado aos participantes. Para esta etapa, pode-se separar a turma em dois ou mais grupos, que participarão das atividades propostas separadamente. As mesmas questões podem ser feitas ao grupo que participou das atividades e ao grupo que ainda não participou das atividades, como forma de avaliar o desempenho de cada grupo e de que forma o conhecimento repassado foi assimilado. 77 Interpretações das atividades Antes de interpretar as atividades, pode-se instigar a curiosidade dos estudantes através de questionamentos, como o que acontece com o solo quando o lixo é descartado nos lixões a céu aberto? O que pode acontecer com o solo e a água com o uso indiscriminado de agrotóxicos nas lavouras? A partir destes questionamentos, pode-se fazer uma breve introdução abordando as reações químicas que podem ocorrer no solo e na água em função destas atividades. Além disso, falar sobre as cargas elétricas do solo e sua capacidade de trocar cátions e ânions, bem como o potencial de adsorção de contaminantes no solo, reduzindo ou evitando a contaminação das águas superficiais ou subterrâneas é relevante, especialmente em um momento onde os temas água e meio ambiente tem sido a grande preocupação da humanidade. Como estas atividades são interdisciplinares, pode-se direcionar ainda as discussões para o uso e ocupação do solo em áreas irregulares, onde deveriam ser ocupadas por vegetação permanente e, a partir disso, citar exemplos de desastres ocorridos pelo uso e ocupação irregular de encostas de morros. Este tipo de atividade vem sendo desenvolvida em alguns cursos de graduação da Universidade Federal de Pelotas, como forma de facilitar a compreensão de assuntos relacionados ao solo e a água. Através dos bons resultados adquiridos no ensino superior, pretende-se utilizar estas atividades em outros segmentos da educação, como ensino básico e médio no município de Pelotas, mas levando em conta a linguagem acessível a estes estudantes. a) O solo e a esponja: o solo como um sistema poroso A relação do solo com a esponja reflete as características do solo, composto de fases sólida, líquida e gasosa. Esta atividade demonstra a função do solo como um filtro ambiental, onde reações químicas estão em constante ocorrência nesse meio. É importante abordar nessa atividade que o solo é constituído por uma fase sólida e outra porosa, sendo a fase sólida constituída por minerais e matéria orgânica e a fase porosa preenchida por gases ou líquido, com componentes químicos dissolvidos na água. Especialmente a fase mineral do solo, ela é função do material que o originou, ou seja, a rocha que deu origem a esse solo. Essa atividade pode ser realizada a nível de ensino médio, e dependendo da linguagem e profundidade da discussão pode ainda ser utilizada no ensino superior, abordando aspectos do solo como sua constituição mineralógica e química, bem como reações que ocorrem no solo, tais como oxidação, redução, adsorção, troca iônica dentre outras. 78 b) Retenção e infiltração de água no solo Dando continuidade à atividade anterior, onde foram abordadas as características do solo, aqui o enfoque está mais relacionado ao fluxo e dinâmica da água no solo, transportando nutrientes e contaminantes dissolvidos na água. Nessa atividade a abordagem pode relacionar os possíveis impactos no solo e na água subterrânea pelo descarte de resíduos no ambiente. Por exemplo, os contaminantes originados de resíduos industriais e urbanos, agrotóxicos e fertilizantes que geralmente são dispostos no solo podem ser inertizados pelo solo ou podem ser lixiviados, atingindo a água subterrânea. O solo pode filtrar, adsorver, biodegradar ou precipitar quimicamente os contaminantes, impedindo que os mesmos contaminem o ambiente (Azevedo e Dalmolin, 2004). Essas reações são possíveis de imaginar ao observar no experimento a água que infiltra no solo e é coletada na garrafa pet utilizada como coletor, representando a lixiviação do solo, enquanto a água que permanece no solo pode sofrer as demais reações. c) Escoamento superficial do solo e da água Na sequência das atividades anteriores, essa atividade está mais relacionada ao escoamento superficial da água e do solo, sendo possível carregar contaminantes e partículas sólidas, podendo contaminar os recursos hídricos superficiais e assorear rios, com consequente impacto na vida presente na água. Com enfoque ao ensino superior, pode-se ainda abordar a adsorção de contaminantes em função das características químicas e mineralógicas do solo. d) O conhecimento adquirido Essa prática é o fechamento das atividades, onde através de um questionário estruturado será avaliado o conhecimento adquirido pelos alunos através da participação nas atividades bem como avaliar as atividades desenvolvidas de modo a melhorar e aperfeiçoar a abordagem dos assuntos aos diferentes públicos. Referências bibliográficas ALMEIDA, M.P.Q.; OLIVEIRA, C.I. Educação ambiental: importância da atuação efetiva da escola e do desenvolvimento de programas nesta área. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, Rio Grande, v.18, p.1517-1256, jan./jun. 2007. AZEVEDO, A.; DALMOLIN, R.S.D. Solos e ambiente: Uma introdução. Santa Maria, RS: Ed. Pallotti, 2004. 100p. FLORIANO, E.P. Educação ambiental como eixo transversal no processo de ensinoaprendizagem. 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