Potencial de produção de energia a partir de bambu nativo no sudoeste da Amazônia
Ecio Rodrigues, Moisés Lobão e Patrícia Amorim
Professores do CCBN-UFAC
A discussão acerca da existência de uma área expressiva com ocorrência de bambu
(taboca) com predominância da espécie Guadua weberbaueri no sudoeste da Amazônia é antiga.
Desde a divulgação pelo IBGE dos estudos realizados no âmbito do projeto Radam Brasil, ainda
na década de 1970, a “mancha de taboca”, como ficou conhecida, vez ou outra surge como
alternativa para a frágil economia do Acre e dos municípios onde ela ocorre em maior
concentração.
Figura 1 - Área com ocorrência natural de Guadua sp (taboca), imagem das tabocas alcançando o dossel,
colmo da taboca e suas gemas com espinhos.
Acontece que o bambu possui ampla distribuição em toda a Amazônia, associado de forma
dominante ou dominado a porções de florestas abertas e densas, conforme classificação
tradicional feita pelo IBGE (2005).
Significa dizer que existe potencial para exploração comercial do bambu em praticamente
toda a região, sendo que todos os mapeamentos por satélites realizados no sudoeste amazônico
nos últimos 30 anos dão conta de uma área de aproximadamente 600 mil hectares, com
ocorrência contínua de bambu dominando a floresta aberta ali existente.
Conforme Rodrigues (2004) seria o mesmo que afirmar que o potencial da “mancha de
taboca” para uso comercial do bambu é muito superior ao potencial observado em toda a
Amazônia.
Afinal, trata-se de uma extensa área, como se pode observar na figura 2, onde o manejo
florestal do bambu nativo, pode se viabilizar devido
a um diferencial inquestionável: a ocorrência
contínua e compacta de bambu na “mancha de
taboca”.
A motivação para discutir o aproveitamento
comercial da “mancha de taboca” é obviamente
decorrente desse diferencial. Trata-se da maior
porção contínua e de densidade por hectare de
bambu nativo no mundo.
Figura 2 - Padrões espaciais e temporais das florestas com bambu (Guadua sp.) no sudoeste da Amazônia,
detectados através de imagem de satélite.
FONTE: SILVEIRA (2006).
Todavia, existe um grupo expressivo de pesquisadores que são contrários ao manejo
florestal do bambu em ambiente nativo, optando pelo investimento em pesquisa voltada para a
domesticação da espécie, em cultivos que poderiam ser realizados próximos aos centros com
maior infraestrutura urbana como a existente na capital do Acre, Rio Branco.
No entanto a domesticação do bambu pode representar no curto prazo, um grave equívoco
para a Amazônia, pois a “taboca” trata-se de uma matéria-prima disponível e em evidência, uma
vez que não há dúvida quanto ao significado econômico do aproveitamento dessa espécie, tendo
em vista o já existente assentamento de negócios sustentáveis no Estado do Acre.
Consensuado esse ponto, as discussões devem se concentrar em duas linhas distintas: a
dispersão nativa da espécie em território amazônico, e a amplitude do emprego da taboca em
mercados como o do mobiliário e da construção civil.
A ideia é que o manejo florestal da taboca possibilite, de forma permanente e sustentável,
o fornecimento de matéria-prima para um segmento empresarial com enormes chances de
consolidação na área de ocorrência da “mancha de taboca”.
Por outro lado, o aproveitamento da espécie se configura em mais um dos setores
produtivo que podem vir a integrar um futuro cluster florestal, ou seja, um aglomerado econômico
baseado na exploração da biodiversidade, e que, por sua vez, pode levar ao estabelecimento de
uma economia florestal na região, em contraposição à nefasta expansão da atividade pecuária de
gado que vem avançando cada vez mais em nossa Amazônia.
A primeira e crucial resposta já foi obtida: existe ocorrência nativa de taboca no
ecossistema florestal do Acre. A “mancha de taboca” está localizada nos municípios de Assis
Brasil e Sena Madureira. Todavia, a “mancha de taboca” foi pouco estudada, tanto no que se
refere ao manejo florestal da espécie quanto ao seu emprego.
As pesquisas realizadas em âmbito internacional e nacional (especialmente em São Paulo)
confirmam o bambu como matéria-prima preferencial para aplicações em ramos díspares como o
da indústria alimentícia, da produção de papel e celulose, sem falar do poderoso, crescente e
alvissareiro segmento econômico da biomassa para geração de energia elétrica.
Analisando-se a literatura existente sobre o crescimento em volume (produção de
biomassa) e as propriedades energéticas do lenho do bambu, verifica-se que este tem um
potencial fabuloso para ser utilizado como fonte de geração de energia em uma região onde o
fornecimento de energia elétrica convencional é precário.
Estudos como o de Murakami (2007); Netto et al. (2008), sugerem que o incremento médio
anual (IMA) de biomassa das espécies de Bambu varia entre 22-44 m³/ha/ano, valores superiores
ao IMA de plantações de Pinus - 25 a 30 m³/ha/ano, e semelhantes aos encontrados em
plantações de eucaliptos - 30 a 40 m³/ha/ano.
Em relação a densidade básica do gênero Guadua alguns trabalhos mostram que ela varia
entre 0,45g/cm³ a 0,65g/cm³, sendo encontrado 0,629 g/cm³ para Guadua angustifólia (Brito et al.,
1987) e 0,49g/cm³ para Guadua sp. (LIMA et al., 2012).
Estudos realizados por Yao Hsing e De Paula (2011) demonstram que o rendimento
gravimétrico de carvão de quatro espécies de bambu variou entre 25 e 30 %. Brito et al.(1987)
verificaram em seus estudos um rendimento gravimétrico de carvão de 32,7% para a espécie
Guadua angustifólia, valor superior encontrado para o Eucalyptus urophylla que foi de 28,4%.
Esses mesmos autores verificaram que o poder calorífico superior do lenho da espécie Guadua
angustifólia foi de 4387 kcal/kg, muito próximo do valor encontrado para o Eucalyptus urophylla
que foi de 4531 kcal/kg.
Como pode-se verificar o poder calorífico do bambu é igual ou superior às espécies
comumente usadas para a obtenção de carvão, como os eucaliptos, e a sua alta capacidade de
renovação e seu rápido crescimento e incremento volumétrico em biomassa possibilita que esta
planta seja uma importante fonte renovável de energia (RIBEIRO, 2005).
Para facilitar esse entendimento foi feita uma simulação comparando o uso de biomassa
de Eucalyptus urophylla e de bambu da espécie Guadua angustifólia para verificar os seus
potenciais para produção de energia em kwh, a partir da densidade básica, do incremento médio
anual em volume de biomassa do seu lenho e seu poder calorifico superior (tabela 1).
Tabela 1 – Analise comparativa entre o emprego de biomassa de Eucalyptus urophylla e
de Guadua angustifólia.
Densidade
básica
Incremento
médio anual
Massa seca
de madeira
(kg/m³)
(m /ha/ano)
(kg/ha/ano)
Eucalyptus
urophylla
490
35
17.150
Guadua
angustifólia
629
33
20.757
Biomassa
3
Poder
Calorífico
superior
Energia
Disponível
/
(kcal/ha Ano)
(kW.h/ha/ Ano)
4.531
77.706.650
90.372,332*1
4.387
91.060.959
105.903,308*1
(Kcal/kg)
Energia
Disponível
*1
Considerando-se 1 kWh equivalente a 859,85 kcal
Constatou-se por essa simulação que a energia disponível obtida do lenho do bambu
(Guadua angustifólia) de 105903,308 kwh/ha/ano foi superior a média obtida da madeira de
Eucalyptus urophylla que foi de 90372,332 kwh/ha/ano, sendo superior a maioria das espécies
vegetais utilizadas para a produção de energia em nosso país.
O aproveitamento do bambu, como biomassa para geração de energia elétrica deve ser
uma prioridade para a realização de pesquisa nessa região. A sociedade acreana e brasileira, há
mais de 40 anos, espera por uma resposta.
Referências
BRITO, J. O.; TOMAZELLO F°, M.; SALGADO, A. L. B. Produção e caracterização do carvão vegetal de
espécies e variedades de bambu – Piracicaba, IPEF, n.36, p.13-17, ago.1987
IBGE. Potencial Florestal do Estado do Acre. Relatório Técnico preliminar. Rio de Janeiro. 2005.
LIMA, D. N.;; AFONSO, D. G.; PONTES, S. M. A. Análise comparativa da estabilidade dimensional de
02 espécies de bambu ocorrentes na Amazônia Ocidental. Publicado nos Anais do 4º Congresso
Florestal Paranaense, Curitiba. 2012.
MURAKAMI, C. H. G.. Bambu: matéria-prima do futuro. In Boletim Florestal: Informativo Florestal do
Norte Pioneiro, ed. 6, ano 1, dez. 2007. p. 5.
NETTO. L. G. GIANNETTI, B. F.; ALMEIDA, C. M.; BONILLA, S. H. Determinação dos fluxos de CO2 de
uma plantação comercial de bambu no Brasil: oportunidades para a diminuição da emissão de CO2. In:
SIMPÓSIO DE ENGENHAIRA DE PRODUÇÃO, 15, 2008, São Paulo 2008.
PEREIRA, M. A. D. R.; BERALDO, A. L. Bambu de corpo e alma. Bauru: Canal 6, 2007. 231 p.
RIBEIRO, A.S. Carvão de bambu como fonte energética e outras aplicações. Instituto do Bambu.
Maceió. Instituto do Bambu, 2005. 109 p.
RODRIGUES, E. Vantagem competitiva do ecossistema na Amazônia: O Cluster Florestal do Acre.
Tese de Doutorado. UnB. Brasília. 2004.
SILVEIRA. M; OLIVEIRA. E. C; BANDEIRA. J. R, Avaliação ecológica rápida estação ecológica do rio
acre vegetação e flora, 2ª expedição. Universidade Federal do Acre, New York Botanical Garden e
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Rio Branco. 2006.
YAO HSING, T.; DE PAULA, N. F. Produção e caracterização de carvão ativado de quatro espécies de
bambu- Ciência & Tecnologia: FATEC-JB, Jaboticabal, v.3, 2011. Suplemento.
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