Boletim eletrônico do Projeto Cursinho Popular
na Periferia- 15/2014
03/12/2014
EDUCADOR POPULAR DO PROJETO CURSINHO POPULAR NA
PERIFERIA GANHA PRÊMIO NACIONAL DA ACADEMIA BRASILEIRA DE
LETRAS
Confira a notícia: http://www.oregional.com.br/…/15-premio-literario-escritor-…
O Projeto Cursinho Popular na Periferia tem apoio da Petrobrás, através do
programa Desenvolvimento e Cidadania.
Segue abaixo entrevista com Vitor Ribeiro Santos Martinez:
MSU: Como foi receber a notícia do prêmio?
VITOR: Foi inesperado. Eu tinha escrito no começo do ano. Mas ganhar um
prêmio com um dos escritores que eu mais gosto, que é o Guimarães Rosa...
foi muito gratificante para mim.
MSU: Como você recebeu a notícia? Foi através de quem?
VITOR: Foi pelo pessoal do concurso. Eles me telefonaram e avisaram e
falaram sobre as passagens para o Rio de Janeiro.
MSU: Sua família ficou feliz?
VITOR: Bastante. Até porque eles vão comigo para o Rio de Janeiro.
Ganhamos duas passagens para eles.
MSU: Você chorou, ficou emocionado?
VITOR: Não, não tanto assim. Eu escrevo muito mais poesia. Prosa, muito
pouco.
MSU: O Guimarães Rosa é seu escritor favorito?
VITOR: Sem dúvidas.
MSU: Por quê?
VITOR: Porque ele conseguiu alcançar um equilíbrio entre uma escrita que é
popular e uma escrita que é erudita. Ele escrevia de uma forma erudita, mas ao
mesmo tempo muito popular. Dialogava com os problemas sociais,
escrevendo, colocando na boca dos personagens a construção social da
linguagem, do idioma brasileiro. É por isso que eu admiro tanto Guimarães
Rosa.
MSU: Como você conheceu Guimarães?
VITOR: Foi por conta própria. Comprei um livro dele. E meu texto [premiado]
descreve este momento, em que eu comprava o livro dele. E a partir da
primeira leitura eu fui puxando várias outras.
MSU: Qual é sua obra favorita dele?
VITOR: É Grande Sertão Veredas. Porque tem um caráter mais popular, escrita
em primeira pessoa. É um homem mesmo que fala durante o livro todo. Ele se
contradiz, entra em dúvida, tem certezas. Ele fala de uma forma absolutamente
real. Ele fala de uma forma que existe, que é popular.
MSU: Você achou uma leitura difícil?
VITOR: No começo eu achei bem difícil. Tive bastante dificuldade no começo,
mas depois você se acostuma. É uma linguagem tão simples, mas tão simples,
que se torna complicada.
MSU: Queria saber um pouco sobre seu trabalho no MSU. Você é voluntário
aos domingos no CEU de Campo Limpo desde que o projeto começou, certo?
VITOR: Isso mesmo.
MSU: Você foi aluno do MSU?
VITOR: Não, eu estou em São Bernardo e soube através da UFABC.
MSU: Como você conheceu o MSU?
VITOR: Como estudei na UFABC antes de ir para a USP, eu ainda recebo emails da UFABC. Então eu vi o chamado dos professores, fiz entrevista com o
Sérgio, ele me disse que como eu era da USP teria que ser voluntário, não
receber salário. Eu achei ótima a experiência de poder dar aula no primeiro ano
[da faculdade]. Ótimo.
MSU: E o que te motivou a lecionar?
VITOR: Sem dúvidas é o momento que o Brasil atravessa na educação. Um
momento de bastante defasagem, de exclusão. Então, isso se tornou uma
necessidade para mim. Eu também estudei em escola pública, com
professores faltando, professores despreparados, desmotivados, faltando,
recebendo pouco. Então acho que quanto mais gente entrar para a área, mais
pessoas estarão batalhando por uma condição melhor de ensino.
MSU: Você enxerga Miguilins, Riobaldos e Sertões urbanos na ação do MSU?
VITOR: Com certeza enxergo. Até porque o próprio Guimarães Rosa se
baseou nos tipos urbanos para construir seus próprios personagens. Encontro
pessoas com histórias incríveis, dignas de Guimarães Rosa, e esta é a melhor
riqueza que o MSU pode me proporcionar. Conhecer essas histórias e de
poder modificar a realidade de alguma forma.
MSU: Você sente que os alunos fazem progressos?
VITOR: Na escrita, sem dúvidas. Isso me alegra muito, ver que os alunos
conseguem pegar a referência de escrita da redação. Na parte da leitura,
depende mais deles do que da gente. A gente tem trabalhado com distribuição
de livros, vejo quais livros eles podem gostar e dou para eles. Aí eles são
apresentados à literatura para verem se gostam ou se não gostam. É direito do
aluno não gostar, mas ele tem que ter facilidade com a leitura. Porque na
faculdade, mesmo se fizer engenharia, vai ter que ler bastante.
MSU: Você cursa letras, certo? E antes fazia o quê?
VITOR: Fiz um ano de engenharia.
MSU: E por que a mudança?
VITOR: Primeiro fui pelo caminho que a sociedade impõe, da estabilidade
financeira, do emprego certo. Depois eu vi que não era na engenharia que eu
me encaixava, não.
MSU: Você teve apoio da sua família para mudar de curso?
VITOR: Na hora de mudar eu tive sim. Eles viram que estava bem infeliz na
engenharia.
MSU: Qual é o sonho da sua vida?
VITOR: Poder publicar um dia um bom livro, mas também poder continuar
ajudando as pessoas. Meu sonho mais pessoal é este. Um sonho mais amplo é
ver a educação brasileira em um bom nível, em que os brasileiros pudessem se
dedicar, atraídos pela escola, que não fosse só uma obrigação ir para a escola.
MSU: Vitor, você gostaria de comentar mais alguma coisa?
VITOR: Gostaria de parabenizar o MSU pelo excelente projeto. É algo que
realmente muda a vida. São pessoas que têm sua primeira oportunidade de
mudar de vida e de chegar à faculdade. Quero parabenizar o MSU por isso, é
algo que vale muito hoje em dia. Ligar pessoas com pessoas, é algo muito
valioso que a humanidade pode fazer.
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