EVOLUÇÃO DOS TRABALHOS DE AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA NAS INSTITUIÇÕES ACADÊMICAS BRASILEIRAS Ângela Maria Ferreira Lima* Mestranda em Gerenciamento e Tecnologias Ambientais no Processo Produtivo TECLIM/UFBA; Especialista em Gerenciamento e Tecnologias Ambientais no Processo Produtivo - Ênfase em Produção Limpa, TECLIM/UFBA, 2001; Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho, UFPB,1992; Engenheira de Materiais, UFPB, 1987. Armando Caldeira-Pires Doutor em Engenharia Mecânica, Universidade Técnica de Lisboa, 1995. Mestre em Engenharia Química. UFRJ, 1985. Engenheiro Químico, UFRJ, 1980. Professor Adjunto da UnB e Pesquisador Visitante do Instituto Superior Técnico de Lisboa - Portugal. Asher Kiperstok Doutor em Engenharia Química e Tecnologias Ambientais, UMIST, Inglaterra, 1996; Mestre em Engenharia QuímicaUMIST, Inglaterra, 1994; Engenheiro Civil,TECHNION, Israel. 1974. Professor Adjunto da UFBA e Coordenador da Rede de Tecnologias Limpas - TECLIM. * Endereço: SQN 312, Bloco K, apt 101. CEP 70.765-110, Brasília /DF. e-mail: [email protected]. RESUMO Este artigo tem como objetivo avaliar o estágio dos estudos acadêmicos brasileiros (mestrado e doutorado), no que se refere a ferramenta ambiental Avaliação do Ciclo de Vida, e sua evolução nos decorrer dos anos. Inicialmente fez-se um levantamento geral dos trabalhos de mestrado e doutorado, em bancos de dados acadêmicos, onde resultou em 47 dissertações de mestrado e 17 teses de doutorado. Em seguida estes trabalhos foram arranjados de acordo com seu ano de publicação, onde graficamente podemos perceber a descontinuidade no decorrer dos anos. O pico de maior produção científica, foi no biênio 2003-2004. Por fim, estes trabalhos foram analisados em categoria de setores produtivos, onde se constatou que as categorias abordadas são bem diversificadas, como: construção civil, automobilístico, embalagens, energia, agro-pecuário, mineração, químico etc. INTRODUÇÃO Análise do Ciclo de Vida é um instrumento de avaliação do impacto ambiental associado a um produto ou processo, compreendendo etapas que vão desde a retirada das matérias-primas elementares da natureza que entram no sistema produtivo (berço) à disposição do produto final, após uso (túmulo). Inclui extração, processamento da matéria prima, manufatura, transporte, distribuição, uso, reuso, manutenção, reciclagem e disposição final. Permite uma visão abrangente dos diversos impactos provocados ao meio ambiente, possibilitando a identificação das medidas mais adequadas do ponto de vista ambiental e econômico para sua minimização, constituindo-se assim numa técnica de gerenciamento ambiental e de desenvolvimento sustentável (CHEHEBE, 1998; JENSEN,1997; GRAEDEL,1998 apud LIMA, 2001). Algumas empresas adotam o conceito de ciclo de vida, entendendo que os impactos dos produtos não se restringem apenas aos processos de fabricação, mas tem também impactos ambientais associados ao seu uso e descarte. Melhorias na concepção do produto podem trazer tanto benefícios econômicos ao longo do seu ciclo de vida (menor geração de resíduo, substituição de produtos perigosos), quanto organizacionais (vantagem competitiva) (UNEP, 2005). Nos últimos anos tem aumentado o interesse em ACV pelas indústrias, especialistas ambientais, autoridades, associações de consumidores, organizações ambientais e o público em geral que querem conhecer a qualidade ambiental dos processos de produção e dos produtos. Este trabalho tem como objetivo avaliar o estágio dos estudos acadêmicos brasileiros (mestrado e doutorado), no que se refere a ferramenta ambiental Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), e sua evolução no decorrer dos anos. METODOLOGIA Para verificar o estágio atual dos trabalhos de ACV na área acadêmica, foi realizada no período de abril a junho/2006, uma revisão bibliográfica para o levantamento dos dados, onde se buscou o tema ACV no resumo dos trabalhos de mestrado e doutorado. Foi realizada nos seguintes bancos de dados acadêmicos: Proceedings of the CILCA2007 – International Conference of Life Cicle Assessment a) Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), onde existe uma relação com resumos de teses e dissertações com a temática ACV; b) Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), que disponibiliza ferramentas de busca e consulta de resumos sobre teses e dissertações defendidas junto a programas de pósgraduação no país; c) Plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), onde foi realizada uma pesquisa no sistema de informação curricular da comunidade científica brasileira, nos principais currículos dos professores universitários que trabalham com a ACV. tabela 2 ilustra a distribuição destas dissertações dentro dos cursos de pós-graduação na USP. Tabela 2 – Cursos de pós-graduação da dissertação em ACV CURSOS DA USP Engenharia Química Nº de dissertações produzidas em ACV 8 Administração 1 Engenharia Civil 1 Engenharia Elétrica Interunidades em Energia 1 1 Saúde Pública A primeira abordagem deste levantamento foi a quantificação destes trabalhos acadêmicos, totalizando 47 dissertações de mestrado e 17 teses de doutorado. Dissertações de Mestrado Estes trabalhos foram separados e quantificados por universidade, para se ter uma visão onde estão concentrados e estão distribuídos conforme a tabela 1. Tabela 1 - Número de dissertações de mestrado em ACV produzidas por universidade. Nº de dissertações produzidas em ACV UNIVERSIDADE Universidade de São Paulo - USP Universidade Federal de Santa Maria UFSM Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS Universidade Regional de Blumenau FURB Universidade Federal de Santa Catarina UFSC USP onde produziram TOTAL 1 13 A maior produção da USP, com 8 dissertações, está concentrada no mestrado de Engenharia Química. Este fato deve-se à existência de um grupo de pesquisa em ACV, denominado “Grupo de Prevenção a Poluição/GP2”, coordenado pelo profº Gil Anderi. Foi estruturado em duas vertentes, uma para estabelecer banco de dados nacional e a outra, estudar os usos e aplicações da ACV (KULAY, 2004). O grupo é também é responsável por uma disciplina de pósgraduação dedicada exclusivamente à ACV. 13 4 4 4 3 Universidade de Brasília - UnB 3 Universidade Federal da Bahia - UFBA Universidade Federal de São Carlos UFSCAR Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ 2 Universidade Federal do Paraná - UFPR Universidade para Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal UNIDERP Universidade Est.Paulista Júlio de Mesquita Filho/Botucatu - UNESP Universidade Estadual de Campinas UNICAMP 1 2 2 1 1 1 Universidade Federal de Viçosa - UFV 1 Universidade Federal Fluminense - UFF Universidade Metodista de Piracicaba UNIMEP Universidade Federal de Itajubá UNIFEI (MG) Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC 1 1 1 1 Universidade de Taubaté - UNITAU 1 TOTAL 47 A universidade que tem o maior número de dissertações na temática ACV, no Brasil, é a Universidade de São Paulo (USP) com 13 trabalhos. A Teses de Doutorado O mapeamento dos trabalhos de doutorado está distribuído na tabela 3. Tabela 3 - Número de teses de doutorado em ACV produzidas por universidade Nº de teses produzidas em ACV UNIVERSIDADE Universidade Estadual de Campinas Unicamp 5 Universidade de São Paulo - USP 4 Universidade Federal do Pará - UFPA Universidade Federal de São Carlos UFSCAR 2 Universidade de São Paulo - São Carlos Universidade Federal de Minas Gerais UFMG Universidade Federal de Santa Catarina UFSC Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ 1 TOTAL 17 2 1 1 1 A UNICAMP destaca-se com a maior produção de teses em ACV com 5 trabalhos, sendo da Engenharia Mecânica (3), Engenharia Química (1) e Planejamento de Sistemas Energéticos (1). Todas as teses com orientadores diferentes. Evolução dos estudos acadêmicos da ACV As dissertações (47) e teses (17) foram arranjadas de acordo com o ano de publicação (Figuras 1 e 2). Proceedings of the CILCA2007 – International Conference of Life Cicle Assessment O ano de 2000, a produção científica aumentou em relação aos anos anteriores, com quatro dissertações e duas teses. As dissertações produzidas foram: duas da USP (Engenharia Elétrica e Engenharia Química); uma da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Botucatu – Agronomia, e uma da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental. As duas teses foram da Universidade Estadual de Campinas - Engenharia Mecânica. Dissertações com a temática ACV produzidas por ano no Brasil 14 10 8 6 4 2 0 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 ano Figura 1 - Quantidade de dissertações produzidas por ano no Brasil na temática ACV. Já em 2005 e 2006 houve uma queda na produção, isto pode ter acontecido por falta de incentivos financeiros, ou seja, por falta de verbas por parte dos órgãos de fomento a pesquisa, além de terem poucos grupos com características de coordenação dentro das universidades. Teses com a temática ACV produzidas por ano no Brasil 6 5 quantidade de teses O período mais produtivo foi o biênio 2003 (12 dissertações e 5 teses) a 2004 (13 dissertações e 5 teses). Podemos supor, que este aumento foi em relação a divulgação da primeira norma ABNT/ISO 14.040 no Brasil, em 2001, o que facilitou o acesso a informação sobre ACV. 4 ACV no meio acadêmico por setor produtivo 3 2 1 0 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 ano Figura 2 – Quantidade de teses produzidas por ano no Brasil na temática ACV Por este levantamento, a primeira produção acadêmica no Brasil na temática ACV, foi uma tese de doutorado no ano de 1997, da Universidade Federal de Santa Catarina - Engenharia de Produção, denominada “Planejamento baseado em casos aplicados na resolução de não-conformidades (NC) ambientais no ciclo de vida de produtos, processos e serviços” (SILVA, 1997). Neste ano é iniciado também as atividades do Grupo de Prevenção a Poluição - GP2, grupo de pesquisa em ACV da USP, coordenado pelo profº Gil Anderi (KULAY, 2004). Já as primeiras dissertações com esta temática, viria um ano depois, em 1998. Foram identificadas três, sendo duas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Planejamento Energético e Engenharia de Produção), e outra da Universidade Metodista de Piracicaba. Em 1999, foram publicadas também três dissertações, sendo duas da Universidade Regional de Blumenau – Administração, orientadas pela profª Beate Frank, e uma da Universidade de São Paulo - Interunidades em Energia. Dos trabalhos acadêmicos avaliados, observa-se que os setores produtivos abordados são bem diversificados, como: construção civil, automobilístico, embalagens, energia, agro-pecuário, mineração, químico etc. Por outro lado, já se identifica um direcionamento das universidades por determinados segmentos. Dos trabalhos de mestrado, podemos destacar a USP em energia, a UFSC e a UFGRS em construção civil, a UnB em agricultura, e a UFBA em políticas públicas. Já as teses, os setores são bem diferentes, com uma predominância dos trabalhos da UNICAMP para a aplicação da metodologia de ACV (Figura 3). Gráfico das instituições x Segmentos de ACV - Doutorado outros Políticas Públicas 6 Nº de trabalhos quantidade de dissertações 12 Embalagens 5 Metodologia 4 Químico 3 Mineraçào 2 Agro-pecuário Energia 1 Plásticos 0 Automobilistico UNICAMP USP UFPA UFSC Demais Construção Civil Instiuições Figura 3 - Produção de teses de ACV por segmento produtivo ACV no meio acadêmico mundial Para verificar o interesse do assunto ACV no meio acadêmico mundial, foi realizada uma pesquisa no banco de dados “Science Direct”, em agosto de 2006, com a palavra-chave “life cycle assessment”. Observou-se que existe um aumento das atividades de Proceedings of the CILCA2007 – International Conference of Life Cicle Assessment pesquisa em ACV no decorrer dos anos, o que é refletido no número de artigos publicados em revistas acadêmicas por este banco de dados, conforme a Figura 4. Estudo semelhante foi realizado por Baumann & Tillman, 2004, nos bancos de dados de artigos do “Sience Citation Index, Compendex and ABIInform”, de 1990 a 1999. 3. 4. Observa-se que em 1993, houve um salto no número de artigos, deve-se ao fato de ter sido publicado a primeira edição especial em ACV, no “Journal of Cleaner Production”, Nº 3-4, volume 1 (RUSSELL, 2005). O aumento progressivo no decorrer dos anos mostra o interesse que a ACV vem despertando na comunidade científica mundial. 5. Artigos de ACV no Science Direct 500 404 Nº de publicações 400 289 300 200 100 0 0 4 1990 1991 1992 21 25 1993 1994 41 53 47 1996 1997 57 67 1998 1999 92 117 141 149 165 2002 2003 6. 0 1995 2000 2001 2004 2005 2006 ano 7. Figura 4 - Número de artigos de ACV no meio acadêmico no Science Direct. CONCLUSÃO Nesta pesquisa sobre o levantamento de teses e dissertações com a palavra-chave “Avaliação do Ciclo de Vida”, mostra que não existe uma evolução progressiva dos trabalhos no decorrer dos anos. Houve um período que a produção cresceu, 2003/2004, possivelmente em decorrência da publicação da primeira norma ABNT/ISO 14.040, o que facilitou o acesso a informação sobre ACV. Nos anos seguintes observa-se uma queda na produção, o que demonstra uma falta de incentivos a pesquisa, por parte dos órgãos de fomento a pesquisa no país. A nível mundial, o interesse em ACV é progressivo, o que pode ser verificado no levantamento da base de dados “Science Direct”. Os trabalhos acadêmicos brasileiros contemplam diversos segmentos produtivos, como: petroquímicos, construção civil, agricultura, construção civil, energia elétrica, alumínio, etc. Algumas universidades já se definindo em determinadas áreas como a USP em energia, a UFSC e a UFGRS em construção civil, a UnB em agricultura, e a UFBA em políticas públicas. 8. 9. Dissertações. Disponível em http://www.capes.gov.br/capes/portal/conteudo/10/ Banco_Teses.htm >. Acesso em Maio/2006. IBICT - Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia. Disponível em <http://acv.ibict.br/publicacoes/teses>. Acesso em Abril/2006. KULAY, Luiz Alexandre. Uso da análise de ciclo de vida para a comparação do desempenho ambiental das rotas úmida e térmica de produção de fertilizantes fosfatados. 314p. Tese (Doutorado). Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, Departamento de Engenharia Química, São Paulo. 2004. LIMA, Ângela M. Ferreira. Estudo da cadeia produtiva do polietileno tereftalato (PET) na Região Metropolitana de Salvador como subsídio para Análise do Ciclo de Vida. 94 p. Monografia (Especialização em Gerenciamento e Tecnologias Ambientais no Processo Produtivo), Escola Politécnica, Universidade Federal da Bahia, Salvador. 2001. PLATAFORMA LATTES. Disponível em http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/index.jsp> Acesso em Junho/2006. RUSSEL, A.; EKVALL, T.; BAUMANN, H. Life cycle assessment – introduction and overview. Editorial. Journal of Cleaner Production. 13 (2005) 1207-1210. SILVA, HARRYSON L. Planejamento baseado em casos aplicado na resolução de nãoconformidades (NC) ambientais no ciclo de vida de produtos, processos e serviços. 234p. Tese (Doutorado). Universidade Federal de Santa Catarina - Engenharia de Produção. 1997. UNEP. SONNEMANN, Guido (project officer). JENSEN, Allan Astrup; REMMEN, Arne (Editor). Background Report for a UNEP Guide to Life Cycle management – A bridge to sustainable products. 2005. 108p. Disponível em http://lcinitiative.unep.fr/default.asp?site=lcinit&p age_id=A9F77540-6A84-4D7D-8F1C7ED9276EEDE3. Acesso em 27 nov. 2005. AGRADECIMENTOS A FAPESB/CAPES, pela bolsa concedida à mestranda Ângela Maria Ferreira Lima. REFERÊNCIAS 1. 2. BAUMANN, Henrikke; TILLMAN, Anne-Marie. The Hitch Hiker´s Guide to LCA – An orientation in life cycle assessment methodology and application. 1ª edição. Editora Studentlitteratur, Sweden. 2004. 543 p. CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Banco de Teses e Proceedings of the CILCA2007 – International Conference of Life Cicle Assessment