Domingo de Pentecostes - Ano C DOMINGO DE PENTECOSTES (ANO C) 19 de Maio de 2013 Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João (Jo 14, 15-16.23-26) 15 «Se me tendes amor, cumprireis os meus mandamentos, dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco. 16 e Eu apelarei ao Pai e Ele vos 23 Se alguém me tem amor, há-de guardar a minha palavra; e o meu Pai o amará, e Nós viremos a ele e nele faremos morada. 24 Quem não me tem amor não guarda as minhas palavras; e a palavra que ouvis não é minha, mas é do Pai, que me enviou. 25 Fui-vos revelando estas coisas enquanto tenho permanecido convosco; 26 mas o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, esse é que vos ensinará tudo, e há-de recordar-vos tudo o que Eu vos disse.» Para situar a passagem no seu contexto Estes poucos versículos, e ainda por cima não contínuos, são como algumas gotas de água extraídas do oceano; fazem parte do longo e estupendo discurso do Evangelho de São João que vai desde 13, 31 até todo o capítulo 17. Desde o início até ao final desta unidade 1/6 Domingo de Pentecostes - Ano C discursiva, profundíssima e indizível, é tratado um só tema: “ir a Jesus”, que aparece inclusivamente em 13, 33: “ Filhin hos, já pouco tempo vou estar convosco, para onde eu vou , vós não podeis ir ” e em 16, 28: “ Saí do Pai e vim ao mundo. Agora deixo outra vez o mundo e vou para o Pai ” e ainda em 17, 13: “ Mas agora vou para ti, Pai ”. O ir de Jesus para o Pai inclui também o significado do nosso caminhar, do nosso percurso existencial e de fé neste mundo; é aqui onde aprendemos a seguir Jesus, a escutá-lo e a viver como Ele. Aqui é-nos oferecida a revelação mais completa acerca de Jesus no mistério da Trindade, como também a revelação sobre a vida cristã, o seu poder, a sua alegria e a sua dor, a sua esperança e a sua luta. Penetrando nestas palavras podemos encontrar a verdade do Senhor Jesus e de nós perante Ele e n'Ele. Estes versículos falam-nos em particular de três fortíssimos motivos de consolação: a promessa da vinda do Consolador; a vinda do Pai e do Filho à alma do discípulo que crê; a presença de um mestre, que é o Espírito Santo, graças ao qual o ensinamento de Jesus não passará jamais. Para ajudar na leitura da passagem vv. 15-16: Jesus revela que a observância dos seus mandamentos não é feita à base de um esforço de constrição, mas é antes um fruto doce, que nasce do amor do discípulo para com Ele. A esta obediência amorosa está unida a oração omnipotente de Jesus por nós. O Senhor promete a vinda de outro Consolador, enviado pelo Pai, que permanecerá sempre connosco para destruir definitivamente a nossa solidão. vv. 23-24: Jesus repete que o amor e a observância dos seus mandamentos são duas realidades vitais essencialmente unidas entre si, que têm o poder de introduzir os discípulos na vida mística, isto é, na experiência da comunhão imediata e pessoal com Jesus e com o Pai. 2/6 Domingo de Pentecostes - Ano C v. 25: Jesus afirma uma coisa muito importante: há uma diferença substancial entre as coisas que Ele disse enquanto estava junto dos seus discípulos e as coisas que dirá depois quando, graças ao Espírito, Ele estará dentro deles. Antes, a compreensão era unicamente limitada, porque a relação com Ele era externa: a Palavra vinha de fora e chegava aos ouvidos, mas não era pronunciada desde dentro. Depois a compreensão será total. v. 26: Jesus anuncia o Espírito Santo como mestre, que não ensinará já não a partir de fora, mas vindo de dentro de nós. Ele vivificará as Palavras de Jesus, que tinham sido esquecidas e recorda-las-á, fará com que os discípulos as possam compreender plenamente. Algumas perguntas - Se me amais. A minha relação com o Senhor é ou não uma relação de amor? Há no meu coração espaço para Ele? Olho para dentro de mim e pergunto: “Onde está o amor da minha vida? Existe?”. Se me dou conta de que dentro de mim não existe o amor, ou há pouco, tento perguntar a mim mesmo: “O que é que me bloqueia, o que é que faz com que o meu coração esteja fechado, prisioneiro, com tanta tristeza e solidão?”. - Observareis os meus mandamentos. Sai-me ao encontro o verbo observar, com toda a carga dos seus muitos significados: olhar bem, proteger, prestar atenção, não atirar fora, reservar e preservar, manter com cuidado, com amor, etc. Vivo iluminado por estas atitudes a minha relação de discípulo, de cristão, com a Palavra e os mandamentos que Jesus nos deixou para a nossa felicidade? - Ele vos dará outro Consolador. Quantas vezes fui à procura de alguém que me consolasse, se preocupasse comigo, que me mostrasse afecto ou prestasse atenção. Estou convencido que a verdadeira consolação vem do Senhor? Ou confio mais nas consolações que vou encontrando, que mendigo aqui e ali, que recolho como migalhas, sem que fique verdadeiramente saciado? - Faremos nele a nossa morada. O Senhor está à porta, chama e espera; não força e não constringe. Ele diz “Se queres...”. Convida-me a ser sua casa, o lugar do seu repouso, da sua intimidade; Jesus está pronto, é feliz por me encontrar, por unir-se a mim numa amizade de todo especial. Mas estou pronto? Espero a visita, a vinda, a entrada de Jesus na minha existência mais íntima e pessoal? Há lugar para Ele na minha casa? - Ele vos recordará tudo o que vos disse. O verbo “recordar” leva em si outra realidade muito importante, essencial, diria. Sou provocado, examinado pela Escritura. Onde aplico a minha memória? O que procuro reter na mente, fazer viver no meu mundo interior? A Palavra do Senhor é um tesouro muito precioso, uma semente de vida semeada no meu coração. 3/6 Domingo de Pentecostes - Ano C Presto atenção a esta semente? Sei defendê-la dos inúmeros inimigos e perigos que a assaltam: os pássaros, o calor, as pedras, os espinhos, o maligno? Em cada manhã levo comigo uma Palavra do Senhor para recordá-la durante o dia e fazer dela uma luz secreta, a minha força e o meu alimento? O rosto do Pai Jesus diz: “Eu pedirei ao Pai” (v. 16) e levanta um pouco o véu da oração: ela é o caminho que conduz ao Pai. Para chegar ao Pai foi-nos dada a oração. Como Jesus vive a sua relação com o Pai através da oração, assim nós também. Percorro as páginas do Evangelho e procuro com atenção qualquer indício relativamente a este segredo de amor entre Jesus e o seu Pai, visto que entrando nessa relação, também eu posso conhecer mais a Deus, meu Pai. “Ele vos dará outro Consolador”. O Pai é quem nos dá o Consolador. Este acto está precedido do acto de amor do Pai, que sabe que temos necessidade da consolação: Ele viu a minha miséria no Egipto e ouviu o meu grito, conhece os meus sofrimentos e vê a opressão que me atormenta (cf. Ex 3, 7-9). Nada escapa ao amor infinito que tem por mim. Por tudo isto Ele nos dá o Consolador. O Pai é o Dador: tudo vem d'Ele e de mais ninguém. “Meu Pai o amará” (v. 24). O Pai é o Amante que ama com amor eterno, absoluto, inviolável, incansável. Como diz Isaías, Jeremias e todos os profetas (cf. Jer 31, 3; Is 43, 4; 54, 8; Os 2, 21; 11, 1). “Viremos a ele”. O Pai está unido ao seu Filho Jesus, é uma só coisa com Ele e com Ele vem a cada homem, está dentro de cada homem. Muda-se, sai, inclina-se e caminha até nós. Levado por um amor delirante e inexplicável, aproxima-se de nós. “E faremos nele a nossa morada”. O Pai constrói a sua casa em nós. Faz de nós, da minha existência, de todo o meu ser, a sua morada. Ele vem e não vai, permanece fielmente. O rosto do Filho 4/6 Domingo de Pentecostes - Ano C “Se me amais...” (v. 15); “Se alguém me ama...” (v. 23). Jesus entra em relação comigo de um modo único e pessoal, face-a-face, coração a coração, alma a alma. Propõe-me um ligação intensa, única, irrepetível e une-me a si através do amor, se eu quero. Sempre põe o “se” e diz, chamando-me pelo meu nome: “Se queres...”. O único caminho que ele percorre para chegar até mim é o do amor. Percebo que os pronomes “vós” e “alguém” estão unidos com o “me” do verbo “amar”, e a mais nenhum outro verbo. “Eu pedirei ao Pai” (v. 16). Jesus é o orante que vive da oração e para a oração; toda a sua vida é cheia de oração, era oração. Ele é o sumo e eterno sacerdote que intercede por nós e oferece orações e súplicas, acompanhadas de lágrimas (cf. Hb 5, 7), pela nossa salvação: “Daí que possa também salvar perfeitamente aos que por ele se aproximam de Deus, já que está sempre vivo a interceder em seu favor” (Hb 7, 25). “Se alguém me ama guardará a minha palavra” (v. 23); “O que me não ama não guarda a minha palavra ” (v. 24). Jesus oferece-me a sua Palavra, entrega-ma, para que eu cuide dela e a guarde, a coloque no tesouro do meu coração e aí me dê calor, vele por ela, a contemple, a escute e, fazendo assim, a faça frutificar. A sua Palavra é uma semente; é a pérola mais preciosa de todas, pela qual vale a pena vender todas as riquezas; é o tesouro escondido no campo, que para o obter se escava, sem ter medo do cansaço; é o fogo que nos faz arder o coração no peito; é a lâmpada que nos permite ter luz para os nossos passos, mesmo que a noite seja escura. O amor à palavra de Jesus identifica-se com o meu amor pelo próprio Jesus, por toda a sua pessoa, já que Ele, em definitivo, é a Palavra, o Verbo. É por isso, que nestas palavras, Jesus me grita ao coração que é a Ele que devo guardar! O rosto do Espírito “O Pai vos dará outro Consolador” (v. 16). O Pai dá-nos o Espírito Santo. Ele é a “boa dádiva e o dom perfeito que vem do alto” (Tg 1, 17). Ele é “um outro Consolador” como Jesus, que vai e vem para não nos deixar sozinhos, abandonados. Enquanto estou no mundo, eu não estou desconsolado, mas confortado pela presença do Espírito Santo, que não é somente um consolo, mas muito mais: é uma pessoa viva que está sempre junto de mim. Esta presença, esta companhia, é capaz de me dar alegria, a verdadeira alegria. Diz São Paulo: “O fruto do Espírito é amor, alegria, paz...” (Gal 5, 22; cf. também Rm 14, 17). 5/6 Domingo de Pentecostes - Ano C “Para que esteja sempre convosco”. O Espírito está no nosso meio, está comigo, como Jesus estava com os discípulos. A sua vinda é uma física e pessoal presença. Eu não o vejo mas sei que está comigo e não me abandona. O Espírito permanece para sempre e vive comigo, em mim, sem limitação de tempo ou de espaço. Deste modo Ele é o Consolador. “Ele vos ensinará tudo” (v. 26). O Espírito Santo é o Mestre, o que abre o caminho ao conhecimento, à experiência. Ninguém fora d'Ele pode guiar-me, plasmar-me, dar-me uma forma nova. A sua escola não se destina a alcançar uma ciência humana, que incha e não liberta. Os seus ensinamentos, as suas sugestões, as suas indicações concretas vêm de Deus e para Deus voltam. O Espírito Santo ensina a verdadeira sabedoria e o conhecimento (Sal 118, 16), ensina a vontade do Pai (Sal 118, 26.64), os seus caminhos (Sal 24, 4), os seus mandamentos (Sal 118, 124.135) que fazem viver. Ele é o Mestre capaz de me guiar para a verdade plena (Jo 16, 13), que me faz livre no mais fundo de mim mesmo, até onde se divide a alma e o espírito, onde somente Ele, que é Deus, pode levar a vida e a ressurreição. É humilde, como Deus, e abaixa-se, desce da sua cátedra e vem para dentro de mim (cf. Act 1, 8; 10, 44), entrega-se a mim, de modo pleno; Ele não tem ciúmes do seu dom, da sua luz, mas oferece-a sem medida. 6/6