SOCIEDADE & AMBIENTE
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A perereca do presidente
A nossa cultura é formada
também pelos
valores que cultivamos, defendemos e cultuamos. Os valores
se definem através de nossas
atitudes e de nossas palavras.
As palavras ditas, verbais ou escritas, com muita sutileza, frequentemente e normalmente,
manifestam nossa ideologia, ou
com muita simplicidade, um
pouco de nossa cultura.
Em um artigo do jornal
Zero Hora do dia 18 de abril de
2013, há na capa uma matéria
com a manchete "O sapo que
parou a usina - espécie rara de
anfíbio descoberta em Arvorezinha atrapalha obras de hidrelétrica". No interior do jornal, a
matéria continua: "Sapo no
caminho - animal raro emperra construção de usina". Mais
adiante coloca que "um animal
que cabe na palma da mão de
uma criança ameaça a construção de uma hidrelétrica". A
matéria ainda cita um outro
fato parecido no Rio Grande do
Sul, ocorrido próximo a obra de
construção de um túnel na duplicação da BR 101 em 2010,
quando a obra ficou paralisada
por seis meses, pois foi identificado por ambientalistas a presença de outro anfíbio em extinção
nas proximidades, o sapo-narigudo-de-barriga-vermelha. O Presidente da República na época, Luiz
Inácio Lula da Silva, em visita ao
Estado, debochou, dizendo "que
o país não pode ficar a serviço de
uma perereca. Nós sabemos a
importância da perereca, mas não
pode parar a obra".
Afora seu tom irônico e ridicularizante, a matéria mostra
sua ideologia ao usar os termos
"atrapalha, emperra, ameaça".
A natureza, com toda sua complexidade de relações, suas teias e cadeias alimentares e ciclos
biogeoquímicos, envolvidos em
permanente trocas de energia,
simbolizada pela figura do minúsculo sapo, "atrapalha, emperra
e ameaça" o progresso, deixando investimento de milhões parados. Como se dinheiro tivesse
alguma relação com natureza.
Como se milhões de reais em
uma mala tivessem algum valor
em uma ilha deserta. O sapo é
tratado como uma terrível ameaça, um "demônio", com seus
"demoninhos" ambientalistas.
O presidente da república,
em seu discurso, deu o recado
dos "representantes do progresso". A ideologia do progresso sem limites não "suporta" a natureza, porque não a
entende, não consegue compreender sua importância, desde a manutenção da vida até
os alicerces de equilíbrio climático. Não consegue entender
que estes sapos e pererecas
representam uma biodiversidade de cadeias e teias alimentares extremamente interligadas
e conectadas, que mantém um
equilíbrio alimentar e energético. Sua pouca sensibilidade não
consegue entender que a terra
é um organismo vivo, nosso planeta gaia, que vem, há 4 bilhões
de anos se transformando, e
que há somente 200 mil anos
conhece a espécie humana.
Os defensores do progresso
agem como pedreiros que querem fazer as paredes da casa,
utilizando os tijolos da fundação,
sem saber que sem os tijolos da
fundação a casa vai cair. Agem
como seres donos deste planeta e única espécie importante,
onde as outras só "atrapalham,
emperram e ameaçam."
Diego da Silva Coimbra
Associado da AIPAN
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2013 / COIMBRA, Diego da Silva A perereca do presidente