○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○○ ○○ ○○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Vinte anos dos documentos PVM e DEIM Uma Igreja que tem coragem de definir sua identidade A Church that is bold enough to define its identity Stanley da Silva Moraes Mestre em Ciências da Religião Secretário-executivo nacional de Educação da Igreja Metodista R e s u m o O processo de formação da identidade da Igreja Metodista no Brasil é analisado neste artigo, que procura resgatar as origens de documentos como o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja Metodista” (PVM) e as “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” (DEIM), entre outros. Nele são estudadas as ênfases e ações que foram sendo assumidas pela Igreja ao longo dos últimos 20 anos, dentre elas o “Movimento Dons e Ministérios” e questiona-se como seria possível dar unidade à ação educativa da Igreja – dividida em educação cristã, teológica e secular –, alcançando os objetivos propostos no PVM e nas DEIM. Unitermos: Concílios Gerais, Igreja “movimento”, identidade, Dons e Ministérios. Synopsis The process of identity formation of the Methodist Church in Brazil is analyzed in the present article that seeks to recover the origins of documents such as the “Plan for the Life and Mission of the Methodist Church” (PVM) and “Guidelines for Education in the Methodist Church” (DEIM), besides others. It studies those emphasis and actions that were assumed by the Church during the last 20 years, the “Gifts and Ministries Movement” being among them. It also questions how it would be possible to bring unity to the Church’s educational action – divided into Christian, Theological and secular education – thus reaching the aims proposed in PVM and DEIMs. Terms: General Councils, “Movement” Church, identity, Gifts and Ministries. Resumen El proceso de formación de la identidad de la Iglesia Metodista en Brasil se analiza en este artículo, que busca rescatar los orígenes de documentos como “Plan para la Vida y la Misión de la Iglesia Metodista( (PVM) y “Directrices para la Educación en la Iglesia Metodista” (DEIM), entre otros. En él, se estudian los énfasis y acciones que se fueron asumiendo por la Iglesia a lo largo de los últimos 20 años, entre los cuales el “Movimiento Dones y Ministerios”, y se cuestiona sobre cómo sería posible dar unidad a la acción educativa de la Iglesia –dividida en educación cristiana, teológica y secular, para lograr los objetivos propuestos en el PVM y en las DEIM. Términos: Concilios Generales, Iglesia “movimiento”, identidad, Dones y Ministerios. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 45 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ I. Introdução E ○ ○ ○ m primeiro lugar quero agradecer ao COGEIME pela oportunidade de compartilhar esta reflexão. Em verdade preparei três estudos para o 35º Concílio Regional da 5 a. Região Eclesiástica que, a pedido do COGEIME, no contexto da revisão das “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” (DEIM), agora transformo em um texto de reflexão para a Revista do COGEIME. Naquele momento (janeiro de 2002) estávamos dentro das comemorações do 20º aniversário do “Plano para a Vida e a Missão da Igreja Metodista” (PVM), o documento marco do Metodismo brasileiro contemporâneo. Certamente há pessoas muito mais bem preparadas do que eu para realizar esta reflexão. Todavia, cumprindo a missão que me foi conferida, compartilharei algumas idéias que, espero, sejam úteis para a continuidade de nossa caminhada. II. Retrospectiva histórica do “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” PVM: o documento marco do Metodismo brasileiro contemporâneo Como a Igreja Metodista “do Brasil” se move nesse contexto da ditadura militar? Retrospectiva histórica do Metodismo brasileiro As décadas de 1960 e 1970 foram centrais no estabelecimento da identidade do povo metodista brasileiro. Quem fez parte deste período histórico tem em sua vida marcas que o/a ajudam a entender melhor a identidade do Metodismo brasileiro de hoje. Até a década de 1960, o Metodismo brasileiro era uma seqüência do Metodismo norte-americano. O próprio nome da Igreja, estabelecido em 1 Até a década de 1960, o Metodismo brasileiro era uma seqüência do Metodismo norteamericano ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ sua constituição, já revelava isso. Os Cânones de 1965 dizem: “A Igreja Metodista do Brasil e a Igreja Metodista mantêm, como elo de ligação entre si, um Conselho Central...” 1 . Aqui fica claro que Igreja Metodista é a igreja dos Estados Unidos, que tem no Brasil uma continuadora. A constituição da Igreja do Brasil estabelece com clareza limites para seu Concílio Geral, a fim de que não se afaste das normas estabelecidas pela “Igreja Metodista”. Nesse período histórico, o Brasil vive o período da ditadura militar, com alguns de seus momentos de maior repressão. Os movimentos populares são desmantelados pela ditadura, que conta com o apoio dos Estados Unidos da América. A política nacional concentra poder em mãos do presidente, dos governadores e prefeitos interventores. Assim, o Estado busca interferir em todos os segmentos da vida nacional, enquanto os movimentos sociais resistem. Como a Igreja Metodista “do Brasil” se move nesse contexto da ditadura militar? Entendo que ela se move trazendo para dentro de si os conflitos da sociedade. Por um lado, ela concentra o poder nas mãos de alguns poucos e, por outro, ela busca ser uma Igreja-comunidade. Por um lado, ela mais se submete às normas e orientações da “Igreja Metodista” (dos Estados Unidos da América) e, por outro, ela busca ser uma Igreja que assume sua identidade nacional, não mais submissa mas parceira. O ambiente na Igreja é de enormes tensões, com posições fortes numa e noutra direção. No contexto da “resistência”, as origens in- Igreja Metodista. Cânones da Igreja Metodista, 1965, p. 17. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 46 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ glesas do Metodismo são buscadas, e se estabelecem novas tensões quanto às raízes do Metodismo. É com esse ambiente de grande tensão que a Igreja chega ao Concílio Geral Extraordinário de 1968, quando se confirma o fechamento da Faculdade de Teologia. Aqueles que apoiaram a decisão pensam com isso ter “sepultado” a Igreja-comunidade, a Igreja que busca sua própria identidade nacional. Todavia, o que acontece após esse Concílio mostra que a Igreja, sob a unção do Espírito Santo, estava com os seus olhos voltados para outro lado. Os delegados e delegadas eleitos para o Concílio seguinte têm uma postura mais semelhante às propostas que foram derrotadas no Concílio Extraordinário de 1968. O 10 o. Concílio Geral de 1970 e 1971 marca o momento radical da sua definição organizacional. Nesse concílio, a Igreja muda seu nome a passa a se chamar de “Igreja Metodista”. Nessa mudança, ela afirma concretamente ser parte do Metodismo universal, com direito de estabelecer seus paradigmas, em comunhão com o Metodismo universal. Nesse concílio, ela modifica sua constituição, dando a si mesma uma nova mobilidade. Nele, ela suprime a existência do Conselho Central, órgão paritário de brasileiros e norte-americanos. Nele ela suprime as Juntas Gerais e estabelece secretários/as executivos/as nacionais para as áreas de ação. Nele, ela cria o Conselho Geral, composto de presbíteros e leigos, como órgão maior de sua administração. Eu diria que aqui se 2 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ completa o período do estabelecimento da autonomia. Passado esse Concílio, com todas as suas decisões, inicia-se o período no qual a Igreja vai tecer os elementos constitutivos de sua identidade em âmbito nacional e suas conexões com o Metodismo universal. Esse foi um período de muitos conflitos na vida da Igreja, pois mesmo que ela tivesse se definido como uma “Igreja-comunidade”, nela mesma e na sociedade ainda existiam muitas pessoas que acreditavam numa Igreja em que as decisões viessem de cima para baixo. Como sair desse impasse? O Conselho Geral e o Colégio Episcopal começaram a desenvolver um programa para estabelecer os eixos básicos do programa nacional (a identidade da Igreja). Esse processo gerou o primeiro Plano Quadrienal, que foi aprovado pelo 11 o. Concílio Geral (1974). O tema definido foi “Missão e Ministério”. Com a definição do tema, a Igreja passou a trabalhar o conceito de “missão”. Definiu assim: “O propósito de Deus é libertar o ser humano de todas as coisas que o escravizam, concedendo-lhe uma nova vida à imagem de Jesus Cristo, através da ação e poder do Espírito Santo, a fim de que, como Igreja, constitua neste mundo e neste momento histórico, sinais concretos do Reino de Deus. A missão da Igreja é participar da ação de Deus neste seu propósito”2 . Com o conceito estabelecido, o documento explicita o mesmo em relação ao Deus trino, à Igreja, à salvação, à segurança pessoal, ao testemunho, ao mundo, aos meios (de comunicação) e ao Reino de Deus. Um período de muitos conflitos na vida da Igreja O 10o. Concílio Geral: aqui se completa o período do estabelecimento da autonomia A Igreja passou a trabalhar o conceito de “missão” Idem. Plano Quadrienal 1975-1978, 1974, p. 9. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 47 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 4 5 6 ○ ○ ○ ○ ○ ○ No final do quadriênio a Igreja deveria ter 100 mil membros. Em seqüência, esse documento explicita os fundamentos doutrinais da Igreja e parte para a definição do “ministério da Igreja”. Ele diz: “A Igreja Metodista reconhece que todos os seus membros, pelo fato de pertencerem ao povo de Deus, são ministros do evangelho. Isto é, são chamados por Deus, preparados pela Igreja para, sob a ação do Espírito Santo, cumprirem a Missão, testemunhando a nova vida e servindo em todas as áreas da existência”3. Com esse conceito, o documento vai trabalhar a especificidade do ministério diaconal e pastoral, para então entrar na nova organização da Igreja, com suas áreas de ação. O estabelecimento e o desenvolvimento desse plano de ação enfrentaram reações na comunidade metodista, mas o que mais se fez presente foi uma nova esperança no povo metodista brasileiro. Assim, o Concílio Geral seguinte, realizado em 1978, ocorreu num clima de uma certa euforia. Esse foi o primeiro Concílio que iniciou com o estudo e aprovação do Plano Quadrienal, para só depois tratar da legislação, já à luz do Plano aprovado. Na Igreja estava presente a visão de que ela tinha encontrado seu caminho, e de que os frutos “agora” começariam a aparecer. Com esse clima, o Concílio estabeleceu como tema “Unidos pelo Espírito, Metodistas Evangelizam”, que veio acompanhado do objetivo geral do plano: “Orientar o povo metodista na sua vivência cristã, sob a dinâmica do Espírito Santo que em unidade, crescimento e serviço, promove a evangelização, em meio à realidade concreta do mundo”. E ele 3 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ teve também a meta de que no final do quadriênio a Igreja deveria ter 100 mil membros. O quadriênio que se seguiu colocou a Igreja dentro de novos impasses. O grande esforço de evangelização não conseguiu levar a Igreja a crescer. A unidade alcançada nos documentos e colegiados maiores não conseguiu mover a base da Igreja. Tornou-se evidente a existência de problemas ainda não superados. Isto levou o Colégio Episcopal e o Conselho Geral a chamarem para 1981 uma grande consulta nacional sobre a Vida e Missão da Igreja. É essa consulta que gerará o documento “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”. O documento vai trabalhar a especificidade do ministério diaconal e pastoral Geração do “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” O Concílio Geral realizado em 1978 ocorreu num clima de uma certa euforia A Igreja reunida em consulta nacional em 1981 colocou sobre a mesa algumas questões básicas: - “O metodismo brasileiro está saindo da profunda crise de identidade que abalou nossa Igreja na primeira metade da década de sessenta.”4 - “A Igreja necessita de um plano geral, que inspire sua vida e programação, e que não será dentro do curto espaço de um quadriênio que corrigiremos os antigos vícios que nos impedem de caminhar.” 5 - A consulta Vida e Missão propõe ao Concílio “não mais um programa de ação para o quadriênio, mas linhas gerais que deverão orientar toda a ação da Igreja nos próximos anos, enquanto necessário, devendo ser avaliado periodicamente” 6 . Idem. Plano Quadrienal 1975-1978, 1974, p. 16. Idem. “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, ANO, p. 9. Idem, ibidem, p. 9. Idem, ibidem, p. 9. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 48 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ O documento que é encaminhado ao 13 o. Concílio Geral, composto pelo “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” (PVM), pelo “Plano para as Áreas de Vida e Trabalho” e pelas “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” (DEIM), vai com essas premissas. Recebido pelo Concílio, ele é debatido calorosamente para, finalmente, ser aprovado com o voto favorável da grande maioria dos conciliares. Ele é aprovado dentro das premissas estabelecidas pela consulta Vida e Missão, e entra para os Cânones da Igreja em sua parte geral. Torna-se, assim, um documento normativo para a Igreja. Ele é aprovado como documento orientador de todo programa de ação da Igreja a ser estabelecido para os anos seguintes. A premissa estabelecida no primeiro Plano Quadrienal de que tudo na Igreja se oriente para a missão é confirmada, e “a Igreja deverá experimentar de modo cada vez mais claro que sua principal tarefa é repartir fora dos limites do templo o que de graça ela recebe do seu Senhor”7 . Agora, a Igreja tem um documento com diretrizes gerais que ultrapassam os programas quadrienais ou qüinqüenais. São diretrizes aprovadas para existire até o momento que a Igreja, por meio de um processo avaliativo, considere necessário revisá-las. O documento, que é gerado em íntima conexão com os dois Planos Quadrienais anteriores, convida a Igreja a uma prática de santificação tipicamente wesleyana, pelo que se impõe revisar suas práticas de piedade pessoal e atos de misericórdia. 7 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Dons e Ministérios A Igreja constata possuir uma estrutura organizacional pesada, A premissa de que tudo na Igreja se oriente para a missão é confirmada O 14o. Concílio Geral aprovará uma estrutura organizacional com maior flexibilidade e mobilidade Desencadeando esse processo de revisão da vida da Igreja à luz do PVM aprovado, a Igreja constata possuir uma estrutura organizacional pesada, de mobilidade muito restrita, que não responde ao novo modo de ser Igreja estabelecido no novo Plano. A vida e missão da igreja não encontra respaldo em sua estrutura organizacional, com cargos pré-estabelecidos, que precisam ser preenchidos independentemente da vocação das pessoas e das necessidades do “mundo” onde a Igreja tem de cumprir a missão. Esse fato acaba gerando um novo momento de profunda tensão dentro da Igreja, pois agora ela já definiu sua missão, sua identidade está explicitada, mas ela não tem os instrumentos adequados para cumpri-las. Sua estrutura organizacional impede sua ação. A Igreja já definiu um novo modo de ser Igreja, mas ainda não está reorganizada. É nesse contexto que, durante o qüinqüênio 1983-1987, vai ser gerado o “Movimento Dons e Ministérios”, que orientará a nova forma organizacional que a Igreja estabelecerá para desenvolver as diretrizes estabelecidas no PVM. O 14o. Concílio Geral aprovará uma estrutura organizacional com maior flexibilidade e mobilidade para com ele desenvolver suas diretrizes, tornando-se uma Igreja missionária relevante para a realidade brasileira. O “Movimento Dons e Ministérios” nasce com as riquezas do “novo” e com a fragilidade de uma Igreja que desaprendeu ser “movimento”. O Metodismo nasceu na Inglaterra como um movimento, mas acabou se institucionalizando, assumindo for- Idem, ibidem, p. 10. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 49 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ mas tão rígidas a ponto de limitar todo movimento dentro de si. Agora a Igreja decide manter sua institucionalidade, mas assumindo os riscos de um movimento. Conclusão O PVM tem em cada período eclesiástico nacional um Plano de Ação, no qual se estabelecem as prioridades daquele período. O PVM é sempre o referencial primeiro. O “Movimento Dons e Ministérios” vai recebendo a cada período novas orientações, que buscam levar a Igreja a uma experiência de unidade, em que cada ministério tem sua especificidade e se soma aos demais – unidade e diversidade. Na própria caminhada vão se fazendo as necessárias correções. O PVM tem em cada período eclesiástico nacional um Plano de Ação II. O “Plano para Vida e a Missão da Igreja” e as “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ bates. Por isso, em sua formulação final ele pôde ser aprovado com voto favorável da grande maioria dos membros do Concílio Geral, sem deixar de ter afirmações que sofrem forte contestação. Todavia, sua redação não deixa dúvidas quanto aos seus objetivos. Quero agora fazer uma abordagem do que é o documento em si mesmo. No próximo trecho desejo verificar a sua presença na vida da Igreja nesses seus 20 anos de existência, com ênfase na questão dos agentes da missão. Quero afirmar de antemão que a Igreja Metodista passou por profundas transformações após sua aprovação. Faço isso buscando comunicar dados que sejam acessíveis àqueles/as que não participaram de sua formulação e nem têm gastado muito tempo estudando-o, não ignorando que há muitos irmãos e irmãs que participaram de todo o processo de preparo, implementação e avaliação do PVM até aqui. Busco somar com eles e elas. “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” Depois de termos visto o contexto histórico dentro do qual nasce o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, agora queremos buscar os eixos centrais desse documento que estabelece a identidade da comunidade metodista brasileira. Tenho presente que ele foi um documento gerado num momento específico da vida da Igreja, pelo que tomou forma trazendo o que de melhor aquele momento soube produzir, sem deixar também de refletir as limitações do mesmo. Como documento que estabelece o básico da identidade metodista, o PVM reflete os acordos alcançados em meio a grandes de- Revista de Educação do Cogeime ○ Para não empobrecermos nossa abordagem do PVM, de início trazemos à memória que o que chamamos de PVM é, na verdade, um conjunto de quatro documentos, todos dependentes do primeiro, mas com algum grau de autonomia. Eles é que completam 20 anos. São eles: 1. “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” 2. “Plano para as Áreas de Vida e Trabalho” 3. “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” 4. “Plano Diretor Missionário da Igreja Metodista” O PVM reflete os acordos alcançados em meio a grandes debates ○ ○ ○ 50 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ O primeiro documento é o principal, e todos os demais surgem orientados por ele. O segundo documento nasceu junto com o PVM, estabelecendo diretrizes para as áreas de ação da Igreja a partir dele, na forma organizacional da Igreja proposta para aquele primeiro período (19831987). O terceiro e o quarto documentos surgiram em paralelo, e foram iluminados pelo PVM. No processo de geração dos documentos, há aspectos que foram dos dois últimos para o primeiro, mas via de regra é do primeiro que foram as diretrizes para os demais. Uma vez prontos os documentos, o PVM é sempre base para os demais, bem como para todo o programa da Igreja, em todos os seus níveis. O PVM nasce numa Igreja que faz uma autocrítica de sua vida e missão e busca encontrar a sua razão de ser na sociedade brasileira e no mundo contemporâneos; uma Igreja que não quer se considerar nem superior nem inferior a qualquer outra denominação, mas quer, sim, ter clara qual é a sua vocação específica; uma Igreja que não quer imitar outras denominações nem se colocar como oposta a elas; uma Igreja que quer corresponder à sua vocação específica. Assim, por exemplo, ele afirma: “A missão acontece quando a Igreja sai de si mesma, envolve-se com a comunidade e se torna instrumento da novidade do Reino de Deus”8. Em sua autocrítica, ela constata que sua vida comunitária ainda é muito voltada para si mesma. Por isso, o PVM também afirma: “A Igreja deverá ex- ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ O PVM é o documento principal, e todos os demais surgem orientados por ele O PVM explicita os elementos básicos constitutivos da “vida” da Igreja Metodista ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ perimentar de modo cada vez mais claro que sua principal tarefa é repartir fora dos limites do templo o que ela de graça recebe do seu Senhor. Por isso estamos sendo convidados ao desafio tipicamente wesleyano da santificação” 9. Noutro momento, o documento faz estas outras afirmações: “Levando em conta o evangelho e sua influência sobre todos os aspectos da vida, a ação educativa metodista trouxe muitas contribuições positivas. Por meio especialmente da igreja local, muitas pessoas foram convertidas e transformadas, modificando sua vidas e seu modo de agir... A ação educativa da Igreja, entretanto, deu muito maior valor às atitudes individualistas em relação à sociedade... Em razão de suas limitações históricas e culturais a ação educativa metodista tornou-se prejudicada em dois pontos importantes: primeiro porque não se identificou plenamente com a cultura brasileira; segundo por ter apresentado pouca preocupação em descobrir soluções em profundidade para os problemas dos pobres e desvalidos, que são a maioria de nosso povo.” 10 O PVM explicita os elementos básicos constitutivos da “vida” da Igreja Metodista, conectando esses elementos à “missão” da Igreja. Nele, fica muito claro que vida e missão são aspectos que nunca podem se separar. “Devemos continuar o processo que permitirá que tudo na Igreja se oriente para a Missão ” 11, qual seja, que a vida da igreja esteja a serviço da missão, e que a vida abundante 8 Idem, ibidem, p. 17. Idem, ibidem, p. 10. 10 Idem, ibidem, p. 41 e 42. 11 Idem, ibidem, p. 10. 9 Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 51 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ alcance todos. O documento nasce na Igreja, corpo de Cristo, definindo as áreas prioritárias de sua vida e missão. Por isso, em sua apresentação, afirma: “A adoção deste plano nos levará necessariamente ao crescimento em todas as dimensões de nossa vida de serviço e culto... Movidos por essa esperança apresentamos à Igreja o plano que Deus nos inspirou nestes últimos anos de estudo, tentativas concretas de mudança e reexame de nossa tradição” 12. O PVM vem dividido em oito partes, contendo a essência da doutrina, os fundamentos da missão, a leitura da realidade, as áreas nas quais prioritariamente a Igreja Metodista deve agir, o que se espera alcançar, o que tem de animar a Igreja. Sendo um documento escrito a muitas mãos, que passou por um processo de sistematização, sua riqueza maior não está em sua forma, mas no seu conteúdo, do qual considero importante destacar: • - - - 12 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Sendo um documento escrito a muitas mãos, sua riqueza maior não está em sua forma, mas no seu conteúdo Os elementos fundamentais da unidade metodista, trazidos de nossa herança wesleyana, são: Está baseado nas Sagradas Escrituras; Aceita completa e total das doutrinas fundamentais da fé cristã promulgadas nos Concílios da Igreja dos quatro primeiros séculos; A vida cristã comunitária e pessoal deve ser expressão verdadeira da experiência pessoal do crente com Jesus Cristo; O poder do Espírito Santo é fundamental para a vida da comunidade de fé, tanto na piedade pessoal como no testemunho social; Somos parte da igreja universal de Jesus Cristo ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ - Somente sob a orientação do Espírito Santo a Igreja se transforma em meio de graça para atender às necessidades do mundo; - O crescimento em santidade exige vida de disciplina pessoal e comunitária; - A santificação se concretiza tanto em atos de piedade (participar da ceia do Senhor, leitura devocional da Bíblia, prática da oração e jejum, participação nos cultos) como em atos de misericórdia (solidariedade ativa junto aos pobres, necessitados e marginalizados sociais); - A paixão evangelística leva os metodistas a anunciar, da maneira mais abrangente e persuasiva possível, Cristo como Senhor e Salvador; - Demonstração de permanente compromisso com o bem-estar da pessoa total, não só espiritual, mas também em seus aspectos sociais; - Todo povo de Deus é chamado a desempenhar um ministério na Igreja e no mundo, atendendo a necessidades do momento histórico em que Deus vocaciona cada um/uma; - O sistema conexional é característica fundamental e básica de sua existência como movimento espiritual e como instituição eclesiástica; - Somos parte da igreja universal de Jesus Cristo. Por isso, o metodista busca caminhos para o estabelecimento da unidade visível da igreja de Cristo; - A vocação do Metodismo é: “reformar a nação, particularmente a Igreja, e espalhar a santidade bíblica sobre toda a Terra”; - A graça divina é o fundamento de toda a revelação e ação histórica de Deus; Idem, ibidem, p. 10. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 52 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ - A fé é uma experiência pessoal e comunitária; - A Igreja é, antes de tudo, um organismo vivo, uma comunidade de Cristo; - Valoriza a prática e a experiência da fé cristã; - O Cristianismo prático tem como fonte de conhecimento de Deus: a natureza, a razão, a tradição, a experiência cristã e a vivência na comunidade da fé, sempre confrontados pelo testemunho bíblico. • - - - - - - ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Cristo, em oposição à morte e a todas as força que a produzem. A fé é uma experiência pessoal e comunitária • Necessidades e oportunidades visualizadas são: Há necessidade de estar em comunhão com Deus; Há necessidade de conhecer a Igreja em tudo que ela é; Há necessidade de conhecer o bairro, a cidade, o campo, o país, o mundo; Há necessidade de apoiar todas as iniciativas que preservem e valorizem a vida humana; Há necessidade de denunciar tudo que oprime e destrói a vida humana; Há necessidade de entender e unir no trabalho, de modo positivo, as igrejas locais, a Igreja e as demais Igrejas cristãs; Há necessidade de entender e superar tensões existentes na Igrejas, para que todos se unam num trabalho participativo na Missão; • A seguir o documento explicita o “como participar na Missão de Deus?”: Produzindo atos de piedade e obras de misericórdia; Cultuando Deus; Aprendendo em comunidade; Trabalhando; Usando ferramentas e métodos adequados; Promovendo a vida. - - Entendendo a vontade de Deus, o PVM afirma: A missão de Deus no mundo é estabelecer o Seu Reino; Participar da construção do Reino de Deus em nosso mundo, pelo Espírito Santo, constitui-se na tarefa evangelizante da Igreja; O Reino de Deus é o alvo do Deus trino e significa o surgimento do novo mundo, da nova vida, do perfeito amor, da justiça plena, da autêntica liberdade e da completa paz; O propósito de Deus é reconciliar consigo mesmo o ser humano; A missão é de Deus – Pai, Filho e Espírito Santo. “Ele trabalha até agora”; Em Jesus, Deus revela sua ação salvadora a favor das pessoas e do mundo; As pessoas, comunidades e instituições sofrem com o domínio das forças satânicas e do pecado, impedindo a vida abundante e contrariando a vontade de Deus; É de Jesus que vem o poder para se participar da construção do futuro que Ele nos oferece já no presente; Neste tempo, fazemos uma escolha clara pela vida, manifesta em Jesus Revista de Educação do Cogeime ○ - - Como participar na Missão de Deus? • Esperança e vitória na Missão de Deus: - Ainda que as forças do mal e da morte lutem para dominar nosso mundo, nossa esperança reside naquele que as venceu, Jesus Cristo. - Perseveramos na caminhada, orando: “Venha o Teu Reino”. ○ ○ ○ 53 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ “Plano para as Áreas de Vida e Trabalho” Já olhando para a Igreja como uma comunidade de dons e ministérios, mas sem ainda ter estabelecido esse modo de ser Igreja, esse documento estabelece diretrizes para sete áreas de vida e trabalho, sendo que a área de educação é subdividida em três (educação cristã, educação teológica e educação secular). Como colocamos no início deste artigo, ao estabelecer o PVM a Igreja tinha ainda uma estrutura que não a permitia ter a mobilidade necessária. Isso, todavia, não a impediu de visualizar uma Igreja trabalhando por áreas. As diretrizes para cada uma das áreas se mantêm nos Cânones até hoje, embora a Igreja denomine essas áreas de ministérios, e não mantenha uma estrutura em que cada uma dessas áreas tenha de existir como ministério. A forma organizacional se modificou, mas os princípios orientadores se mantêm. Aqui já está estabelecida uma Igreja que passa a trabalhar por projetos, na qual as áreas específicas têm de se apoiar mutuamente. Por ele, a Igreja supera tanto uma estrutura rígida préestabelecida, como uma organização espontaneísta, com um espiritualismo indisciplinado. Começam a se estabelecer canais comunicativos para que os projetos de Deus e da Igreja se desenvolvam. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Igreja é conhecida mundo afora pelo seu projeto educacional. No contexto de uma Igreja brasileira que buscou fixar sua identidade e missão, seu projeto educacional passou por uma profunda avaliação objetivando estabelecer as diretrizes que deveriam orientar sua ação educativa nas suas três subáreas de ação. O primeiro Plano Quadrienal coloca sua preocupação quando define: “que se estabeleça uma Filosofia Educacional, segundo os princípios e tradições metodistas, visando a nortear a ação educativa secular da Igreja”13. Ele mesmo enfatiza: “Que uma filosofia cristã de Educação seja o critério efetivo e prático da vida e ação da Escola, através da qual se encontre o meio de fazer da Escola a agência efetiva da missão, em todas as suas áreas de ação” 14. Com essas orientações básicas, o Conselho Geral chamou uma reunião com o Conselho Geral das Instituições Metodistas de Ensino e o Conselho Geral de Educação Teológica a fim de se elaborar um documento para esse fim. Dessa reunião, nasceu a constituição de quatro grupos de trabalho responsáveis por gerar quatro documentos: 1. Bases Bíblico-Teológicas; 2. Fundamentos para o estabelecimento de uma Filosofia da Educação; 3. Política e Objetivos para o sistema educacional metodista brasileiro – área secular; 4. Política para o sistema educacional metodista na área teológica.15 Esse documento estabelece diretrizes para sete áreas de vida e trabalho Fazer da Escola a agência efetiva da missão “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista” O Metodismo historicamente tem na educação uma área muito forte. A 13 AUTOR. “Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos para o Sistema Educacional Metodista”, 1980, página de apresentação. Idem, ibidem, página de apresentação. 15 Idem, ibidem, página de apresentação. 14 Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 54 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Cada um desses quatro grupos gerou uma tese que foi levada a um seminário realizado no Rio de Janeiro. Desse seminário saiu um documento intitulado: “Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos para o Sistema Educacional Metodista”. Esse documento vai ser encaminhado pelo Conselho Geral para um grande debate em toda Igreja, envolvendo as instituições de ensino seculares e as instituições de educação teológica. Esse documento propõe novos fundamentos e diretrizes, por entender que “o processo educacional desenvolvido por meio da Igreja Metodista passou a ser mero reprodutor da educação oficial, esvaziando-se e perdendo sua identidade confessional, desvinculando-se do seu compromisso com o Evangelho de Jesus Cristo”.16 Paralelamente a isso, “a Secretaria Executiva de Educação Cristã do Conselho Geral promovia, a mando deste, a busca de um posicionamento acerca da Educação Cristã”17. “Tendo em vista as colocações alcançadas, o Conselho Geral determinou que elas fossem consideradas quando da revisão final dos ‘Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos para o Sistema Educacional Metodista’”18. Assim, em janeiro de 1982 reuniuse no Rio de Janeiro o Seminário Diretrizes para um Plano Nacional de Educação. Nele foram acolhidas e discutidas as teses, as contribuições dos 5 (cinco) grupos anteriormente constituídos. Constando-se a impossibilidade de, nesse seminário, se dar uma redação final ao documento, se 16 17 18 19 Idem, Igreja Idem, Idem, ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ constituiu um grupo que redigiu as “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista”, entregando seu trabalho ao Conselho Geral, que o encaminhou ao Concílio Geral de 1982, que o aprovou. Assim, o documento foi aprovado em plena conexão com o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, no mesmo Concílio Geral, em momento posterior à aprovação do PVM. As DEIM são um documento que produziu profundas mudanças no sistema metodista de educação. Elas fazem uma análise crítica da ação educativa da Igreja Metodista no Brasil, valorizando as novidades que ela estabeleceu, mas também explicita as limitações que o projeto educacional teve. Para estabelecer as novas diretrizes para o sistema educacional, o documento começa fazendo uma análise da realidade, ilumina-a com a Bíblia, traz à memória elementos da nossa história educacional no Brasil. Com esses pressupostos, as DEIM estabelecem as diretrizes para o que devemos fazer em cada uma das três áreas de ação educativa da Igreja. Nelas, aparece a definição do Sistema de Educação e não mais do Sistema de Ensino. Elas vêm com uma concepção de educação que ultrapassa a visão do mero ensino, e trazem para dentro de si toda uma visão de processo. Do conteúdo das DEIM, considero importante destacar estas afirmações: • “Toda a ação educativa se baseia numa filosofia, isto é, numa visão a respeito do mundo e das pessoas” 19 ; O documento foi aprovado em plena conexão com o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” Em janeiro de 1982 reuniu-se no Rio de Janeiro o Seminário Diretrizes para um Plano Nacional de Educação ibidem, p. 1. Metodista. Cânones da Igreja Metodista, 2002, p.112. ibidem, p. 112. ibidem, p. 118. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 55 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ “Até o momento [1982] nossa ação educativa tem sido influenciada pela filosofia liberal”20; • “A educação na perspectiva cristã é o processo que visa a oferecer à pessoa e à comunidade uma compreensão da vida e da sociedade, comprometida com uma prática libertadora, recriando a vida e a sociedade segundo o modelo de Jesus Cristo e questionando os sistemas de dominação e morte à luz do Reino de Deus”21; • “A Igreja desenvolverá sua prática educativa de tal modo que os indivíduos e grupos: - Desenvolvam consciência crítica da realidade; - Compreendam que o interesse social é mais importante que o individual; - Exercitem a prática da justiça e da solidariedade; - Alcancem sua realização como fruto do esforço comum; - Tomem consciência de que todos têm direito de participar de modo justo dos frutos do trabalho; - Reconheçam que, dentro de uma perspectiva cristã, útil é aquilo que tem valor social” 22. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ • 22 23 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Conclusão A aprovação do conjunto de documentos que formam o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja” fecha um ciclo de sua história, dentro do qual a Igreja estabeleceu os fundamentos de sua vida e missão, com diretrizes que orientarão não só sua prática, mas também sua reestruturação organizacional. O PVM é o marco referencial para tudo que se estabelecerá na Igreja a partir de então. Por isso, não se pode imaginar um metodista que não o compreenda em profundidade e o assuma como seu princípio pessoal e comunitário. Depois da Bíblia, ele é o grande documento do povo metodista brasileiro. O PVM é o marco referencial para tudo que se estabelecerá na Igreja a partir de então IV. A Igreja Metodista a partir do PVM – um novo modo de ser Igreja Como esse documento foi gerado no mesmo contexto, faço uma rápida incursão. Idem, Idem. Idem. Idem, ○ Assim, esse documento estabelece os critérios que devem ser seguidos para que a Igreja estabeleça projeto missionário em algum lugar onde ainda não esteja, a partir dos conceitos do PVM. “Plano Diretor Missionário da Igreja Metodista” 21 ○ “O seu objetivo foi o de estabelecer medidas e diretrizes que visem a ordenar a ação missionária da Igreja, nas áreas onde ainda não há trabalho metodista regular, desde uma perspectiva da Missão, tal como conceituada pelo ‘Plano para a Vida e a Missão da Igreja’.”23 A partir disso, o documento estabelece procedimentos que devem ser desencadeados nas instituições de educação secular e teológica e na educação cristã. 20 ○ Podemos celebrar 20 anos do PVM porque ele se tornou, verdadei- ibidem, p. 118. “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, ANO, p. 45. Cânones da Igreja Metodista, 2002, p. 119. ibidem, p. 129. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 56 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ramente, um marco para o Metodismo brasileiro. A Igreja que, por um processo democrático, em profunda comunhão com Deus, produziu esse documento, vem, desde então, sensível à ação do Espírito Santo, se “reformando” no propósito de ser aquilo que se propôs em seu Plano. Como levar a sério as diretrizes estabelecidas? Como se tornar uma Igreja em que tudo esteja voltado para a missão? Como desafiar todos seus membros a assumirem o seu próprio ministério? Como ser solidária com o povo que sofre? As mudanças começaram a acontecer logo após o Concílio, quando todo o povo metodista começou estudar o PVM, por meio de um programa estabelecido pelo próprio Concílio. O fato de o documento ter sido introduzido nos Cânones da Igreja deu a ele a relevância institucional que precisava ter, e aqueles que tinham posição contrária a ele tiveram de reformular sua postura e assimilá-lo com o “seu” documento maior. Até o PVM, os Cânones tinham documentos da raiz wesleyana, o credo social e a legislação da Igreja. A partir de então, os Cânones se tornaram um documento muito mais relevante, porque passaram a ter as definições maiores sobre a vida e missão da Igreja. Com isso, a unidade da Igreja Metodista passou a ser buscada não na sua forma (uniformidade às vezes confundida com unidade), mas no seu conteúdo (unidade com diversidade). Nisso, também, a Igreja passou a ter muito mais dificuldade para alcançar sua unidade, porque agora não era mais uma questão formal, mas algo que tinha a ver com a interioridade. O Concílio passou a ter um novo significado na vida da Igreja, em toRevista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Como se tornar uma Igreja em que tudo esteja voltado para a missão? A Igreja passa a buscar em seus Concílios meios para atender aos desafios da missão ○ ○ ○ 57 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ dos os níveis. Os Concílios Gerais, com base no PVM, passaram a aprovar o Planejamento Nacional, que depois, num processo de amadurecimento, se tornou Plano Nacional. Os Concílios passaram a ter uma agenda de movimento, em que o institucional está a serviço da missão, qual seja, começam com a avaliação e daí partem para a aprovação do Planejamento/Plano Nacional. O Planejamento/Plano é feito com base no PVM. Só depois de aprovado esse documento básico é que o Concílio passa a trabalhar com a legislação, eleições e estrutura da Igreja. Essa mudança demonstra a decisão da Igreja de ser um movimento missionário e não uma organização que tenha fim em si mesma. Antes que manter a estrutura, a Igreja passa a buscar em seus Concílios meios para atender aos desafios da missão. A estrutura agora tem de ser pensada a partir dos eixos missionários aprovados. Com isso, a unidade na missão fica garantida no fundamento. Agora, a nova questão que surge é: como alcançar a unidade na missão? Essa questão acabou colocando a Igreja diante de um grande impasse. No que consistia esse impasse? Ela até então estava organizada uniformemente, com cargos que se repetiam em todas as igrejas locais, Distritos, Regiões, Área Geral. Os cargos não dependiam nem das necessidades missionárias atuais, nem dos dons das pessoas pertencentes às comunidades. Eles existiam e tinham de ser preenchidos e as atividades previstas para quem exercesse aquele cargo tinham de ser cumpridas. A organização da Igreja era uniforme, enquanto o Plano Nacional propunha uma Igreja “moviAno 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ mento” com “ministérios” que se organizassem a partir das necessidades presentes da missão. Foi nesse contexto que começou a ser gerado o “Movimento Dons e Ministérios”, um movimento com raízes wesleyanas. Esse modo de ser Igreja atenderia às necessidades da nova Igreja Metodista? Para atender a essas necessidades, que fundamentos ele deveria ter? Como a Igreja se organizaria tendo nesse movimento o seu novo modo de ser Igreja? Que relação teria ele (movimento) com cargos existentes na vida da Igreja? Qual seria o lugar do/a pastor/a na Igreja de Dons e Ministérios? Como se relacionaria o “institucional” com o “movimento”? Num primeiro momento, em cada lugar se criaram diferentes ministérios e a conexionalidade da Igreja ficou profundamente prejudicada. Mas essas experiências é que foram ajudando a Igreja a discernir o seu novo modo de ser Igreja. Isso levou a Igreja a compreender que os ministérios deveriam existir na esfera local, pois ali as pessoas devem ser desafiadas a partir da realidade. A resposta ao chamado de Deus e da Igreja é muito mais possível de acontecer, pois as necessidades são visíveis e as pessoas estão ali mesmo. Nas esferas regional e nacional, em que as pessoas não vivem nessa realidade, por outro lado, elas têm de ser chamadas e desafiadas de outra forma. Essas pessoas também têm de exercer um ministério, mas vão fazê-lo em outra forma organizacional. Via de regra, nas esferas regional ou nacional não existem os ministérios, e sim as coordenações. Assim, no primeiro quadriênio do “Movimento Dons e Ministérios”, a Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Como se relacionaria o “institucional” com o “movimento”? A Igreja definiu como essenciais: ação docente, ação social, expansão missionária, ação administrativa, trabalho com crianças e acrescentou escola dominical ○ ○ ○ 58 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Igreja tem apenas um/a secretário/a geral que encaminha as decisões do Colégio Episcopal e coordena diferentes programas na Área Nacional. No segundo período, que é de um sexênio, se começa da mesma forma, mas já está evidente que a Igreja precisa de executivos para a Área Nacional e Regional. Em 1993, se criam as Coordenações Nacionais de Ação Missionária, Ação Administrativa e Ação Docente. Aí, as atribuições da Área Nacional começam a ter atendimento, e tomam nova força na vida da Igreja. Surge a coleção Vida e Missão, que vai suprindo as necessidades doutrinárias da Igreja. Na Igreja que também é movimento, outra questão que se tornou aguda foi: como estabelecer a conexão entre os diferentes ministérios? A caminhada também foi clareando algumas decisões que precisaram ser tomadas. Enumero algumas delas: 1. Ficou claro que alguns ministérios são da essência do ser metodista. Estes têm de ser definidos pela Igreja Nacional e precisam estar em todas as igrejas locais. - A Igreja definiu como essenciais: ação docente (agora educação), ação social, expansão missionária, ação administrativa, trabalho com crianças e, no último Concílio Geral, acrescentou escola dominical. 2. Há competências que são específicas de cada um dos níveis da vida da Igreja. Assim, a Igreja precisa ter um fluxo que permita uma comunicação fácil, que flua da igreja local e Igreja Nacional. 3. Há ministérios que são específicos de um determinado local, e que devem ser estabelecidos à luz do PVM. Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 4. O Ministério Pastoral tem a missão de coordenar todos os ministérios. 5. Cabe à Igreja capacitar os vocacionados para o exercício de dons e ministérios. O PVM e as DEIM estabeleceram a área de educação como composta de três subáreas (educação cristã, educação teológica e educação secular). O sistema metodista de educação passa a ser composto por essas três subáreas. Como dar unidade à ação educativa da Igreja, alcançando os objetivos propostos nos documentos? Essa questão inquietou profundamente a Igreja. Encaminhando essa questão, o Concílio Geral de 1997 criou o Sistema Metodista de Educação, integrando as três subáreas. Pela forma como foi criado o sistema, ele teve dificuldades para cumprir com sua missão. O grande bem que a decisão trouxe foi que ela levou as três subáreas a se reunirem sistematicamente, conhecendo-se, aproximandose, conectando-se melhor. Isso levou à realização de um Fórum Nacional de Educação Teológica, um Fórum Nacional de Educação, um Congresso Nacional de Escolas Dominicais, no último quadriênio. Desses eventos nasceram propostas que, encaminhadas e aprovadas pelo último Concílio Geral, estabelecem uma nova gestão para a educação metodista no Brasil. Neste momento acontece a implementação dessas decisões. Ao toma-las, a Igreja está se instrumentalizando para que os objetivos estabelecidos no PVM possam ser alcançados. Entre essas decisões, pode-se destacar: - Implementação da Coordenação Nacional de Educação Cristã; Revista de Educação do Cogeime Como dar unidade à ação educativa da Igreja, alcançando os objetivos propostos nos documentos? Nasceram propostas que estabelecem uma nova gestão para a educação metodista no Brasil ○ ○ ○ 59 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ - Transformação da Coordenação Nacional de Ação Docente em Coordenação Nacional de Educação; - Integração da Coordenação do Sistema Metodista de Educação à Coordenação Nacional de Educação; - Transformação da Coordenação Regional de Ação Docente em Coordenação Regional de Educação Cristã; - Mudança do nome dos coordenadores das áreas para secretários executivos das áreas de ação; - Criação dos Departamentos Nacional e Regional de Escola Dominical; - Estabelecimento da escola dominical como um ministério local; - Estabelecimento da obrigatoriedade do uso das revistas produzidas pelo Departamento Nacional de Escola Dominical em todas escolas dominicais; - Determinação de que todas as congregações e pontos missionários possuam escola dominical; - Estabelecimento de um processo para criação da Universidade Metodista do Brasil; - Transformação do COGEIME num órgão de gestão das instituições metodistas de educação; - Estabelecimento de uma nova estrutura para o COGEIME; - Definição de que cada subárea de educação deva ser parte das outras subáreas, garantindo-se, assim, a conexão do sistema; - Passagem para a jurisdição nacional de todas as instituições que ofereçam educação superior; - Criação de um cadastro de metodistas que possam ser aproveitados na área educacional da Igreja; - Estabelecimento de um programa de formação para pessoas que posAno 12 - n 0 23 - dezembro / 2003 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ sam vir a ser membros de conselhos diretores e fiscais das instituições metodistas de educação. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Jesus Cristo. Por isso, já podemos dialogar entre nós, com as demais comunidades cristãs, com os demais segmentos religiosos, com o mundo dentro do qual existimos. Acredito que temos, hoje, as melhores condições para poder voltar ao documento “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista”, revisitando-o, estabelecendo um processo de atualização do mesmo. O PVM é nosso documento fundamental. As DEIM nascem dele, mas têm de responder também aos novos desafios deste tempo. Como Igreja-movimento, neste momento experimentamos processos que nos ajudam a avançar na direção proposta, nos levam a avaliar sistematicamente o que somos e fazemos, nos ajudam a visualizar novos desafios, nos desafiam a revisar nossos fundamentos e práticas. Somos uma Igreja com identidade própria, que se sente parte do movimento metodista mundial e da Igreja de ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Referências bibliográficas IGREJA METODISTA. Cânones da Igreja Metodista Metodista. São Paulo: Igreja Metodista, 1965. (Cânones de 1965) __________________. Cânones da Igreja Metodista Metodista. São Paulo: Igreja Metodista, 2002. __________________. Plano Quadrienal 1975-1978 1975-1978, São Paulo: Imprensa Metodista, 1974. Plano para a Vida e Missão da Igreja, 3ª edição. Fundamentos, Diretrizes, Políticas e Objetivos para o Sistema Educacional Metodista, Conselho Geral, 1980. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 60 ○ ○ ○ Ano 12 - n 0 23 - dezembro / 2003