JOGOS DIGITAIS: UMA ALTERNATIVA DE APRENDIZAGEM?
Parece consenso dizer que criança gosta de brincar, jogar, fantasiar... Mas
será que isso se dá apenas pelo prazer e diversão despertados? Não. Há na criança
uma necessidade de brincar, jogar e fantasiar – é daí que a imaginação e o ato
criador derivam. Mas a realidade por ela vivida não alimenta sua imaginação e seu
ato criador? Sim, mas não é fonte única, pois as crianças, nas brincadeiras, não
somente repetem seu cotidiano, como também podem reinventá-lo de acordo com
seus anseios. Brincando e jogando, crianças podem dar significação às suas
experiências, recriar o mundo, ser criador e criatura; percebem mais
concretamente a dimensão da diversidade humana, de suas diferentes redes de
pertencimento e dos diversos papéis de cada um na história – alargando a
fronteira entre fantasia e realidade, e exercitando valores sociais.
Mas isso se aplica também aos jogos digitais? Jogos digitais são
brincadeiras com regras que têm condição de vitória e de derrota; peças
(geralmente os personagens/avatares); tabuleiro/arena (no caso, o cenário);
objetivo; regras (às vezes são imperceptíveis); e obstáculos. Hoje, a infância
contemporânea está povoada de meninos e meninas nativo(a)s digitais. Portanto,
é também nestas e por meios destas tantas atividades lúdico-tecnológicas que as
crianças podem experimentar outras maneiras de reinventar o mundo real.
O que dizer de jogos educativos? Trazer objetivos didáticos não é
contraditório ao aspecto de espontaneidade e prazer do jogo? Há muitas
iniciativas alicerçadas na díade educação e tecnologia intituladas “jogos
educativos” ou “pedagógicos”, mas o que se observa é que a maioria destas é
pautada em modelos tradicionais de memorização e repetição, apresentados
através de testes, aulas expositivas ou exercícios descontextualizados – e ainda
assim se autodenominando jogo. Na realidade, camuflam propostas
escolarizantes, enciclopédicas, desconfigurando o caráter prazeroso e espontâneo
inicialmente prometido. Cabe, então, esclarecer: nem tudo que é digital e
interativo é jogo! Além disso, observa-se que a pressa, a atividade de destreza e a
competitividade são os aspectos normalmente mais solicitados – o que colocaria
em cheque a dimensão educativa destes pseudo-jogos.
Empresas que queiram entrar, crescer e se fixar neste mercado que parece
estar sempre em ascensão são constantemente desafiadas a buscar oferecer
experiências lúdicas que, ao mesmo tempo, promovam aprendizagens com
significação para as crianças. O ponto nevrálgico que se coloca é: como abranger
conceitos das diferentes áreas de conhecimento sem abrir mão do
desenvolvimento da imaginação, da capacidade criadora, análise crítica e
colaboração? Afinal, estes são aspectos fortemente presentes em jogos (e bem
distantes de tantos dos chamados jogos educativos do mercado...).
Outro aspecto bastante interessante de ser problematizado diz da
possibilidade de provocar, nas crianças, o exercício de parar, olhar, pensar... E só
depois agir. Isso não é parte de seu cotidiano, menos ainda dos games. Propor
jogos nesta linha seria romper com o estabelecido – aliás, mesmo no campo
educacional, enfrentar mistérios, favorecer a imaginação, a criatividade e a
narrativa são também, muitas vezes, romper com o estabelecido!
Acreditamos que diante de jogos digitais desafiadores, contextualizados,
interdisciplinares, dinâmicos, sempre em diálogo com múltiplos contextos
históricos, sociais e culturais, que agem como mediadores da relação da criança
com o conhecimento, o uso da tecnologia pode aumentar a motivação e o interesse
de crianças, favorecendo a percepção de que aprender seja gostoso, lúdico, e
estimule a criatividade. Deste modo, os estudantes podem processar informações,
analisar opções, tomar decisões e resolver situações-problema de forma
cooperativa e significativa. Neste caso... Respondemos ao título: sim, os jogos
digitais podem ser uma alternativa à aprendizagem!
Maria Isabel Leite
Doutora em Educação (UNICAMP), com Pós-Doutorado em Arte-Educação (Roehampton
University).
Juliana Uggioni
Doutora em Educação (UNESA).
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