53 METODOLOGIA ATIVA NA CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO EDUCATIVO CRITICO REFLEXIVO COM DISCENTES DO CURSO DE FARMÁCIA Karla Bruna Nogueira Torres Barros Regilane Matos da Silva Prado Anny Natércia da Costa Loureiro Danielle Santiago da Silva Varela Karla Deisy Morais Borges Maria de Fátima Antero Sousa Machado RESUMO A graduação em Farmácia requer o desenvolvimento de competências, habilidades e atitudes específicas a esta área. A escolha da metodologia adequada é fundamental para preparar os discentes às demandas dos serviços em saúde. Assim, o objetivo deste foi relatar a experiência da aplicação do arco de Maguerez junto aos discentes do curso de Farmácia. A prática realizou-se em maio de 2013, com sete alunos do curso de Farmácia de uma instituição privada em Quixadá, como atividade do módulo de Metodologias Ativas de Ensino Aprendizagem do Curso de Mestrado Profissional Ensino na Saúde da UECE. Consistiu na aplicação do Arco de Maguerez, seguindo as etapas de observação da realidade, elaboração dos pontos–chave, teorização, hipóteses de solução e aplicação na realidade. O problema formulado pelos discentes foi: “ansiedade em relação às dificuldades profissionais que se pode enfrentar enquanto farmacêuticos recém-formados.” Para explicar o problema destacam-se os seguintes pontos chaves: falta de preparo para a prática profissional, ênfase em conteúdos em detrimento de uma aproximação com a realidade e novas responsabilidades exigidas pelo mercado. A teorização foi realizada através do relato de experiências das facilitadoras e a utilização de artigos científicos. Em seguida foram apontadas hipóteses de solução para o problema: reestruturação curricular e mudanças de posturas de docentes e discentes. O método finalizou com a aplicação na realidade que se deu através da elaboração de um plano de atividades a serem desenvolvidas no curso e os estudantes apresentaram entusiasmo e interesse na construção do arco. Palavras-chave: Metodologias Ativas. Arco de Maguarez. Processo Ensino-Aprendizagem. ABSTRACT A graduate in Pharmacy requires the development of competencies, skills and attitudes specific to this area. The choice of the appropriate methodology is crucial to prepare students for the demands of health services. Thus, the aim of this was to report the experience of applying arc Maguerez next to students from the Pharmacy. The practice was held in May 2013 with seven students of Pharmacy from a private institution in Quixadá as the Active Teaching and Learning Methodologies module Course Professional Master of Education in Health UECE activity. Consisted of the application of the Arch of Maguerez, following the steps of observation of reality, preparing key-points, theorizing, possible solutions and application in reality. The problem was formulated by the students: "Anxiety in relation to professional difficulties which may face while newly trained pharmacists." To explain the problem we highlight the following key points: lack of preparation for professional practice, emphasis on content rather than an approximation to reality and new responsibilities required by the market. The theory was performed by reporting the experiences of facilitators and the use of scientific articles. Curricular restructuring and changes in the positions of teachers and students: Then possible solutions to the problem were identified. The method finished with the application that actually occurred through the development of a plan of activities to be developed in the course and the students showed enthusiasm and interest in the construction of the arch. Keywords: Methodologies Active. Arc Maguarez. Teaching-Learning Process. Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 54 1 INTRODUÇÃO A Farmácia enquanto ciência é bastante complexa, não exata e fragmentada em diferentes áreas de atuação, tendo assim um processo educativo caracterizado por essa complexidade, e requer do discente uma saber teórico e prático, para uma atuação como foco na qualidade de vida de uma determinada população. Assim, no processo educativo em Farmácia, o docente precisa orientar o discente a buscar os conhecimentos teóricos para desenvolver uma prática clínica consciente e cumprir sua função social, atendendo a todos sem privilégios e discriminação. Desta forma, o modelo de ensino-aprendizagem centrado na demanda dos serviços em saúde, apresenta aspectos muito diferenciados daqueles aprendidos somente em sala de aula, devido a isto os processos de formação em saúde vêm merecendo, nas últimas décadas, um novo olhar e um novo fazer de modo a atender as necessidades da população. Ao longo dos anos foi se percebendo que as concepções pedagógicas utilizadas para o ensino superior de profissionais da saúde, até então não estavam dando conta de todas as necessidades exigidas pela sociedade contemporânea. Deste modo tais concepções e metodologias, entendidas como tradicionais, vêm sendo substituídas por outras, que apontam para a necessidade de uma formação que seja capaz de ajudar no processo de transformação deste aluno em profissional crítico reflexivo capaz de se inserir ativamente em uma realidade social, com objetivo de transformar as injustiças e desigualdades ali presentes (PRADO et al., 2012). Neste propósito, as metodologias ativas de ensino-aprendizagem, representadas pelos métodos da aprendizagem baseada em problemas e problematização, apontam para uma mudança de paradigma no ensino de saúde e para a formação de profissionais críticos e reflexivos e que associem o ensino com a pesquisa e o envolvimento comunitário. Essas metodologias buscam um rompimento com aquela antiga postura do professor como aquele que transmite informações e em que os alunos participam passivamente do processo ensino-aprendizagem. Como diria Freire as novas metodologias procuram conceber a educação como prática de liberdade, distanciando de uma educação como prática de dominação (CYRINO; TORALLES-PEREIRA, 2004). De acordo com Prado et al. (2012), as metodologias ativas tem formas fundamentais de organização: a Problematização e a Aprendizagem Baseada em Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 55 Problemas (PBL). Ambas entende que o conhecimento deve ser construído de maneira significativa e cuja raiz alicerça-se em um problema a fim de resolvê-lo. A problematização constitui uma verdadeira metodologia, entendida como um conjunto de métodos, técnicas, procedimentos ou atividades intencionalmente selecionadas e organizadas em cada etapa, de acordo com a natureza do problema em estudo e as condições gerais dos participantes (BERBEL, 1998 apud CYRINO; TORALLES-PEREIRA, 2004). Os resultados da Problematização voltam-se para uma compreensão crítica da realidade que fora estudada com o objetivo de promover uma transformação desta, mediante propostas de intervenções (CYRINO; TORALLES-PEREIRA, 2004), ou seja, o aluno parte da realidade, reflete sobre ela, tenta compreender os motivos, cria hipóteses de intervenção e volta a realidade a fim de modificá-la. Desta forma esta baseia-se no aumento da capacidade do aprendiz/aluno de se inserir na realidade como agente ativo e transformador (MITRE et al., 2008). O Método do Arco, conhecido como Arco de Maguerez, em homenagem ao seu criador, Charles Maguarez, é utilizado por Bordenave e Pereira (2002). Tal método consiste em cinco etapas, a saber: 1) Observação da Realidade, onde o estudante faz uma leitura da realidade a partir da observação; 2) Pontos-Chaves, na qual o estudante é capaz de realizar uma análise crítica, tentando entender os porquês daquela realidade, de modo a compreender melhor o problema; 3) Teorização, momento de analisar e avaliar as informações para saber se realmente são capazes de resolver o problema; 4) Hipóteses de Solução, momento de usar da criatividade e imaginação livre, pensando de maneira inovadora para resolver o problema observado na realidade; 5) Aplicação à Realidade, execução das soluções encontradas em grupo (MITRE et at., 2008). Frente às mudanças nos cenário de ensino - aprendizagem, o presente trabalho tem por objetivo relatar o desenvolvimento de um processo crítico reflexivo com os discentes do curso de graduação em Farmácia de uma faculdade privada do Ceará, por meio da utilização do Arco de Maguerez. O tema proposto para o desenvolvimento de tal processo foram às dificuldades a serem vivenciadas por futuros egressos de um curso de farmácia no mercado de trabalho. Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 56 2 RELATO DE CASO A atividade foi realizada com um grupo de alunos do curso de Farmácia de uma instituição privada do município de Quixadá, Ceará. A aplicação da metodologia com os discentes ocorreu durante o período de maio de 2013. Participaram desta atividade sete estudantes do curso de graduação em Farmácia. Para aproximar os envolvidos com a metodologia, realizou-se uma breve exposição sobre a técnica, de forma a lhes fornecer subsídios para a participação. Para a realização do processo educativo crítico reflexivo utilizou-se de uma metodologia ativa como referencial teórico metodológico, o método do Arco de Maguerez, constituído das seguintes etapas: observação da realidade, pontos – chaves, teorização, hipóteses de solução e aplicação da realidade. Estas etapas proporcionam aos participantes uma reflexão crítica por meio da problematização da realidade sobre o tema a ser discutido (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). 3 DISCUSSÃO Para a realização do Arco de Maguerez partimos da observação da realidade, por meio de questionamentos aos discentes sobre a sua realidade, como: Tendo como base a realidade em que vocês estão inseridos atualmente enquanto acadêmicos pré–concludentes do curso de farmácia, qual dificuldade vocês poderiam apontar? Nesse momento tem seu ponto de partida na realidade vivenciada pelo discente a cerca do problema levantado, o processo de ensino e aprendizagem se relaciona com aspectos que o estudante observa minuciosamente, expressando suas percepções e realiza uma leitura sincrética da realidade (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). O grupo construiu o seguinte Problema: Possíveis dificuldades a serem vivenciadas no exercício profissional enquanto farmacêuticos recém-formados. A segunda etapa é constituída pelo levantamento dos pontos–chave, onde seleciona-se o que é relevante e essencial para a representação da realidade observada, identificando as variáveis que podem contribuir para a compreensão e solução do problema (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 57 Nessa etapa, os discentes citaram todos os pontos–chave que achavam pertinentes, em seguida realizou-se a discussão destes pontos levantados para que houvesse um consenso entre os participantes dos pontos que realmente eram relevantes. A partir desta discussão foi elaborada uma lista final dos pontos–chave que representariam a realidade em questão, sendo estes: Falta de preparo para a prática profissional; Insegurança diante do novo; Metodologias inadequadas com ênfase nos conteúdos em detrimento de uma aproximação com a realidade prática; Distanciamento entre teoria e realidade; Pouca inserção na prática; Novas responsabilidades exigidas pelo mercado; Mercado competitivo; Trabalho em equipe pouco vivenciado na faculdade ou vivenciado de modo fragilizado; Dificuldade de acesso a educação permanente (escassez de cursos na região). A terceira etapa de teorização foi o momento em que as informações forma analisadas, buscando explicações acerca da realidade observada e a compreensão dos pontos–chave, possibilitando algumas conclusões que viabilizarão a etapa seguinte (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). Para auxiliar nesta etapa foram disponibilizados artigos que possibilitaram um maior suporte teórico aos participantes, contribuindo com o processo de teorização. O desenvolvimento ocorreu pela exposição dialogada, entre as docentes que coordenavam a metodologia do Arco e os discentes participantes, por meio da utilização de recurso áudio visual. As discussões se concentraram nas metodologias utilizadas em sala de aula em relação ao preparo para o mercado de trabalho, cujos discentes levantaram aspectos sobre a maneira e o foco do desenvolvimento de cada tipo de metodologia e como estas influenciavam em sua futura prática profissional. A quarta etapa é a formulação de hipóteses para a solução de problemas, essas devem ser construídas a partir da profunda compreensão do problema, utilizando-se a criatividade e originalidade dos estudantes, para buscar novas Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 58 maneiras para a resolução desses, durante o desenvolvimento desta etapa, deve-se atentar para a avaliação da possibilidade de aplicação da hipótese de solução levantada na realidade observada inicialmente (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). Neste momento houve uma interação ainda maior entre os envolvidos, pois na medida em que as ideais de possibilidade de hipóteses eram levantadas por um participante ocorria a intervenção dos demais presentes contribuindo com a ideia inicial, possibilitando o aprimoramento e a lapidação, tornando-a ainda mais interessante para o resultado esperado. As hipóteses formuladas para o questionamento inicial se remeteram a necessidade de reestruturação curricular para propiciar ao aluno maior proximidade com a prática e consequentemente maior segurança quando da inserção no mercado de trabalho, bem como mudanças de posturas de docentes e discentes a fim de acolher metodologias que contribuam para contextualizar cenários de prática e assim possam diminuir a insegurança gerada diante da eminência da vida profissional. A quinta etapa se refere à aplicação das hipóteses à realidade, aplica-se as soluções eleitas como viáveis e o estudante aprende a generalizar o aprendido para utilizá-lo em diferentes situações, permitindo que ele saia do âmbito intelectual e volte a sua realidade, aplicando uma resposta ao problema levantado, buscando transformá-lo de alguma maneira (BERBEL, 1998; BORDENAVE, 2002). Essa etapa é visualizada e vivenciada pelos discentes, no momento em que esses ao saírem do grupo de discussão e emergirem novamente em seus ambientes de trabalho apliquem aquelas hipóteses levantadas por eles e as vejam como eficazes ou não para sua realidade, sendo necessário a realização de um plano de atividades a serem realizadas, que permitisse a execução de ações , tendo em vista o problema identificado. Percebe-se então, que o uso do Arco de Marguerez se mostrou uma excelente estratégia para o desenvolvimento de um processo que buscava a visão critica reflexiva. Este referencial teórico metodológico foi fundamental, pois permitiu problematizar a realidade dos participantes, fazendo com que esses se sentissem parte essencial para a consolidação do processo. Assim a discussão, o debate de ideias se fortaleceu durante todo o processo, sendo vislumbrada a interação e a integração entre os participantes envolvidos no grupo. Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 59 Este processo possibilitou a exposição da percepção individual sobre o tema proposto, o debate entre as diversas percepções encontradas e a formulação de uma nova percepção do grupo, bem como a discussão sobre as dificuldades a serem vivenciadas por futuros egressos de um curso de farmácia no mercado de trabalho. AGRADECIMENTOS Deixamos aqui nossos agradecimentos aos alunos que tão prontamente aceitaram participar da prática e as professoras do modulo de Metodologias Ativas do Mestrado Profissional em Ensino na Saúde - UECE, em especial a professora Maria de Fátima Antero. REFERÊNCIAS BERBEL, N. N. A problematização e a aprendizagem baseada em problemas: diferentes termos ou diferentes caminhos? Interface: Comunicação, Saúde, Educação, v. 2, n. 2, p. 139-154, 1998. BORDENAVE, J. D. E; Pereira A. M. Estratégias de ensino-aprendizagem. 24. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. CYRINO, E. G., TORALLES-PEREIRA, M. L. Trabalhando com estratégias de ensino aprendizagem por descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada em problemas. Cad. Saúde Pública, v. 20, n. 3, p. 780-788, maio./jun. 2004. MITRE, S. M; BATISTA, R. S; MENDONÇA, J. M. G; PINTO, N. M. M; MEIRELLES, C. A. B; PORTO,C. P; MOREIRA .T; HOFFMANN,L. M. A. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação profissional em saúde: debates atuais. Ciência e Saúde Coletiva, v. 13, sup. 2, p. 2133-2144, 2008. PRADO, M. L. et al. Arco de Charles Maguerez: refletindo estratégias de metodologia ativa na formação de profissionais de saúde. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, mar. 2012. Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br 60 SOBRE OS AUTORES Karla Bruna Nogueira Torres Barros Docente na Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS. Farmacêutica, Especialista em Farmacologia Clínica e Mestranda em Ensino na Saúde Universidade Estadual do Ceará – UECE. E-mail: [email protected]. Regilane Matos da Silva Prado Docente na Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS. Farmacêutica, Doutora em Farmacologia pela Universidade Federal do Ceará – UFC. E-mail: [email protected]. Anny Natércia da Costa Loureiro Terapeuta Ocupacional, Especialista, Mestranda em Ensino na Saúde Universidade Estadual do Ceará – UECE. E-mail: [email protected]. Danielle Santiago da Silva Varela Docente na Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS. Fisioterapeuta, Mestranda em Ensino na Saúde Universidade Estadual do Ceará – UECE. E-mail: [email protected]. Karla Deisy Morais Borges Docente na Faculdade Juazeiro do Norte – FJN. Farmacêutica, Mestre em Farmacologia pela Universidade Federal do Ceará – UFC. E-mail: [email protected]. Maria de Fátima Antero Sousa Machado Docente e Coordenadora na Universidade Regional do Cariri – URCA. Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará – UFC. E-mail: [email protected]. Revista Expressão Católica 2014 jan./jun.; 3(1): 53-60 revistaexpressaocatolica.fcrs.edu.br