Enquadramento Histórico – Arqueológico O concelho de Celorico da Beira situa-se na região geográfica do Alto Mondego, constituída por duas áreas geomorfológicas distintas: a área de montanha (onde predominam as encostas de declive acentuado, originando um relevo bastante acidentado, com altitudes superiores aos 1000 m nalguns pontos – o ponto mais elevado do concelho situa-se na Penha de Prados com 1.100 m de altitude), e as áreas aplanadas, que vão sendo recortadas pela existência de algumas pequenas elevações, dando origem à designada depressão ou bacia de Celorico. A nível hidrográfico o concelho de Celorico da Beira é percorrido por diversas linhas de água, algumas de caudal e percurso insignificante, outras, como é o caso do rio Mondego, importantes linhas de água. A nível administrativo o concelho de Celorico da Beira situa-se na região da Beira Alta (Beira Interior), fazendo fronteira com os concelhos de Trancoso e Pinhel a Norte, Gouveia a Sul, Fornos de Algodres a Oeste e Guarda a Este, e ocupa uma área de 253 km, sendo constituído por 22 freguesias. Os vestígios mais antigos que documentam a ocupação humana, no actual território do concelho de Celorico da Beira, remontam ao período Neolítico (IV/III milénio a.C.). Deste período é de referir a existência até à poucos decénios de um monumento megalítico, nas proximidades da aldeia da Carrapichana (Martins Sarmento:1883). Este monumento foi destruído em finais do século XIX, inícios do século XX. Atribuídos igualmente ao período Neolítico, foram encontrados dois machados de pedra polida na freguesia de Cortiçô em inícios do século XX, posteriormente doados à Sociedade Santos Rocha (Santos Rocha: 1908). Outros testemunhos de uma ocupação humana PréHistórica foram encontrados no sítio do Barrocal do Olival (Fornotelheiro). Trata-se de um sítio arqueológico de época romana que apresenta testemunhos de uma ocupação Calcolítica – II milénio a.C. – (Lobão et alii, 2006). Localizado na Serra do Monte Verão, na freguesia da Rapa, encontra-se o sítio arqueológico da Pedra Aguda. Trata-se de um povoado fortificado, cuja ocupação humana remontará ao Bronze Final (Pereira: 2003). Do mesmo período cronológico, foram encontradas recentemente (2006), no decorrer de trabalhos de acompanhamento arqueológico da construção do Parque Eólico da Serra do Ralo, duas estelas, uma contendo a representação de um reticulado e outra a representação de um escudo com uma lança. Na Serra de Darouca, no sítio da Silva, localiza-se um povoado da Idade do Ferro (Almeida, 1945: 204-206; Lobão et alii, 2006). A romanização do território de Celorico da Beira, bem como de toda esta região, ter-se-á efectuado e desenvolvido nas últimas décadas do século I a.C., inícios do século I d.C. No que concerne ao território de Celorico, o vestígio mais antigo desta área, ou um dos mais antigos da romanização, é constituído por uma inscrição rupestre, localizada no exterior do Castelo de Celorico da Beira. É dedicada a uma divindade indígena e apresenta a seguinte leitura (.../.../M) ALCEINI (filio, vel filia) / (SAC) RVM / (M) VNIDI e tradução «Consagrado a Munídia, por...?...(filho/filha) de Malgueino»(Curado:1985). Datada cronologicamente do século I d. C, esta inscrição comprova a existência dos primeiros contactos entre a população indígena e os primeiros colonos romanos ou indígenas romanizados a estabelecerem-se na região. A existência desta inscrição poderá testemunhar a presença de um santuário proto-histórico romanizado, o que por si só não implica uma ocupação permanente do espaço, pois a ausência de testemunhos materiais deste período ou anteriores deixam transparecer a ideia de uma não-ocupação deste espaço enquanto habitat permanente. Outro importante testemunho do processo de romanização deste território situase no interior da Capela de Nossa Senhora dos Azares. Embutida numa das paredes da capela encontra-se uma ara com uma inscrição votiva, dedicada a uma divindade indígena que, segundo Ferreira (et alii, 2004, nº347), apresenta a seguinte leitura: AMMAE · AR/ACELENI · SACRVM / CLEMENS · CELE/RIS · LICINVS · CIL(I) / D(e) ·S(uo) · F(aciendum) C(urauerunt) e tradução: Consagrada a Ama Aracelene; Clemente (filho de) Celer e Licinio (filho de) Cilo mandaram fazer à sua custa. Aparentemente, todo este território, parece ter estado à margem do processo de romanização e conquista e apenas em meados do século I a.C. terá ganho importância estratégica, que permitisse à administração romana o desenvolvimento de campanhas militares na região. Contudo, verifica-se que um maior interesse demonstrado pela administração romana na conquista e controlo deste território não terá tido, de forma subsequente, uma ocupação efectiva do território por colonos romanos ou por populações romanizadas. A conquista e posterior pacificação desta região sob domínio romano terá servido como uma espécie de retaguarda para a conquista dos territórios que se encontravam para lá do rio Douro (Carvalho, 2008). Uma ocupação efectiva do território, que fosse mais além da mera ocupação territorial pelas legiões em períodos de conquista, terá ocorrido na transição do século I a.C. para os primeiros anos da nossa era. Possivelmente, só neste período foi possível à administração romana criar as condições ideais para o desenvolvimento do processo de ocupação e exploração do território segundo os preceitos romanos. Relativamente à área do concelho de Celorico, é provável que a integração deste território sob jurisdição de uma Civitas tenha ocorrido igualmente neste período. Aparentemente esta área pertenceria à Civitas dos Lanciensis Transcudani, dada a maior proximidade geográfica com este local, pois todas as outras capitais de Civitates conhecidas na região e cuja localização geográfica não deixa qualquer tipo de dúvida situam-se mais afastadas deste território. Apontando as últimas investigações realizadas na região, como sede desta cidade romana, o sítio arqueológico da Póvoa do Mileu (Carvalho:2007,Guerra:2007). Tendo por base trabalhos de prospecção arqueológica realizados no concelho de Celorico da Beira (Valera et alli:1994, Lobão et alli:2006), o povoamento romano que se terá estabelecido na região caracteriza-se essencialmente por uma ocupação do território essencialmente rural, onde os aglomerados urbanos são praticamente inexistentes. Aparentemente, trata-se de uma ocupação humana feita através de pequenos núcleos unifamiliares que administram e ocupam territórios situados em vales, de preferência localizados na proximidade de cursos de água, em detrimento dos terrenos situados nas áreas de montanha. Durante a tardo-antiguidade e Alta Idade Média (sécs. VI-XI), verifica-se a continuidade de ocupação territorial de alguns sítios que vinham sendo ocupados desde a época romana. Um dos mais antigos testemunhos da Alta Idade Média no concelho de Celorico da Beira encontra-se no interior da Igreja de Nossa Senhora de Açores. Tratase de uma inscrição funerária que apresenta a seguinte leitura: + REQVIEVIT · FAMVLA · / XPI · IN · PACE · SVINTHI/LIVBA · SUB DIE · NON · / NOVENBRES · ERA · / DCCIII e tradução: (aqui) repousou a serva de Cristo (que) acabou em paz, Suinthiliuba, no mês de Novembro, Era de 704 (ano de 666 d. C). Também é através do “mundo do mortos” que obtemos testemunhos da ocupação humana em determinados locais durante este período. As inúmeras sepulturas escavadas na rocha existentes no actual território de Celorico demonstram a existência quer de pequenos aglomerados humanos unifamiliares quer de aglomerados humanos de maior dimensão (aldeias). Um caso bastante característico e que representa uma importante ocupação humana durante a Alta Idade Média é o sítio arqueológico de S. Gens, onde se encontra identificada uma necrópole com 52 sepulturas escavadas na rocha. O actual território do concelho de Celorico da Beira localiza-se numa área que, durante a Idade Média, foi uma zona de fronteira entre o poder Cristão localizado nos territórios a Norte da Península Ibérica e o Muçulmano a Sul. Numa época de constantes convulsões militares e sociais, a geografia do terreno desempenha um importante papel ao estabelecer fronteiras físicas entre os diferentes reinos e culturas. Desta forma se verifica que os designados acidentes naturais - como as montanhas e os rios - possuem nesta época uma enorme importância por estabelecerem as fronteiras entre povos. Os territórios circundantes ou localizados em zona de fronteira são alvo de constante vigilância e palco de lutas entre forças inimigas. Aparentemente toda esta área do actual concelho de Celorico da Beira parece ter estado debaixo de constantes razias militares de parte a parte (Tente, 2007). Mesmo durante o período em que a fronteira entre cristãos e muçulmanos se localizaria no rio Douro, é verosímil pensar que dada a proximidade deste território ao vale do Douro, então linha de fronteira, todo este território fosse alvo de constantes destruições. Desta instabilidade política e social que surge a necessidade das populações se protegerem a si e aos seus bens, erguendo muralhas de defesa em torno dos principais aglomerados populacionais (Barroca, 1990-91:89). Os primeiros castelos, enquanto significado actual do conceito, parecem ter surgido em meados do século IX, com Afonso III das Astúrias. No actual território Português, este tipo de estrutura parece ter surgido um pouco mais tarde, durante os séculos X e XI. São estruturas incipientes com muros rudimentares, localizadas em terrenos com morfologia favorável para a defesa, privilegiando o campo de visão, e com muralhas que aproveitavam a presença de batólitos graníticos para se apoiarem (Barroca 1990-91: 91). Com a reconquista cristã iniciada por D. Afonso III das Astúrias, os territórios conquistados são objecto de uma reforma político-administrativa, com o intuito de estabilizar os territórios, o monarca procede à criação da civitates. Trata-se da criação ou repovoamento de importantes núcleos habitacionais que, devido ao seu excelente posicionamento geo-estratégico dominam um vasto território. É neste âmbito que surgem as primeiras fortificações, verificando-se a criação das denominadas civitates, associadas à construção de castelos, estrutura criada não só para defender as populações de possíveis ataques inimigos, como para demonstrar a presença de um poder forte, detido pelo monarca e que era delegado em alguém da sua confiança para dirigir os destinos do núcleo populacional. As civitates eram núcleos populacionais fortificados que, dada à sua localização geo-estratégica, efectuavam o controlo de um vasto território recém-conquistado. Aquando da reconquista dos territórios na área da Serra da Estrela por Afonso III das Astúrias e a fixação da fronteira entre cristãos e muçulmanos na linha do Mondego, procedeu à criação da civitate de Seia. Assim, verificamos que os territórios do actual concelho de Celorico e concelhos limítrofes neste período histórico constituiriam uma mesma unidade territorial sob o governo da civitate de Seia. A hipótese de existir em Celorico uma estrutura defensiva, já no século IX-X, é colocada por Catarina Tente, que refere essa ideia como plausível, embora refira que a documentação escrita e artefactual ainda não possam sustentar essa ideia (Tente:2007). Os séculos X, XI e XII ter-se-ão caracterizado por uma grande instabilidade político-administrativa, nomeadamente nas regiões de fronteira. No que se refere às transformações políticas e administrativas, com a reconquista dos territórios até a linha do rio Mondego por Fernando Magno em meados do século XI, regista-se um novo processo de reorganização territorial, procedendo-se à criação de Terras. Esta divisão administrativa do território, implantada por Fernando Magno em meados do século XI, procurou reestruturar a administração territorial vigente desde a época de D. Afonso III com a criação das civitates. Ao criar as Terras este monarca procurou estimular um novo sistema de maior proximidade das populações, pois, o quadro geopolítico que esteve na génese da criação civitates, sofreu transformações e nos alvores da nacionalidade. Com a estabilização desta região e com a reconquista cristã a deslocar-se para Sul, os territórios que anteriormente faziam parte integrante dos territórios das civitates, procuram a sua emancipação político administrativa, ocorrendo neste período o acréscimo de importância de algumas terras. O carácter conflituoso que caracteriza os últimos séculos da Alta Idade Média, motiva uma nova reestruturação do povoamento e ocupação do território. No caso do território que actualmente constitui o concelho de Celorico, é provavelmente neste período de transição da Alta Idade Média para a Baixa Idade Média, que se encontrarão as origens de algumas das povoações actualmente existentes dentro do seu território. Um exemplo bastante singular parece ter ocorrido com o sítio arqueológico de S. Gens, com uma ocupação humana desde a época romana, verá durante os primeiros séculos da Alta Idade Média essa ocupação manter-se ou mesmo aumentar de importância em relação ao período anterior. Com o aumento da conflituosidade associado ao processo de Reconquista, o povoamento sobranceiro às margens do rio Mondego e que aí havia permanecido durante séculos, a ocupação aparentemente ter-se-á deslocado para Sul, para o topo de um monte onde viria a ser fundado o Castelo de Celorico da Beira, que posteriormente esteve na origem da fundação da povoação de Celorico da Beira. Entre finais da década de 50 e finais da década de 60 do século XII, Celorico terá recebido o seu primeiro foral outorgado por D. Afonso Henriques. Esta política de concessão de forais, conforme refere José Mattoso, refere-se sobretudo “a concelhos situados perto da fronteira leonesa e que reproduz geralmente o modelo do de Salamanca. São todos não datados, excepto o de Linhares, concedido em 1169; devem ter sido outorgados em ocasiões muito próximas umas das outras…Beneficiaram as povoações fortificadas de Trancoso, Marialva, Aguiar da Beira, Celorico da Beira, Moreira de Rei, Linhares e Penela da Beira. A criação nesta zona de municípios autónomos, dotados de privilégios, destinava-se a formar as malhas de uma rede defensiva contra as possíveis agressões militares leonesas a partir de Cidade de Rodrigo, lugar repovoado pelo rei Fernando II por volta de 1160 ou 1161. De facto, a guerra entre Leão e Portugal atingiu particularmente esta zona, a partir da celebração do já mencionado Tratado de Sahagún, em 1158.” (Mattoso, 1993: p.80 e 81). É importante lembrar que o território de Celorico no período em causa localizava-se muito mais próximo da linha de fronteira, pois até finais do século XIII e antes da assinatura do Tratado de Alcanizes no reinado de D.Dinis e a posterior integração dos territórios do Riba Côa no reino de Portugal, a fronteira entre os dois reinos encontra-se muito mais próxima do território de Celorico. A doação de forais por parte de D. Afonso Henriques a diversas localidades raianas da Beira Interior parece ter surtido o efeito pretendido, já que em finais da década de 80 do século XII, sob o reinado de D. Sancho I, Celorico, em colaboração com outras localidades vizinhas, conseguem travar uma invasão das forças leonesas. A importância estratégica de Celorico, enquanto ponto de defesa do reino português, é reconhecida por D. Afonso II, que em 1217 confirma a carta de foral de D. Afonso Henriques (Rodrigues:1979). Com a doação e confirmação de forais os monarcas da 1a Dinastia pretendiam povoar os territórios localizados em zona de fronteira, concedendo uma série de privilégios à população que aí se fixasse (Mattoso:1993). Em 1246, na sequência da guerra civil que opôs o rei D. Sancho II ao seu irmão D. Afonso (Conde Bolonhês), o castelo de Celorico foi envolvido no conflito, devido à lealdade demonstrada pelo alcaide Fernão Rodrigues Pacheco ao rei D. Sancho II. A posição de Celorico no conflito valeu-lhe um cerco ao seu castelo pelas forças militares do Conde Bolonhês. O reconhecimento da soberania de D. Afonso sobre o castelo de Celorico só terá ocorrido após a morte de D. Sancho II. O final do século XIII e o século XIV revelou-se um período de profundas transformações na Castelologia Portuguesa. No castelo de Celorico essas transformações ter-se-ão materializado na construção de uma torre adossada ao pano de muralha e na construção de uma barbacã (Monteiro:1999). Na defesa contra as investidas castelhanas, Linhares e Celorico da Beira tiveram um papel preponderante durante a Idade Média. Devido ao seu valor estratégico-militar, a povoação foi várias vezes disputada por castelhanos e portugueses, tendo integrado os dois reinos alternadamente. Celorico da Beira, Trancoso e Linhares formavam um poderoso triângulo defensivo da Beira. Na crise de sucessão da Coroa Portuguesa de 1383-85, o alcaide de Celorico acabou por vir a apoiar a causa do futuro D. João I, o Mestre de Avis. Esta posição de Martim Afonso de Melo acabou por envolver Celorico em mais um cerco castelhano. Quando D. João I de Castela, entretanto regressado a Castela, teve conhecimento da aclamação do Mestre de Avis como rei de Portugal, ordenou ao Arcebispo de Toledo, como represália, a destruição de povoações portuguesas. Os exércitos espanhóis acabaram por causar imensos danos no território português, particularmente no concelho de Celorico. Todavia, antes de puderem declarar vitória os exércitos espanhóis foram interceptados pelas forças militares portuguesas. A Batalha de Trancoso, como ficou conhecida, terá acontecido entre Celorico e Trancoso, a 28 de Maio de 1385, e terminou numa completa vitória para Portugal (Rodrigues:1979). Contudo, “O Rei de Castela entra uma vez mais pela Comarca da Beira com o intuito de retomar, pela força, o reino, a que se julga com direito”. Nesta nova investida o monarca acampou em Celorico. Tendo-se sentido acolhido por doença, o rei fez nesta mesma povoação o seu testamento (a 25 de Julho de 1385), alguns dias antes da derrota que viria a sofrer na Batalha de Aljubarrota. D. Manuel I, em 1512, outorga foral novo à povoação e eleva-a a vila. Realizaram durante este período novas obras no castelo, construindo-se um muro e passadiço de comunicação com o chamado Poço d’El Rei. Pela sua localização geográfica estratégica, o controle da vila significou desde sempre dominar a portela natural que inclui o vale do Mondego. O desenvolvimento económico que se verificou na região no século XVI foi, em parte, resultado do domínio desta portela natural e da consequente passagem obrigatória dos comerciantes. As poucas informações que conhecemos, relativamente ao urbanismo primitivo de Celorico, encontram-se associadas à arquitectura religiosa (Oliveira:1997) e a fundação de Igrejas e capelas que parece ter ocorrido a partir de meados do século XIII, inícios do século XIV (Rodrigues:1979). Relativamente a outros espaços, nomeadamente à existência ou não de praças públicas, as informações existentes são relativamente escassas, contudo, estes espaços devem ter surgido na malha urbana de Celorico associados à construção de outros edifícios nomeadamente aos espaços religiosos. Já que, no decorrer da história, a praça pública tem sido o espaço por excelência onde os factos históricos mais relevantes da história local ou nacional ocorrem. Durante o período medieval verifica-se um ressurgimento urbano. As cidades ou os aglomerados populacionais mais significativos retomam as suas funções de centralidade política, económica e religiosa. A criação do núcleo populacional de Celorico da Beira recua a este período histórico, criado por mandato régio (foral), o urbanismo de Celorico podese classificar como um aglomerado populacional de crescimento orgânico, que adapta as ruas à topografia existente, tendo como espinha dorsal uma rua principal onde todas as outras pequenas ruas convergem. Nesta rua principal, junto á primitiva Igreja de Santa Maria, terá surgido a primeira praça pública do urbanismo de Celorico da Beira. Tal como noutros locais onde se verificou um crescimento orgânico dos núcleos populacionais, esta praça não terá nascido de uma forma planeada, mas consistiu no alargamento da rua principal, na área onde se localizava o principal espaço religioso do núcleo populacional. No que se refere à existência de outras praças públicas é de destacar a Praça da Republica ou Largo do Mercado. A importância deste local enquanto praça pública só se terá acontecido em finais do século XVIII, período em que se verifica a instalação do mercado semanal neste local. Inicialmente, a realização do mercado semanal decorreria no largo da Igreja de Santa Maria. Porém, dada a proximidade com um espaço religioso, levou a que alguns habitantes se manifestassem contra a realização do mercado semanal naquele local. Assim, por despacho régio, em 1719 o local do mercado semanal vai ser alterado e a sua realização passa a efectuar-se no Largo da Corredoura, há época um local periférico a Celorico da Beira. A sua localização periférica obriga a que, em 1783 e novamente por despacho régio, se altere o local de realização do mercado semanal, passando este a realizar no Largo do Mercado, futura Praça da Republica (Oliveira:1997). Durante o século XVII, no final do domínio filipino (1640), o castelo é alvo de reparações, sendo-lhe colocadas as ameias, soalhados os andares da torre e alteada a muralha. A fortaleza sofre pesados danos na Guerra dos Sete Anos (1756-1763) face ao combate travado entre as tropas portuguesas e espanholas neste local. Durante as Invasões Francesas, a praça de Celorico serviu de quartel-general dos aliados e dos franceses. Manuel Ramos de Oliveira destaca o ofício n.º 74 de 2 de Agosto de 1810, enviado por Wellington do Quartel General de Celorico a D. Miguel Pereira Forjaz, onde se refere a conveniência da população abandonar as suas habitações, não só no interesse geral como no particular, citando a propósito o que sucedeu aos habitantes de Castelo Mendo, que assim não quiseram proceder. De facto, durante este período Celorico foi invadido inúmeras vezes por tropas francesas, que provocaram enormes danos materiais e pessoais no concelho, em geral, e na vila, em particular (Rodrigues:1979). No decorrer do século XX e já num avançado estado de abandono, o castelo de Celorico é, segundo os registos da DGEMN, alvo de diversas intervenções: 1936 - autorização de trabalhos de modificação nos depósitos de água junto ao castelo; 1939 - reconstrução e consolidação de paredes de alvenaria, construção de ameias de alvenaria, execução de anéis de betão armado para consolidação de paredes, reparação e substituição de cantarias, assentamento de degraus em cantaria, refechamento de juntas, execução de lajeamento de cantaria, execução de estrutura e colocação de telha na cobertura, execução de pavimento sobre vigamento de madeira, escavação de terras; 1940 - reconstrução de parede de alvenaria, construção de ameias segundo o existente, execução de anéis de betão armado para consolidação de paredes; 1941 - reconstrução de parede de alvenaria, construção de ameias segundo o existente; 1972 / 1973 - limpeza e regularização do terreno intramuros e sondagens junto às portas, rectificação da escada de acesso à porta principal das muralhas, com levantamento e reassentamento da soleira e degraus e reparação do pavimento, construção de pavimento em tijoleira ao nível da entrada da Torre de Menagem, consolidação do pavimento ao nível do 1º andar da Torre de Menagem, consolidação da estrutura da cobertura da Torre de Menagem, rectificação e consolidação das escadas de acesso à Torre de Menagem, construção de portas de madeira, consolidação dos adarves, remoção de vegetação e refechamento de juntas nos paramentos da muralha; 1973 - Diversas propostas de trabalhos de iluminação exterior. 1981 / 1982 / 1986 - iluminação exterior; IPPAR: 1996 / 1997 / 1998 / 1999 / 2000 / 2001 - obras de valorização; trabalhos arqueológicos, sendo encontradas moedas de várias épocas. 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