Copyright@2015 Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação do copyright (Lei no 9.610/98) Capa, projeto gráfico e diagramação: Voilà! Estúdio Criativo - www.voilaestudio.com.br Impressão: Juizforana Gráfica e Editora - www.juizforana.com.br Serviço de JUPIC Missionários do Verbo Divino Província BRN Rua Redentor, 32 – Paineiras 36.016-070 – Juiz de Fora/MG Coordenador: Pe Ozanan Carrara, svd Contato: [email protected] Blog: http://jupic-svd-brasil-norte.webnode.com/ Site: www.svdesdeva.com.br APRESENTAÇÃO 2015 promete ser o ano de discussão sobre a Reforma Política, na esperança de que ela realmente se efetive, apesar das decepções com as muito tímidas iniciativas do congresso nacional após as manifestações de rua que começaram em 2013, tentando mais impedir mudanças do que implementálas. Iniciativas como a da Coalizão pela Reforma Democrática e Eleições limpas, lideradas pela CNBB e OAB, juntamente com outras 99 instituições da Sociedade Civil e a da Plenária Nacional dos Movimentos Sociais deram passos mais significativos ao promoverem o abaixo-assinado, no dia 07 de setembro de 2014, em favor de um plebiscito e ao apresentarem uma série de propostas sobre a tão esperada Reforma Política. As iniciativas tomadas pelos dois grupos trouxeram várias propostas concretas que, embora diferentes, são, no entanto, complementares. No intuito de colaborar e ampliar as discussões, elaboramos este subsídio para reflexão, discussão, estudo e aprofundamento das comunidades eclesiais das paróquias e escolas verbitas, de modo particular, embora não exclusivamente para elas. Estamos convencidos, como o conteúdo dos encontros mostrará, que sem a pressão e a organização popular, nenhuma reforma sairá do papel, pois as elites políticas já começaram sua campanha de desinformação e difamação que visa desacreditar as iniciativas ora propostas, agarradas como sempre estiveram a seus privilégios e interesses, vendo qualquer iniciativa que os contrarie como subversiva, anarquista, comunista, etc. Como as mudanças mais profundas nunca vieram de cima e a base sabe disso, é preciso conscientizar os grupos populares e envolvê-los no processo para que se construa uma democracia mais participativa e popular, no Brasil. Os encontros foram preparados, tentando mostrar, nos primeiros encontros, as duas propostas que são complementares, separando-as para facilitar a compreensão e expondo a problemática que cada uma delas traz para o debate. Os últimos encontros estão voltados para um pequeno aprofundamento sobre a democracia que temos e a que queremos além de outras reformas que se fazem igualmente necessárias como a democratização da mídia, a reforma tributária e a questão do Estado que desejamos e buscamos, usando as reflexões trazidas pela 5ª. Semana Social brasileira, promovida pela CNBB. No mais, desejamos que nossas comunidades eclesiais e escolas se envolvam no processo político que estamos vivendo, ajudando a prepará-lo como cristãos e como cidadãos ativos e conscientes, sentindo-se partícipes da construção de uma outra democracia e de um outro Estado para o país. Pe Ozanan Carrara, svd – Animador de JUPIC/BRN COMO USAR ESTE SUBSÍDIO? Este subsídio se destina principalmente aos formadores de grupos de Jupic (Justiça, Paz e Integridade da Criação), grupos de fé e política e coordenadores de pastorais sociais. Jovens e seus grupos também são convidados a estudá-lo para uma compreensão mais crítica da dimensão social da fé. Por isso, damos a seguir algumas dicas aos coordenadores que poderão ajudar no uso desse material. 1. O coordenador ou coordenadores devem estudar previamente cada encontro, inteirando-se do tema a ser refletido com o grupo. É preciso preparar o ambiente, colocar os participantes em círculo para facilitar a interação, preparar ilustrações (cortes de jornais e revistas, material procurado previamente na internet, vídeos disponíveis sobre o tema indicados ao final deste subsídio, etc. 2. A sequência do encontro segue o método Ver-Julgar-Agir-ReverCelebrar. Após a colocação do tema referente a cada encontro, são oferecidos dois textos que devem ajudar no momento do julgar (olhar para o problema colocado à luz da palavra de Deus e da reflexão de alguns teólogos). Os dois textos ajudam cada um a se posicionar perante o problema colocado, julgando-o à luz do projeto do Reino de Deus e dos ensinamentos da Igreja, no Brasil. Portanto, há uma relação direta entre a introdução e os dois textos que a seguem. O terceiro momento – o do agir – deve ser feito em grupo, durante o momento proposto para discussão. Não se trata de cada um dar uma opinião pessoal, mas de relacionar a situação descrita com o projeto de Deus, ver o que não está conforme a ele, ver como a Igreja no Brasil se posicionou perante o problema. Deve-se evitar dar opiniões sem relação direta com o tema proposto e sem qualquer fundamentação. Sugerese gastar uns 20 minutos, ao menos, com a discussão que deve ser seguida de um pequeno plenário para que o grupo maior conheça o que foi discutido nos grupos menores, enriquecendo e ampliando a visão do problema. Estes três momentos são fundamentais dentro da proposta dos encontros. 3. No quarto momento (Rever), um outro pequeno texto é oferecido para ajudar no fechamento da discussão. Só então segue-se um momento de oração ou celebração. Após um momento de silêncio, abre-se um tempo para preces espontâneas que devem ser concluídas com a oração proposta e, finalmente, um canto também relacionado à temática do encontro. 4. Outras dicas práticas: A) Não correr para dar conta de todo o conteúdo. Estudá-lo com paciência, detendo-se em cada momento proposto e não passar ao seguinte enquanto todos os participantes não tiverem se inteirado do que é proposto em cada momento. B) Não fazer mais de um encontro de cada vez. Combinar sempre quem será o coordenador de cada encontro, a menos que algumas pessoas assumam a coordenação de todos os encontros. Se forem os mesmos coordenadores em todos os encontros, pedir que pessoas diferentes leiam ou orientem outros momentos do encontro e ajudem a prepará-lo. C) Cuidar para que a leitura da introdução e dos textos não seja corrida ou mal feita, pois todos devem compreender o tema proposto em cada encontro. Gravuras, fotos, vídeos e recortes devem ajudar a compreender a temática de cada encontro. A reflexão segue uma ordem progressiva de tal modo que um conteúdo não exclui o anterior. D) Pedir e incentivar a participação de todos, no momento da discussão, de modo que o estudo ajude cada um a mudar sua visão a respeito daquele assunto e a rever seus preconceitos e pontos de vista adquiridos através do senso comum ou da opinião pública passada pela mídia. A formação atinge seu objetivo quando cada um se dispõe a pensar diferente, revendo hábitos, atitudes e preconceitos, dispondo-se a atuar em algum grupo de base com proposta transformadora. No mais, desejamos que o material seja proveitoso para todos os grupos e os ajude a aprofundar sua fé. Barra Mansa, 20 de janeiro de 2015. Pe Ozanan Carrara, svd – Animador Jupic BRN SUMÁRIO Encontro I Reforma do Sistema Político: por que e para quê. 9 Encontro II Diferentes Propostas de Reforma Política que se complementam. 17 Encontro III O financiamento das Campanhas eleitorais 25 Encontro IV O financiamento democrático de Campanhas 33 Encontro V O Sistema eleitoral proporcional em dois turnos. 39 Encontro VI O Sistema eleitoral e a representação popular 45 Encontro VII Alternância de gênero e grupos étnicos nas listas partidárias 51 Encontro VIII A democracia e seus instrumentos 57 Encontro IX A democracia e seus modelos 63 Encontro X A democratização da mídia 69 Encontro XI O Sistema tributário brasileiro 75 Encontro XII O papel do Estado na atual fase do Capitalismo 81 ENCONTRO I Reforma do sistema político: por que e para quê? “É às comunidades cristãs que cabe analisarem com objetividade a situação própria de seu país e procurarem iluminá-la com a luz das palavras inalteráveis do Evangelho; a elas cumpre haurirem princípios de reflexão, normas para julgar e diretrizes para a ação na doutrina social da Igreja”. (Papa Paulo VI) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estuda-lo com cuidado e pesquisar material adicional indicado na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sites que contêm conteúdo sobre a Reforma Política: http://www.reformapoliticademocratica.org.br/; http:// plebiscitoconstituinte.org.br/; http://www.arquidiocesebh.org.br/site/downloads/ cartilha_eleicoes.pdf. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Muito se tem falado de Reforma Política desde as manifestações populares de junho de 2014. Mas o que significa uma Reforma Política, por que ela se faz necessária e quais são os seus objetivos? 2015 será o ano de discussão e organização da sociedade brasileira em prol da Reforma Política que, para que se torne realidade, deverá ocupar a reflexão de todos os grupos eclesiais e movimentos populares que devem se inteirar do que ela propõe e pressionar por sua efetivação. Reproduzimos abaixo artigo de José Antônio Moroni, da Plataforma dos Movimentos Sociais, que responde às nossas questões: LEITOR 1: José Antônio Moroni:“Não é de hoje que muitas organizações e movimentos discutem a questão da reforma do sistema político. Esta é uma agenda que permeia muitas organizações e discussões. Mas, assim como para os partidos, Executivo e Congresso, não era uma agenda prioritária até agora. Era a segunda prioridade. Algo mudou no ultimo período. Esta mudança de postura foi construída ao longo dos tempos e passou por várias etapas. Primeiramente era necessário desconstruir a ideia rasa que reforma política é o mesmo que reforma eleitoral e que dizia respeito à “vida dos parlamentares”. Portanto os sujeitos políticos reconhecidos para este debate eram os parlamentares e no máximo os partidos e o único “lugar” para o debate era o Congresso Nacional. Esta concepção de reforma política foi aos poucos sendo substituída pelo conceito de reforma do sistema político. Sistema político envolve todos os processos decisórios, portanto é uma discussão sobre o poder, sobre mecanismos disponíveis para o exercício do poder e instrumentos existentes para controlar o poder e quais os sujeitos políticos reconhecidos para o exercício do poder. Neste sentido abordar a temática da reforma do sistema político significa tratar de todas as formas de poder, tanto na esfera privada como na pública. Com isso incorporamos no debate questões que estruturam os processos de desigualdades no Brasil, as dimensões de classe, sexo, cor da pele, etnia e desejos sexuais”. 10 LEITOR 2: “Foi necessário também ter um olhar mais apurado para o nosso sistema político e identificar quais são as grandes questões que queremos enfrentar. Nesta leitura chegamos a conclusão, segundo as palavras do Prof. Fabio Comparato, que temos uma democracia sem povo. Isso é, os nossos processos democráticos não são alicerçados na soberania popular. Então, onde estão alicerçados? No poder econômico e na reprodução das desigualdades. É a velha forma, poder gera mais poder, que gera mais desigualdades. É uma ciranda que se auto-alimenta. Não é por acaso que temos um sistema onde as elites sempre estão no poder ou o poder está a serviço delas. Precisamos romper com esta “roda viva” que na verdade é a morte da soberania popular, portanto do poder popular. Um retrato disso é a subrepresentação nos espaços de poder de vários segmentos, como por exemplo, mulheres, população negra, indígena e homoafetiva, a juventude das periferias, a população camponesa, entre outros”. LEITOR 3: “Temos um poder masculino, branco e proprietário.Esta leitura do nosso sistema político nos leva a interrogações. Qual a institucionalidade que sustenta um sistema tão perverso e desigual? Que razões históricas, econômicas, sociais e culturais nos levaram a isso? Temos um arcabouço institucional que é incapaz de processar as grandes transformações desejadas pela sociedade. Isso ficou evidente não só com as manifestações de junho do ano passado. A institucionalidade que temos nos levou até aqui, teve condições de processar algumas demandas, principalmente as que vivemos no período pós-Constituição de 1988, mas é incapaz de processar grandes transformações. Estamos num impasse: para avançar precisamos criar outras institucionalidades democráticas. Porquê? Porque nunca tivemos na nossa historia política força suficiente para provocar rupturas. Sempre saímos de um “período histórico” para outro através da conciliação e não de rupturas. E esta conciliação sempre foi feita tendo como sujeito político hegemônico as forças conservadoras e as elites. Foi assim com a “independência do Brasil”, com a “abolição” da escravidão, com a proclamação da Republica, chegando a saída da ditadura militar, onde a hegemonia do processo foi das próprias forças que apoiaram o ditadura. Portanto criar novas institucionalidades significa romper com este passado conciliatório e provocar rupturas no sistema político”. LEITOR 4: “Com esta avaliação do nosso sistema político, como funciona e as questões que queremos enfrentar, formulamos duas grandes estratégias políticas que se complementam, mas que apresentam horizontes políticos diversos. Uma é a Iniciativa Popular pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas e a outra é o Plebiscito Popular pela Convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. A iniciativa popular é organizada 11 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... pela Coalizão pela Reforma Política, que promoveu um processo de dialogo e unificou a proposta da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político e a do Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral (MCCE). A iniciativa popular é um instrumento da democracia direta previsto na Constituição e tem uma serie de exigências, como por exemplo: obter perto de 1.500.000 assinaturas; não pode apresentar propostas de mudança constitucional; tem que ter o numero do titulo eleitoral, etc. Mas ela consegue, mesmo com estes limites, enfrentar questões importantes e estruturais do nosso sistema político, como o peso do poder econômico nas eleições, a subrepresentação de vários segmentos no parlamento, fortalecer os instrumentos da democracia direta e criar mecanismos democráticos de controle e fiscalização do processo eleitoral”. LEITOR 5: “A iniciativa popular é uma estratégia que se propõe atuar em um tempo político mais curto, isso é, mobilizar a sociedade para forçar que este Congresso aprove uma reforma política que responda aos anseios de amplos segmentos da sociedade. Como a Iniciativa popular faz isso? Na questão do financiamento propõe mecanismos democráticos proibindo o aporte de recursos por parte das empresas. As eleições passariam a ser financiadas com recursos do orçamento público, de contribuições de pessoas físicas. Tudo isso com limites e como estratégia de democratizar o processo, combater a corrupção, limitar e baratear os custos das campanhas. Propõe um sistema de escolha dos/as representantes em dois turnos. Os partidos elaboram de forma democrática listas partidárias com alternância de sexo e critérios de inclusão dos demais segmentos subrepresentados. O primeiro turno visa definir quantas cadeiras no parlamento o partido vai ter. No segundo turno participa o dobro de candidatos e o/a eleitor/a vota no nome de seu representante. Para fortalecer a democracia direta propõe que determinados temas só possam ser decididos por plebiscitos e referendos, como por exemplo: grandes projetos com grandes impactos socioambientais, privatizações, concessões de bens públicos, megaeventos com recursos públicos, entre outros. Para conhecer na integra a proposta da Iniciativa Popular acessar: www.reformapoliticademocratica.org.br”. LEITOR 6: “Já o plebiscito popular abarca três estratégias: trabalho de base, formação política e discussão ampla com a sociedade. Busca-se debater a institucionalidade que temos e a que queremos (sistema político) e o lócus político para se fazer esse debate é a convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana. Neste sentido o horizonte político do plebiscito popular é mais longo prazo, é de acumular forças na sociedade para poder provocar as rupturas que precisamos. Neste sentido é importante o processo de conquista de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana. Esta mesma demanda 12 por uma Constituinte Exclusiva e Soberana esteve presente em 1985. Mas, não tivemos força política suficiente para torná-la realidade na ocasião e tivemos uma Constituinte Congressual (o Congresso que fez), sem soberania (pois estava subordinada a vontade do executivo, dos militares e do poder judiciário). Em outras palavras, para provocar as rupturas que precisamos, urge criar novas institucionalidades onde o alicerce do poder é a soberania popular, onde o poder constituinte seja a próprio poder popular. Para ter acesso ao debate do plebiscito, ver: http://plebiscitoconstituinte.org.br/. Como percebemos não tem contradição entre as duas estratégias e ambas procuram criar novas institucionalidades capazes de provocar as transformações estruturais que tanto precisamos”. [Jose Antonio Moroni é membro do INESC e da Plataforma dos Movimentos Sociais da Reforma do Sistema Político] 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: 1 Samuel 12, 1-4; 12-16. Quando o povo pede a Samuel mudanças no sistema social e político, ele os adverte, em nome de Javé, a respeito das consequências da passagem para o sistema tributário, dirigido por um regime monárquico. Samuel lhes recorda o que significou a autoridade dentro do regime tribal quando o povo não era explorado nem oprimido e faz previsões sombrias sobre a implantação do regime monárquico. “Samuel disse a todo o Israel: ‘Vejam. Atendi vocês em tudo o que me pediram; estabeleci um rei para vocês. De agora em diante, é o rei quem estará à frente de vocês. Eu já estou velho, de cabelos brancos, e meus filhos aí estão no meio de vocês. Fiquei à frente de vocês desde a minha juventude até hoje. Aqui estou eu. Deponham contra mim diante de Javé e do seu ungido. De quem tomei um boi e de quem tomei um jumento? A quem explorei e a quem oprimi? De quem recebi dinheiro para fechar os olhos sobre o caso? Eu restituirei a vocês’. Eles disseram: ‘Você não explorou, nem oprimiu nem tirou nada de ninguém’. (...) Mas quando vocês viram Naás, rei dos amonitas, marchando contra vocês, me disseram: ‘Não importa. Queremos ser governados por um rei’. No entanto, Javé seu Deus é o rei de vocês! Agora, aí está o rei que vocês escolheram e pediram: Javé deu um rei para vocês! Se temerem a Javé e o servirem, se lhe obedecerem e não se opuserem a ele, tanto vocês, como o rei que reina sobre vocês, seguirão a Javé seu Deus. Mas se vocês não obedecerem a Javé e se opuserem a ele, então a mão de Javé pesará sobre vocês e sobre seu rei”. 13 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “No exercício de funções políticas, eletivas ou não, os militantes cristãos descobrem algo de que só agora o socialismo real se dá conta: na história, o fator subjetivo é de grande importância e pode até ser preponderante. Não há teoria política ou mecanismo econômico que, por si, façam nova a sociedade. O desafio de se construir o homem e a mulher novos torna-se premente quando se constata o quanto velhas práticas se repetem e antigos vícios perduram sob novas ideias e propósitos. De sua parte, os militantes cristãos sabem que possuem, na fé, um precioso capital a ser investido nesse desafio. A prática de Jesus, os valores evangélicos e a sabedoria bíblica apresentam-se como utopias normativas a serem efetivamente alcançadas, de modo a se criarem novas relações humanas e políticas condizentes com o projeto revolucionário. O aprofundamento da vida de fé surge, pois, como exigência da radicalidade do projeto político. (...) É preciso enfrentar a questão ética e os valores evangélicos se constituem num manancial privilegiado, capaz de livrar a prática política de marcas herdadas dos longos tempos de opressão, onde o modelo predominante caracteriza-se pela ambição pessoal, oportunismo, mentira, vingança e corrupção”. (Frei Betto, Da Mística e da Política. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 24). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM GRUPOS... A partir dos textos acima, discuta em pequenos grupos: 1. Quais os aspectos da nossa conjuntura política que precisam ser mudados? O que lhe parece mais problemático no atual sistema político brasileiro? 2. Discuta as mudanças que estão sendo propostas pelas entidades que pressionam pela reforma política e aponte aquelas que você acha mais adequadas e pertinentes para sua realidade local. 14 6. PARA REFLETIR! Os 10 mandamentos da relação Fé e Política (Frei Betto) 1º MANDAMENTO: A fé e a política destinam-se ao mesmo objetivo de realizar o projeto de Deus na história. Mas não são a mesma coisa, são diferentes. 2º MANDAMENTO: A vivência da fé é necessariamente política. 3º MANDAMENTO: A fé é um dom que nos vem de Deus através da Igreja – da comunidade dos que creem. A política é uma ferramenta que exige aprendizado. 4º MANDAMENTO: Uma política contrária aos direitos do povo faz da fé expressão de uma religião “ópio do povo”. 5º MANDAMENTO: A política tem autonomia e não depende da fé. 6º MANDAMENTO: Fé e política são coisas diferentes que se complementam na prática da vida. 7º MANDAMENTO: A fé é especialmente ‘tratada’ na Igreja, onde é celebrada, anunciada e refletida. A política é diretamente ‘tratada’ nos movimentos populares, sindicais e nos partidos políticos que assumem os direitos dos oprimidos. 8º MANDAMENTO: Não devemos confundir a esfera da explicitação religiosa da fé, a Igreja, com as esferas da política. Mas, embora diferentes, são complementares. 9º MANDAMENTO: O Evangelho contém valores que criticam e norteiam a atividade política. 10º MANDAMENTO: A política é tanto mais popular quanto mais a gente se encontra ligada à luta do povo. A fé é tanto mais evangélica quanto mais a gente se liga ao Deus da vida através da comunidade cristã. 7. MOMENTO DE ORAÇÃO. ORAÇÃO DA CF/2015 Após um momento de preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Ó Pai, Alegria e esperança de vosso povo, vós conduzis a Igreja, servidora da vida, nos caminhos da história. A exemplo de Jesus Cristo e ouvindo sua palavra que chama à conversão, seja vossa Igreja testemunha viva de fraternidade e de liberdade, de justiça e de paz. Enviai o vosso espírito de Verdade para que a sociedade se abra à aurora de um mundo justo e solidário, sinal do Reino que há de vir. Por Cristo Senhor nosso. Amém. 8. CANTO FINAL: “Deus chama a gente pra um momento novo” ou outro à escolha do grupo. 15 ENCONTRO II Diferentes Propostas de Reforma Política que se Complementam “O poder não é um ser, mas uma relação. Mais ainda, é um conjunto de relações, por meio das quais indivíduos ou grupos interferem na atividade de outros indivíduos ou grupos”. CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional indicado na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. Outros sites que contêm conteúdo sobre a Reforma Política e suas diferentes propostas: http:// cnbb.org.br/publicacoes-2/documentos-para-downloads-2/cat_view/491coalizacaodemocratica-eleicoes20; http://www.abong.org.br/final/download CartilhaPlebiscitoReformaPol%C3%ADtica.pdf. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Como demonstra abaixo o professor Pedro Ribeiro de Oliveira, há diferentes propostas de Reforma Política que, embora diferentes, não estão em contradição umas com as outras, mas se complementam naquilo que é essencial para a mudança de nosso sistema político. Acompanhemos a reflexão do professor: LEITOR 1: Pedro A. Ribeiro de Oliveira: “Hoje está claro que a reforma do sistema político brasileiro é condição prévia para as reformas estruturais: do Estado, Agrária e Fiscal com auditoria da dívida pública. Não está claro, contudo, como ela deve ser encaminhada. Enquanto a Plenária Nacional dos Movimentos Sociais Brasileiros organiza o plebiscito popular em favor da convocação de uma Constituinte exclusiva, a Coalizão pela Reforma Democrática e Eleições Limpas promove a coleta de assinaturas em favor do projeto de Lei de Iniciativa Popular. Essas duas iniciativas da sociedade civil são de grande valor, desde que uma não anule a outra. O problema é que a diferença entre as duas propostas está se transformando em divergência que as enfraquece. Quero defender aqui a tese de que não há contradição entre elas, pois podem se reforçar mutuamente.” LEITOR 2: “Pesquisa da Fundação Perseu Abramo mostra que a maioria da população (89%) é favorável à Reforma Política e que 75% a consideram “muito importante”. Mostra também que falta clareza “técnico-política”: as respostas referem-se a combate à corrupção (15%) e privilégios (26%), mais controle social e melhor escolha de representantes (27%); outras referem-se a melhores políticas de saúde, segurança, salarial, educacional, etc. Essa confusão pode ser observada até mesmo entre lideranças de movimentos sociais, que pensam que 18 mais de 1,5 milhão de assinaturas tornam obrigatório o resultado do plebiscito popular. Diante dessa desinformação, é preciso ter claro o que busca cada proposta.” LEITOR 3: Projeto da Coalizão Democrática: “O Projeto de Lei de Iniciativa Popular pela Reforma Política, nasceu do convite da CNBB a entidades da sociedade civil que hoje chegam a quase 100. Para agregar tantas entidades, a proposta teve que limitar-se a pontos consensuais e não proíbe coligações em eleições proporcionais, como é desejo de muitos. Em compensação traz pelo menos uma inovação de grande importância: a regulamentação das doações para campanhas eleitorais. Vejamos rapidamente o conjunto de propostas desse projeto de lei: A. Proibição do financiamento de campanha por empresa. Instauração do financiamento democrático de campanha, constituído do financiamento público e de contribuição de pessoa física limitada a R$ 700,00. B. Adoção do sistema de “voto transparente” pela introdução de dois turnos de votação também nas eleições proporcionais (deputados e vereadores): o eleitor vota primeiramente no partido e depois escolhe um dos nomes da lista; C. Alternância de gênero nas listas de candidatos do item anterior; D. Regulamentação dos instrumentos da Democracia Participativa, reduzindo-se as exigências para a sua realização e facilitando-se sua tramitação no Congresso; E. Fortalecimento e democratização dos partidos, para impor programas partidários efetivos e vinculantes; F. Aumento da participação política de afrodescendentes e indígenas; G. Criação de instrumentos que assegurem equilíbrio do pleito entre todos os partidos e candidatos. Merece especial atenção a proposta de regulamentação das doações.” LEITOR 4: “Na atual situação, qualquer empresa pode contribuir financeiramente para custear campanhas eleitorais. Torna-se um bom negócio para a empresa ajudar candidatos que depois de eleitos vão lhe prestar serviços dentro do governo ou defender seus interesses no Parlamento. Basta lembrar a liberação de agrotóxicos, de mineração e de remédios, a especulação urbana, a isenção fiscal ao agronegócio, o favorecimento a empreiteiras de obras públicas e a política de juros altos. Por isso se diz que empresário não faz doações, faz investimentos. Essa promiscuidade entre o interesse público e interesses privados é imoral e tende a descambar para a corrupção. Além disso, o financiamento das campanhas por empresas eleva muito o seu custo, porque o dinheiro sai do caixa da empresa e não do bolso do empresário. A revista 19 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... Carta capital de 22/03/2014 traz o exemplo da Oi. Entre seus acionistas está, além de fundos estatais como BNDESPar, Previ e Funcef, a Andrade Gutierrez (representada pela AG Telecom), umas das empreiteiras que mais faz doação de campanha. Para se ter uma ideia dos valores envolvidos, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a construtora doou para campanhas do PMDB de Eduardo Cunha (que puxou a oposição ao marco civil da internet) um total de R$ 20,6 milhões em 2010 e R$ 14,8 milhões em 2012.” LEITOR 5: “Há então flagrante contradição: pessoas jurídicas, que não têm direito a voto, de fato influem muito mais no resultado das eleições do que quem, ao votar, exerce o direito de cidadania. Essa contradição foi levada ao Supremo Tribunal Federal pela Ordem dos Advogados do Brasil sob a forma de ação direta de inconstitucionalidade. No dia 2 de abril o STF julgou a ação. Vale a pena transcrever parte do voto do ministro Marco Aurélio:”Segundo dados oficiais do Tribunal Superior Eleitoral, nas eleições de 2010, um deputado federal gastou, em média, R$ 1,1 milhão, um senador, R$ 4,5 milhões, e um governador, R$ 23,1 milhões. A campanha presidencial custou mais de R$ 336 milhões. Nas eleições municipais de 2012, segundo recente contabilização do Tribunal, teriam sido gastos incríveis 6 bilhões de reais. Apontou-se que os maiores financiadores são empresas que possuem contratos com órgãos públicos. O setor líder é o da construção civil, tendo contribuído com R$ 638,5 milhões, seguido da indústria de transformação, com R$ 329,8 milhões, e do comércio, com R$ 311,7 milhões.” Embora a votação tenha sido suspensa por interferência do juiz Gilmar Mendes, o resultado já está definido: a maioria do STF (os 6 votos já proferidos) são pela inconstitucionalidade das doações de empresas. A notícia é ótima mas ainda não significa a vitória final da proposta, porque já corre no Congresso um movimento para mudar a Constituição e tornar legal aquela prática. Nesse contexto, o projeto de Lei de Iniciativa Popular torna-se ainda mais importante, porque impedirá essa tentativa de retrocesso legal.” LEITOR 6: A proposta de plebiscito popular: “A proposta da Plenária Nacional dos Movimentos Sociais Brasileiros visa realizar um plebiscito popular sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusivamente para fazer a Reforma Política. Embora não tenha valor jurídico, por não ser reconhecido oficialmente, o plebiscito tem força moral quando recolhe um número significativo de votos. Basta lembrar o resultado positivo dos plebiscitos populares sobre a Dívida Externa e sobre a ALCA, que se converteram em força de pressão da sociedade sobre o governo. Também este poderá ser um valioso instrumento em favor da convocação de uma Assembleia Constituinte capaz de fazer a Reforma Política sem submeter-se aos interesses corporativos dos 20 membros do Congresso Nacional. Além disso, a mobilização para o Plebiscito Popular é uma excelente oportunidade para fazer-se o trabalho de educação política de massa, esclarecendo à população como funciona o Congresso, como se dá o processo eleitoral, para que servem os partidos políticos, e outros temas relevantes. Até a semana do 7 de setembro esse trabalho educativo deve mobilizar os Movimentos Sociais, de modo a obter um bom resultado em termos de votos. Conclusão: As duas propostas se complementam. A primeira busca efetividade, pois projeto de lei de iniciativa popular respaldado por quase 2 milhões de assinaturas tem muito peso no Congresso. A segunda promove a conscientização política, trazendo para toda a sociedade o debate de questões que a mídia insiste em esconder ou deturpar. Se não há contradição entre elas, a hora é de unir forças e evitar qualquer desqualificação dessas propostas. [Pedro A. Ribeiro de Oliveira é consultor de ISER/Assessoria] 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: 1 Samuel 8, 10-18. A tentação de um poder político centralizado sempre rondou o povo de Israel, mas o risco desse poder central é que ele abandone o projeto de Javé, deixando assim de servir ao seu principal destinatário, o povo, e se firme exatamente às custas da exploração e opressão exercidas sobre este mesmo povo. “Samuel transmitiu todas as palavras de Javé ao povo que lhe pedia um rei. E lhes disse: “Este é o direito do rei que governará vocês: ele convocará os filhos de vocês para cuidar dos carros e cavalos dele, e correr à frente do seu carro. Ele os nomeará chefes de mil e chefes de cinquenta. Ele os obrigará a ararem a terra dele e fazerem a colheita para ele, a fabricarem para ele armas de guerra e as peças dos seus carros. As filhas de vocês serão convocadas para trabalhar como perfumistas, cozinheiras e padeiras. Ele tomará os campos, as vinhas e os melhores olivais de vocês, para dá-lo aos ministros. Pegará a décima parte das plantações e vinhas de vocês, e as dará aos oficiais e ministros. Os melhores servos e servas, os bois e jumentos de vocês, ele os tomará para que fiquem a serviço dele, e cobrará, como tributo, a décima parte dos rebanhos. E vocês mesmos serão transformados em escravos dele. Quando isso acontecer, vocês se queixarão do rei que escolheram. Nesse dia, porém, Javé não dará nenhuma resposta a vocês”. 21 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “É lamentável constatar que, hoje, os movimentos espirituais na Igreja se identificam com o que há de mais reacionário e servem para legitimar um aparente apoliticismo que, de fato, é conivência com a exploração capitalista”. (...) Seja estimulando uma ‘Igreja paralela’ (...), seja fortalecendo a expansão de uma espiritualidade centrada na privatização da fé. Em geral, espiritualidade originária de países sob ditadura, como a Espanha de Franco, relegando-se ao Estado a dimensão social e política da fé e reservando à Igreja o cuidado da vida espiritual aparentemente despolitizada – mas, de fato, conivente com a ordem vigente. Prova disso é que todo o potencial político aí contido emerge abruptamente quando tal ordem se vê ameaçada – por uma eleição, por uma política que afeta os interesses do capital ou por uma revolução. Então, o que se proclamava apolítico transforma-se, como por encanto, na mais ferrenha trincheira reacionária, inclusive capaz de patrocinar o terrorismo. Enfim, é preciso romper a bipolaridade entre mística cristã e práxis política. Esta é uma tarefa de incalculável importância histórica. Articular fé e política, recuperar a experiência mística, resgatar os místicos, redescobrir a espiritualidade de Jesus – são desafios imprescindíveis à construção do homem e da mulher novos encarados sob a ótica cristã. Só assumindo-os é possível consolidar práticas e valores que preparem a qualidade – não só desse atual desempenho partidário-administrativo – mas também do futuro socialista brasileiro. Na história, como na vida, colhe-se amanhã o que se planta hoje”. (Frei Betto, Da Mística e da Política. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 27-28). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discuta em grupos: 1. Você acredita no aparente “apoliticismo” de alguns grupos católicos conservadores que se apresentam como “neutros” politicamente? Acha que é possível a “neutralidade política” que eles julgam representar? 2. O que dizer do comportamento de tais grupos em épocas eleitorais quando, sob a aparência de neutralidade, apoiam candidatos e grupos reacionários e da direita política? 22 6. PARA REFLETIR! O PODER DEMOCRÁTICO. “Regra geral, estamos preparados para perceber o sentido da política antes na violência do que no diálogo, antes na coerção do que na liberdade. E quanto ao poder, se alguém nos pergunta o que é isso, as primeiras imagens que nos ocorrem são sobre os aparatos de poder. São sobre o poder como coisa. Seria casual na tradição política brasileira a referência tão constante nos discursos oficiais aos “poderes constituídos”? É que a tradição – conservadora e autoritária – faz de tudo para obscurecer a dimensão essencialmente constituinte da noção de poder, ou seja, o poder como algo que se cria, como associação livre de vontades. Para a tradição, é mais fácil perceber, por exemplo, o poder de um burocrata que apenas implementa decisões de outros, do que o poder de uma proposta política que mobiliza enormes quantidades de pessoas para chegar a determinadas decisões. Percebe melhor o poder morto do “aparelho”, da ‘máquina”, do que o poder vivo, potencialmente transformador, das relações políticas reais. No limite, vê no poder a capacidade da repressão muito mais do que a da libertação”. (Weffort, Francisco. Por que democracia? SP: Brasiliense, 1984, p. 35). 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Tu nos chamaste, Senhor, para sermos servidores na construção do teu Reino. Nós te agradecemos, porque, com essa missão, nos ofereces muitas oportunidades de crescimento. Ajuda-nos a usar os dons e os talentos que nos deste para servir aos que precisam de apoio e ajuda. Ensina-nos a partilhar o que somos e o que temos para vivermos todos numa grande comunidade de irmãos que se amam e juntos podem servir melhor. Se estivermos desanimados, renova nossas forças para sermos capazes de colocar em prática o que Jesus ensinou. Graças te damos, Senhor, porque nos orientas com tuas leis e nos animas a seguir pelo caminho da paz, da caridade e da justiça. Amém. 8. CANTO FINAL: Igreja é povo ou outro à escolha do grupo. 23 ENCONTRO III O Financiamento das Campanhas Eleitorais “O Deus a quem das mais diversas formas e maneiras sempre de novo se rende tributo é simplesmente o grande Deus da era moderna: o Deus Progresso, o Deus Sucesso! Isto quer dizer: em vez de transcendência, eficiência; em vez de abertura para uma outra dimensão, o lucro, a carreira, o prestígio e o sucesso a qualquer preço”. (Hans Kung) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Para entender o problema do financiamento privado das campanhas eleitorais, reproduziremos abaixo parte do texto da Cartilha sobre a Reforma Política da Coalizão democrática. Vejamos o que ele tem a nos dizer: LEITOR 1: “O problema estrutural mais grave que afeta o processo democrático brasileiro é o financiamento de campanha eleitoral por empresas, uma das principais causas da corrupção no Brasil. Isto porque o poder político daí originado não representa os interesses da maioria da população brasileira. O atual sistema de financiamento de campanha eleitoral é misto, com recursos públicos e privados. Os recursos públicos se destinam ao Fundo Partidário que visam à manutenção da vida partidária e, nas eleições, asseguram o tempo de rádio e televisão utilizados pelos partidos. O financiamento dos candidatos se origina de recursos privados, de pessoas físicas e de empresas, pessoas jurídicas. A contribuição das empresas ao financiamento das campanhas eleitorais representa mais de 95% do total arrecadado. Com o objetivo de analisar a influência do poder econômico no processo eleitoral foi realizada uma Audiência Pública no Supremo Tribunal Federal. A audiência teve como objetivo dar elementos ao relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pela OAB sobre o financiamento de campanhas por empresas. Na oportunidade várias entidades e personalidades demonstraram, com dados, as graves consequências do financiamento de campanha por empresas. Foi demonstrado que os gastos gerais da campanha eleitoral de 2002 atingiram 800 milhões de reais e em 2010, com um crescimento de 600%, atingiram a cifra de 4,5 bilhões. Nas eleições de 2010, 1% dos doadores de campanha contribuiu com 61% do total das contribuições e 10 deles com 22%. Um dado revelador indica que as contribuições foram feitas por um pequeno grupo que corresponde a 0,5% das empresas brasileiras. Ou seja, há uma grande concentração num número pequeno de empresas que destinam recursos para as campanhas eleitorais”. 26 LEITOR 2: “Em 2012 as dez maiores financiadoras privadas de campanha doaram R$ 92 milhões, sendo que 75% foram de empreiteiras. Somente duas doaram R$ 44.345.000. Estas são contribuições legais sendo que existem ainda as contribuições ilegais (Caixa-2). A relação entre o financiamento de campanhas e o resultado eleitoral foi apresentada em estudo realizado pelo Departamento Intersindical de Assistência Parlamentar (DIAP). Nele ficou comprovado que dos 594 parlamentares (513 deputados e 81 senadores) eleitos em 2010, 273 são empresários, 160 compõem a bancada ruralista e apenas 91 parlamentares são 4considerados representantes dos trabalhadores”. LEITOR 3: “A ONG - Transparência Brasil apresentou outros dados que jogam mais luz no esclarecimento deste processo. Ela constatou que, no geral, o candidato a deputado que se elegeu em 2006, gastou R$ 4,80 por voto obtido. Em 2010 o 5 gasto foi de R$ 9,50, num astronômico aumento de 97,8% . Estes dados revelam a força do poder econômico no Congresso Nacional Brasileiro. Esta influência determina que, cada vez mais, a grande maioria dos eleitos representa seus financiadores e não seus eleitores. Tal fato resulta em que o poder econômico passa a ter uma representação política muito grande. Ou seja, uma minoria na sociedade se transforma em maioria nas instâncias de poder e corrompe o princípio constitucional da soberania popular. Esta maioria defende interesses privados de seus financiadores e não da sociedade, gerando a atual crise de representação política no país”. LEITOR 4: “O financiamento de campanha por empresas, além de encarecer cada vez mais as eleições, é um canal da corrupção eleitoral. O empresário declara legalmente uma pequena parte do financiamento de campanha e a maior parte é repassada através do “Caixa 2”, doação ilegal, não registrada na Justiça Eleitoral. Calcula-se que estas contribuições representem 80% do 6financiamento das campanhas eleitorais . Visando abrir caminho para o aprofundamento da democracia no país, a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o financiamento de campanhas eleitorais por empresas. Ela fundamentou sua proposição alegando que este financiamento agride o princípio constitucional inscrito no parágrafo único do artigo 1º da Constituição Brasileira que estabelece: “Todo poder emana do povo que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição”. Com base neste dispositivo a OAB afirmou a inconstitucionalidade do financiamento de campanhas eleitorais por empresas. Para a entidade, as empresas não sendo povo, não podem ser fonte do poder. A consistência desta argumentação é tal que no STF, o Ministro Relator da ADIN e mais cinco outros Ministros já acataram a argumentação da OAB. Estes seis votos constituem a maioria da Suprema Corte o que assegura o reconhecimento da 27 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... inconstitucionalidade do financiamento privado. O Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, também Ministro do STF, manifestou sua posição favorável à inconstitucionalidade. Reagindo a esta decisão do STF, membros de um outro grupo de trabalho da Câmara dos Deputados apresentou uma emenda constitucionalizando o financiamento de campanhas por empresas, indo na contramão da decisão do STF. Todavia como a questão envolve cláusula pétrea – a origem do poder – esta iniciativa antidemocrática não pode ser objeto de emenda constitucional”. Extraído de: http://cnbb.org.br/ publicacoes-2/documentos-para-downloads-2/cat_view/491-coalizacaodemocratica-eleicoes20. LEITOR 5: Sobre o financiamento da campanha eleitoral de 2014 por empresas, o jornal “O Estado de São Paulo” publicou: “Sete de cada dez deputados federais eleitos receberam recursos de pelo menos uma das dez empresas que mais fizeram doações eleitorais em 2014. Os top 10 doadores contribuíram financeiramente para a eleição de 360 dos 513 deputados da nova Câmara: 70%. É uma combinação inédita de concentração e eficiência das doações por parte das contribuidoras”. (...) “Os 360 deputados que elas financiaram estão distribuídos por 23 partidos diferentes”. “A maior bancada é a do bife. Empresas do grupo JBS (ou que têm os mesmos sócios) distribuíram R$ 61,2 milhões para 162 deputados eleitos. Dona dos maiores frigoríficos do País, a JBS deu recursos para a cúpula de 21 dos 28 partidos representados na nova Câmara, incluindo todos os grandes. (...) Além de ter sido a maior doadora, a JBS acabou elegendo a mais numerosa bancada da Câmara - mais do que o dobro da do maior partido, o PT. Não foi a única que tentou não deixar nenhuma sigla a descoberto. O Grupo Bradesco doou R$ 20,3 milhões para 113 deputados eleitos por 16 partidos. É a segunda maior bancada empresarial. Ficou à frente do grupo Itaú, que contribuiu para a eleição de 84 novos deputados de 16 partidos. Mas o concorrente foi mais econômico com o dinheiro: gastou “só” R$ 6,5 milhões. Há 42 deputados que foram financiados por ambos os bancos. O Bradesco privilegiou as direções partidárias. O Itaú doou mais a candidatos”. Como setor, as empreiteiras têm a maior presença entre os top 10 doadores da nova Câmara. Cinco delas entraram na lista: OAS, Andrade Gutierrez, Odebrecht, UTC Engenharia e Queiroz Galvão. A OAS investiu R$ 13 milhões para ajudar a eleger 79 deputados de 17 partidos - do PT ao PSDB, passando por PMDB e todos os grandes. Já a Andrade Gutierrez gastou quase o mesmo valor e ajudou a eleger 68 deputados federais. A Odebrecht doou R$ 6,5 milhões para 62 deputados, a UTC deu R$ 7,2 milhões para 61 deputados, e a Queiroz Galvão, R$ 7,5 milhões para 57 parlamentares. (...) A bancada do concreto na nova Câmara tem 214 deputados de 23 partidos. Isso não inclui parlamentares que receberam doações de empreiteiras 28 que não entraram nos top 10, como C.R. Almeida. O grupo Vale elegeu a terceira maior bancada empresarial. Foram 85 os deputados eleitos - de 19 partidos - que receberam uma parte dos R$ 17,7 milhões doados pela empresa. (...) Como a JBS, outra empresa voltada ao consumo popular se destacou nestas eleições: a Ambev (dona das marcas Brahma e Antarctica, entre outras), que doou R$ 11,7 milhões e ajudou a eleger 76 deputados de 19 partidos. A bancada do churrasco, que recebeu do frigorífico e da cervejaria, soma 25 deputados. (Fonte: http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,as- 10-empresas-que-mais-doaram-em-2014-ajudama- eleger-70-da-camara,1589802, 10/11/2014. 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Deuteronômio 14, 22-29 Na cultura bíblica, toda a produção é dom gratuito de Deus e sinal da bênção divina. Para que não se perca essa consciência e para mpedir o espírito de posse, instituiu-se o dízimo que devia ser repartido entre todos ( e não somente entregue aos acerdotes) já que de graça tudo foi também recebido. Isso levava à criação de relações econômicas justas que impediam as desigualdades sociais de se aprofundarem. “Todos os anos você separará o dízimo de qualquer produto de seus campos e o comerá diante de Javé seu Deus, no lugar que ele tiver escolhido para aí fazer habitar o nome dele; nesse lugar você comerá o dízimo do trigo, do vinho novo e do óleo e também os primogênitos das vacas e das ovelhas, para que você aprenda continuamente a temer Javé seu Deus. Se o caminho for longo demais e você não puder levar o dízimo, porque fica muito longe o lugar escolhido por Javé seu Deus para aí colocar o nome dele e Javé seu Deus tiver abençoado você, então venda, pegue o dinheiro e vá ao lugar que Javé seu Deus tiver escolhido. Aí você trocará o seu dinheiro por aquelas coisas que desejar: vacas, ovelhas, vinho, bebida embriagante, tudo o que você quiser. Você comerá aí diante de Javé seu Deus, e festejará com a família. Mas não abandone o levita que mora em suas cidades, pois ele não tem parte nem herança com você. A cada três anos você pegará o dízimo da colheita do ano e o colocará nas portas da cidade. Então virá o levita que não recebeu uma parte da herança de vocês, o imigrante, o órfão e a viúva que vivem nas suas cidades, e comerão até ficarem saciados. Desse modo, Javé seu Deus abençoará você em todo trabalho que você realizar”. 29 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “O desencanto geral em relação à atividade política é um fato inegável e é hoje quase um ‘lugar comum’. Tal descrédito que sempre acompanhou essa atividade em nível do povo e inclusive de intelectuais, atinge hoje um grau e uma extensão nunca antes alcançados. A desafeição é geral: atravessa toda a sociedade e todas as sociedades, tanto no norte como no sul do mundo. Não se acredita mais que mudanças decisivas cheguem pela via dos partidos. Quais são as razões disso? Olhando a questão por seu lado macro-dimensional, podemos dizer, em primeiro lugar, que o neoliberalismo imperante muito contribui para o descrédito do empenho político na medida em que dá prioridade ao mercado sobre qualquer outra instituição social, inclusive sobre as instâncias políticas, como o Estado, o Parlamento e os Partidos. Em seguida, a queda do socialismo real levou consigo à queda da confiança nas lutas políticas para a transformação do sistema. Nos meios de esquerda, instala-se assim certa resignação e opta-se por se esconder atrás do “pensamento fraco”, rescaldo do dogmatismo anterior. As análises, os projetos e as estratégias não chegam a se definir claramente e obter o consenso requerido. Enfim, a mentalidade pós-moderna, expressiva de certos meios, particularmente juvenis, não é apta a favorecer o engajamento político: ela não acredita nas grandes causas ou nos grandes projetos, privilegia a subjetividade do desejo consumista e do sentimento individualizado e opta por um hedonismo desencantado. Contudo, pode-se perguntar se é propriamente contra a política como tal que se dá a referida desafeição, ou se não é mais precisamente contra a “política que está aí”, contra a forma vigente de fazer política”. (Clodovis Boff, Fé e Política: alguns ajustes. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 30). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discuta em pequenos grupos: 1. Você percebe nitidamente a influência do poder econômico nas campanhas eleitorais em sua região? Dê exemplos concretos! 2. Você acha que essa influência do poder econômico é um obstáculo à implantação de uma verdadeira democracia no país? Conversar sobre as três razões que Frei Clodovis Boff apresenta para o descrédito da política atual. 30 6. PARA REFLETIR! Os seis novos mandamentos das novas tábuas da lei do neoliberalismo. 1º Não podes resistir à globalização dos capitais, dos mercados, das finanças e das empresas. Deves adaptarte a ela sem pôr qualquer dificuldade. 2º Não podes resistir à inovação tecnológica. Deverás inovar constantemente para reduzir gastos e mão-de-obra e melhorar os resultados, mesmo que isso gere desemprego. 3º Deverás liberar completamente os Mercados, renunciando à proteção das economias nacionais. 4º Transferirás todo poder ao Mercado, e o Estado se converterá em mero notário da realidade ou em simples executor de ordens. 5º Tenderás a eliminar qualquer forma de propriedade pública e os serviços públicos, privatizando tudo o que é privatizável e deixando o governo da sociedade nas mãos das empresas privadas. 6º Deverás chegar a ser o mais forte, se quiseres sobreviver no meio da brutal competitividade mundial. Do contrário, serás eliminado do Mercado (que é como ser eliminado do Reino dos Céus). ( Ricardo Petrella) 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Apelo a Lázaro. Pelo amor que tenho aos ricos – a quem não devo julgar, a quem não posso julgar e que custaram o sangue de Cristo – eu te peço, Lázaro, não fiques nas escadas e não te deixes enxotar... Irrompe banquete adentro, vai provocar náuseas nos saciados convivas. Vai levar-lhes a face desfigurada de Cristo de que tanto precisam sem saber e sem crer. (Dom Hélder Câmara) 8. CANTO FINAL: Hino da CF/2010 ou outro à escolha do grupo. 31 ENCONTRO IV O Financiamento Democrático de Campanha “Há três tipos de pessoas: as que identificam felicidade com prazer; as que identificam felicidade com honra; e as que identificam felicidade com sabedoria. As primeiras mostram alma de escravos e vivem como bestas; as segundas dedicam-se à política; as terceiras vivem segundo a inteligência e conhecem o amor”. (Aristóteles. Ética) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA LEITOR 1: A proposta da coalizão democrática das 101 entidades da sociedade civil coordenada por CNBB e OAB é que o poder público financie as campanhas eleitorais para evitar que o poder econômico se imponha e dite as regras. Transcrevemos a proposta: “Para dar resposta à influência do poder econômico nas eleições o projeto prevê a proibição do financiamento de campanhas por empresas e propõe o Financiamento Democrático de Campanha. Este tipo de financiamento visa criar condições de uma disputa igualitária e democrática. O Financiamento Democrático de Campanha será realizado através do Fundo Democrático de Campanha e do financiamento de pessoas físicas. O Fundo Democrático de Campanha será constituído por recursos do Orçamento Geral da União, multas administrativas e penalidades eleitorais. Os recursos do Fundo serão destinados exclusivamente aos partidos políticos. No segundo turno das eleições proporcionais, os candidatos receberão do partido recursos em igualdade de condições. O financiamento de pessoas físicas será de, no máximo, R$ 700,00, corrigidos por índices oficiais, a cada eleição. E o total destas contribuições não poderá ultrapassar 40% dos recursos públicos destinados ao candidato. Isto para impedir uma nova forma de influência do poder econômico nas eleições com repasse de recursos a determinado candidato por intermédio de “laranjas”. A Justiça Eleitoral ficará encarregada de organizar um Fórum de Controle Social do Fundo Democrático de Campanha. Constatada a contribuição ilegal de empresas o candidato terá seu registro de candidatura cassado, a empresa ficará proibida de contratar com o poder público por cinco anos e receberá multa de 10 vezes o valor da contribuição. A contratação de pessoal para a campanha eleitoral será feita através de contrato escrito. Tal iniciativa visa impedir a atual prática da compra de votos nos dias que antecedem as eleições, camuflada através da contratação de “cabos eleitorais”. Assim será possível à fiscalização identificar o volume de recursos gastos com este expediente”. 34 LEITOR 2: AS VANTAGENS DO SISTEMA DE FINANCIAMENTO DEMOCRÁTICO DE CAMPANHAS: “Os que se opõem ao financiamento público de campanha argumentam, equivocadamente, que este financiamento servirá tão só para beneficiar políticos corruptos. No entanto, a proposta de Financiamento Democrático de Campanha implica uma série de medidas para barrar a corrupção eleitoral. O sistema eleitoral proposto, contribui com este objetivo, reduzindo drasticamente o número de candidatos e estabelecendo que os recursos públicos sejam destinados de forma igualitária aos candidatos, reduzindo as distorções econômicas entre os candidatos na disputa eleitoral. No combate à corrupção eleitoral o projeto impõe taxativamente a cassação de registro de candidatos beneficiados por contribuições ilegais. Por outro lado proíbe à empresa, que destinou ilegalmente recursos para campanha, de contratar com a administração pública por cinco anos, além de aplicar uma multa de dez vezes a quantia ilegalmente doada. No caso de reincidência será decretada a extinção da pessoa jurídica. O projeto impõe que as doações sejam realizadas na página oficial do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo assegurada sua divulgação em tempo real. Os candidatos que concorrerem ao segundo turno das eleições proporcionais terão direito à divisão igualitária do Fundo Democrático de Campanha. A movimentação dessas verbas será feita exclusivamente pelos partidos políticos ou coligações. Cabe ressaltar que o financiamento de campanhas por empresas é uma relação de custo benefício que visa o retorno do capital investido. Em última análise, estes recursos terminam por onerar indiretamente o bolso da população, já que o “investimento” feito em campanha eleitoral retorna em volume muito maior do que foi doado. A realidade mostra o retorno dos recursos aos empresários através do superfaturamento de obras e de favores concedidos por estes políticos financiados”. 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Isaías 2,1-5. O oráculo de Isaías imagina Jerusalém como modelo para todos os povos por causa de sua fidelidade à aliança com Javé. A paz nascerá de uma transformação profunda da nação e inaugurará um novo relacionamento entre todas as nações. Os que antes eram instrumentos de destruição se tornarão instrumentos que geram e defendem a vida. “Visão de Isaías, filho de Amós, sobre Judá e Jerusalém: no final dos tempos, o monte do templo de Javé estará firmemente plantado no mais alto dos montes, e será mais alto que as colinas. Para lá correrão todas as nações. Para lá irão 35 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... muitos povos, dizendo: “Venham! Vamos subir à montanha de Javé, vamos ao templo do Deus de Jacó, para que ele nos mostre seus caminhos, e possamos caminhar em suas veredas”. Pois de Sião sairá a lei, e de Jerusalém a palavra de Javé. Então ele julgará as nações e será o árbitro de povos numerosos. De suas espadas eles fabricarão enxadas, e de suas lanças farão foices. Nenhuma nação pegará em armas contra outra, e ninguém mais vai se treinar para a guerra. Venha, casa de Jacó: vamos caminhar à luz de Javé.” 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “A via que vai da fé para a política se dá em linha de continuidade. Explicando: a política como exigência ética decorre da fé de maneira absolutamente necessária. Por conseguinte, o cristão é obrigado a se envolver de uma forma ou de outra com a política. Sem isso, sua fé ficaria “mutilada”. Isso porque a política é em realidade uma dimensão “integrante” da fé cristã. Na mesma linha vai o Vaticano II: “A obra redentora de Cristo inclui também a instauração da ordem temporal”. Também o sínodo dos bispos de 1971 afirma: “A ação pela justiça e a participação pela transformação do mundo nos aparecem plenamente como razão constitutiva da missão da Igreja”. Assim, a dimensão política como tal (não como essa ou aquela política) promana diretamente da fé, sem rupturas. A política, como busca do bem comum ou da libertação do povo, “provém do mais íntimo da fé cristã: o domínio de Cristo que se estende a toda a vida”. Nesse sentido geral vale dizer “político porque cristão”. Na verdade, é “no centro da mensagem” cristã que os cristãos encontram “inspiração para atuar em favor da fraternidade e da justiça, da paz, contra todas as dominações...” – como disse João Paulo II em Puebla. Desse modo, a política aparece como um desdobramento da fé”. (Clodovis Boff, Fé e Política: alguns ajustes. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 48) 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Por quais motivos o cristão se engaja em atividades políticas? 2. Que tipo de sociedade e de política o projeto do Reino de Deus exige? Quais são as utopias cristãs? 36 6. PARA REFLETIR! Sonho impossível (Chico Buarque) Sonhar, mais um sonho impossível. Lutar quando é fácil ceder Vencer o inimigo invencível Negar quando a regra é vender Sofrer a tortura implacável Romper a incabível prisão Voar num limite improvável Tocar o inacessível chão É minha lei É minha questão Virar esse mundo Crivar esse chão Não importa saber Se é terrível demais Quantas guerras Terei de vencer Por um pouco de paz E amanhã Se esse chão que eu beijei For meu leito e perdão Vou saber que valeu Delirar e morrer de paixão E assim, Seja lá como for, Vai ter fim A infinita aflição E o mundo Vai ver uma flor Brotar do impossível chão. 37 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Salmo 93 (94) – O Senhor faz justiça! Senhor Deus justiceiro, brilhai, Revelai-vos, ó Deus vingador! Levantai-vos, juiz das nações, E pagai seu salário aos soberbos! É feliz, ó Senhor, quem formais E educais nos caminhos da Lei, Para dar-lhe um alívio na angústia, Quando ao ímpio se abre uma cova. O Senhor não rejeita seu povo E não pode esquecer sua herança: Voltarão a juízo as sentenças; Quem é reto andará na justiça. Pode acaso juntar-se convosco Eis que oprimem, Senhor, vosso povo O impostor tribunal da injustiça, Que age mal, tendo a lei por pretexto? E humilham vossa herança; Eles podem agir contra o justo, Estrangeiro e viúva trucidam, Condenando o inocente a morrer: E assassinam o pobre órfão! Até quando os injustos, Senhor, Até quando haverão de vencer? Arrogantes derramam insultos, E se gabam do mal que fizeram. Eles dizem: “O Senhor não nos vê E o Deus de Jacó não percebe! Entendei, ó estultos do povo; Insensatos, quando é que vereis? Para mim o Senhor é com certeza, É refúgio, é abrigo, é rochedo! O Senhor, nosso Deus, os arrasa, Faz voltar contra eles o mal, Sua própria maldade os condena. 8. CANTO FINAL: Utopia de Zé Vicente ou outro à escolha do grupo. 38 ENCONTRO V O Sistema Eleitoral Proporcional em Dois Turnos “Os valores últimos e mais sublimes desapareceram da vida pública e se retiraram, seja do misticismo seja das relações imediatas entre os indivíduos”. (Max Weber) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Uma das propostas da Coalizão Democrática é que o sistema eleitoral seja feito em dois turnos. Reproduzimos a seguir a proposta, tema deste encontro: LEITOR 1: “O atual sistema eleitoral é o proporcional de lista aberta. A proporcionalidade representa uma forma avançada do processo eleitoral. Todavia a “lista aberta“ de candidatos acarreta sérios problemas ao sistema político brasileiro. O sistema proporcional, incorporado à Constituição Brasileira, representou um importante avanço democrático em vários países do mundo. Ele se tornou uma necessidade em decorrência da incorporação de grandes massas ao processo eleitoral, com a ampliação do sufrágio universal – o voto. No sistema proporcional os partidos elegem um número de parlamentares, proporcional ao número de votos que obtêm no processo eleitoral. Assim, um partido ou coligação que obtiver 30% dos votos, terá, aproximadamente, 30% da representação parlamentar. O constitucionalista Paulo Bonavides se refere ao 26 sistema proporcional, afirmando que ele torna ‘’a vida política mais dinâmica e abre à circulação das ideias e das opiniões novos condutos que impedem uma rápida e eventual esclerose do sistema partidário, tal como acontece onde se adota o sistema eleitoral majoritário, determinante da rigidez bipartidária’’. O sistema proporcional pode utilizar duas modalidades distintas: a de lista aberta e a de lista pré-ordenada”. LEITOR 2: “O sistema proporcional brasileiro adota a lista aberta de candidatos. O voto é dado a qualquer dos candidatos da lista. Assim a disputa eleitoral é realizada em torno de indivíduos e não em torno de projetos para solucionar os problemas do País, dos Estados ou Municípios. E, mais grave, se elege o candidato que dispuser de mais recursos. O poder econômico passa a ser o diferencial a garantir a eleição. Além do mais este sistema conduz à disputa eleitoral para dentro do partido. Ganha aquele que, no partido, consegue o maior número de votos. Isto leva a uma guerra entre os candidatos do mesmo partido e a consequente fragilização partidária. Os comitês eleitorais se transformam em verdadeiros partidos dentro do partido. O único objetivo é a eleição daquele candidato. Os objetivos maiores de avançar na solução dos 40 problemas econômico-sociais ficam totalmente deixados de lado. Há um rebaixamento do processo eleitoral. Tal sistema não estimula a definição político-ideológica dos partidos. Hoje é voz corrente diz que os programas da maioria dos partidos são iguais. Isto ocorre porque os votos não são dados em função de programas, de projetos para solucionar os problemas do povo brasileiro. Ele permite que um candidato que tenha muitos votos possa assegurar a eleição de candidatos inexpressivos. Tal fato ocorreu com Eneias no passado e, mais recentemente, com o Tiririca. Outra deficiência deste sistema de lista aberta é que a grande quantidade de candidatos, além de tornar muito cara as eleições, praticamente impossibilita uma efetiva fiscalização do processo eleitoral. Portanto, o problema do atual sistema eleitoral brasileiro não está no sistema proporcional, mas sim na lista aberta de candidatos”. LEITOR 3: “Para enfrentar as distorções geradas pelo sistema eleitoral de lista aberta o Projeto da Coalizão apresenta a alternativa de eleição pelo Sistema Proporcional em lista pré-ordenada e em dois turnos. Esta proposta incorpora as vantagens do sistema proporcional de lista pré-ordenada e, ao mesmo tempo, leva em consideração a cultura política do eleitor acostumado a votar em candidatos. No primeiro turno o voto será dado ao partido atendendo à plataforma política e à lista pré-ordenada de candidatos. Neste turno fica assegurado o debate em torno de ideias e projetos para solucionar os problemas do país. Com base no quociente eleitoral será definido o número de vagas parlamentares a serem preenchidas por cada partido. No segundo turno o voto será dado ao candidato. Participarão do segundo turno os candidatos equivalentes ao dobro das vagas obtidas por cada partido. Assim, o partido que obtiver cinco vagas no parlamento, disputará o segundo turno com os dez primeiros nomes de sua lista de candidatos. Caberá ao eleitor dar a palavra final sobre quais os candidatos serão os eleitos. Reiterase que no segundo turno os recursos do Fundo Democrático de Campanha serão destinados em parte iguais aos candidatos. Esta proposta reduz drasticamente o número de candidatos no segundo turno, bem como os custos de campanha e facilita a efetiva fiscalização do processo eleitoral. Os críticos deste sistema argumentam que a lista será elaborada pelos “caciques“ dos partidos. Na realidade isto já ocorre no sistema atual, pois a constituição da chapa de candidatos da maioria dos partidos é organizada pelos “caciques“ partidários. Na alternativa proposta para evitar isto, a elaboração da lista partidária de candidatos deverá ser realizada em eleições primárias, com a participação de todos os filiados e com acompanhamento da Justiça Eleitoral e do Ministério Público. Ou seja a elaboração da lista não será feita pelos “caciques” partidários e sim em votação democrática pelo conjunto da militância. A crítica de que o voto em lista impede que o eleitor vote no candidato de sua preferência, não cabe na proposta da Coalizão, pois a alternativa proposta não retira do eleitor o direito de decidir, em última instância, quem será eleito. No primeiro turno vota-se no partido, no programa, na lista, porém no segundo turno vota-se nos candidatos”. 41 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Apocalipse 21, 1-7. A proposta bíblica é sempre de uma nova relação entre Deus e os homens de tal modo que ela crie os novos céus e a nova terra. A Nova Jerusalém personifica a projeto de Deus de aliança com toda a humanidade para que, nela, a vida possa ser plena e total. “Vi, então, um novo céu e uma nova terra. O primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe. Vi também descer do céu, de junto de Deus, a Cidade santa, uma Jerusalém nova, pronta como esposa que se enfeitou para o seu marido. Nisso, saiu do trono uma voz forte. E ouvi: “Esta é a tenda de Deus com os homens. Ele vai morar com eles. Eles serão o seu povo e ele, o Deus-com-eles, será o seu Deus. Ele vai enxugar toda lágrima dos olhos deles, pois nunca mais haverá mprte, nem luto, nem grito, nem dor. Sim! As coisas antigas desapareceram! Aquele que está sentado no trono declarou: “Eis que faço novas todas as coisas”. E me disse ainda: “Elas se realizaram. Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim. Para quem tiver sede, eu darei de graça da fonte de água viva. O vencedor receberá esta herança; eu serei o Deus dele, e ele será meu filho”. 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “A dignidade humana, em suas várias expressões, inclui também uma dimensão política. A política tem a ver com as formas de participação no poder da sociedade. Pelo fato de ser pessoa, de ser criativo, livre, responsável, o ser humano vem dotado de uma vontade ontológica de participação. Não se trata de uma veleidade que pode ser ou não ser. Essa vontade é intrínseca. Sem a participação, o ser humano se sente oprimido, forçado a secundar um projeto político dos outros, para o qual não teve nenhuma colaboração. Mesmo que se sinta beneficiário do sistema social (como era o caso no socialismo de Estado), não se sente feliz, porque não é participante na gestação do bem comum. O ser humano, politicamente, não quer ser beneficiário, mas participante. Ora, as sociedades históricas que conhecemos se caracterizam por parcos mecanismos de participação dos cidadãos. Participam os que detêm o poder, o saber e o ter. Os demais são conduzidos e reduzidos a uma função subalterna. A dignidade humana politicamente considerada coloca a exigência de uma 42 democracia no sentido originário da palavra: a participação no poder por todos, em níveis a serem sempre estabelecidos, no controle desse poder e na rotatividade das várias funções. Ademais, a sociedade como um todo é somente sã se predominarem as relações de inclusão, relações de solidariedade entre todos, relações de reciprocidade e de complementaridade. Tal dinamismo social é propício à salvaguarda da dignidade humana; cria as condições de ela se expressar e assim construir o bem comum”. (Boff,Leonardo. Refundação da dignidade humana a partir da Nova Cosmologia. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 137). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Você acha que o atual sistema eleitoral é suficientemente democrático? Quais são suas limitações? 2. Os atuais partidos políticos estão abertos à participação popular e à influência da sociedade ou acabam girando em torno de seus próprios interesses, deixando de lado as demandas populares? Discutir as saídas que a proposta da coalizão democrática indica. 6. PARA REFLETIR! Declaração Universal dos direitos humanos. (versão popular de Frei Betto) “Todos nascemos livres e somos iguais em dignidade e direitos. Todos temos direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal e social. Todos temos direito de resguardar a casa, a família e a honra. Todos temos direito ao trabalho digno e bem remunerado. Todos temos direito ao descanso, ao lazer e às férias. Todos temos direito à saúde e à assistência médica e hospitalar. Todos temos direito à instrução, à escola, à arte, à cultura. Todos temos direito ao amparo social na infância e na velhice. Todos temos direito à organização popular, sindical e política. Todos temos direito de eleger e ser eleitos às funções de governo. Todos temos direito à informação verdadeira e correta. Todos temos direito de ir e vir, mudar de cidade, de Estado e de país. Todos temos direito de não sofrer nenhum tipo de discriminação. Ninguém pode ser torturado ou linchado. Todos somos iguais perante a lei. Ninguém 43 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... pode ser arbitrariamente preso ou privado do direito de defesa. Toda pessoa é inocente até que a Justiça, baseada na lei, prove o contrário. Todos temos liberdade de pensar, de nos manifestar, de nos reunir e de crer. Todos temos direito ao amor e aos frutos do amor. Todos temos o dever de respeitar e proteger os direitos da comunidade. Todos temos o dever de lutar pela conquista e ampliação desses direitos”. 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Contigo, Senhor, queremos contemplar o mundo em que vivemos. Olhamos os que não podem se defender, estudar, progredir e percebemos quanta injustiça se acumula sobre esses nossos irmãos e irmãs. Inspira-nos, Senhor e Pai de todos, para que possamos perceber as melhores formas de contribuir para a superação do que ofende os direitos desses teus filhos e filhas. Olhamos para os que se acham donos do mundo, acima das leis, e desejamos mais igualdade, mais solidariedade. Olhamos para nós mesmos e vemos o quanto ainda precisamos nos converter para sermos eficientes operários do teu Reino. Ajuda-nos, Senhor, a trabalhar sempre mais pela justiça e pela paz, na igualdade que nos vem de sermos todos filhos teus, diferentes nos talentos, mas iguais no amor que nos ofereces. Amém. 8. CANTO FINAL: Oração de São Francisco ou outro à escolha do grupo. 44 ENCONTRO VI O Sistema Eleitoral e a Representação Popular “A pergunta ética se mostra para nós como uma pergunta inevitavelmente política”. Antonio Gonzalez CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Neste encontro, refletiremos sobre a representação política das camadas populares no sistema eleitoral. O chamado voto distrital, seja puro ou misto, não garante a participação do povo no processo político. Reproduzimos o texto da Coalizão democrática que mostra os limites que um tal sistema representa e porque ele se apresenta como pouco democrático: LEITOR 1: O SISTEMA ELEITORAL MAJORITÁRIO OU O DISTRITAL REDUZ A REPRESENTAÇÃO POLÍTICA DAS CAMADAS POPULARES. “No sistema eleitoral majoritário distrital, que se opõe ao sistema proporcional, o país é dividido em distritos, sendo eleito o candidato mais votado de cada distrito. Este sistema capta mal a vontade dos eleitores e reduz drasticamente a representação das minorias, mesmo sendo expressivas. Isto porque, por hipótese, um partido que obteve 51% dos votos em 10 distritos terá todas 10 cadeiras no parlamento. O outro partido que obteve 49% dos votos não terá nenhuma cadeira. Esta é a distorção mais grave do sistema majoritário. Variação do sistema distrital puro é o sistema distrital misto. Ambos se contrapõem ao sistema eleitoral proporcional. A experiência histórica demonstra que o sistema majoritário distrital favorece a eleição de representantes das elites locais em detrimento das candidaturas populares. No Brasil o sistema eleitoral majoritário distrital foi adotado, com suas peculiaridades, por 70 anos durante o Império e a República Velha. A revolução de 1930, representando um avanço político, acabou com o sistema distrital e implantou o sistema proporcional. A Constituição de 1946 incorporou em seu texto o sistema eleitoral proporcional para as eleições de deputados federais, estaduais e vereadores. Durante a ditadura militar, foi estabelecido o sistema distrital misto no País. No entanto, não foi colocado em prática. Com o fim da ditadura, o Congresso revogou, em maio de 1985, este entulho autoritário. Os argumentos dos defensores do sistema eleitoral distrital têm claramente uma marca de restrição à democracia. É um sistema defendido pelos partidos conservadores que querem manter o controle do sistema político com maior facilidade e por partidos que 46 incorporaram concepções neoliberais que, no plano político, se relacionam com a limitação da democracia. O voto distrital é excludente da representação de grande parte do eleitorado ao não assegurar a representação política da parcela minoritária da sociedade mesmo com uma votação próxima da metade do eleitorado. Induz ao bipartidarismo por assegurar a representação política somente aos grandes partidos. Aniquila as minorias. Promove a ditadura da maioria. Golpeia o voto de opinião”. LEITOR 2: “Num país tão vasto e complexo como o Brasil, onde existem grandes diferenças sociais, ideológicas, políticas, regionais e religiosas, o sistema político tem que ser capaz de abarcar todos estes interesses e opiniões. Ao regionalizar o processo eleitoral o sistema distrital afasta o debate político dos grandes temas nacionais. Transforma o deputado federal em “despachante de luxo”, em um “vereador federal” voltado, quase que exclusivamente, para os problemas paroquiais e regionais, afastando dos temas de interesse e repercussão nacional. Agrava a influência do poder econômico nas eleições. Ao concentrar a eleição a um distrito o sistema permite que o candidato endinheirado gaste um grande volume de recursos num território reduzido. O sistema distrital misto atenua mas não elimina os problemas causados pelo sistema majoritário. Parte de seus membros é eleita pelo sistema proporcional e parte pelo sistema majoritário. Esta divisão reduz pela metade a possibilidade de eleição de candidatos que expressem interesses de determinados segmentos da sociedade. E mais, os “caciques” de determinadas localidades exercerão ali influência sobre o voto proporcional, reduzindo mais ainda as possibilidades de eleição de candidatos independentes do poder local. A conclusão é cristalina. O sistema distrital puro ou misto visa restringir a participação popular no processo político e assegurar um rígido e concentrado controle sobre as estruturas de poder. Tanto assim é que nos países que adotam estes sistemas a resultante é a existência de apenas dois ou três partidos”. LEITOR 3: POR QUE O DISTRITÃO NÃO FORTALECE A DEMOCRACIA? “O chamado “distritão” é a eleição proporcional de lista aberta realizada num espaço territorial menor do que o do Estado-membro. Nela cada Estado seria dividido em circunscrições eleitorais destinadas a eleger de quatro a sete deputados federais. Esta proposta mantém o sistema proporcional de lista aberta, causador de graves distorções do processo eleitoral. Neste sistema os mais votados, em cada distrito, seriam os eleitos. Esta alternativa acentua os problemas atuais. Amplia a influência do poder econômico nas eleições ao permitir que o candidato com recursos concentre seu investimento numa região menor. Por outro lado as eleições continuariam realizadas em torno de pessoas, e não ideias ou programas, além de contar com a influência do poder político local. Tal sistema aprofundaria as dificuldades para a eleição de candidatos de origem popular. Esta proposta reúne os graves defeitos do 47 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... sistema eleitoral proporcional de lista aberta e nenhuma vantagem. Por outro lado o “distritão” dificulta sobremaneira a renovação dos quadros políticos”. 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Êxodo, 18, 13-14;21-23. O poder deve ser participativo e nunca concentrador. As leis que regem a sociedade devem garantir uma relação social fundada na liberdade, na vida e na dignidade. O Estado sem a sociedade é usurpador do poder e, sozinho, ele não garante uma sociedade igualitária. “No dia seguinte, Moisés sentou-se para resolver os assuntos do povo. Ora, o povo procurava por ele desde o amanhecer até à noite. O sogro de Moisés viu tudo o que este fazia pelo povo e lhe disse: “O que é que você está fazendo com o povo? Por que está sentado sozinho, enquanto todo o povo o procura de manhã até à noite? Escolha entre o povo homens capazes e tementes a Deus, que sejam seguros e inimigos do suborno: estabeleça-os como chefes de mil, de cem, de cinquenta e de dez. Eles administrarão regularmente a justiça para o povo: os assuntos graves, eles trarão a você; os assuntos simples, eles próprios resolverão. Desse modo, vocês repartirão a tarefa e você poderá realizar a sua parte. Se você fizer assim e Deus lhe der as instruções, você poderá suportar a tarefa, e o povo voltará para casa em paz”. 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “A questão do sujeito central do desenvolvimento é chave. Incluído na definição de desenvolvimento da Declaração da ONU está o reconhecimento de que o sujeito central do desenvolvimento é o ser humano. Implicitamente, portanto, o Mercado, o Capital, e o setor privado não são, nem devem ser, o sujeito central do desenvolvimento. As implicações disso são profundas. Entra em cena a proposta da participação dos setores populares – isto é, daqueles que vivem prioritariamente de seu trabalho – enquanto sujeitos e não meros objetos, em todos os processos que influem em sua existência. Essa dimensão participativa do processo abrangente do desenvolvimento implica transformações estruturais desde o nível mais local, imediato, tático e macrosocioeconômico ( a empresa, a comunidade, o bairro, o município, até o nível mais global, mediato, estratégico e macro (o Estado, o projeto nacional e global de desenvolvimento, os grupos transnacionais, a comunidade das nações, o sistema produtivo global). A proposta de uma 48 democracia integral, portanto, começa pela afirmação de que cada um e todos os cidadãos sejam instituídos sujeitos de um desenvolvimento libertador do ser humano, seja em relação ao trabalho para responder a suas necessidades materiais, seja em relação ao desenvolvimento de seus potenciais de personalização e socialização no sentido de uma consciência pessoa e coletiva sempre superior (Zohar, 1991: cap. 13). Tornar-se sujeito implica três processos. Um, o de empoderamento, por cada cidadão e por cada coletividade, ou o tornar-se sujeito de todos os processos relacionados com seu desenvolvimento pessoal (portanto, unificador) e coletivo (portanto, diversificador). O segundo é a cooperação, acima e para além da competição; eis porque as formas comunitárias cooperativas de organização da economia terão crescente preferência às formas privadas e excludentes. O terceiro é a educação contínua e ininterrupta, prática e teórica, para o exercício dessa subjetividade”. (Boff, Leonardo e Arruda, Marcos. Educação e desenvolvimento da Democracia Integral. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 184-185). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Você acha que o poder político é exercido de forma participativa? Aqueles que são eleitos como nossos representantes agem segundo as demandas populares? 2. Nosso sistema eleitoral permite que as camadas populares (índios, negros, mulheres, camponeses, etc) se façam representar no congresso e no senado? Por que? 6. PARA REFLETIR! Ninguém pode prender um sonho (Frei Fabretti) Ninguém pode prender um sonho E impedir alguém de sonhar. Ninguém pode prender a esperança De um povo sofrido a lutar. Ninguém pode abafar o grito 49 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... Do oprimido clamando Javé. Deus que salva e liberta seu povo, Que ergue o caído e alimenta sua fé. Todo sonho alimenta a história E a vitória do povo a chegar. Vamos juntos que nesse caminho Ninguém sobre ou fica pra trás. Para ver este mundo florindo, Crianças sorrindo, sem fome e sem dor, É preciso cuidar bem da vida, Que a vida sofrida se eleva em clamor! Ninguém prende um sonho Como a luz do sol que nasceu. Ele brilha, inventando caminhos, E desvela o que a noite escondeu. Ninguém pode abafar o grito De quem sofre de tanto suor, Pelo pão, pela paz e a justiça E anda à procura de um mundo melhor. 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a oração: Aqui estamos, Senhor, colocando diante de ti o mundo em que vivemos. Queremos que ele seja melhor, mais parecido com a vida plena e feliz que desejas para todos os teus filhos e filhas. Dá-nos sabedoria para compreender a realidade e firmeza para trilhar caminhos de transformação. Ajuda-nos a crescer em comunhão para juntos podermos construir a fraternidade e a justiça que nos trarão a verdadeira paz. Amém. 8. CANTO FINAL: Coração Civil de Milton Nascimento ou outro à escolha do grupo. 50 ENCONTRO VII Alternância de Gênero e Grupos Étnicos nas Listas Partidárias “A soberania não pode ser representada pela mesma razão porque não pode ser alienada, consiste essencialmente na vontade geral e a vontade absolutamente não se representa. É ela mesma ou é outra, não há meio-termo”. (Rousseau) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Outra proposta da Coalizão democrática é a alternância de homens, mulheres e jovens bem como de negros e indígenas nas listas de candidatos dos partidos políticos. Há claramente uma sub-representação desses setores altamente representativos da sociedade brasileira. Vejamos o que diz a pesquisadora do INESC sobre os resultados do 1º turno das últimas eleições ao congresso e senado brasileiros: LEITOR 1: Segundo Carmela Zigoni, “os resultados do 1º turno das Eleições 2014 infelizmente demonstram que o Brasil não avançou na equidade e representatividade na política. Negros(as), mulheres, indígenas e jovens continuarão sub-representados nos próximos 4 anos no Congresso Nacional. Importante ressaltar que, pela primeira vez na história, o Brasil tem o dado oficial do perfil racial do Parlamento, informação que pode passar a impactar o debate sobre democratização do processo eleitoral e acesso aos espaços de poder de grupos historicamente excluídos da vida política. Os dados são desanimadores: para o cargo de deputado federal, foram eleitas somente 51 mulheres (9,9%), ao passo que se elegeram 462 homens (90,10%); no Senado foram 5 mulheres (18,5%) e 22 homens (81,5%). Considerando então o Parlamento como um todo (540 cargos), as mulheres representam 52 10,37% – em 2010 foram 9,2% de um total de 567 cargos. Das mulheres eleitas, 12 se declararam negras, 11 na Câmara e 1 no Senado. Importante ressaltar que, pela primeira vez na história, os partidos conseguiram cumprir a cota de equidade de gênero imposta pela Lei 9.504/97, mas os dados demonstram que estas candidatas não conseguiram chegar ao poder. Deve ser dito, ainda, que a cota apenas determina o mínimo (30%), mas o ideal seria ter paridade entre homens e mulheres em todas as etapas do processo eleitoral. LEITOR 2: Os Estados que tiveram maior número de mulheres eleitas foram São Paulo e Rio de Janeiro, que elegeram 6 mulheres cada, seguidos de Minas Gerais, com 5 mulheres eleitas. Espírito Santo, Paraíba, Mato Grosso e Rio Grande do Sul não elegeram nenhuma mulher para a Câmara dos Deputados federal. Quanto aos partidos políticos, os que mais elegeram mulheres foram o PT (8 Deputadas Federais e 1 Senadora) e o PMDB (7 Deputadas Federais e 3 Senadoras), seguidos do PSB e PSDB com 5 Deputadas Federais cada. No que diz respeito à questão da auto-declaração quanto ao quesito raça/cor, nenhum indígena foi eleito para o Parlamento Federal. Quanto aos negros, foram eleitos para a Câmara 106 candidatos que se auto-declararam negros (somatória de pretos+pardos), representando 20,7% do total: os brancos foram 407 (79,3%). No Senado, foram eleitos 5 negros e 22 brancos. A composição total do Congresso Nacional, portanto, é de 20,5% de negros e 79,5% de brancos. Considerando que a população negra, no Brasil, representa 52% da população, podemos dizer que o Legislativo não reflete, mais uma vez, a composição étnico-racial da sociedade. O partido político que elegeu mais negros foi o PT (18 Deputados), seguido do PSB (10) e PRB (10). No Senado, os 5 negros eleitos pertencem aos partidos PT, PSB, PP, PDT e DEM. Quanto à idade dos candidatos eleitos, 4,3% tem menos de 29 anos, significando que os jovens também seguiram sub-representados, já que entre as candidaturas representavam 6,8% do total (considerando todos os cargos), e 6,4% concorrendo para Câmara e Senado. LEITOR 3: “Em outubro de 2014, o Inesc realizou o Seminário Desigualdades no Parlamento: Sub-representação e Reforma do Sistema Político, onde apresentou os dados com relação ao perfil dos candidatos e candidatas às Eleições 2014, considerando as variáveis sexo, raça/cor e idade, em relação com a distribuição regional e partidos políticos. À época, os dados demonstraram que as candidaturas continuavam a refletir desigualdades intrínsecas da sociedade brasileira com relação às relações de gênero e étnico-raciais, assim como geracional. O resultado das eleições demonstra que, na corrida eleitoral, isso se agrava, e a equidade ficou comprometida”. Isso pode ser explicado por um conjunto de fatores que interferem no voto: desde o financiamento privado de campanhas, que geralmente são canalizados para candidatos homens, 53 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... brancos, com maior poder aquisitivo e que acabam por ter mais tempo de exposição na mídia; até a própria discriminação do eleitor em relação a determinados perfis, dado que ainda não superamos o racismo e o sexismo em nossa sociedade. Os dados quanto ao perfil das candidaturas devem ser alvo de reflexão pela sociedade. Um primeiro passo, deve ser pensado como realizar um ajuste imediato no processo eleitoral, visando a promoção da equidade de gênero e raça, por exemplo estabelecendo cotas para negros e negras nos partidos. A longo prazo, a Reforma do Sistema Político deve ser discutida de forma ampla e democrática, a fim de que a própria estrutura do sistema político seja aperfeiçoada, alterando critérios para composição partidária, o formato das campanhas e as regras para votação: destaca-se o urgente e necessário fim do financiamento privado de campanha, hoje, o fator que mais promove desigualdades no Parlamento, e que também é um aspecto que gera a corrupção generalizada nos partidos. (Carmela Zigoni é assessora política do Inesc, artigo publicado em Brasil de Fato, 10/10/2014). 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Colossenses 3, 9-16 Pelo batismo, o cristão passa por uma transformação radical que tem reflexos no seu modo de se relacionar com os outros. Ele abandona hábitos antigos de racismo, discriminação, preconceito e abraça as atitudes do homem novo disposto a romper todas as barreiras que separam uns dos outros. “De fato, vocês foram despojados do homem velho e de suas ações, e se revestiram do homem novo que, através do conhecimento, vai se renovando à imagem do seu criador. E aí já não há grego nem judeu, circunciso ou incircunsivo, estrangeiro ou bárbaro, escravo ou livre, mas apenas Cristo, que é tudo em todos. Como escolhidos de Deus, santos e amados, vistamse de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência. Suportem-se uns aos outros e se perdoem mutuamente, sempre que tiverem queixa contra alguém. Cada um perdoe o outro, do mesmo modo que o senhor perdoou vocês. E acima de tudo, vistam-se com o amor, que é laço da perfeição. Que a paz de Cristo reine no coração de vocês. Para essa paz vocês foram chamados, como membros de um mesmo corpo. Sejam também agradecidos. Que a palavra de Cristo permaneça em vocês com toda a sua riqueza, de modo que possam instruir-se e aconselhar-se mutuamente com toda a sabedoria”. 54 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “Perspectiva da fé libertadora que se traduz por uma opção pelos oprimidos e marginalizados supõe um projeto de sociedade, baseado na participação mais larga possível, na igualdade em direitos e dignidade de todos os cidadãos, no respeito às diferenças, impedindo que degenerem em desigualdades e discriminações e incentivando à comunhão entre as subjetividades e para com o próprio Deus, sentido derradeiro de todos os sentidos intra-históricos. Para além de todos os pragmatismos, o militante cristão vê na construção possível de uma nova sociedade que não democratize apenas os meios de produção, mas também os meios do poder e os meios do significar (cultura) e que permita uma nova aliança com a natureza. Essa nova sociedade não será fruto dos cristãos ou de elites iluminadas ou poderosas, excludentes de “outros” diferentes, mas da vontade coletiva do próprio povo organizado, homens e mulheres com seus aliados e aliadas, que ultrapassa a democracia representativa para concretizar uma democracia participativa. O Cristão militante projeta sua visão de poder, como mediação para a transformação e para a justiça e se legitima na medida em que reforça o poder do povo em suas organizações, das mulheres e dos culturalmente diferentes (povos indígenas e negros, principalmente) na defesa de sua identidade e de seus direitos igualitários. Por isso, o poder deve ser sempre controlado e mantido sob permanente transparência de seus mecanismos e de crítica de seus objetivos. Para os militantes cristãos, há uma forma de enfrentar os conflitos, não os exorcizando como patologia social, mas vendo-os como pólo dialético da própria realidade social em processo, convivendo com eles, aprendendo pedagogicamente a tolerá-los e a tirar deles energias de transformação. A perspectiva da fé, que permite ver a eminente dignidade dos fracos, marginalizados e oprimidos e valorizar sua cultura, seu modo de ser feminino e masculino, e suas lutas, ganha especial relevância num ambiente político onde a história é lida e organizada a partir dos que detêm o poder, o saber oficial e o ter”. (Boff, Leonardo e Miranda, Márcia. A Contribuição dos militantes cristãos na política partidária. In: In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 86-87). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Uma democracia autêntica supõe a inclusão de todos. Você acha que a democracia brasileira permite a participação de 55 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... homens, mulheres, jovens, índios e negros? Quais são as razões de exclusão desses grupos? 2. Quais os caminhos possíveis para superar o machismo, o racismo e a predominância branca de ascendência europeia, no sistema político brasileiro? 6. PARA REFLETIR! “Nós, brasileiros, nesse quadro, somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos oriundos da mestiçagem viveu por séculos sem consciência de si, afundada na ninguendade. Assim foi até se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros. Um povo, até hoje, em ser, na dura busca de seu destino. Olhando-os, ouvindo-os, é fácil perceber que são, de fato, uma nova romanidade, uma romanidade tardia mas melhor, porque lavada em sangue índio e sangue negro”. (Ribeiro, Darcy. O Povo brasileiro. A formação e o sentido do Brasil. SP: Companhia das Letras, 2002, pág. 453). 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a oração da CF/2015: Ó Pai, Alegria e Esperança de vosso povo, vós conduzis a Igreja, servidora da vida, nos caminhos da história. A exemplo de Jesus Cristo e ouvindo sua palavra que chama à conversão, seja vossa Igreja testemunha viva de fraternidade e de liberdade, de justiça e de paz. Enviai o vosso Espírito de Verdade para que a sociedade se abra à aurora de um mundo justo e solidário, sinal do Reino que há de vir. Por Cristo, Senhor nosso. Amém! 8. CANTO FINAL: Hino da CF/2015 ou outro à escolha do grupo. 56 ENCONTRO VIII A Democracia e Seus Instrumentos “O que distingue essencialmente um governo democrático de um não democrático é que apenas no primeiro os cidadãos podem livrar-se de seus governantes sem derramamento de sangue”. Karl Popper CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA A ideia central da Reforma Política é aperfeiçoar os mecanismos que garantam a democratização da sociedade brasileira, retirando o que resta de entulho autoritário da ditadura militar e implantando novos mecanismos que garantam a participação da sociedade nas escolhas e nos destinos do país. A seguir, reproduziremos um texto de Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins que nos ajudará a entender o que é democracia em suas mais variadas dimensões. Dizem as autoras: “O ideal de uma sociedade verdadeiramente democrática é que ela seja uma democracia formal e substancial. Embora haja variações nos graus de aproximação desse ideal, sabemos que pelo menos até agora nenhuma nação preencheu totalmente tais requisitos, o que não nos impede de elaborarmos projetos a serem perseguidos na construção de um mundo melhor. O aspecto formal da democracia consiste no conjunto das instituições características deste regime: o voto secreto e universal, a autonomia dos poderes, pluripartidarismo, representatividade, ordem jurídica constituída, liberdade de pensamento e expressão e assim por diante. Trata-se propriamente das “regras do jogo” democrático, do estabelecimento dos meios pelos quais a democracia se exerce. A democracia substancial diz respeito não aos meios, mas aos fins que são alcançados, aos resultados do processo. Dentre estes valores se destaca a efetiva — e não apenas ideal — igualdade jurídica, social e econômica. Portanto, a democracia substancial diz respeito aos conteúdos alcançados de fato. Dentre os mais diversos países constatamos que em alguns pode haver democracia formal, sem que se tenha conseguido cumprir as promessas da democracia substancial, enquanto em outros pode haver democracia substancial implantada sem recurso ao exercício democrático do poder. É o 58 caso das democracias para o povo, mas não pelo povo. A fim de melhor compreender tais contradições, vamos examinar quatro campos possíveis do exercício democrático: econômico, social, jurídico e político. a) Democracia econômica: há democracia econômica quando existe justa distribuição de renda, iguais oportunidades de trabalho, contratos livres, sindicatos fortes. Tais aspectos formais podem levar ou não à efetiva democracia substancial. Sabemos que a livre concorrência, sem os devidos cuidados para ser mantido o interesse coletivo, pode provocar conseqüências danosas para a maioria da população. Por outro lado, também o controle total feito pelo Estado é paternalista e pode levar a distorções, como ocorreu nas sociedades socialistas do Leste europeu, onde os bens de produção foram apropriados pelo Estado. b) Democracia social: embora as pessoas sejam diferentes e participem de grupos diversos, ninguém pode ser discriminado, e todos devem ter possibilidade de acesso aos bens materiais como moradia, alimentação e saúde, e aos bens culturais em todos os níveis; educação, profissionalização, lazer, arte. Ê preciso existir abertura para a produção e consumo da cultura, e que não haja censura, a fim de que as informações circulem livremente. Numa sociedade democrática o saber deve ser acessível a todos sem tornar-se privilégio de alguns. c) Democracia jurídica: a democracia supõe o estado de direito, o respeito à Constituição, a autonomia do Poder Judiciário. O poder autoritário se caracteriza pela submissão dos poderes Legislativo e Judiciário ao Executivo. Basta lembrar o tempo da ditadura militar no Brasil, quando se governava por meio de atos institucionais, indiferentes à soberania do Congresso. A continuidade do uso e abuso de medidas provisórias indica ainda resquícios do estado de arbítrio. Para ser substancial, a democracia jurídica deve se basear em leis que realmente atendam ao interesse da comunidade e precisa contar com uma justiça ágil e resistente às pressões de grupos. d) Democracia política: o coração da democracia está no reconhecimento do valor da coisa pública, separada dos interesses particulares. Neste sentido, há a exigência da institucionalização do poder, ou seja, quem ocupa o poder o faz enquanto representante do povo, e, como tal, não é proprietário do poder, mas ocupa um “lugar vazio”, um espaço que será assumido também por outras pessoas, garantindo a rotatividade do poder. 59 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... O acesso ao poder na democracia política é ascendente, fazendo-se “de baixo para cima”, pela escolha popular e com os recursos do pluripartidarismo, garantia daexistência da oposição efetiva. Pois se a democracia supõe o consenso, isto é, a aceitação comum das regras após as discussões, tal procedimento não elimina a permanência do dissenso, a possibilidade de discordar sempre que necessário. Aliás, uma característica da democracia é a aceitação do conflito como expressão das opiniões divergentes. Faz parte do processo democrático “trabalhar” o conflito e não negá-lo ou camuflá-lo. Além disso, a ampliação da democracia ocorre paralelamente à multiplicação dos órgãos representativos da sociedade civil, de modo a ativar as formas de participação dos cidadãos em geral. É isto que pode tornar a democracia uma policracia, o regime que não tem apenas um centro, mas cujo poder se irradia para inúmeros pontos da sociedade. Por exemplo, são importantes as organizações tanto ocasionais como permanentes que representam interesses de setores da coletividade, tais como associações de bairros, mutirões, grupos contra a violência, grupos ecológicos, ao lado de outras importantes instituições como a Ordem dos Advogados, a Associação de Imprensa, os partidos políticos, os sindicatos etc. Tal difusão de poderes dá condições para o melhor cumprimento da vontade geral, bem como para o controle dos abusos, exigindo-se maior transparência das ações nas diversas instâncias de poder. O que prejudica o processo de democratização é o desvirtuamento da atividade política, voltada para interesses particulares, a descaracterização dos partidos sem estofo ideológico ao sabor de casuísmos e conchavos, e a grande maioria despolitizada e não-participante”. (Aranha, Maria Lúcia de Arruda e Martins, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. SP: Editora Moderna, 1996, pág. 144-145) 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Mateus 20, 24-28 Jesus instrui seus discípulos para que a prática política das autoridades, sobretudo a de Herodes, não se reproduza na prática cristã que deve se guiar pela política do poderserviço, da fraternidade e do bem comum. “Como sabeis, os chefes das nações as mantêm sob seu poder, e os grandes, sob seu domínio. Não deve ser assim entre vós. Pelo contrário, se alguém quer ser grande entre vós, seja vosso servo, e se alguém quer ser o primeiro entre vós, seja vosso escravo. Assim é que o Filho do Homem veio, não para ser servido,mas para servir e dar sua vida em resgate pela multidão”. 60 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “Aqui há uma grande contribuição que os cristãos têm a dar a partir do trabalho popular animado nos últimos 30 anos pelas Igrejas: partir sempre de baixo, do nível de consciência dos grupos, valorizar sua história de resistência e de libertação, ouvir a todos, especialmente os mais humildes, potencializar tudo o que possa significar um avanço na consciência crítica, na participação e na inauguração do novo, fazer com que se viva, nos grupos, associações e comunidades, a democracia participativa. Nesse processo pedagógico se desmontam preconceitos que tanto penalizam as mulheres, os negros, os pobres e demais marginalizados. O espírito cristão procura, muitas vezes equivocadamente, germes verdadeiros que devem ser resgatados e potenciados no interior de um quadro mais são e completo. Essa pedagogia de inclusão ajuda a desmontar sectarismos e a rigidez de soluções teóricas distanciadas dos processos reais da vida do povo”. (Boff, Leonardo e Miranda, Márcia. A Contribuição dos militantes cristãos na política partidária. In: In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 87-88) 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Quais são as características de uma verdadeira democracia apontadas nos textos acima? Enumere-as! 2. Você vê como indispensáveis à democracias as pequenas associações de bairro, de agricultores, de sem-terra, sem-teto, mulheres e jovens? Como elas descentralizam o poder e ajudam na construção da democracia? 6. PARA REFLETIR! Se caminhar é preciso, caminharemos unidos. E nossos pés, nossos braços, sustentarão nossos passos. Não mais seremos a massa, sem vez, sem voz, sem história, Mas uma Igreja que vai em esperança solidária. Se caminhar é preciso, caminharemos unidos. E nossa fé será tanta que transporá as montanhas. Vamos abrindo fronteiras, onde só havia barreiras, pois somos povo que vai em esperança solidária. 61 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... Se caminhar é preciso, caminharemos unidos. E o Reino de Deus teremos como horizonte de vida. Compartiremos as dores, os sofrimentos e as penas, levando a força do amor em esperança solidária. Se caminhar é preciso, caminharemos unidos. E nosso voz no deserto fará brotar novas fontes. E a nova vida na terra será entrevista nas festas. É Deus que está entre nós em esperança solidária. (Simei Monteiro). 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a oração da CF/2015: O Senhor nos abençoe e nos guarde! O Senhor faça brilhar sobre nós a sua face e nos seja favorável! O Senhor dirija para nós o seu rosto e nos dê a paz! Que o senhor confirme a obra de nossas mãos agora e sempre. Amém! 8. CANTO FINAL: Virá o dia em que todos ou outro à escolha do grupo. 62 ENCONTRO IX A Democracia e Seus Modelos “Os deputados do povo não são, nem podem ser seus representantes; não passam de comissários seus, nada podendo concluir definitivamente. É nula toda lei que o povo diretamente não ratificar; em absoluto, não é lei”. (Rousseau) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Continuaremos nesse encontro a refletir sobre a democracia a partir dos seus diferentes modelos que têm sido historicamente construídos em diferentes países e também no Brasil. A seguir, as autoras Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins nos falam de dois modelos democráticos: “DEMOCRACIA: DIRETA OU REPRESENTATIVA? Quanto ao tipo de soberania popular, distinguimos a democracia direta da democracia representativa. A mais antiga democracia de que se tem notícia é a ateniense. Trata-se da democracia direta, em que todo cidadão tem não só o direito, como também o dever de participar da assembleia pública a fim de decidir os destinos da polis. A igualdade que daí resulta se caracteriza pela isonomia (igualdade perante a lei) e pela isegoria (direito à palavra na assembléia). O apogeu da democracia grega se deu no século V a.C, mas, a bem da verdade, é preciso lembrar que, na sociedade grega, os escravos, mulheres e estrangeiros não eram considerados cidadãos e portanto se achavam excluídos da vida pública. Restava, de fato, apenas 10% do corpo social capaz de decisão política. O que importa, no entanto, é o surgimento do ideal democrático como um valor novo que se contrapõe à concepção aristocrática de poder. Apesar da experiência democrática, os principais teóricos gregos, como Platão e Aristóteles, veem com reserva a democracia, que para eles ocupa o último lugar dentre as formas de governos. Na Idade Moderna, surgem as teorias políticas contratualistas e que começam a ocupar-se com a questão da legitimidade do poder. Para um liberal como Locke, a legitimidade do poder se encontra na origem parlamentar do poder político. Isto significa que a ocupação de um cargo político não deve resultar de um privilégio aristocrático, mas do mandato popular alcançado pelo voto: a representação política torna-se legítima porque nasce da vontade popular. Em outras palavras: na Idade Média transmitia-se por herança tanto a propriedade como o poder político; o herdeiro do rei, do 64 conde ou do marquês recebia não só os bens como também o poder sobre os homens que viviam nas terras herdadas. Já com o liberalismo, estabelece-se adistinção entre sociedade política e sociedade civil, entre público e privado. Na verdade, o liberalismo dos séculos XVII e XVIII não era igualitário, mas fundamentalmente elitista. Por isso, é preciso entender que a representação política se referia aos que possuíam propriedades e, com o voto censitário, excluía-se do poder a grande maioria, apenas “proprietária do seu corpo”, ou seja, da força de trabalho. Ainda no século XVIII, em pleno período de valorização da legitimidade da representação, Rousseau defende a democracia direta. Para ele, com o contrato social, cada indivíduo aliena incondicionalmente seu poder em favor da coletividade, mas a vontade geral não pode ser alienada nem representada. Isto significa que, para Rousseau, os deputados e governantes não são representantes do povo, mas apenas seus oficiais, estando subordinados à soberania popular, a única que decide por meio de assembleias, plebiscitos e referendos. A vontade geral é um conceito fundamental para compreender a democracia rousseauísta. Todo indivíduo é ao mesmo tempo uma pessoa privada e uma pessoa pública (cidadão): enquanto pessoa privada trata de seus interesses particulares, e enquanto pessoa pública é parte de um corpo coletivo que tem interesses comuns. Nem sempre o interesse de um coincide com o de outro, pois muitas vezes o que beneficia a pessoa particular pode ser prejudicial ao coletivo. Aprender a ser cidadão é justamente saber qual é a vontade geral, típica do interesse de todos enquanto componentes do corpo coletivo, mesmo que à revelia dos seus próprios interesses enquanto pessoa particular. O próprio Rousseau reconhecia as dificuldades em implantar a democracia direta, sobretudo em nações de território extenso e grande densidade populacional. Mas essa objeção não nos deve desanimar na busca do aperfeiçoamento do jogo democrático. Ao contrário, o desafio está justamente em descobrir formas para melhor aproximação dos ideais da democracia. DEMOCRACIA E CIDADANIA: Se até hoje temos nos contentado com a democracia representativa, não há como deixar de sonhar com mecanismos típicos da democracia direta que possibilitem a presença mais constante do povo nas decisões de interesse coletivo. Mas na Constituição brasileira de 1988 foi introduzida a “iniciativa popular de projetos de leis”, através de manifestação do eleitorado, mediante porcentagem mínima estipulada conforme o caso. Essa forma de atuação ainda será regulamentada e devem ser enfrentadas dificuldades as mais diversas para o exercício efetivo. Mas alguns poderiam argumentar: para participar enquanto cidadão pleno é preciso que haja politização, caso contrário haverá apatia ou manipulação. Daí o desafio: quem educa o cidadão? 65 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... Cidadania se aprende no exercício mesmo da cidadania. Embora a escola seja aliada importante, não é nela fundamentalmente que se dá a aprendizagem, pois há o risco da ideologia e do discurso vazio, quando o ensino não é acompanhado de fato pela ampliação dos espaços de atuação política do cidadão na sociedade. A participação popular se intensifica com as já referidas organizações saídas da sociedade civil. Essas organizações, ao colocarem seus representantes em confronto com o poder constituído, tornam-se verdadeiras escolas de cidadania. O importante do processo é que, ao lado dos outros poderes, como o poder oficial do município, do estado e federal, e o poder das elites econômicas, desenvolve-se o poder alternativo. Ou seja, o esforço coletivo na defesa de interesses comuns transforma a população amorfa, inexpressiva e despolitizada em comunidade verdadeira. Na luta contra a tirania e o poder arbitrário, nem as regras da moral, nem apenas as leis impedirão o abuso do poder. Na verdade, como já dizia Montesquieu, só o poder controla o poder”. (Aranha, Maria Lúcia de Arruda e Martins, Maria Helena Pires. Temas de Filosofia. SP: Editora Moderna, 1996, pág. 146-147). PROPOSTA DA COALIZÃO DEMOCRÁTICA: “Para assegurar maior efetividade ao exercício da democracia direta o projeto da Coalizão democrática formula uma nova regulamentação dos instrumentos de democracia direta prevista na Constituição: plebiscito, referendo e projetos de iniciativa popular. Esta nova regulamentação resgata a noção de soberania popular definindo que as grandes questões nacionais só poderão ser decididas pelos mecanismos da democracia direta. Entre tais questões estão concessões de serviços públicos, privatizações, construção de obras de grande impacto ambiental, alienação de bens públicos, entre outros. Os projetos de iniciativa popular poderão ser subscritos por meio de formulário impresso, urnas eletrônicas e assinatura digital na internet e terá rito próprio de tramitação, com a urgência garantida. Caberá à justiça eleitoral conferir as assinaturas”. 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Lucas 22, 24-27 Jesus critica a disputa de poder entre seus discípulos, ensinando que o poder deve ser exercido como um serviço aos outros e não para que aqueles que o detêm em suas mãos tirem dele privilégios e benefícios para si mesmos. “Eles chegaram a discutir sobre quem dentre eles lhes parecia o maior. Ele lhes disse: “Os reis das nações agem com elas como senhores, e os que dominam 66 sobre elas fazemse chamar de benfeitores. Quanto a vós, nada disso. Mas o maior dentre vós tome o lugar do mais moço, e o que comanda, o lugar de quem serve. Qual é, com efeito, o maior: aquele que está à mesa ou aquele que serve? Não é acaso o que está à mesa? Ora quanto a mim, estou no meio de vós no lugar daquele que serve”. 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “A partir de sua experiência de fé, o cristão dispõe de energias espirituais e morais para enfrentar as tentações ligadas ao poder com as vantagens e mordomias que lhe são afetas, para poder suportar sem demasiados desgastes as dimensões neurotizantes da vida partidária, das lutas internas das tendências e da disputa pelo poder. O militante cristão pode colaborar na transparência e retidão nas decisões políticas, sujeitas muitas vezes a conchavos escusos. A fé leva a ser generoso e a viver a gratuidade na luta e a ver as pessoas humanas para além de seus papéis sociais, de seu ser-mulher e seu ser-varão, e então respeitá-las e valorizá-las na riqueza de sua especificidade: a fé leva a conviver com os adversários ideológicos e até com os inimigos, exercendo tolerância e renúncia ao espírito de vingança; essas atitudes são altamente relevantes nas relações políticas e ajudam a elevar a ética política, constituindo, na compreensão de Mikhail Gorbatchev, uma verdadeira espiritualidade, tão necessária face à frieza das estruturas de poder. Importa viver já agora, germinalmente, o homem novo e a nova mulher, que queremos para todos; não se há de esperar a grande aurora quando então estourará a sociedade transformada; se ela não começar pelos próprios atores que a querem e, para gestá-la historicamente, se organizam, ela nunca surgirá”. (Boff, Leonardo e Miranda, Márcia. A Contribuição dos militantes cristãos na política partidária. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, P: Ideias e Letras, 2004, pág.85-86). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Qual a contribuição que os cristãos podem dar à política? Com que espírito, o cristão deve militar politicamente? 2. A democracia representativa, modelo vigente em nosso país, parece insuficiente. Como podemos avançar para uma democracia participativa? Você concorda com as propostas da Coalização democrática que apontam nessa direção? 67 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 6. PARA REFLETIR! (...) “Envolvendo o problema da desigualdade social e econômica, está o problema da intercomunicação dos níveis culturais. Nas sociedades que procuram estabelecer regimes igualitários, o pressuposto é que todos devem ter a possibilidade de passar dos níveis populares para os níveis eruditos como conseqüência normal da transformação de estrutura, prevendo-se a elevação sensível da capacidade de cada um graças à aquisição cada vez maior de conhecimentos e experiências. Nas sociedades que mantêm a desigualdade como norma, e é o caso da nossa, podem ocorrer movimentos e medidas, de caráter público ou privado, para diminuir o abismo entre os níveis e fazer chegar ao povo os produtos eruditos. Mas, repito, tanto num caso quanto no outro está implícita como questão maior a correlação dos níveis. E aí a experiência mostra que o principal obstáculo pode ser a falta de oportunidade, não a incapacidade”. (Antonio CANDIDO.”Direitos humanos e literatura”. In FESTER, Antônio Carlos R. (org.) Direitos humanos e... São Paulo, Brasiliense/Comissão Justiça e Paz de S. Paulo, 1989. p. 123-124). 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com Salmo 72 (71), A autoridade que o povo quer: Ó Deus, confia o teu julgamento ao rei e a tua justiça ao filho do rei. Que ele governe teu povo com justiça, e teus pobres conforme o direito. Que os montes tragam a paz, e as colinas a justiça. Que ele defenda os pobres do povo, salve os filhos do indigente e esmague os seus opressores. Que ele dure como o sol e a luz, de geração em geração. Que ele desça como chuva sobre a erva, como chuvisco que irriga a terra. Que em seus dias floresça a justiça e muita paz até o fim das luas. Que ele domine de mar a mar, do Grande Rio até os confins da terra. Amém! 8. CANTO FINAL: Somos gente da esperança ou outro à escolha do grupo. 68 ENCONTRO X A Democratização da Mídia “Não há instituição humana que não tenha seus perigos. Quanto maior a instituição, maiores as chances de abusos. A democracia é uma grande instituição e por isso mesmo está sujeita a ser consideravelmente abusada. Mas o remédio não é evitar a democracia e sim reduzir ao mínimo a possibilidade de abuso.” (Richard At-tenbourough. As palavras de Gandhi.) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Outro grande problema que impede uma verdadeira democratização da política brasileira são os oligopólios e monopólios da mídia por parte de políticos e de suas famílias. No artigo reproduzido abaixo, a situação alarmente nesse setor é colocada pelo jornalista Carlos Gustavo Yoda. Leiamos o que ele diz a respeito da questão: CARLOS GUSTAVO YODA: Desde 2011, tramita no Supremo Tribunal Federal uma ação, intitulada “Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental” (ADPF), elaborada pelo Intervozes, em parceria com o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que pede a declaração de inconstitucionalidade à concessão de outorgas de radiodifusão a emissoras controladas por políticos. A arguição - “acusação”, para desembrulhar o juridiquês, também afirma que, desde a posse, os parlamentares não podem mais ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada. Assim, defende como inconstitucional o ato de posse desses radiodifusores eleitos, pelo fato de os mesmos não terem deixado, antes, o controle de suas emissoras. A base da ADPF 246 é o artigo 54 da Constituição, que aponta, em seus dois primeiros parágrafos, como fundamento da República, que deputados e senadores não podem firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público. Além deste artigo, a ação também entende que a prática do coronelismo eletrônico viola o direito à informação (artigo 5º e 220 da Constituição Federal), a separação entre os sistemas público, estatal e privado de comunicação (art. 223), o direito à realização de eleições livres (art. 60), o princípio da isonomia (art. 5º) e o pluralismo político e o direito à cidadania (art. 1º). Além da Constituição Federal, o artigo 38 do Código Brasileiro de 70 Telecomunicações, principal lei que rege o setor, aponta, em seu parágrafo primeiro, que não pode exercer a função de diretor ou gerente de concessionária, permissionária ou autorizada de serviço de radiodifusão quem esteja no gozo de imunidade parlamentar ou de foro especial. No entanto, a ADPF cita mais de 40 deputados federais e senadores, da atual legislatura, que controlam diretamente pelo menos uma emissora de rádio ou televisão em seu estado de origem. A tese da ação aponta diferentes órgãos como responsáveis pela ilegalidade. Em primeiro lugar, o Ministério das Comunicações e a Presidência da República, por concederem outorgas a empresas que não poderiam recebêlas e pela omissão na fiscalização das emissoras; o Congresso Nacional, também responsável pela autorização e renovação das outorgas e pela diplomação dos parlamentares; e o Poder judiciário, também responsável pela diplomação de candidatos eleitos. O STF ainda não se manifestou sobre o tema, mas já coletou a manifestação dos órgãos envolvidos. Em parecer enviado ao Supremo, o Senado afirma que o entendimento de sua Comissão de Constituição e Justiça é de que os contratos de concessão e de permissão de radiodifusão enquadram-se na incompatibilidade constitucional prevista pelo artigo 54, II, “a”. Deputados e senadores não poderiam, portanto, ser proprietários e controladores de pessoas jurídicas prestadoras do serviço de radiodifusão pois estas gozam do benefício decorrente da celebração de contrato com pessoa jurídica de direito público – no caso, a União. (...) A posição da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal (MPF), também é de que os detentores de mandatos não podem direta ou indiretamente ter vínculo societário em empresas que detêm concessão de radiodifusão. “Sem meias palavras, uma das grandes tragédias da comunicação social no país é o fato dos parlamentares terem o controle gerencial dessas empresas. É um poder que retroalimenta o controle político”, pontua o procurador Regional da República no Rio Grande do Sul, Domingos Sávio da Silveira. “O que me parece mais grave é o poder de gestão que esses clãs políticos exercem sobre concessões [de radiodifusão]. E mais do que isso, como o fato de ser parlamentar tem ao longo da história feito com que as concessões sejam dirigidas a empresas que estão sob o controle indireto desses parlamentares”, acrescenta. Para Silveira, quando grupos políticos controlam as emissoras acontece a distorção direta do processo político. “É a falsificação da democracia. A opinião pública é construída pela mídia. Se frauda a democracia quando, através da utilização desigual de uma concessão, se consegue uma visibilidade incomparável em relação aos outros candidatos”, explica. (...) 71 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... A Deputada Luiza Erundina (PSB-SP), no entanto, que presidiu a Subcomissão, constata a dificuldade de se fazer cumprir tal compreensão, justamente porque o número de parlamentares que, de forma ilegal e inconstitucional, são detentores de concessões de rádio e TV ainda é elevado. “E eles têm seus prepostos, seus representantes, na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara e do Senado, o que explica a dificuldade que há em se avançar minimamente em relação a esse marco legal”, diz. Em 2010, o então ministro chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Franklin Martins, também afirmou a inconstitucionalidade do controle de outorgas de radiodifusão por políticos. De acordo com ele, “criou-se terra de ninguém. Todos sabemos que deputados e senadores não podem ter televisão, tem TV e usam de subterfúgios dos mais variados”. (...) Para o procurador Domingos Sávio da Silveira, a sociedade deve procurar o Ministério Público Federal para denunciar possíveis casos de uso indevido de concessões públicas que podem interferir no processo eleitoral. Ele acredita que iniciativas como a ADPF 246 e demandas individuais e pontuais que podem ser delatadas não devem ser entendidas como “censura”, como colocamse os opositores a todo e qualquer tipo de regulação da mídia. “Seria muito bom que toda a sociedade fizesse representações. É preciso provocar em cada local um processo de aplicação democrática da Constituição, de construção da igualdade. Essas ações têm poder pedagógico”, conclui. (Carlos Gustavo Yoda é jornalista e integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social). 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Marcos 10, 35-45. Os discípulos de Jesus disputam poder e privilégios, alimentando desavenças entre eles. Jesus aproveita a ocasião para ensinar que, a exemplo dele, o discípulo é aquele que serve e o exercício da autoridade não é mero poder, mas serviço aos outros até mesmo com o sacrifício de si mesmo e dos seus próprios interesses. “Tiago e João, filhos de Zebedeu, foram a Jesus e lhe disseram: “Mestre, queremos que faças por nós o que vamos te pedir”. Jesus perguntou: “O que vocês querem que eu lhes conceda?”. Eles responderam: “Quando estiveres na glória, deixa-nos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda.” Jesus então lhes disse: “Vocês não sabem o que estão pedindo. Por acaso, vocês podem beber o cálice que eu vou beber. Podem ser batizados com o batismo com que 72 eu vou ser batizado?” Eles responderam: “Podemos.” Jesus então lhes disse: “Vocês vão beber o cálice que eu vou beber, e vão ser batizados com o batismo com que vou ser batizado. Mas não depende de mim conceder o lugar à minha direita ou esquerda. É Deus quem dará esses lugares àqueles, para os quais ele preparou.” Quando os outros dez discípulos ouviram isso, começaram a ficar com raiva de Tiago e João. Jesus chamou-os e disse: “Vocês sabem: aqueles que se dizem governadores das nações têm poder sobre elas, e os seus dirigentes têm autoridade sobre elas. Mas entre vocês não deverá ser assim: quem de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês, e quem de vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se o servo de todos. Porque o Filho do Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e para dar a sua vida como resgate em favor de muitos.” 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “Cristo propôs uma concepção revolucionária do poder: o poder-serviço. Trata-se aí de um poder essencialmente diverso do poder-dominação. É o poder convertido, exorcizado do demônio da prepotência que costuma fazer nele sua habitação. Essa ideia é antes de tudo um “evangelho”, no sentido estrito de boa-nova que deve ser vivida como um credo, uma convicção profunda. Como se vê, estamos aqui no campo da espiritualidade. A ideia de poder-serviço deve estar profundamente enraizada no coração do cristão militante. Para ele, esse poder-serviço deve constituir um tema permanente de mediação e uma fonte perene de inspiração. Trata-se de um ideal que deve penetrar em todas as veias da alma e do corpo, para daí irradiar em forma de atitudes e de comportamentos consequentes.” (Boff, Clodovis. Espiritualidade do Militante. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 208). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Procure levantar as concepções de poder que as pessoas próximas de você têm no dia a dia. Contraste-as com a noção evangélica de poder-serviço. 2. É possível construir uma verdadeira democracia sem a democratização da mídia? Converse com os demais sobre quem domina a mídia em sua região. Há políticos donos de canais de TV e emissoras de rádio? 73 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 6. PARA REFLETIR! Coração de Estudante Milton Nascimento Quero falar de uma coisa, adivinhe onde ela anda: deve estar dentro do peito ou caminha pelo ar. Pode estar aqui do lado, Bem mais perto que pensamos; A folha da juventude é o nome certo desse amor. Já podaram meus momentos Desviaram seu destino, seu sorriso de menino Quantas vezes se escondeu. Mas, renova-se a esperança, Nova aurora a cada dia, E há que se cuidar do broto, oh! Pra que a vida nos dê flor, flor e fruto! Coração de estudante Há que se cuidar da vida, Há que se cuidar do mundo, Tomar conta da amizade. Alegria e muito sonho Espalhados nos caminhos: Verdes plantas, sentimentos, Folhas, coração, juventude e fé. 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a Ave Maria latino-americana de Frei Betto: Ave Maria, grávida das aspirações de nossos pobres, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre os oprimidos, benditos são os frutos de libertação do vosso ventre. Santa Maria, Mãe latinoamericana, rogai por nós para que confiemos no Espírito de Deus, agora que o nosso povo assume a luta por justiça e na hora de realiza-la em liberdade, para um tempo de paz. Amém. 8. CANTO FINAL: Canta Francisco de Luiz A. Passos ou outro à escolha do grupo. 74 ENCONTRO XI O Sistema Tributário Brasileiro “Se emprestares dinheiro ao meu povo, ao necessitado que está contigo, não agirás com ele como um agiota, não lhe cobrareis juros. Se tomares o manto do teu próximo em penhor, devolvê-lo-ás ao pôr-do-sol, pois o manto que lhe protege a pele é o seu único cobertor. E se acontecer de ele clamar a mim, hei de ouvilo, pois eu sou compassivo” (Ex. 22,24-26) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Outra necessidade que se faz urgente é a reforma tributária. A 5ª. Semana Social brasileira, realizada pela CNBB, discutiu o modelo de Estado que temos e o Estado que queremos. Um dos itens abordados foi o Sistema Tributário brasileiro. Reproduzimos abaixo o texto publicado pela CNBB sobre esta questão: “O elemento que estrutura o Estado nacional é o seu sistema fiscal, pois, no mundo real, os objetivos e fundamentos institucionais do Estado materializamse na forma como são arrecadados os tributos e como são distribuídos os recursos públicos. O desenho do sistema fiscal, portanto, reflete, como numa fotografia, o modelo de estado que temos na prática, o qual, como sabemos, resulta da correlação de forças e nas disputas de classes existentes na sociedade. O poder que predomina é o que define, em seu favor, a configuração do sistema fiscal do país. No Brasil, a estrutura do Estado encontra-se capturada por uma minoria que controla a maior parte das riquezas sociais, que são os donos dos meios de produção, e isso faz com que o sistema fiscal pese muito mais sobre os pobres e trabalhadores do que sobre os ricos e capitalistas, portanto, beneficie mais os ricos do que os pobres. No campo da tributação, verificamos que a maior parte dos impostos incide de forma invisível sobre o consumo, prejudicando mais os que ganham menos, pois estes utilizam toda sua renda em consumo. A tributação direta, ou seja, aquela que incide sobre a riqueza ou sobre o patrimônio, representa uma parte bem menor do volume total dos recursos arrecadados. Por isso, é que aqueles que ganham até dois salários mínimos gastam quase a metade em tributos enquanto os que ganham mais de trinta salários mínimos gastam menos de 28% com tributos. Além disso, os ricos desfrutam de vários tipos de benefícios e privilégios fiscais, como isenções, incentivos fiscais, alíquotas reduzidas, nenhuma tributação sobre grandes fortunas e inúmeros artifícios que permitem colocar seus ganhos e seus patrimônios a salvo de qualquer tributação. 76 O aumento da tributação sobre os mais pobres decorre da decisão política de diminuir a carga sobre os mais ricos, embasada nas mais variadas e esdrúxulas justificativas, argumentando que é preciso primeiro fazer o bolo crescer para só depois distribuí-lo e que, se tributar o capital, ele pode fugir para outros países que lhe tratem melhor. E mais: tributar o capital é afrontar o direito de propriedade. Isso só é possível e tolerável porque esta tributação feita sobre os pobres se dá de forma invisível. Do lado dos recursos públicos para os pobres, que são a maioria da população brasileira, sobra apenas uma pequena parcela daquilo que foi reservado aos ricos, que é uma parcela que recebe uma parte generosa desses recursos. As garantias dos privilégios foram estabelecidas por instrumentos como o superávit primário e a desvinculação das receitas da União (DRU) e outras medidas que possibilitaram reservar dos recursos públicos uma parcela generosa para atender aos interesses privados e, com isso, fazendo com que a elevação da carga tributária que o Brasil promoveu nas última décadas não tenha refletido na melhoria das condições de vida da população. Com isso, as políticas sociais continuam disputando entre si uma pequena e residual parcela dos recursos públicos, como se a escolha se restringisse em decidir entre saúde ou educação, entre educação ou previdência, entre saneamento básico ou moradia, quando a verdadeira disputa deveria ser entre o interesse privado ou o interesse público. No orçamento da União, quase a metade dos recursos é destinada ao pagamento dos serviços da dívida pública, valor que beneficia uma parcela muito pequena da população, enquanto as políticas de inclusão social ficam com as migalhas. Mas, que dívida é esta que só cresce e que consome a maior parte dos nossos recursos? Este é um segredo guardado a sete chaves. Inúmeros esforços para a realização de uma auditoria cidadã neste endividamento são sempre rechaçados pelos detentores do poder e principais beneficiários desta dívida, apesar de haver previsão constitucional para a sua realização. O sistema da dívida pública vem se transformando mais num importante instrumento de extração de riquezas da sociedade, para uma pequena elite nacional e internacional, do que em mecanismo para financiamento do Estado. (...) Ainda que não falemos da dívida, os interesses privados têm sempre um espaço privilegiado na disputa dos recursos públicos, garantindo a total precedência dos poucos credores financeiros em detrimento dos milhões de credores sociais e esta é uma lógica mundial. Segundo dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), na crise financeira de 2008, os Estados centrais aportaram nada menos do que sete trilhões de dólares de recursos 77 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... públicos para socorrer as grandes corporações empresariais e financeiras. O Brasil participou, também, do esforço internacional para salvamento dos grandes negócios, distribuindo inúmeros benefícios fiscais que ajudaram a manter a lucratividade dos grandes negócios no mundo. Ao cobrar mais impostos dos pobres do que dos ricos e ao privilegiar mais os interesses privados das elites econômicas e financeiras, do que o interesse social e coletivo, o Estado contribui para o aprofundamento das desigualdades sociais.” (CNBB, O Estado que temos e o Estado que queremos. Estado para que e para quem? Brasília: Edições CNBB, 2013, págs. 22-25). 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Atos dos Apóstolos 2, 42-47 O retrato da primeira comunidade cristão é o modelo que deve orientar qualquer sociedade. Quem adere ao cristianismo deve abraçar o convite à conversão que deve alterar as relações sociais, condição para se criar uma nova sociedade. “Eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, no partir do pão e nas orações. Em todos eles havia temor, por causa dos numerosos prodígios e sinais que os apóstolos realizavam. Todos os que abraçaram a fé eram unidos e colocavam em comum todas as coisas; vendiam suas propriedades e seus bens e repartiam o dinheiro entre todos, conforme a necessidade de cada um. Diariamente, todos juntos frequentavam o templo e nas casas partiam o pão, tomando alimento com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e eram estimados por todo o povo. E a cada dia o Senhor acrescentava à comunidade outras pessoas que iam aceitando a salvação.” 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “A concepção dominante de desenvolvimento é a que o mundo experimenta hoje de forma cada vez mais generalizada e globalizada. Está baseada numa série de postulados, entre os quais focalizaremos apenas três: o desenvolvimento como mero crescimento econômico; o da democracia como um conjunto de direitos apenas individuais, aos quais têm pleno acesso somente aqueles que vivem do capital, mais que de sua força de trabalho; 78 e o da educação como um processo seletivo e de caráter predominantemente funcional, visando formar pessoas dispostas e capazes para perpetuar o sistema dominante de divisão do trabalho. Desenvolvimento é apresentado pela cultura do Capital como sinônimo de crescimento econômico, de modernização industrial, de progresso tecnológico e de acumulação ilimitada de bens materiais. A herança do Racionalismo e do Iluminismo inclui a crença na dominação da natureza pela humanidade através da indústria e da técnica. O ser humano é colocado arrogantemente não apenas no centro do Universo e da natureza, mas é visto como um ser superior à natureza, todo-poderoso por virtude de sua razão e dos objetos que ela cria. (...) A questão da democracia está ligada a quem exerce na prática o papel de sujeito dodesenvolvimento, tanto no plano político quanto no econômico, tecnológico, social e cultural. Na cultura do Capital, o sujeito é sinônimo de ‘livre mercado’, ou ‘setor privado’. (...) A democracia do capital é seletiva e excludente, no que se refere aos que podem usufruí-la, e restritiva, em termos dos diferentes aspectos e dimensões da existência humana e social que ela abrange. Nesse contexto sócio-político de exclusão e subordinação, a educação é direito apenas de alguns e é tanto mais abrangente e de qualidade, quanto mais próximo o indivíduo estiver do topo da pirâmide social. As maiorias, que compõem a base da pirâmide são ou privadas do acesso à educação, ou orientadas para uma educação predominantemente funcional, à qual se convencionou chamar ‘capacitação’. (...) A educação para compreender criticamente a realidade, para desenvolver uma visão prospectiva e o potencial de gestão e de tomadas de decisão, fica restrita aos membros das elites cuja função será dirigir a economia, a sociedade e o Estado e, assim, perpetuar o sistema socialmente estratificado do capital.” (Boff, Leonardo e Arruda, Marcos. Educação e desenvolvimento na perspectiva da democracia integral. In: Oliveira, Pedro R. de. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2004, pág. 174-180). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Você acha possível uma democracia se forem mantidos os níveis atuais de desigualdade sócio-econômica, no Brasil? 79 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 2. As políticas sociais como bolsa-família, cotas sociais, maior acesso à educação de qualidade são importantes, mas não mudaram ainda a estrutura econômica vigente. Quais os mecanismos, no que diz respeito à Reforma Tributária, capazes de diminuir os atuais níveis de desigualdade e mudar a distribuição de riquezas, no país? 6. PARA REFLETIR! “A religião também pode ser manipuladora de consciências, no que diz respeito ao verdadeiro lugar do valor econômico. Assim, temos muitas instituições religiosas que pregam a chamada “teologia da retribuição”, segundo a qual Deus ajuda principalmente aqueles que ajudam financeiramente a instituição religiosa. Assim, a doação financeira estabelece vínculos comerciais entre a pessoa e o próprio Deus, que se torna sujeito de obrigações perante o fiel. Outro problema que surge é que a religião fica reduzida a questões do dia-a-dia, sem abrir-se ao transcendente e sem buscar os significados mais profundos da existência humana ou o empenho em vista à transformação social.” (Manual da CF/2010, pág. 291). 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a oração: Senhor, tu conheces o mundo em que vivemos e nos convidas a fazer algo melhor, deixando uma boa marca por onde passamos. Ajuda-nos hoje a aprender mais, a ouvir tua mensagem com vontade de entrar em ação. Fica conosco para nos animar a fazer o que é certo, com sabedoria e sem desanimar.Confiamos no teu amor e queremos que o teu Espírito nos conduza. Amém. 8. CANTO FINAL: Hino da CF/2010 ou outro à escolha do grupo. 80 ENCONTRO XII O Papel do Estado na Atual Fase do Capitalismo “O Estado é um produto da sociedade numa certa fase de seu desenvolvimento. É a confissão de que essa sociedade se embaraçou numa insolúvel contradição interna, se dividiu em antagonismos inconciliáveis de que não pode desvencilhar-se”. (Lênin) CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 1. PREPARANDO O ENCONTRO Os dirigentes do encontro devem ler com atenção e antecedência todo o conteúdo proposto, estudá-lo com cuidado e pesquisar material adicional na internet além de preparar o ambiente do encontro de modo a favorecer a discussão, compreensão e participação de todos. Sugere-se organizar o ambiente em círculo, com ilustrações e arranjos ao centro que despertem para o tema, além da Bíblia, figuras e recortes de jornais e revistas. 2. INTRODUÇÃO AO TEMA Para concluir nossos encontros, dedicaremos este último ao tema do papel do Estado a partir das reflexões da 5ª. Semana Social brasileira, promovida pela CNBB. Reproduziremos abaixo parte do terceiro capítulo do estudo: “Do ponto de vista histórico, foi após a Revolução Francesa que o Estado passou a se fundamentar e a se constituir, através da denominada democracia burguesa, em três poderes: legislativo, executivo e judiciário. Sendo os dois primeiros escolhidos pelo voto, sufrágio universal, enquanto que o judiciário não o é. O conjunto destas instituições, acrescido das forças armadas, funciona como mecanismo fundamental para a defesa dos interesses da classe dominante. (...) O Estado para ser reconhecido pela sociedade, inclusive pela classe trabalhadora, apresenta-se como uma entidade neutra. Para tanto, utiliza dos meios de comunicação, reprime a liberdade de expressão a fim de consolidar a ideia de que os interesses da classe dominante são benéficos a todos. Dentro da chamada democracia burguesa, qualquer forma de participação popular se dá sempre em períodos de paz, pois em momentos de conflito entre as classes, o grupo dominante jamais coloca em risco o seu controle sobre a propriedade privada, a ideologia e o controle da força, partes inerentes do Estado, sempre administradas por um governo de plantão. Ou seja, em períodos de crise como a que passamos hoje, os capitalistas jamais fazem concessões para maior participação popular no conjunto das instituições do Estado; ao contrário, elas se fecham e se tornam mais repressivas, como no caso das forças armadas. Como forma de superação da atual crise financeira do sistema capitalista, o capital tem apresentado algumas saídas clássicas para aumentar os lucros, a produtividade do trabalho e dos trabalhadores. Para tanto, multiplica as unidades de bens e serviços, otimiza o tempo e aprofunda a exploração do trabalhador e dos bens da natureza. 82 COMO FAZEM PARA ALCANÇAR ESTE OBJETIVO? a) Pelo domínio e controle da técnica em vista de maior produtividade. b) Pelo aprimoramento de tecnologias que tornam o trabalho do trabalhador mais produtivo. c) Pela exploração e apropriação dos bens naturais, transformando-os em mercadorias (minérios, petróleo, água, biodiversidade, etc). d) Pela utilização da força política, econômica e organizativa do Estado (as últimas eleições mostraram uma disputa acirradíssima pelo controle do Estado). (...) No Brasil, como não há um projeto claro, tanto o Estado quanto o governo seguem o projeto do capital internacional. Quando as forças populares estão desarticuladas, as tentativas de reformas ou as mudanças na legislação são para piorar as condições para os trabalhadores ou para o capital avançar sobre o controle do território e promover a devastação ambiental, tal como aconteceu recentemente com o Código Florestal. Está sujeito acontecer o mesmo com o Código da Mineração que se encontra em tramitação no Congresso Nacional. Não obstante, vivemos em um estado democrático de direito, o Estado tem se colocado como braço armado e repressivo das lutas populares e dos movimentos sociais, criminalizando e encarcerando lideranças. DESAFIOS PARA A CLASSE TRABALHADORA: Frente à conjuntura atual, como primeiro desafio, há que se construir uma estratégia de unificação da classe trabalhadora, criando mecanismos que identifiquem seus opositores que, neste momento, se expressam pela força devastadora do capital. O segundo desafio é compreender que as mudanças na sociedade, e consecutivamente no Estado, somente ocorrerão através da participação popular, por meio do exercício da democracia direta: plebiscitos, referendos e outras formas democráticas de pressão. O terceiro desafio está na retomada do trabalho de base, sobretudo junto aos pobres e excluídos, possibilitando-lhes maior compreensão da realidade que os cerca e capacitandoos para uma intervenção organizada na superação da estrutura da sociedade atual. É também fundamental a discussão sobre o Projeto Popular para o Brasil, que tenha como protagonista a classe trabalhadora, a defesa e a garantia de seus direitos e dos direitos da natureza, preservando no presente e no futuro a sobrevivência da comunidade de vida que compõe nosso planeta”. (CNBB, O Estado que temos e o Estado que queremos. Estado para que e para quem? Brasília: Edições CNBB, 2013, págs.29-33). 83 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 3. ILUMINAÇÃO BÍBLICA: Isaías 58, 6-8.10 A verdadeira religião consiste em praticar a justiça e o direito. Isaías condena toda forma de religião e práticas de piedade que escondam uma falta de compromisso com o projeto de Deus. O culto verdadeiro consiste na solidariedade com os oprimidos e na luta efetiva pela libertação. “O jejum que eu prefiro, acaso não é este: desatar os laços provenientes da maldade, desamarrar as correias do jugo, dar liberdade aos que estavam curvados, em suma, que despedaceis todos os jugos? Não é partilhar o pão com o faminto? E ainda: os pobres sem abrigo, tu os albergarás; se vires alguém nu, cobri-lo-ás: diante daquele que é a tua própria carne, não te recusarás. Então a tua luz despontará como a aurora, e o teu restabelecimento se realizará bem depressa. Tua justiça caminhará diante de ti e a glória do Senhor será a tua retaguarda... se cederes ao faminto o teu próprio bocado, e se aliviares a garganta do humilhado, tua luz se levantará nas trevas, tua escuridão será como o meio dia”. 4. ILUMINAÇÃO TEOLÓGICA “Todas as linhas inspiracionais da espiritualidade cristã hão de ser vividas pelo militante na imanência histórica, no esforço da vida política. Elas devem se encarnar no material mesmo de que é entretecida sua vida. Pois é de dentro de seu mundo vital que ele há de encontrar Deus e viver de seu Espírito. O pecado capital do militante é naturalmente fugir da realidade. Sua é a mística da terra. Ele pode dizer como o grande místico sufi Al-Hallaj (+922): “Mas que terra pode estar vazia de Ti, para que eu deva buscar-te no céu?”. Isso significa que a espiritualidade do militante é essencialmente de encarnação. A fórmula de sua identidade espiritual é: contemplativos em ação, como se disse de Santo Inácio. Trata-se de uma espiritualidade tipicamente “leiga”, como mostra muito esclarecedoramente o Vaticano II no precioso no. 31 da Lumen Gentium. Nesse sentido, pode-se falar numa ‘espiritualidade secular’, em nosso caso, numa ‘santidade política’. 84 Efetivamente, o mundo político é um espaço que pode ser ‘espiritualizado’ na medida em que o militante o vive na sintonia do Espírito. Diz muito bem o decreto conciliar sobre os leigos: “Os assuntos seculares não devem ser estranhos à espiritualidade da vida cristã do leigo, segundo a expressão do apóstolo: ‘O que quer que fizerdes, por palavra ou por ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus Cristo, dando graças a Deus Pai por Ele’ (Cl. 3,17)” (AA 4,1). (Boff, Clodovis. Espiritualidade do Militante. In: Oliveira, Pedro R. Fé e Política – Fundamentos. Aparecida: Ideias & Letras, 2004, pág. 202). 5. DE OLHO NA REALIDADE! REFLETINDO EM PEQUENOS GRUPOS... A partir dos textos acima, discutir em pequenos grupos as questões: 1. Nossa experiência de Estado, no Brasil, especialmente nos anos da ditadura militar, era a de um estado repressor. Hoje, vemos que podemos ter outros tipos de estado. Qual é o Estado que queremos? 2. Tente desenhar o Estado que queremos a partir das características fundamentais que, a partir desse estudo, você descobriu que ele precisa ter. 6. PARA REFLETIR! “Nações há no Novo Mundo – EUA, Canadá, Austrália – que são meros transplantes da Europa para amplos espaços de além-mar. Não apresentam novidade alguma neste mundo. São excedentes que não cabiam mais no Velho Mundo e aqui vieram repetir a Europa, reconstituindo suas paisagens natais para viverem com mais folga e liberdade, sentindo-se em casa. É certo que às vezes se fazem criativos, reinventando a república e a eleição grega. Raramente. São, a rigor, o oposto de nós. Nosso destino é nos unificarmos com todos os latino-americanos por nossa oposição comum ao mesmo antagonista, que é a América anglo-saxônica, para fundarmos, tal como ocorre na comunidade europeia, a Nação LatinoAmericana sonhada por Bolívar. Hoje, somos 500 milhões, amanhã seremos 1 bilhão. Vale dizer, um contingente humano com magnitude suficiente para encarnar a latinidade em face dos blocos chineses, eslavos, árabes e neobritânicos na humanidade futura”. (Ribeiro, Darcy. O Povo brasileiro). 85 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... 7. MOMENTO DE ORAÇÃO Após algumas preces espontâneas, concluir com a seguinte oração: Ó Senhor Jesus Cristo, conservai-nos no vosso amor. Permiti que ouçamos a vossa voz e acreditemos naquilo que dizeis, porque somente Vós tendes palavras de vida eterna. Ensinai-nos a professar a nossa fé, a manifestar o vosso amor e a transmitir a vossa esperança aos outros. Fazei de nós testemunhas convictas do vosso Evangelho num mundo tão necessitado da vossa graça salvífica. Fazei de nós o novo povo das Bem-aventuranças, afim de que possamos ser o fermento, o sal da terra e a luz do mundo no terceiro milênio cristão! (JMJ/2002). 8. CANTO FINAL: Hino da CF/2015 ou outro à escolha do grupo. 86 CONVERSANDO SOBRE A REFORMA POLÍTICA... • Sites Fé e Política, Justiça e Paz COMISSÃO BRASILEIRA DE JUSTIÇA E PAZ: http://www.cbjp.org.br ÉTICA E DIREITOS HUMANOS: www.krohling.com MOVIMENTO NACIONAL DE FÉ E POLÍTICA: www.fepolitica.org.br CENTRO DE FÉ E POLÍTICA: www.cefep.org.br LAICATO SP: www.claspnet.org.br CIDADANIA E POLÍTICA: www.cidadaniaepolitica.org.br CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO: www.cimi.org.br COMISSÃO PASTORAL DA TERRA/CNBB: www.cptnacional.org.br CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL: www.cnbb.org.br • Vídeos disponíveis na internet que podem ser úteis aos encontros de JUPIC: IMAGENS CHOCANTES DE COMO A MINERAÇÃO DA VALE AFETA MINAS GERAIS! https://www.youtube.com/watch?v=N40i5dyelcM DOCUMENTÁRIO SOBRE O PROJETO DE MINERAÇÃO MINAS-RIO! http://issuu.com/ibase/docs/liv_ibase_minerio_final4 JUVENTUDES - ESPIRITUALIDADE LIBERTADORA http://www.youtube.com/watch?v=N3UCEFZjOrc&list=UUp883u9kbNNZnR96yTf_IQ&index=2 ESPIRITUALIDADE E UTOPIAS LIBERTÁRIAS - LEONARDO BOFF https://www.youtube.com/ watch?v=J92aBNzcNME&feature=share&list=UUp883u9kbNNZn ESPIRITUALIDADE DA LIBERTAÇÃO: MARCELO DE BARROS https://www.youtube.com/watch?v=F3KwBSKmoss VÍDEOS PARA USO DAS CEB´S Vídeos Teologia da Libertação produzidos pelo Iser Assessoria EL DIOS DE LOS POBRES - ESPIRITUALIDADE DA LIBERTAÇÃO 1990 - 23 MIN Apresenta a Teologia da Libertação como um forte movimento de espiritualidade revolucionado pelos empobrecidos. O vídeo abre espaço para uma reflexão sobre a articulação que vigora entre gratuidade e eficácia libertadora, assim como para as 88 dificuldades que o tema tem suscitado na prática pastoral. El Dios de los Pobres - Parte 1 https://www.youtube.com/watch?v=4CGqNIuf3m8 El Dios de los Pobres - Parte 2 https://www.youtube.com/watch?v=f39784ERsks A IGREJA DOS POBRES 1990 - 23 MIN Apresenta a nova consciência da Igreja, que acompanha a irrupção histórica dos pobres e seu movimento de cidadania eclesial: o significado da Igreja dos pobres e o desafio que essa representa para toda a Igreja. A Igreja dos Pobres - Parte 1 https://www.youtube.com/watch?v=Ht1EHOEajjA A Igreja dos Pobres - Parte 2 https://www.youtube.com/watch?v=HiC82QokNfQ BÍBLIA: DEUS VIVO - 1990 - 22 MIN Traz os aspectos essenciais da nova interpretação popular da Bíblia, que vem ganhando cidadania na América Latina e, em particular, o método de Frei Carlos Mesters. O vídeo procura mostrar a importância da Bíblia na vida das Comunidades Eclesiais de Base, o que está surgindo de novo na sua interpretação e suas características mais importantes. Bíblia: Deus Vivo - Parte 1 https://www.youtube.com/watch?v=Z737ICp8oX8 Bíblia: Deus Vivo - Parte 2 https://www.youtube.com/watch?v=Ib-zSOj1Ty0 UNS E OUTROS - O DESAFIO DA INCULTURAÇÃO - 1990 - 23 MIN Abre espaço para uma reflexão de estrema atualidade para a Igreja: a questão do outro, da identidade e diferença, a relação de evangelização com a religião popular, com os desafios específicos do índio e do negro e a questão do sincretismo religioso. Uns e Outros - Parte 1 https://www.youtube.com/watch?v=DLWcPc7su0g Uns e Outros - Parte 2 https://www.youtube.com/watch?v=I-xRkmVCF18 NOSSA AMÉRICA - 1989 - 25 MIN A luta dos países latino-americanos contra a dependência econômica, a injustiça social e a dominação política. A partir da edição de vários filmes, esse vídeo foi feito como material informativo para o 7º Encontro Intereclesial de Cebs. Nossa América - Parte 1 https://www.youtube.com/watch?v=JRL2PJXGOZA Nossa América - Parte 2 https://www.youtube.com/watch?v=av0MdMTY8K EXPLORAÇÃO DE URÂNIO EM CAETITÉS, BAHIA. https://www.youtube.com/watch?v=69KhzmY-DY0 89 ANOTAÇÕES 90 91 ANOTAÇÕES 92 93 ANOTAÇÕES 94 95