Células - tronco Profº: Cláudio Giovannini Introdução Entre as cerca de 75 trilhões de células existentes em um homem adulto, por exemplo, são encontrados em torno de 200 tipos celulares distintos. Todos eles derivam de células precursoras, denominadas “células-tronco”. A célula-tronco prototípica é o óvulo fertilizado (zigoto). Essa única célula é capaz de gerar todos os tipos celulares existentes em um organismo adulto, até os gametas — óvulos e espermatozóides — que darão origem a novos zigotos (Figura 1) Introdução Fig. 1: Organismo completo, com inúmeros tipos diferentes de células, forma-se a partir de apenas uma célula — o óvulo fertilizado (zigoto). Introdução Logo após a fecundação, o zigoto começa a se dividir: uma célula em duas, duas em quatro, quatro em oito e assim por diante. Pelo menos até a fase de oito células, cada uma delas é capaz de se desenvolver em um ser humano completo. São chamadas de totipotentes. Na fase de oito a dezesseis células, as células do embrião se diferenciam em dois grupos: um grupo de células externas que vão originar a placenta e os anexos embrionários, e uma massa de células internas que vai originar o embrião propriamente dito. Após 72 horas, este embrião, agora com cerca de cem células, é chamado de blastocisto. As células internas do blastocisto vão originar as centenas de tecidos que compõem o corpo humano. São chamadas de células tronco embrionárias pluripotentes (Figura 2) Introdução Figura 2: Representação esquemática da disposição das células-tronco no embrião. História A incrível capacidade de gerar um organismo adulto completo a partir de apenas uma célula tem fascinado os biólogos desde que o fisiologista alemão Theodor Schwann (1810-1882) lançou, em 1839, as bases da teoria celular. Já no início do século 20, vários embriologistas, entre eles os alemães Hans Spemann (1869-1941) e Jacques Loeb (1859-1924), começaram a decifrar os segredos das células-tronco através de experimentos engenhosos com células de embriões. História Tais pesquisas revelaram que, quando as duas primeiras células de um embrião de anfíbio são separadas, cada uma é capaz de gerar um girino normal, e que, mesmo após as quatro primeiras divisões celulares de um embrião de anfíbio, o núcleo dessas células embrionárias ainda pode transmitir todas as informações necessárias à formação de girinos completos, se transplantado para uma célula da qual o núcleo tenha sido retirado (célula anucleada). Apareceu uma pergunta fundamental para a moderna biologia do desenvolvimento: o núcleo de uma célula totalmente diferenciada seria capaz de gerar um indivíduo adulto normal, se transplantado para um óvulo anucleado? Em 1996, o nascimento da ovelha Dolly, primeiro mamífero clonado a partir do núcleo de uma célula adulta diferenciada (uma célula epitelial de glândula mamária), trouxe a resposta. Características: São indiferenciadas; Têm a capacidade de gerar não só novas células-tronco como grande variedade de células diferenciadas funcionais (Figura 3). Figura 3: A divisão das células-tronco embrionárias segue dois modelos: o determinístico (A), que gera sempre uma célula-tronco e uma célula diferenciada, e o aleatório (B), em que podem ser geradas diversas combinações de células. A B Características As células-tronco podem ser de dois tipos: as embrionárias, conhecidas há mais tempo, que aos poucos, com o desenvolvimento do embrião, produzem todas as demais células de um organismo e as adultas, pois nas últimas décadas descobriu-se que tecidos já diferenciados de organismos adultos conservam essas células precursoras. Células-tronco embrionárias As células-tronco embrionárias são estudadas desde o século XIX; Essas células são conhecidas pela sigla ES, do inglês embryonic stem cells (células-tronco embrionárias), e são denominadas pluripotentes, pois podem proliferar indefinidamente in vitro sem se diferenciar, mas também podem se diferenciar se forem modificadas as condições de cultivo (Figura 4). Figura 4: Diferenciação de células-tronco em cultivo. Células-tronco embrionárias Outra característica especial dessas células é que, quando reintroduzidas em embriões, dão origem a células de todos os tecidos de um organismo adulto, mesmo as germinativas (óvulos e espermatozóides). Figura 5: Estudos em laboratórios de vários países já conseguiram que as célulastronco embrionárias se diferenciassem, em cultura, em diversos tipos celulares Células-tronco adultas Alguns tecidos de um organismo adulto se regeneram constantemente. Isso acontece com a pele, com as paredes intestinais e principalmente com o sangue, que têm suas células destruídas e renovadas o tempo inteiro, em um complexo e finamente regulado processo de proliferação e diferenciação celular. É relativamente recente a constatação de que, além da pele, do intestino e da medula óssea, outros tecidos e órgãos humanos — fígado, pâncreas, músculos esqueléticos (associados ao sistema locomotor), tecido adiposo e sistema nervoso — têm um estoque de células-tronco e uma capacidade limitada de regeneração após lesões. Mais recente ainda é a idéia de que essas células-tronco ‘adultas’ são não apenas multipotentes (capazes de gerar os tipos celulares que compõem o tecido ou órgão específico onde estão situadas), mas também pluripotentes (podem gerar células de outros órgãos e tecidos). Células-tronco adultas Um trabalho, publicado na revista Science (1999), com o título “Transformando cérebro em sangue” demonstrava em um experimento que células-tronco neurais de camundongos adultos podem restaurar as células hematopoiéticas em camundongos que tiveram a medula óssea destruída por irradiação. Esse achado revolucionou os conceitos até então vigentes, pois demonstrou que uma célula tronco-adulta derivada de um tecido altamente diferenciado e com limitada capacidade de proliferação pode seguir um programa de diferenciação totalmente diverso se colocada em um ambiente adequado. Aplicações: Células hematopoiéticas / Medula óssea; Substitutos de pele e mucosas; Implantes ortopédicos / Cartilagem e osso; Substitutos de pâncreas e fígado; Terapia celular de músculo cardíaco; Regeneração do sistema nervoso; Engenharia vascular e neoascularização; Substitutos de córnea. Aplicações Doenças Cardiovasculares (enfarte no miocárdio) Tratamento: células-tronco retiradas da medula óssea do paciente são implantadas no músculo cardíaco Resultado: há uma regeneração do músculo e criação de novos vasos sangüíneos, aumentando a irrigação Andamento: o Brasil é um dos países mais avançados no mundo na área. Em 2005 será feito um estudo com células-tronco para tratar de 1.200 cardíacos em várias instituições Lesões da Medula Espinhal Tratamento: implante de células-tronco da medula óssea na medula espinhal Resultado: melhora a passagem de impulso elétrico, sensibilidade e atividade motora Andamento: de 30 pacientes tratados no Hospital das Clínicas (USP), três voltaram a andar Aplicações Esclerose Tratamento: transplante de células-tronco do próprio paciente Resultado: há uma diminuição dos sintomas da doença Andamento: paciente com esclerose lateral amiotrófica tratado na USP de Ribeirão Preto melhorou sua coordenação motora Parkinson Tratamento: são implantadas células-tronco em áreas específicas do encéfalo, estriado e substância negra, buscando a produção de dopamina Resultado: melhora do déficit motor e cognitivo com a reposição dos neurônios lesados e destruídos Andamento: um time internacional de cientistas inseriu nos cérebros de macacos genes para induzir a produção da proteína GDNF, que protege as células nervosas contra os efeitos degenerativos da doença Aplicações Leucemia e Outros Tipos de Câncer do Sistema Sangüíneo Tratamento: são retiradas células-tronco do paciente durante tratamento de quimioterapia, para que sejam preservadas da radiação. Depois elas são reinjetadas Resultado: como as células são do próprio paciente, não há risco de rejeição Andamento: pesquisadores (norte-americanos e europeus) avaliaram pacientes que receberam células-tronco de cordão umbilical. A técnica é menos agressiva que a tradicional Diabetes Tratamento: há uma diferenciação de células-tronco da medula óssea, in vitro, em ilhotas pancreáticas (órgãos que produzem a insulina) Resultado: diminuição da necessidade de injeções de insulina Andamento: o Instituto de Química da USP conduz pesquisas com camundongos para entender o papel dos genes na transformação das células-tronco em células beta (produtoras de insulina) Aplicações Figura 6: Em adultos Células-tronco adultas podem ser obtidas facilmente da medula-óssea, que dá origem às células do sistema sanguíneo Em embriões Com a fecundação do óvulo em laboratório, origina-se uma célula, que se divide sucessivamente, gerando outras. No quinto dia forma-se um embrião com duzentas células não especializadas (células-tronco) Especialização A aplicação de reagentes químicos às células-tronco faz com que elas se transformem em células de tecidos específicos quando se desenvolvem Coleta Embriões congelados nesse estágio e não aproveitados em clínicas de reprodução assistida são coletados Implantação Por meio da corrente sanguínea podem ser implantadas novas células no paciente. Pode-se também injetar as células diretamente no órgão danificado para que se diferenciem no organismo Permanecem questões a serem respondidas: Como as células-tronco permanecem indiferenciadas e autorenováveis enquanto todas a células ao redor das mesmas se diferenciaram? Quis os fatores que normalmente regulam a proliferação e a autorenovação das células-tronco em organismos vivos? Quantos tipos de células-tronco existem e em quais tecidos elas subsistem? As células-tronco adultas normalmente apresentam plasticidade ou apenas transdiferenciam quando manipuladas experimentalmente? Quais os sinais que regulam a proliferação e diferenciação de células-tronco que se demonstram plásticas? É possível manipular células–tronco adultas para estimular a proliferação de forma que se possa produzir tecido suficiente para transplantes? Quais os fatores que estimulam células-tronco a se realocarem em sítios de lesão? O debate: 1. 2. 3. 4. Pode-se intencionalmente destruir um embrião humano? Podemos nos beneficiar da destruição de outros embriões? Pode-se criar um embrião para destruí-lo? Pode-se clonar embriões humanos? Quem vale mais? X Qual o status moral do embrião humano?? Defesa da personalidade humana embrionária e fetal: Pais humanos podem apenas produzir prole humana. Assim sendo, os não-nascidos são membros da comunidade humana. As diferenças funcionais entre o feto e o recém-nascido são moralmente irrelevantes. Os não-nascidos são pessoas humanas porque possuem natureza humana, não porque desempenhem determinadas funções A Fertilização não é um evento, mas um processo com distintos subprocessos que podem levar segundos, minutos, horas ou até mesmo semanas se se leva em conta a individuação.” Quando o processo de uma nova vida começa, este continua-se por estágios biológicos até que o final da morte chegue ao seu termo. O começo da vida está no início do início do processo, não no final do início. “ Estágios muito precoces do processo são apenas humanos em potencial”. Uma vez que o processo tenha começado, este embrião não pode desenvolver-se em uma ovelha ou um cachorro; ele é inerente e imutavelmente humano. O zigoto (ou blastocisto, ou embrião, ou feto) não é um humano em potencial, é uma vida humana em um estágio específico do desenvolvimento. “ … estas células são ainda totipotente, não são ainda verdadeiros indivíduos humanos.” Fim