POR UMA EDUCAÇÃO MORAL, FÍSICA E CÍVICA: A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E A DIVULGAÇÃO DO MOVIMENTO DE RENOVAÇÃO EDUCACIONAL NA REGIÃO SUL DO RIO GRANDE DO SUL Aliana Anghinoni Cardoso1 Eliane Peres2 UFPel Introdução Este artigo irá apresentar os resultados parciais da investigação O Movimento da Escola Nova a e seus desdobramentos na Região Sul do Rio Grande do Sul, em andamento junto ao Centro de Estudos e Investigações em História da Educação (CEIHE-FaE/UFPel), que tem como objetivo principal estudar o movimento da Educação Nova e suas repercussões na Região Sul do Rio Grande do Sul, enfatizando: o processo de criação e as ações da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação – ABE (fundada em Pelotas em 1926); as ações de modernização didático-pedagógicas nas escolas públicas primárias da Região Sul; a repercussão das Conferências Nacionais de Educação (anos 20-30) na imprensa da Região Sul do Estado; as notícias veiculadas nos jornais sobre o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932); e o tratamento dispensado pela imprensa do sul do Rio Grande do Sul ao “caso Anísio Teixeira” (polêmica dos bispos gaúchos com o educador baiano sobre sua posição em relação à escola pública, laica e gratuita, em 1957). As fontes privilegiadas nessa investigação, até o momento, foram os jornais pelotenses que circularam nas décadas de 1920 e 1930, situados no Centro de Documentação e Obras Valiosas (CDOV) da Biblioteca Pública Pelotense. Os resultados obtidos no período inicial desse estudo evidenciaram a existência, desde os anos 20, de um projeto de expansão e modernização da educação em Pelotas, especialmente a educação pública. Segundo os dados até agora analisados, esses projetos tinham como objetivo principal organizar a educação pelotense de acordo com os fundamentos da chamada pedagogia moderna. Partindo desses dados, estamos nos dedicando a investigar a forma como essas idéias renovadoras foram divulgadas em âmbito local e até que ponto esse projeto de organização e modernização foi efetivado no cotidiano escolar. De acordo com nossos estudos, um dos principais agentes de divulgação do movimento de renovação educacional e das idéias pertencentes ao seu ideário em Pelotas foi a Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação (ABE), conhecida também como Associação Pelotense de Educação, criada na cidade em 1926. Neste trabalho enfocamos o processo de criação da Seção Pelotense da ABE e suas principais ações em âmbito local, destacando principalmente a relação dessas ações com a idéia da importância da garantia de uma educação integral (moral, física e cívica) para a população, elemento presente também no discurso renovador difundido pelos membros da sede carioca da Associação Brasileira de Educação. Para isso, dividimos o texto em duas partes: na primeira apresentamos brevemente alguns dados sobre a ABE, fundada no Rio de Janeiro em 19243; em seguida, baseadas nas notícias vinculadas pelo jornal pelotense Diário Popular, analisamos os dados sobre a criação da Seção Pelotense da ABE e seus primeiros anos de atuação. 1. A Associação Brasileira de Educação (ABE) A fundação da Associação Brasileira de Educação (ABE) está, de alguma forma, relacionada ao que Nagle (2001) chamou de entusiasmo pela educação. Segundo o autor, as diversas transformações econômicas, políticas e culturais que foram se efetivando ao longo da primeira fase do período republicano fizeram com que a sociedade brasileira entrasse em uma espécie de crise, causada pela eclosão de diferentes idéias e correntes de pensamento além, é claro, dos novos modos de vida gerados pelos processos de industrialização e urbanização. A solução para todos esses problemas passou a ser então, no discurso de muitos intelectuais e do poder público, a educação do povo. Lutar contra o analfabetismo e transformar a população brasileira em um povo “culto” seria o caminho que levaria o país ao progresso. Em meio à luta contra o analfabetismo e com a crença de que através da educação era possível a reforma da sociedade, foi criada em 1924, no Rio de Janeiro, a Associação Brasileira de Educação (ABE). Segundo Marta Carvalho (1998), a fundação dessa Associação foi resultado da união de intelectuais que compartilhavam de algumas concepções em relação às novas funções da educação em uma sociedade moderna. Um dos principais intuitos desse grupo de intelectuais era discutir as possibilidades de organização de uma Federação de Associações de Ensino que vinculasse os educadores (e demais envolvidos com questões educacionais) de todo país em torno de um grande movimento nacional em prol da questão educacional. As personalidades que tomaram a frente da ABE nos seus primeiros anos de atuação depositaram na questão educacional as suas principais expectativas em relação ao futuro da nação brasileira. A explicação para esta grande importância atribuída à educação, como já foi dito, era baseada na convicção de que as mudanças e os melhoramentos que fossem realizados em benefício dessa causa eram o caminho para as reestruturações e as reformas que vinham se mostrando necessárias à sociedade brasileira. Uma das condições para a realização do ideal de uma nação próspera era “disseminar” e propiciar a educação para o povo. A melhor maneira de garantir a multiplicação dessas idéias por todo o país, segundo a visão dos idealizadores da ABE, era a criação de departamentos estaduais da Associação Brasileira de Educação. Entre os nomes que se destacaram na defesa da nacionalização da ABE estão Levi Carneiro e Licínio Cardoso. Em 1929, como presidente da Associação, Licínio Cardoso viajou pelo país decidido a criar departamentos da ABE e tomar conhecimento do que estava sendo feito em prol da educação em vários estados brasileiros (sul e norte do país). A contribuição de Licínio Cardoso foi de grande importância para a divulgação dos objetivos e das campanhas da Associação Brasileira de Educação. Entretanto, foi Levi Carneiro, presidente da Associação em 1925, o pioneiro nas tentativas de dar ao movimento de reforma educacional um alcance nacional. Logo no começo da estruturação do Departamento Carioca, Levi Carneiro fez contato com os diretores da instrução pública de diferentes estados brasileiros, incentivando a criação de departamentos locais da Associação. Esses departamentos, segundo os estatutos da sede carioca, teriam autonomia para realizarem as melhorias necessárias e adequadas à sua região, mantendo comunicação constante de seus feitos à Associação e participando dos eventos organizados pela mesma (Carvalho, 1998). Além da divulgação dos principais fins a que seriam direcionadas as realizações da Associação Brasileira de Educação, Levi Carneiro preocupou-se também em solicitar aos responsáveis pela instrução pública informações que pudessem esclarecer a atual situação do ensino nos diferentes estados brasileiros. Ainda segundo Carvalho (1998), as ações do presidente Levi Carneiro não tiveram a repercussão prevista e a transformação da ABE em uma Federação de Associações de Ensino não se efetivou. Contudo, a ABE, nos moldes em que se organizou, procurou desenvolver um trabalho voltado para a disseminação da causa educacional no país. Pode-se dizer, também que, ao que tudo indica, a campanha de nacionalização da Associação empreendida por Levi Carneiro, como presidente da ABE, não foi totalmente em vão. De alguma forma, a prova disso foi a fundação, em 1926, da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação, que foi bastante ativa nas discussões e realizações promovidas em Pelotas, a favor de uma educação moderna e de qualidade, principalmente durante a década de 1920. 2. A Seção Pelotense da ABE Como já foi citado, a criação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação parece ter relação com a campanha de nacionalização empreendida por Levi Carneiro. Nossos dados indicam essa relação quando mostram a referência feita ao nome do antigo presidente da ABE em diversos momentos da constituição da nova Agremiação pelotense. Além de ter sido aclamado sócio honorário dessa instituição, Levi Carneiro foi citado durante a assembléia na qual trataram-se das primeiras providências para a organização da Seção Pelotense da ABE, que ocorreu no Ginásio Pelotense no dia 24 de outubro de 1926. Conforme reportagem publicada pelo jornal pelotense Diário Popular, ficou acertado entre os presentes que a fundação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação seria noticiada a Levi Carneiro, levando em consideração seu incentivo para que essa fundação acontecesse. Segundo o já referido jornal: (...) Ficou assentado telegraphar-se ao dr. Levi Carneiro, cujo nome foi muito festejado, de congratulações com este eminente patricio pela fundação da Associação Pelotense de Educação, iniciativa que s. exa. animou, entre nós, quando na presidência da grandiosa instituição nacional com seus bons officios junto ao dr. Joaquim Luís Osório (Diário Popular, 26 de outubro de 1926). Um dos principais responsáveis pela fundação da Seção da Associação Brasileira de Educação em Pelotas foi Joaquim Luís Osório. Bacharel em Direito, era reconhecido nacionalmente por conta de sua intensa atuação na política. Foi deputado estadual e, no ano da criação da Seção local da ABE, ocupava os cargos de deputado federal e de diretor administrativo daquele que, na época, era o mais importante estabelecimento de instrução pública da cidade de Pelotas: o Ginásio Pelotense. Os primeiros momentos da Seção Pelotense foram destinados à organização da estrutura da Associação, o que não demorou muito tempo. Seis dias depois da reunião convocada por Joaquim Luis Osório, no dia 24 de outubro de 1926, na qual a proposta de fundação da Seção Pelotense da ABE foi acatada pelos presentes4, aconteceu a primeira assembléia geral dos sócios. Nessa assembléia, que ocorreu também no Ginásio Pelotense, no dia 31 de outubro de 1926, foram discutidos e aprovados os estatutos da Associação Pelotense de Educação - registrados oficialmente em fevereiro de 1927 – e eleitos os membros do seu primeiro Conselho Diretor5 (Diário Popular, 2 de novembro de 1926). Uma das ambições da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação, conforme o discurso produzido por seus integrantes, era ampliar a oferta de ensino e garantir que a educação oferecida na cidade de Pelotas, em todos os níveis, tivesse qualidade e pudesse resolver os problemas da sociedade local. Assim, também a exemplo daqueles que estiveram a frente da ABE, a crença de que a educação era o caminho para uma sociedade melhor também esteve fortemente presente entre os intelectuais pelotenses que criaram a Associação Pelotense de Educação, sendo mesmo a razão de sua criação e existência. Para atingir seus objetivos, a Associação elaborou um plano de ação no qual estão escritas suas principais preocupações em relação à educação local e que procedimentos levaria a efeito para colaborar com as melhorias que ainda necessitavam ser feitas nesse campo. Percebe-se nesse planejamento que a atuação pretendida pela Associação Pelotense de Educação considerou a importância de medidas como a realização de pesquisas que proporcionassem uma noção da situação dos estabelecimentos de ensino, dos professores e dos alunos pelotenses; a promoção de atividades de incentivo à leitura e à produção de materiais didáticos; a organização de espaços, como bibliotecas infantis e pedagógicas, que garantissem o fácil acesso de professores e alunos a livros e materiais didáticos; a promoção de campanhas que alertassem a importância da educação de jovens e adultos, entre outras.( Diário Popular, 30 de outubro de 1926 e 1º de janeiro de 1927). No entanto, um dos elementos que mais se destaca tanto no plano de ação proposto pela Associação quanto nas suas primeiras iniciativas é a expressão de uma preocupação bastante significativa com questões relativas à educação moral, cívica e física. Portanto, a partir de agora, nos deteremos a analisar de forma mais pontual a importância atribuída pela Seção Pelotense da ABE a essa questão. Por uma educação moral, cívica e física – a atuação da Seção Pelotense da ABE O plano de Ação proposto pela Associação Pelotense de Educação previa, em um de seus itens, a cooperação com iniciativas de educação física (orientando a população quanto a importância de uma boa alimentação, da prevenção de doenças e da preocupação com a higiene, promovendo de exames de saúde obrigatórios para o ingresso no ensino público), moral (censurando filmes, indicando os livros mais adequados às crianças, proibindo a entrada de menores em casas de jogos e estabelecimentos do gênero) e cívica (adotando o escotismo nas escolas elementares, e promovendo intensas comemoração às datas cívicas). .( Diário Popular, 30 de outubro de 1926 e 1º de janeiro de 1927). No decorrer dos anos de 1926, 1927 e 1928 alguns dos procedimentos do plano de ação traçado pela Associação Pelotense de Educação foram colocados em prática. Os dados que se referem à atuação dessa Associação nesse período demonstraram a disposição de seus membros em colaborar para que a educação ofertada à população fosse uma educação integral, moderna e de qualidade. Essa educação integral seria, de acordo com os fundamentos da Nova Pedagogia, uma educação preocupada não só com a assimilação de saberes e conhecimentos como também com a formação moral, física e cívica dos educandos. (Filho, 1969) Nesse sentido, uma das primeiras ações da Seção local, ainda em 1926, foi a campanha para a utilização do cinema como agente educativo. Em reunião do Conselho Diretor foi resolvido que seriam encaminhados ofícios à Intendência Municipal, esclarecendo os propósitos da campanha e solicitando o incentivo para a realização de suas metas, e aos proprietários de cinemas, prevendo os benefícios que teriam ao aderir à campanha. O jornal pelotense Diário popular publicou os ofícios encaminhados pela Associação, dos quais destacamos alguns trechos que acreditamos esclarecer o cunho da campanha: Pelotas, 22 de novembro de 1926. Illustre sr.dr. Augusto Simões Lopes, M.D. Intendente Municipal [...] Urge, com effeito, aproveitar o cinematographo na educação popular e da infância, nenhum instrumento melhor do que elle pelo poder da suggestão que offerece, para ministrar ensinamentos moraes e civicos, regras de defeza individual e collectiva. Com um programma de espetaculos populares, abrangendo assumptos do Brasil, da sua geographia, historia, dos seus fastos e seus vultos principaes, das suas riquezas, etc; com a demonstração publica dos maleficios causados pelos grandes flagellos da humanidade, syphylis, a tuberculose, o alcool, a cocaina, a morphina, o abuso do fumo, tera o governo feito benemerita obra social. Por outro lado, é preciso evitar a influencia nociva do cinema na educação da infancia, protegendo-na contra as suggestões malsãs e criminosas, de modo a que não se converta esse apparelho em uma escola de vicio, e antes seja um instrumento pedagogico. Neste sentido a acção do poder publico já se faz sentir com efficiencia em diversos paizes, onde existe a censura previa nas peliculas cinematographicas e a prohibição do ingresso de menores nos espetaculos em que figure o aviso de “Impróprio para as crianças”[...]. (Diário Popular, 25 de novembro de 1926). Nesse ofício, encaminhado pela Associação ao Intendente Municipal, é possível perceber a preocupação dos membros da Seção Pelotense da ABE com a utilização adequada desse recurso da modernidade em favor da educação das crianças e jovens, visto o seu significativo poder de suggestão. Além disso, talvez para ressaltar a importância da ação do poder público em relação a essa questão, que não estava relacionada só à educação dos escolares, mas da população em geral, é feita uma referência ao que estava sendo feito a respeito em outros países. A resposta encaminhada pela Intendência à Seção Pelotense da ABE garantiu que os estabelecimentos que exibissem filmes educativos, considerados adequados à infância pela diretoria da instrução municipal, teriam isenção das taxas previstas sobre os lucros dessas atividades na lei orçamentária do município (Diário Popular,15 de janeiro de 1927). O lançamento dessa campanha pela Seção local da ABE, além de evidenciar uma possível preocupação com a educação moral das crianças, jovens e adultos pelotenses, pode ser considerado um indicativo de que os membros da ABE pelotense estavam a par das discussões que estavam sendo feitas a respeito da utilização do cinema como recurso pedagógico em outros estados do Brasil, discussões essas que não se detinham somente à questão da moral6. É certo que, nos primeiros anos da década de 1920 o cinema ainda não podia ser pensado, em Pelotas, como um recurso audio-visual a ser usado pelo professor em sala de aula, para facilitar a aprendizagem dos alunos. Por conseqüência, cabia aos educadores atribuir uma maior atenção às possíveis influências do cinema no comportamento das pessoas, investindo, assim, em campanhas para sensibilizar os donos dos cinemas municipais para a possibilidade de serem exibidos em seus estabelecimentos filmes considerados educativos. O apoio das autoridades locais à campanha para utilização do cinema como agente educativo, de certa forma, demonstrou sua concordância em relação à necessidade de privar crianças e jovens das más influências que poderiam exercer certos tipos de atividades. Partindo dessa premissa, a Associação Pelotense de Educação intercedeu novamente junto ao poder público para que o acesso de menores de 21 anos aos espetáculos e ambientes considerados impróprios fosse proibido, sendo mais uma vez atendida em sua reivindicação. Além dessas primeiras iniciativas, que expressam a preocupação da Seção local da ABE com a educação moral de crianças e jovens, destaca-se a atuação dessa Associação na divulgação dos programas “Caixas Escolares” e "Copo de Leite", ambos empreendidos pelo governo municipal. O primeiro consistia em reunir recursos provenientes de doações ou promoções realizadas pelas escolas para auxiliar na compra de materiais escolares ou agasalhos para as crianças menos favorecidas, enquanto segundo pretendia garantir às crianças provenientes de famílias com baixa renda uma alimentação saudável que as auxiliasse realização de suas atividades escolares. A Associação Pelotense de Educação também esteve representada, pelos membros de sua diretoria, nas festas cívicas realizadas pelas escolas municipais durante os anos de 1927 e 1928. Entre essas, destaca-se a grande festa organizada pela Diretoria da Instrução Pública Municipal, em comemoração ao Dia da Bandeira, realizada em 15 de novembro de 1928. Nessa festa, que reuniu um público bastante extenso, incluindo as principais autoridades locais, equipes de alunos das escolas municipais fizeram demonstrações de ginástica coletiva em saudação à bandeira e cantaram o Hino da Republica. Sobre a festa, publicou o Diário Popular: [...] A demonstração collectiva de gymnastica, levada a effeito, a primeira que se realiza em publico, em Pelotas, foi sem duvida um bello espetaculo, assignalador dos progressos que vem fazendo o nosso ensino, onde avulta a preocupação da cultura physica.[...] É de concenso universal que a obra da escola ficará incompleta se não busca aproveitar-se ao estagio em que nella vive a criança para desenvolver-lhe, harmonicamente, todas as suas faculdades, visando o equilibrio phisiologico e psychico do alumno - isto é promovenso a conquista e defeza de sua saude, de modo a transforma-lo numa personalidade dynamica. (Diário Popular, 17 de novembro de 1928). Como se pode perceber, não só as atividades desenvolvidas pela sociedade de educadores pelotenses como também àquelas promovidas pela administração municipal mantinham proximidade com as novas propostas pedagógicas que circulavam pelo país e que tinham no departamento central da Associação Brasileira de Educação um importante veículo de divulgação. Exemplo disso é a importância atribuída à educação física, à educação moral e à educação cívica, elementos que estão entre os principais fundamentos da chamada pedagogia moderna, e que estão expressas nas iniciativas da Associação Pelotense de Educação e da Diretoria da Instrução Pública de Pelotas. Considerações Finais Dos dados já analisados na investigação, pode-se ter uma visão parcial da repercussão e disseminação das idéias do movimento da Educação Nova na cidade de Pelotas, bem como as ações impulsionadas por esse movimento, dentre elas, e talvez a mais relevante, a criação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação. A fundação dessa Associação Pelotense de Educação indica que os discursos em defesa da educação como forma de prevenção e cura dos possíveis males que poderiam assolar a esfera da sociedade, característicos dos educadores envolvidos com o projeto da ABE no Rio de Janeiro, encontraram na cidade de Pelotas terreno fértil para se desenvolver, uma vez que, desde o início da década de vinte, a educação vinha sendo colocada no centro das preocupações dos administradores municipais e dos "defensores da imagem" de Pelotas, considerada um dos principais centros culturais do Estado gaúcho e quiçá do Brasil. O que se pode concluir até o presente momento é que a atuação da Seção Pelotense da ABE constitui-se em um elemento bastante relevante ao projeto que já vinha sendo desenvolvido pelo poder público municipal e que tinha como objetivo equiparar o sistema educacional de Pelotas às mais modernas concepções pedagógicas da época, fazendo do município referência nacional em educação. Dessa forma, a atuação da Associação Pelotense de Educação através da promoção da campanha para utilização do cinema como agente educativo, da intercessão junto às autoridades locais para a proibição do acesso de menores de 21 anos em estabelecimentos considerados impróprios, da divulgação dos programas "Caixas Escolares" e "Copo de Leite" e da participação em festas cívicas promovidas pelas escolas municipais, entre outras ações, podem ser interpretadas, ao mesmo tempo, como demonstrações de apoio dessa Associação ao projeto de modernização que vinha sendo proposto pela Intêndencia Municipal e como estratégias de divulgação das idéias do movimento de renovação educacional, que tinha entre seus principais fundamentos o reconhecimento da importância de garantir que a educação no Brasil fosse uma educação integral, moderna e de qualidade. . Notas 1 Acadêmica do Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Pelotas, bolsista PIBIC/CNPq e integrante do grupo de pesquisadores do Centro de Estudos e Investigações em História da Educação (CEIHE/FaEUFPel). 2 Docente da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas e integrante do grupo de pesquisadores do Centro de Estudos e Investigações em História da Educação (CEIHE/FaE-UFPel). 3 A ABE tem sido, com mais ou menos profundidade, analisada por vários pesquisadores. Para maior conhecimento dessa Associação ver o estudo de CARVALHO, Marta Maria C. Molde Nacional e Fôrma Cívica. Bragança Paulista, SP: EDUSF, CDAPH, 1998. 4 Entre aqueles que testemunharam os momentos iniciais da Seção local da ABE estiveram nomes que se destacaram no cenário político e educacional da época. Enviaram por carta suas mensagens de incentivo à Associação Pelotense de Educação, Augusto Simões Lopes (Intendente Municipal) e João Brum de Azeredo (Diretor da Instrução Pública do município). De alguma forma, a presença ou a manifestação de apoio de pessoas que ocupavam cargos de liderança e/ou que tinham influência política, econômica ou cultural na cidade denota o prestígio da então nascente Associação Pelotense de Educação. 5 Conforme notícia do Diário Popular de 02 de novembro de 1926, o primeiro Conselho Diretor eleito na assembléia do dia 31 de outubro ficou assim composto: Presidente: Joaquim Luís Osório (advogado e atuante na política como deputado federal e estadual); Secretário: Professor Joaquim Alves da Fonseca (professor de matemática do Ginásio Pelotense); Tesoureiro: Coronel Guilherme Echenique (advogado); Helena Pillman (professora); Manoel Serafim Gomes de Freitas (diretor da Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel); Anna Velloso da Silveira (professora); Orfila do Nascimento (diretora da Escola Complementar Félix da Cunha) Comissão de Contas: Edmundo Berchondes Essartes; Pompeu Mascarenhas de Souza (vice-intendente municipal); Dias da Costa (diretor da Faculdade de Direito). 6 Segundo Vidal (1994), as discussões em torno da utilização do cinema para fins educativos, principalmente no que se refere à Reforma Fernando de Azevedo no Distrito Federal (1927-1930) enfatizavam a relevância da utilização desse recurso da modernidade – e da ciência - nas escolas, de maneira a atribuir ao trabalho do professor maior eficácia e qualidade. Dessa forma, a preocupação com a qualidade moral dos filmes exibidos pelos cinemas era precedida por uma preocupação tão importante quanto: a de possibilitar e incentivar a produção e exibição de filmes com fins técnico-pedagógicos, que versassem, por exemplo, sobre aspectos da história e geografia do Brasil, das ciências naturais, etc. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARDOSO, Aliana & PERES, Eliane. A criação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação (ABE-1926). Anais do IX Encontro Sul-rio-grandense de Pesquisadores em História da Educação: História da Educação, Literatura e Memória. Pelotas, Seiva, ASPHE, 2003. CARDOSO, Aliana & PERES, Eliane. A participação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação na 1ª Conferência Nacional de Educação. Anais do X Encontro Sul-rio-grandense de Pesquisadores em História da Educação: História da Cultura Escolar: Escritas e Memórias Ordinárias, Pelotas, Seiva, ASPHE, 2004. CARDOSO, Aliana. A fundação da Seção Pelotense da Associação Brasileira de Educação e a proposta de modernização do ensino na cidade de Pelotas. Anais do V Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul (VANPed Sul), Curitiba, 2004, meio digital. CARVALHO, Marta Maria C. Molde Nacional e Fôrma Cívica. Bragança Paulista, SP: EDUSF, CDAPH, 1998. FILHO, Lourenço. Introdução ao Estudo da Escola Nova. São Paulo, Editora Melhoramentos, 1969, 10 ed. NAGLE, Jorge. Educação e Sociedade na Primeira República. São Paulo: EPU, 1974. VIDAL, Diana Gonçalves. Cinema, laboratórios, ciências físicas e escola nova.In; Caderno de Pesquisa, SP, nº 89, pp 24-28, maio 1994.