DISTRIBUIÇÃO DE INTENSIDADE DAS CHUVAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS E SUAS
CONSEQÜÊNCIAS
Ana Catarina F. Perrella (1); Clóvis M. do E. Santo; Talitha C. Silva; Tatiana S. Vergueiro
(1) Laboratório de Meteorologia – UNIVAP
e-mail: [email protected]
ABSTRACT
Using intensity and amount precipitation data from São José dos Campos Airport's Meteorological
Station and data set of the occurrences assisted by the Civil Defense on Vale do Paraíba, a comparison
between these two variables (rain and occurrence) was made. It was possible to identify some critical
areas of the Municipal district, whose information may help the competent Administrative Offices to
mitigate the impact of rains on São José dos Campos population.
1 Introdução
A distribuição da quantidade e da intensidade de chuva que atinge uma região ao longo do ano,
são de fundamental importância para a vida de seus habitantes.
Quase todas as áreas metropolitanas têm problemas anuais de inundações do espaço urbano em
diferentes graus de intensidade e, de quando em quando são palcos de grandes calamidades (Monteiro,
1976).
Questões relacionadas ao impacto ambiental decorrente de chuvas intensas têm sido motivo de
grande preocupação para técnicos e administradores ligados ao planejamento urbano e ao uso racional
do solo (Mello et al, 1994, Pedrosa et al, 1997).
As inundações em áreas urbanas representam um grande problema para grande parte dos
municípios brasileiros, principalmente, quando atingem áreas densamente ocupadas, ocasião em que
geram prejuízos consideráveis e muitas vezes irreparáveis, com perda de vidas humanas (Pires &
Barbassa, 1997).
A ocorrência de chuvas intensas na cidade de São José dos Campos tem sido alvo de estudo de
alguns pesquisadores, Conti (1975), Ferreira et al. (1996). Entretanto, nesse trabalho o enfoque é dado
a um estudo de casos com ocorrência de chuva intensa e, de forma geral, são focalizados apenas as
forçantes físicas de larga escala.
O presente trabalho tem como objetivo estudar a distribuição temporal, a quantidade e
intensidade da chuva em São José dos Campos ocorrida de Outubro de 1995 a Março de 1996 e
verificar qualitativamente os bairros que sofreram maior impacto para fornecer aos órgãos responsáveis
pelo planejamento urbano, um mapeamento das áreas de maior risco.
2 Dados e Metodologia
Para a realização desse trabalho foram utilizados os dados diários obtidos de um pluviógrafo
instalado na Estação Meteorológica do Aeroporto de São José dos Campos. Essas medidas de
precipitação fornecem, além da quantidade diária de chuva acumulada, o máximo de chuva ocorrido
em 60 minutos. Essa variável fornece uma idéia aproximada da intensidade máxima da precipitação
durante o dia do evento. A Figura 1 mostra a precipitação diária média no aeroporto de São José dos
Campos entre outubro de 1995 e março de 1996.
Com o auxílio do Banco de Dados da Defesa Civil da Região do Vale do Paraíba foi possível o
levantamento das ocorrências atendidas no Município de São José dos Campos no período de estudo.
Das 103 ocorrências atendidas pela Defesa Civil no período de estudo, 32 casos foram de
inundações (residências, garagens, vias públicas), 51 foram de desmoronamentos (residências, muros,
pontes, barreiras, taludes), 6 foram de alagamentos (residências e vias públicas), 2 foram de enchentes
e o restante dos casos foi de atendimentos em decorrência de vendaval (destelhamento).
Após esse levantamento fez-se uma comparação entre as variáveis chuva e atendimentos para
mapear as áreas mais críticas do município.
3 Análise e Discussão dos Resultados
A chuva acumulada de Dezembro/95 a Março/96 foi de 1365 mm, excedendo em 43% do valor
médio ocorrido no período de 1938 a 1970 (Azevedo, 1974) ou 1974 a 1996 (Estação Meteorológica
do Aeroporto de S. J. dos Campos). Com exceção dos meses de Novembro e Dezembro de 95, quando
a chuva atingiu valores um pouco inferiores à média de 33 anos, os meses de Out/95, Jan, Fev e
Mar/96 apresentaram precipitação com valores bem acima desta mesma média (Figura 2). Em
particular os meses de Jan, Fev e Mar/96 foram excepcionalmente chuvosos, perfazendo um total
acumulado de 890,5 mm, 65% acima da média climatológica (Tabela 1).
Tabela 1. Precipitação mensal acumulada [mm] nos meses de no período de 1974 a 1996.
MESES
ANO
1974
1975
1976
1977
1978
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
MÉDIA
JANEIRO
270.4
173.5
156.1
313.2
120.1
167.6
152.3
233.0
282.6
227.5
157.2
127.7
291.2
249.8
301.1
152.9
271.5
212.3
213.2
126.8
236.5
322.8
216.3
FEVEREIRO
79.1
220.0
268.2
23.5
67.1
181.3
124.3
171.8
177.6
8.6
182.6
247.0
119.9
165.2
261.1
116.5
191.3
89.8
317.0
197.4
321.5
305.3
174.4
MARÇO
204.1
71.6
131.7
139.7
137.3
125.9
63.6
141.7
94.2
67.6
150.8
251.2
162.6
108.7
162.6
73.5
350.4
159.6
193.0
159.5
73.0
262.4
149.3
Acumulada
no trimestre
555.3
465.1
556.0
476.4
324.5
474.8
340.2
546.5
554.4
303.7
490.6
625.9
573.7
523.7
724.8
342.9
813.2
461.7
723.2
483.7
631.0
890.5
540.0
MÉDIA
184.5
155.0
185.3
158.8
108.2
158.3
113.4
182.2
184.8
101.2
163.5
208.6
191.2
174.6
241.6
114.3
271.1
153.9
241.1
161.2
210.3
296.8
180.0
Em cada um desses meses isoladamente, a chuva também excedeu consideravelmente as
médias registradas (figura 2). Além disso, a precipitação no mês de Janeiro foi a maior registrada para
esse mês nos últimos 22 anos; a de Fevereiro foi a 3a maior (diferindo apenas 5% da maior), e a de
Março foi a 2a maior no período de 1974 a 1996 (Tabela 1).
É interessante ressaltar que mesmo esses valores mensais elevados de precipitação nos últimos
22 anos ocorreram em anos distintos, ao passo que em 1996, houve três meses seguidos (Jan, Fev, e
Mar) nos quais a precipitação foi bastante elevada (registrando-se valores máximos para o período
estudado de 22 anos), o que resultou em um total trimestral acumulado bem acima da média.
Esta chuva excessiva ocorrida no período de estudo, teve reflexos desastrosos para vários locais
de São José. dos Campos. Em algumas ocasiões, o efeito da chuva em grande quantidade e/ou
intensidade, se fez sentir imediatamente, com alagamentos, deslizamentos, desmoronamentos, etc. Em
outras ocasiões foi o efeito acumulativo, de chuvas até menos intensas, que provocou o desastre.
A figura 3 apresenta a precipitação diária, a máxima ocorrida em 60 minutos e o número de
atendimentos efetuados e registrados pela Defesa Civil no período de Out/95 a Mar/96.
Alguns eventos, como os ocorridos em 20/Out, 28/Dez, 3, 7 e 8/Jan, tiveram impacto imediato
na cidade, sendo responsáveis por 38 ocorrências (37% do total de ocorrências no período analisado).
Com exceção do primeiro deles que teve uma intensidade máxima de 32 mm/h, os estragos foram
devidos mais ao volume de água precipitada do que à intensidade da chuva (Figura 3). As ocorrências
dos dias (sem chuva) 22 e 26/Dez e 10/Mar foram conseqüências “atrasadas” de eventos de
precipitação ocorridos em dias anteriores. A mesma explicação pode ser aplicada ao evento do dia
9/Jan, quando, após quatro dias de chuva (acumulando 115 mm), uma chuva de apenas alguns
milímetros ocasionou 10 ocorrências.
Já em outras ocasiões, chuvas relativamente intensas (aproximadamente 30 mm/h) não
ocasionaram dano algum (4 e 25/Dez e 21/Jan). Provavelmente o estado geral das condições do solo e
do sistema de drenagem favoreceu o escoamento eficiente da chuva. No mês de Novembro, com uma
precipitação acumulada abaixo da média observada, a Defesa Civil não atendeu a ocorrências
provocadas por chuvas. Este mês relativamente seco propiciou condições físicas de drenagem
favoráveis para que, mesmo o evento relativamente intenso (30 mm/h) ocorrido em 4/Dezembro, não
tivesse conseqüências desastrosas para a cidade.
Apesar da chuva de 1 de março não ter sido muito intensa (18 mm/h de um total de 22 mm), ela
foi acompanhada de ventos fortes provocando a ocorrência de 17 casos atendidos pela Defesa Civil.
De acordo com a análise regional e temporal feita na cidade, a região compreendida pelos
bairros Jardim Satélite (13 registros), Vila São Bento (8) e Conj. Dom Pedro I (27 registros), seguida
da região do Parque Industrial (7), Rio Comprido (6) e Bosque dos Eucaliptos com 18 registros são as
regiões mais críticas da cidade.
O Jardim Satélite é uma região crítica, apresentando ocorrências em todos os meses chuvosos
(com exceção de Março) do período analisado. Na região Central, destaca-se o Fundo do Vale que
parece ser bastante sensível à precipitações intensas, tendo sofrido alagamentos em Dezembro/95 e
Março/96. Provavelmente uma manutenção mais intensiva e cuidadosa permitiu que o Fundo do Vale
não fosse alagado por ocasião dos eventos de Janeiro e Fevereiro/96.
4 Considerações Finais
Como não se pode modificar os fenômenos do tempo, pelo menos pode-se estipular medidas de
proteção ou emergência que estabeleçam aos órgãos encarregados da segurança pública,
especificamente a Defesa Civil, decisões e ações que devam ser tomadas no sentido de minimizar os
efeitos danosos, pelas providências preventivas e corretivas, em consonância com as ações
administrativas tomadas por parte da Prefeitura Municipal.
No período estudado de Out/95 a Mar/96, a precipitação teve valores acima da média dos
últimos 22 anos. Em particular os meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 1996 foram
excepcionalmente chuvosos perfazendo um total acumulativo de 890,5mm, 65% acima da média
climatológica. As chuvas excessivas ocorridas nesse período tiveram grande impacto em vários locais
da cidade e se fez sentir com alagamentos, deslizamentos e desmoronamentos, eventos esses atendidos
pela Defesa Civil. Os bairros mais afetados pela chuva foram Jardim Satélite, Vila São Bento e
Conjunto Dom Pedro I (48 registros).
Apesar dessas ocorrências desastrosas estarem primeiramente relacionadas com
quantidade/intensidade das chuvas (fator não controlado pelo Homem), outros fatores, muitos dos
quais de responsabilidade do Homem (despejo de lixo nos córregos, rios e vias públicas em geral,
manutenção deficiente da rede de drenagem urbana e suburbana, pavimentação não planejada, uso e
ocupação indevida do solo etc), contribuem para o agravamento da situação.
5 Referências
AZEVEDO, D. C., Chuvas no Brasil, regime, variabilidade e probabilidade de alturas mensais e
anuais, 324 p, 1974. Dissertação de Mestrado IPH da UFRGS.
CONTI, B. J., Circulação secundária e efeito orográfico na gênese das chuvas na região lesnordeste
paulista. Dissertação (Doutorado em Geografia) Instituto de Geografia. São Paulo: Universidade de
São Paulo, 1973.
FERREIRA et al, Estudo de caso de um evento meteorológico associado a chuvas intensas no Vale do
Paraíba e Litoral Norte de São Paulo, IX Congresso Brasileiro de Meteorologia Campos do Jordão,
v.1 p. 751, 1996.
MELLO, M. H. A.; Arruda, H. V.; Ortolani, A .A., Probabilidade de ocorrência de totais pluviais
máximos horários, em Campinas-São Paulo, Revista do Instituto de Geografia São Paulo, v. l5 (12), p. 59 - 67, 1994.
PEDROSA, A., V et al. Regionalização de chuvas intensas em Alagoas. VII Congresso Brasileiro de
Recursos Hídricos. Vitória/ES, 16 – 20. Nov 1997. Anais 3: 695-701
PIRES, A. A. O. & BARBASSA. A. P. Mapeamento de áreas urbanas através do modelo MPHRC –
MAI com área representada polinomialmente e por M. N. T. VII Congresso Brasileiro de Recursos
Hídricos. Vitória/ES, 16 – 20. Nov 1997.
MONTEIRO, C. A. F., Teoria e clima urbano de São Paulo Tese de Livre Docência de Geografia.
Instituto de Geografia. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1976.
Precipitação diária - aeroporto de SJC
80
[ mm ]
60
40
20
0
Out/95
Nov
Dez
Jan/96
Dia
Fev
Mar
Figura 1. Precipitação diária [mm] medida no Aeroporto de São José dos Campos no período de
Out/95 a Mar/96.
Precipitação em S.J. dos Campos
Out/95 - Mar/96
400
Total
Média
67%
59%
[ mm ]
300
79%
82%
-4%
200
-25%
100
0
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Meses
Figura 2. Comparação da precipitação mensal acumulada (Total) com a média mensal
climatológica (Média) obtida a partir de 40 anos de medidas (1931-1970). Os
números sobre o histograma representam a diferença percentual entre os dois valores
(Total e Média).
Out - Nov/95
Precip
3
80
11
1
1
Máx 60 '
desmoronamento ou
enchente ou alagamento
Precipitação [ mm ]
60
40
1 1
2
20
0
1/Out
5
10
15
20
25
1/Nov
Dias
5
10
15
20
25
30
Dez/95 - Jan/96
Precip
80
desmoronamento ou
1
1
Precipitação [ mm ]
Máx 60 '
3
4
enchente ou alagamento
3
2
3
2
7
60
40
7
6
1
2
1
1
1
1
1
1
20
0
1/Dez
5
10
15
20
25
1/Jan
Dias
5
10
15
20
25
31
25
31
Fev - Mar/96
Precip
80
1
1
3
Máx 60 '
2
desmoronamento ou
1
enchente ou alagamento
Precipitação [ mm ]
60
1
15
2
1
4
1
40
1
2
2
1
1
3
1
1
20
0
1/Fev
5
10
15
20
25
1/Mar
5
10
15
20
Dias
Figura 3. Precipitação diária e número de ocorrências atendidas pela Defesa Civil da região do Vale do
Paraíba. Os traços horizontais sobre cada barra representam a chuva máxima acumulada em 60' durante
cada evento.
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