Vol. 22 | nº 1 | 2013
ISSN 0871 - 6099
revista da Sociedade Portuguesa de
ANESTESIOLOGIA
Journal of the Portuguese Society of Anesthesiology
Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
1
Primeiro Inibidor Direto Oral do Fator Xa
Proteção Simples para Mais Doentes
Tratamento da trombose
venosa profunda
Com um só medicamento oral
Nome: Xarelto 15 mg, 20 mg. Composição: Cada comprimido revestido por película contém 15 mg ou 20 mg de rivaroxabano. Forma Farmacêutica: Comprimido revestido por película. Indicações terapêuticas Prevenção do acidente vascular cerebral e do embolismo sistémico em doentes adultos com fibrilhação auricular não-valvular com um ou mais fatores de risco, tais como insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão, idade ≥75 anos, diabetes mellitus, antecedentes de acidente vascular cerebral ou acidente isquémico transitório. Tratamento da trombose venosa profunda (TVP) e prevenção da TVP recorrente e embolismo pulmonar (EP) após uma TVP aguda em adultos. Posologia e modo de administração: Prevenção do acidente vascular cerebral e do embolismo sistémico: A dose recomendada, que também é a dose máxima recomendada, é de 20 mg uma vez por dia.
No caso de esquecimento de uma dose, o doente deve tomar imediatamente Xarelto e continuar no dia seguinte com a toma uma vez ao dia, conforme recomendado. Não deve ser
tomada uma dose a dobrar no mesmo dia para compensar uma dose esquecida. Tratamento da TVP e prevenção da TVP recorrente e EP: A dose recomendada para o tratamento
inicial da TVP aguda é de 15 mg duas vezes por dia durante as primeiras três semanas, seguida de 20 mg uma vez por dia para continuação do tratamento e prevenção da TVP
recorrente e EP. A experiência com Xarelto nesta indicação durante mais de 12 meses é limitada. No caso de esquecimento de uma dose durante a fase de tratamento de 15 mg duas vezes
por dia (dia 1 - 21), o doente deve tomar imediatamente Xarelto para assegurar a toma de 30 mg de Xarelto por dia. Neste caso podem tomar-se dois comprimidos de 15 mg ao mesmo tempo. O
doente deve continuar no dia seguinte a toma diária e regular de 15 mg duas vezes por dia, conforme recomendado. No caso de esquecimento de uma dose durante a fase de tratamento de uma toma
diária (dia 22 e seguintes), o doente deve tomar imediatamente Xarelto e continuar no dia seguinte com a toma diária, conforme recomendado. Não deve ser tomada uma dose a dobrar no mesmo dia para
compensar uma dose esquecida. Passagem de Antagonistas da Vitamina K (AVK) para Xarelto: Em doentes tratados para prevenção do acidente vascular cerebral e embolismo sistémico, o tratamento com
AVK deve ser interrompido e a terapêutica com Xarelto deve ser iniciada quando o INR for ≤3,0. Em doentes tratados para TVP e na prevenção da TVP recorrente e EP, o tratamento com AVK deve ser interrompido e a
terapêutica com Xarelto deve ser iniciada assim que o INR for ≤2,5. Passagem de Xarelto para os Antagonistas da Vitamina K (AVK): Em doentes que passam de Xarelto para um AVK, o AVK deve ser administrado
simultaneamente até o INR ser ≥2,0. Durante os dois primeiros dias do período de passagem, deve utilizar-se a dose inicial padrão do AVK, seguida de uma dose do AVK baseada nas determinações do INR. Enquanto
os doentes estiverem a tomar simultaneamente Xarelto e o AVK, o INR não deve ser determinado antes das 24 horas após a dose precedente de Xarelto e antes da dose seguinte. Passagem de anticoagulantes
parentéricos para Xarelto: Em doentes atualmente a serem tratados com um anticoagulante parentérico, Xarelto deve ser iniciado 0 a 2 horas antes da hora prevista para a administração seguinte do medicamento
parentérico (ex.: HBPM) ou na altura da interrupção de um medicamento parentérico em administração contínua (ex.: heparina não fracionada intravenosa). Passagem de Xarelto para anticoagulantes parentéricos:
Administrar a primeira dose do anticoagulante parentérico na altura em que deve ser tomada a dose seguinte de Xarelto. Os comprimidos devem ser tomados com alimentos. Compromisso renal moderado ou grave:
Na prevenção do acidente vascular cerebral e do embolismo sistémico em doentes com fibrilhação auricular não-valvular, a dose recomendada é de 15 mg uma vez por dia; No tratamento da TVP e prevenção da TVP
recorrente e EP: os doentes devem ser tratados com 15 mg duas vezes por dia durante as primeiras 3 semanas. Após isto, a dose recomendada é 15 mg uma vez ao dia com base em modelos farmacocinéticos. Xarelto
deve ser utilizado com precaução em doentes com compromisso renal grave. Não é necessário ajuste posológico: compromisso renal ligeiro, população idosa, sexo, peso corporal. Não é recomendada a utilização em
doentes com taxa de depuração da creatinina <15 ml/min. Está contra-indicado em doentes com doença hepática associada a coagulopatia e risco de hemorragia clinicamente relevante, incluindo doentes com cirrose
com Child Pugh B e C. População pediátrica: não é recomendada a sua utilização em crianças com idade inferior a 18 anos. Contra-indicações: Hipersensibilidade à substância ativa ou a qualquer um dos excipientes.
Hemorragia ativa clinicamente significativa. Gravidez e aleitamento. Doença hepática associada a coagulopatia e risco de hemorragia clinicamente relevante incluindo doentes com cirrose com Child Pugh B e C.
Advertências e precauções especiais de utilização: Risco hemorrágico, compromisso renal, doentes com risco aumentado de hemorragia. Os doentes com problemas hereditários raros de intolerância à galactose,
deficiência de lactase Lapp ou malabsorção de glucose-galactose não devem tomar este medicamento. Doentes com válvulas protésicas. Doentes com embolismo pulmonar agudo. Procedimentos invasivos e intervenções cirúrgicas. Interacções medicamentosas: Inibidores do CYP3A4 e da gp-P: não é recomendada em doentes submetidos a tratamento sistémico concomitante com antimicóticos azólicos tais como cetoconazol,
itraconazol, voriconazol, posaconazol ou inibidores da protease do VIH; Anticoagulantes: deve ter-se precaução se os doentes são tratados concomitantemente com quaisquer outros anticoagulantes; AINEs/ inibidores
da agregação plaquetária: deve ter-se precaução nos doentes tratados concomitantemente com AINEs (incluindo ácido acetilsalicílico) e inibidores da agregação plaquetária; Indutores do CYP3A4; Os parâmetros de
coagulação (ex.: TP, aPTT, HepTest) são afetados. Efeitos indesejáveis: Anemia (incl. parâmetros laboratoriais respetivos), tonturas, cefaleias, síncope, hemorragia ocular (incl. hemorragia conjuntival), taquicardia,
hipotensão, hematoma, epistaxe, hemorragia do trato gastrointestinal (incl. hemorragia gengival, hemorragia retal), dores gastrointestinais e abdominais, dispepsia, náuseas, obstipação, diarreia, vómitos, prurido (incl.
casos raros de prurido generalizado), erupção cutânea, equimose, dor nas extremidades, hemorragia do trato urogenital (incluindo hematúria e menorragia), febre, edema periférico, diminuição da força e energia de
um modo geral (incl. fadiga, astenia), aumento das transaminases, hemorragia pós-procedimento (incluindo anemia pós-operatória e hemorragia da ferida), contusão, trombocitemia (incl. aumento da contagem de
plaquetas), reação alérgica, dermatite alérgica, hemorragia cerebral e intracraniana, hemoptise, boca seca, anomalias da função hepática, urticária e hemorragia cutânea e subcutânea, hemartrose, compromisso renal
(incl. aumento da creatinina no sangue, aumento de ureia no sangue), sensação de mal-estar, edema localizado, aumento da bilirrubina, aumento da fosfatase alcalina sanguínea, aumento da HDL, aumento da lipase,
aumento da amilase, aumento da GGT, secreção da ferida, icterícia, hemorragia muscular, aumento da bilirrubina conjugada (com ou sem aumento concomitante da ALT), formação de pseudoaneurisma após intervenção percutânea, síndrome compartimental secundário a hemorragia, insuficiência renal/insuficiência renal aguda secundária a hemorragia suficiente para causar hipoperfusão Número da A.I.M.: 5132956, 5132964,
5132972, 5423918, 5423926, 5423934, 5424403. Data de revisão do texto: Dezembro 2011
Não comparticipado nas doses de 15 mg e 20 mg. Medicamento sujeito a receita médica.
Para mais informações deverá contactar o titular da AIM
2 RevistaBayer
SPA | Vol.
22 - nº1 | S.A.,
2013
Portugal,
Rua Quinta do Pinheiro, nº 5, 2794-003 Carnaxide · NIF 500 043 256
L.PT.GM.02.2012.0192
Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia Vol 22 - Nº 1
revista da Sociedade Portuguesa de
ANESTESIOLOGIA
FICHA TÉCNICA
EDITOR
António Augusto Martins
EDITORES ASSOCIADOS
Isabel Aragão, Lucindo Ormonde, Rosário Orfão
CONSELHO EDITORIAL
Vol. 22 | nº1 | 2013 - ISSN 0871-6099
Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia
Daniela Figueiredo, Fernado Abelha, Hugo Vilela, Joana Carvalhas,
Jorge Reis, Jorge Tavares, José Luís Ferreira, Luís Agualusa, Paulo Sá
Rodrigues, Rui Araújo, Sílvia Neves
DIRECÇÃO DA SPA
Presidente
Lucindo Palminha do Couto Ormonde
Vice Presidente
Isabel Maria Marques de Aragão Fesh
Secretrário
Maria do Rosário Lopes Garcia Matos Orfão
Tesoureiro
Maria de Fátima da Silva Dias Costa Gonçalves
Vogal
Rui Nuno Machado Guimarães
ASSEMBLEIA GERAL
Presidente
José António Benito Bismark de Melo
1º Secretário
Maria Rosário Santos Rocha Tavares Fortuna
2º Secretário
António Manuel Coelho Marques Costa
CONSELHO FISCAL
Presidente
Maria Manuela Marques Proença
1ª Vogal
Pedro Augusto da Conceição Santos Garcia
2ª Vogal
Maria Luísa Graça Teixeira Almeida Gomes
SPA
Centro de Escritórios do Campo Grande
Av. do Brasil, nº 1, 5º andar, sala 7
1749-028 Lisboa
Tel.: (+351) 913 609 330
E-mail: [email protected]
ISSN 0871-6099
Tiragem: 2500 exemplares - Publicação periódica
Propriedade e Administração da Sociedade Portuguesa
de Anestesiologia
Depósito Legal nº 65830/93
Preço Avulso: 7,5€ / número
Assinatura: 4 edições / 30€
Distribuição: Gratuita aos Sócios da Sociedade Portuguesa
de Anestesiologia
Design, Concepção Gráfica e Paginação:
Letra Zen Comunicação
[email protected]
(+351) 936 206 030
Editorial 06
António Augusto Martins
Artigo de Opinião
A Anestesiologia e a Medicina Intensiva
07
Joana Estilista | Pais Martins
Consensos
Errata
09
Carta da Anestesiologia e Direitos do Cidadão 10
Declaração de Coimbra 11
Artigo de Revisão
Profilaxia do tromboembolismo
venoso no doente cirúrgico
12
Cristina Amaral, Jorge Tavares
Casos Clínicos
Abordagem anestésica de doente
com angioedema hereditário
20
Luís Conceição, Hélder Martinho, Marta Azenha
Edema Pulmonar de pressão negativa 24
Fátima Pinhal , Lúcia Rebelo, Vera Mondim,
Manuela Botelho
Artigo Histórico
Histórias da História da Anestesiologia Portuguesa
28
A consulta da Dor no Serviço
de Anestesiologia do IPO, Lisboa
José Manuel Caseiro, Jorge Tavares
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
3
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4 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
´
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
5
Editorial
Caros colegas,
A necessidade de participação ativa dos anestesiologistas em projetos fundamentais para a nossa especialidade pode e deve traduzir-se em propostas concretas. Neste sentido, publicamos neste
número da Revista, em artigo de opinião, o texto ”A Anestesiologia e a Medicina Intensiva / Secção
da Medicina Intensiva da SPA – fundamentos para a sua criação”. As origens ou causas do relativo
“distanciamento” da especialidade por esta área são do conhecimento de todos. A proposta em causa
– a criação da Secção da Medicina Intensiva da SPA – pode constituir um passo importante para o
congregar de vontades e expressão da Anestesiologia nesta competência tal como está definida pela
União Europeia dos Médicos Especialistas / Secção de Anestesiologia.
A multidisciplinariedade é um conceito integrante da vivência hospitalar. A sua prática diária visa proporcionar o mais elevado nível de cuidados a prestar ao doente. Um dos aspetos mais relevantes,
António Augusto Martins
Editor da Revista da SPA
em paralelo com os aspetos clínicos, é sublinhado na introdução do artigo de revisão “Profilaxia do
tromboembolismo venoso no doente cirúrgico”. Salienta-se, aqui, o conceito de responsabilidade multidisciplinar (não só clínica, mas com potenciais implicações médico-legais) que o Programa “Cirurgia
Segura, Salva Vidas” vem reforçar.
Neste âmbito de responsabilidade partilhada e, na qual o tema da profilaxia do tromboembolismo venoso está incluída na “Lista de Verificação
de Segurança Cirúrgica e o Índice de Apgar Cirúrgico”, a recente Norma da Direção-geral da Saúde (nº 02/2013 de 12/02/2013) torna esta check-list um procedimento “obrigatório em todos os blocos operatórios do Serviço Nacional de Saúde e das entidades com ele contratadas, sendo
considerado o padrão mínimo de qualidade clinica.” 1 Esta norma vem referida no Diário da República, 2ª série – Nº 38 – 22 de fevereiro de 2013,
por Despacho nº 2905 que reforça o carácter obrigatório da referida norma, através de sistemas informáticos, e responsabiliza o diretor do Bloco
Operatório na aplicação do programa. 2
Na secção de casos clínicos reportam-se duas situações:
- Uma patologia rara, o Angioedema Hereditário, entidade de transmissão autossómica hereditária dominante. O episódio de crise na sua apresentação clínica mais grave envolve o edema das estruturas da via aérea com uma elevada taxa de mortalidade. São revisitados aspetos relevantes
de terapêuticas, atualmente disponíveis, que permitem abordar esta patologia com alguma segurança.
- Um edema pulmonar de pressão negativa, entidade clínica de baixa frequência que ocorreu no pós-operatório imediato em doente jovem e sem
patologia associada.
Na continuidade das Histórias da História da Anestesiologia Portuguesa relata-se a implementação da Consulta da Dor no Instituto Português de
Oncologia Francisco Gentil – Lisboa e no que representou de importância para a abordagem específica da terapêutica da dor, em particular da
crónica.
E, por fim, duas notas finais:
O Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia de 15 a 17 de Março – 2013 realiza-se em Cascais sob o tema do “Doente
Crítico”. Um tema abrangente e transversal para a nossa especialidade.
A conjuntura económica adversa em que vivemos produz constrangimentos de toda a ordem pelo que o esforço solicitado, neste aspeto, será de
uma dimensão maior.
Apela-se à participação dos anestesiologistas para o maior evento anual da Sociedade e de grande importância para todos.
Uma nota de apreensão pela suspensão da publicação em papel da Revista do CAR. Um veículo de comunicação com uma história importante
na divulgação da Anestesia Regional (e não só) em língua portuguesa e, que por razões que o seu editor enquadra em editorial, vai deixar de nos
acompanhar na sua versão impressa. Esperamos que tal situação seja transitória e de curta duração.
Os meus melhores cumprimentos,
António Augusto Martins
Editor da Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia
Bibliografia
1. Direção Geral de Saúde. Normas e orientações. Disponível em www.dgs.pt/?cr=23652
2. Diário da República. Disponível em dre.pt/pdf2sdip/2013/02/038000000/0718007180.pdf
6 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
Artigo de Opinião
A Anestesiologia e a Medicina Intensiva
Secção de Medicina Intensiva da SPA – fundamentos para a sua criação
Joana Estilista 1, António Pais Martins 2
1
Assistente Hospitalar de Anestesiologia, UCI Polivalente, Centro
Hospitalar do Barlavento Algarvio, Portimão
2
Chefe de Serviço de Anestesiologia, Coordenador da UCI, Hospital S.
Francisco Xavier, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental
É inquestionável a importância do papel da Anestesiologia moderna como vasta área da ciência médica que reúne o conhecimento no âmbito da Anestesia e Medicina do
Peri-operatório, da Medicina Intensiva, da Medicina da Dor
e da Medicina de Emergência.
Em Portugal, na ausência de médicos diferenciados em
Medicina Pré-Hospitalar, verifica-se que mais de 65 % dos
médicos que trabalham nas Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação são Anestesiologistas. Da mesma
forma, a grande maioria das Unidades de Dor são parte
integrante dos Serviços de Anestesiologia. Os Anestesiologistas foram, adicionalmente, pioneiros no desenvolvimento da Medicina do Doente Crítico, muito embora representem actualmente uma pequena percentagem de médicos
vocacionados para os Cuidados Intensivos. A sondagem
COMPACCS (Commitee on Manpower for Pulmonary and
Critical Care Medicine),1 desenvolvida entre 1996 e 1999,
verificou que os Anestesiologistas representavam apenas
6,1 % de todos os Intensivistas a exercerem nos Estados
Unidos, apesar de se encontrarem particularmente treinados para a abordagem do Doente Crítico. Esta tendência
também se verifica na Europa e surge numa altura em que
há uma recorrente necessidade de Intensivistas.
Na maior parte dos Estados-Membros da União Europeia os Cuidados Intensivos são um componente integral
do Internato de Anestesiologia. Adicionalmente, os Anestesiologistas são frequentemente chamados para papéis
organizacionais na maioria das Unidades de Cuidados Intensivos (UCIs).
As Necessidades da Medicina Perioperatória
Em entrevista dada ao jornal Público em Outubro de
2010, por ocasião das comemorações do Dia Mundial da
Anestesiologia, o Presidente da Sociedade Portuguesa de
Anestesiologia Dr. Lucindo Ormonde referia que, à época
em Portugal, existiam menos de metade dos Anestesiologistas necessários. Esta poderá ser uma das razões que
fez diminuir a representação dos Anestesiologistas nas
UCIs, uma vez que, na escassez, são muitas vezes redireccionados para o Bloco Operatório, onde a sua ausência
pode acarretar perdas mais visíveis para as Instituições
Hospitalares. Estas medidas economicistas podem, em úl-
tima análise, fazer com que a Anestesiologia se torne uma
Especialidade mais limitada.
Como reconhecimento da importância da Medicina Intensiva nas boas práticas do Anestesiologista, foi recentemente modificada a estrutura do Internato de Especialidade: A Portaria n.º 49/2011 de 26 de Janeiro, tendo em
consideração o desenvolvimento da especialidade e a sua
diferenciação em novas áreas, aumentou para cinco anos
o tempo mínimo de formação e o estágio de Medicina Intensiva para “9-12 meses sendo que, pelo menos 6 meses
consecutivos em Unidade/Serviço Polivalente”. 2
Esta importante medida, é um reforço do peso do Anestesiologista, no tratamento do doente crítico e na sua formação como Especialista do peri-operatório.
A Realidade dos Cuidados Intensivos em Portugal
Em Portugal existem mais de 150 Serviços Hospitalares
que prestam Cuidados Intensivos, no entanto o número de
Unidades de nível C é substancialmente menor.
Desconhece-se o número exacto de Anestesiologistas a
exercerem a sua actividade em tempo total ou parcial nas
Unidades de Cuidados Intensivos, Unidades de Cuidados
Intermédios e Unidades de Cuidados Pós-Operatórios.
É contudo uma realidade, que o número de Anestesiologistas afeto a tão importante actividade e a uma área
onde a Anestesiologia é perita, tem vindo a diminuir ao longo dos últimos anos. Em Fevereiro de 2011, encontravam-se apenas 68 Anestesiologistas inscritos no Colégio de
Medicina Intensiva e destes, um número significativo, não
dedicado aos Cuidados Intensivos.
Não pode ser ignorado o desejo de vários autores 3 e
da atual direção do Colégio da Subespecialidade de Medicina Intensiva da Ordem dos Médicos, (composta por
sete elementos, não sendo nenhum Anestesiologista), da
criação da Especialidade Primária de Medicina Intensiva.
A Sociedade Europeia de Anestesiologia (ESA), o Conselho Europeu de Anestesiologia da UEMS (EBA) e o Comité
Multidisciplinar dos Cuidados Intensivos da UEMS (MJCIM)
são contra esta proposta. O Colégio de Anestesiologia da
Ordem dos Médicos e a Sociedade Portuguesa de Anestesiologia, concomitantemente, manifestaram também publicamente, a sua discórdia contra esta iniciativa.
Como referem Hugo Van Aken, Jannicke Mellin-Olsen
e Paolo Pelosi no editorial do Nº28 do European Journal
of Anaesthesiology de 2011,4 os Cuidados Intensivos são
considerados como uma área demasiado complexa para
ser abordada por uma única especialidade. A estreita cooRevista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
7
peração entre médicos de várias especialidades é, indiscutivelmente, um valor acrescido nos cuidados a prestar
ao doente crítico e um património que não pode ser delapidado.
A Medicina Intensiva como uma especialidade primária,
em vez de subespecialidade, tenderia a impedir esta mútua comunicação e colaboração entre profissionais de diferentes áreas, com conhecimento específico, experiência e
habilidades complementares.
Por isso, nesta altura conturbada, recebemos com agrado a notícia do Tema do próximo Congresso Anual da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia, intitulado “Doente
Crítico”. Acreditamos que se trata de um reconhecimento
merecido por parte da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia aos Anestesiologistas que desenvolvem a sua actividade nas Unidades de Cuidados Críticos, em todas as
suas vertentes.
A criação da Secção de Medicina Intensiva da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia, como pólo aglutinador e
dinamizador de todos os interessados nesta área do saber médico, torna-se assim imperativa no contexto actual,
onde a influência, o interesse e a participação dos Anestesiologistas na área da Medicina Intensiva tem vindo a
decrescer de ano para ano.
Referências
1. Cooper RA. The COMPACCS Study: questions left unanswered.
The Committee on Manpower for Pulmonary and Critical Care Societies. Am J Respir Crit Care Med. 2001 Jan;163(1):10-1.
2. Diário da República, 1.ª série — N.º 18 — 26 de Janeiro de 2011.
3. Moreno RP, Rhodes A. Intensive care medicine: a specialty coming to LIFE. Lancet 2010; 376:1275–1276.
4. Hugo Van Aken, Jannicke Mellin-Olsen and Paolo Pelosi: Intensive care medicine: a multidisciplinary approach! Eur J Anaesthesiol
2011; 28:313-315.
8 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
Consensos
ERRATA
Na edição da Revista da SPA – Vol 21, Nº4, 2012 – o Índice referenciava na secção de Consensos dois textos:
Carta da Anestesiologia e Direitos do Cidadão
Declaração de Coimbra
Estes textos foram elaborados e apresentados durante as comemorações do Dia Mundial da Anestesiologia a
16 de Outubro, 2012.
Por lapso, na edição da Revista o texto relativo à “Carta da Anestesiologia e Direitos do Cidadão” ficou omisso
– facto que lamentamos.
De igual modo, na “Declaração de Coimbra”, na sua introdução “Nós, Diretores de Serviço e Departamentos de
Anestesiologia Portugueses, reunidos em Coimbra …”, foi apontada a necessidade de objetivar os subscritores
efetivos.
A Revista da SPA, pela necessidade de corrigir estas lacunas, reproduz a totalidade dos textos em causa e
solicitou à Coordenação deste projeto os respetivos subscritores dos documentos.
A Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia
Diretores de Serviço e de Departamento de Anestesiologia subscritores dos documentos:
Centro Hospitalar Alto Ave, EPE
Centro Hospitalar de Leiria-Pombal, EPE
Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE
Centro Hospitalar de Oeste Norte
Centro Hospitalar de Setúbal, EPE
Centro Hospitalar de Torres Vedras
Centro Hospitalar de Vila Nova Gaia-Espinho, EPE
Centro Hospitalar do Baixo Vouga, EPE – Aveiro
Centro Hospitalar do Porto, EPE
Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE
Centro Hospitalar Médio Tejo, EPE
Centro Hospitalar São João-Porto, EPE
Centro Hospitalar Tondela-Viseu, EPE
Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro, EPE
Hospital Central do Funchal
Hospital de Braga
Hospital de Faro, EPE
Hospital de Santo Espírito – Angra Heroísmo-Açores
Hospital Distrital da Figueira da Foz, EPE
Hospital Distrital de Santarém, EPE
Hospital do Divino Espírito Santo – Ponta Delgada – Açores
Hospital Dr. Francisco Zagalo, EPE – Ovar
Hospital João Crisóstomo – Cantanhede
Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, EPE
Instituto Português de Oncologia Dr. Francisco Gentil, EPE – Porto
Instituto Português de Oncologia, Dr. Francisco Gentil, EPE – Coimbra
Instituto Português de Oncologia, Dr. Francisco Gentil, EPE – Lisboa
Unidade Local de Saúde de Castelo Branco, EPE
Unidade Local de Saúde Matosinhos, EPE
Unidade Local de Saúde Nordeste, EPE
Unidade Local de Saúde Norte Alentejano, EPE
Presidente da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia
Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
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Consensos
Carta da Anestesiologia
e Direitos do Cidadão
O médico anestesiologista é perito nas áreas da Anestesia
para procedimentos cirúrgicos e exames complementares,
Medicina Peri-operatória, Medicina Intensiva, Medicina de
Emergência e Medicina da Dor. É o médico responsável pela
segurança do cidadão doente nas situações críticas e de
grande vulnerabilidade, no âmbito das suas competências.
Direitos do cidadão
•Acesso sem discriminação à Medicina Peri-operatória, Medicina Intensiva, Medicina de Emergência e
Medicina da Dor;
•Receber cuidados prestados por anestesiologistas
com competência e treino nas diversas áreas;
•Aceder a estes cuidados em tempo útil;
•Privacidade e intimidade no decurso da assistência
anestesiológica prestada;
•Confidencialidade de toda a informação clínica e
elementos identificativos;
•Fim de vida com dignidade, apoiado por médicos
com competência em Medicina da Dor e formação em
cuidados paliativos;
•Respeito pelo testamento vital;
•Apresentar sugestões e reclamações.
Informação adequada
• Ser avaliado e informado numa consulta de Anestesia;
• Ser informado sobre a técnica anestésica, analgésica,
cuidados peri-operatórios e complicações possíveis.
Ato anestesiológico de qualidade e seguro
• Cuidados peri-operatórios prestados por um anestesiologista;
•Vigilância intraoperatória assegurada por um anestesiologista que controle as suas funções vitais;
•Vigilância pós-operatória em Unidades de Cuidados
Pós-anestésicos, onde o anestesiologista possa dar continuidade à prestação de cuidados relacionados com a recuperação das funções vitais e com o controlo da dor;
•Avaliação e orientação no pós-operatório em consulta
de follow-up, por anestesiologistas.
Terapêutica da dor, qualquer que seja a sua causa, por
forma a evitar sofrimento desnecessário e reduzir a morbilidade que lhe está associada
•Garantia de adequado controlo da dor aguda pós-operatória proporcional à agressividade do ato cirúrgico e adotando modelos organizados de intervenção (Unidades de
Dor Aguda);
•Ter acesso à prevenção e controlo da dor provocada ou
consequente aos exames de diagnóstico e tratamentos
médicos;
10 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
•Adequado controlo doutras formas de dor aguda resultantes de trauma ou de patologia de qualquer origem;
• Escolha informada entre várias técnicas de analgesia
de trabalho de parto prestada por anestesiologistas;
• Prevenção da dor crónica pós-operatória;
• Ser referenciado, em tempo útil, para consulta de Medicina da Dor dotada de recursos humanos e materiais adequados.
Medicina Intensiva e de Medicina de Emergência
• Receber assistência médica pré e intra-hospitalar de
emergência, adequada e célere;
• Receber o máximo tratamento disponível desde que
proporcional às suas necessidades, e com real beneficio
para si;
• Ser informado, bem como os familiares próximos, sobre
o diagnóstico, prognóstico e eficácia dos meios terapêuticos utilizados;
• A terapêutica que produza amnésia, com ponderação
e de acordo com quadro clínico de dor e ansiedade, tendo
em conta a perda de autonomia e de memória resultantes;
• À suspensão de tratamentos fúteis e à abstenção do
encarniçamento terapêutico;
• A ser acompanhado pelos familiares, na morte consciente, quando o conhecimento médico e os meios técnicos
disponíveis não permitem salvar a vida ou evitar sequelas
compatíveis com uma qualidade de vida eticamente aceitável.
O médico anestesiologista deve:
•Fornecer ao cidadão todas as informações relativas aos
cuidados anestesiológicos, de modo claro e esclarecedor,
dentro dos limites legais da sua prática profissional e tendo
em conta os recursos disponíveis. Obter o consentimento
informado para o procedimento proposto;
•Assegurar a confidencialidade de toda a informação clínica e elementos identificativos do cidadão;
•Manter-se treinado e atualizado cientificamente.
O cidadão deve:
•Fornecer ao anestesiologista todas as informações necessárias, nomeadamente doenças e terapêuticas associadas
incluindo as alternativas, para a obtenção de um correto dia-gnóstico e adequada abordagem anestesiológica;
•Colaborar com o anestesiologista, respeitando as indicações que lhe são recomendadas e por ele livremente
aceites.
Consensos
DECLARAÇÃO DE COIMBRA
Nós, Diretores dos Serviços e Departamentos de Anestesiologia Portugueses, reunidos em Coimbra no dia 16 de
Outubro de 2012, no âmbito das comemorações do Dia
Mundial da Anestesiologia, sob a égide da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia e, em torno do tema “A Anestesiologia e os Direitos dos Cidadãos”,
Conscientes dos contributos sociais, humanistas e personalistas que esta especialidade dá aos direitos de cidadania.
Reafirmando a importância do direito de todas as mulheres à analgesia do trabalho do parto, com vista a um
parto sem dor,
Destacando a importância da segurança do doente, da
segurança da anestesia e do tratamento da dor.
Reafirmando o nosso compromisso com a emergência
médica e os cuidados intensivos,
Enaltecendo o direito a um final de vida com dignidade,
Levando em consideração as áreas em que os Anestesiologistas são peritos, reconhecidas no seio da UEMS
- União Europeia dos Médicos Especialistas – Anestesia,
Medicina Peri-operatória, Medicina Intensiva, Medicina
de Emergência e Medicina da Dor,
ACORDAMOS
1. Reforçar a nossa intervenção junto dos cidadãos, criando laços de proximidade que reforcem o conhecimento
dos avanços e da excelência da Anestesiologia Portuguesa.
2. Reafirmar que os médicos anestesiologistas são peritos nas áreas da Anestesia para procedimentos cirúrgicos
e exames complementares de diagnóstico, Medicina Peri-Operatória, Medicina Intensiva, Medicina de Emergência e
Medicina da Dor.
3. Considerar a importância do conhecimento destes
médicos especialistas na actividade de cuidados paliativos, destacando o papel da sociedade e do Estado no
acesso dos cidadãos a estas unidades, contribuindo para a
dignidade no fim da vida.
4. Destacar a importância do acesso de todos os cidadãos
às mais modernas técnicas anestésicas, independentemente da região, do hospital ou do procedimento, com o
objectivo de contribuir para a coesão nacional.
5. Promover a criação ou desenvolvimento de unidades
de tratamento de dor aguda, integradas nos serviços de
anestesiologia.
6. Insistir na referenciação dos cidadãos com dor crónica
para a consulta de medicina da dor dotada com os recursos humanos e materiais adequados à situação clínica.
7. Reafirmar os valores e os princípios dos direitos dos
cidadãos a:
a. Acesso sem discriminação à Medicina da Dor, Medicina Peri-operatória, Medicina Intensiva e Medicina de
Emergência;
b. Receber cuidados prestados por Anestesiologistas que
tenham competência e treino nas diversas áreas;
c. Acesso a estes cuidados em tempo útil.
8. Que todos os hospitais portugueses disponham de
Serviços de Anestesiologia com autonomia e independência funcional, administrativa, técnica e científica.
9. Destacar o requerido papel do Estado para incentivar
as políticas de investigação e de ensino em Anestesiologia.
10. Reiterar junto de todas as Faculdades de Medicina
Portuguesas a importância e a exigência científica da integração do ensino da Anestesiologia nos programas curriculares do curso de medicina.
11. Realizar os esforços necessários para que se possam duplicar em 3 anos o número de doutorandos em Anestesiologia.
12. Valorizar as melhores práticas para responder adequadamente aos desafios colocados pelas dificuldades financeiras do País, apoiando os esforços de rigor orçamental e de execução financeira das instituições, através da
reorganização dos serviços, do rigor na prescrição clínica e
da valorização do trabalho em equipa.
13. Promover junto das administrações hospitalares a
necessidade de acreditação dos serviços e das práticas
clínicas, como instrumento de qualidade.
14. Que, em consequência, se disponibilizem os meios
organizacionais que permitam a constituição de serviços
ou departamentos consistentes e abrangendo as áreas em
que os anestesiologistas são peritos.
15. Estimular o intercâmbio com serviços congéneres
nacionais e internacionais, através de uma plataforma a
implementar com os vários agentes sociais profissionais.
16. Valorizar a participação dos anestesiologistas em
missões humanitárias e atividades de solidariedade e
compromisso social.
17. Defender o fortalecimento do investimento dos hospitais em equipamentos mais seguros e em estruturas
mais modernas e adequadas para as diversas áreas de
actividade da Anestesiologia, enfatizando o papel chave
que deve cumprir, nesse contexto, o financiamento internacional através dos programas de coesão existentes.
18. Promover franco diálogo junto das administrações
hospitalares para que estas tomem consciência da importância essencial e crescente – no contexto da economia, da organização, da cidadania e da qualidade – de que
os serviços de Anestesiologia são promotores da melhoria
da qualidade assistencial e da eficiência hospitalar.
19. Reafirmar o apoio da Anestesiologia portuguesa à
Declaração de Helsínquia sobre a segurança do doente.
Coimbra, 16 de Outubro, 2012
Diretores de Serviço de Anestesiologia Portugueses
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
11
Artigo de Revisão
PROFILAXIA DO TROMBOEMBOLISMO VENOSO NO DOENTE CIRÚRGICO
o papel da anestesiologia numa responsabilidade multidisciplinar
Cristina Amaral 1, Jorge Tavares 2
Palavras-chave:
- Profilaxia;
- Tromboembolismo venoso;
- Doente cirúrgico;
- Fatores de risco;
- Anestesia;
- Recomendações
Resumo
A eficácia da profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico está demonstrada
e tem um grande impacto epidemiológico e económico.
Os recursos e indicações em termos de terapêutica profilática devem ter em conta os
fatores de risco específicos do doente, aqueles inerentes ao procedimento cirúrgico e os
relacionados com a própria anestesia.
Apesar do evidente contributo para a melhoria do prognóstico, as recomendações de
profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico continuam a não estar
completamente implementadas nos hospitais. Este facto prende-se com várias barreiras,
desde o desconhecimento das recomendações, à dificuldade em avaliar diferentes
graus de risco e populações de risco adicional, ao receio de complicações associadas,
até à ainda não integrada responsabilidade multidisciplinar. Acresce a necessidade de
reforçar a importância do registo de execução e do controle de processo. Os reguladores
já puseram em prática programas no sentido de vencer estas barreiras, mas estamos
longe de um nível de excelência transversal a todo o doente cirúrgico.
O objectivo deste artigo é apresentar as mais recentes recomendações de prevenção
do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico, nomeadamente as do nono consenso
do American College of Chest Physicians e as suas implicações na conduta anestésica,
procurando estratégias para vencer algumas das barreiras existentes à sua implementação.
THE SURGICAL PATIENT PROPHYLAXIS OF VENOUS THROMBOEMBOLISM
Anesthesiology’s role of a multidisciplinary responsibility
Cristina Amaral 1, Jorge Tavares 2
Keywords:
- Prophylaxis;
- Venous Thromboembolism;
- Risk factors;
- Anesthesia;
- Recommendations
Abstract
The effectiveness of prophylaxis of venous thromboembolism in surgical patients is
demonstrated and has great economic and epidemiological impact.
The features and indications in terms of prophylactic therapy should take into account the
specific risk factors of the patient, those inherent to the surgery and related to anesthesia itself.
Despite the obvious contribution to improving the prognosis, the recommendations of
venous thromboembolism prophylaxis in surgical patient is still not fully implemented
in hospitals. This relates to various barriers since the lack of recommendations and
the difficulty of assessing different degrees of risk and additional risk populations, the
fear associated complications, to the still not integrated multidisciplinary responsibility.
Furthermore there’s a need to reinforce the importance of execution and registration of
process control. The regulators have already implemented programs in order to overcome
these barriers, but we are far from a level of excellence across the entire surgical patient.
The purpose of this article is to present the latest recommendations for the prevention
of venous thromboembolism in surgical patient, including the ninth consensus of the
American College of Chest Physicians and the implications for anesthetic management,
seeking strategies to overcome some of the barriers to their implementation.
1
Assistente Hospitalar Graduada, Serviço de Anestesiologia, Centro
Hospitalar de S. João EPE, Porto.
2
Chefe de Serviço, Serviço de Anestesiologia, Centro Hospitalar de S. João
EPE, Porto. Professor Catedrático, Anestesiologia, Faculdade de Medicina da
Universidade do Porto.
Em 2009, o Departamento de Segurança do Paciente
da Organização Mundial de Saúde, após o Programa de
12 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
Higienização das Mãos, lançou um segundo desafio com o
objetivo de prevenir os eventos adversos relacionados com
a cirurgia à escala global sob o lema “A Cirurgia Segura Salva Vidas”.1 O programa pretendia implementar uma Lista
de Verificação de Segurança Cirúrgica (LVSC), da qual fazia
parte a enumeração de itens relacionados à comunicação
interdisciplinar efetiva, à anestesia, à cirurgia e aos procedimentos de enfermagem. Portugal teve o mérito de ade-
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
rir a este programa a 15 de Dezembro de 2009 com um
aditamento relevante, que foi o da introdução da profilaxia
tromboembólica.2
A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) em parceria com
a Siemens - Joint Commission e uma Comissão de Acompanhamento de peritos nacionais, implementaram o primeiro Sistema Nacional de Avaliação na Área da Saúde
(SINAS), em 2010. 3 A avaliação de desempenho começou nas áreas cirúrgicas de ortopedia e ginecologia. As
recomendações da Joint Comission4 abrangem múltiplos
indicadores, nos quais está incluída a profilaxia tromboembólica.
Estão criados dois programas, redundantes como convém, ao processo de prevenção do tromboembolismo venoso (TEV) no doente cirúrgico em Portugal.
Reconhecidamente uma responsabilidade multidisciplinar,5 esta atribuição no per-operatório tem recaído sobre a
responsabilidade dos anestesiologistas, quer ao elaborarem a LVSC, quer ao avaliarem os diferentes graus e populações de risco com adaptações terapêuticas ao índice de
massa corporal ou à insuficiência renal para a prevenção
do TEV. Acresce a necessidade de adaptar esses regimes
posológicos à anestesia loco-regional, tão frequente em
algumas das especialidades cirúrgicas avaliadas e que
se estende ao pós-operatório. O facto de alguns dos pacientes submetidos a cirurgia estarem hipocoagulados no
pré-operatório reforça a necessidade de uma colaboração
mais estreita da anestesiologia no sentido de otimizar os
doentes para técnicas loco-regionais. Sendo que, estas
mesmas técnicas demonstraram contribuir para uma si-gnificativa redução do TEV quando comparadas à anestesia geral.6
À anestesiologia compete atuar como um catalisador de
eficiência das fases do peri-operatório, pelo que a sua intervenção no processo de prevenção da trombose venosa
não pode ser ignorada, sob risco de criar um hiato. A nível
médico-legal começa a haver casos de atribuição de culpa
parcial ao anestesiologista pela omissão da terapêutica
preventiva adequada. 7
Ultrapassar as barreiras à implementação das recomendações, requer uma reflexão sobre epidemiologia, patofisiologia, racional da prevenção, fatores de risco e hiatos,
ainda existentes, na profilaxia do TEV. Tratando-se de um
importante problema de saúde pública, que ao contrário
de muitos outros pode ser significativamente reduzido pela
boa prática médica, é necessário sensibilizar todos os intervenientes.
EPIDEMIOLOGIA
A trombose venosa profunda (TVP), mais frequente a
nível dos membros inferiores, e a embolia pulmonar (EP),
constituem duas preocupantes apresentações do TEV.
A TVP tem uma incidência intra-hospitalar de cerca de 25 %
em doentes com fatores de risco, em cerca de um terço dos
quais dá origem a EP, sendo, que noutros tantos, a longo pra-
zo, têm como sequela a síndrome pós-trombótico (SPT).7
De acordo com o estudo ENDORSE, a EP é responsável
por cerca de 10 % das mortes hospitalares e constitui a
maior causa de morte intra-hospitalar evitável. 8 A sua profilaxia é uma estratégia prioritária para melhorar a segurança dos pacientes nos hospitais.9
O ENDORSE foi um estudo de avaliação do cumprimento
internacional das recomendações do sétimo consenso do
American College of Chest Physicians (ACCP) sobre prevenção do TEV.8 O estudo revelou, que nos hospitais portugueses o risco de TEV é de 52,7 %, dos quais 68,9 % no
doente cirúrgico e 38.5 % no médico.10 A taxa de profilaxia
adequada nos doentes em risco foi de 58,5 % ( 59 % doentes cirúrgicos e 57,6 % doentes médicos). Cerca de 38 % dos
doentes cirúrgicos, que não preenchiam critérios, receberam profilaxia anticoagulante, ficando expostos a riscos
desnecessários. O estudo mostra também, que o TEV é
motivo de internamento em 1 % dos doentes.
Comparativamente, a taxa de profilaxia no doente cirúrgico de outros países participantes no ENDORSE foi superior à portuguesa: Alemanha (94 %), Hungria (87 %), Suíça
(85 %), República Checa (84 %) e Espanha (83 %).
A prevalência do TEV é desconhecida.7 Em cerca de 50 %
dos casos é assintomático7 e 25 % dos doentes com EP
têm morte súbita como manifestação inicial da doença.11
Após um primeiro episódio de tromboembolismo alguns
pacientes têm episódios recorrentes. Em alguns destes o
primeiro episódio não foi diagnosticado e noutros surge
quando param a terapêutica anticoagulante.12
Como complicação do TEV surgem duas sequelas crónicas relacionadas à recorrência. Uma delas é o SPT, que na
maioria dos doentes ocorre um a dois anos após o primeiro
evento.13 Outra é a hipertensão tromboembólica pulmonar
crónica.8 Esta ocorre em cerca de 2-4 % de doentes após
EP e é definida por uma pressão arterial pulmonar média
superior a 25 mmHg, que persiste por seis meses após o
diagnóstico de EP.12
Sem tromboprofilaxia, a incidência de TVP varia entre
10-20 % para o total de doentes, médicos e cirúrgicos; sobe
para 15-40 % naqueles submetidos a cirurgia major geral,
ginecológica, urológica ou neurocirúrgica e é nas artroplastias do joelho e da anca, que atinge o seu valor mais alto
entre 40-60 %.9
Em 2007, cerca de 12 % das mortes anuais na União
Europeia estavam associadas ao TEV.14 Este é considerado um importante problema de saúde pública na Europa,
tendo grande impacto económico e estando o seu custo
direto nos cuidados hospitalares avaliado em mais de 3 mil
milhões de euros por ano.15 Nos EUA a proporcionalidade
dos números é semelhante.15, 16
PATOFISIOLOGIA
Virchow descreveu uma tríada, classicamente aceite, de
fatores responsáveis pela trombose: alterações do fluxo
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
13
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
sanguíneo e da coagulação e injúria endotelial.7,17
Os trombos ocorrem em áreas de estase ou turbulência, como cúspides valvulares, seios venosos da pelve e
região gemelar, veia cava superior, sistema porta, câmaras
cardíacas direitas e zonas de trauma vascular e inserção
de cateteres.7 Um trombo não resolvido endogenamente
pode estreitar o lúmen do vaso ou migrar. A sua massa é
formada por glóbulos rubros, fibrina e menos frequentemente plaquetas e leucócitos.7
O TEV partilha com a aterotrombose fatores de risco e
patofisiologia (inflamação, hipercoagulabilidade e injúria
endotelial).12,18 Nesta abordagem mais recente, é reforçado o papel do TEV na contribuição para uma síndrome
panvascular, que consiste em doenças coronária, arterial
periférica e cerebrovascular.12 Alguns dos seus fatores de
risco são comuns à aterosclerose.19 O estudo Atherosclerosis Risk In Communities, 20 mostra que concentrações de
proteína C- reativa acima do percentil 90 estão associadas
a um aumento significativo do risco de TEV, evidenciando o
papel da inflamação neste processo.
RACIONAL PARA A PROFILAXIA DO TEV
Os fundamentos da prevenção do TVE baseiam-se na
sua eficácia, natureza silenciosa da doença, elevada prevalência nos hospitais e suas consequências potencialmente fatais. 21 Esta prevenção constitui uma das medidas
com melhor custo/eficácia da medicina e tem sido alvo das
recomendações de vários organismos responsáveis pela
avaliação da qualidade da saúde a nível mundial.4,21,22,23,24
Em 2010, o National Institute for Healt and Clinical Excellence (NICE) do Reino Unido, formulou orientações para
a prevenção do TEV, com base em intervenções eficientes.
Nelas ficou sublinhada a necessidade de validar modelos
de predição de risco. 22
As recomendações de 2012 do ACCP 25 enfatizam a ponderação do risco individual do paciente na decisão da terapêutica profilática. Em alguns estudos, 8 a pressão para
fazer profilaxia a todos os doentes, resultou em que alguns
deles fizessem terapêutica desnecessária.
Outro fator a ponderar é o risco de hemorragia e a relação de benefício com a hipocoagulação, que pode ficar
condicionada, quer pela cirurgia, quer pela anestesia. 25 As
recomendações da European Society of Anaesthesiology26
e da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia, 27 ambas de
2010, em relação à hipocoagulação, nem sempre são respeitadas no peri-operatório, pelo que a incidência de complicações e potencial aversão à terapêutica podem conduzir a um aumento da morbilidade dos pacientes.
Uma das inovações do nono consenso do ACCP é a consideração dos valores e preferências do paciente e restrição
dos outcomes somente aqueles, que para ele são importantes. 23,28
Contrariamente à versão anterior, nesta, o ACCP indica a
aspirina como uma opção, embora não de primeira linha,
14 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
na prevenção do TEV, mesmo em cirurgia major ortopédica (evidência de qualidade moderada). 23,29 Também são
incluídas recomendações em relação aos novos anticoagulantes apixabam, rivaroxabam, ambos inibidores diretos
do fator Xa e etexilato de dabigatrano, inibidor direto da
trombina.25,29,30
O ACCP estrutura as recomendações em três tipos de
pacientes: não cirúrgico,31 cirúrgico não ortopédico25 e cirúrgico ortopédico. 29 A esta estruturação, não é alheia a diferente incidência de TEV nos três grupos. Esta abordagem,
que também é utilizada nas orientações do NICE, simplifica a aplicação de protocolos, o que contribui para uma
mais fácil implementação. Além disso, no doente cirúrgico
em per e pós-operatório imediato, a ponderação do risco
de hemorragia é um fator limitante de regimes terapêuticos de anticoagulantes em substituição dos profiláticos.
FATORES DE RISCO DE TEV
ESPECÍFICOS DO PACIENTE
O risco de TEV aumenta exponencialmente com a idade. Com uma incidência anual de 1/10.000 abaixo dos 40
anos, comparativamente, aumenta dez vezes entre os 6069 anos e 100 vezes acima dos 80 anos. 21,32,33
A malignidade está associada a um aumento do risco de
TEV, 22,25 de 5 a 7 vezes comparativamente à população
geral; agravado pela cirurgia, quimioterapia e cateterismo
venoso central. 21 Caprini refere um risco, somente, 2 a 5
vezes superior em cirurgia oncológica, que varia com o tipo
de cancro (gástrico, pancreático, ginecológico, renal e coloretal, com maior risco).34
Alguns autores atribuem à obesidade um aumento do
risco de TEV de 2 a 3 vezes, para um índice de massa corporal (IMC) superior a 30 Kg.m-2. 21,35 Esta associação pode
estar relacionada a outros fatores específicos do doente,
como a idade35 ou ter maior influência em certos procedimentos como a cirurgia bariátrica. 25 A EP foi a principal
causa de morte pós- operatória encontrada neste último
grupo. Caprini associa o aumento de risco a um IMC superior a 25 Kg.m-2.34 Independentemente do peso da obesidade no risco de TEV, a profilaxia farmacológica nestes
doentes deve estar ajustada em função do IMC, sob pena,
de ela própria se converter numa barreira às boas práticas.
Um grupo especial de risco é a gravidez e puerpério.
Comparativamente a mulheres não grávidas, há um aumento de risco de TEV de 10 vezes na gravidez e de 25
vezes no puerpério. 21 A co-existência de trombofilia é um
fator aditivo de risco. 21 O aumento da idade da primeira
gravidez, também em Portugal é outro fator adicional de
risco.36
A terapêutica hormonal na mulher21,22,37 e o uso de anti-psicóticos 37,38 estão associados ao aumento do risco de
TEV.
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
História pessoal de TEV não provocada, representa não
só um fator de risco, como também de recorrência de TEV
(taxa de 5 % por ano). 22,25 Outros fatores de recorrência
são: sexo masculino, obesidade e trombofilias. 21
A doença cardiovascular, coronariopatia, insuficiência
cardíaca congestiva e acidente vascular cerebral (AVC)
também aumentam o risco de TEV.21 A trombose venosa
cerebral (TVC) responde por cerca de 0.5 % do AVC. Numa
pesquisa feita em Portugal, 87 % dos doentes atingidos por
TVC tinham fatores de risco vascular.39
Outros fatores envolvidos no TEV são a existência de
veias varicosas, 21,22 doença pulmonar obstrutiva crónica, 25
infeção aguda severa21,22,25 e doença inflamatória intestinal.21,22
No Quadro 1 estão enunciados os fatores de risco específicos do paciente, entre outros.
Fatores de risco de TEV
- Idade > 60 anos 21,22,25
- Malignidade 21,22,25
- Obesidade (IMC> 30Kg.m-2) 21,22
- Veias varicosas 21,22
- História pessoal 21,22,25 ou familiar (1º grau) de TEV 21,22
- Trombofilias 21,22,25
- Doença cardiovascular (AVC, Coronariopatia, ICC) 21
- Doença pulmonar obstrutiva crónica 25
- Infeção aguda severa 21,22,25
- Doença inflamatória intestinal 21,22
- Outros estados trombóticos (S. metabólico, Infecção crónica
HIV, Anemia falciforme, S. nefrótico) 21,22
- Contracetivos 21,22,25
- Terapêutica de substituição hormonal 21,22,25
- Tamoxifeno, 21,22 raloxifeno 21
- Gravidez e puerpério 21,22,25
- Antipsicóticos 37,38
- Imobilidade (>3 dias) 21,22
- Internamento 21,25
- Anestesia (> 2h) 25
- Anestesia geral 21,25
- Cateterismo venoso central 21,22,25
- Complicações cirúrgicas 25
- Desidratação 22
Quadro 1 – Fatores de risco de TEV
RELACIONADOS COM O INTERNAMENTO
O internamento hospitalar, se superior a dois dias, condiciona um aumento do risco de TEV de 10 vezes. 25,22 A
imobilidade se superior a 3-4 dias tem igual impacto.21 A
admissão em cuidados intensivos aumenta o risco. 22
RELACIONADOS COM A ANESTESIA
menta.25 O NICE refere que um procedimento anestésicocirúrgico superior a 90 minutos ou a 60 se envolver a pelve
e membros inferiores aumenta o risco de TEV.22
O cateterismo venoso central, também contribui para o
TEV, sendo que o acesso femoral tem um risco 11,5 vezes
superior ao subclávio.40 As recomendações da American
Society of Anesthesiologists Task Force de 2012 podem
ajudar a ultrapassar alguns riscos, nomeadamente preferir
acessos na parte superior do corpo, usar ecografia, sobretudo, em alguns casos, confirmar pressões diretas e fazer
controlo radiológico sempre que necessário.41
A desidratação é referida como fator de risco de TEV.22
No per- operatório, perdas relacionadas à exposição ou à
hemorragia obrigam a fazer reposição ou compensar estado prévio.
Outros fatores independentes de risco relacionados com
complicações cirúrgicas como infeção urinária, insuficiência renal aguda, transfusões, enfarte de miocárdio perioperatório e pneumonia, 25 podem ser modificados pelo desempenho da anestesiologia.
RELACIONADOS COM A CIRURGIA
As recomendações de 2012 do ACCP, classificam o risco
cirúrgico do doente não ortopédico em quatro categorias:
muito baixo, baixo, moderado e alto. 25 Ao muito baixo risco corresponde a maior parte da cirurgia de ambulatório.
O risco baixo é o que está associado à apendicectomia,
colecistectomia laparoscópica, prostatectomia transuretral, herniorrafia inguinal, mastectomia e cirurgia da coluna
para doença não maligna. Já a laparotomia, cirurgia ginecológica para doença não maligna, cirurgia cardíaca e a
maior parte da cirurgia torácica (exceto pneumectomia ou
cirurgia alargada) têm risco moderado. O risco elevado engloba a cirurgia bariátrica, ginecológica para malignidade,
pneumectomia, craniotomia, traumatismo cranioencefálico e medular e outros traumatismos major.
A admissão cirúrgica urgente por doença inflamatória ou
intra-abdominal, aumenta o risco de TEV.22
Em cirurgia plástica e reconstrutiva, estudos observacionais mostram, que a TEV é uma complicação frequente
na abdominoplastia e reconstrução mamária.42 Nos queimados, quanto maior o tamanho da superfície de área
corporal atingida e o número de intervenções cirúrgicas
necessárias, maior o risco. O internamento em cuidados
intensivos também agrava o risco de TEV.43
A divisão das orientações em doente cirúrgico não ortopédico e cirúrgico ortopédico, enfatiza o alto risco associado à cirurgia ortopédica major. O TEV é a causa mais
comum de readmissão ao hospital após artroplastia da
anca e o risco no doente ortopédico mantem-se elevado
pelo menos nos dois primeiros meses de pós-operatório.9
A anestesia geral comporta um risco 2 a 3 vezes superior
ao do bloqueio do neuro-eixo, relativamente ao TEV. 21 Se
a duração da anestesia superar as duas horas, o risco auRevista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
15
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO E RECOMENDAÇÕES
PARA O DOENTE CIRÚRGICO NÃO ORTOPÉDICO
Uma das dificuldades na implementação das guidelines
é a estratificação adequada dos doentes nas respetivas
classes de risco. Têm sido elaborados alguns métodos de
avaliação de risco (MAR) dependentes de fatores de risco específicos do doente e de risco cirúrgico. As limitações
destes modelos são a complexidade, dificuldade de aplicação ou falta de validação. 25
O ACCP considera dois MAR. O de Rogers, mais difícil de
aplicar e não validado externamente;44 e o de Caprini, validado através de um grande estudo retrospetivo de doentes de cirurgia geral, vascular e de urologia45 e modificado
pelo autor em 2009.46 Este também foi validado em cirurgia plástica e reconstrutiva.47 Nenhum dos dois foi validado especificamente em ginecologia.25 O Quadro 2 mostra
o MAR de TEV modificado de Caprini.
Por motivos práticos, consideraremos o MAR de Caprini,
ao qual é feita correspondência quantitativa com o MAR de
Rogers pelo ACCP.
A estimativa do risco base através dos grupos é a validada no estudo de Bahl et al.48 No Quadro 3 estão relacionados o risco base e o MAR de Caprini para o doente cirúrgico
não ortopédico, bem como as respetivas recomendações
terapêuticas.
Anderson e Spencer descreveram uma relação aditiva,
segundo a qual um paciente com cinco ou mais fatores de
risco tem um risco de TEV próximo de 100 %.49
Doente cirúrgico não ortopédico
Risco de TEV
Muito baixo (<
0,5%)
Fator de risco
Idade 61-74 anos
Malignidade
Previsão de alectuamento (> 72h)
Imobilização por gesso
Cirurgia aberta major
Cirurgia laparoscópica (>45min)
Cirurgia artroscópica
Cateter venoso central
Idade ≥75 anos
História de TEV
História familiar de TEV
Fator V Leiden
Protrombina 20210A
Anticoagulante lúpico
Anticorpos anticardiolipina
Outras trombofilias
Elevação da homocisteína sérica
Trombocitopenia induzida pela heparina
AVC
Artroplastia
Fratura da pelve, anca ou perna
Traumatismo medular agudo (< 1 mês)
0
1-2
Pontos
Moderado
(~3%)
- com risco de
hemorragia
major ou contra-indicação
farmacológica
HBPM ou HNF (Grau
1B)
Profilaxia mecânica
(Grau 2C)
- associado a
malignidade
sem risco de
hemorragia
- com contraindicação /
indisponibilidade de HBPM
ou HNF
3
Profilaxia mecânica
preferível com CPI
Apendicectomia, colecistectomia laparoscópica, prostatectomia
transuretral, herniorragia
inguinal, mastectomia
uni ou bilateral, cirurgia
da coluna para doença
não maligna
Profilaxia mecânica
preferível com CPI
(Grau 2C)
- sem risco de
hemorragia
2
Maior parte da cirurgia
de ambulatório
3–4
Elevado (~6%)
Tipo de cirurgia
Deambulação
precoce
(Grau 1B)
HBPM, HNF (Grau
2B) ou Profilaxia
mecânica preferível
com CPI (Grau 2C)
- sem risco de
hemorragia
1
Recomendação
Baixo (~1,5%)
MAR de TEV de Caprini
Idade 41-60 anos
IMC > 25 Kg.m-2
Gravidez ou puerpério
História de feto morto espontâneo inexplicado ou aborto
recorrente
Contracetivos orais ou terapêutica hormonal de substituição
Veias varicosas
Edema dos membros interiores
Sépsis (< 1 mês )
Doença pulmonar grave, incluindo pneumonia (< 1 mês)
Enfarte agudo do miocárdio
Insuficiência cardíaca congestiva (< 1 mês)
História de doença inflamatória intestinal
Alectuamento de paciente médico
MAR
Caprini
Laparatomia, cirurgia
ginecológica para doença
não maligna
Cirurgia cardíaca, maior
parte da cirurgia torácica
Cirurgia da coluna para
malignidade
Cirurgia bariátrica , cirurgia ginecológica para
malignidade, pneumectomia, craniotomia, TCE,
traumatismo medular
e outros traumatismos
major
HBPM ou HNF +
≥5
Profilaxia mecânica
e HBPM durante 4
semanas
Baixa dose de aspirina (160mg) (Grau
2C) ou fondaparinux
(Grau 2C)
Profilaxia mecânica
(se risco de hemorragia ou consequencia graves da
mesma) preferível
com CPI ou ambas
Recomendações do nono consenso do American College of Chest Physicians
2012. Neste quadro é tido em conta o MAR de estratificação de risco de Caprini.
4
CPI = compressão pneumática intermitente.
HBPM = Heparina de baixo peso molecular.
HNF = Heparina não fraccionada.
Quadro 2 - Modelo de avaliação do risco de TEV modificado
de Caprini
16 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
Quadro 3 – Recomendações para a prevenção de TEV no doente cirúrgico
ortopédico em função do risco base, MAR de Caprini e tipo de cirurgia
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
RISCO DE HEMORRAGIA
Alguns estudos identificaram maior risco de hemorragia
em pacientes submetidos a cirurgia gástrica para malignidade, duodenopancreatectomia, resseção hepática parcial
e cirurgia abdominal complexa.25
Noutros procedimentos, como a craniotomia e a cirurgia
da coluna vertebral e medular é temida a severidade das
complicações hemorrágicas.
Em cirurgia cardíaca, sobretudo não programada, há
maior risco de hemorragia com a associação a antiagregantes ou se mais de cinco enxertos vasculares. 25 A cirurgia torácica alargada também comporta aumento do risco.
O bloqueio do neuro-eixo deve respeitar as recomendações existentes relativamente aos intervalos de administração de anticoagulantes e antiagregantes pré e pós
procedimento. 26,27,29 O hematoma epidural pode causar
invalidez permanente, se não for evitado ou diagnosticado
atempadamente.
As guidelines existentes, incluindo as do ACCP, referem
que a administração pré-operatória de anticoagulante é
uma opção e não uma condição. Situações excecionais,
poderão requerer alternativa de técnica anestésica.
A regra adotada é que o tempo de intervalo entre a suspensão do anticoagulante e a execução do bloqueio seja
duas vezes a semivida de eliminação do fármaco. 26 As
doses terapêuticas de anticoagulante, tomando a enoxaparina como exemplo, exigem 24H de intervalo, quer para
a introdução, quer para a remoção de cateteres ( Classe
IIC, nível B). 26,27 A tromboprofilaxia bidiária também deve
respeitar 24h de intervalo (Classe IIb, nível C). 26 A profilaxia
em dose única diária requer 12h de intervalo (Classe IIa,
nível C). 27 É necessária monitorização neurológica no pós-operatório, até à remoção dos cateteres. 26
A administração de anticoagulante seguinte à punção do
neuro- eixo ou à remoção do cateter deve cumprir pelo menos quatro horas de diferença (Classe IIa, nível C). 26 Tendo
em conta a associação de potenciais complicações pósoperatórias o ACCP recomenda, que o anticoagulante seja
administrado 12 horas após a cirurgia.
Como a maior parte dos anticoagulantes têm eliminação
renal, o anestesiologista deve proceder ao ajuste da dose
em função do clearance de creatinina.
A aprovação de novos anticoagulantes para cirurgia major ortopédica implica adaptações à semivida plasmática
destes fármacos (exemplo: rivaroxabam t½ de 5-9H, dabigatran t½ de 12-17H, fondaparinux t½ de 18H).26
Em relação à antiagregação com aspirina ou anti-inflamatórios não esteroides, em monoterapia, a American Society of Regional Anesthesia (ASRA), não condiciona o bloqueio.50 Já relativamente ao clopidogrel e à ticlopidina, e
tendo em conta as recomendações da ASRA, as Nórdicas51
e a semi-vida dos fármacos, é aconselhável suspender o
primeiro cinco dias antes e a segunda dez dias. 27
Outros fatores condicionantes da profilaxia tromboembóli-
ca pelo risco de hemorragia encontram-se no Quadro 4.
Fatores de risco para hemorragia Major
- Hemorragia ativa
- Hemorragia major prévia
- Discrasia sanguínea
- Falência hepática ou renal
- Trombocitopenia
- HTA não controlada
- Enfarte agudo
- Anticoagulante, antiagregante ou trombolíticos
- Bloqueio do neuro-eixo (recomendações das sociedades
de anestesiologia)
- Cirurgia abdominal complexa ou para malignidade
- Pancreaticoduodenotomia
- Resseção hepática
- Cirurgia cardíaca (AAS, clopidogrel nos últimos 3 dias,
IMC>25kg.m-2, cirurgia não programada, 5 ou mais enxertos, geriatria)
- Cirurgia Torácica (Pneumectomia, resseção alargada)
- Procedimentos cuja hemorragia > severidade das complicações
- Craniotomia
- Cirurgia da coluna
- Trauma Medular
Baseado nos fatores de risco enunciados pelo nono consenso do American College of Chest Physicians 2012
Quadro 4 – Fatores de risco para hemorragia Major a ponderar na terapêutica anticoagulante
RECOMENDAÇÕES PARA A PROFILAXIA DO
TEV NO DOENTE ORTOPÉDICO
Embora não se consiga quantificar de que forma dois
ou mais fatores de risco interagem e contribuem para o
risco global de TEV do paciente, estes estão classificados
em função dos odds ratio (OR) em major (> 10), moderado
(2- 9) e minor (< 2).52
A cirurgia ortopédica da anca e joelho, fratura da bacia e
membros inferiores, cirurgia pélvica e abdominal major e os
traumatismos major, nomeadamente o vertebro-medular,
têm um OR superior a dez. 52
O risco minor inclui idade, obesidade, imobilidade, gravidez, cirurgia laparoscópica e veias varicosas.
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
17
Profilaxia do tromboembolismo venoso no doente cirúrgico
No Quadro 5 estão as recomendações para tromboprofilaxia no doente cirúrgico ortopédico em função dos vários
tipos de cirurgia.
Doente cirúrgico ortopédico
Tipo de cirurgia
Pontos
gião e ao enfermeiro. Articular essa informação com o
clínico de medicina familiar para assegurar, que as recomendações pré-operatórias e a duração pós-operatória da
terapêutica são cumpridas.
6. Criar programas ao longo da cadeia de execução do
processo, idênticos aqueles que os anestesiologistas hoje
praticam, nomeadamente com tempo preciso da administração e dose de fármaco. Cultivar uma política de aprendizagem com o erro.
7. Introduzir sistemas de alerta eletrónicos,53,54,55 se possível ligados aos protocolos de profilaxia.
8. Validar modelos de avaliação de risco para a população interessada, que sejam simples e fáceis de aplicar.
Lesões isoladas distais ao joelho
requerendo imobilização
Não fazer profilaxia farmacológica
(Grau 2C)
Artroscopia do joelho sem história
de TEV
Não fazer profilaxia farmacológica
(Grau 2B)
Cirurgia Major
Sugerida profilaxia terapêutica
35 dias
Artroplastia total da anca e joelho
HBPM, fondaparinux, apixaban,
dabigatran, rivaroxaban, HNF, AVK,
aspirina (Grau 1B) ou CPI (Grau 1C)
no mínimo 10-14 dias
Bibliografia
HBPM, fondaparinux, HNF, AVK,
aspirina (Grau 1B) ou CPI (Grau 1C)
no mínimo 10-14 dias
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Cirurgia para fratura da anca
Recomendações do nono consenso do American College of Chest Physicians
2012.
HBPM = Heparina de baixo peso molecular.
HNF = Heparina não fracionada.
CPI = Compressão pneumática intermitente.
AVK = Antagonistas da vitamina K.
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projetos. Disponível em: www.dgs.pt/Qualidade
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Quadro 5 – Recomendações para a profilaxia do TEV no doente cirúrgico
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ESTRATÉGIAS PARA MELHORAR A PREVENÇÃO DO TEV
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1. Erradicar hiatos relacionados à prescrição, aqui analisados, como sejam: conhecimento da farmacocinética
e da farmacodinâmica dos fármacos; ajuste da dose de
fármaco ao peso e insuficiência renal; cumprimento do
tempo necessário de suspensão do anticoagulante, antes
e depois da cirurgia e do bloqueio do neuro-eixo; profilaxia
do TEV durante o período recomendado; estratificação do
risco e majoração pelo OR, na presença de fatores de risco
isolados. Assegurar que a prevenção mecânica cumpre as
regras terapêuticas relativamente à pressão pretendida e
ao tempo de utilização diária.
2. Informação do paciente. Uma das melhores técnicas
de prevenção, para assegurar o cumprimento da terapêutica e diagnosticar deterioração da condição clínica.
3. Consulta do paciente em relação ao esquema terapêutico que prefere (exemplo: anticoagulantes orais versus
subcutâneos) para garantir adesão. Consulta ainda, sobre
o objetivo em termos de qualidade de vida. 23,28
4. Cultivar uma política de melhoria contínua da qualidade em relação ao TEV nas instituições hospitalares, através da criação de protocolos de prevenção, diagnóstico e
tratamento.53 Avaliação da performance.38,53,54
5. Sensibilizar, através de ações de formação53,55 todos
os profissionais envolvidos, desde o anestesista, ao cirur18 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
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Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
19
Caso Clínico
Abordagem anestésica de doente com angioedema hereditário
proposto para cirurgia electiva
Luís Conceição1, Hélder Martinho2, Marta Azenha3
Palavras-chave:
- Anestesia;
- Angioedema Hereditário;
- Inibidor de C1;
Resumo
O angioedema hereditário é uma entidade rara, com transmissão autossómica dominante,
causada por deficiência no inibidor de C1. Esta condiciona uma ativação descontrolada da
via clássica do complemento e da cascata das cininas, sendo responsável por episódios de
angioedema com possível comprometimento da via aérea.
Os autores descrevem um caso clínico de um doente com 36 anos com angioedema
hereditário tipo I proposto para colecistectomia electiva sob anestesia geral, tendo
sido tomadas algumas medidas preventivas para evitar o angioedema da via aérea,
nomeadamente a administração pré-operatória de 1000 unidades de concentrado de
inibidor de C1. Descrevem sucintamente a fisiopatologia, clínica e implicações anestésicas
na abordagem de doentes com esta patologia.
Anesthesia management for elective surgery in a patient with
hereditary angioedema
Luís Conceição1, Hélder Martinho2, Marta Azenha3
Keywords:
- Anesthesia;
- Hereditary angioedema;
- C1 Inhibitor
Summary
The hereditary angioedema is an uncommon disease with dominant autossomic
transmission, caused by a C1 inhibitor deficiency. This causes an uncontrolled activation
of the classic pathway of the complement and of the cascade of kinins, being implicated
in episodes of angioedema with possible involvement of the superior airways.
The authors describe the anesthetic management of a 36 year old patient diagnosed
with hereditary angioedema type I submitted to a general anesthesia for an elective
cholecystectomy. Some preventive measures like the preoperative administration of 1000
units of C1 inhibitor concentrate were taken to avoid the angioedema of the airways. The
authors briefly expose the pathophysiology, clinical manifestations and the anesthetic
implications in the management of patients with this pathology.
1
Interno Complementar de Anestesiologia dos Hospitais da Universidade
de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra,
2
Assistente Hospitalar Graduado de Anestesiologia dos Hospitais da
Universidade de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
Assistente Hospitalar de Anestesiologia dos Hospitais da Universidade de
Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
3
Serviço de Anestesiologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra,
Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
O angioedema hereditário (AH) é uma patologia rara
(1/50.000 – 1/150.000) de transmissão autossómica dominante causada por uma mutação no gene que codifica a
produção do inibidor da fração C1 do complemento) levando a deficiência quantitativa (AH tipo I) ou qualitativa (AH
20 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
tipo II) do inibidor de C1.1,2 Esta patologia manifesta-se habitualmente durante a segunda década de vida, por episódios de angioedema não pruriginoso, rapidamente progressivo e bem demarcado das estruturas da face e pescoço,
extremidades, genitais e parede intestinal (podem simular
um ventre agudo). As crises podem surgir espontaneamente (a maioria) ou ser precipitadas por traumatismos físicos
e psicológicos, infecções, consumo de anti-inflamatórios
não esteroides (AINEs), Inibidores da Enzima de Conversão
de Angiotensina (IECAs) ou Antagonistas dos Receptores II
da Angiotensina (ARA II). Habitualmente perduram por 2 a
5 dias antes da sua resolução espontânea.1,3,4,5,6 O edema
das estruturas da via aérea constitui, sem dúvida, a sua
apresentação mais grave, com mortalidade em 30 – 40 %
dos casos.1,3,4,5,7 Por isto, pela necessidade frequente de
manipulação da via aérea, estes doentes apresentam um
Abordagem anestésica de doente com angioedema hereditário proposto para cirurgia electiva
risco anestésico consideravelmente acrescido, pelo que o
Anestesiologista ao confrontar-se com um caso destes deverá ter uma ideia da conduta a implementar de modo a
evitar que a condição evolua para uma situação dramática
e de difícil resolução. Os relatos sobre abordagem anestésica de doentes com AH não abundam. Este caso, apesar
de ter decorrido sem intercorrências, pretende servir para
alertar para os perigos e cuidados a implementar.
Caso clínico
Doente do sexo masculino, de 36 anos, ASA II, proposto para
colecistectomia por via laparoscópica. Tinha antecedentes de
litíase vesicular e crises esporádicas de dor abdominal associada a angioedema da face (aproximadamente um episódio
por ano, desde os 20 anos de idade). Aos 26 anos foi submetido a orquidectomia esquerda por seminoma, não se tendo
registado qualquer intercorrência durante o internamento. Há
5 anos, a sua irmã teve um episódio de edema súbito da via
aérea, tendo necessitado de receber suporte ventilatório no
Serviço de Medicina Intensiva. Na sequência da investigação
etiológica deste episódio, foi estabelecido o diagnóstico de
AH Tipo I. O estudo do complemento do doente revelou baixo
nível de C4 (0,02 g/L, N: 0,16-0,38 g/L), baixo nível de inibidor
de C1 (< 0,045 g/L, N: 0,319-0,385 g/L) e actividade funcional do inibidor de C1 normal (45,65 %, N: >41 %). O doente
tem outros familiares afectados por esta patologia, nomeadamente a sua mãe, a tia materna e respetiva filha.
Ao exame objectivo, o doente não apresentava sinais sugestivos de via aérea difícil. Pesava 70 Kg, media 1,70 m e
o restante exame físico era normal. Estava medicado com
danazol 50 mg diários e 2 semanas antes do internamento aumentou-se a dose diária para 100 mg e assegurou-se a sua manutenção para os 3 primeiros dias de pós-operatório.
No dia da cirurgia a medicação pré-anestésica foi diazepam 5 mg oral e antes do transporte para o bloco operatório, administrou-se ao doente 1000 U de concentrado de inibidor de C1 por via endovenosa. Foi submetido a
anestesia geral endovenosa com propofol e remifentanil
em perfusão, curarizado com atracúrio e entubado sob laringoscopia clássica com tubo orotraqueal de calibre 8,5
mm cujo cuff foi insuflado a uma pressão de 20 cm H2O.
A profilaxia de náuseas e vómitos pós-operatórios foi assegurada com ondansetron 4 mg ev e a analgesia com
paracetamol 1g ev e tramadol 150 mg ev. Para além da
monitorização standard, vigiou-se a profundidade anestésica recorrendo ao Bispectral Index System (Active Medical Systems) e a função neuro muscular ao Train-of-four
(TOF Watch). No final da cirurgia, a reversão do bloqueio
neuromuscular foi alcançada com neostigmina 30 µg.kg-1
e atropina 15 µg.kg-1. O despertar foi rápido e após a extubação, com o doente completamente desperto e colaborante, este não apresentava qualquer sinal de dificuldade
respiratória nem disfonia. A cirurgia teve uma duração de
50 minutos e durante os atos anestésico e cirúrgico não
houve qualquer intercorrência a registar. Após a cirurgia, o
doente permaneceu em vigilância na Unidade de Cuidados
Pós-Anestésicos (UCPA) por 4 horas, foi depois transferido
para a Unidade de Cuidados Cirúrgicos Intermédios (UCCI),
tendo tido alta para o domicílio ao fim de 48 horas.
Discussão
Para se entender a doença e os meios de atuação a promover há que haver uma clara compreensão da sua fisiopatologia e isto começa pela noção da função biológica do
inibidor de C1, a primeira fração a ser ativada na via clássica do complemento (Figura 1). Este consiste num sistema funcional de 20 proteínas plasmáticas que interagem
entre si formando uma cascata enzimática, permitindo a
amplificação da resposta humoral que culmina na formação do complexo de ataque à membrana e eliminação do
agente agressor. Esta cascata é controlada apertadamente por inibidores para que uma reacção excessiva não lese
o próprio hospedeiro.
O inibidor de C1 (C1-INH) é uma importante proteína reguladora daquela cascata, uma vez que controla a activação do Complexo de C1 da Via Clássica do Complemento.
Em doentes com déficit deste inibidor há uma activação
descontrolada que cursa com consumo exagerado de C4
e C2. 1,5
Figura 1 – Sistema complemento (adaptado de Robbins & Cotran.
Patologia – Bases Patológicas das Doenças, Elsevier 2005) 8
Mas o Inibidor de C1 tem também papel regulador do sistema calicreína-cinina, que é fundamental para o desenvolvimento das crises. Embora inicialmente se pensasse
que as crises de AH se deviam à produção de fragmentos
de C2 cinina libertados aquando da formação de C4b2a
do Complemento, estudos mais recentes comprovaram
que eles se devem ao efeito da bradicinina produzida pela
ativação descontrolada da cascata das cininas perante o
deficit de Inibidor de C1. Na realidade, a produção desequilibrada da bradicinina é o mecanismo que está na génese das crises de AH pelos seus efeitos vasodilatadores e
aumento marcado da permeabilidade vascular, causando
edema e inflamação (Figura 2).1,9,10
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
21
Abordagem anestésica de doente com angioedema hereditário proposto para cirurgia electiva
Figura 2 – Fisiopatologia do AH (adaptado de Kaplan AP. J Allergy
Clin Immunol 2010) 11
O AH é classificado em 3 tipos. O tipo I é o mais comum
(80 – 85 % dos casos) e caracteriza-se por marcada supressão dos níveis de Inibidor de C1. O tipo II corresponde a
15-20 % dos casos e caracteriza-se por níveis normais de
Inibidor de C1, mas a sua função está diminuída.12 Ambos
os tipos são causados por mutações em 11q11-q23, o gene
que codifica a produção de Inibidor de C1, estando descritas mais de 200 mutações diferentes, e a sua transmissão
é hereditária autossómica dominante.1,4 Recentemente foi
descrita uma terceira apresentação, mais frequente em
mulheres. Esta não está relacionada com deficiência de
Inibidor de C1, mas sim com uma mutação no gene F12,
que codifica o Factor de Hageman (XII), que provavelmente
resulta numa produção exagerada de bradicinina.1,2,4,6 Tem
uma transmissão ligada ao cromossoma X e a sua prevalência ainda é desconhecida. Aproximadamente 20-25 %
dos doentes não apresentam história familiar prévia, pelo
que a doença é devida a mutação de novo.1,13
O diagnóstico de AH baseia-se nos dados obtidos pela
história clínica e em exames laboratoriais (doseamento de
C4 e teste quantitativo e de avaliação funcional do inibidor
de C1). No caso exposto o doente manifestava episódios
sugestivos da enfermidade – crises recorrentes de dores
abdominais associadas a angioedema facial. Além disto
havia antecedentes familiares concretos. Os exames laboratoriais revelaram baixos níveis de C4, alteração presente
em 99 % dos doentes com esta patologia provocada pelo
consumo daquela fracção do complemento por falha na
inibição da cascata. Constatou-se também uma queda dos
valores do inibidor de C1, tendo o teste qualitativo comprovado que a sua função era normal. Tudo isto permite-nos
afirmar que o nosso doente sofria da AH do tipo I.
No tratamento do AH podem considerar-se 3 níveis de
actuação: a profilaxia a longo prazo, profilaxia de curto
prazo para procedimentos de alto risco e o tratamento de
episódios agudos.
A profilaxia a longo prazo está indicada para doentes que
sofrem crises frequentes e graves e quando há ansiedade
significativa com perda de qualidade de vida.1,7 Consiste
na medicação com androgénios atenuados (danazol ou es22 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
tanazolol), que atuam aumentando a síntese hepática de
C2, C4 e de inibidor de C1. Dado os seus efeitos adversos
(hirsutismo, teratogenia, surgimento de adenomas hepáticos), a administração destes fármacos é desaconselhada
em crianças e mulheres em idade fértil e deve ser titulada
à menor dose possível para prevenir crises.1,4,9
A profilaxia de curto prazo é necessária quando vão
ocorrer procedimentos que irão implicar risco de desenvolvimento de uma crise (estomatológicos, endoscopia, cirurgia otorrinolaringológica, entre outros).3 Caso os doentes já
façam profilaxia com androgénios atenuados, a dose diária
deve ser aumentada para o dobro com pelo menos 5 dias
de antecedência até 3 dias após o procedimento. Mas para
além disto é fundamental recorrer à infusão de concentrado de inibidor de C1 (15-20 Unidades.Kg-1 de peso corporal) que deve ser administrado cerca de 1 a 2 horas antes
do início do procedimento. A utilização do concentrado de
inibidor de C1 é segura e na maioria dos casos obtém-se
um excelente resultado. O seu início de acção estabelece-se em aproximadamente 15 minutos e o efeito protetor
perdura por 2 dias.4,9 No entanto, trata-se de uma terapia
dispendiosa e disponível em poucos centros.9
Quanto ao tratamento dos episódios agudos, nas crises graves com atingimento da via aérea, face, pescoço
ou manifestações intestinais, o tratamento de escolha é
a injecção subcutânea de 30 mg de icatibant (que é um
antagonista dos receptores B2 da bradicinina) ou a infusão
endovenosa de concentrado de inibidor de C1.14 Se o episódio agudo ocorrer num centro em que esta terapêutica
não está disponível pode optar-se pela administração de
plasma humano (10 ml Kg-1 peso corporal) que contém inibidor de C1. Contudo, o plasma humano pode exacerbar o
quadro clínico uma vez que também contém cininas e C2
e C4, substracto para a activação da cascata das cininas e
do sistema complemento.1,2
A adrenalina e os corticosteroides não são eficazes, uma
vez que o mediador em causa não é a histamina, mas sim a
bradicinina.1 Quando a obstrução respiratória é grave e não
responde à terapêutica médica, há que proceder à intubação
traqueal. O edema das vias aéreas pode agravar-se durante
as tentativas de entubação, pelo que pode haver necessidade
de recorrer à cricotirotomia ou à traqueostomia.7
Os doentes com AH apresentam risco anestésico acrescido pelo risco de desenvolvimento de edema da via aérea,
pelo que a sua prevenção é essencial. Pensa-se que o trauma e o stress provoquem uma queda dos níveis de inibidor
de C1 abaixo de um nível crítico, provocando ativação da
cascata das cininas. Assim sendo, neste caso clínico em
particular, foram tomados os cuidados apropriados e as
medidas preventivas imperativas que, acreditamos, contribuíram para que houvesse um bom desfecho:
O doente estava medicado com danazol 50 mg diários.
Esta dose foi aumentada para o dobro, 2 semanas antes,
e continuada até 3 dias após o procedimento.
Foi assegurada a disponibilidade de concentrado de inibidor de C1 na farmácia do hospital, o qual foi administra-
Abordagem anestésica de doente com angioedema hereditário proposto para cirurgia electiva
do aproximadamente 1 hora antes da indução anestésica.
É necessário ter em mente que a profilaxia medicamentosa é geralmente protectora, mas pode não o ser em todas as situações, nomeadamente quando a manipulação
das estruturas da via aérea é intensa, como em procedimentos otorrinolaringológicos.15
A medicação pré-anestésica torna-se importante nestes
doentes para diminuir o stress, possível causa de crise.
Sempre que possível, o anestesiologista deverá preferir técnicas de Anestesia Locorregional, em detrimento da
Anestesia Geral, para evitar a manipulação da via aérea,
que é um importante desencadeador de crise. No caso referido havia necessidade de realizar Anestesia Geral com
intubação orotraqueal, tendo esta sido efectuada delicadamente, de forma a minimizar o traumatismo das estruturas da via aérea.
Não há limitações na escolha dos fármacos anestésicos,
nomeadamente em relação aos relaxantes musculares, incluindo succinilcolina. Está desaconselhada a utilização de
IECAs uma vez que a Enzima de Conversão da Angiotensina é um catabolizante da bradicinina. A utilização de AINEs
deve ser evitada pois estes inibem a síntese de prostaglandinas, causando desgranulação cutânea dos mastócitos,
podendo desencadear crise de Angioedema,4,6 razão pela
qual não os empregámos apesar da sua utilidade na cirurgia laparoscópica.
Deve estar disponível material para acesso invasivo da
via aérea (cricotirotomia, traqueostomia).16 No nosso caso,
não dispúnhamos do mesmo dentro da sala operatória,
mas ele está incluído num dos carros de via aérea difícil
do bloco operatório que estaria acessível em breves segundos.
Previamente foi assegurada vaga na UCPA e na UCCI
para uma vigilância adequada no período pós-operatório.
A cirurgia em regime de ambulatório não é recomendada
nos doentes com esta patologia.
Seria totalmente imprudente proceder ao acto cirúrgico
num centro em que não se encontrassem disponíveis os
meios de profilaxia e tratamento aqui expostos.
Concluindo: o angioedema hereditário é uma doença
rara e potencialmente fatal. O Anestesiologista deve ter
uma noção da sua fisiopatologia de modo a alicerçar os diferentes níveis de actuação. Havendo uma adequada planificação dos actos anestésicos e cirúrgicos será de esperar
um resultado excelente.
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Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
23
Caso Clínico
Edema pulmonar de pressão negativa após extubação traqueal
FÁTIMA PINHAL1, LÚCIA REBELO2, VERA MONDÍM1, MANUELA BOTELHO3
Palavras-chave:
- Anestesia;
- Edema pulmonar de pressão
negativa;
- Laringospasmo
Resumo
O edema pulmonar de pressão negativa (EPPN) também descrito na literatura como
edema agudo do pulmão pós-obstrutivo ou pós-extubação traqueal, é uma entidade rara,
com uma incidência de aproximadamente 0.1 % em doentes anestesiados.
Os autores descrevem o caso, ocorrido após extubação traqueal, de um doente submetido
a orquidectomia por via laparoscópica sob anestesia geral balanceada. Relatam a
fisiopatologia, o padrão radiológico e broncoscópico e as medidas terapêuticas instituídas.
Post-tracheal extubation negative pressure pulmonary edema
FÁTIMA PINHAL1, LÚCIA REBELO2, VERA MONDÍM1, MANUELA BOTELHO3
Keywords:
- Anesthesia;
- Pulmonary Edema ;
- Laryngospasm
Summary
Pulmonary edema negative pressure (NPPE) also described in the literature as acute
pulmonary edema or post-obstructing after extubation, corresponds to an unusual event,
with an incidence of approximately 0.1% in anesthetized patients.
The authors describe the case of NPPE occurred after tracheal extubation in a patient
undergoing laparoscopic orchidectomy under general anesthesia. They report the
pathophysiology, radiological and bronchoscopic pattern and therapeutic measures
instituted.
1
Interna do Internato Complementar de Anestesiologia do Centro
Hospitalar de Lisboa Central, EPE
2
Assistente Hospitalar de Anestesiologia do Centro Hospitalar de Lisboa
Central, EPE
Responsável do Pólo Hospital Curry Cabral do Centro Hospitalar de Lisboa
Central, EPE
3
O edema pulmonar de pressão negativa (EPPN) também
descrito na literatura como edema agudo do pulmão pós-obstrutivo ou pós-extubação traqueal, corresponde a um
acontecimento raro, com uma incidência de aproximadamente 0.1 % em doentes anestesiados.¹ Trata-se de uma
entidade clínica atualmente bem descrita que ocorre tipicamente após desobstrução da via aérea superior, obstruída por um factor mecânico ou por dor.
O laringospasmo e a mordedura do tubo orotraqueal são
os fatores desencadeantes mais frequentes. 1-4
Caso Clínico
Doente do sexo masculino, de 19 anos, de raça negra
admitido no Serviço de Urologia do Hospital de Curry Cabral para orquidectomia por via laparoscópica.
Na avaliação anestésica pré-operatória não foram encontrados antecedentes patológicos ou cirúrgicos relevan24 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
tes. Apresentou-se consciente, orientado e colaborante,
com bom estado geral, porte atlético, IMC de 24 Kg.m- ²,
PA 116/52 mmHg, FC 65 bpm, eupneico, SpO2 99 % (FiO2
21 %), exame físico cardiopulmonar normal e sem sinais
preditivos de via aérea difícil.
Dos exames complementares de diagnóstico apuraram-se os seguintes resultados:
Estudo analítico: sem alterações
Amostra
Resultados
Amostra
Resultados
Eritrócitos
5,01 x 1012/L
aPTT
2,6 s
Hemoglobina
15,2 g/dL
Glicose
62 mg/dL
Hematócrito
45,3%
45,3%
38 mg/dL
Leucócitos
3,1.109/L
Creatinina
1,1mg/dL
Plaquetas
153 x 109/L
Na
140 mmol/L
TP
12,9 s/80,4%
K
4,8 mmol/L
INR
1,2
Cl
104 mmol/L
Quadro 1 - Exames analíticos hematológicos, bioquímicos e de coagulação
ECG: ritmo sinusal, 66 bpm, sem desvio axial do eixo
Edema pulmonar de pressão negativa após extubação traqueal
QRS e sem alterações sugestivas de isquémia.
RX do tórax: índice cardio-torácico (ICT) normal,
sem lesões pleuro-parenquimatosas evidentes ou derrame pleural (Figura 1).
Figura 1 - Radiografia do tórax pré-operatória, sem evidência de lesões pleuro-parenquimatosas ou infiltrado intersticial
ferido para a Unidade de Recuperação Pós-Anestésica
(URPA). À chegada a esta, queixou-se de dor abdominal
e revelou um quadro de intensidade progressivamente
maior de agitação psicomotora, dificuldade respiratória e
tosse produtiva com expetoração hemoptoica. Ao exame
objetivo apresentou: PA 158/49 mmHg, FC 111 bpm, SPO2
88 % (FiO2 21 %), polipneia, tiragem intercostal e auscultação pulmonar com aumento do tempo expiratório, roncos e
fervores crepitantes dispersos bilateralmente. Foi instituído tratamento com salbutamol e beclometasona por via
inalatória, 100 mg de hidrocortisona e 1 gr de paracetamol
por via ev e implementadas medidas de suporte como aspiração de secreções brônquicas, suplemento de O2 (FiO2
a 100 %) por máscara facial e posição semi-sentada. Por
persistência do quadro clínico foi administrado 2 mg de
morfina e 4 mg de dexametasona por via ev.
Nesta fase a gasometria revelou acidose respiratória
(Quadro 2) e a telerradiografia do tórax evidenciou um
infiltrado pulmonar intersticial difuso, de predomínio peri-brônquico, bilateralmente e sem apagamento dos seios
costofrénicos (Figura 2).
´
QUADRO 2
Amostra
O doente foi classificado como apto, ASA I e foi estabelecido o seguinte plano anestésico:
1. Medicação pré-anestésica: lorazepam 1mg p.o.,
na véspera e na manhã da intervenção cirúrgica
2. Jejum de 8 horas
3. No bloco operatório:
• Monitorização standard da ASA
• Monitorização do relaxamento neuromuscular
• Dois acessos venosos G18
• Intubação oro-traqueal (tubo traqueal 8 com cuff)
• Ventilação mecânica controlada por volume
• Sonda nasogástrica (SNG)
• Anestesia geral balanceada (AGB)
• Analgesia multimodal endovenosa (ev)
A indução anestésica realizou-se por via endovenosa
com 1,5 mg de midazolam, 0,6 mg de droperidol, 200mg
de propofol, 0,6mg de alfentanil e 35mg de atracúrio. A
anestesia foi mantida com sevoflurano a 2 % e bólus de
0,3 mg de alfentanil. Para analgesia do pós-operatório foi
administrado 30 mg de cetorolac e 100 mg de tramadol
por via ev ainda no período intraoperatório.
A intervenção cirúrgica decorreu sem intercorrências e
teve uma duração de 75 minutos durante os quais o doente manteve estabilidade dos sinais vitais. Foi administrado
um total de 500mL de cristaloides.
Não foi efetuada descurarização porque o doente apresentou uma sequência de quatro estímulos (SQE) com
um rácio T4/T1> 0.9. Imediatamente após a extubação
traqueal foram evidentes sinais de depressão respiratória
pelo que foi efetuado apoio ventilatório com máscara facial e O2 a 100 % e administrado 0,3 mg de flumazenil ev.
Houve melhoria do quadro respiratório e o doente foi trans-
pH
pO2
pCO2
BE(B)
HCO3¯
Resultados
7,26
65,5mmHg
52,5mmHg
-4,4mmol/L
HCO3¯
23,3mmol/L
SpO2
89,8%
Quadro 2 - Gasometria arterial imediatamente após o início do quadro de dificuldade respiratória
Figura 2 - Radiografia do tórax 30 minutos após a instalação do
quadro de insuficiência respiratória evidenciando infiltrado intersticial
difuso bilateral
Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
25
Edema pulmonar de pressão negativa após extubação traqueal
Foi colocado o diagnóstico de edema agudo do pulmão
(EAP), por provável pressão negativa, pelo que foi pedida
a transferência do doente para a Unidade de Cuidados Intensivos (UCI). Nesta, foi submetido a broncofibroscopia
que revelou sinais inflamatórios e ponteado hemorrágico
disperso em toda a árvore brônquica.
Durante as primeiras horas manteve sinais vitais estáveis, em ventilação espontânea com oxigénio suplementar por máscara facial e registou-se melhoria gradual do
quadro clínico. Às 12 horas de pós-operatório estava sem
queixas e evidenciando melhoria clínica - auscultação
pulmonar sem ruídos adventícios, oximetria de 98 % (FiO2
21 %) e gasometria confirmando oxigenação e ventilação
adequadas (Figura 3).
Figura 3 - Radiografia de tórax realizada 14 horas após o diagnóstico
de EPPN, com melhoria do padrão radiológico de edema intersticial
As hemoculturas, os exames direto e cultural do lavado
brônquico e as pesquisas de antigénios Legionella pneumophila e W na urina foram negativos.
O doente foi transferido da UCI para a enfermaria ao fim
de 17 horas e teve alta hospitalar no 2º dia de pós-operatório. Foi orientado para a consulta externa de Urologia
e de Dermatologia para despiste de alergia aos fármacos
administrados no período intraoperatório mas os resultados foram inconclusivos.
Discussão
Descrevemos o caso clínico de um jovem, saudável, submetido a AGB para orquidectomia por via laparoscópica
que, após um quadro de depressão respiratória revertido
com apoio ventilatório e flumazenil, apresentou sinais evidentes de EAP.
No diagnóstico diferencial do EAP há a considerar a causa cardiogénica e a não-cardiogénica - reação anafilática associada a fármacos anestésicos, sobrecarga hídrica,
26 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
pneumonite de aspiração e EPPN.1,2
No presente caso, sendo o doente jovem, ASA I, sem
ingurgitamento jugular, edema periférico, hepatomegalia,
oligúria ou alterações eletrocardiográficas (por exemplo,
arritmias) a etiologia cardiogénica foi descartada.
Tendo em conta o volume de cristaloides infundido durante a intervenção assim como a ausência de edema
tecidular, rash cutâneo, pieira ou sinais de colapso cardiovascular, a possibilidade de se tratar de uma reação
anafilática ou de sobrecarga hídrica também foi excluída.
Por se tratar dum procedimento eletivo, com jejum prévio
de 8 horas, com colocação de SNG pela qual não houve
drenagem de qualquer conteúdo, pela falta de evidência de
regurgitação ou de vómito alimentar e ainda pela ausência
de padrão radiológico típico (infiltrado pulmonar unilateral
e inicialmente localizado) o diagnóstico de pneumonite de
aspiração pareceu pouco consistente.
O facto de o doente ser um indivíduo jovem, do sexo
masculino, saudável e de porte atlético, com maior probabilidade de gerar grandes pressões intratorácicas negativas perante qualquer evento obstrutivo da via aérea,
despertou para a possibilidade de se tratar de um caso de
EPPN. O diagnóstico foi reforçado pela constatação de início súbito no período pós-operatório imediato, após a administração do flumazenil, pela evidência clínica, radiológica e laboratorial, pela rápida evolução favorável (em cerca
de 12 horas) e ainda pelos achados na broncofibroscopia
- sinais inflamatórios e ponteado hemorrágico disperso em
toda a árvore brônquica.
De acordo com a literatura, o principal fator desencadeante do EPPN é o laringospasmo, originado por um
mecanismo álgico ou mecânico.3,4 No doente em causa o
mecanismo álgico parece a causa mais provável tendo em
conta que foram administradas no intraoperatório doses
subterapêuticas de analgésicos.
A compreensão do mecanismo fisiopatológico envolvido
neste processo é importante para uma adequada abordagem diagnóstica e terapêutica. Perante uma glote fechada, o esforço inspiratório acentuado gera uma pressão
subatmosférica de -50 a -100mmHg que é transmitida
ao interstício pulmonar, levando a um aumento do retorno venoso e consequente aumento da pressão hidrostática, transudação capilar pulmonar e alteração da relação
ventilação-perfusão.3,4 Um outro mecanismo implicado
é o aumento da estimulação adrenérgica desencadeado
por fatores como a hipoxemia, hipercapnia e acidose respiratória. Todos estes estavam presentes no doente, eventualmente desde a fase de depressão respiratória que o
doente apresentou.
A hipoxemia isoladamente também contribui para a disrupção da microvasculatura pulmonar, responsável pelas
secreções hemoptoicas.5
A abordagem terapêutica consiste no tratamento da
causa e em medidas de suporte - permeabilização da via
aérea, administração de O2 suplementar por máscara facial a 100 % (fluxo=15l/min), broncodilatadores e, se neces-
Edema pulmonar de pressão negativa após extubação traqueal
sário, ventilação mecânica não-invasiva ou invasiva.1,3,4 A
ventilação não invasiva (CPAP/BIPAP) vem assumindo progressivamente um papel preponderante no tratamento
da insuficiência respiratória aguda no peri-operatório pois
constitui uma alternativa eficaz à ventilação invasiva.
O EPPN, uma complicação de ocorrência principalmente pós-operatória, é tido na literatura como uma entidade
bem definida mas pouco diagnosticada, possivelmente
pela sua evolução, frequentemente transitória e autolimitada.1,2,4
O objetivo deste trabalho consistiu em relatar um caso
de EPPN após extubação traqueal dando relevo à avaliação clínica, analítica e radiológica para um diagnóstico precoce e tornar evidente a importância de uma terapêutica
analgésica eficaz em todo o peri-operatório.
Quando diagnosticado e tratado adequadamente o
EPPN tem um prognóstico favorável com um número reduzido de complicações.
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Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
27
Artigo Histórico
Notas sobre a história da anestesiologia portuguesa: A Consulta da Dor
no Serviço de Anestesiologia do Instituto Português de Oncologia
Francisco Gentil, Centro de Lisboa
José Manuel Caseiro1, Jorge Tavares2
Sumário
O Serviço de Anestesiologia do Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Centro
de Lisboa, foi criado em 1972 sob a direção de Nair Azevedo. No desenvolvimento das
actividades clínicas, terapêuticas e de investigação da consulta de Neurologia e do Serviço
de Anestesiologia, foi criada uma Consulta da Dor no Instituto Português de Oncologia
(IPO) Francisco Gentil, Centro de Lisboa, em 1978. A actividade da consulta ficou sob
a responsabilidade de Vasco Chichorro e a terapêutica da dor, principalmente crónica,
praticada no Serviço de Anestesiologia ficou a cargo do especialista em Anestesiologia
José Luís Portela, no âmbito dos planos de trabalho deste serviço. Esta iniciativa pioneira
foi o ponto de partida para o desenvolvimento em Portugal da abordagem específica
da dor crónica em outros hospitais do país, oncológicos e não oncológicos. Na evolução
do Hospital, a Anestesiologia passou por diferentes enquadramentos institucionais, nos
quais sobressai a inclusão das unidades da abordagem da dor.
Notes on the history of Portuguese anesthesiology: Pain consultation in Anesthesiology Department of Portuguese Oncologic Institute Francisco Gentil, Lisbon
José Manuel Caseiro1, Jorge Tavares2
Summary
The first pain treatment clinic was created at the Portuguese Oncologic Institute in Lisbon
on 1978, July 24th for development of the therapeutic, diagnostic and research activities
of the respective Departments of Anesthesiology and Neurology. José Luis Portela,
an anaesthesiologist consultant, was appointed responsible for pain activities at the
Department of Anesthesiology. This was the first pain treatment facility created in an
oncologic hospital in Portugal, soon followed by many others in other oncologic and nononcologic hospitals.
1
Diretor do Serviço de Anestesiologia, Instituto Português de Oncologia
Francisco Gentil, Centro de Lisboa, Lisboa, Portugal
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Professor Catedrático e Assistente Hospitalar Sénior Unidade de
Anestesiologia e Cuidados Peri-anestésicos,Departamento de Cirurgia,
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e Serviço de Anestesiologia,
Centro Hospitalar S. João, E.P.E., Porto, Portugal
O Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil foi
fundado em 1923. Os primeiros anestesistas que nele trabalharam e tiveram a responsabilidade de organizar a sua
atividade anestésica foram João Lemos Gomes e Francisco Branco.
O Serviço de Anestesiologia foi criado em 1972 sob a direção de Nair de Azevedo. No desenvolvimento espectável
de um serviço de Anestesiologia num hospital oncológico,
as preocupações com a dor quando falha o tratamento
do cancro deu lugar a um interesse individualizado pelo
tratamento da dor, tal como vinha a acontecer por todo o
mundo civilizado.
O Serviço de Anestesiologia em breve começou a alinhar
por estas tendências do tratamento multidisciplinar da dor
crónica, começadas logo a seguir à Segunda Guerra Mun28 Revista SPA | Vol. 22 - nº1 | 2013
dial (1939/45) por John Bonica a que a criação da IASP
(International Association for the Study of Pain) em 1974
deu um decisivo impulso. As técnicas de neuroestimulação
e os bloqueios do neuroeixo ou de nervos periféricos foram
uma das bases da intervenção nesses doentes.
Em conferência na Sociedade de Ciências Médicas de
Lisboa em 28 de Junho de 1978, José Luís Rodrigues Portela, especialista do serviço de Anestesiologia do IPO, comunicou os resultados que obtivera no tratamento da dor,
em 14 meses da atividade. Apresentou 373 tratamentos
em 89 doentes, segundo 4 técnicas distintas – bloqueios
nervosos (40 % dos tratamentos), infiltrações de zonas
“trigger”, soro gelado intratecal e estimulação transcutânea (56 %). 1
Em 48 doentes foram realizados bloqueios neurolíticos
(com sulfato de amónio, fenol e álcool absoluto) sobre situações dolorosas em tumores malignos, tendo os resultados sido de bons em 35 % dos casos e parciais em 40 %
(em contraste com os 53 % e 22 %, respetivamente, no total dos doentes incluídos).
Esta comunicação foi a demonstração pública de que o
Centro de Lisboa do Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, através do Serviço de Anestesiologia, bem como
Notas sobre a História da Anestesiologia Portuguesa: O Serviço de Anestesiologia do IPO
da consulta de Neurologia, desenvolvia atividades clínicas, terapêuticas e de investigação suficientes para justificarem a
criação de uma consulta multidisciplinar de dor, o que veio a
ser determinado pela Ordem de Serviço nº 53/78, Série A, de
24 de Julho, assinada pelo Delegado do Ministério da Educação e Ciência, o Major Raul da Costa Dionísio.
tesiologia, a Unidade de Tratamento da dor, a Unidade
de Cuidados Intensivos (então criada) e a Unidade da Dor
Aguda, criada no ano anterior com a designação de Serviço
Permanente de Apoio à Dor Aguda. José Luis Portela foi
nomeado Diretor do Departamento, Maria do Rosário Ferrão responsável pelo Serviço de Anestesiologia, Ana Girão
coordenadora da Unidade de Cuidados Intensivos e José
Manuel Caseiro coordenador da Unidade de Dor Aguda.
Nair de Azevedo, a primeira diretora do Serviço de Anestesiologia no IPO
de Lisboa, homenageada como um dos pioneiros da Anestesiologia em
Fotografia 1. Conferência em que foram comunicados os primeiros resultados dos primeiros bloqueios nervosos usados em Portugal no tratamento da dor.
Esta Ordem de Serviço considerou ainda que a intervenção específica no domínio da dor se iria desenvolver nas
terapêuticas neurocirúrgica (a realizar por elementos diferenciados em Cirurgia), anestesiológica (a realizar por elementos diferenciados do Serviço de Anestesiologia), neurológica (medicamentosa), psicológica e psiquiátrica.
Nesta linha de orientação, dispôs ainda que a atividade
da consulta da dor ficasse sob a responsabilidade do Especialista em Neurologia, Chefe de Consulta, Vasco Artur
Navarro Andrade Sousa Chichorro e que a equipa indispensável ao seu funcionamento fosse organizada de acordo
com as necessidades efectivamente apuradas e com os
recursos humanos disponíveis. Dispôs ainda que “a terapêutica da dor a praticar no Serviço de Anestesiologia fique
a cargo do Especialista [em Anestesiologia] José Luís Rodrigues Portela, no âmbito dos planos de trabalho daquele
Serviço”. Ficou assim criada e a funcionar a primeira Consulta Multidisciplinar de Dor em Portugal. José Luís Portela
realizara um longo estágio específico no domínio da dor
crónica no Istituto Regina Elena, em Roma, sob a orientação de Guido Morica.
A criação da consulta do IPO de Lisboa despoletou o interesse dos anestesiologistas portugueses pelo assunto.
Realizaram-se logo a seguir reuniões multitudinárias com
equipas docentes que integravam anestesiologistas e investigadores estrangeiros de renome, maioritariamente
europeus, que se dedicavam à dor, de forma especial à dor
crónica. Outras unidades da dor foram assim sendo criadas
por todo o país, não só nos Hospitais Oncológicos, como
também em Hospitais Gerais e de todos os níveis). 2
Nair de Azevedo reformou-se em 1992 e foi substituída na Direção do Serviço de Anestesiologia por José Luis
Portela. Em 1994, foi criado o Departamento de Anestesiologia do IPO, que englobava, além do Serviço de Anes-
Portugal (Hospital S. João, Porto, 1989)
O Departamento foi extinto em 2003 (como todos os
outros do IPO), passando a existir o Serviço de Anestesiologia, com a Unidade de Dor Aguda, dirigido por José Manuel
Caseiro, a Unidade de Tratamento da Dor (que passou a
denominar-se Unidade Autónoma de Clínica da Dor) dirigida por José Luís Portela e a Unidade de Cuidados Intensivos (que passou a denominar-se Unidade Autónoma de
Cuidados Críticos) dirigida por Maria José Bouw.
Atualmente, o Serviço de Anestesiologia é uma Estrutura
Departamental que engloba o Serviço de Anestesiologia,
dirigido por José Manuel Caseiro, a Unidade de Dor Aguda,
coordenada por Isabel Serralheiro e a Unidade de Urgência
Médica, criada em 2006 e coordenada por Luís Medeiros.
A Unidade Autónoma de Clínica da Dor continua a ser independente do Serviço de Anestesiologia e é dirigida por
Matilde Raposo, anestesiologista com a competência em
Medicina da Dor.
Agradecimentos:
A José Luís Portela que facultou a JT, em 7 de Abril
de 2008, os elementos que permitiram a concretização da parte do texto referente à criação da Consulta
Multidisciplinar da Dor.
Bibliografia
1. Portela, J Luís. Bloqueios nervosos no tratamento
da dor. Revista da Sociedade de Ciências Médicas de
Lisboa 1979; Tomo XLIII (Junho / Julho): 385-396.
2. Neves da Costa, António da Cruz. O Meu Percurso na Anestesia. Algumas Memórias. Edição do autor.
Coimbra. 2008.
3. Tavares, Jorge. História da Anestesiologia Portuguesa. Edição da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia. 2ª Edição (em preparação) Lisboa. 2013.
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Normas de Publicação:
A Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia publica manuscritos
considerados de importância para a Anestesiolo­
gia, Cuidados Intensivos,
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inteira responsabilidade dos auto­res, mesmo quando sujeitos a revisão editorial.
Por artigo original entende-se todo aquele que, baseado em material clínico e/
ou experimental, pela sua originalidade, objetivo e qualidade de metodologia,
representa um esforço de contribuição concreto na esfera do conhecimento
cientifico. Quando pressuponha uma anterior investigação ou tratamento dos
dados colhidos, para esclarecimento das conclusões, deve ser referenciado
com o subtítulo “comunicação prévia”.O arti­go de revisão é todo aquele que
resulta de uma síntese crítica de informação contida em publicações existentes, apoiando-se fundamentalmente as afirmações nele referidas em
citações bi­bliográficas recentes (últimos cinco anos). O caso clínico con­siste
na apresentação de uma história clínica, cuja evolução apresenta particularidades dignas de registo.
CONSIDERAÇÕES LEGAIS
Os artigos baseados em investigação clínica no Homem, devem deixar bem
explícito que os ensaios foram conduzidos de acordo com as normas éticas
da declaração de Helsínquia. Se se tratar de investigação animal, os autores
devem estar atentos ao De­creto- lei l29/72, de 6/7/92 e à Portaria I005/92,
de 23/I0/92.
Nos casos clínicos, os autores, devem evitar quaisquer dados que identifiquem o doente, tais como o nome ou iniciais deste, fotografias que permitam a sua identificação (salvo com con­sentimento expresso) ou ainda referências hospitalares.
A inclusão de material já publicado, como ilustrações ou qua­dros, implica a
autorização do seu autor e editor.
Preparação de manuscrito e suporte informático
Devem ser enviadas três cópias de cada, em formato A4, escri­tos em língua
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deve conter o título e uma abreviação deste, não ultrapassando os 50 caracteres e espaços. Nesta página, deve ainda constar o nome e o apelido dos
autores, categoria profissional, local de trabalho, direcção e telefone do autor,
a contactar para troca de correspondência. Na página que se lhe segue deve
constar o resumo e as pala­vras-chave em português, seguindo-se-lhe o título, o resumo e as palavras-chave em inglês. Estas deverão basear-se, sempre
que possível, na terminologia do Index Medicus e não exceder o número de
10 (os editores, reservam-se o direito de revisão destas, quando justificada).
Deverá ser entregue, uma disquete com a cópia do manuscrito, em formato
de documento Word (Windows 97 ou outra versão anterior) ou de texto (.txt)
ambos para PC.
Os autores devem guardar uma cópia do material enviado, para a eventualidade da sua revisão ou extravio.
Os manuscritos dividem-se consoante o tipo:
ARTIGO ORIGINAL
Subdivide-se, regra geral em:
Sumário: Deve conter informação sucinta sobre o objetivo, metodologia, resultados e conclusões e ser elaborado de modo a permitir a compreensão do
trabalho, sem necessidade de re­correr ao texto.
Introdução: não deve ser referenciada com título. Deve ser con­cisa e conter as razões e objetivos do trabalho, podendo incluir referências sucintas e
informação considerada pertinente para o tema tratado e com bibliografia
devidamente referenciada.
Metodologia: devem ser descritos os métodos utilizados, de modo claro e
objetivo, de forma a que a experiência possa ser devidamente interpretada
e reproduzida pelo leitor. Igualmente, no que se refere a análise estatística,
deve ser referido, neste capítulo, o método usado.
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Resultados: a apresentação de resultados deve ser feita de forma clara,
reportando a significância a níveis de probabilida­de e evitando repetições
desnecessárias do texto, quadros e gráficos.
Discussão: devem ser relacionados e interpretados os factos observados, assim como o seu significado em relação a estu­dos já publicados. Os dados
considerados de interesse para as conclusões devem também ser discutidos.
Os artigos originais não devem ultrapassar as quinze páginas.
ARTIGO DE REVISÃO
Para além do título, pode subdividir-se em sub-capítulos e alí­neas, segundo
o critério dos autores. Os artigos de revisão não podem ultrapassar quinze
páginas.
CASO CLÍNICO
Para além do título e resumo, deve conter uma introdução sucinta, sem título,
focando a razão de ser do relato clíni­co, podendo conter referências bibliográficas pertinentes. A esta introdução, segue-se a descrição do caso, sob
o título “Caso Clínico”, em que se relatam os dados relevantes da doença
actual, antecedentes pessoais e familiares, exames auxiliares, terapêutica
e técnicas. Relatando o caso segue-se a Discussão, em que se analisam as
características especiais do caso e se aprecia o seu significado, à luz da bibliografia existente. Os casos clínicos não devem ultrapassar as seis páginas.
QUADROS
Os quadros representam uma relação de dados em linhas hori­zontais. Se
neles figurarem unidades (referentes aos resultados), devem ser colocadas no
topo das colunas (não as repetindo nas linhas horizontais).Devem numerar-se
com algarismos romanos, segundo a ordem de citação no texto, identificados
com legen­das na parte superior e apresentados em páginas separadas.
ILUSTRAÇÕES
Por ilustrações, consideram-se os esquemas, gráficos e foto­grafias. Numeram-se com algarismos árabes, pela ordem de ci­tação no texto. Os esquemas
e gráficos devem ser executados em papel branco e a sua identificação, com
número de citação, autor e titulo do artigo, deve ser feita no reverso, a lápis.
As le­gendas devem ser apresentadas em páginas separadas.
AGRADECIMENTOS
Se existem, devem ser curtos.
BIBLIOGRAFIA
As referências bibliográficas devem ser numeradas pela or­dem em que são
mencionadas no texto e identificadas neste por algarismos árabes, entre
parênteses rectos. Os títulos das revistas ou jornais devem ser abreviados
de acordo com o modelo utilizado no Índex Medicus. As referências de ma­
nuscritos ainda não publicados não devem ser consideradas como fontes
bibliográficas.
Exemplos de referências bibliográficas correctas:
Revista: Jaeger MJ, Scheultetus RR.The effect of Brain circuit on gas exchange.
Can J Anaesth 1897; 34:26-34.
Livro: Greene NM. Key words in anaesthesiology, 3rd ed. New York, Elsevier,
1988.
Capitulo de Livro: Hull CJ. Opioid Infusions for the management of post – operative pain. In: Smith G, Covino BG, eds. Acute pain. Butterworths,1985:155-179.
CARTAS AO EDITOR
Poderão ou não referir-se a material publicado na revista. Será, no entanto,
dada prioridade de publicação às relacionadas com material já editado.
NOTA
Estas normas de publicação representam apenas uma orien­tação para os Autores
que pretendem dar o seu contributo para a edição desta Revista. Para informação
mais detalhada do modo de elaboração de um artigo cientifico, poderão ser consultados diversos textos dedicados a este tema, dos quais de destacam:
-Bailar JC, Mosteller F. Guidelines for statistical reporting in ar­ticles for medical Journals. Annals of Internal Medicine 1988: 266-273
-Baron DN. Units, symbols and abbreviations: a guide for biolo­gical and medical editors and authors. 4th ed. London: Royal Society of Medicine Services, 1988:64
-Dudley H.The presentation of original work in Medicine and Biology. Churchill Livingstone, 1977.
-Huth EH, Kinning K, Lock SP et al. eds. Uniform requirements of manuscripts submmited to Biomedical Journals. Annal of Internal Medicine, 1988; 108: 258-265.
-Smith G. ed. Extended guide to contributors. British Journal of Anaesthesia,1990;
64: 129-136.
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