Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação ISSN: 0104-4036 [email protected] Fundação Cesgranrio Brasil Verhine, Robert Evan; Vinhaes Dantas, Lys Maria; Soares, José Francisco Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, vol. 14, núm. 52, julio-septiembre, 2006, pp. 291 -309 Fundação Cesgranrio Rio de Janeiro, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=399537944002 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro * Robert Evan Verhine Lys Maria Vinhaes Dantas José Francisco Soares me que o antecedeu. Os autores concluem Resumo Nesse artigo, os autores analisam, de maneira comparativa, o Exame Nacional de Avaliação do Desempenho de Estudante – ENADE, e o Exame Nacional de Cursos – ENC, mais conhecido como Provão, a partir de críticas feitas ao segundo e da capaci- que o novo exame não conseguiu, até o momento, resolver vários dos problemas identificados na abordagem anterior, mas que algumas das propostas, se implementadas, constituirão um avanço real para a utilização dos seus resultados. Palavras-chave: Avaliação do ensino su- dade do ENADE de en- perior. Provão. ENADE. dereçá-las. Ao fazê-lo, identificam diferenças e Robert Evan Verhine similaridades entre os PhD em Educação, Universitat dois exames, argumen- Hamburg, UH, Alemanha. tam que ambos têm integridade técnica e apresentam contribuições SINAES. Abstract Professor Adjunto, UFBA [email protected] Lys Maria Vinhaes Dantas para o aprimoramento Doutoranda, UFBA do exame vigente, tais [email protected] como a elaboração de José Francisco Soares uma matriz permanente PhD em Educação, University of Michigan e a pré-testagem dos ins- Professor do Programa de trumentos. Em síntese, as Pós-Graduação em Educação, UFMG análises apontam para [email protected] From the National Course Exam (Provão) to ENADE: a comparative analysis of uma grande similarida- national de dos processos técnicos das duas abordagens, enquanto que as diferenças se apre- exams used in Brazilian sentam mais no plano conceitual, vez que o ENADE se propõe a apresentar um indica- High School dor de diferença de desempenho e, especi- In this article, the authors comparatively almente, perde o caráter high stakes do exa- analyze the National Exam for Evaluating * O presente artigo é baseado em um relatório intitulado “A Avaliação da Educação Superior no Brasil: do Provão ao ENADE”, financiado pelo Banco Mundial sob encomenda do seu representante Alberto Rodriguez. Os autores agradecem a colaboração de Dilvo Ristoff, Diretor de Estatísticas e Avaliação da Educação Superior no INEP, de Hélgio Trindade, Presidente da CONAES, e dos membros das suas respectivas equipes que prestaram informações para esta pesquisa. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 292 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares Student Achievement – ENADE, and the Estudiantes (ENADE) y el Examen Nacional National Course Exam – ENC, better de Carreras (ENC, más conocido como known as the Provão, focusing on Provão), a partir de críticas hechas al criticisms directed at the latter and the segundo y de la capacidad del ENADE de ENADE’s ability to address them. encaminarlas. Al hacerlo, identifican In so doing, they identify similarities and diferencias y similitudes entre los dos differences between the two exams, argue exámenes, argumentan que ambos tienen that both sustain an adequate level of integridad técnica y presentan technical integrity, and present contribuciones para el perfeccionamiento suggestions for improving the present del examen vigente, tales como la exam regarding aspects such as test elaboración de una matriz permanente y el specification and instrument testeo previo de los instrumentos. En pretesting. The analyses reveal that the síntesis, los análisis señalan una gran technical processes adopted by the two similitud entre los procesos técnicos de los approaches are very similar. Their dos abordajes, siendo que las diferencias differences are primarily conceptual in aparecen más en el ámbito conceptual, nature, since dado que el ENADE se propone presentar the ENADE, in contrast to the Provão, un indicador de diferencia de desempeño y, proposes to indicate achievement gain especialmente, pierde el carácter high over time and is not high stakes in stakes del examen que lo antecedió. Los orientation. The authors conclude that the autores concluyen que el nuevo examen no new exam has not, as yet, resolved a consiguió, hasta el momento, resolver number of problems associated with the varios de los problemas identificados en el previous approach, but some of the abordaje anterior, pero que algunas de las current proposals, if implemented, propuestas, si fueran implementadas, constitute a genuine advance with respect constituirían un avance real para la to the utilization of the exam results. utilización de sus resultados. Keywords: High Education Evaluation. Palabras clave: Evaluación de la enseñanza Provão. ENADE. SINAES. superior – Provão – ENADES - SINAES Resumen Introdução Del “Provão” al ENADE: Na metade da década de 90, o governo brasileiro iniciou um processo gradual de im- un análisis comparativo de los exámenes plementação de um sistema de avaliação do ensino superior. O processo teve início em 1995 com a Lei 9.131 (BRASIL, 1995), que nacionales utilizados en la Enseñanza Superior estabeleceu o Exame Nacional de Cursos – ENC, a ser aplicado a todos os estudantes concluintes de campos de conhecimento pré- Brasileña definidos. Leis subseqüentes incluíram no sis- En este artículo, los autores analizan, de un tema o Censo de Educação Superior e a Ava- modo comparativo, el Examen Nacional de liação das Condições de Ensino – ACE, atra- Evaluación del Desempeño de los vés de visitas de comissões externas às institui- Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 293 ções de ensino, mas o ENC, popularmente relatórios e artigos), foram conduzidas en- conhecido como Provão, permaneceu no cen- trevistas com membros da equipe do INEP tro desse sistema. Ainda que inicialmente boi- e da CONAES. É importante enfatizar que cotado em muitos campi, esse exame tornou- todos os dados levantados a respeito da se parte da cultura da educação superior no implementação do ENADE referem-se à Brasil. Apesar do seu crescimento (de 3 áreas aplicação realizada em 2004. Assim, even- de conhecimento testadas em 1995 para 26 tuais mudanças efetuadas para a aplica- em 2003) e da sua larga aceitação pela soci- ção em 2005 não são aqui consideradas. 1 edade em geral, o Provão foi veementemente criticado por muitos membros da comunidade O presente artigo está organizado em acadêmica e especialistas em avaliação. Mu- três seções além dessa Introdução. A pri- danças para esse exame foram amplamente meira seção descreve e contextualiza os dois debatidas durante a campanha presidencial exames – o Provão e o ENADE. A segunda de 2002 e, logo após o novo presidente (Luiz traz a comparação entre eles, a partir de Inácio Lula da Silva) ter assumido o cargo, seis das principais críticas feitas ao Provão sua administração anunciou a formação de e da tentativa do ENADE de endereçá-las. uma comissão cujo trabalho teve como obje- A terceira seção apresenta as considera- tivo sugerir alterações significativas ao sistema ções finais, avaliando a integridade técni- de avaliação vigente. Em agosto de 2003, a ca dos exames e oferecendo contribuições comissão propôs um novo sistema, chamado para a melhoria do modelo vigente. SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, que foi formalmente institu- Os diferentes contextos ído através da Lei 10.861 (BRASIL, 2004), aprovada em abril de 2004. Esse novo sistema in- do Provão e do ENADE cluía uma diferente abordagem para o exame Conforme amplamente documentado na de cursos, denominado ENADE – Exame literatura, o Provão nasce no âmbito de glo- Nacional de Desempenho dos Estudantes. balização e neoliberalismo, em que o ensino superior é caracterizado por massifica- O presente artigo busca descrever, com- ção e diversificação, por um lado, e maior parar e analisar o modelo do ENADE em autonomia institucional, por outro. Neste relação ao exame que se propôs a substi- contexto, o estado, tanto no Brasil como no tuir, através do levantamento das principais exterior, buscando conter despesas públicas críticas feitas ao Provão e da sua resolu- e valorizando o mercado como mecanismo ção, ou não, pelo ENADE. Ao fazê-lo, pro- de alocação de recursos escassos, inicia uma cura identificar as diferenças e similarida- política de “gerenciamento à distância”, des entre o ENADE e o Provão e discute a garantindo qualidade e responsabilidade integridade técnica dos exames. social através de processos de avaliação em lugar dos de intervenção e de controle dire- Para cumprir tais propósitos, além da revisão da documentação existente (leis, 1 2 to. A partir da década de 80, no cenário internacional, um modelo geral de avalia- Nesse artigo optou-se por utilizar a terminologia popular, Provão, em lugar de sua abreviação oficial, ENC, ao se mencionar o Exame Nacional de Cursos. 2 As relações entre globalização, neo-liberalismo e a avaliação do ensino superior são discutidos no contexto internacional por Brennan; Shah (2002), Heywood (2000) e Huisman; Curry (2004) e, no contexto brasileiro, por Dias Sobrinho (2003) e Gouveia e outros (2005). Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 294 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares ção de ensino superior começa a emergir, dos os cursos deveriam ser avaliados atra- caracterizado pela combinação de auto-ava- vés dos resultados do Provão e dos relatóri- liação e avaliação externa realizada por pares os de especialistas, que verificariam in situ (BILLING, 2004). Embora este modelo não as condições de ensino em termos do currí- tenha se manifestado uniformemente, vari- culo, da qualificação docente, das instala- ando de acordo com as características es- ções físicas e da biblioteca. Desde o início, pecíficas dos diversos contextos nacionais, é a responsabilidade pela avaliação de insti- interessante observar que, dentre aproxima- tuições de ensino superior (IES) e de cursos damente 40 países para os quais existem de graduação foi concedida ao INEP. O estudos na literatura disponível, apenas o único componente do sistema que perma- Brasil adotou o uso de um exame nacional neceu fora do domínio do INEP foi relativo de cunho obrigatório. à avaliação da pós-graduação, desde 1976 sob responsabilidade da CAPES. A legislação que criou o Provão determinou que exames escritos fossem aplica- O aspecto high stakes 4 das avaliações dos anualmente, em todo o território nacio- conduzidas pelo INEP, que deveriam servir nal, a estudantes concluintes de cursos de para orientar decisões relativas ao recre- graduação. Embora precedido por outras denciamento institucional e ao reconheci- iniciativas buscando fomentar a avaliação mento e renovação do reconhecimento dos 3 do ensino superior no Brasil, foi a primeira cursos, foi estabelecido oficialmente atra- política desta natureza a ser aplicada de for- vés do Decreto nº 3.860/01 (BRASIL, 2001). ma universal e obrigatória (condicionada à Apesar dessas determinações, tais aspec- liberação do diploma). Desde o início, foi tos nunca foram implementados. Somente planejada uma expansão gradual do nú- em casos extremos as instituições perderam mero de cursos sob avaliação de modo a credenciamento e o processo de recreden- garantir cobertura de todas as áreas. ciamento periódico não chegou a ser posto em prática (SCHWARTZMAN, 2004). A política do Provão foi detalhada através do Decreto nº 2.026/96 (BRASIL, 1996), Fruto da gestão de Fernando Henrique que estabeleceu medidas adicionais para a Cardoso, o Provão foi mantido pelo Parti- avaliação da educação superior, determi- do dos Trabalhadores no seu primeiro ano nando uma análise de indicadores-chave da de governo. Sensível ao modelo dito neoli- performance geral do Sistema Nacional de beral atrelado à avaliação, o desagrado Educação Superior, por estado e por região, no novo governo tornou-se explícito quan- de acordo com a área de conhecimento e o do da elaboração do Relatório Técnico do tipo de instituição de ensino (baseada no Provão 2003 (BRASIL, 2003b), do qual Censo da Educação Superior). O Decreto constam severas críticas a esse exame en- acrescentava a avaliação institucional, co- quanto instrumento para medida de quali- brindo as dimensões Ensino, Pesquisa, e dade. Todavia, vale ressaltar que, ainda Extensão. Além disso, determinava que to- quanto à aplicação em 2003, o INEP in- 3 Para informação sobre os programas de avaliação do ensino superior que antecederam o Provão, ver Brasil (2004) e Gouveia e outros (2005). 4 Termo técnico da área de avaliação, sem tradução consensuada para o português, que significa “com conseqüências significativas para aquele que está sendo avaliado”. O termo low stakes significa o contrário. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 295 troduziu duas novidades na tentativa de vou que as avaliações institucionais deveri- endereçar essas críticas. Primeiro, publicou am fornecer análises abrangentes das di- os resultados dos cursos em ordem alfabé- mensões, estruturas, objetivos, relações, ati- tica, em lugar de ordem crescente de clas- vidades, compromissos e responsabilidade sificação nas escalas (dificultando, portan- sociais, das IES e de seus cursos, nas diver- to, o ranking das IES). Em segundo lugar, sas áreas de conhecimento. A proposta con- inseriu como um dos resultados a média siderou também que os procedimentos, da- absoluta das áreas de conhecimento, an- dos e resultados deveriam ser públicos; que tes relativa, baseada na curva normal. a autonomia e identidade das instituições e cursos deveriam ser respeitadas, preservan- Em paralelo à operacionalização do do-se assim a diversidade que caracteriza o Provão 2003, o Ministério de Educação setor no país; e que todos os membros da designou a CEA para estudar o tema da comunidade do ensino superior deveriam avaliação do ensino superior. 5 Em 27 de agosto de 2003, a Comissão divulgou a participar, bem como outros representantes da sociedade civil. proposta preliminar para uma nova rede de avaliação, com componentes articula- À Medida Provisória 147 se seguiu a Lei dos e integrados, chamada Sistema Naci- 10.861 (BRASIL, 2004), de 14 de abril de onal de Avaliação da Educação Superior, 2004, aprovada por grande maioria na câ- 6 ou mais sucintamente, SINAES. mara federal e no senado. Uma análise dessa lei deixa claro que nem todos os aspectos No final de 2003, o governo Lula apro- da proposta inicial para o SINAES foram acei- vou a Medida Provisória 147, mudando a tos e, especialmente, que várias das caracte- legislação que regia a avaliação da edu- rísticas da abordagem de avaliação do go- cação superior e, em paralelo, o MEC pu- verno anterior foram mantidas, o que parece blicou e divulgou um documento detalhan- indicar que houve uma grande negociação do todos os aspectos da nova abordagem entre dezembro de 2003 até a passagem da de avaliação (BRASIL, 2003a). Ao fazê-lo, lei em abril do ano seguinte. Com ela, pode- se ocupou em identificar várias das defici- se perceber a separação nítida entre avalia- ências do exame utilizado anteriormente e ção institucional e avaliação de curso e, nes- em fundamentar os conceitos, princípios e se momento, a avaliação de desempenho de características da nova proposta. estudante (ENADE) foi instituída como a terceira parte do sistema, com igual peso. Foi Em contraste com o sistema anterior de também instituída a Comissão Nacional de avaliação, a abordagem do SINAES foi pen- Avaliação da Educação Superior – CONA- sada como verdadeiramente sistêmica e com ES, já prevista no delineamento do sistema foco na instituição. O documento acima re- proposto pela CEA, mas não contemplada ferido, de apresentação do SINAES, obser- na Medida Provisória. 5 A Comissão Especial de Avaliação (CEA) foi formalmente instituída pelo Ministro da Educação, em 29 de abril de 2003 e apresentou sua proposta inicial para o sistema de avaliação em 27 de agosto do mesmo ano. Ela foi composta por 22 membros, incluindo 14 professores universitários, 3 estudantes, e 5 representantes do MEC (do INEP, CAPES e SESu). A CEA foi presidida pelo Prof. José Dias Sobrinho, da Universidade de Campinas, um arquiteto-chave do PAIUB, programa de avaliação anterior ao Provão, considerado por muitos como o modelo a adotar, por ter sido participativo, voluntário e centrado na auto-avaliação. 6 Embora alguns autores tenham se referido ao esforço de avaliação pré-SINAES como um sistema, ele nunca foi legalmente rotulado como tal e nunca recebeu um acrônimo referendando esse status. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 296 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares Apesar das mudanças, ficaram assegu- em julho de 2004, da Portaria nº 2.051 rados os principais conceitos norteadores: (BRASIL, 2004). Essa portaria se incumbiu respeito à diferença, à autonomia, à iden- de detalhar as atribuições da CONAES e tidade, além da ênfase na missão pública do INEP (com uma grande mudança nas e nos compromissos e responsabilidades responsabilidades do INEP, que passa a sociais das IES. Também ficou mantido o ser protocolo de compromisso para aqueles como os procedimentos a serem usados que não obtivessem um conceito satisfató- em cada instância a ser avaliada (insti- rio e garantido o caráter regulatório do SI- tuição, curso, e aluno). apenas executor da política), bem NAES, sem excluir os aspectos avaliativoeducativos do sistema. Os componentes do SINAES que tratam da avaliação institucional e da ava- Além disso, enquanto o Provão se pres- liação de cursos não são objetos deste tava a ser um mecanismo de regulação, o estudo e, assim, suas características não 7 ENADE passaria a fornecer não só um in- serão dicador com esse fim, mas principalmente ENADE, seria uma ferramenta de avaliação, atra- vão, vés do diagnóstico de competências e ha- cular bilidades adquiridas ao longo de um ciclo tórico de 3 anos de escolarização superior, cru- tras zado com a visão do aluno sobre sua ins- das entre o Provão e o ENADE: os re- tituição e com seu conhecimento sobre as- sultados individuais dos estudantes são pectos mais gerais, não relacionados a disponíveis conteúdos específicos. há premiação para os alunos com me- aqui mesma tornou-se um obrigatório, escolar de similaridades lh ore s O estabelecimento desses princípios trou- detalhadas. da forma para ser curri- próprios; áre a perfil hisOu- encontra- eles por de ao Pro- no estudante. podem dados o registro cada de se m pe nhos, nhecimento; que componente com apenas Quanto de do c o- aluna- xe um grande impacto no processo de ava- do, do curso e da instituição, e percep- liação: não só os resultados deixaram de se ção prestar a ranking e a competições, como os paralelo novos objetivos do sistema o tornaram mais dos pelos estudantes e pelo coordena- subjetivo, conseqüentemente, dificultando os dor do curso avaliado; além da já men- processos de avaliação, em especial quanto cionada sobre à a prova, são aplicação expansão do levantados teste, gradual do em forneci- sistema. ao estabelecimento de critérios e de padrões a partir dos quais decisões quanto à regulação viriam a ser tomadas. Dentre as diferenças entre o Provão e o ENADE, pode-se relacionar: 1 O ENADE é aplicado para estudantes Muitos dos aspectos de articulação en- ingressantes e concluintes do curso tre as três peças do SINAES (avaliação ins- sob avaliação, desta forma incluindo titucional, de curso e do estudante) só fo- nos resultados uma aproximação da ram melhor regulados com a publicação, noção de “valor agregado”; 7 8 8 Para uma descrição de tais características, ver Brasil (2004). De acordo com o Diretor de Estatísticas e Avaliação da Educação Superior no INEP, o ENADE foi desenhado para medir a trajetória de aprendizagem e não para conferir desempenho (entrevista em 01/05/2005). Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 2 O ENADE avalia cada curso trienal- 297 Análise comparativa mente, em lugar da freqüência anual entre o Provão e o do Provão; 3 O ENADE promete ser referenciado a ENADE a partir das critério, baseando seus testes em pa- críticas feitas ao primeiro drões mínimos pré-determinados; 4 O ENADE se propõe a englobar várias Ao comparar o Provão com o ENADE, dimensões em seu teste, de modo a os autores pretendem responder às per- cobrir a aprendizagem durante o curso (em lugar de apenas medir o desempenho dos alunos ao final do curso) e dar um peso maior às competências profissionais e à formação geral, com ênfase nos temas transversais; 9 5 O ENADE visa reduzir custos através da administração dos testes a uma guntas: que deficiências do Provão o ENADE pretendeu suprir? Essa nova abordagem de fato trabalhou as deficiências? Para sintetizar sua resposta, optaram por relacionar a seguir seis das principais críticas feitas ao Provão e, para cada uma, comentar tecnicamente o movimento do ENADE no sentido de saná-la. amostra representativa; 6 O ENADE divulga seus resultados de for- 1ª Crítica ma discreta, com pouco alarde da mídia; Faltou articulação do Provão com os 7 O ENADE se atribui um uso diagnósti- demais componentes da Avaliação da Edu- co na medida em que se diz capaz de cação Superior que, por sua característica identificar as competências não desen- de criação, não chegou a ser implementa- volvidas pelos alunos ao longo de 3 da através de um sistema, no qual as par- anos de escolarização superior; 10 e, 8 O ENADE parte da premissa de que as tes contribuíssem para uma visão geral da qualidade de cada instituição. instituições e cursos utilizarão seus resultados como ingrediente em um processo avaliativo institucional mais abrangente. Comentário O SINAES, ainda que com algumas alterações advindas da promulgação da Lei O estabelecimento de semelhanças e nº 10.861/04 (BRASIL, 2004), em relação diferenças entre ENADE e Provão é interes- à proposta original, contempla esse pro- sante no sentido de se poder observar até blema. Cada componente do sistema con- que ponto o novo exame endereça as críti- tribui na composição do conceito da ins- cas feitas ao antigo, sem uma quebra de tância maior, ou seja, o ENADE é utilizado integridade técnica. Por essa razão, uma para a composição da nota do curso e essa vez situados os contextos de ambas as abor- é empregada para a composição do con- dagens avaliativas, a seção a seguir rela- ceito da instituição. ciona as principais críticas feitas ao Provão e comenta a capacidade do ENADE de solucioná-las. 9 Três ressalvas são necessárias: em primeiro lugar, os critérios de participação Essa diferença foi enfatizada pelos consultores do ENADE em suas apresentações na 1ª. Conferência da Associação de Avaliação Educacional da Américas (Brasília, 11-13 jul. 2005). 10 Para um aprofundamento sobre o aspecto diagnóstico do ENADE, consultar Limana e Brito (2005). Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 298 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares das notas do ENADE nos conceitos dos Quanto à composição das comissões cursos e instituições ainda não foram di- assessoras de avaliação, uma atenção deve vulgados e, a depender das decisões fei- ser dada ao número pequeno de represen- tas nesse sentido, podem dissipar a im- tantes portância do exame; em segundo lugar, quanto não foram encontradas informações so- membros das comissões por diversas ins- bre como as informações provenientes do tâncias e regiões do país garante algum roteiro de auto-avaliação (ferramenta da tipo de representatividade, mas sete parti- Avaliação processa- cipantes por área de conhecimento é um das e analisadas; e por fim, em terceiro número muito reduzido (embora os autores lugar, também não fica claro como ou- reconheçam que comissões com uma gran- Institucional) serão tros componentes não centrais do sistema, como os conceitos da CAPES e as informações do Censo, vão contribuir para o conceito final da instituição. envolvidos, para o tanto ENADE. para A o Provão indicação de de quantidade de membros tendam a ser improdutivas). Essa deficiência é potencializada pela inexistência de um processo de validação externa, que envolva um número representativo de atores relevantes 2ª Crítica debruçando-se sobre as especificações pro- O Provão foi imposto de fora para den- duzidas por cada comissão. tro, sem a participação das instituições a serem avaliadas. Além disso, a sociedade, Merece reflexão um segundo problema de maneira geral, e a comunidade acadê- relacionado às comissões: na busca por re- mica não eram vistas como parceiros, ape- presentatividade, nem sempre o perfil técnico nas como consumidores de informação. dos participantes é garantido e não há, nos relatórios técnicos do INEP , menção à pre- Comentário sença de especialistas em avaliação em lar- Embora o componente de auto-ava- ga escala fazendo parte desses grupos, ain- liação institucional seja a peça chave do da que “experiência em avaliação” seja um SINAES, item para análise do currículo dos membros das a através da autonomia, são respeitadi- das comissões. Isso pode ter um especial im- educação pacto nas especificações do ENADE por que superior, o ENADE, visto de maneira iso- as comissões são também responsáveis pela lada, determinação do formato da prova. versidade das adota a qual identidade instituições os mesmos da e a procedimentos de representação utilizados pelo Provão. As acadê- A sociedade, de maneira geral, conti- mica são convidadas a participar ao se- instituições nua apenas sendo informada dos resulta- rem representadas nas comissões de ava- dos do exame, agora com menos alarde. liação, ao terem membros fazendo parte No entanto, é importante mencionar os pla- das bancas de elaboração de testes, ao nos do INEP de envolver, ainda mais, a responderem coor- comunidade científica no processo de dis- denador de curso, e ao participarem de cussão sobre a qualidade do Ensino Supe- seminários de rior, através de convites formais para sub- discutir os resultados obtidos e possíveis missão de projetos de pesquisa baseados melhoras para o exame. na utilização dos dados do ENADE. Os e e a comunidade ao questionário eventos com do objetivo Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 299 projetos aprovados em termos de mérito percepção da prova, o que, contrastado com deverão ser financiados pelo INEP. Essa o Provão, implica o acréscimo de uma im- estratégia tem a vantagem de gerar uma portante dimensão analítica a compor os variedade bem maior de pesquisas acadê- relatórios de avaliação. micas e de talvez angariar um apoio junto à academia nunca desfrutado pelo Provão. Quando comparado ao Provão, o Essa proposta de envolvimento, até o mo- ENADE se propõe a ampliar a gama de mento de elaboração desse artigo, ainda aspectos avaliados através do teste. O Pro- não tinha sido concretizada; se implemen- vão manteve o foco no conhecimento pro- tada, constitui um avanço real do ENADE fissional específico, esperado em alunos em relação ao Provão. concluintes. No caso do ENADE, formação geral e componente específico repre- 3ª Crítica O Provão enfatizou competências finais específicas de cada área de conhecimento, deixando de lado aspectos fundamentais relacionados ao processo de ensino-aprendizagem e à formação do alunado, como compromisso profissional, ético e socialmen- sentam duas dimensões distintas da prova e são analisados separadamente. Além disso, vez que o ENADE aplicou o mesmo teste a alunos ingressantes e a concluintes, as questões utilizadas deveriam cobrir os diferentes estágios (ou níveis) de aprendizagem esperados na trajetória do curso. te engajado. Além disso, o Provão se concentrou no desempenho dos alunos, em lugar de atentar para o valor agregado, gerado pelo curso no decorrer do tempo. Considerando o novo perfil do exame, o número de questões de teste, especialmente no componente de formação geral, parece ser muito pequeno para medir o Comentário Assim como o Provão, o ENADE se utiliza de quatro diferentes instrumentos para a coleta de dados: 1) os testes; 2) um questionário para levantar a percepção dos alunos sobre o teste (que faz parte do caderno de prova); 3) um questionário sobre o perfil socioeconômico-educacional do aluno (em caderno próprio, de preenchimento voluntário, e que deve ser entregue no dia da prova); e 4) um questionário a ser respondido pelo coordenador de curso sob avaliação, conhecimento e as competências que estão postas nas especificações. De acordo com o Resumo Técnico do ENADE (BRASIL, 2005, p. 10), os dez itens que compõem a formação geral devem medir: 1) ética profissional, 2) competência profissional, e 3) compromisso profissional com a sociedade em que vive. Ao mesmo tempo, devem avaliar a habilidade do estudante para analisar, sintetizar, criticar, deduzir, construir hipóteses, estabelecer relações, fazer comparações, detectar contradições, decidir, no qual se pedem suas impressões sobre o organizar, trabalhar em equipe, e admi- projeto pedagógico e as condições gerais de nistrar conflitos. Além dessas 12 compe- ensino de seu curso. No caso do ENADE, é tências, as 10 questões do teste devem possível comparar as respostas dos alunos considerar 11 diferentes temas, aí inclu- ingressantes com aquelas apresentadas pe- sos bio e sociodiversidade, políticas pú- los alunos concluintes, não só em relação blicas, aos testes, mas também quanto ao perfil e à blemáticas contemporâneas. redes sociais, Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 cidadania, e pro- 300 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares Contudo, a análise dos itens do compo- aplica o mesmo teste a ingressantes e con- nente de Formação Geral oferecida nos Re- cluintes e, por essa razão, as questões de- latórios de Área do ENADE 2004 traz como veriam também cobrir os vários estágios de habilidades avaliadas: analisar relações, aprendizagem interpretar para inferir, interpretar texto poé- momentos do curso. O Provão, em contra- tico para associar, estabelecer pontos co- partida, foi menos ambicioso, vez que tra- muns, identificar para associar, refletir, de- zia seu foco para o conhecimento profissi- duzir, e efetuar leitura de gráfico. Em que onal específico de final de curso. esperados em diferentes medida essas oito habilidades estão relacionadas à ética, à competência e ao compro- É fundamental registrar uma limitação misso profissionais não fica claro, assim como importante identificada no processo de cons- as análises não aprofundam a relação do trução dos instrumentos, tanto para o Pro- desempenho dos alunos com os temas trans- vão quanto para o ENADE: a ausência de versais propostos. A partir da leitura dos re- pré-testagem dos itens, o que significa que latórios e do Resumo Técnico (BRASIL, 2005), um procedimento técnico fundamental para não é possível identificar uma lógica coe- assegurar a validade e confiabilidade do rente embasando o componente de forma- instrumento não foi realizado. De acordo com ção geral. Registra-se ainda que não houve fontes do INEP, essa ausência tem sido re- relato de estudos que considerassem se o sultante de cronogramas apertados para a número de questões foi realmente adequa- elaboração dos testes, muitas vezes associ- do. Como será visto adiante, a inadequa- ados à quantidade de tempo gasta no pro- ção do componente de formação geral do cesso licitatório para contratação de empre- teste é evidenciada pelo fato de que os alu- sas especializadas em avaliação, que é rea- nos ingressantes e concluintes atingiram, em lizado a cada ano. Ainda que os itens e as média, escores muito próximos. provas, após aplicação, sejam tornados públicos e discutidos pelas comissões, agên- As questões do componente específico cias elaboradoras, e INEP, além de serem foram mais difíceis de avaliar por que dife- submetidos a um crivo estatístico (parte do rem entre as várias áreas. Também elas fo- processo de análise dos dados), essas ações ram, a priori, insuficientes para cobrir todo pos-facto não podem ser consideradas ade- o escopo proposto. O problema foi exacer- quadas para a composição das provas de- bado pelo fato de o número total de ques- vido às características de ambos os exames, 11 tões ser supostamente igual a 30. Como conseqüência, o grau de cobertura do es- especialmente em uma situação onde os itens não são reutilizados. copo proposto de cada teste deve ter variado enormemente pelas áreas. Como pode ser visto acima, muito da promessa do ENADE de aumento do esco- Esses problemas também foram identi- po avaliado não pode ser atendida nas suas ficados em relação ao Provão. Entretanto, provas. Quanto ao valor agregado, o INEP eles são mais graves no caso do ENADE o porque, como já observado, esse exame como indicador de diferença de desempe- 11 rotulou, posterior e adequadamente, A análise de exemplos dos testes usados no ENADE 2004 mostrou que, ao contrário das recomendações oficiais de 30 itens, esse número variou no componente específico. Por exemplo, a prova de agronomia teve 40 itens. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 301 nho. A abordagem utilizada permite dois aprovação das disciplinas nos cursos ava- tipos de comparação. O primeiro é a com- liados, segurando no percurso aqueles alu- paração, em uma mesma aplicação, entre nos com desempenho que venha a “com- as médias obtidas pelo grupo de alunos prometer ” o resultado da instituição no ingressantes com as médias do grupo de ENADE. Se os mesmos estudantes fossem concluintes. O segundo tipo pode ser obti- avaliados no primeiro e no último ano do do através dos resultados dos alunos in- curso, esses problemas estariam sanados, gressantes no primeiro ano do ciclo trienal mas as dificuldades logísticas associadas a de avaliação com aqueles dos alunos con- um estudo em painel em larga escala são cluintes no terceiro ano do mesmo ciclo. tão grandes que, embora inicialmente pensados, essa opção foi julgada não factível No caso do Provão, isso não era exe- pela equipe do INEP. Além disso, outros qüível, já que não havia a medição de en- problemas poderiam advir do uso do pai- trada. No entanto, usando-se como medi- nel, como, por exemplo, o fato que os alu- da de entrada o resultado de vestibulares nos, uma vez identificados, poderiam, des- seria possível produzir, em regiões restritas, de o primeiro ano, sofrer pressões e políti- uma medida do valor agregado como feito cas especiais da instituição, no sentido de por Soares, Ribeiro e Castro (2001). garantir um bom indicador de diferença de desempenho após três anos. Há problemas óbvios com essas duas comparações. Quando se comparam alu- Deve-se registrar ainda um outro pro- nos ingressantes e concluintes em um de- blema com a tentativa de o ENADE calcu- terminado ano, parte-se da premissa de que lar o valor agregado: os alunos ingressan- esses dois grupos são comparáveis, mas é tes são avaliados ao final do seu primeiro preciso lembrar que o perfil de estudantes ano letivo (com de 7% a 22% da carga de um determinado curso ou instituição horária curricular cumprida). Com isso, pode ter sido alterado ao longo do tempo. algum efeito institucional poderá ter sido Além disso, pode haver efeito de seleção introduzido, de modo que a diferença entre ao longo do curso (através da aprovação/ os escores dos alunos ingressantes e con- reprovação dos alunos), que tende a artifi- cluintes não capture todo o processo de cialmente inflacionar o indicador de dife- aprendizagem no contexto do curso. rença de desempenho. No caso da análise dos resultados de diferentes anos, a com- Problemas com comparabilidade são paração de alunos ingressantes com con- agravados por causa de decisão, para o cluintes pode gerar incentivos indesejáveis ENADE 2004, de se calcular um escore fi- e processos de avaliação, internos em cada nal único por curso, baseado na combina- curso, mais voltados para um bom indica- ção dos resultados dos alunos ingressantes dor de diferença de desempenho. Nesse e concluintes. Mais especificamente, neste sentido, como exemplos de possíveis políti- cálculo, o escore padronizado dos alunos cas institucionais se podem citar o encora- ingressantes nos itens do componente espe- jamento de alunos ingressantes a demons- cífico recebeu peso 15, o escore padroniza- trar um desempenho ruim no teste e/ou o do dos alunos concluintes nos itens do com- aumento da seletividade no processo de ponente específico recebeu peso 60, e o es- Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 302 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares core padronizado de todos os alunos – in- trastado com o Provão, por que essa compa- gressantes e concluintes – nos itens do com- ração fornece algumas informações a mais ponente de formação geral recebeu peso 25. sobre a aprendizagem e o perfil do aluno. O Dessa maneira, os alunos concluintes con- Provão, com foco exclusivo no desempenho tribuíram mais no cálculo dos resultados do aluno concluinte, favorecia programas que (aproximadamente 75% de concluintes contra tivessem sido mais seletivos nos seus vestibu- 25% dos ingressantes, considerando-se que lares, ainda que esses programas não neces- a proporção de ingressantes e concluintes sariamente tivessem proporcionado um am- na amostra total era aproximadamente de 2 biente mais favorável à aprendizagem. Infe- para 1). Do mesmo modo, os componentes lizmente, esse avanço potencial do ENADE específicos dos testes tiveram muito mais peso foi prejudicado pela maneira escolhida pelo que a formação geral (novamente, 75% e INEP para o cálculo da nota final do curso. 25%, refletindo o número relativo de ques- Através do uso de uma nota unificada, cal- tões – 30 x 10 – que supostamente compu- culada a partir de pesos dos resultados de seram os dois blocos de itens das provas). ingressantes e concluintes, essa comparação desaparece. Novamente, o efeito de um pro- A razão para a composição de um resulta- cesso de seleção de entrada (vestibular) mais do único, a partir dos resultados dos ingressan- exigente, que enviesava o Provão, se apre- tes e concluintes, está ligada ao fato de que a senta no ENADE. É possível, no entanto, que diferença entre os resultados dos dois grupos foi esse “escore unificado” seja uma proposta muito pequena, especialmente no componente temporária. Fontes do INEP mencionaram de formação geral. Essa pouca diferença é sur- que, em três anos, uma nova abordagem preendente e levanta questionamentos sobre a será adotada, vez que, nesse momento, será qualidade dos itens. Simon Schwartzman (2005) possível comparar, para certos cursos, os es- chamou esse fenômeno de “O enigma do ENA- cores dos estudantes ingressantes em 2004 DE”. Uma das razões para o problema pode com os concluintes em 2007. estar no fato, já mencionado, da utilização de um número pequeno de itens. Uma outra consideração é que os itens do componente de formação geral podem ter sido mais bem respondidos pelos alunos ingressantes por que tenderam à similaridade com as questões comuns 4ª Crítica O Provão não se mantém como indicador de qualidade, pois a não equalização dos seus instrumentos contribui para resultados instáveis e sem comparabilidade, aos vestibulares, dessa maneira favorecendoos. Vale repetir que, sem pré-testagem, não foi Comentário possível que os desenvolvedores de teste pre- Essa crítica, presente no Resumo Técnico dissessem o comportamento dos itens, fazendo do ENC 2003 (BRASIL, 2003b), poderia ser adequações que se mostrassem necessárias de aplicada inteiramente ao ENADE 2004. Não forma a evitar esses problemas. só os instrumentos não foram pensados para garantir comparabilidade, como a fórmula Apesar dos possíveis problemas listados utilizada para a composição dos conceitos acima, não há dúvidas de que o foco na implicou resultados instáveis e, pelo menos nas diferença entre os ingressantes e concluintes áreas de Medicina e Odontologia, inflaciona- é o grande avanço do ENADE, quando con- dos, como será melhor explicado a seguir. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 303 Em relação à atribuição dos conceitos, dias obtidas pelos cursos em uma área, mas há duas maneiras de se transformar os esco- a distribuição dos escores brutos de todos res para obtê-las. Testes referenciados a nor- os estudantes do campo de conhecimento ma classificam os avaliados com base na sob avaliação. Como os escores dos alu- comparação entre eles. Testes referenciados nos variam mais que os escores médios dos a critérios utilizam padrões pré-estabelecidos cursos, a abordagem usada pelo ENADE para o desempenho esperado ou desejado. reduziu substancialmente o tamanho dos Tanto o Provão quanto o ENADE argumen- escores padronizados (z), potencialmente tam que seu objetivo é determinar se os alu- criando distorções para a comparabilida- nos demonstram ter o conhecimento e as de dos resultados. 13 competências que seus cursos requerem e, por essa razão, idealmente deveriam ser refe- Um segundo problema apontado é que, renciados a critério. Em realidade, é muito no caso do ENADE 2004, a nota do curso difícil o estabelecimento de especificações de dependeu dos melhores e piores escores dos teste para o ensino superior, dada a comple- cursos em um dado campo de conhecimen- xidade das competências requeridas pelas to. A nota de cada curso foi determinada carreiras que demandam grau superior. Um através da seguinte fórmula: teste referenciado a critério adequado deveria conter um amplo número de questões, o que inviabilizaria sua aplicação em um perí- Xi — X(1) , X(n) — X(1) notai = odo razoável. Assim, nem o Provão nem o ENADE são referenciados a critério. Esses dois é a Onde nota é a nota do curso, x i exames apenas classificam os cursos avalia- nota do curso i, x dos a partir da comparação de seus resulta- todos os cursos e x dos entre si, no mesmo campo de conheci- todos os cursos. é a nota mínima entre (1) é a maior nota entre (n) mento, sem o estabelecimento de um padrão mínimo satisfatório a ser alcançado. A nota resultante foi então multiplicada por cinco e arredondada, de modo a que pudesse Tanto o ENADE quanto o Provão base- ser situada em uma escala de cinco níveis, va- aram-se nos escores de testes padroniza- riando de 01 a 05. Basear as notas nos escores dos para dar nota e classificar os cursos mais altos e mais baixos cria distorções e insta- 12 . Mas, ao fazê-lo, eles optaram bilidades para as comparações ao longo do por abordagens técnicas diferentes. Por tempo. Uma mudança na posição relativa en- exemplo, no Provão o ponto de referência tre a menor nota e as outras notas das diferen- para o estabelecimento da nota final de tes instituições fará com que o processo produ- cada curso considerou os escores médios za valores substancialmente diferentes. Esse fe- obtidos por todos os cursos de uma deter- nômeno pode já ser observado em Medicina. minada área. No caso do ENADE 2004, o Em 2004, o mais baixo escore de curso foi subs- ponto de referência não considerou as mé- tancialmente inferior aos outros. Se esse curso avaliados 12 Os autores prepararam uma nota técnica explicando os detalhes estatísticos da atribuição de notas no Provão e no ENADE, que está à disposição dos leitores interessados. 13 Para calcular o escore padronizado (z), subtrai-se o escore bruto da média de distribuição dos escores brutos e divide-se o resultado pelo desvio padrão dessa distribuição. Dessa maneira, uma maior variação aumenta o valor do denominador da equação, reduzindo, portanto, o valor do escore z. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 304 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares tivesse sido excluído da análise, as notas dos A instabilidade do indicador da qualida- demais teriam sido drasticamente alteradas para de dos cursos, proveniente tanto do Provão valores inferiores aos divulgados. Assim, o fato quanto do ENADE, é aumentada pela fre- de que, em Medicina, o curso de mais baixo qüência de revisões feitas à matriz de referên- resultado tenha sido muito inferior aos demais cia de cada área de conhecimento. Não só resultou, no geral, que as notas da área tives- os instrumentos em si não são equalizados sem ficado artificialmente altas. Dos 84 cursos de Medicina avaliados pelo Provão em 2003, 64 (76%) melhoraram suas notas no ENADE 2004. O percentual dos cursos de medicina classificados nas duas faixas mais altas da escala subiu de 29% (24 cursos) em 2003 para 87% (73 cursos) em 2004. O percentual de ao longo dos anos, como também aquilo que é avaliado pode mudar a cada revisão. Nesse caso, é o próprio conceito de qualidade que é instável, o que dificulta a tomada de decisões das instituições e formuladores de políticas públicas no sentido de atingir um patamar, no mínimo, satisfatório. cursos nas duas categorias mais inferiores na escala caiu de 21% (18 cursos) em 2003 para 5ª Crítica zero, em 2004. O Provão seria economicamente inviáO caso de Odontologia é igualmente vel com o passar dos anos. emblemático em relação à instabilidade dos resultados. O número de cursos alocados Comentário nas duas categorias superiores da escala Não há um valor preciso ou estimado subiu de 41 (32% do total) para 115 (90%), do custo total do Provão ou do ENADE. Em enquanto que o número de cursos das duas 2002, o custo relativo à contratação de categorias mais baixas caiu de 36 (28%) agências de avaliação representou um va- para apenas um. lor de aproximadamente R$ 100,00 por aluno (por volta de US$ 33,00 dólares). Quan- De maneira inversa ao fenômeno que to ao mesmo custo no ENADE 2005, o INEP aconteceu em Medicina e Odontologia, mas estima que tenha gasto R$ 62,00 por aluno, de acordo com o mesmo raciocínio, as notas equivalentes a US$ 27,00. Não há informa- de um determinado campo de conhecimento ções disponíveis sobre os custos internos do tornar-se-iam artificialmente baixas quando Ministério da Educação com despesas com o maior escore de um dos cursos fosse subs- viagens para seus membros e para aqueles tancialmente superior aos demais. Esse caso que fazem parte das comissões assessoras não foi identificado em nenhum dos sete cam- de avaliação; com seminários e eventos, com pos de conhecimento avaliados em 2003 e impressão de material de divulgação; com em 2004, mas poderá acontecer no futuro, valor/hora do staff envolvido, com os paga- contribuindo assim para a instabilidade dos mentos dos consultores responsáveis pelas 14 resultados ao longo do tempo. 14 análises de dados e com outros serviços. Os autores compararam os resultados de 2003 e 2004 em quatro campos: Medicina, Odontologia, Agronomia e Farmácia. Nesse grupo, os resultados melhoraram marcadamente nos casos de Medicina e Odontologia e moderadamente em Farmácia, permanecendo os mesmos em Agronomia. É difícil ignorar o fato de que a tendência geral de melhoria traz benefícios políticos potenciais e pergunta-se se essa conseqüência influenciou a decisão sobre a abordagem estatística utilizada no ENADE. Pode-se, entretanto, argumentar que não há qualquer evidência de que essas melhorias nos resultados tenham sido exploradas publicamente pelo INEP, pela imprensa ou por grupos político-partidários. Na verdade, o INEP tem sido muito “discreto” na divulgação dos resultados do ENADE. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 305 A magnitude do esforço do ENADE 2004 as referências para controles das IES por par- foi consideravelmente menor que aquela do te do governo e sociedade voltam a ser difu- Provão 2003. No seu último ano de existên- sas. É importante reconhecer que cabe ao cia, o Provão foi aplicado a um total de governo federal a supervisão e regulação da 423.946 alunos matriculados em 5.897 dife- educação superior e essa função não pode rentes cursos, distribuídos entre 26 campos ser desprezada. Talvez, com a implementa- de conhecimento diversos. Entre 2003 e 2004, ção plena do SINAES, essa dimensão venha o número de áreas avaliadas foi reduzido pela a ser contemplada com mais clareza e con- metade e o número de alunos que responde- sistência do que até agora foi observado. ram às provas foi diminuído em dois terços. Esse fato mostra que o procedimento de amos- A leitura sobre seis das principais críti- tragem cumpriu seu propósito de redução de cas feitas ao Provão e dos esforços do ENA- custos, ao diminuir o número de participan- DE no sentido de resolver tais questões per- tes, especialmente frente às crescentes taxas mite perceber que a grande maioria delas de matrícula e considerando-se a inclusão continua sem solução. de alunos ingressantes como respondentes 15 dos testes. Entretanto, exames em larga es- Nas Considerações Finais, a seguir, os cala são caros por natureza e há um cres- autores apresentam algumas contribuições cente surgimento de novos cursos e áreas, para o processo avaliativo. que precisarão ser contemplados no futuro. Orçamentos precisam ser garantidos no sentido de que não haja ruptura nos ciclos de avaliação ou queda da qualidade do exame, com a expansão do sistema. Considerações finais O presente documento se propôs a descrever brevemente e a analisar o modelo do ENADE, contrastando-o ao ENC, conhecido como Provão. Após a inserção das 6ª Crítica duas experiências em seus contextos políti- O Provão concentrou seus esforços nos co-educacionais, uma análise técnica foi aspectos regulatórios da política, dessa realizada a partir de seis das principais crí- maneira confundindo os conceitos de ava- ticas feitas ao Provão e dos esforços do liação e regulação. ENADE para saná-las. Comentário Comparando-se os exames, foi possível O ENADE reforça os aspectos diagnósti- observar que, quanto a questões técnicas, cos do exame, contribuindo para que a di- há muitas similaridades entre eles, especial- mensão Avaliação prevaleça sobre a Regu- mente em relação à elaboração e à admi- lação. Entretanto, o conflito avaliação x re- nistração dos instrumentos. Pode-se dizer que gulação impactou o delineamento do SINA- ambos adotaram procedimentos criteriosos ES, ressaltado, por exemplo, pelas diferenças nas etapas de construção, administração e entre a Medida Provisória 147 (BRASIL, 2003) análise dos dados e que as estratégias de e a Lei nº 10.861 (BRASIL, 2004), e está lon- divulgação respeitaram o sigilo aos resulta- ge de ser resolvido. Nesse novo panorama dos individuais dos estudantes, ao tempo em 15 Os autores analisaram a qualidade técnica do processo de amostragem utilizado pelo ENADE –2004 e concluiram que o mesmo foi desenvolvido com rigor apropriado, considerando as limitações das informações disponíveis sobre os parâmetros relevantes. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 306 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares que garantiram transparência quanto aos da- Analisando-se os dois exames em rela- dos agregados (por área de conhecimento, ção à integridade técnica, pode-se afirmar região e dependência administrativa) e aos que, de maneira geral, o ENADE manteve o passos cumpridos para sua obtenção. padrão estabelecido pelo Provão. O processo de especificação dos testes adotado pelo As principais diferenças estão intrinseca- ENADE 2004 foi similar àquele utilizado mente relacionadas à mudança de foco e anteriormente pelo Provão. Para os dois exa- objetivo do ENADE, quando comparado ao mes, a formulação dos itens de teste, e a sub- Provão. Assim, dentre elas pode-se ressaltar seqüente composição das provas foram rea- a inserção de um componente de Formação lizadas, a partir das especificações definidas Geral, comum para todos os campos de co- por comissões assessoras, por agências es- nhecimento, nas provas dos estudantes; a pecializadas em avaliação, contratadas atra- aplicação dos testes a uma amostra de estu- vés de processo licitatório. O processo inter- dantes ingressantes e de concluintes; pelo no conduzido por cada agência foi descrito, envolvimento dos alunos ingressantes, a ri- com algum detalhamento, nos vários relató- queza da análise de um indicador de dife- rios e manuais disponibilizados pelo INEP , e rença de desempenho (tanto entre ingressan- parece ter sido conduzido de acordo com as tes e concluintes em uma mesma aplicação, melhores práticas internacionais. quanto entre ingressantes em um ano x e concluintes em um ano x+3); a possibilida- O grande impacto do ENADE está re- de da análise cruzada entre esse indicador e lacionado não a mudanças técnicas, mas os diversos fatores que compõem o perfil do principalmente, aos aspectos regulatórios alunado e a percepção que tiveram da pro- do exame, que deixam de existir isolada- va; a ênfase de divulgação nos aspectos ava- mente. Nesse sentido, é imprescindível que liativos do exame, que deixa de ser high stakes. sejam criados e divulgados os critérios de utilização das notas do ENADE na compo- Muitas das promessas do ENADE ainda não foram concretizadas. Dentre elas, algumas são sição dos conceitos da Avaliação de Cursos e da Avaliação de Instituições. pontuais, como a não-divulgação de um relatório técnico-científico do ENADE 2004, e ou- Entendendo que, dos países que reali- tras são estruturais e mais sérias, como: a) as zam avaliação do ensino superior, apenas dificuldades para a análise das diferenças en- o Brasil optou por uma aplicação nacional tre ingressantes e concluintes, criadas a partir de exames escritos, por área de conhecimen- da opção, pelo INEP , de composição de uma to, não fez parte do objetivo dessa investi- nota única, em lugar de uma nota dos in- gação discutir a pertinência dessa escolha. gressantes, e outra dos concluintes; e b) a Os autores partem da premissa que, adota- ausência de um padrão mínimo por área. dos, os exames devem oferecer algumas Um dos aspectos mais preocupantes quanto contribuições para o aprimoramento do ao ENADE 2004, refere-se à atribuição da modelo atual, reconhecendo as dificulda- nota final, que implicou inflação dos cursos des de delineamento de qualquer sistema de com conceitos mais altos na escala (mantida avaliação em larga escala, para efeitos di- com cinco níveis) em algumas áreas de co- agnósticos, de regulação ou quaisquer ou- nhecimento, como Medicina e Odontologia. tros necessários aos governos em geral. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 Do Provão ao ENADE: uma análise comparativa dos exames nacionais utilizados no Ensino Superior Brasileiro 307 Essas contribuições podem ser agrupadas ma, é imprescindível que a elaboração e em três diferentes categorias: 1) aspectos con- administração de testes sejam desenvolvi- ceituais e estruturais; 2) aspectos técnicos; e 3) das no sentido de garantir comparabilida- aspectos administrativos. Em relação aos as- de, em uma mesma área de conhecimen- pectos conceituais e estruturais, uma atenção to, através dos anos. Nos moldes de hoje, maior poderia ser dada à elaboração de ma- essa comparabilidade está comprometida. trizes de referência para cada área de conhecimento, de modo a garantir que sejam durá- Quanto aos aspectos administrativos, as veis por um período mais longo de tempo que sugestões se voltam para os processos lici- o ciclo atual. Para tanto, o processo de espe- tatórios, que poderiam ser feitos para todo cificação das matrizes, por campo de conhe- o ciclo trienal, com amarras contratuais que cimento, precisa ser mais aberto, com uma permitam a quebra do contrato por falta de ampla discussão nacional sobre seus elemen- qualidade no processo e nos produtos/ de tos e com uma etapa de validação posterior. cumprimento das cláusulas. Dessa forma, Também é interessante que haja mais incenti- garante-se tempo para a pré-testagem dos vo às análises de comparação em relação às instrumentos, a homogeneização dos ma- mudanças no perfil socioeconômico-educaci- teriais, e facilita-se a comparabilidade dos onal de alunos ingressantes e concluintes. Su- resultados nos anos x e x+3. gere-se incluir nesses questionários outras dimensões de pesquisa, para que sejam levan- Para finalizar, é imprescindível reconhecer tadas as contribuições da escolarização do que nenhum processo avaliativo, especialmen- ensino superior, não só quanto à aprendiza- te considerando-se aplicação de instrumentos gem dos alunos em relação aos conteúdos em larga escala, é capaz de cobrir todas as específicos e de formação geral, mas também dimensões que compõem o conceito “Quali- em relação a atitudes e motivação, por exem- dade da Educação Superior”. Acresce-se a esse plo. Por fim, defende-se uma maior articula- reconhecimento o fato de que uma avaliação ção SINAES-CAPES, inclusive atentando para integra um ciclo de gestão que se completa com um certo paralelismo, de modo a garantir que as etapas de planejamento e implementação. os dois processos avaliativos sejam comple- Por essas razões, qualquer exame ou sistema mentares e não concorrentes. avaliativo precisa ser constantemente avaliado, para que continue a ser útil àqueles que depen- Em relação a aspectos técnicos, os au- dem de suas informações, de caráter diagnós- tores acreditam que uma grande melhoria tico ou não. Nesse sentido, a mudança ENA- no exame pode ser resultante da pré-testa- DE x Provão é interessante, bem como devem gem dos itens de prova e questionários. Essa ser considerados os diversos aspectos mencio- etapa é crucial para a qualidade do instru- nados acima, com o objetivo de aprimorar o mento e pode favorecer a representação do exame vigente. Uma especial atenção deve ser escopo de competências e habilidades em dada à utilização dos produtos de um exame cada área de conhecimento, na medida em como o Provão e, depois dele, o ENADE. Todo que a perda de itens por desempenho in- esse esforço só se justifica se seus produtos fo- satisfatório é menor. Além disso, é essenci- rem efetivamente utilizados, nos diversos níveis al para a construção de instrumentos que de tomada de decisão: aluno, curso, institui- estes sejam comparáveis. Da mesma for- ção, governo e sociedade. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v.14, n.52, p. 291-310, jul./set. 2006 308 Robert Evan Verhine, Lys Maria Vinhaes Dantas e José Francisco Soares Referências BILLING, D. International comparisons and trends in external quality assurance of higher education: commonality or diversity? Higher Education, Netherlands, UK, v. 47, n. 1, p. 113-137, jan. 2004. BRASIL. Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior. 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