G.1.1 – Antropologia; MEMÓRIAS E DIÁSPORAS DOS ARTESÃOS DE BRINQUEDO DE MIRITI NA AMAZÔNIA. Bruno Rodrigo Carvalho Domingues¹, Fagner Freires de Sousa², Flavio Bezerra Barros³. 1. Estudante de Economia, Bolsista de Iniciação Científica da Universidade Federal do Pará, UFPA, Belém/PA; *[email protected] 2. Mestrando do Programa de Pós- Graduação em Agriculturas Amazônicas, PPGAA/NCADR/UFPA, Belém/PA; 3. Docente dos Programas de Pós- Graduação em Agriculturas Amazônicas e Antropologia da UFPA, Belém/PA; Palavras Chave: Amazônia Brasileira, Etnoecologia, Economia Ecológica. Introdução O miritizeiro (Mauritia flexuosa L. f.) é uma palmeira de relevância inconteste para os ribeirinhos e artesãos da cidade de Abaetetuba, no Pará. Os artesãos de brinquedo de miriti, ao longo do tempo, traduziram o modo de vida e o cotidiano social dos povos ribeirinhos das ilhas do município. Hoje, percebe-se também, que através do miriti, representam o mundo do trabalho, as religiosidades, a natureza, e até elementos da cultura global, de desenhos animados a personagens midiáticos. Os artesãos destes brinquedos possuem forte ligação com o Círio de Nossa Senhora de Nazaré, manifestação profanoreligiosa da capital paraense. O presente estudo tem por objetivos descrever e compreender o papel sociocultural e emancipatório do miriti na vida dos artesãos seja esta emancipação no campo econômico, social ou cultural, bem como descrever as memórias e histórias de vida dos artesãos, e caracterizar as diásporas desses atores. Resultados e Discussão O miriti possui um grande potencial de emancipação para as comunidades tradicionais de Abaetetuba, através dele, estes conseguiram alcançar melhorias no que diz respeito à renda, qualidade de vida e fortalecimento da cultura local. O estudo Figura 1. Seu Jessé, Artesão. constatou que as relações entre o nativo e o miriti são eivadas de relações sociais, onde os valores e conhecimentos acerca da palmeira são transmitidos de geração em geração ou adquiridos por meio da observação e com o desejo de mudança de suas realidades socioeconômicas. Outro fato significante que fora constatado é o de que as relações de produção existente entre os artesãos se dá a partir de cooperação familiar, a divisão do trabalho se dá a partir do núcleo familiar, geralmente os homens fazem o corte (não obstante algumas mulheres ultimamente também façam este trabalho), as mulheres e crianças são responsáveis por lixar e pintar os brinquedos e membros das famílias fazem a venda do artesanato na cidade, ou em Belém. Os artesãos trabalham na produção do brinquedo durante todo o ano, no entanto, nas proximidades do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, quando a demanda por brinquedos sobe, a produção aumenta, muitos paralisam outras atividades para direcionar a atenção para os brinquedos, como demonstra o relato do artesão Raimundo Diabinho. “Eu inda me lembro assim... eles faziam o seguinte, um mês... ai eles trabalhavam sabe? faziam brinquedo, faziam pouco, quando faltava assim um mês, no mês do círio... naquele tempo tinha muito camarão seco, comida fácil assim de fazer, enlatado ai eles compravam farinha, o camarão seco ficava ali em cima... no paneiro, mapará eles preparavam deixava.. eles preparavam tudo pra esse mês, ai eles começavam trabalhar [...]. Ai eles passavam o mês, chegava na hora do almoço ali, pra num tirar a mulher pra... num botar pra cozinhar, nem o cara ir trabalhar, ai eles baixavam o camarão, tiravam uma mão cheia pra cada um, ai fazia o pirão com açaí, aquela coisa, comiam ali trabalhando e ai pra comer na casa, ai quando era de noite corria um cara chata, sabe o que é cara chata? (risos) mingau... ai assim levava. Olha, eu não te digo o mês inteiro, mas uns quinze dia assim pra vim mesmo pra cá, eles faziam direto, direto mesmo.” As relações etnoecológicas e etnoeconômicas entre os atores do miriti se fazem muito presente, eles buscam na natureza até mesmo para a produção de tintas, usando especiarias amazônicas para dar coloração ao brinquedo. Outra preocupação que o estudo teve é em relação aos riscos que o miriti enfrenta por conta do aumento dos monocultivos do açaí, além da pressão de empresas em torno da aquisição de seus frutos. Esta substituição do miriti pela monocultura de açaí ocorre, porque na visão de alguns moradores das ilhas de Abaetetuba, o açaí traz um maior retorno financeiro. Logo, foi necessário discutir estas questões de maneira interdisciplinar, de modo a conservar tanto as palmeiras, como os saberes e fazeres dos artesãos. O estudo é conduzido através de técnicas da história oral, etnografia, atrelados a conhecimentos da ecologia e da economia ecológica a fim de analisar de modo interdisciplinar as problemáticas apresentadas. Conclusões O miritizeiro é mais que uma simples palmeira, é instrumento da promoção do bem-estar e da cultura amazônica, é uma “palmeira santa”, que alimenta, que cuida, que protege e que embeleza o povo abaetetubense. O artesão, que outrora vivia em empregos nas cidades, que ganhavam por comissão, que por muitas vezes não conseguiam o suficiente para alimentar suas famílias, consegue, através do miriti, transformar a sua realidade. As diásporas dos artesãos de brinquedo de miriti na Amazônia dizem respeito às relações socioeconômicas e culturais do artesão para com a palmeira na confecção de sua arte, diz respeito à maneira como o nativo lida com a natureza, a respeita, a transforma sem prejudicá-la, compreende os aspectos etnoeconômicos e ecológicos por trás do corte, do processo de produção do brinquedo, e do quão importante a palmeira é para aqueles que, mais que trabalhar com ela, a tem como sua paixão. 67ª Reunião Anual da SBPC