Tribunal de Contas da União Número do documento: DC-0147-09/01-P Identidade do documento: Decisão 147/2001 - Plenário Ementa: Denúncia. Possíveis irregularidades praticadas pelo TRT 4ª Região. Nomeação, para o quadro de pessoal do órgão, de candidatos aprovados em concurso público realizado por outro Tribunal. Conhecimento. Procedência. Fixação de prazo para anulação dos atos de nomeação. Determinação. Arquivamento. - Investidura em cargos efetivos da mesma denominação, integrantes dos Quadros de Pessoal de diversos Tribunais. Considerações. Grupo/Classe/Colegiado: Grupo II - CLASSE VII - Plenário Processo: 011.144/2000-9 Natureza: Denúncia Entidade: Órgão de Origem: Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região Interessados: Interessado: Identidade preservada (art. 55, § 1º, da Lei nº 8.443/92, c/c o art. 66, § 4º, da Resolução nº 136/2000 ¿ TCU) Dados materiais: ATA 09/2001 DOU de 30/03/2001 INDEXAÇÃO Denúncia; TRT Região 04; Nomeação de Pessoal; Cargo Público; Legislação; Constituição de 1988; Concurso Público; TRF Região 04; Candidato Habilitado; Edital; Oficial de Justiça Avaliador; Categoria Funcional; Aproveitamento de Pessoal; Provimento de Cargo; Anulação; Inspeção; Prazo; Vigência; Aposentadoria; Incorporação; Quadro Permanente; Cargo Efetivo; Princípios da Administração Pública; Moralidade Administrativa; Legalidade; Requisitos; Cancelamento; Sigilo; Arquivamento; Sigiloso (com 01 volume) Sumário: Denúncia contra o TRT ¿ 4ª Região em face da nomeação, para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador do quadro de pessoal do órgão, de candidatos aprovados em concurso público realizado por outro Tribunal (TRF ¿ 4ª Região). Ausência de identidade entre os requisitos de habilitação acadêmica exigidos pelos dois Tribunais para ingresso no cargo. Ilegalidade das nomeações. Determinações. Ciência ao interessado. Relatório: Cuidam os autos de denúncia formulada contra o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região envolvendo a nomeação, para o quadro de pessoal do órgão, de candidatos aprovados em concurso público realizado por outro Tribunal (Tribunal Regional Federal da 4ª Região). De acordo com o denunciante, este submeteu-se ao concurso promovido pelo TRT mediante o edital nº 01/98, publicado no D.J. de 30/01/98, concorrendo a uma das vagas ofertadas para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador (atual Analista Judiciário, especialidade Execução de Mandados). Embora tenha auferido pontuação superior à mínima exigida para sua habilitação, acabou sendo eliminado do certame, haja vista a existência de cláusula editalícia que considerava aprovados apenas os candidatos cuja classificação final fosse igual a "até dez vezes o número de vagas divulgado por ocasião da inscrição, para cada categoria funcional." Ocorre que, após a nomeação de todos os aprovados, surgiram ainda outras três vagas, as quais foram preenchidas pelo TRT mediante o aproveitamento de candidatos aprovados no concurso promovido, à mesma época, pelo TRF, também destinado ao provimento de cargos de Oficial de Justiça-Avaliador (edital TRF nº 001/98, publicado no D.J. de 16/02/98). Para o denunciante, tais nomeações seriam irregulares, tendo em vista a existência de "diversas diferenças entre os requisitos e regras dos dois concursos, o que acarretou o preterimento dos candidatos habilitados no concurso do TRT." Entre tais diferenças, esclarece, estariam as seguintes (quadro apresentado à fl. 07): VIDE QUADRO NO DOCUMENTO ORIGINAL Segundo o interessado (que não pôde fazer o concurso do TRF por não ser possuidor de diploma de bacharel em Direito), "pela diferença nas habilitações exigidas, o número de pessoas aptas na sociedade a fazer o concurso do TRT era, no mínimo, quatro vezes maior do que as aptas a fazer o do TRF, o que tornava a concorrência maior no TRT". Ademais, prossegue, se a mesma regra limitadora do número de aprovados existisse no edital do TRF, nenhum dos três candidatos nomeados pelo TRT teria logrado êxito no certame, pois que o melhor classificado entre eles alcançou a 100ª colocação, ao passo que o edital previa a existência de nove vagas, ou seja, o último candidato aprovado seria o 90º colocado. Após discorrer acerca dos inconvenientes das nomeações promovidas pelo TRT (qualificadas de "nomeações sem concurso") e equipará-las, em seus efeitos, à transferência (forma de provimento declarada inconstitucional pelo STF nos autos da ADIN nº 231-RJ), o denunciante conclui seu longo arrazoado requerendo ao TCU: a) anulação imediata das três nomeações irregulares relacionadas na Portaria TRT 4ª Região nº 2738, de 10/08/99; b) ressarcimento aos cofres do TRT das remunerações pagas indevidamente, a ser promovido pelos agentes responsáveis pelas nomeações irregulares; c) investigação acerca da existência de qualquer espécie de tráfico de influência, dentro do TRT e do TRF da 4ª Região, que pudesse favorecer as nomeações inquinadas, inclusive eventual ligação ou vínculo familiar dos candidatos com autoridades desses órgãos. Submetido o processo à SECEX-RS, a Analista encarregada, após a realização de inspeção no TRT, lavrou a instrução de fls. 66/73, a qual, para melhor compreensão da matéria, permito-me reproduzir parcialmente: "O TRT da 4ª Região realizou concurso público para o preenchimento de duas vagas para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador, conforme Edital nº 01/98, publicado no Diário Oficial da Justiça de 30.01.98 (Expediente TRT 4ª Adm. Nº 11.664/97). No referido concurso, foram aprovados vinte e cinco candidatos, em decorrência do disposto no Edital, Capítulo VI, item 3, abaixo transcrito: 'Para as Categorias Funcionais de Auxiliar Operacional de Serviços Diversos, Atendente Judiciário, Atendente Judiciário-Operador, Auxiliar Judiciário, Auxiliar Judiciário-Programador, Desenhista, Telefonista, Contador, Médico, Oficial de Justiça-Avaliador, Técnico Judiciário e Técnico Judiciário-Analista de Sistemas, o resultado final será avaliado com base no número de pontos obtidos nas provas objetivas. Serão considerados aprovados nestas Categorias Funcionais os candidatos habilitados cuja classificação seja igual a até dez vezes o número de vagas divulgado na ocasião da inscrição, para cada Categoria Funcional. No caso de haver empate em número de pontos na posição correspondente ao limite de dez vezes o número de vagas, serão considerados aprovados todos os candidatos que se encontrarem nessa situação.' (Grifo nosso). Dessa forma, os candidatos que excederam aos vinte e cinco primeiros colocados, mesmo obtendo a pontuação mínima exigida em cada uma das matérias, foram considerados apenas 'habilitados'. Embora o prazo de validade do concurso fosse de dois anos, prorrogável por mais dois, bem antes do término da validade já haviam sido chamados todos os aprovados, e ainda havia vagas a serem preenchidas. Isso se deu em razão dos seguintes motivos: - o grande número de aposentadorias decorrentes das alterações trazidas pela Lei nº 9.527/97, que garantiu a incorporação de vantagens aos proventos dos que já contavam tempo de serviço suficiente para a aposentação. Com isso, muitos servidores optaram pela aposentadoria, ainda que proporcional. No TRT, durante o período compreendido entre março de 1998 a agosto de 1999, foram treze as aposentadorias, só no cargo de Oficial de Justiça-Avaliador, sendo que, dessas, doze foram proporcionais, impossibilitando, inclusive, qualquer previsão ou planejamento por parte da administração. - grande rotatividade dos novos concursados. Dos vinte e cinco aprovados, 10 desistiram da vaga ou deixaram de tomar posse dentro do prazo de trinta dias. Assim, diante da existência de três vagas para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador, e já tendo esgotado a lista de aprovados do respectivo concurso, a administração do TRT optou pelo aproveitamento de candidatos habilitados no concurso realizado pelo TRF, que, no Capítulo XVI, item 6, previa a nomeação dos candidatos habilitados para o Quadro de Pessoal de outro órgão do Poder Judiciário da União, obedecida a respectiva classificação e conveniência administrativa, com observância à identidade das atribuições e remuneração da categoria funcional e ao expresso interesse do candidato. O procedimento está documentado no Expediente TRT 4ª MA nº 30.538/99, no qual consta a concordância do Vice-Presidente no exercício da Presidência, Juiz Sebastião Alves de Messias, no sentido de se realizar o aproveitamento; a troca de correspondência entre os dois Tribunais, os Termos de Aceitação dos candidatos aproveitados e os Termos de Desistência dos candidatos que optaram pelo não-aproveitamento, demonstrando que o aproveitamento respeitou a ordem de classificação obtida pelos candidatos (vide cópia do Edital nº 001/98 do TRF às fls. 74 a 89, bem como da publicação do resultado às fls.90 a 102). Os três candidatos aproveitados foram nomeados pela Portaria nº 2.738, de 10 de agosto de 1999, e tomaram posse no dia seguinte, ainda dentro do prazo de validade do concurso, que expirou no dia 12 daquele mês. Constatou-se, entretanto, que não houve, por parte da administração, nenhuma análise mais criteriosa a respeito do Edital nº 001/98 do TRF, a ponto de perceber as diferenças apontadas pelo denunciante, em especial a que diz respeito à escolaridade e conhecimentos específicos. Essas questões só foram objeto de pronunciamento por parte do TRT no processo de denúncia administrativa, protocolado sob o número 019567/2000. Essa denúncia foi arquivada, por ordem do atual Presidente do TRT, Juiz Darcy Varlos Mahle, após receber pareceres da Secretaria de Recursos Humanos e do Diretor-Geral. Em linhas gerais, a administração do Tribunal assim se posiciona com relação às irregularidades então levantadas, de igual teor às agora trazidas para apreciação do TCU: - O TCU entende que é legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, desde que dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, com as mesmas atribuições, competência, direitos e deveres que os cargos nos quais os candidatos foram aproveitados, observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação definida no respectivo Edital, baixado na forma da Lei. - Sobre a inclusão e manutenção da cláusula prevista no Capítulo VI, item 3 do edital 01/98 do TRT, o TRT manifesta-se no sentido de que o detalhamento do certame está a cargo da entidade interessada, posto que se trata de ato discricionário da administração. As regras previstas no edital, desde que não contrariem a lei, devem ser obedecidas, pois é ele o instrumento adequado para reger o concurso, impondo-se a fiel observância de seu teor. Acrescenta, ainda, que as regras foram objetivamente estabelecidas e a inscrição da candidata implicou aceitação tácita das condições previstas no edital. - Não existiu a alegada preterição do denunciante em razão do aproveitamento dos candidatos, tendo em vista que o interessado não logrou aprovação, habilitando-se em trigésimo nono lugar, o que demonstra, por si só, que ao mesmo não aproveitam as questões discutidas acerca da nomeação dos candidatos provenientes do concurso do TRF. No concurso do TRT, foram aprovados vinte e cinco candidatos, tendo sido observada, rigorosamente, a ordem de classificação para a nomeação dos mesmos. De igual modo se deu o aproveitamento dos candidatos do concurso do TRF, tendo sido observada a ordem de classificação para a indicação dos nomes dos candidatos. - No tocante à habilitação, a administração limita-se a observar que o curso de Ciências Jurídicas e Sociais era comum aos dois concursos. - Afirma terem sido obedecidos os princípios constitucionais que norteiam a Administração Pública, não havendo irregularidades a corrigir. Entende que as alegações expedidas pelos denunciantes não procedem, arquivando a denúncia. Verificou-se, no decorrer da inspeção, que é prática daquele Tribunal o aproveitamento de candidatos concursados de outros Tribunais, já tendo, em ocasiões anteriores, preenchido dessa forma a vaga de um médico, de uma atendente de enfermagem e de uma telefonista. Constatou-se, também, que um dos candidatos aproveitados do concurso do TRF, o Sr. Leo Wirth, era servidor concursado do TRT desde 1993, ocupante do cargo de Agente de Segurança Judiciária, tendo sido desligado em 16.08.1999, em razão da posse no cargo de Oficial de Justiça-Avaliador. Quanto à servidora Karla Mata Schultz, a mesma exonerou-se do cargo no início deste exercício, em razão de não ter conseguido conciliar aspectos de sua vida pessoal com a sua nomeação para o exercício do cargo na cidade de Santa Rosa/RS. Não procede a alegação do denunciante no que tange a Oficiais de Justiça-Avaliadores em desvio de função, lotados em Gabinetes de Juízes. Conforme levantamento de lotação, realizado durante os trabalhos 'in loco', ficou evidenciado que os servidores nessa situação ocupam Função Comissionada de Assessor de Juiz, função essa que pode ser exercida, inclusive, por servidor extra-quadro, estando afastada a ocorrência de qualquer irregularidade. Registre-se, por fim, que o Órgão Especial do TRT, em decisão de 25.04.00, não prorrogou a validade do referido certame, que expirou em 28.05.00, autorizando, na oportunidade, a abertura de novo concurso público, inclusive para provimento de cargos de Analista Judiciário ¿ Executante de Mandados (Oficial de Justiça-Avaliador). DAS CONCLUSÕES O aproveitamento de candidatos aprovados em concurso público para o preenchimento de cargos em órgão diverso daquele que realizou o concurso, embora não tenha previsão legal, é prática aceita por este Tribunal, conforme entendimento firmado nas Decisões nº 633/94, 627/97 e 212/98, todas de Plenário, desde que obedecidos determinados requisitos. Esse aproveitamento não se confunde com o instituto da transferência, razão pela qual se afasta de plano toda a argumentação do denunciante no sentido de equiparar os dois procedimentos. Ao responder consulta formulada por parlamentar acerca da legalidade de tal prática, o TCU assim decidiu: '... é legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, desde que dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, que tenha as iguais denominação e descrição e que envolva as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que se exijam idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional e sejam observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação prevista no edital, que deverá antever a possibilidade desse aproveitamento...' (Decisão nº 212/98, Plenário, TC 000.262/98-6, Ata 15, Sessão de 29.04.98). Ficou facilmente comprovado, durante a inspeção, o cumprimento de alguns dos requisitos acima citados, quais sejam: - a previsão, no Edital do concurso do TRF, da possibilidade de aproveitamento, por parte de outros Órgãos do Poder Judiciário da União, dos candidatos habilitados no referido concurso (Capítulo XVI, item 6); - a obediência da ordem de classificação, uma vez que foram nomeados o centésimo, o centésimo segundo e o centésimo sexto candidatos, depois da desistência do centésimo primeiro, centésimo terceiro e centésimo quinto e da nomeação do centésimo quarto pelo próprio TRF, em razão de sua classificação em terceiro lugar em Lista por Circunscrição Judiciária (Novo Hamburgo), conforme estabelecido no Capítulo II, item 2, do Edital 001/98-TRF. Ademais, o aproveitamento se deu dentro do mesmo Poder. Cabe então indagar se o cargo para o qual os candidatos foram aprovados era idêntico ao cargo no qual foram aproveitados, tinha igual denominação e descrição e envolvia as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que fossem exigidos idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional. Os dois editais contemplavam, resumidamente, as atribuições próprias de cada cargo, conforme abaixo transcrito: VIDE QUADRO NO DOCUMENTO ORIGINAL Analisando as normas específicas dos dois tribunais, relativas à descrição das atribuições do cargo em questão, verifica-se que as tarefas a serem executadas são comuns, também constando, nas atividades típicas do Oficial de Justiça-Avaliador do TRF, a realização de citações, intimações e notificações, a penhora de bens mediante apreensão, remoção e depósito, a avaliação de bens e lavratura do respectivo laudo, a realização de reintegração, desocupação, emissão ou manutenção de posse, o seqüestro de bens, a realização de diligências e a lavratura de certidões. Contudo, é na habilitação acadêmica exigida para a ocupação dos cargos que se estabelece a diferença entre eles. No TRF, tanto por força do Manual aprovado pelo Conselho de Justiça Federal, em 05.12.94, quanto pela Resolução nº 212, de 27.09.99, desse mesmo Conselho de Justiça, a formação especializada exigida é única, restringindo a ocupação do cargo a bacharéis em Direito. No TRT, o curso de Direito está entre as habilitações elencadas, uma vez que a habilitação requerida nesse Tribunal para o exercício do cargo de Oficial de Justiça-Avaliador é multidisciplinar, possibilitando o acesso de bacharéis em Administração de Empresas, Ciências Econômicas, Ciências Contábeis, Ciências Jurídicas e Sociais e Ciências Atuariais. O fato de a habilitação em Ciências Jurídicas e Sociais ser comum aos dois concursos não basta, S.M.J., para atender ao requisito de igual habilitação acadêmica, imposta pelo TCU como uma das condições de validação do aproveitamento de candidatos concursados. Tal exigência não está voltada apenas para o aspecto técnico inerente às atribuições do cargo, busca também, certamente, propiciar oportunidade a todos os interessados que por lei estão aptos à investidura em determinado cargo. No caso em exame, o denunciante foi impedido de participar do concurso do TRF, por falta da habilitação acadêmica nele exigida. Contudo, participantes desse mesmo concurso passaram a ocupar cargos no TRT para os quais ele se encontrava perfeitamente habilitado. Releva notar que os participantes do concurso do TRT, independentemente de sua formação acadêmica, deveriam demonstrar conhecimento específico sobre o Direito e o Processo do Trabalho, visto que estavam sendo recrutados para trabalhar na Justiça especializada nessa área. Esses conhecimentos específicos não foram requeridos nem foram avaliados no TRF, em face da sua própria natureza. Quanto à existência e manutenção da cláusula editalícia que limitava o número de aprovados, entende-se que: - o detalhamento das regras que regem o concurso é de competência da administração e caracteriza-se como atividade discricionária, permitindo, dentro dos limites legais, que o administrador escolha o que entende mais conveniente e oportuno. Entretanto, os atos e procedimentos administrativos devem ter uma motivação que assegure a sua racionalidade, de modo a não ensejar exigências inúteis ou cláusulas desnecessárias. Dessa forma, se a cláusula que limitava o número de aprovados tivesse real importância, se a distinção entre 'aprovados e habilitados' fosse substancial, não se teria dado o aproveitamento dos candidatos do TRF, pois esses não preencheriam o perfil requerido pelo TRT; - a manutenção da cláusula pela administração foi medida acertada, posto que, depois de divulgados os resultados, não poderia ela alterar as regras de aprovação sem invalidar todo o certame realizado. Quanto à possível preterição alegada pelo denunciante, entende-se que não procede, visto que os cargos vagos ou que vagaram no decorrer da validade do concurso não poderiam ser por ele preenchidos, em face da sua não-aprovação. O fato de ter sido aproveitada uma candidata do TRF que, no concurso específico do TRT, ficou em pior classificação do que o denunciante, embora exija uma avaliação, por parte da administração, dos atos praticados no exercício de sua competência discricionária, não demonstra a preterição alegada, posto que não mais havia candidatos provenientes do concurso do TRT que pudessem ser aproveitados. Sobre a possível interferência de juízes e servidores de ambos os Tribunais, na tentativa de favorecer a nomeação de algum candidato em particular, ou a existência de algum vínculo de parentesco que tivesse motivado a decisão da administração em aproveitar os concursados do TRF, nada foi comprovado. Pelo contrário, a primeira candidata aproveitada já se exonerou, em razão de ter sido designada para a cidade de Santa Rosa. O segundo candidato, que no entender do denunciante poderia ter realizado 'alguma gestão' para que se efetivasse o aproveitamento, também seria nomeado, caso as medidas defendidas pelo denunciante (revogação da cláusula que limitava o número de aprovados) fossem adotadas pela administração, uma vez que se havia classificado em vigésimo sétimo lugar no concurso do TRT. Quanto ao terceiro candidato, só o fato de que para seu aproveitamento foi necessária a desistência de outros três afasta qualquer suspeita. Por fim, entende-se que não cabe a anulação dos atos de nomeação dos servidores concursados pelo TRF, conforme requer o denunciante, em face do princípio da estabilidade das relações jurídicas e da presunção de boa-fé que recai sobre eles, uma vez que não concorreram para a consecução dos fatos, tendo tão-somente realizado concurso público válido e submetido-se às regras do edital ao qual se achavam vinculados. IV ¿ PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO Pelo exposto, propõe-se a remessa do presente processo ao Ministro-Relator Guilherme Palmeira, sugerindo, com fundamento no art. 194, inciso II, combinado com o art. 212, § 3º, ambos do Regimento Interno, que: I - conheça da denúncia, por atender os requisitos de admissibilidade previstos no art. 213 do Regimento Interno, para, no mérito, considerá-la parcialmente procedente: II - determine ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região que: a) ao efetuar o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, certifique-se do atendimento de todos os requisitos estabelecidos pelo Tribunal de Contas da União para que o procedimento seja considerado legal, de maneira que só ocorra 'dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, que tenha as iguais denominação e descrição e que envolva as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que se exijam idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional e sejam observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação prevista no edital, que deverá antever a possibilidade desse aproveitamento', conforme Decisão nº 212/98 ¿ Plenário, publicada no DOU de 11.05.98, a qual possui caráter normativo por força do disposto no § 2º do art. 1º da Lei nº 8.443/92; b) ao elaborar seus editais de concurso público, caso entenda oportuno estabelecer previamente o número de aprovados, o faça com base em critérios que levem em conta a rotatividade dos servidores, as possíveis aposentadorias no período de validade do certame e o índice de desistência dos candidatos aprovados nos últimos concursos, de modo a aproveitar o maior número possível de candidatos habilitados em seu próprio concurso; III - encaminhe ao interessado cópia da Decisão que vier a ser proferida, bem como do Relatório e Voto que a fundamentarem; IV - determine a juntada deste processo às contas anuais do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região." O Diretor da 1ª Divisão Técnica e o Titular da Secretaria puseram-se de acordo com o encaminhamento oferecido pela instrução. Ouvido, por minha iniciativa, o Ministério Público, este, em percuciente parecer de autoria do Subprocurador-Geral Ubaldo Alves Caldas, assim se manifestou (fls. 75/77): "....................................................................... .......................... Como já ressaltado pela Unidade Técnica, o E. Tribunal de Contas da União ao responder consulta, mediante r. Decisão n° 212/98 ¿ TCU ¿ Plenário, proferiu o entendimento no sentido de ser legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, in verbis: '... é legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, desde que dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, que tenha as iguais denominação e descrição e que envolva as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que se exijam idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional e sejam observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação prevista no edital, que deverá antever a possibilidade desse aproveitamento .....' (grifamos). Ao analisarmos os editais dos dois concursos, observamos que o requisito de idêntica habilitação acadêmica mencionado na Decisão não foi preenchido, uma vez que a habilitação acadêmica exigida para o concurso do TRF se restringia às Ciências Jurídicas e Sociais, enquanto o concurso do TRT abarcava bem mais cursos. Desta forma, a concorrência dos dois concursos era bem diferente, quebrando assim a necessária isonomia na participação. Ademais, o concurso do TRT tinha um conteúdo programático mais extenso que o do TRF, presumindo-se diferença na participação. Desta forma, conquanto não tenha havido o preterimento do denunciante, vez que estava submetido às regras do edital do concurso do TRT, consequentemente, a sua aprovação estava limitada à uma classificação a dez vezes o número de vagas disponíveis, as nomeações de candidatos para o cargo de oficial avaliador no TRT decorrentes do aproveitamento de candidatos provenientes do concurso realizado pelo TRF são irregulares, pois não cumpriram todos os requisitos exigidos para o aproveitamento. Quanto à estabilidade das relações jurídicas trazida como justificativa pela Unidade Técnica para a manutenção da nomeação dos servidores, cabe-nos trazer parecer já exarado pela representante deste Ministério Público, Drª. Cristina Machado da Costa e Silva, nos autos do TC n° 010.391/1997-5, o qual transcreveremos parcialmente: '9. Os princípios da segurança jurídica e da legalidade, ínsitos ao Estado democrático de direito, têm, em nosso ordenamento jurídico, status constitucional, não havendo que se falar em prevalência de um sobre o outro. Em verdade, estes dois princípios se complementam, de modo que não há como se conceber o da segurança jurídica dissociado do da legalidade. 10. O princípio da legalidade, lato sensu, repousa na subordinação de todos, cidadãos e Estado, aos comandos da Lei. Assim é que, em um Estado de Direito, a Lei é o principal instrumento de que dispõem as pessoas sujeitas ao império estatal para evitar a arbitrariedade e a injustiça. 11. A segurança jurídica, por sua vez, pode ser entendida como a certeza de que essa mesma Lei, que deve, tanto quanto possível, ser clara e estável, será efetivamente aplicada dentro do seu limite temporal de vigência, permitindo assim aos cidadãos prever as conseqüências jurídicas dos atos que pretendam praticar. 12. Calha trazer a lume o entendimento, sobre o assunto, do renomado constitucionalista José Afonso da Silva, verbis: 'A temática deste número liga-se à sucessão de leis no tempo e à necessidade de assegurar o valor da segurança jurídica, especialmente no que tange à estabilidade dos direitos subjetivos. A segurança jurídica consiste no 'conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das conseqüências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida'. Uma importante condição da segurança jurídica está na relativa certeza que os indivíduos têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem perdurar ainda quando tal norma seja substituída. Realmente, uma lei é feita para vigorar e produzir seus efeitos para o futuro. Seu limite temporal pode ser nela mesma demarcado ou não. Seu texto, às vezes, delimita o tempo durante o qual ela regerá a situação fática prevista. Outras vezes ela é feita para regular situação transitória, decorrida a qual perde a vigência e, consequentemente, a eficácia.' (destaques nossos e do autor) (Curso de Direito Constitucional Positivo, 12 ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 412). 13. Relevante também é o pensamento de J.J. Gomes Canotilho, já inúmeras vezes citado nestes autos, que assim se pronuncia sobre o assunto: 'O homem necessita de uma certa segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se considerou como elementos constitutivos do Estado de direito o princípio da segurança jurídica e o princípio da confiança do cidadão. Esses princípios apontam sobretudo para a necessidade de uma teoria da conformação material dos actos legislativos, postulando uma teoria da legislação, preocupada em racionalizar e optimizar os princípios jurídicos de legislação inerentes ao Estado de Direito. A idéia de segurança jurídica reconduz-se a dois princípios materiais concretizadores do princípio geral de segurança: princípio da determinabilidade de leis expresso na exigência de leis claras densas e o princípio da protecção da confiança, traduzido na existência de leis tendencialmente estáveis, ou, pelo menos, não lesivas da previsibilidade e calculabilidade dos cidadãos relativamente aos seus efeitos jurídicos. ........................................................................ ........................... Os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica podem formular-se assim: o cidadão deve poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre seus direitos, posições jurídicas e relações, praticadas ou tomadas de acordo com as normas jurídicas vigentes, se ligam os efeitos jurídicos duradouros previstos ou calculados com base nessas mesmas normas. Estes princípios apontam basicamente para: (1) a proibição de leis retroactivas; (2) a inalterabilidade do caso julgado; (3) a tendencial irrevogabilidade de actos administrativos constitutivos de direitos. ........................................................................ ........................... Embora o princípio da segurança jurídica seja considerado em elemento essencial do princípio do próprio Estado de direito, não é fácil sintetizar o seu conteúdo básico. Além das suas imbricações com o princípio da protecção da confiança, as idéias nucleares da segurança jurídica desenvolvem-se em torno de dois conceitos: (1) estabilidade ou eficácia ex post da segurança jurídica: uma vez adaptadas, na forma e procedimento legalmente exigidos, as decisões estaduais não devem poder ser arbitrariamente modificadas, sendo apenas razoável alteração das mesmas quando ocorram pressupostos materiais particularmente relevantes; (2) previsibilidade ou eficácia ex ante do princípio da segurança jurídica que, fundamentalmente, se reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos dos actos normativos.' (destaques nossos e do autor) (Direito Constitucional, 6ª ed., Coimbra: Livraria Almedina, 1995, pp. 371 a 373, 380). 14. Como se pode ver dos trechos acima transcritos, a segurança jurídica de uma decisão estatal está condicionada a que ela tenha sido adotada na forma e procedimento legalmente exigidos, ou seja, que tenha sido praticada ou tomada de acordo com as normas jurídicas vigentes. A segurança do cidadão repousa, pois, na certeza de que a Lei vigente será aplicada. Em nenhum momento se defende que a mantença de decisões tomadas com afronta à Lei seja um indicador de segurança jurídica. Esses dois princípios, segurança jurídica e legalidade, estão, pois, indissociavelmente ligados'. Desta forma, sendo irregulares as nomeações, vez que as habilitações acadêmicas exigidas para os concursos do TRT e do TRF não eram idênticas, não preenchendo assim um dos requisitos mencionados pelo E. Tribunal de Contas da União, em Sessão Plenária ¿ Decisão nº 212, não há que se falar em estabilidade das relações jurídicas. Pelo exposto, este representante do Ministério Público opina pela anulação das nomeações dos servidores Karla Mata Shultz, Leo Wirth e Ivair Roberto Marasca para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador no TRT da 4ª Região, mediante aproveitamento de suas aprovações no concurso do TRF 4ª Região, sem prejuízo de serem feitas as determinações alvitradas na instrução técnica (fls. 73)." É o Relatório. Voto: A ação estatal desenvolve-se nos mais diferentes ramos de atividade. Logo, é natural que cada órgão integrante da Administração Pública apresente uma estrutura de pessoal própria, concebida segundo as peculiaridades de sua missão institucional. Nesse sentido, à luz da norma insculpida no art. 37, incisos I e II, da Constituição Federal, abaixo reproduzida, torna-se necessário, em regra, que cada um desses órgãos, para a captação de recursos humanos no mercado de trabalho, promova concurso público específico, levando em conta a natureza e a complexidade dos cargos ou empregos de que necessita para o bom desempenho de suas funções. "Art. 37 ........................................................................ ........... I ¿ os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; II ¿ a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei (...)". Nada obstante, é fato que alguns cargos ¿ sobretudo aqueles associados às atividades de apoio ¿ estão presentes, por sua própria natureza, na estrutura organizacional de unidades distintas. Nessas hipóteses, havendo identidade de atribuições, requisitos, deveres e direitos, admite-se, em nome da racionalidade administrativa, que haja, por parte de determinado órgão, o aproveitamento de candidatos selecionados em concurso realizado, originariamente, para o preenchimento de vagas existentes em outro órgão. Essa faculdade, no entanto, não pode, por óbvio, mitigar o alcance do preceito constitucional, fruto que é da marcada preocupação do Legislador com a observância, em todo o serviço público, dos princípios da moralidade e da isonomia. No caso dos autos, a administração do TRT da 4ª Região, tendo em conta as características próprias do cargo de Oficial de Justiça-Avaliador integrante de seu quadro de pessoal, estabeleceu, entre outros, dois requisitos necessários ao seu provimento: (1) formação superior em Administração, Ciências Econômicas, Ciências Atuariais, Ciências Contábeis ou Ciências Jurídicas e Sociais e (2) conhecimento mínimo nas áreas de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, a ser aferido mediante prova escrita. Já o TRF, igualmente disciplinando o preenchimento do cargo de Oficial de Justiça-Avaliador de sua estrutura, houve por bem, em face de suas peculiaridades, restringir-lhe o acesso apenas aos portadores de diploma de bacharel em Direito. Ademais, não vislumbrou necessidade de exigir demonstração de conhecimentos na área da justiça trabalhista. Ora, se para o exercício do cargo de Oficial de Justiça-Avaliador, no âmbito do TRT, não é indispensável formação superior em Direito, buscar candidatos aprovados no concurso do TRF ¿ onde tal formação é, sim, indispensável ¿ representou clara afronta ao princípio da isonomia, protegido, como visto, pela Constituição. Ao fazê-lo, a administração do TRT não assegurou, no tocante aos três cargos indevidamente preenchidos, plena acessibilidade a todos aqueles que satisfaziam, à época, os requisitos estabelecidos em lei. Essa, por sinal, foi a situação do denunciante, impedido de participar do concurso do TRF (por não possuir formação em Direito) mas plenamente apto a desempenhar as funções do cargo no TRT. Portanto, não sendo idênticos os cargos (pois que diferentes os requisitos de formação acadêmica), e demonstrada, na espécie, a ocorrência de ofensa aos direitos subjetivos de outros potenciais interessados nas vagas, há que se buscar a reparação do erro, consoante, aliás, prescreve o art. 37, § 2º, da C.F. Com essas considerações, e louvando-me, de mais a mais, nos lúcidos apontamentos colacionados pelo representante do Ministério Público nos autos, VOTO no sentido de que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto a este Colegiado. Sala das Sessões, em 21 de março de 2001. GUILHERME PALMEIRA Ministro-Relator Assunto: VII - Denúncia Relator: GUILHERME PALMEIRA Representante do Ministério Público: UBALDO CALDAS Unidade técnica: SECEX-RS Quórum: Ministros presentes: Humberto Guimarães Souto (Presidente), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Iram Saraiva, Bento José Bugarin, Valmir Campelo, Adylson Motta, Walton Alencar Rodrigues, Guilherme Palmeira (Relator) e o Ministro-Substituto José Antonio Barreto de Macedo (Relator). Sessão: T.C.U., Sala de Sessões, em 21 de março de 2001 Decisão: O Tribunal Pleno, ante as razões expostas pelo Relator, DECIDE: 8.1. conhecer da presente denúncia, com fulcro no arts. 212 e 213 do Regimento Interno, para, no mérito, considerá-la procedente; 8.2. assinar, com fulcro no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal c/c o art. 45 da Lei nº 8.443/92, o prazo de 15 (quinze) dias para que o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região proceda à anulação das nomeações de Karla Mata Shultz, Leo Wirth e Ivair Roberto Marasca para o cargo de Analista Judiciário, Especialidade Execução de Mandados (anteriormente denominado Oficial de Justiça-Avaliador), por ofensa ao disposto no art. 37, incisos I e II, da Constituição Federal; (Tornado insubsistente pelo Acórdão 1855/2004 Plenário - Ata 45). 8.3. determinar ao TRT-4ª Região que: 8.3.1. observe com rigor, quando for o caso, os requisitos necessários ao aproveitamento de candidatos aprovados em concurso público realizado por outro órgão, consignados na Decisão TCU nº 212/98 - Plenário, de caráter normativo (art. 1º, § 2º, da Lei nº 8.443/92), publicada no D.O.U. de 11/05/98, de sorte que tal aproveitamento apenas ocorra "dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, que tenha iguais denominação e descrição e que envolva as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que se exijam idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional e sejam observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação prevista no edital, que deverá antever a possibilidade desse aproveitamento"; 8.3.2. quando da realização de concursos públicos para provimento de cargos do órgão, caso entenda oportuno estabelecer previamente o número de aprovados, considere, entre outros aspectos pertinentes, a rotatividade dos servidores, as possíveis aposentadorias no período de validade do certame e o índice de desistência dos candidatos aprovados nos últimos concursos, de modo a aproveitar o maior número possível de candidatos habilitados em seu próprio certame; 8.4. retirar a chancela de sigiloso que recai sobre os autos, mantendo-a, no entanto, com relação à identidade do denunciante; 8.5. dar ciência desta Decisão, bem como do Relatório e do Voto que a fundamentam, ao interessado; 8.6. determinar o arquivamento do presente processo. Parecer do Ministério Público: Proc. TC-011.144/2000-9 Denúncia PARECER Trata-se de denúncia formulada contra possíveis irregularidades na nomeação para o cargo de Oficiais de Justiça ¿ Avaliador no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. O TRT ¿ 4ª Região realizou concurso para o cargo de Oficial de Justiça ¿ Avaliador, tendo sido nomeados todos os 25 (vinte e cinco) candidatos aprovados, nos termos estabelecidos no item 3, do capítulo VI, do Edital n° 001/98 (fl. 31). Em face de continuar existindo cargos vagos, devido à ocorrência de várias aposentadorias e da grande rotatividade dos novos concursados, fazia-se necessário a contratação de mais oficiais de justiça-avaliador, razão pela qual o TRT nomeou mais três pessoas, mediante aproveitamento de candidatos aprovados no concurso realizado pelo TRF da 4ª Região, vez que não havia mais aprovados no concurso realizado pelo TRT. A denunciante alega a inconstitucionalidade das referidas nomeações, por representar nomeação sem concurso, uma vez que se equipara à modalidade transferência, prevista inicialmente na Lei n° 8.112/90, todavia declarada inconstitucional pelo STF. Argumenta que as regras dos concursos do TRT e do TRF eram absolutamente diferentes, pois enquanto o concurso do TRT exigia habilitação nos cursos de Administração de Empresas, Ciências Econômicas, Ciências Contábeis, Ciências Jurídicas e Sociais e Atuariais, o do TRF restringia-se apenas à habilitação em Ciências Jurídicas e Sociais, diferença esta que torna o concurso do TRT bem mais concorrido, uma vez que haverá mais pessoas habilitadas a fazê-lo. Continua, informando que o programa do TRT continha as matérias Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, as quais não estavam inclusas no programa do TRF, consequentemente, a habilitação acadêmica exigida para o primeiro concurso era maior do que para o do TRF. E, ainda, que a cláusula contida no edital do concurso do TRT, a qual limitava o número de aprovados em dez vezes o número de vagas disponíveis, não existente no edital do concurso do TRF, fez com que o número de aprovados no TRT fosse em número bem inferior do que os aprovados no TRF, consequentemente, pessoas com classificação bem inferior foram nomeadas preterindo outras mais bem classificadas, como no caso da denunciante. Como já ressaltado pela Unidade Técnica, o E. Tribunal de Contas da União ao responder consulta, mediante r. Decisão n° 212/98 ¿ TCU ¿ Plenário, proferiu o entendimento no sentido de ser legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, in verbis: "... é legal o aproveitamento de candidatos aprovados em concurso realizado por outro órgão, desde que dentro do mesmo Poder, para provimento de cargo idêntico àquele para o qual foi realizado, que tenha as iguais denominação e descrição e que envolva as mesmas atribuições, competências, direitos e deveres, de tal modo que se exijam idênticos requisitos de habilitação acadêmica e profissional e sejam observadas a ordem de classificação e a finalidade ou destinação prevista no edital, que deverá antever a possibilidade desse aproveitamento, ....." (grifamos). Ao analisarmos os editais dos dois concursos, observamos que o requisito de idêntica habilitação acadêmica mencionado na Decisão não foi preenchido, uma vez que a habilitação acadêmica exigida para o concurso do TRF se restringia à Ciências Jurídicas e Sociais, enquanto o concurso do TRT abarcava bem mais cursos. Desta forma, a concorrência dos dois concursos era bem diferente, quebrando assim a necessária isonomia na participação . Ademais, o concurso do TRT tinha um conteúdo programático mais extenso que o do TRF, presumindo-se diferença na participação. Desta forma, conquanto não tenha havido o preterimento da denunciante, vez que estava submetida às regras do edital do concurso do TRT, consequentemente, a sua aprovação estava limitada à uma classificação a dez vezes o número de vagas disponíveis, as nomeações de candidatos para o cargo de oficial avaliador no TRT decorrentes do aproveitamento de candidatos provenientes do concurso realizado pelo TRF são irregulares, pois não cumpriram todos os requisitos exigidos para o aproveitamento. Quanto à estabilidade das relações jurídicas trazida como justificativa pela Unidade Técnica para a manutenção da nomeação dos servidores, cabe-nos trazer parecer já exarado pela representante deste Ministério Público, Drª. Cristina Machado da Costa e Silva, nos autos do TC n° 010.391/1997-5, o qual transcreveremos parcialmente: "9.Os princípios da segurança jurídica e da legalidade, ínsitos ao Estado democrático de direito, têm, em nosso ordenamento jurídico, status constitucional, não havendo que se falar em prevalência de um sobre o outro. Em verdade, estes dois princípios se complementam, de modo que não há como se conceber o da segurança jurídica dissociado do da legalidade. 10.O princípio da legalidade, latu sensu, repousa na subordinação de todos, cidadãos e Estado, aos comandos da Lei. Assim é que, em um Estado de Direito, a Lei é o principal instrumento de que dispõem as pessoas sujeitas ao império estatal para evitar a arbitrariedade e a injustiça. 11.A segurança jurídica, por sua vez, pode ser entendida como a certeza de que essa mesma Lei, que deve, tanto quanto possível, ser clara e estável, será efetivamente aplicada dentro do seu limite temporal de vigência, permitindo assim aos cidadãos prever as conseqüências jurídicas dos atos que pretendam praticar. 12.Calha trazer a lume o entendimento, sobre o assunto, do renomado constitucionalista José Afonso da Silva, verbis: "A temática deste número liga-se à sucessão de leis no tempo e à necessidade de assegurar o valor da segurança jurídica, especialmente no que tange à estabilidade dos direitos subjetivos. A segurança jurídica consiste no 'conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das conseqüências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida'. Uma importante condição da segurança jurídica está na relativa certeza que os indivíduos têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem perdurar ainda quando tal norma seja substituída. Realmente, uma lei é feita para vigorar e produzir seus efeitos para o futuro. Seu limite temporal pode ser nela mesma demarcado ou não. Seu texto, às vezes, delimita o tempo durante o qual ela regerá a situação fática prevista. Outras vezes ela é feita para regular situação transitória, decorrida a qual perde a vigência e, consequentemente, a eficácia." (destaques nossos e do autor) (Curso de Direito Constitucional Positivo, 12 ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 412). 13.Relevante também é o pensamento de J.J. Gomes Canotilho, já inúmeras vezes citado nestes autos, que assim se pronuncia sobre o assunto: "O homem necessita de uma certa segurança para conduzir, planificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se considerou como elementos constitutivos do Estado de direito o princípio da segurança jurídica e o princípio da confiança do cidadão. Esses princípios apontam sobretudo para a necessidade de uma teoria da conformação material dos actos legislativos, postulando uma teoria da legislação, preocupada em racionalizar e optimizar os princípios jurídicos de legislação inerentes ao Estado de Direito. A idéia de segurança jurídica reconduz-se a dois princípios materiais concretizadores do princípio geral de segurança: princípio da determinabilidade de leis expresso na exigência de leis claras densas e o princípio da protecção da confiança, traduzido na existência de leis tendencialmente estáveis, ou, pelo menos, não lesivas da previsibilidade e calculabilidade dos cidadãos relativamente aos seus efeitos jurídicos. ........................................................................ ........................... Os princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica podem formular-se assim: o cidadão deve poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre seus direitos, posições jurídicas e relações, praticadas ou tomadas de acordo com as normas jurídicas vigentes, se ligam os efeitos jurídicos duradouros previstos ou calculados com base nessas mesmas normas. Estes princípios apontam basicamente para: (1) a proibição de leis retroactivas; (2) a inalterabilidade do caso julgado; (3) a tendencial irrevogabilidade de actos administrativos constitutivos de direitos. ........................................................................ ........................... Embora o princípio da segurança jurídica seja considerado em elemento essencial do princípio do próprio Estado de direito, não é fácil sintetizar o seu conteúdo básico. Além das suas imbricações com o princípio da protecção da confiança, as idéias nucleares da segurança jurídica desenvolvem-se em torno de dois conceitos: (1) estabilidade ou eficácia ex post da segurança jurídica: uma vez adaptadas, na forma e procedimento legalmente exigidos, as decisões estaduais não devem poder se arbitrariamente modificadas, sendo apenas razoável alteração das mesmas quando ocorram pressupostos materiais particularmente relevante. (2) previsibilidade ou eficácia ex ante do princípio da segurança jurídica que, fundamentalmente, se reconduz à exigência de certeza e calculabilidade, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos dos actos normativo." (destaques nossos e do autor) (Direito Constitucional, 6ª ed., Coimbra: Livraria Almedina, 1995, pp. 371 a 373, 380). 14.Como se pode ver dos trechos acima transcritos, a segurança jurídica de uma decisão estatal está condicionada a que ela tenha sido adotada na forma e procedimento legalmente exigidos, ou seja, que tenha sido praticada ou tomada de acordo com as normas jurídicas vigentes. A segurança do cidadão repousa, pois, na certeza de que a Lei vigente será aplicada. Em nenhum momento se defende que a mantença de decisões tomadas com afronta à Lei sejam um indicador de segurança jurídica. Esses dois princípios, segurança jurídica e legalidade, estão, pois, indissociavelmente ligados". Desta forma, sendo irregulares as nomeações, vez que as habilitações acadêmicas exigidas para os concursos do TRT e do TRF não eram idênticas, não preenchendo assim um dos requisitos mencionados pelo E. Tribunal de Contas da União, em Sessão Plenária ¿ Decisão nº 212, não há que se falar em estabilidade das relações jurídicas. Pelo exposto, este representante do Ministério Público opina pela anulação das nomeações dos servidores Karla Mata Shultz, Leo Wirth e Ivair Roberto Marasca para o cargo de Oficial de Justiça-Avaliador no TRT da 4ª Região, mediante aproveitamento de suas aprovações no concurso do TRF 4° Região, sem prejuízo de serem feitas as determinações alvitradas na instrução técnica (fls. 73). Ministério Público, em 30 de Outubro de 2000. Ubaldo Alves Caldas Subprocurador-Geral