NO TEMPO DOS CAPUCHINHOS GUILHERME CARDOSO NO TEMPO DOS CAPUCHINHOS 1ª Edição Belo Horizonte Guilherme Cardoso Dias Neto 2011 Copyright © Guilherme Cardoso Capa: Zeca Martins Diagramação: Márcio Rubens C. Cardoso Revisão: Guilherme Cardoso Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Cardoso, Guilherme No tempo dos Capuchinhos / Guilherme Cardoso. -- 1. ed. -- São Paulo : PerSe, 2011. ISBN 978-85-91218-60-8 1. Capuchinhos - Brasil - História 2. Histórias de vida 3. Juventude Franciscana da Pompeia Belo Horizonte (MG) - História 4. Memórias 5. Pompeia (Belo Horizonte, MG) - Bairro - História I. Título. 11-05868 CDD-869.93 Índices para catálogo sistemático: 1. Belo Horizonte : Cidade : Juventude Franciscana da Pompeia : Histórias de vida: Literatura brasileira 869.93 2011 Esta obra é uma publicação da Editora PerSe Impresso no Brasil: Printed in Brazil Vendas: www.perse.com.br Este livro é dedicado a todas aquelas pessoas que passaram pela primeira parte da minha vida, mais especificamente no período de 20 anos, compreendido entre 1950 até fins dos anos 60. Meus pais, irmãos, cunhados, sobrinhos, padres capuchinhos, frei Benigno. Colegas e amigos, contemporâneos, vivos ou falecidos: Da Juventude Franciscana da Pompeia. Da Casa Abreu - Centro Ótico. Do Banco Agrícola Mercantil - Unibanco. No Tempo dos Capuchinhos é para a apreciação e conhecimento, de velhos e novos colegas e amigos, esposa, filhos, noras e netos, para que saibam e possam transmitir adiante, que houve sim, em um tempo não muito distante, uma época de pura inocência e muitos sonhos, chamada de Anos Dourados, em que, no lugar da tecnologia que quase não existia, era preciso usar bastante a imaginação, a solidariedade e a criatividade. Sumário INTROITO ................................................................ 11 A SAGA DOS PADRES CAPUCHINHOS ..................... 13 O QUE FAZEM OS CAPUCHINHOS ........................... 15 OS CAPUCHINHOS NO BRASIL ............................... 16 OS CAPUCHINHOS CHEGAM A BELO HORIZONTE . 18 FAVELA, NOSSA PRIMEIRA MORADA ..................... 20 O PODER DOS CAPUCHINHOS NA POMPEIA ......... 24 OS SAUDOSOS ANOS DOURADOS ........................... 26 MULHER NÃO ASSISTIA À MISSA SEM VÉU ............. 28 POBRE, ERA POBRE MESMO! ................................... 31 COROINHA ERA O SONHO DOS GAROTOS ............. 34 COMIDA ERA FEITA COM TOUCINHO .................... 36 OS CAPUCHINHOS ERAM NOSSOS ÍDOLOS ............ 38 CACHORRO ERA AMARRADO COM LINGUIÇA ...... 40 IGREJA ERA LUGAR DE REZAR................................ 43 A PONTE DO CARDOSO ........................................... 45 DIZIMO, CONTRIBUIÇÃO OU ESMOLA? ................ 47 ANTIGAMENTE ERA MELHOR?................................. 48 A MISSA, OS PECADOS E A CONFISSÃO .................. 50 NA ESCOLA, QUEM MANDAVA ERA A PROFESSORA51 O PADRE CELEBRAVA DE COSTAS ........................... 53 MAIOR AUDIÊNCIA ERA A VOZ DO BRASIL .......... 55 NÃO SE PODIA MASTIGAR A HÓSTIA ..................... 57 ESCOLA ERA PARA SE ALIMENTAR ......................... 59 CONFESSANDO OS PECADOS ................................... 61 COMER MAÇÃ, SÓ HOSPITALIZADO ....................... 63 OS CAPUCHINHOS ERAM O PODER PÚBLICO ....... 65 COMPRAS ERAM NA CADERNETA ............................ 67 COMO A GENTE ERA INOCENTE .............................. 71 ASSALTANTES ERAM LADRÕES DE GALINHAS ........ 73 SEXO NOS ANOS DOURADOS .................................. 75 MEDO ERA DE ASSOMBRAÇÕES .............................. 78 PENICILINA ERA REMÉDIO DE RICO ..................... 80 CEMITÉRIO ERA LUGAR DE MORTOS ..................... 81 HAVIA TEMPO PARA CONTAR CASOS ..................... 83 O DESFILE PARA ARRANJAR NAMORADO ............. 87 AS HORAS DANÇANTES EM CASA ............................ 89 FESTA BOA ERA CASAMENTO DE POBRE ................ 93 AS BARRAQUINHAS DO MÊS DE MAIO .................. 95 BELO HORIZONTE, SEGUNDO A PERIFERIA .......... 99 CEM DISCOS É O LIMITE........................................ 103 AS SERENATAS AO LUAR ....................................... 106 O ENCONTRO COM O CINTURA FINA .................. 108 A MORTE DOS TRÊS CAPUCHINHOS ..................... 111 BRIGA PARA NÃO ESQUECER ................................ 112 A GENTE JOGAVA BENTE ALTAS............................. 114 FUTEBOL AINDA ERA ESPORTE ............................ 115 NO MEIO DOS PADRES, EU ERA UM CAPETINHA 118 O DIA EM QUE CORRI PELADO ............................ 119 ENCARAR O PRIMEIRO EMPREGO ........................ 123 ESCREVEU NÃO LEU, É NA CASA ABREU ............... 124 O EIXO DE 180 GRAUS ........................................... 126 A JUVENTUDE FRANCISCANA DA POMPEIA ........ 129 HOMEM NÃO JOGAVA VÔLEI, NEM PETECA, NEM CALÇAVA HAVAIANAS............................................ 135 QUEM SE REBELAVA ERA COMUNISTA ................. 137 PAX ET BONUM ...................................................... 139 AS PELADAS COM OS CAPUCHINHOS ................... 142 UM PORRE NA SEXTA-FEIRA SANTA ..................... 145 O DIA EM QUE ASSALTAMOS A COZINHA DOS PADRES ................................................................... 148 TEATRO ERA PROTESTO ........................................ 153 A TURMA DOS CORDÍGEROS ................................ 155 ERA O TEMPO DA IMAGINAÇÃO ........................... 157 SEXO ERA SÓ NO CASAMENTO .............................. 162 O TEMPO DAS REVOLUÇÕES .................................. 167 DITADURA, GOLPE OU REVOLUÇÃO? .................. 170 REVOLUÇÃO NA IGREJA ........................................ 174 AMIGOS DO LADO ESQUERDO DO PEITO ............ 176 COMO O TEMPO NÃO PASSAVA ............................. 179 O CINEMA PARADISO NA POMPEIA .................... 182 OS CINEMAS DA PERIFERIA .................................. 184 O CINE POMPEIA ................................................... 187 FILMES EM 3D JÁ EXISTIAM, MUITO TEMPO ATRÁS ................................................................................ 194 O TRIO LOS SIETE .................................................. 195 SER BANCÁRIO ERA GANHAR NA LOTERIA ......... 197 GENÉSIO, O BOM GAÚCHO .................................... 200 LAMBRETA: A MULHER QUE NÃO ERA MOTO ...... 202 TEATRO ERA COISA DE VAGABUNDO ................... 204 CHICO MOREIRA, UM GOZADOR ......................... 206 ERA O TEMPO DA INOCÊNCIA .............................. 209 ANOS 50 E 60: O TEMPO DOS CAPUCHINHOS! .... 213 CITAÇÕES PESSOAIS .............................................. 214 FOTOS ..................................................................... 229 Guilherme Cardoso Introito Este não é um livro contando a história do Bairro Pompeia ou a trajetória dos padres capuchinhos no Brasil. É um relato pessoal e histórico de fatos, costumes e casos acontecidos, presenciados ou vividos por mim e por outros colegas que tiveram a honra e a felicidade de pertencer à Juventude Franciscana da Pompeia (JUF). É um texto meio autobiográfico também, embora evitasse isso. Os Capuchinhos e o Bairro Pompeia são o cenário onde tudo acontecia e circulava. Não fiz pesquisas científicas, nem bibliográficas. Naquele tempo quase não se fotografava, pois o custo para revelar as fotos era alto. Gravadores de som eram poucos, filmadora, nem pensar, só profissional. Ninguém guardava documentos. Nem os padres, nem o fotógrafo oficial da paróquia. Não imaginavam a importância para a história. Apelei para a minha memória, que pode ter falhado na exatidão de datas, na troca ou esquecimento de nomes de pessoas envolvidas em fatos e casos. Por isso, estou pedindo desculpas pelos erros ou omissões. Procurei colocar no papel, para ficar gravados, e não se perderem no tempo, momentos, fatos, pessoas e personagens que de algum modo foram importantes em minha vida e, com certeza, na vida de outras pessoas, que viveram e atuaram no Bairro Pompeia nas décadas de 50 e 60. 11 No Tempo dos Capuchinhos Busquei relatar, principalmente, como eram os costumes, os hábitos e o modo de ver e pensar daquela geração chamada de Anos Dourados. E relatar como um grupo de jovens, a JUF, e a comunidade de um bairro, viveram e desenvolveram-se, influenciadas e seguindo religiosamente as normas e as orientações católicas, neste caso, pregadas pelos padres capuchinhos. Os cenários são Belo Horizonte e o Bairro Pompeia, mas os costumes e os personagens aqui descritos poderiam facilmente ser os mesmos em outras cidades e comunidades, mudando-se apenas os nomes. Isso tudo para mostrar um pouco como era a vida da maioria da população brasileira nas décadas de 50 e 60. Tudo o que está escrito são histórias, fatos e casos verdadeiros. Alguns com uma pitada de exagero na forma de contar. Não me atreveria a mentir. Falsear continua sendo pecado. Causos, esses sim, são frutos da imaginação. Espero que gostem de ler este livro, como eu gostei bastante de escrevê-lo. Belo Horizonte, maio de 2011. Guilherme Cardoso 12 Guilherme Cardoso I A Saga dos Padres Capuchinhos O primeiro grupo dos frades menores capuchinhos teve origem no século XVI, liderado por Frei Mateus de Báscio, na província italiana das Marcas. O nome Capuchinhos surgiu por usarem um capuz comprido, inspirados na vestimenta de São Francisco. A barba grande também era uma característica dos capuchinhos, embora não obrigatória. Durante anos foram perseguidos, até que uma sobrinha do Papa Clemente VII, Catarina Cibo, intercedeu junto ao pontífice lembrando-lhe que os capuchinhos tinham sido verdadeiros heróis ao socorrerem os doentes de uma peste em 1523 na cidade de Camerino. Em 1525 o grupo foi crescendo e juntaram-se a Frei Mateus de Báscio outros frades, dentre eles os irmãos Frei Ludovico e Frei Rafael de Fossombrone. Durante um tempo ficaram abrigados com os camaldulenses de Massácio. Depois, foram acolhidos pelo ministro geral dos franciscanos conventuais. Somente em 3 de julho de 1528 foi que o Papa Clemente VII decidiu aprovar a ordem menor dos Capuchinhos através da bula "Religionis Zelus". Esta bula autorizava os adeptos a levar vida eremítica, seguindo a Regra de São Francisco, a usar barba e a vestir o hábito com capuz comprido e a pregar ao povo. Mais tarde, em abril de 1529, em Albacina, um grupo de doze religiosos elegeu os superiores e redigiu as Constituições. 13