LÁPIS E COMPUTADORES: A EDUCAÇÃO DOS RICOS E A EDUCAÇÃO DOS POBRES Luca Rischbieter1 Herbert Kohl é um educador muito conhecido nos Estados Unidos desde o final da década de 60, quando publicou o livro 36 Children, relato de seu trabalho com uma turma de crianças marginalizadas (de 11 a 14 anos), no Harlem, em Nova Iorque. O livro, um clássico da pedagogia, conta histórias muito bonitas e reais, e é uma espécie de Ao mestre com carinho da educação primária nos guetos. Trinta anos depois, Herbert Kohl continua comprometido com a educação das crianças marginalizadas da América, especialmente negras e latinas. Poderíamos esperar, talvez, que ele visse os computadores de forma negativa, mas não é isso que acontece: é ele que assina o prefácio do livro Computers in the classroom, publicado em 1996 pela Apple Press, relato de meia dúzia de experiências muito interessantes em que computadores Macintosh foram parar no coração de salas de aula dos EUA. Para Kohl, os computadores permitem que cada sala de aula se torne "um centro de comunicação, uma casa de edição, um centro de arte multimídia e um centro de pesquisas, onde o aluno pode se valer dos recursos da Livraria do Congresso e do Instituto Smithsoniano". O potencial dos computadores é muito grande para renovar a educação, atualizar os currículos, conseguir resultados de aprendizagens ótimos para todas as crianças, mas, em um grande número de casos, os computadores não são utilizados adequadamente pelas escolas. Em vez de aproveitar suas grandes possibilidades para implementar uma educação renovada, os computadores acabam em algum canto da escola, encostados ou servindo como simples apoio às matérias tradicionais. Isso irrita muito H. Kohl, que percebe o imenso desperdício deste formidável instrumento. Ele conta que, quando usou seu primeiro computador, muitos se perguntavam: "Será que ele deve ir para as atividades de escrita, matemática, ciências ou para o centro de artes? Eu recoloquei a questão, pensando em outros instrumentos. Eu nunca limitei lápis, canetas ou réguas a um lugar apenas. Eles eram úteis para tudo." Mas o computador é muito mais que um lápis, é uma poderosíssima "extensão da mente." No Brasil, o desperdício de seu potencial pela maioria das escolas 1 Pedagogo e Geógrafo particulares é grave, mas o meio familiar vai proporcionar a essas crianças todas as chances de lidar e conhecer as possibilidades destes incríveis "pós-lápis". Triste é pensarmos no que acontece em nossas escolas públicas, onde as crianças das famílias mais humildes encontram uma das únicas chances de conhecer, de explorar e dominar o imenso potencial pedagógico dos computadores. Será que, para além do "analfabetismo", do "iletrismo" — filho de métodos educacionais escandalosamente ultrapassados — não estamos aprofundando ainda mais as disparidades sociais neste país, ao permitir por omissão, conservadorismo e ignorância — que seja criado um novo tipo de exclusão, que os franceses já chamam de "iletronismo"? Infelizmente, parece que sim...