a Cidade sUstentÁVeL Professora Erminia Maricato ____________ ermínia Maricato Graduação (1971), mestrado (1977) e doutorado (1984) e Livre Docência (1996), professora titular (1997) em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP). Professora visitante da University of British Columbia/Center of Human Settlements, Canadá (2002) e da University of Witswaterhand of Johannesburg, África do Sul (2006). Secretária de Habitação e Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de São Paulo (1989/1992), coordenadora do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (1998/2002) e Ministra Adjunta das Cidades (2003/2005). Foi consultora ad-doc da FINEP, CAPES, CNPQ, FAPESP, e também de inúmeras prefeituras no Brasil e no exterior. Criou o LABHAB - Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos da FAUUSP (1997) e formulou a proposta de criação do Ministério das Cidades. Prêmio Juan Torres Higuerras da Federação Panamericana de Associações de Arquitetos, em 2006. Prêmio Arquiteto do Ano 2007 da Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas. Conferência de abertura da World Planning Schools Congress (México, 2006). Key speaker do Social Forum of Architecture - Ankara (2010). Presidente da Comissão de Pesquisa da FAUUSP (2007/2009) e Membro do Conselho de Pesquisa da USP (2007/2009). Membro do Human Settlemente Advisory Board - United Nation Habitat (2009). Membro dos conselhos editoriais da Revista Urbe PUCPR, Cadernos Metrópole - PUCSP, Revista Brasileira Estudos Urbanos e Regionais- ANPUR e Justice Spaciale - Nanterre Universite, França. ÍndiCe 11 INTRODUÇÃO: A QUESTÃO AMBIENTAL SE IMPÔS NAS AGENDAS NACIONAL E GLOBAL 13 NO BRASIL: A URBANIZAÇÃO PRÓPRIA DO CAPITALISMO PERIFÉRICO: DESIGUALDADE SOCIAL E PREDAÇÃO AMBIENTAL 14 MUDANÇAS NO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO. METRÓPOLES, CIDADES MÉDIAS. COMO ANDAM A HABITAÇÃO E SANEAMENTO 18 O AUTOMÓVEL REINA SOBERANO. O TRANSPORTE COLETIVO CAMINHA PARA A RUÍNA 19 O IMPACTO DAS POLÍTICAS NEOLIBERAIS NO APROFUNDAMENTO DA TRAGÉDIA URBANA BRASILEIRA E A RETOMADA DO DESENVOLVIMENTISMO 22 O PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO (PAC), O PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA (MCMV), E O PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO: UMA AGENDA PARA AS CIDADES NO INÍCIO DO SÉCULO XXI? 24 O MOVIMENTO SOCIAL DE REFORMA URBANA, AS CONQUISTAS INSTITUCIONAIS, A AMPLIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO E O IMPASSE ATUAL 26 SOBRE A FORMAÇÃO DO ENGENHEIRO 28 DESAFIOS, DIFICULDADES E PERSPECTIVAS A CIDADE SUSTENTÁVEL 1- introdUÇÃo: a QUestÃo aMbientaL se iMpÔs nas agendas naCionaL e gLobaL1 É de conhecimento amplo que o padrão capitalista de produção e consumo, (e aí poderíamos incluir as sociedades socialistas produtivistas), vigente nos últimos 200 anos, desconhece limites para a exploração de recursos naturais, consumo de energia e poluição de terras, águas e ar, tornando-se absolutamente insustentável para o futuro da humanidade e do planeta. Numa sociedade onde a mercadoria se generaliza a ponto de marcar como tal o próprio trabalhador, a felicidade é identificada com o ato de possuir ou consumir, novas necessidades são criadas por força do mercado. Reverter este padrão não é tarefa banal. A crise ambiental se impõe na agenda política do final do século XX e início do século XXI com um diferencial (mas necessariamente em parceria), com a crise social e econômica promovida pelo desemprego e precarização do trabalho decorrentes da reestruturação produtiva do capitalismo. Aquecimento global, agressão à camada de ozônio, elevação do nível do mar, desertificação de terras, assoreamentos de cursos d’água, são evidências científicas do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) e entraram na agenda para ficar2. Além de inviável, esse padrão produtivo é injusto: alguns consomem, de forma conspícua marcada pelo desperdício, mais do que necessitam e muitos não consomem ____________ 1 A autora agradece as indispensáveis colaborações de: engenheiro, e professor da UFABC, Francisco Comarú; urbanista e professora da PUC de Campinas, Laura Machado de Mello Bueno; e engenheiro Clovis do Nascimento, Secretário Geral da FISENGE. 2 Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), trata-se de um corpo de cientistas definidos pela United Nations Environment Programme (UNEP) e pela World Meteorological Organization (WMO) que visa fornecer um diagnóstico claro do conhecimento sobre mudança climática e seus potenciais impactos sócio-econômicos. 11 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE o mínimo para a sobrevivência. E sabemos que o planeta não tem recursos para que todos consumam de acordo com o padrão americano vigente. Há consenso sobre a necessidade de mudança, mas não há consenso sobre as causas e também sobre a profundidade das medidas a serem tomadas. Há resistências – ou interesses – muito fortes contra as mudanças, e elas são especialmente fortes no meio urbano. E mais ainda nos países emergentes e periféricos. Apenas para dar uma ideia de fatos que denunciam um estado de emergência, vale a pena lembrar que uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2002 mostrou que aproximadamente 60% dos municípios brasileiros apresentavam assoreamento dos cursos d’água (70% com desmatamento das matas ciliares e 56% com erosão e deslizamentos de encostas), 74% despejam esgotos domésticos nos cursos d’água, 63% apresentavam contaminação do solo por uso de agrotóxicos, esgotos domésticos e chorume. Utilizando um indicador menos sistêmico e isolado, porém paradigmático, podemos chegar à mesma conclusão sobre a urgência catastrófica da poluição da água em meio urbano. Pesquisas realizadas nos anos 90 trouxeram à tona uma evidência estarrecedora. Se nos anos 60 constatou-se a presença de metais pesados na água considerada potável, submetida a tratamento, nos anos 90 constatou-se que o tratamento convencional não elimina a presença de poluentes fármacos, hormônios, disruptores endócrinos, herbicidas, em águas que recebem efluentes de ETES3. Há 40 anos, o Brasil consumia 5% dos agrotóxicos que os EUA consumiam. Em 2009, o Brasil tornou-se o maior consumidor de agrotóxico do mundo, com óbvio impacto sobre as águas também no meio urbano, mas especialmente sobre a segurança alimentar. Enquanto o mercado mundial de agrotóxicos cresceu 94% entre 2000 e 2009, o brasileiro subiu 192%4. Foram negociados 1,06 milhão de toneladas de defensivos, segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola. Apenas 13 empresas transnacionais são responsáveis por 90% dessa produção. No entanto, nunca a palavra sustentabilidade foi tão pronunciada e, não pouco frequentemente, alardeada exatamente por aqueles que mais a violentam. O desafio da FISENGE ao debater a cidade sustentável é o desafio do Brasil e do mundo de transformar um padrão social, econômico, cultural, político e ambiental insustentável. ____________ 3 Esses estudos são geralmente de universidades públicas. Somente em 2005, as concessionárias de saneamento foram obrigadas a avaliar outros parâmetros além dos sanitários, por Portaria da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), e deverão torná-los públicos conforme resolução da Agência Nacional de Águas (ANA). Ver a respeito BUENO, L.M. A água no ambiente urbano. In BIOIKOS 51-55 Vol. 19, nºs 1 e 2 , jan/dez 2005. 4 Reportagem de Débora Prado. Revista Caros Amigos, de 17/09/2010 12 A CIDADE SUSTENTÁVEL 2 - no brasiL: a UrbaniZaÇÃo prÓpria do CapitaLisMo periFériCo: desigUaLdade soCiaL e predaÇÃo aMbientaL De 1940 a 2010 a proporção da população brasileira vivendo nas cidades passou de 31% a 84%, com atuais cerca de 160 milhões de residentes urbanos. Pode-se dizer que foi um dos processos mais intensos de urbanização ocorridos no mundo durante o século XX. Esse deslocamento gigantesco de população está relacionado à histórica concentração da terra rural e ao fracasso da proposta de Reforma Agrária, uma das propostas de Reforma de Base sustentada pelos movimentos sociais e sindicais no período que antecedeu o Regime Militar que teve início em 1964. Nas cidades para onde se dirigiram, esses migrantes tiveram um papel fundamental como oferta de mão de obra barata para o processo de industrialização tardio baseado na chamada substituição de importação. Entre 1940 e 1980 o Brasil cresceu a taxas superiores a 7% configurando um aparentemente bem sucedido salto de modernização. No entanto essa modernização se fez às expensas da força de trabalho barata que, ignorada pelas políticas públicas e excluída do mercado formal residencial capitalista, foi obrigada a construir suas próprias moradias, e frequentemente seus próprios bairros, para resolver seu problema de assentamento nas cidades. Um processo de urbanização baseado nos baixos salários – nas áreas industrializadas – e na relação informal, nas áreas de economia deprimidas é a chave explicativa para cidades e metrópoles produzidas, em grande parte, de forma ilegal pelas mãos de seus moradores: sem observação de leis urbanísticas e edilícia, sem conhecimento técnico de engenheiros e arquitetos, sem financiamento público ou subsídios resultando em casas e demais edifícios cuja construção se arrasta ao longo de muitos anos, marcados por ambientes insalubres e áreas submetidas a riscos de diversas naturezas. Trata-se, ainda, desde o início da industrialização até os dias de hoje, de uma força de trabalho que não ganha o suficiente para sua própria reprodução dentro da formalidade urbanística. A ocupação de áreas inadequadas ou ambientalmente frágeis como APAS, APPs, mangues, dunas, encostas instáveis, pela população pobre – ou seja, a maior parte da população – é apenas mais uma das consequências desse processo que tem no mercado privado especulativo e restritivo – orientado pelo produto de luxo – um agente central. A escala da cidade ilegal no Brasil mostra que ela é mais regra que exceção. Nas metrópoles situadas nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, mais de 50% dos domicílios são ilegais (essa taxa se aplica também ao Rio de Janeiro). Em São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, essa taxa está entre 33% e 25% dos domicílios. Até mesmo a “planejada” Curitiba apresenta números significativos se considerarmos sua Região Metropolitana. O diagnóstico sobre as cidades não contraria o fato de que se trata de uma das sociedades mais desiguais do mundo. Até mesmo no contexto da 13 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE América Latina, o Brasil é um campeão de desigualdade. A ocupação desordenada da terra, a falta de controle sobre o uso e a ocupação do solo, a especulação fundiária e imobiliária sem regulação (com a despudorada demonstração de luxo e preconceito), a segregação urbana, o crescimento exponencial de favelas, os desastres decorrentes de desmoronamentos com mortes e até mesmo a alta taxa de impermeabilização do solo causadora de enchentes constantes, são causas articuladas de um processo que tem a valorização imobiliária no seu núcleo central. Não faltam planos e nem leis para contrariar essa cidade partida e reorientar seus rumos. O planejamento urbano é bastante prestigiado nos meios técnicos e até mesmo na grande mídia. Após 2005 teve lugar a produção de um número significativo de Planos Diretores participativos formulados por 1.526 municípios brasileiros. As leis urbanísticas no Brasil figuram entre as mais avançadas do mundo tendo à frente o Estatuto da Cidade aprovado no ano 2001 após muitas lutas dos movimentos sociais reunidos em torno do Movimento Nacional de Reforma Urbana. Ao decidir debater o tema de Cidades Sustentáveis, a FISENGE se encontra diante de um grande desafio: como implementar políticas, planos e programas que rompam com a injustiça urbana e com a predação ambiental que persiste apesar das conquistas institucionais obtidas nos últimos anos? Como vencer os obstáculos que se contrapõem às propostas que ocupam um sem número de teses, agendas, planos, leis, tecnicamente viáveis, socialmente necessários, mas politicamente travados? Esta é a questão. 3 - MUdanÇas no proCesso de UrbaniZaÇÃo. MetrÓpoLes e Cidades Médias. CoMo andaM a HabitaÇÃo e saneaMento O Brasil tem apresentando mudanças acompanhadas de grande impacto territorial decorrentes de sua inserção na economia globalizada na virada do século XXI. O processo de urbanização, historicamente concentrado nas faixas litorâneas, apresenta mudanças. A partir de 1980 o IBGE evidencia a reorientação dos fluxos migratórios. As cidades do Norte e do Centro-Oeste passam a crescer a taxas mais altas e, além disto, as cidades de porte médio (entre 100 mil e 500 mil habitantes) crescem proporcionalmente mais do que as metrópoles. Esse fenômeno, crescimento das cidades de porte médio, se dá tanto no que se refere à população quanto à economia. Enquanto a população das cidades grandes cresceu 1,43% e a das cidades pequenas 1,15% ao ano, entre 2000 e 2007, as cidades de porte médio cresceram 2,06% no mesmo período. Quanto ao Produto Interno Bruto (PIB), as cidades de porte médio apresentaram crescimento de 5,3% ao ano entre 2002 e 2006, ao mesmo tempo em que o crescimento do PIB nacional ficou aquém de 3,2% ao ano em média5. 14 A CIDADE SUSTENTÁVEL A região Sudeste perde peso relativo na economia brasileira. O indicador de Valor da Transformação Industrial (VTI) mostra que a importância da Região Metropolitana de São Paulo passou de 43,5% em 1970 para 22,0% em 2005. O VTI do estado de São Paulo passou de 58,1% em 1970 para 44,0% em 2005. O VTI da região Sudeste passou, como um todo, de 80,7% em 1970 para 61,8% em 2005, perdendo importância relativa se comparado a todas as demais regiões do país6. Entretanto, apesar das mudanças, trazidas especialmente pelo agronegócio ancorado na exportação de commodities, a concentração econômica e as desigualdades regionais persistem acentuadamente. O mesmo vale quando olhamos para as cidades. Os dados não nos autorizam a negar a característica de concentração de pessoas e poder econômico nos grandes pólos configurados nas principais metrópoles e nelas uma desigualdade muito acentuada, como evidenciam estudos do Observatório das Metrópoles. Como mostra a Tabela 1 abaixo, nas 15 metrópoles mais populosas em 2010 residiam cerca de 36% da população total do país, o equivalente a 69 milhões de habitantes, segundo dados do Censo de 20107. Metrópoles brasileiras – população ibge/2010 Metrópoles Habitantes São Paulo 19.672.582 Rio de Janeiro 11.602.070 Belo Horizonte 4.882.977 Porto Alegre 3.960.068 Brasília 3.716.996 Curitiba 3.168.980 Salvador 3.353.704 Recife 3.688.428 Fortaleza 3.525.564 Campinas 2.798.477 Manaus 2.021.722 Goiânia 2.091.335 Belém 2.040.843 Vitória 1.685.384 Florianópolis total metrópoles 877.706 69.086.836 Fonte: Observatório das Metrópoles, 2004 e 2009. ____________ 5 Motta, D.M. e Matta, D. Dinamismo das Cidades Médias Brasília: IPEA, 2010. Ver ainda Campolina Diniz, Fórum Fiscal, Brasília 2008. 7 Ver sítio www.ibge.gov.br 6 15 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE As duas maiores e mais importantes metrópoles localizam-se na região que continua sendo a mais rica e dinâmica do país – o Sudeste – e, juntas, detêm pouco mais de 23% da população urbana total e mais de 45% da população das 15 regiões apresentadas na Tabela 1. É preciso reconhecer que a urbanização no Brasil, contribuiu positivamente com a evolução de alguns indicadores ao longo do século XX e início do século XXI. Entre os exemplos destacam-se a diminuição da mortalidade infantil (de 150 mortes para cada mil nascidos vivos em 1940 para 23,3 em 2008), a melhoria da expectativa de vida (de 40,7 anos de vida média em 1940 para 72,8 em 2008), a diminuição da taxa de fertilidade8 (de 6,16 filhos por mulher em idade fértil em 1940 para 1,86 em 2008) e o aumento muito significativo da escolaridade da população (55,9% de analfabetos em 1940 para 10% em 2007). Segundo relatório da UN-Habitat9, a América Latina e o Caribe constituem-se terra da desigualdade: os coeficientes de Gini das zonas urbanas desta região estão entre os mais altos do mundo. No nível das cidades, as mais desiguais da região (Américas e Caribe) incluem as brasileiras Goiânia, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza e São Paulo, e a cidade colombiana de Bogotá – todas com coeficiente de Gini acima de 0,60, o que é considerado um padrão extremamente alto em termos de comparação internacional (regiões urbanas comparáveis da Índia apresentavam em 2005, cerca de 0,37, por exemplo). Estes coeficientes de desigualdade estão muito próximos dos seguidos por outras cidades brasileiras como Rio de Janeiro e Curitiba, pouco abaixo de 0,6. Segundo a mesma fonte, outras cidades latino-americanas como Buenos Aires, Santiago, Quito, Guatemala, México apresentavam coeficientes de Gini entre 0,50 e 0,55 – melhor colocadas que as brasileiras. O déficit habitacional estimado em 2007 corresponde a 6,3 milhões de domicílios, dos quais 5,2 milhões referem-se a regiões urbanas, de acordo com dados do Ministério das Cidades e Fundação João Pinheiro10. Quase 90% do déficit habitacional refere-se à população com rendimentos na faixa de zero a três salários mínimos. A população moradora de favelas cresceu mais do que o conjunto da população urbana durante as décadas de 1980 e 1990. De acordo com o IBGE, 82% da população ____________ 8 Portanto abaixo do nível mínimo de reposição da população, considerado de 2,1 filhos por mulher. No Sudeste esta taxa estava em torno de 1,62 filhos por mulher. Fonte: IBGE: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_impressao.php?id_noticia=1233 9 UN-HABITAT – United Nations Human Settlement Programme. State of the world’s cities 2008/2009. Harmonious cities. London: Earthscan: IIED, 2008. 10 4 Brasil. Ministério das Cidades. Déficit habitacional no Brasil 2007. Em: http://www.cidades.gov.br/secretariasnacionais/secretaria-de-habitacao/biblioteca/publicacoes-e-artigos/DeficitHabitacional.zip/view 16 A CIDADE SUSTENTÁVEL brasileira moradora de favelas (habitações subnormais) estavam nessas 11 metrópoles que concentram também 33% do déficit habitacional ou o equivalente a 2.192.296 unidades. Mais da metade dos moradores de favelas estão nas metrópoles de São Paulo e Rio de Janeiro o que afirma esse padrão de crescimento, modernização, concentração de poder e riqueza e a manutenção de relações atrasadas e pobreza. Apesar da ampliação do acesso à água tratada, 5% da população urbana e 18,8% da população brasileira não fazem parte desse quadro, o que soma 37,6 milhões de pessoas, que corresponde a dez países do tamanho do Uruguai11. Na área de esgotamento sanitário a situação é desesperadora, pois coletamos 52% dos esgotos produzidos na área urbana e tratamos apenas 65%. Significa dizer que 96 milhões de brasileiros não são atendidos com sistema de esgotamento sanitário e contribuem para o quadro dantesco de poluição hídrica. Com base na totalidade dos esgotos gerados pela população brasileira, o índice de tratamento é de apenas 35%, ou seja, 65% dos esgotos produzidos, sem tratamento, contribuem, de maneira decisiva, para a poluição dos rios e mares transformando-se em um dos principais veículos de transmissão de doenças, ampliando a proliferação de vetores e de reservatórios de doenças infecto-contagiosas. A coleta domiciliar de lixo está marcada por um padrão questionável, como evidencia o abandono dos bairros pobres, e o destino final dos resíduos constitui o maior problema. A drenagem e macrodrenagem urbanas constituem um capítulo à parte que requer atenção dos profissionais de engenharia. As soluções ainda preconizadas na maioria das obras, mais agravam o problema ao invés de resolvê-los. Tamponamento de córregos para a construção de avenidas em fundos de vales, marginais nas áreas lindeiras de rios e córregos são modelos seguidos em todo o Brasil, durante décadas, que contribuíram para a impermeabilização da superfície urbana e ocorrência tão frequente de enchentes. Após décadas de erros que apressaram o fluxo das águas pluviais para as calhas urbanas, trata-se de retardá-lo e outra solução paliativa ganha status de modelos que são disseminados de uma cidade para outra – “os piscinões” – contribuindo para a felicidade de um certo empresariado que oferece soluções rápidas aos governantes de plantão. Enquanto isso, o padrão de ocupação do solo permanece inalterado e a impermeabilização avança guiada especialmente pela matriz rodoviarista ou pelo império do automóvel. Este merece um destaque neste documento. ____________ 11 Brasil. Ministério das Cidades. Diagnóstico dos serviços de água e esgoto. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades / SNIS. Brasília, 2008. Disponível em: http://www.snis.gov.br/ 17 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE 4 - o aUtoMÓVeL reina soberano. o transporte CoLetiVo CaMinHa para a rUÍna De todos os fatores que contribuem para a piora na condição de vida das metrópoles, o modelo de mobilidade baseado na matriz rodoviarista, especialmente no automóvel, e o relativo desprezo pelo transporte coletivo são, talvez, os de maior impacto. Em 2008, o Brasil produziu aproximadamente 2,8 milhões de automóveis de passageiros e comerciais leves. Estima-se que em 2010 a produção tenha sido de aproximadamente 2,9 milhões e, em 2015, será de 3,9 milhões, a maior parte dos quais fica no país, que por sua vez, segundo estimativas, será o terceiro mercado mundial consumidor de automóveis até o fim da década12. O produto das indústrias automobilísticas equivaleu a 13% do PIB em 1999 e 19,8% do PIB dez anos depois, em 2009. Em 2008 a indústria automobilística mundial produziu 66 milhões de unidades e em 2015 estima-se que vá produzir 82 milhões. As indústrias automobilísticas estão se voltando para os países “emergentes” para onde tem sido orientada a produção e o consumo dos veículos e não apenas em busca da mão de obra barata. O automóvel é o fator urbano de maior impacto no aquecimento global, idem na qualidade do ar nas cidades, induz a ocupação espraiada do solo, é um dos maiores responsáveis pela impermeabilização do solo (causa principal de enchentes), atua como oposição ao transporte coletivo de massa, ao pedestre e à mobilidade baseada em veículos não motorizados, além de ser uma das maiores causas de mortes ou incapacitação para o trabalho devido ao número de acidentes que em 2005 totalizaram 35.753 óbitos e 123.061 internações a um custo de R$ 118 milhões (SUS – Ministério da Saúde). Em dez metrópoles brasileiras 38,1% das viagens são feitas a pé13. No entanto, o automóvel continua sendo um dos itens de maior investimento por parte das prefeituras e governos estaduais, tendência orientada pela visibilidade das obras e compromissos de financiamento de campanhas eleitorais. Comparado ao transporte coletivo os automóveis são responsáveis por 83% dos acidentes e 76% da poluição. O custo das horas de trabalhadores parados em trânsito congestionado pode atingir 10% do PIB de uma metrópole, como comprovou pesquisa desenvolvida em 2008, pela Fundação Getúlio Vargas para a cidade de São Paulo. Dados da Associação Nacional de Transporte Público (ANTP) mostram que autos, motos e táxis recebem de R$ 10,7 a R$ 24,3 bilhões/ano de subsídios (86%), enquanto o transporte público recebe R$ 2,0 a R$ 3,9 bilhões (14%)14. ____________ 12 13 14 Segundo a PricewaterhouseCoopers, 2010. Fonte ANTP, elaboração IPEA. Revista Desenvolvimento. IPEA, ago 2009. AFFONSO, N.S. Automóveis e sustentabilidade. Revista Desenvolvimento. IPEA ago 2009 . 18 A CIDADE SUSTENTÁVEL Durante a crise global de 2008 a indústria automobilística recebeu subsídios públicos em vários países do mundo, incluindo o Brasil. No entanto, em que pesem os números inéditos de venda de automóveis entre nós, os recursos investidos pelas montadoras no país ficaram aquém da remessa de lucros que estas enviaram ao exterior: entre 2008 e 2010 as empresas automotivas enviaram, entre remessas de lucros e dividendos, US$ 12,4 bilhões diante de investimentos externos de US$ 3,6 bilhões15. 5 - o iMpaCto das poLÍtiCas neoLiberais no aproFUndaMento da tragédia Urbana brasiLeira e a retoMada do desenVoLViMentisMo O ideário neoliberal que acompanhou a reestruturação produtiva do capitalismo deixou uma herança nas cidades dos países emergentes ou não desenvolvidos do mundo capitalista que serão necessários muitos anos de investimentos, caso eles aconteçam, para neutralizar seu impacto. A queda do crescimento econômico, o desemprego, o aprofundamento da informalidade, o aumento da violência, o aumento de crianças abandonadas, o aumento dos moradores (e até de famílias) nas ruas, o crescimento das favelas, mas especialmente o recuo das políticas públicas e sociais em contexto de significativo crescimento urbano, como verificado na América Latina, marcaram as duas últimas décadas do século XX e início do século XXI16. Se a reestruturação produtiva com a precarização do trabalho e fim do Welfare State significou ampliação da desigualdade nas cidades dos países centrais, entre nós, que nunca conhecemos a universalização de direitos como a previdência social, o impacto foi mais profundo. O que havia de acúmulo de capacidade técnica e administrativa no aparelho de Estado – que não era muita – foi desconstruída especialmente a partir do governo de Collor de Mello. Isso se deu especialmente na habitação, no saneamento e nos transportes urbanos17. As propostas de desregulamentação ou privatizações evidentemente constituíram-se em fracassos nos casos das políticas sociais. Embora a partir de 2003 o Brasil passe a apresentar políticas públicas voltadas para a distribuição de renda, como foi o caso da Bolsa Família ou aumento real do salário mínimo, foi somente a partir de 2006 que se verifica uma clara agenda desenvol____________ 15 Ver de SARTI, F. e HIRATUKA, C. Gasto público, lucro privado. In Revista Carta Capital. 16/fev.2011. Ver a respeito: um quadro internacional em DAVIS, M. Planeta Favela. São Paulo: Boitempo. 2006. Para o Brasil, ver dados sobre a piora nas condições de vida urbana, MARICATO, E. O impasse da política urbana. Petrópolis: Vozes, no prelo. 16 19 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE vimentista em oposição à agenda neoliberal. Em maio de 2007 é lançado o primeiro Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) com previsão de investimentos de R$ 503,9 bilhões em logística (rodovias, ferrovias, portos, hidrovias, aeroportos), energia (geração, transmissão, combustíveis renováveis, petróleo e gás natural), sociais e urbanos (luz para todos, habitação, saneamento e recursos hídricos). O PAC rompia com a regra de fogo do ajuste fiscal antes determinado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) de contabilizar no superávit primário as despesas com essas obras. Esse artifício permitiu que o Estado brasileiro retomasse o investimento em obras de infraestrutura econômica e social o qual estava praticamente abandonado há quase três décadas. Ainda na agenda para as cidades, em 2009 o governo federal lança o Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida. Ao mesmo tempo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) avança decisivamente no financiamento de investimentos industriais e na infraestrutura. Em 2004 a participação do BNDES nesses investimentos era de 19%; em 2009 chegou a quase 40% totalizando R$ 137,4 bilhões. Essa orientação permitiu a concentração de capitais em torno de algumas empresas – ou fusões de empresas – que passaram a figurar entre os maiores conglomerados transnacionais do planeta. O BNDES e, portanto, o Estado brasileiro tornou-se sócio do Bradesco, Brasken, Brasil Foods (fusão da Sadia com a Perdigão), Coteminas, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Embraer, Gerdau, Itaú, JBS, Klabin, Marfrig e Vale. O crescimento econômico, com impacto sobre o crescimento do emprego, e as políticas públicas distributivas contribuíram para mudar o quadro da distribuição da renda no Brasil, durante os governos do presidente Lula. A Segundo a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), foram gerados 1,77 milhões de empregos apenas em 200918. Considerando os rendimentos do trabalho, aumento do emprego, ganhos da previdência (que, ao contrário do que quer a agenda neoliberal, não são regressivos) e a política assistencial, entre 2001 e 2008, o número de pobres no Brasil caiu de 57 milhões para menos de 30 milhões de pessoas19. Quanto ao número de indigentes ou pobreza extrema, o número é mais efetivo e caiu de 36 milhões de indivíduos para 12 milhões ou 3,6 milhões de famílias, no mesmo período. Isso significa que a proporção de indigentes que era no começo do período 19,2% da população, cai para 6,5%20. ____________ 17 18 19 20 Ver a respeito: MARICATO, E. Metrópoles desgovernadas. Revista IEA. São Paulo/USP, abril 2011. http://blog.planalto.gov.br/brasil-gera-17-milhao-de-empregos-no-ano-da-crise-economica-mundial/ Conceito de pobreza utilizado nessa medição: US$ 2,5 por dia per capita. Fonte: PNAD/IBGE com dados manejados por Lena Lavinas, 2010. 20 A CIDADE SUSTENTÁVEL O salário mínimo teve reajuste nominal de 155% e aumento real de 73% (acima da taxa de inflação calculada pelo INPC/IBGE) de janeiro de 2003 a março de 201021. Em dezembro de 2008, o Bolsa-Família chegava a 11.353.445 famílias com recursos no valor de R$ 10,9 bilhões22. Outros programas também ajudaram a irrigar recursos para as camadas mais pobres da sociedade: Luz para Todos, Pro-UNI, Crédito Consignado, PRONAF, Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), entre outros. Apesar desses números, que podem ser atribuídos tanto a iniciativas internas quanto (especialmente o crescimento econômico) à expansão capitalista que privilegiou os chamados países emergentes, a distribuição de renda no Brasil continua a apresentar índices inaceitáveis. O Coeficiente Gini, indicador universal aprovado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que mede a desigualdade social, passou de 0,587 em 2002 para 0,539 em 200923. Apesar da queda da taxa de juros nos anos do governo Lula, o Brasil mantém a taxa mais alta do mundo com impacto decisivo sobre os gastos federais. O estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) “Distribuição funcional da renda no Brasil: situação recente” baseado na PNAD/IBGE revela que de 2000 a 2007 o Brasil gastou com os serviços da dívida mais do que o dobro do que gastou com educação, saúde e investimentos, de um modo geral. Sete por cento do PIB são comprometidos com juros da dívida, um verdadeiro ralo de recursos públicos transferidos como renda de propriedades24. Essa constatação envolve uma clara disputa que está presente na sociedade brasileira há muitos anos e ainda permanece viva em 2011. De um lado estão os representantes do capital financeiro e dos veículos de comunicação ligados ao mainstream, repetindo ad nauseam, como um mantra, a necessidade de aumento dos juros e de cortes dos gastos públicos por meio da diminuição do aparelho de Estado e das políticas sociais. De outro, há a constatação de que o Estado brasileiro não é o apregoado elefante superdimensionado, de que a taxa de juros pode ser outra, e os investimentos em educação e saúde, entre outras políticas sociais, precisam ser ampliados25. ____________ 21 Informações extraídas de BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Comunicação Social. Destaques: ações e programas do Governo Federal / Secretaria de Comunicação Social – Brasília, 2010. 22 Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. 23 Dados extraídos de Apresentação de Jorge Abrahão de Castro na 1º Conferência Nacional de Políticas Públicas – UFRN e USP, em Natal, nov. de 2010 24 er a respeito entrevista de Marcio Pochmann para o jornal Brasil de Fato. 20 a 26 nov. 2008. 25 Ver a respeito da possível e necessária diminuição da taxa de juros os artigos de Amir Khair no jornal O Estado de São Paulo, entre janeiro e abril de 2011. 21 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE Além do mais, condições estratégicas que mantém a desigualdade social e econômica não foram tocadas. Para citar apenas duas, o lucro dos bancos nesse período aumentou (420% em relação à era FHC) atingindo recordes no ano de 2010, e a questão da terra ficou intocada, no campo ou na cidade. A queda no desemprego e a distribuição de renda contribuem para a melhoria da vida urbana embora, como veremos adiante, não é suficiente. Nas cidades lidamos com uma variável que é o território. Sem tocar na questão fundiária, o direito à cidade fica travado como veremos adiante. 6 - o prograMa de aCeLeraÇÃo do CresCiMento (paC), o prograMa MinHa Casa, MinHa Vida (MCMV) e o pLano diretor partiCipatiVo: UMa agenda para as Cidades? A análise do conjunto de obras que compõem o PAC mostra que ele não inova no que se refere a uma nova atitude em relação à questão ambiental, especialmente no que se refere à energia. De fato várias mega obras relacionadas à infraestrutura econômica foram resgatadas da antiga orientação seguida pelo Regime Militar, contrariando a necessidade de repensar um plano inovador orientado por uma nova atitude – sustentável – de planejamento de Estado. Na área do saneamento ambiental, conquistas da primeira equipe que ocupou a Secretaria Nacional do Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades foram perdidas e obras insustentáveis – como o tamponamento de córregos e impermeabilização de calhas de vales – tiveram financiamentos retomados, repetindo erros dos anos da ditadura. O mesmo felizmente não se pode dizer das obras do PAC de habitação. Elas constituíram uma inovação como prática do governo federal. O PAC-Habitação priorizou a urbanização de áreas precárias investindo na construção de bairros saneados sem a remoção da maior parte da ocupação já consolidada. Pela primeira vez na história do país, as chamadas obras de urbanização de favelas atingem uma importância e escala sem precedentes. Esse programa dialoga com a cidade real, com o passivo urbano, com a cidade informal repassando recursos para prefeitos recuperarem bairros inteiros, verdadeiros focos de epidemias e insalubridade. O Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) não seguiria essa lógica. Dialogando fortemente com o setor empresarial do mercado residencial (incorporadores e construtores), carreando recursos financeiros inéditos – oriundos do FGTS, do SBPE e subsídios orçamentários – mas deixando intocada a base fundiária, o MCMV contribui para repetir erros e falhas verificados durante o período de vigência do Banco Nacional da Habitação (BNH) e do Sistema Financeiro da Habitação (SFH). 22 A CIDADE SUSTENTÁVEL O impacto dos recursos financeiros na base fundiária e imobiliária, deixada intocada pelos governos locais, isto é, sem controle ou regulação, causou um súbito aumento do preço da terra e dos imóveis em todas as principais cidades brasileiras após seu lançamento em 2009 e 2010. Nos municípios periféricos do Rio de Janeiro e de São Paulo o preço do metro quadrado aumentou mais de 50% em (2) dois anos, enquanto que o imóvel usado aumentou mais de 30%. Um movimento fortemente especulativo reafirma a tendência socialmente excludente das cidades brasileiras embora os recursos drenados para o mercado tenham o efeito de permitir sua ampliação, isto é, notase a inserção de uma classe média que até então, apesar de constituir força de trabalho regularmente empregada, como policiais militares, professores secundários, bancários, se encontrava fora do mercado26. Os mais pobres, que compõem 90% do déficit habitacional, continuam a ocupar, quase como regra, conjuntos habitacionais situados fora da cidade acarretando mais problemas do que soluções para o mercado de terras, para o transporte urbano, para o isolamento social dessas famílias, acarretando o desenvolvimento de patologias, como já mostrou vasta bibliografia. De acordo com a Constituição Federal de 1988 e com a lei federal Estatuto da Cidade de 2001, caberia principalmente às prefeituras municipais o controle sobre a especulação fundiária e imobiliária, assegurando a função social da propriedade e da cidade por meio do Plano Diretor. Entretanto, apesar da Campanha do Plano Diretor Participativo desenvolvida pelo Ministério das Cidades a partir de 2005 ter assegurado a elaboração de 1.526 Planos Diretores por municípios brasileiros, sua eficácia tem se revelado sofrível27. Mais do que lei ou plano, a correlação de forças sociais é que pode assegurar a aplicação da função social da propriedade, um limitante ao direito de propriedade que contraria a história do país, onde patrimônio sempre esteve ligado ao poder político, econômico e social. O planejamento urbano ou as peças de Planos Diretores têm sido bastante prestigiadas entre nós, seja pela mídia, seja pelos profissionais, seja pela academia, e seja até, ultimamente, por lideranças populares formadas em “cursos de capacitação”. Mas, como destaca uma razoável, porém ignorada, bibliografia com des- ____________ 26 Impacto nos preços dos imóveis, conforme pesquisas realizadas pela autora. Conforme anúncio, o MCMV 2 pretende destinar 1,2 milhão, dos 2 milhões de unidades a serem financiadas, para as faixas de renda situadas abaixo ou igual a três s.m. O preço da terra constituirá um grande obstáculo para a boa localização dessas unidades caso elas sejam, de fato, construídas. 27 Ver a respeito: SANTOS Jr, O. e MONTANDON, T. Os planos diretores municipais pós Estatuto da Cidade: balanço crítico e perspectivas. Rio de Janeiro: Letra Capital/Ministério das Cidades, 2011. 23 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE taque para os escritos do professor Flavio Villaça, no Brasil, o papel dos PDs têm sido mais ideológicos do que efetivos28. Frequentemente eles desviam a atenção dos reais interesses que orientam o crescimento urbano com exclusão social, confinando o debate a instrumentos jurídicos ou medidas burocráticas. É preciso desmistificar a importância real que os Planos Diretores têm tido no destino das cidades brasileiras, especialmente no nível dos poderes municipal e metropolitano, retomar o debate crítico sobre os programas dispersos e insuficientes do governo federal para então reorientar a construção social de uma política urbana sustentável. 7 - o MoViMento soCiaL de reForMa Urbana, as ConQUistas institUCionais, a aMpLiaÇÃo da partiCipaÇÃo e o iMpasse atUaL A proposta de Reforma Urbana foi formulada no ano de 1963 em consonância com outras propostas de Reformas – Agrária, da Educação, da Saúde, Política, Administrativa – que ocupavam as forças vivas e organizadas da sociedade brasileira. A América Latina passava por uma conjuntura especial e buscava sua emancipação política para fugir ao poder do império. Sabemos pelo que aconteceu em 1964 qual foi o desfecho histórico e o que aconteceu com as forças que se encontravam em disputa por diferentes modelos de sociedade. Durante a luta contra a ditadura militar, pela retomada de um Estado de Direito, a proposta de Reforma Urbana foi resgatada mantendo em seu núcleo central a questão fundiária urbana. Nas décadas que se seguiram aos anos 60 o país passou a ser predominantemente urbano e os problemas acarretados por um processo de urbanização veloz e predatório ganharam dimensões cada vez maiores. O movimento social que foi organizado em torno da proposta de Reforma Urbana reuniu uma gama importante de lideranças composta de uma diversidade expressiva de agentes políticos. Lideranças sociais, sindicais, profissionais (arquitetos, engenheiros, sanitaristas, advogados, assistentes sociais etc.) além de pesquisadores, acadêmicos, parlamentares, ONGs, até prefeitos ou integrantes do Executivo. Esse movimento social ganhou representantes nas câmaras municipais, no Congresso Nacional, nas prefeituras municipais com a eleição de militantes ligados a ele. Nas prefeituras, ainda na vigência do Regime Militar, nos anos 80, tem início novas práticas de governo nas cidades que incorporavam a participação social como o orçamento participativo e os conselhos locais e setoriais. A orientação de inclusão social ____________ 28 Ver especialmente de VILLAÇA, F. As ilusões do Plano Diretor. http://www.flaviovillaca.arq.br/pdf/ilusao_pd.pdf 24 A CIDADE SUSTENTÁVEL no território levou a novas atitudes, como as obras de urbanização e saneamento em favelas e as tentativas de regularização fundiária. Novos sujeitos sociais se formaram nesse processo que acompanhou a democratização do país. A lista de conquistas do movimento de Reforma Urbana é respeitável e tem início com a Constituição Federal (CF) de 1988, que incorpora dois artigos sobre o tema das cidades. O Estatuto da Cidade, lei federal de 2001, que regulamenta os capítulos da CF, registra a proeza de limitar o direito de propriedade individual e subordiná-lo à sua função social prevista na Constituição. Em 2003 foi criado o Ministério das Cidades e com ele as Conferências Nacionais das Cidades e o Conselho das Cidades. Em 2005 foi aprovada uma lei federal que regulamenta os Consórcios Públicos. Em 2007 foi aprovada lei federal que constitui o novo marco regulatório do saneamento básico. Essa última lei pôs fim a um período de quase duas décadas de vazio institucional na área do saneamento, quando forças pró e contra a privatização se enfrentaram nos bastidores das disputas entre interesses públicos e privados. Ganha importância nesse quadro o papel da Frente Nacional do Saneamento à qual deve ser creditada a defesa do caráter público do saneamento no Brasil. Em 2010 foi aprovada a lei federal de Resíduos sólidos. A retomada dos investimentos em habitação e saneamento teve início em 2003 e 2004, porém foi com o PAC e o MCMV, que a escala ganhou mais expressão tendo em vista a orientação desenvolvimentista. Enquanto se processa um movimento de retomada dos investimentos e a ampliação dos espaços de participação em um grande número de Conselhos setoriais – Saúde, Criança e Adolescente, Educação, Habitação, Cidade, entre muitos – o movimento ligado à Reforma Urbana parece ter perdido a antiga unidade, independência, força e ofensividade. Como já foi afirmado, mais do que planos ou leis, o que parece orientar o crescimento das cidades são as obras esparsas de infraestrutura definidas por empreiteiras em consonância com os governantes de plantão, a especulação imobiliária que, com investimentos públicos, abre novas frentes de expansão condenando parte das cidades à deterioração, com especial destaque para a matriz rodoviarista. O que temos são obras sem planos e planos sem obras. O Plano/discurso, expressão cunhada por Flávio Villaça, é menos efetivo na indução do rumo tomado pelas cidades do que as obras esporádicas de infraestrutura ou do que a influência exercida pelo capital imobiliário. Nos anos muito recentes registra-se uma sensível tendência de queda da taxa de pobreza em algumas metrópoles. A taxa de pobreza que era em abril de 2004 de 42,7% do total da população para as seis principais regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre) caiu para 30,7% em março de 2009. Isso significa que uma quantidade significativa de pobres reduziu-se no período 25 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE – fenômeno que não ocorria há décadas29. Mas para a conquista de cidades justas, ou para a conquista do direito à cidade, não basta a distribuição da renda como vimos, especialmente num contexto de aumento exagerado no preço dos imóveis – terrenos e imóveis edificados – promovido pela disponibilidade de recursos para o financiamento residencial. Cabe reconhecer que com o programa Minha Casa Minha Vida há uma tendência para a ampliação do mercado especialmente em direção à classe média e média baixa (entre cinco e dez s.m. aproximadamente). Entretanto, necessário frisar também que o mesmo programa gera outros impactos e tende a não ser capaz de reverter a estrutura de exclusão social e urbana marcada pelo espraiamento na ocupação do solo e pela localização dos pobres em periferias distantes das áreas urbanas consolidadas. A escala das unidades destinadas à baixa renda – 90% do déficit está concentrado nessas faixas de renda – também não permite constatar aí um impacto significativo. 8 - sobre a ForMaÇÃo do engenHeiro Muito já se escreveu sobre a necessidade da formação do engenheiro superar a mera repetição de técnicas e fórmulas para alcançar o estágio criativo e crítico que a contextualização histórica e social exige num país como o nosso30. Autores que estudaram a sociedade brasileira como Sergio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes, Celso Furtado, Roberto Schwarz, Mario Schenberg, entre outros, chamaram a atenção para o prestígio obsessivo das ideias que vêm do exterior e o desprestígio daquilo que se desenvolve originalmente no país. Essa tradição de dominação cultural, intelectual, científica e tecnológica dificulta o acúmulo de conhecimento e a solução de problemas locais. Doenças tropicais, como a de Chagas, ainda esperam a cura ao mesmo tempo em que nossas universidades buscam parcerias com pesquisadores e temas que interessam, no mais das vezes, aos países desenvolvidos quando não aos conglomerados transnacionais31. Nossas cidades repetem “soluções”, inspiradas no capitalismo central, que são um verdadeiro conjunto de “ideias fora do lugar”. A maior parte dos estudos realizados fora do país e financiados com recursos públicos, ____________ 29 Pochmann, M. Pobreza e crise econômica: o que há de novo no Brasil metropolitano. Nota Técnica. IPEA. Rio de Janeiro, 2009. Em: http://www.observatoriodorecife.org.br/site/wpcontent/uploads/Ipea_Pobreza%20e%20 Crise%20Economica_2009.pdf 30 Ver a respeito: SANTOS, A. V. de “A percepção de nossos engenheiros: questões impertinentes e o campo CTS. Publicado pelo SENGE - BA em 27 de janeiro de 2009. 31 Ver a respeito: A tragédia das doenças esquecidas. In Revista Problemas Brasileiros, nov/dez. 2009. 26 A CIDADE SUSTENTÁVEL se dá em países do capitalismo central.32 Apenas recentemente, seguindo esforço da diplomacia brasileira, é que poucos pesquisadores começam a dar prioridade às parcerias entre os chamados países do sul, como é o caso do comitê Índia/Brasil, África do Sul (IBSA). Florestan Fernandes lembrou que as escolas profissionais – direito, engenharia e medicina – foram criadas, no Brasil, no século XIX ou começo do século XX, contraditoriamente, sem um sentido prático. Elas eram dirigidas aos filhos de uma elite que não precisava do saber prático ou do mérito para abrir seu caminho no mundo. Os alunos já eram “doutores” por conta da origem social. Uma certa alienação do ensino em relação à realidade social, territorial e ambiental tornou-o abstrato e complexo enquanto que problemas simples nunca tiveram a centralidade adequada. No Brasil discutem-se normas que frequentemente carregam excesso de detalhes (vide Códigos Municipais de Obras e Edificações ou leis de zoneamento) ao mesmo tempo em que uma parte significativa e esquecida das cidades não segue norma nenhuma. O saber livresco, o saber dos gabinetes, é mais notável na área do direito, mas também está presente nas demais áreas e tem marcado muito o desenvolvimento do conhecimento nas universidades. Nas últimas duas ou três décadas o desenvolvimento tecnológico se destacou, no Brasil, em áreas específicas da engenharia, agronomia, geologia, a ponto de competir em escala global. A produção de grãos, carnes, celulose, etanol, aviões, ganhou alta produtividade. Todo o conhecimento envolvido na prospecção e agora na exploração do petróleo do Pré Sal foi desenvolvido no país, o que não deixa de constituir uma novidade histórica. No entanto, como já foi destacado, o saneamento ambiental constitui uma tragédia marcada até por epidemias com mortes por motivos banais. Os contrastes são profundos. Essa realidade exige a hierarquização dos problemas nacionais que leve em conta o peso social dos mesmos e reoriente o ensino de engenharia para um desenvolvimento científico e tecnológico mais engajado na realidade brasileira. Ao invés do engate passivo no capitalismo globalizado, o país deve ser pensado a partir de uma proposta de desenvolvimento sustentável como sugere documento da FISENGE. A escolha da Amazônia para a realização do Congresso não se dá por acaso já que essa região ocupa um lugar estratégico tanto nacional como internacionalmente. ____________ 32 Apenas recentemente parte dos pesquisadores, seguindo o esforço da diplomacia brasileira, se voltam para parcerias entre os chamados países do sul que apresentam condição urbana semelhante. É o caso do esforço que tenta consolidar o MERCOSUL ou os laços latino-americanos. É o caso também do Comitê Índia, Brasil, África do Sul (IBSA). 27 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE 9 - desaFios, diFiCULdades e perspeCtiVas Há uma quase unanimidade entre urbanistas do mundo todo ao contrapor e defender a “cidade compacta com diversidade de usos” em oposição à cidade dispersa com especialização de usos. Uso misto e mais denso do solo (contrapondo-se aos subúrbios dispersos e condomínios extensivos e fechados), desenvolvimento da economia local e defesa do pequeno comércio, implantação de centros de bairros com oferta de serviços públicos, comunidades com sentido de vizinhança, propiciam viagens curtas que podem ser feitas a pé para acessar a padaria, a lavanderia, o chaveiro, a farmácia, o cabeleireiro... A pegada ecológica é menor (além de propiciar também maior segurança pública como já demonstrou certa bibliografia a começar pelo clássico livro de Jane Jacobs, Morte e vida das grandes cidades). Outros princípios devem ser lembrados como novas formas de tratamento de esgoto e de gestão de resíduos sólidos, novas formas de geração e manejo de energia, respeito à drenagem natural, gestão integrada da água, e, finalmente, as políticas baseadas nos 3R’s (Reduzir, Reusar e Reciclar). Entretanto, a referência aqui é de um modelo abstrato, que até foi implementado em algumas cidades do capitalismo central, mas que está muito distante da realidade dos países periféricos. Aqui encontramos cidades excessivamente impermeabilizadas, (certos bairros ocupados de forma muito adensada apresentando riscos de diversas naturezas), com grande acúmulo de problemas sociais e ambientais que exigem mitigação ou adaptação urgentes. Há um imenso passivo a ser enfrentado. Não cabe desenvolver cada caso, mas ao menos lembrar que deve-se correlacionar as políticas urbana, sanitária, agrícola e ambiental no espaço periurbano e integrá-las com a habitacional e de transporte no espaço intraurbano. Esse processo é de maior impacto socioambiental nas áreas metropolitanas. Por isso, lembremos de diferenciar como essa crise se expressa nas metrópoles e nas pequenas e médias cidades. Por outro lado, as competências para o desenvolvimento urbano, previstas na Constituição Federal, exigem um Pacto Federativo que reúna esforços (incluindo planos, ações e investimentos) dos três níveis de governo, do Legislativo, do Judiciário, do setor privado e da sociedade civil. Nada mais difícil se levarmos em consideração a cultura de competição, descontinuidade e o desprezo pela implementação de planos entre nós. Elaborar planos resulta inútil se eles não são implementados para o conjunto da cidade. A FISENGE pode e deve afirmar uma agenda política para cidades sustentáveis, mas ela será mais um documento cheio de boas intenções, como tantos outros, se não for acompanhado de uma perspectiva crítica que aponte o que impede a implementação dessa agenda. 28 A CIDADE SUSTENTÁVEL Afirmar mais uma vez, a necessidade da prioridade do transporte coletivo ou da universalização do saneamento básico não vai mudar a realidade, enquanto orçamentos públicos, em diversos níveis, priorizam investimentos para a circulação de automóveis. No Brasil temos instrumentos legais importantes para planejamento e gestão da cidade sustentável. • os planos diretores municipais participativos, que visam a implantação da função social da cidade e da propriedade; • os planos locais de saneamento, conforme a lei federal 11.445 de janeiro de 2007, que institui as diretrizes nacionais do saneamento básico, regulamentada pelo Decreto 7.217 de 21 de junho de 2010; • Os planos de resíduos sólidos conforme lei federal 12.305 de 02/08/2010; • a política ambiental e de recursos hídricos, baseada em conselhos e comitês com participação e controle social; • o acesso aos recursos federais para financiamento de obras de infraestrutura, saneamento e habitação a partir da existência dos planos e de projetos de qualidade; • está em discussão o Plano Nacional para enfrentamento das mudanças climáticas. Se as leis fossem aplicadas e os planos cumpridos muitos dos problemas poderiam ser amenizados. Lembremos ainda que as Conferências Nacionais das Cidades (2003, 2005, 2007, 2010) e o Conselho das Cidades do Ministério das Cidades já registraram um grande número de propostas visando orientar políticas urbanas, metropolitanas, e as políticas setoriais de transporte e mobilidade urbanos, saneamento ambiental, habitação – este tema foi tratado inclusive em um plano nacional, o Plano Nacional de Habitação (PLANHAB) – e os programas especiais para as cidades que tratam dos Planos Diretores, Reabilitação de Áreas Centrais Urbanas e, o que é muito importante, um Programa para Áreas de Risco. Portanto, o que parece faltar é uma iniciativa independente da sociedade civil para reafirmar o que é prioritário e denunciar o que está travando – onde e como – a necessária mudança de rumo para as cidades. Do ponto de vista estritamente territorial, considerando a conflituosa realidade urbana brasileira, antes de mais nada é preciso retomar a centralidade da questão fun- 29 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE diária e afirmar o controle do Estado sobre o uso e a ocupação do solo sem o que não há futuro para cidades que crescem, em parte, desgovernada, orientada por um mercado imobiliário formal especulativo e excludente e na outra parte, também desgovernada, construída pelos próprios moradores livre de qualquer plano ou norma jurídica. Trata-se da “cidade partida”, ou fraturada ou segregada ou simplesmente desigual. Portanto, Justiça urbana e sustentabilidade ambiental exigem a aplicação da FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E DA CIDADE, PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E NO ESTATUTO DA CIDADE. Como sua aplicação se faz por meio do Plano Diretor Municipal, como reza o Estatuto da Cidade, é necessário romper com a cultura do plano/discurso para implementar efetivamente os Planos Diretores, desde que efetivamente comprometidos com esse rumo de justiça ambiental. Não há qualquer alternativa técnica ou jurídica que garanta esse caminho, mas simplesmente a correlação de forças dada pela luta social (daí a importância da FISENGE retomar esse debate e dar o exemplo para outras entidades sociais e sindicais). Esse embate se dá na arena política municipal ou metropolitana, mas uma proposta clara definida nacionalmente é fundamental. Portanto, em escala federal se faz necessário a formulação da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano e da Política Nacional para Regiões Metropolitanas, que oriente a articulação dos esforços nacionais em todas as escalas incluindo Estado e sociedade. Mas não se pode aceitar a ausência de municípios e governos estaduais em relação à política urbana. Para tanto o Ministério das Cidades não pode ser instrumento de trocas clientelistas, mas ser conduzido por uma equipe representativa do conhecimento técnico e empírico acumulado no setor público brasileiro e sensível à busca da justiça urbana. Constatada a centralidade da questão fundiária, outras propostas deveriam seguila. Trata-se de propostas nas áreas de Transporte, Saneamento Ambiental (água, esgoto, resíduos sólidos e drenagem), Habitação e Informação para a gestão. Como foi lembrado, não é por falta de propostas que nossas cidades estão como estão. Mas vale insistir em algumas delas para o debate da FISENGE. AS PRÓXIMAS PROPOSTAS COMPOEM UMA RELAÇÃO INCOMPLETA CUJA CONSOLIDAÇÃO DEPENDERÁ DOS DEBATES REGIONAIS PROMOVIDOS PELA FISENGE. ALGUMAS DESSAS PROPOSTAS TIVERAM ORIGEM NA REUNIÃO DA DIRETORIA REALIZADA NO RIO DE JANEIRO NO DIA 30/04/2011 MobiLidade Urbana e transporte CoLetiVo Afirmar o transporte urbano como tema de agenda nacional. Buscar aprovação do marco nacional de Mobilidade no Congresso Nacional. 30 A CIDADE SUSTENTÁVEL Prioridade ao transporte coletivo e transporte não motorizado. Ampliar rede de corredores exclusivos para ônibus. Ampliar transporte sobre trilhos. Ampliar rede de transporte não motorizado. Integrar as linhas de ônibus, às ferrovias, aos metrôs, aos corredores exclusivos de ônibus e ciclovias combatendo irracionalidades e superposições. Elaboração e implantação de Planos Metropolitanos de Transportes articulados com plano de uso e ocupação do solo nas RMs. Ampliar a segurança do pedestre com a construção de calçadas nos bairros de periferia e ampliar a sinalização urbana em toda a cidade com especial atenção ao pedestre, idosos e crianças. Criar um fundo de mobilidade urbana municipal com recursos provenientes da CIDE – combustível, de pedágios urbanos e estacionamentos visando equilíbrio e tarifas e investimentos. saneaMento aMbientaL Implementar o marco regulatório do Saneamento, lei federal 11.445 de janeiro de 2007. Implementar a lei federal de resíduos sólidos, 12.305 de 2010. Integrar os sistemas de drenagem, abastecimento de águas, esgotamento sanitário, limpeza urbana, gestão de resíduos, uso do solo e legislação ambiental. As obras públicas e privadas devem estar em consonância com essa integração. Integrar um sistema de operação e fiscalização desses sistemas Promover políticas públicas visando manter ou recuperar a permeabilização da superfície do solo à água de chuva no interior de uma bacia hidrográfica. Controlar a impermeabilização nas intervenções sobre o ambiente construído. Proteger áreas públicas e áreas verdes. Controlar as fontes de poluição incluindo as difusas e proteger as nascentes. HabitaÇÃo Implementação do Plano Nacional de Habitação elaborado pela Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades em 2009, levando em consideração a diversidade regional e urbana no Brasil. 31 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE Implementação do Subsistema de Habitação de Interesses Social descentralizado buscando articular recursos financeiros e instrumentos urbanísticos que garantam a função social da propriedade. Prioridade do sistema social sobre o sistema de mercado. Implementar a função social da propriedade visando combater a especulação imobiliária (controle dos lucros e rendas imobiliários) e promover a ampliação do direito à cidade. Aperfeiçoar o padrão de fiscalização da ocupação das áreas ambientalmente frágeis. Controle do lucro e da renda imobiliários. Elaborar política de desenvolvimento industrial visando a produção normatizada de materiais ambientalmente sustentáveis. Assistência técnica e jurídica gratuita para moradia social. Elaborar e implementar política de qualificação da força de trabalho. Aperfeiçoar fiscalização das condições de trabalho. 32 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE dia 07 – Quarta-feira Credenciamento: Dia 7 – 14:00h às 20:00h Dia 8 – 08:00h às 12:00h 19:00h - Abertura Local: Aquarius Selva Hotel 19:30h – Atividade Cultural 20:00h – Formação da Mesa 21:00h – Palestra de Abertura - “A sociedade que Queremos” 22:00h – Coquetel dia: 08 – Quinta-feira 08:00h - Plenária Inicial: Aprovação do Regimento Interno 08:30h - Alteração no Estatuto 11:30h – Palestra sobre Gênero Almoço: 12:30h 14:00h às 18:30h – Palestra seguida de Debate dos Temas I e II • Tema I: A Cidade Sustentável • Coffe Break • Tema II: Integração da América Latina dia: 09 – sexta-feira 08:00h – Palestra seguida de Debate do Tema III: Energia, Recursos Minerais e Desenvolvimento 11:00h às 13:00h – Trabalho em Grupo 13:00h às 14:00h – Almoço 14:00h - Visita Técnica Hidrelétrica Santo Antônio dia: 10 – sábado 08:00h – Plenária Final • Discussão e deliberação das propostas, recomendações e moções contidas no relatório dos grupos de trabalho; • Discussão e aprovação da Carta de Rondônia; Almoço • Eleição da nova direção da Fisenge; • Escolha do Estado anfitrião do 10º Consenge • Apresentação da nova diretoria da Fisenge; • Posse da Diretoria e do Conselho Fiscal; Encerramento: 16:00h • Festa de Confraternização – 17:00h 96 REGIMENTO INTERNO parágrafo 1º As alterações na programação dos trabalhos do Congresso, se necessárias, só poderão ser efetivadas com a aprovação da maioria dos membros da Comissão Organizadora. CapÍtULo iX - da dinÂMiCa dos trabaLHos art. 15º. - A Plenária Inicial aprovará este Regimento Interno, em especial a respeito da regulamentação e programação dos trabalhos e atividades do 9º CONSENGE. art. 16º. – A Comissão Organizadora, em conjunto com os Sindicatos, elaborará proposta para composição das mesas e das regras da dinâmica dos trabalhos das Plenárias e dos grupos de trabalho. parágrafo 1º - A mesa da cerimônia de abertura será composta pelo Presidente da Fisenge, Presidente do Senge/RO, Presidente do Confea, Presidente do Crea/RO, autoridades dos âmbitos Federal, Estadual e Municipal, representantes do Legislativo e por convidados especiais dentre as autoridades presentes. parágrafo 2º - Os integrantes das mesas dos trabalhos em grupo e das Plenárias deverão ser escolhidos observando-se os seguintes critérios: • ser delegado ao Congresso; • ter experiência em condução de Plenárias; • ter experiência como relator. art. 17º. - Os delegados, os observadores e os convidados serão distribuídos proporcionalmente entre os grupos de trabalho, a critério da Comissão Organizadora, ouvidas as solicitações dos Sindicatos. art. 18º. - Os grupos de trabalho deliberarão conforme estabelecido neste Regimento Interno e suas reuniões constarão de: a) Instalação dos trabalhos por um membro da Comissão Organizadora; b) Escolha da mesa diretora a partir da proposta elaborada pela Comissão Organizadora; 97 9º CONGRESSO NACIONAL DE SINDICATOS DE ENGENHEIROS – CONSENGE c) Apresentação e discussão dos temas, recomendações e propostas, levando em consideração a dinâmica definida pela Comissão Organizadora; d) Aprovação das propostas, recomendações, destaques e moções que comporão o relatório do grupo. parágrafo 1º - Todas as propostas consideradas aprovadas nos grupos serão automaticamente encaminhadas à plenária. parágrafo 2º - As propostas e Moções que obtiverem menos de 30% (trinta por cento) serão consideradas rejeitadas. parágrafo 3º. - Os relatórios dos grupos serão sistematizados, por tema, em relatório geral a ser apresentado na Plenária final. art. 19º. - Discussão sobre os temas nos grupos de trabalho: serão 03 grupos de trabalho. Cada grupo discutirá um tema. art. 20º. – O registro de chapas deverá ser feito até às 09:00h do dia 10 de setembro/11 na secretaria do congresso. art. 21º. - As deliberações das Plenárias constituirão as RESOLUÇÕES do 9º CONSENGE e determinarão as diretrizes para a ação da Fisenge e dos Senges filiados até o próximo Congresso. parágrafo Único – As RESOLUÇÕES do 9º CONSENGE farão parte dos Anais do Congresso que serão editados pela Fisenge para divulgação. CapÍtULo X - dos direitos e deVeres dos deLegados, obserVadores e ConVidados art. 22º. - São direitos e deveres dos delegados: a) Tomar parte nos trabalhos, debater e votar este Regimento, as recomendações, propostas e moções, de acordo com o estabelecido no presente Regimento, nas deliberações da Comissão Organizadora e pela Plenária do Congresso. parágrafo único – Só poderá votar e ser votado para os cargos da Diretoria e do Conselho Fiscal os delegados presentes ao Congresso. 98 REGIMENTO INTERNO art. 23º. - São direitos e deveres dos observadores e convidados: a) Receber credencial, material de divulgação e cópias dos textos base inscritos no Congresso, na conformidade deste Regimento; b) Tomar parte nos trabalhos e debater sem direito a voto, de acordo com o estabelecido no presente Regimento, nas deliberações da Comissão Organizadora e pela Plenária do Congresso. CapÍtULo Xi - das disposiÇÕes gerais art. 24º. - Os casos omissos neste Regimento serão resolvidos pela Comissão Organizadora. parágrafo 1º. - A Comissão Organizadora poderá submeter à aprovação da Diretoria ou do Conselho Deliberativo da Fisenge ou, ainda, da Plenária Inicial os casos que julgar acima do seu próprio âmbito de deliberação e delegação. parágrafo 2º. – A Comissão Organizadora se reunirá com os coordenadores e relatores de grupos e Plenárias para unificar procedimentos para a condução dos trabalhos. art. 25º. - A Plenária é a instância máxima do Congresso e é soberana em suas decisões. 99