Preparando-se para o futuro
Desenvolvimento de superbactérias
ameaça futuro da medicina
Cada vez mais micro organismos mostram resistência
aos antibióticos.
Incapacidade de matar bactérias pode fazer a
medicina retroceder.
Da Reuters
(Foto: Suzanne Plunkett/Reuters)
David Livermore está numa corrida contra a evolução. Em seu laboratório no
Norte de Londres, segura uma placa de culturas com um cheiro ruim,
lambuzada de bactérias. Esta colônia, de tom amarelo e aspecto cremoso, é
o inimigo: um novo tipo de germes, resistente aos mais poderosos
antibióticos já feitos pela humanidade.
Nas ruas, Steve Owen corre a mesma corrida – batendo pernas para atrair
atenção para o problema das infecções resistentes às drogas.
Donald, pai de Owen, morreu há quatro anos de falência múltipla dos órgãos
num hospital britânico. Ele tinha dado entrada para operar o joelho. Mas
pegou Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA, na sigla em
inglês), uma “superbactéria”que nenhuma das drogas receitadas pelos
médicos conseguiu vencer. Depois de quase 18 meses de muita dor, a
infecção chegou ao sangue dele, dominou os órgãos vitais e o matou.
Owen e sua esposa Jules se comprometeram a correr 12 corridas ao longo
do mesmo número de meses para angariar fundos para uma instituição que
trabalha para combater a MRSA. “Isso simplesmente não deveria ter
acontecido”
, diz Jules, enquanto o casal cuida das pernas doloridas, depois
de uma meia-maratona. “Era o joelho – não é algo que deveria tê-lo matado”
.
Bem vindos a um mundo no qual as drogas não funcionam.
Depois que Alexander Fleming descobriu o primeiro antibiótico, a penicilina,
rapidamente nos convencemos de que tínhamos a química para vencer as
bactérias. É claro, elas evoluem e desenvolvem resistência. Mas por décadas
os cientistas conseguiram desenvolver medicamentos para estar pelo menos
um passo à frente do inimigo sempre mutante.
Agora, contudo, nossa estrada pode estar perto do fim. Estima-se que
somente a MRSA mate cerca de 19 mil pessoas por ano nos EUA – bem
mais que o HIV e a Aids – e um número semelhante na Europa. Outras
superbactérias estão se espalhando. A tuberculose “com resistência
abrangente às drogas”cresceu como uma praga nos últimos anos. Uma nova
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onda de “super superbactérias”
, com uma mutação chamada NDM 1, que
surgiu inicialmente na Índia, já está em todo o mundo, da Grã-Bretanha à
Nova Zelândia.
"Não dá para vencer a evolução"
David Livermore, pesquisador da Agência Britânica de Proteção à Saúde
É NDM 1 que está crescendo nas placas que Livermore segura com as mãos
vestidas com luvas. “Não dá para vencer a evolução”
, diz o cientista, que
passa os dias monitorando a emergência de superbactérias num laboratório
de referência nacional na Agência Britânica de Proteção à Saúde. “Tudo o
que se pode tentar fazer é estar um passo à frente”
.
Isso não está acontecendo no momento por uma série de razões. De início,
as bactérias estão em todos os lugares, dando às bactérias incontáveis
oportunidades de desenvolver rotas de escape. As drogas podem ser pegas
sem prescrição por centavos em países como Tailândia, Índia e partes da
América Latina. Embora o uso seja controlado no Ocidente, o sistema
estimula os médicos a atirar nas bactérias primeiro e perguntar depois.
Talvez mais preocupante seja o fato de que as duas maiores companhias
farmacêuticas do mundo, deparadas com um retorno cada vez menor e com
uma ciência cada vez mais cara e difícil, não só diminuíram seus esforços no
desenvolvimento de antibióticos, como também estão abandonando esse
campo.
Hoje, apenas duas grandes companhias – GlaxoSmithKline e AstraZeneca –
ainda têm pesquisas e programas de desenvolvimento fortes e ativos em
relação aos antibióticos, segundo a Sociedade de Doenças Infecciosas dos
EUA. Nos anos 1990, havia cerca de 20.
O impacto sobre o modo como tratamos nossas doenças pode ser profundo.
“Se alguns dos mais potentes tipos multirresistentes que conhecemos hoje se
acumularem, então a medicina moderna – desde transplantes até tratamento
de câncer, e mesmo cirurgias mais comuns – se torna insustentável”
, diz
Livermore. “Você precisa da capacidade de tratar infecções em pacientes
vulneráveis. Perca isso e uma faixa da medicina moderna se torna instável”
.
Estaríamos em via de começar a ir para trás, para uma era antes dos
antibióticos, na qual próteses, quimioterapia e terapia intensiva eram
simplesmente impossíveis? O medo é grande o suficiente para que
Organização Mundial da Saúde dedicasse o Dia Mundial da Saúde deste ano
(7 de abril) à resistência antimicrobial, numa tentativa de salvaguardar as
drogas as futuras gerações.
“A medicina moderna não funciona sem antibióticos eficazes”
, diz Derek
Butler, presidente da instituição “MRSA Action UK”
, para a qual Owen está
angariando fundos. “Se perdermos essas balas mágicas, a medicina
regredirá em mais de 80 anos”
.
Um aspecto da corrida contra as bactérias mudou pouco desde a época de
Fleming. A higiene hospitalar é o trabalho básico, mal pago e sem glamour
que forma a primeira linha de defesa, vital contra os patógenos. Quando feita
corretamente, diminui a demanda pelas drogas. Ainda assim, Steve Owen se
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lembra do pai contando que viu um rato correndo pela enfermaria – um
choque para um hospital de um país desenvolvido.
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