Depois que morre, cabou-se de Calixto de Inhamuns Atenção: Texto registrado e distribuído em caráter puramente de uso e leitura PESSOAL. Todos os direitos reservados aos detentores legais dos direitos da obra. Para a representação e comercialização legal da peça, entrar em contato com o autor. Inspirado na reportagem Depois que morre, cabou-se, de Fred Melo Paiva, no O Estado de de São Paulo, de 06 de julho de 2008. Um senhor anda no meio do público com uma foto na mão. SENHOR: Por favor, senhores, alguém viu esse menino? Por favor, olhem, vejam essa foto... É meu filho... Alguém viu?... Ele tá perdido... Faz 50 dias que tô procurando ele... Não desisto, moço... É meu único filho... Meu único filho!... Saiu pra trabalhar e não voltou... Vê a foto, moça, a senhora viu?... Era caçador... Entrou na mata pra caçar onça com uns amigos, eles voltaram, ele não... Não eram bons amigos. senão não tinham voltado sem ele... Desculpem, desculpem... Ele não foi caçar onça, a gente mora no Grajau, na Zona Sul, aqui em São Paulo... Lá não tem onça... Ele saiu pra trabalhar... É... Foi caçar a vida... Sumiu... Faz 50 dias que tô procurando ele... A vida é traiçoeira... Tô procurando, meu filho, moço?... Num sei... Minha cabeça tá fraca... Ele saiu pra cacar onça e se perdeu... Entrei no mato procurando ele... Rezava... “O Senhor fechou a boca dos leão sobre Daniel. Senhor, fecha a boca da onça sobre o meu filho. Fecha a boca da cobra, meu Senhor"... É... Eu tô doido... Meu filho saiu pra trabalhar e não voltou... Eu não tenho orgulho do que o meu flho fazia, mas, também, não tenho orgulho da minha vida, minha senhora... Ninguém viu mesmo?... Todos dizem que ele morreu, que a polícia matou... A polícia mata gente pobre como a gente matava as onças que comiam o gado da gente... Meu filho era uma onça... Não, não! Meu filho era gado... Não... Era gente, mas depois que morre, cabou-se!... Morreu... Não!... Meu filho não 1 morreu, se perdeu nas selvas... É... Nas selvas da cidade cheia de bicho ruim, de raposas... Eu... Ele não se perdeu, moço, eu perdi ele.... Sou um homem bronco, marcado pelo álcool, pelas tristezas... Eu matei bicho, matei passarinho... Foi vingança dos bichos, dos passarinhos... Olha a foto, moça. Veja, dá uma olhada. Sai mostrando a foto desbotada. Calixto de Inhamuns Rua Baltazar Lisboa, 426 (VILA MARIANA) 04110-060 – SÃO PAULO – SP Telefone: (11) 5083-8877 E-mail: [email protected] 2