A Atividade Elétrica do Coração
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1. A contração das células musculares cardíacas é acionada por um potencial de
ação elétrico
Conforme o músculo cardíaco relaxa, os ventrículos enchem-se de sangue. A contração
cardíaca tem lugar em dois estágios. Primeiro, os átrios direito e esquerdo começam a se
contrair quase que simultaneamente. Depois de um intervalo de 50 – 150 ms, os ventrículos
direito e esquerdo começam a se contrair quase que simultaneamente. A contração atrial ajuda
a completar o enchimento dos ventrículos com sangue, a contração ventricular ejeta sangue
para fora do coração, o sangue é ejetado do ventrículo direito para a artéria pulmonar e do
ventrículo esquerdo para a aorta. Depois desta contração ventricular, o coração relaxa e os
ventrículos começam a se encher novamente. A seqüência de contractilidade é iniciada e
organizada por um sinal elétrico, um potencial de ação propagado de célula a célula muscular,
através do coração.
2. O mecanismo de contração do músculo cardíaco é bastante similar ao do
músculo esquelético
Embora a base molecular da contração seja a mesma em músculos cardíacos e
esqueléticos, os dois tipos musculares diferem em relação à ligação elétrica entre células
vizinhas, e essa diferença tem consequências importantes. As células musculares esqueléticas
individuais estão eletricamente isoladas umas das outras. Os potenciais de ação não podem
pular de uma célula muscular para outra. Um potencial de ação é iniciado em uma célula
muscular esquelética sob a ação da acetilcolina, que é liberada como neurotransmissor do
neurônio somático motor. A acetilcolina promove a abertura dos canais de Na que
despolarizam a célula muscular até o limiar para a formação de um potencial de ação.
3. As contrações cardíacas são iniciadas por potenciais de ação que surgem
espontaneamente em células marcapasso especializadas
Qualquer célula cardíaca pode desencadear o batimento do coração. Se uma única célula
cardíaca despolarizar-se durante o limiar, forma um potencial de ação e este potencial irá
espalhar de célula a célula através do coração para proporcionar a contração cardíaca como
um todo. Entretanto, poucas células especializadas cardíacas tem a propriedade de
despolarizar espontaneamente em direção ao limiar para a formação de potenciais de ação.
Quando uma célula dessas atinge seu potencial de ação o resultado é o batimento do coração.
Estas células são conhecidas como células marcapasso, porque iniciam o batimento cardíaco e
determinam a frequência, ou o passo do coração. No coração normal, as células marcapasso
que se despolarizam mais rapidamente estão localizadas no nodo sinoatrial (SA) este nodo
está na parede atrial direita. Em virtude da presença de células marcapasso que se
despolarizam espontaneamente, o coração inicia seus próprios potenciais de ação musculares
e as contrações. Os neurônios motores não são necessários para iniciar a contração cardíaca
como são necessários para o músculo esquelético. Os neurônios motores influenciam apenas
a freqüência cardíaca alterando a velocidade de despolarização das células marcapasso até o
limiar, mas o coração continua a bater até mesmo sem nenhuma influência nervosa.
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4. Um sistema de células musculares cardíacas especializadas inicia e organiza
cada batimento cardíaco
Uma vez formado, o potencial de ação rapidamente se espalha, de célula para célula,
através dos átrios direito e esquerdo, promovendo a contração de ambos os átrios. Depois este
mesmo potencial de ação aciona os ventrículos por um sistema especial de células que se
localizam entre os átrios e ventrículos. Esta via consiste do nodo atrioventricular (AV) e na
porção inicial do feixe de His. Este sistema é o único que permite a condução do potencial dos
átrios aos ventrículos. O feixe AV bifurca-se para formar os ramos esquerdo e direito. No
ápice ventricular, os ramos direito e esquerdo do feixe se ramificam nas fibras de purkinge,
que carreia o potencial de ação pelas paredes internas de ambos os ventrículos. Os nodos SA e
AV, o feixe AV e os ramos do feixe de His e as fibras de purkinge são conjuntamente
denominados sistema especializado de condução do coração. Esse sistema está composto de
células musculares cardíacas especializadas, e não com nervos. Em um batimento normal,
ambos os átrios se contraem quase que simultaneamente. A seguir, há curta pausa (para total
enchimento do ventrículo com sangue). Consequentemente, os dois ventrículos se contraem,
quase que simultaneamente. Por fim, o coração inteiro relaxa-se e enche-se novamente.
5. A longa duração do potencial de ação cardíaco garante um período de
relaxamento (e enchimento) entre as batidas
No pico do potencial de ação os canais de Na fecham-se e tornam-se inativos. Este canal
não se reabrirá até mesmo se a célula receber outro estímulo para despolarizar-se. Enquanto
um canal de Na encontra-se inativo, outro potencial de ação não pode ocorrer. Quando a
célula volta ao seu nível de repouso, a inativação do canal de Na termina e este se abre.
Assim, a inativação do Na impede que um segundo potencial de ação ocorra até que um
potencial de ação tenha terminado. Este período entre um potencial de ação até outro que não
poderá ser iniciado chama-se período refratário. Em um músculo esquelético este período
dura de 1 a 2 ms, no músculo cardíaco este período dura 100 a 250 ms. A importância deste
período refratário é que ele garante um período de relaxamento (e novo enchimento do
coração) entre as contrações cardíacas. Por este motivo também as células musculares
cardíacas não entram em tetania.
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6. Os nervos simpáticos e parassimpáticos atuam nas células marcapasso do
coração aumentando ou diminuindo a frequência cardíaca
Os neurotransmissores noradrenalina e acetilcolina afetam as células marcapasso do
coração. A acetilcolina retarda a despolarização espontânea das células marcapasso ativando
receptores colinérgicos muscarínicos nas membranas celulares. A ativação destes receptores
promove uma queda na velocidade do fluxo iônico através dos canais de íons que são
responsáveis pela despolarização espontânea das células marcapasso. A acetilcolina faz com
que as células marcapasso demorem a atingir o limiar, de modo que há longo intervalo entre
as batidas do coração. A noradrenalina tem efeito oposto. A noradrenalina acelera as trocas
dos canais iônicos que são responsáveis pela despolarização espontânea de células
marcapasso. A noradrenaliona exerce feito nos receptores B-adrenérgicos na membrana das
células marcapasso. A freqüência cardíaca eleva na presença de noradrenalina. Os neurônios
parassimpáticos liberam acetilcolina nas células do nodo SA, de modo que a atividade
parassimpática diminui a freqüência cardíaca. Os neurônios simpáticos liberam noradrenalina,
logo a atividade simpática aumenta a freqüência cardíaca. Em cães de grande porte a
freqüência cardíaca é de 140 bpm, entretanto, a freqüência cardíaca é de 60 bpm durante o
sono e cerca de 90 bpm em repouso. Exercícios ou excitações emocionais fazem com que a
freqüência cardíaca aumente. A atividade simpática é máxima durante uma reação de defesa
(resposta ao medo ou luta). Neurônios simpáticos e parassimpáticos do coração são algumas
vezes ativados simultaneamente. Quando ambos os sistemas são ativados, a freqüência
cardíaca resultante representa o resultado de um tipo de "cabo-de-guerra" entre a ação
simpática para aumentar a freqüência e a ação parassimpática para diminuir a freqüência
cardíaca. Normalmente, os sistemas simpáticos e parassimpáticos são parcialmente ativados
quando a freqüência cardíaca está entre 90 e 175 bpm. Quando as atividades simpática e
parassimpática são iguais, seus efeitos se cancelam mutuamente e a freqüência cardíaca fica
em seu nível intrínseco ou espontâneo.
7. As células do nodo atrioventricular atuam como marcapassos auxiliares e
também protegem o ventrículo de um batimento muito rápido
Assim como as células do nódulo sinoatrial, as células do nódulo atrioventricular
normalmente possuem atividade de marcapasso e potenciais de ação lentos mas de certa
forma irrelevantes. As células do nódulo atrioventricular despolarizam-se espontaneamente na
direção de seu limiar mas muito mais lentamente do que as células do nódulo sinoatrial. As
células do nódulo sinoatrial atingem o limiar primeiramente e iniciam o potencial de ação,
que então se propaga de célula em célula através do átrio para o nódulo atrioventricular. Em
certas condições anormais, a função de marcapasso do nódulo atrioventricular é fundamental
à sobrevivência. Por exemplo, se o nódulo sinoatrial estiver lesado e não puder despolarizarse no limiar, as células marcapasso do nódulo AV continuam a se despolarizar
espontaneamente no limiar e iniciam um potencial de ação cardíaco. Se não fosse por essa
função de marcapasso auxiliar das células do nódulo AV, o coração com nódulo SA lesado
não poderia bater. Já que as células marcapasso do nódulo AV despolarizam-se mais
lentamente que células normais do nódulo SA, a freqüência cardíaca é caracteristicamente
mais lenta quando as células do nódulo AV estiverem controlando os batimentos cardíacos. A
freqüência cardíaca resultante do marcapasso do nódulo AV é de aproximadamente 30-40
bpm em um cão em repouso, comparando-se com a freqüência normal de 80-90 bpm quando
as células do nódulo SA são o marcapasso. Outra propriedade importante das células do
nódulo AV é que elas possuem períodos refratários maiores do que as células atriais normais.
O período refratário longo das células do nódulo AV ajuda a proteger os ventrículos de
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estimulação e contração com freqüências rápidas demais para um bombeamento eficiente. A
função protetora do nódulo AV é fundamental para a sobrevivência do animal em casos de
flutter atrial ou fibrilação atrial, nas quais os potenciais de ação atriais são extremamente
freqüentes.
8. Disfunção no sistema condutor especializado resulta em ritmos cardíacos
anormais (Arritmias)
As arritmias cardíacas resultam tanto de problemas com a formação de potencias de
ação como de problemas na condução dos potenciais de ação. Um exemplo de problema com
a formação do potencial de ação é a parada sinusal – em que o nodo SA falha completamente
para formar os potencias de ação. Em um paciente com parada sinusal, a função do
marcapasso auxiliar do nodo AV mantém o batimento ventricular, embora em uma frequência
bastante baixa. Uma droga que bloqueie os efeitos parassimpáticos restabelece a frequência a
80 bpm. Outro possível tratamento apropriado é aumentar a frequência cardíaca
administrando-se uma droga que mimetiza a ação dos nervos simpáticos. Caso um tratamento
com drogas de síndrome sinusal seja ineficaz, uma maneira alternativa de aumentar a
frequência cardíaca é através do uso de um marcapasso artificial cardíaco. O marcapasso
cardíaco é um estimulador elétrico que aplica ao coração choques elétricos que despolarizam
o músculo cardíaco até o limiar. Os choques aplicados ao átrio iniciam o potencial de ação
atrial. Para tratamento a longo prazo, um estimulador elétrico a bateria pode ser implantado
cirurgicamente sob a pele do paciente e ligado a eletrodos que estão inseridos em uma câmara
cardíaca e ligados à superfície externa do coração.
9. Bloqueio do nódulo AV é a causa mais comum de Arritmias cardíacas
O bloqueio AV é uma disfunção elétrica comum da condução do potencial de ação. Se a
lesão da porção inicial do nódulo AV bloqueia a condução dos potenciais de ação atriais ao
ventrículo, os átrios continuam a bater numa frequência determinada pelas células marcapasso
do nódulo SA. Os ventrículos também continuam a bater, mas em uma frequência muito mais
baixa. Quando o nódulo AV é bloqueado, as contrações ventriculares são iniciadas por células
abaixo das células do nódulo AV que agem como marcapassos auxiliares. Caso os potencias
de ação sejam conduzidos esporadicamemente do átrio para os ventrículos, de modo que o
nódulo AV transmita algum potencial de ação atrial mas não todo ele, a condição é conhecida
como bloqueio do nódulo AV de segundo grau. Em um paciente com bloqueio de segundo
grau, algumas contrações atriais são seguidas de contrações ventriculares e outras não.
Atividade parassimpática forte pode criar ou agravar o bloqueio do nódulo AV de segundo
grau, porque a atividade parassimpática aumenta o período refratário de células do nodo AV.
O bloqueio AV pode ser causado por toxinas, infecções virais ou bacterianas, isquemias,
defeitos cardíacos congênitos ou fibrose cardíaca. O bloqueio pode ser tratado se a frequência
ventricular for baixa para manter fluxo sanguíneo adequado para o organismo. As drogas que
bloqueiam as ações parassimpáticas no coração (antagonistas colinérgicos muscarínicos –
atropina) podem reduzir o período refratário suficientemente para superar um estado de
bloqueio. O mesmo efeito pode ser atingido pela droga que mimetiza o efeito dos nervos
simpáticos. Caso o efeito das drogas falhe em corrigir o bloqueio AV, então um marcapasso
artificial é requerido. Neste caso o marcapasso deve ser aplicado aos ventrículos.
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10. As taquiarritmias cardíacas resultam de formação de potencial de ação
anormal (marcapasso ectópico) ou de condução de potencial de ação anormal
(reentrada)
As taquiarritmias são anormalidades no ritmo cardíaco em que as freqüências atriais ou
ventriculares, ou ambas, estão anormalmente altas. Um batimento isolado extra e ocasional
atrial ou ventricular é chamado pré-contração ou batimento prematuro. Geralmente esta
contração é o resultado da presença na área atrial ou ventricular de um tecido anormal que
atua como marcapasso por despolarização espontânea até o limiar antes que o marcapasso
normal o faça. Algumas toxinas, desequilíbrios eletrolíticos e isquemias podem promover tal
atividade de marcapasso ectópico. Taquicardia refere-se ao batimento mais rápido do coração
e são denominadas de acordo com o local do marcapasso de onde elas originaram.
Caso as contrações atriais tornem-se muito rápidas, teremos então a fibrilação atrial que
caracteriza-se pela passagem contínua e aleatória de potenciais de ação pelo átrio. Neste caso
o átrio aparenta ter tremores. Geralmente a fibrilação atrial não causa fibrilação ventricular
por causa do longo período refratário protetor das células do nódulo AV. Os ventrículos
continuam a bater sincronizadamente com efetivo bombeamento sangüíneo. Essas contrações
ventriculares são essenciais para a manutenção da vida, caso a sincronia das contrações
ventriculares seja desfeita e o ventrículo começa a fibrilar e o bombeamento ventricular cessa.
Na fibrilação ventricular, cada pequena região das paredes ventriculares se contrai e relaxa
aleatoriamente em resposta ao potencial de ação que se espalha esporádica e continuamente
através dos ventrículos. A condição de fibrilação ventricular é sinônimo de morte cardíaca
súbita.
Em muitos casos, a fibrilação ventricular pode ser revertida somente por desfibrilação
elétrica. Neste processo, uma forte corrente elétrica passa brevemente pelo músculo cardíaco.
Essa corrente despolariza todas as células cardíacas simultaneamente e as mantém por um
instante no estado despolarizado. Quando a corrente acaba, espera-se que todos os tecidos
cardíacos despolarizem para um potencial de repouso da membrana simultaneamente e que o
marcapasso normal do coração terá, então, chance de iniciar os batimentos, mais uma vez, de
maneira organizada e sincronizada.
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