Casas de Rendas Económicas das Células I e II do Plano de Urbanização de Alvalade - 1ª Experiência de Urbanização Integral Alexandra Alegre INTRODUÇÃO O Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade corresponde à primeira grande operação de expansão urbana da cidade de Lisboa, de iniciativa camarária, destinada à construção de infraestruturas, de habitação e de equipamento público de interesse imediato à habitação. Alvalade constitui o primeiro conjunto urbano planeado para integrar edifícios destinados a habitação social e a habitação para rendimento, apoiados em equipamentos - escola, mercado, centro cívico - e em pequena indústria. A integração de diferentes tipologias e formas de promoção de habitação viabilizou a operação em termos financeiros, diversificou a oferta da habitação de forma a incluir os próprios valores do mercado e permitiu constituir um tecido socialmente diversificado e plurifuncional. A utilização de processos, na altura inovadores, tanto ao nível da concepção – projecto-tipo com 12 variantes – como da construção dos edifícios e gestão das obras – empreitadas experimentais – contribuiu para o sucesso desta operação. O planeamento e a execução do Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade afirmou-se como um modelo de referência, tanto a nível arquitectónico, através do desenho urbano e da concepção dos próprios edifícios, como a nível de engenharia e gestão de obras, através de soluções inovadoras de préfabricação e normalização de elementos integrados na construção e de processos construtivos. O Bairro de Alvalade constitui hoje uma área consolidada e qualificada da cidade de Lisboa. PLANO DE URBANIZAÇÃO DO SÍTIO DE ALVALADE Breve descrição O Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade, inicialmente designado por Plano de Urbanização da Zona a Sul da Av. Alferes Malheiro (D.L. 33921 de 5 de Setembro de 1944), foi planeado no início da década de 40 pelo arq. João Faria da Costa. Enquadrado no esquema estruturante da cidade de Lisboa, proposto no Plano Director de Urbanização de Lisboa elaborado por Etienne de Gröer (1938-1948), promove a expansão da cidade de Lisboa para norte, dá continuidade e integração à zona compreendida entre o Campo Grande e o Areeiro, e responde, em parte, à eliminação do déficit habitacional que afectava a cidade. Fig. 1 – Plano Director de Urbanização de Lisboa (1938-1948) O plano ocupa uma área com cerca de 230 hectares. É limitado a Norte pela Av. do Brasil (antiga Av. Alferes Malheiro); a Nascente pela Av. Almirante Gago Coutinho; a Sul pela linha férrea de cintura; e a Poente pelo Campo Grande e pela Rua de Entrecampos. É formado por uma quadrícula hierarquizada, definida por uma rede de vias principais que a subdividem em oito células, formando ‘unidades de vizinhança’ distintas: Av. de Roma, Av. Rio de Janeiro, Av. da Igreja/Av. D. Rodrigo da Cunha e Av. dos Estados Unidos da América. A sua realização assegurou a construção de 12 000 habitações para uma população de 45 000 habitantes. O primeiro conjunto de 84 edifícios foi inaugurado em 1947 (CML, 1948). Fig. 2 – Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade O Plano de Urbanização de Alvalade reflecte na sua organização conceitos e influências que marcaram as primeiras décadas do século XX. Aplica princípios da urbanística moderna como a unidade de vizinhança, a organização distributiva das funções e equipamentos, a hierarquização viária através de avenidas, ruas, impasses e caminhos de peões, a desprivatização do solo e a libertação do interior do quarteirão para espaço de uso colectivo. As células –‘unidades de habitação’ – são estruturadas a partir de um elemento central, a escola primária, em torno da qual se distribuem as habitações. A sua dimensão média foi fixada de forma a não se excederem os 500m de distância das habitações às escolas. As ligações entre estes dois pontos são facilitadas pela existência de percursos pedonais que atravessam os logradouros dos blocos de habitação. Os logradouros são desenhados como amplos espaços exteriores comuns, para usufruto dos moradores (CML, 1948). Os equipamentos e os grandes espaços de lazer distribuem-se de forma a poderem ser alcançados pelos habitantes de cada célula através de percursos cómodos e pouco extensos, que cruzam pontualmente os arruamentos principais, onde se processa o trânsito rápido. Dentro de cada célula as ruas constituem vias de acesso local às habitações. Antecedentes A partir de 1888, a expansão da cidade de Lisboa concretiza-se com a elaboração de vários planos articulados entre si, desenvolvidos pela Repartição Técnica da Câmara de Lisboa sob chefia do Eng. Frederico Ressano Garcia. Engenheiro diplomado em Paris, onde permanece até 1891, traz consigo as ideias de Haussman e o conhecimento de técnicas e processos necessários ao crescimento de uma cidade. Entre os planos que desenvolve para a cidade de Lisboa salienta-se o Plano das Avenidas Novas, que estabelece ligação entre a Av. da Liberdade e o Campo Grande possibilitando o desenvolvimento da cidade para norte. Este plano assenta o crescimento da cidade numa malha ortogonal adaptada à topografia do terreno a urbanizar, rasgada por avenidas (Av. da Liberdade, Av. Fontes Pereira de Melo e Av. da República) que se unem em duas praças (Praça Marquês de Pombal e Praça Duque de Saldanha), desenhando quarteirões regulares de diferentes dimensões para ambos os lados. A edificação deste novo bairro caracterizou-se, no entanto, por uma excessiva liberdade entregue à iniciativa privada, não impondo o município de Lisboa normas para o dimensionamento de lotes e tipologias. As diferentes tipologias (prédio de rendimento ou moradia burguesa) distribuem-se nos lotes hierarquizando-os pela importância de vias e sítios, criando um tecido urbano com descontinuidades na volumetria e na ocupação do solo. Quando o Eng. Duarte Pacheco assumiu a presidência da Câmara Municipal de Lisboa no final da década de 30, cargo que viria a acumular com o de ministro de Obras Públicas, verificaram-se importantes alterações a nível do contexto sócio-político e urbanístico, bem como a nível da política de habitação social seguida. A este propósito o Eng. Guimarães Lobato (1951), citando uma comunicação do Eng. Vasconcelos e Sá, apresentada no II Congresso das Capitais em Outubro de 1950, refere que até 1938 a política urbanística que acompanhou o desenvolvimento da capital “caracterizou-se fundamentalmente por um limitado ‘controle’ do Município conjugado com a intervenção activa dos proprietários de terrenos nas operações de urbanização”. É só a partir desta data que estas operações passam ser feitas "pelo munícipe através do seu município" (Lobato, 1951). Com efeito, o município de Lisboa, através do seu presidente, irá desencadear um conjunto de acções que globalmente irão alterar a configuração social e urbana da cidade de Lisboa (Nunes da Silva, 1994). É proposto o reordenamento do território do concelho de Lisboa através da realização do primeiro Plano Director de Urbanização de Lisboa, e consequente definição de regras urbanas para o crescimento e organização da cidade. Em simultâneo é dado inicio a uma política de alteração da estrutura fundiária do concelho, resultado de um processo sistemático de expropriações de terrenos, centrado no controlo fundiário dos usos dos solos do município. A publicação de legislação a que se assistiu a partir da década de 30 permitiu ao Município chamar exclusivamente a si a iniciativa de urbanização da cidade de Lisboa, de uma forma disciplinada integrando, também, legislação respeitante à habitação social. Salienta-se, a publicação do Decreto-Lei nº 28797 de 1 de Julho de 1938 que previa a simplificação do processo de expropriação permitindo a sua aplicação nos terrenos destinado à realização do Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade (dos 230 ha que constituem a área total do plano, 218 ha foram expropriados ou adquiridos); do Decreto-Lei 33921 de 5 de setembro de 1944, instrumento regulador do ‘Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade’ e da Lei 2007 de 7 de Setembro de 1945 que criou o regime das Casas de Rendas Económicas. Este regime constituiu o primeiro instrumento legal que permitiu ao município de Lisboa prosseguir com uma política de habitação. Igualmente importante para a realização deste programa foi a publicação do Decreto-Lei 35611 de 25 de Abril de 1946 que permitiu às Instituições de Previdência mobilizar para a promoção da habitação social os seus recursos financeiros. As Instituições de previdência foram as entidades que conferiram maior impulso à realização do programa das Casas de Rendas Económicas. Refirase que por contrato de 8 de Agosto de 1948 com a Federação de Caixas de Previdência – Habitações Económicas, foram construídos 302 edifícios no ‘Sítio de Alvalade’. CASAS DE RENDAS ECONÓMICAS Caracterização das Casas de Rendas Económicas Fig. 3 – Casas de Renas Económicas das Células I e II do Bairro de Alvalade. Planta A urbanização do Sítio de Alvalade iniciou-se com a construção do programa das Casas de Rendas Económicas localizadas nas células I e II do Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade, que contemplou a construção de 2066 habitações distribuídas por 302 edifícios de 3 e 4 pisos, sem elevador. O estudo das Casas de Rendas Económicas, elaborados sob orientação do Arq. Jacobetty Rosa, contemplou o desenvolvimento de 9 tipos de habitações diferentes agrupadas em três séries de três tipos cada, correspondendo as séries aos diferentes níveis sociais dos agregados familiares e os tipos ao número de pessoas a abrigar em cada casa. A nível de organização funcional, em cada série os tipos variam com a introdução de um quarto de cama, e a variação de série para série obteve-se com a introdução de um escritório e maiores áreas de instalações complementares da série I para a série II, e com a introdução de instalações destinadas a uma criada (quarto com instalação sanitária) da série II para a série III. Fig. 4 – Fichas-tipo da série I (Tipo 3), série II (Tipo 6) e série III (Tipo 9): planta, cortes e alçados Os edifícios, enquadrando-se na tipologia de bloco, de planta rectangular, foram agrupados em quarteirões abertos, permitindo a existência de logradouros arborizados sobre os quais se debruçavam as fachadas posteriores dos edifícios. Formalmente caracterizam-se pela sobriedade e pela reduzida variação de elementos de composição arquitectónica, constituindo um conjunto edificado com uma imagem exterior de forte unidade. O projecto das diferentes habitações traduziu uma solução económica baseada numa racionalização da organização espacial e da adaptação dos espaços à função prevista: aumento da área habitável de cada habitação através da redução de espaços desaproveitados (eliminação do corredor integrando a sua área na sala) e da criação de plantas simples e racionais e libertou-se mais área útil para a habitação através da colocação de móveis integrados na própria construção. A racionalização das habitações baseou-se no estudo e aplicação de métodos e análise de índices significativos, que permitiram aperfeiçoar as condições de correlações das diferentes funções da habitação e adoptar soluções de distribuição dos diversos compartimentos que conduzissem à máxima comodidade da vida doméstica. Acima de tudo procurava-se racionalizar o fogo de modo a 'aumentar o valor da habitação reduzindo ao mínimo compatível a área da mesma' (CML, 1946). A aplicação destas metodologias inovadoras aliadas à preocupação de dotar as habitações de boas condições de habitabilidade - iluminação natural de todos os compartimentos, ventilação transversal dos fogos e de higiene resultaram na concepção de fogos de planta rectangular. Suprimiram-se assim os saguões e evitou-se a existência de recantos húmidos e sombrios como resultado de uma inovação que o município levou a cabo na organização das plantas das habitações. Fig.5 – Casas de Renas Económicas. Conclusão do 1º Grupo de empreitada Execução do Programa Fig. 6 – Vista aérea das células I e II do Plano de Urbanização do Sítio de Alvalade: execução dos diferentes grupos de empreitada A execução do programa dos 302 edifícios que constituem as CRE dividiu-se em quatro grupos de empreitadas, de volume de obra sensivelmente igual, acrescidas da construção de um grupo experimental constituído por 3 prédios de diferentes tipos (tipo 3, 6 e 8). Esta opção permitiu testar as soluções adoptadas nos projectos, tanto do ponto de vista da concepção arquitectónica como das tecnologias construtivas, fornecendo ensinamentos úteis para a realização global do programa. O custo da construção deste grupo experimental, tendo sido superior ao previsto para as outras casas, tornou-se compensador na medida em que permitiu introduzir correcções na construção das casas das empreitadas seguintes. Nas primeiras três empreitadas empregaram-se, na sua construção, alvenarias de pedra e tijolo, distinguindose a quarta empreitada pela aplicação de alvenarias de bloco de betão. Os princípios de racionalização e de simplificação aplicados aos estudos das habitações foram, também, aplicados a nível construtivo traduzindo soluções em que se procurou a concentração das canalizações das cozinhas e instalações sanitárias, uma criteriosa escolha de materiais e processos construtivos a adoptar, bem como uma cuidada planificação e gestão da obra. A par das empreitadas de construção, organizaram-se empreitadas de fornecimento de materiais e de elementos da construção, distribuídas ao longo do tempo segundo o programa do plano geral de trabalhos de modo assegurar a regularidade do fornecimento dos mesmos. Assim, estabeleceram-se empreitadas independentes para o fornecimento das madeiras e do fabrico de caixilharias de portas e janelas, procurando uma melhoria na qualidade destes elementos; empreitadas para o fornecimento de tubagens de grés para canalizações, de ladrilhos de cimento, de loiças sanitárias, de tijolos, telhas e telhões. A normalização e a préfabricação de alguns elementos utilizados na construção permitiu maior economia de custo e maior rapidez de construção: elementos préfabricados como portas, janelas e revestimentos; elementos normalizados de betão com acabamento de marmorite para degraus de escadas e guarnecimentos de vãos exteriores; janelas com dimensões e secções das caixilharias normalizadas, tubagens normalizadas destinadas às redes de água, esgotos e electricidade. Fig. 7 – Execução de paredes de alvenaria de blocos de betão Fig. 8– Elementos normalizados de betão: guarnecimento dos vãos interiores. Fig. 9– Degraus de escadas: elementos normalizados de betão com acabamento de marmorite. A nível de planificação e gestão de obra, o município contou com a colaboração da Federação das Caixas de Previdência, que no final de 1946, em contrato realizado com a Câmara Municipal de Lisboa, disponibilizou a verba necessária para o arranque do programa das Casas de Rendas Económicas. Segundo este contrato competia às Caixas de Previdência as seguintes competências: encargos correspondentes à execução dos contratos com os fornecedores e empreiteiros; despesas com os fornecedores e trabalhos adicionais imprevistos, até 5% do montante global daqueles encargos; pagamento ao município do custo dos terrenos para a construção e despesas relativas à direcção e fiscalização das obras, no montante de 1% dos restantes encargos em conjunto. Por sua vez competia à CML as seguintes responsabilidades: elaborar o plano geral de urbanização, incluindo todos os estudos técnicos, económicos e sociais; elaborar o plano geral de trabalhos, incluindo a definição dos prazos de execução e programas das diferentes fases de realização do plano; organizar as empreitadas especiais para assegurar o abastecimento de todos os materiais de construção necessários; adjudicar, mediante concurso público, a produção de elementos préfabricados, assim como fiscalizar e orientar o seu fabrico. No decorrer da obra realizaram-se diversos ensaios de materiais e de processos de execução que constituíram atitudes inovadores em termos de gestão de obra. Destacam-se os estudos dos betões sem finos; os estudos dos tipos mais adequados de argamassas de fraca dosagem de cimento para aplicação em revestimentos interiores e exteriores e para execução de alvenarias, particularmente as de blocos de betão; os estudos realizados pelo Laboratório de Engenharia Civil, relativos a estuques e a madeiras que, neste último caso, propondo um tratamento mais adequado para este material, permitiram uma melhoria na qualidade de fabrico das caixilharias. Procurou-se, também, nas sucessivas empreitadas, melhorar as ferragens aplicadas criando novos tipos mais económicos e funcionais; as tubagens de grés, as loiças sanitárias e os ladrilhos hidráulicos satisfizeram requisitos de fabrico e de qualidade prédefinidos. O emprego de alvenarias de blocos de betão, em substituição das de pedra ou tijolo, levou o município a adquirir uma instalação para o fabrico dos blocos, tentando garantir, assim, as condições técnicas e económicas de estabilização da produção. Caracterização Construtiva Os edifícios das CRE pertencem à época de construção que caracterizou a 1ª metade do século XX em Portugal, de transição para o betão armado. Como já foi referido, a sua execução dividiu-se em quatro grupos de empreitadas. As primeiras três empreitadas caracterizaram-se construtivamente pelo emprego de alvenaria de pedra (alvenaria hidráulica) nas paredes exteriores e de tijolo nas paredes interiores, cintadas em todos os pisos por vigas de betão armado à altura das vergas das janelas. Os pavimentos das cozinhas e casas de banho foram executados com lajes de betão armado, sendo os restantes de vigamento de madeira e solho à portuguesa. As escadas foram construídas com degraus de betão préfabricados, apoiados em frontais de tijolo. A quarta empreitada distinguiu-se pela utilização de alvenarias de blocos ocos de betão nas paredes exteriores, por blocos maciços de betão nas paredes frontais e por blocos de pedra pomes ou de gesso nas paredes divisórias. Os pavimentos foram executados com blocos de jorra que tornam desnecessárias as cofragens. Em todas as empreitadas as coberturas têm estrutura de madeira e revestimentos em telha Lusa. As caixilharias são de madeira de pinho e as paredes exteriores são rebocadas a argamassa de cimento e areia, acabadas exteriormente a massa de areia e interiormente estucadas. De referir a execução da empreitada de substituição dos pavimentos de madeira por pavimentos de vigotas de betão pré-esforçado por blocos cerâmicos de enchimento, em edifícios que apresentavam graves anomalias na madeira utilizada na execução destes elementos. Esta empreitada decorreu sob a responsabilidade da Federação das Caixas Económicas durante a década de 50. CONCLUSÃO O êxito da experiência de Alvalade reflecte-se nas grandes vantagens de uma urbanização estudada, planeada e executada ordenadamente pelo município, que estabeleceu regras tanto a nível de planeamento e desenho urbano como a nível de concepção das habitações e sua construção. Esta experiência permitiu, também, demonstrar que os custos de construção podem ser controlados através do estudo das condições técnicas de execução: a nível do material utilizado, do emprego de elementos normalizados e préfabricados e soluções construtivas economicamente viáveis. Após a conclusão da urbanização do Sítio de Alvalade, algumas deficiências foram, no entanto, apontadas: ligeiro excesso de densidade populacional e reduzida distância entre fachadas nos arruamentos secundários, excessiva distância de algumas habitações à zona comercial do bairro, inconveniência dos logradouros individualizados e murados pouco aproveitados pela população. Passados aproximadamente 50 anos após a conclusão do Bairro de Alvalade, este apresenta-se como uma zona consolidada da cidade de Lisboa, com características urbanísticas, construtivas e arquitectónicas distintas da restante cidade. Ao longo deste tempo tem-se assistido a alterações pósocupação a vários níveis: a nível físico, nos fogos e edifícios que o constituem, a nível social, na população que o habita e a nível funcional, tanto no edificado como no espaço urbano. A nível físico os edifícios apresentam uma degradação do seu estado de conservação que tem a sua origem no envelhecimento e desgaste dos materiais que o constituem associados aos efeitos climatéricos e de poluição e à ausência de acções de manutenção. A este aspecto associa-se intervenções pontuais executadas no interior dos fogos que reflectem soluções pouco apropriadas que poderão contribuir para o agravamento do seu estado de conservação. A nível social, Alvalade tem vindo a assistir a um processo de 'gentrificação' envolvendo novos moradores com novos modos de habitar. A evolução social da população caracteriza-se por novas composições do agregado familiar, com a diminuição da sua dimensão e com um maior poder económico. Esta 'nova' população é responsável pelas alterações introduzidas nas habitações, com a adaptação dos fogos a novas exigências funcionais, com repercussões na organização espacial e construtiva, traduzindo intervenções que pelo seu grau de profundidade e falta de conhecimento da realidade construída são responsáveis por consequências negativas para a construção e estrutura dos edifícios. A nível do espaço urbano apontam-se alguns problemas a nível ambiental nomeadamente a nível de segurança, estacionamento, iluminação pública e da ocupação ilegal e desordenada dos logradouros que se tem vindo a acentuar gradualmente ao longo dos anos, espaços que se pretendiam verdes e de lazer para a população residente. Alvalade constitui a primeira experiência de urbanismo integral, definindo normas e regras a nível urbanístico, construtivo e arquitectónico. A elaboração de uma normativa/regulamento municipal que estabeleça regras específicas de actuação, garantindo os objectivos de um programa de reabilitação tornase necessária. Este processo deve ser apoiado na sua totalidade por uma equipa pluridisciplinar experiente na área da reabilitação. Garante-se, assim, a manutenção da unidade estética e urbanística do conjunto edificado, que para além de ocupar uma área nobre da cidade de Lisboa, é representativa de uma fase de desenvolvimento urbano bem definido com características muito próprias e excepcionais. REFERÊNCIAS CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, (1945), “Empreitada de Construção do 1º Grupo de Casas de Rendas Económicas” – Caderno de Encargos, CML, Lisboa 1945 CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, (1946), “Grandes Problemas de Lisboa – A Construção de Casas de Rendas Económicas” in Revista Municipal, nº 26, Edições CML, 3º trimestre de 1946 CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, (1948), A Urbanização do Sítio de Alvalade, Edições CML, Lisboa, Setembro 1948 LABORATÓRIO NACIONAL DE ENGENHARIA CIVIL (1954); Assistência Laboratorial à Construção de Casas de Rendas Económicas no Sítio de Alvalade - Lisboa, Relatório nº 620, II Serviço - Secção de Madeiras, LNEC-MOP, Lisboa, Maio 1954. LAMAS, José M. Ressano Garcia (1993); Morfologia Urbana e Desenho da Cidade, Textos Universitários de Ciências Sociais e Humanas, Edições F. C. Gulbenkian - JNICT, 1988. LOBATO, Luís Guimarães e FARINHA, Manuel Brazão (1946); Construção de Casas de Rendas Económicas - Condições Gerais, CML, Lisboa Fevereiro 1946. LOBATO, Luís Guimarães (1951); "A Experiência de Alvalade" in Separata da Técnica, Revista de Engenharia, nº209-210, Instituto Superior Técnico, Lisboa 1951. SILVA, Carlos Nunes (1994); Política Urbana em Lisboa, 1926-1974, Colecção Cidade de Lisboa, nº 26, Livros Horizonte, Lisboa, 1994.