0 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO Renata Colares Tavares A Valorização Do Princípio Da Fraternidade No Direito Constitucional Macapá 2008 ‘1 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO Renata Colares Tavares A Valorização Do Princípio Da Fraternidade No Direito Constitucional Monografia apresentada ao Curso de Direito, do Centro de Ensino Superior do Amapa, como requisito à obtenção do grau de bacharel em Direito. Sob a orientação do professor Agnaldo Alves Ferreira. Macapá 2008 ‘2 À minha mãe, Rosa Maria Colares Tavares a quem devo os valores aprendidos a ternura e o amor a mim dedicados,à minha irmã Roberta Colares Tavares pelo constante encorajamento e à minha prima Simone Brito de Oliveira pelo companheirismo e amizade. ‘3 AGRADECIMENTOS Não poderia deixar de agradecer o apoio de muitos. Assim, agradeço: Em primeiro lugar a Deus, meu mestre maior. Ao meu orientador Agnaldo, assim como aos demais docentes do curso, os quais com suas experiências, conhecimentos jurídicos, suscitaram reflexões para este trabalho em especial a Professora Claudia Cezario com seus comentários preciosos. A todos os amigos que direta ou indiretamente me deram o suporte necessário a realização deste trabalho. ‘4 “A exigência mais sentida no mundo de hoje é a reconstituição dos relacionamentos humanos em todos os âmbitos da vida social: desde aquele familiar até o relacionamento entre as Nações e os Povos. Redescobrir e atuar novas formas de relação, que correspondem às novas formas éticas e jurídicas que garantem a justiça em todos os relacionamentos, para o bem de cada individuo e da sociedade; é o objetivo perseguido por juristas, advogados, professores e estudantes empenhados no mundo do Direito e da Justiça,nos quais vivenciam a Fraternidade’’. (Lubich,2005) ‘5 RESUMO O presente trabalho aborda o tema a valorização do principio da fraternidade no Direito Constitucional, tomando como foco o princípio da fraternidade no sistema jurídico, sobretudo no direito constitucional. Abrange-se o contexto histórico contemporâneo, a evolução do constitucionalismo moderno e na normatização dos direitos fundamentais inserindo-se neste contexto o principio da fraternidade. Discorre-se sobre a fraternidade e direitos humanos tendo como enfoque a idéia de universalização que a fraternidade comporta, Faz-se uma correlação da fraternidade com a dignidade da pessoa humana como pressuposto para a analise do caráter intersubjetivo dos direitos fraternais. Citando-se alguns fundamentos clássicos, aborda-se o direito constitucional contemporâneo para situar o principio da fraternidade em fase de valorização e reconhecimento em transcendência ao constitucionalismo fraternal, apresenta de forma concisa os reflexos deste novo viés no âmbito da justiça restaurativa e solução de conflitos. O trabalho discorre sobre a constatação de que o principio da fraternidade esta sendo assimilado não somente no âmbito filosófico, social ou político, mas também no âmbito jurídico e constitucional e destaca a importância e necessidade de aprofundamento da questão. Palavras-chaves: fraternidade, direito, operadores, constitucionalismo ‘6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO......................................................................................................... 7 CAPITULO I............................................................................................................. 10 OS PRINCIPIOS DA LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE E O CONSTITUCIONALISMO MODERNO...............................................................................................................10 1.1 O CONSTITUCIONALISMO MODERNO E A NORMATIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E A SUA RELAÇÃO COM OS PRINCÍPIOS DA LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE..................................................... 10 CAPITULO II............................................................................................................ 17 FRATERNIDADE E O CARATER INTERSUBJETIVO DOS DIREITOS................ 17 17 2.1 A FRATERNIDADE E DIREITOS HUMANOS................................................. 2.2 A FRATERNIDADE E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: O CARÁTER INTERSUBJETIVO DOS DIREITOS........................................................................19 CAPITULO III........................................................................................................... 26 O PRINCIPIO DA FRATERNIDADE E O CONSTITUCIONALISMO...................... 26 3.1 O PERSONALISMO CONSTITUCIONAL E O PRINCIPIO DA 26 FRATERNIDADE..................................................................................................... 3.2 O CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL........................................................29 3.3 OS REFLEXOS DE UM CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL.................... 33 CONSIDERAÇÔES FINAIS..................................................................................... 35 REFERÊNCIAS........................................................................................................37 ANEXOS.................................................................................................................. 40 ‘7 INTRODUÇÃO O propósito, na abordagem do tema A valorização princípio da fraternidade no direito constitucional é provocar uma reflexão sobre a sua importância, reconhecimento e repercussão na seara jurídica, em especial, no campo do Direito Constitucional. A fraternidade é um conceito filosófico ligado a idéias de liberdade e igualdade que hoje representa um complemento tardio e necessário da trilogia que caracterizou parte do pensamento revolucionário francês no século XVIII. O princípio fundado na igualdade dos homens perante a lei perdura nas práticas jurídicas da nossa sociedade, tanto quanto o princípio da liberdade juntamente com todas as lutas em busca da sua concretização e cresceu nos mais variados níveis, sendo neste contexto que queremos identificar o principio da fraternidade no direito constitucional. Vale ressaltar não ter sido possível maior aprofundamento das questões tratadas, como gostaríamos de fazê-lo, sobretudo, pelo pouco material bibliográfico que trate especificamente deste assunto ainda que seja de fundamental importância para a aplicabilidade do direito. O principal objetivo deste trabalho é apresentar a fraternidade como uma categoria jurídico constitucional dentro do ordenamento jurídico, extraindo a participação e importância da fraternidade em alguns momentos históricoconstitucionais, e apontando as formas com que a fraternidade vem sendo valorizada, e efetivamente aplicada no meio jurídico. Para aprofundar o tema em questão, necessário se fez analisar, brevemente, a evolução porque passou o constitucionalismo moderno, com destaque nas respostas que procurou empreender frente às grandes transformações da sociedade. A fraternidade, ao longo do tempo, vem sendo reconhecida como um ideal de filosofia política ou social, mas nunca jurídico, portanto, o tema é inovador no ordenamento jurídico contemporâneo e tem suscitado grande interesse dos operadores do Direito. Podemos citar como exemplo desta preocupação os vários congressos a nível nacional e internacional que enfatizaram a fraternidade no contexto jurídico como o Congresso ocorrido em 2005 na Itália com a participação ‘8 de 700 pessoas de 47 paises, no Brasil, o ocorrido em outubro de 2007 em São Luiz com o tema “Fraternidade: um novo elemento ao conceito de justiça” e outro em São Paulo em janeiro de 2008 com o tema Direito e Fraternidade na construção da justiça. A priori, constata-se uma inquestionável dificuldade na apreciação crítica do tema em uma perspectiva jurídica, porquanto, como registra Goria (2008, p. 25), em geral, concebe-se a fraternidade como algo que se aperfeiçoa espontaneamente, o que seria incompatível com o Direito, caracterizado pelo uso da coatividade. Fraternidade e direito, no entanto, não são excludentes. Tal afirmação tem sua comprovação pela normatização do princípio da fraternidade em inúmeras Constituições modernas, transcendendo aos já consagrados princípios da liberdade e da igualdade. Este trabalho identifica, pois, a fraternidade como igualdade em dignidade entre todos os homens; superando a idéia simplista de consangüinidade, ou laços entre parentes, isto é, qualidade que liga membros de uma mesma família, como já foi conceituada. A dignidade, aqui, é considerada numa perspectiva dinâmica, em constante evolução. Entende-se a pessoa num contexto relacional, na busca por sua própria realização em comunidade; sua participação com outras pessoas, respeitando os direitos subjetivos destas. Assim, é que em boa hora a fraternidade como categoria jurídica, há de ser vista como uma nova tendência sistêmica, propiciando as bases não só para o seu reconhecimento no mundo jurídico, como para um novo olhar na atuação jurídica, com a humanização dos operadores e dos próprios tribunais na aplicação do direito. Ao analisar a problemática jurídica relacionada com a Fraternidade, buscamos mostrar a sedimentação deste princípio ao longo do tempo e também em nosso ordenamento jurídico. Para isto, realizamos pesquisa e análise bibliográfica pertinentes ao assunto, enlaçando o teor histórico, jurídico, doutrinário, sociológico e em pesquisas feitas na Constituição em vigor. O trabalho monográfico será dividido em partes; a primeira será direcionada a normatização dos direitos fundamentais e a sua direta relação com os princípios da liberdade, igualdade e fraternidade; a segunda apresentará a ‘9 fraternidade e sua estreita relação com a dignidade da pessoa humana, condição sine qua non para a compreensão do caráter intersubjetivo dos direitos; e a terceira, finalmente, discorrerá sobre o personalismo constitucional e o principio da fraternidade, apresentado o constitucionalismo fraternal e seus reflexos no âmbito jurídico no que concerne a justiça restaurativa e na solução de conflitos como resultado prático do reconhecimento da fraternidade no direito constitucional. ‘10 CAPITULO I – OS PRINCIPIOS DA LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE E O CONSTITUCIONALISMO MODERNO. 1.1 O CONSTITUCIONALISMO MODERNO E A NORMATIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E A SUA RELAÇÃO COM OS PRINCÍPIOS DA LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE. Remontando a primeira idéia de ordenamento jurídico, tem-se que a normatização do direito surge com a organização da sociedade. Tal fato social gera a necessidade de normas que, disciplinando condutas, estabeleçam regras de convivência social. Nestes termos, de acordo com a doutrina de Kelsen (1995, p. 264), a produção do Direito se dará sempre em conseqüência de um ato do poder constituído, isto é, de uma opção feita pelo legislador, em face do poder a ele conferido. Nas palavras de kelsen (1995 p 264): Não existe nenhuma ordem jurídica, de nenhum Estado moderno, segundo a qual os tribunais e outoridades administrativas sejam excluídos da criação de normas jurídicas gerais, isto é, da legislação, e da legislação não apenas com base em estatutos e regras de costume, mas também diretamente baseada na constituição. No decorrer da evolução das sociedades humanas, entretanto, constatouse que há certos direitos, que não se submetem a tal arbítrio e devem ser assegurados. Estes direitos, segundo a doutrina jus naturalista, decorrem da própria natureza humana e se inserem num conjunto de bens da vida insuscetíveis de submissão às ingerências do Estado. Dessa forma, esses direitos adquiriram a denominação de fundamentais, sendo caracterizados pelo professor Silva (2007, p. 181), como irrenunciáveis, imprescritíveis e inalienáveis. A normatização dos direitos do homem sedimentou-se lentamente e está intimamente ligada à necessidade de limitação do poder do Estado, ocorrida mediante o chamado constitucionalismo moderno. ‘11 Em verdade, de acordo com Canotilho (1998, p. 350), costuma-se fazer uma divisão no processo de desenvolvimento da idéia dos direitos fundamentais, marcado por dois importantes documentos do século XVIII: a Declaração da Virgínia, de 1776, no continente americano e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, conseqüência da Revolução Francesa e da queda do regime absolutista. Afirma ainda o mestre português, que antes da publicação destes documentos havia uma “cegueira” em relação à idéia dos direitos do homem e que depois deste marco histórico passou-se a vivenciar a constitucionalização de tais direitos. Como afirma Baggio (2008, p 8 - 9) a grande importância da trilogia de 1789 é a fraternidade adquirir uma dimensão política aproximando-se e interagindo com outros dois princípios que caracterizam as democracias atuais: a liberdade e a igualdade. Porque de fato, até antes de 1789 fala-se de fraternidade sem a liberdade e a igualdade civis, políticas e sociais; ou fala-se de fraternidade em lugar delas. Tal trilogia arrancou a fraternidade do âmbito das interpretações – ainda que bem matizadas – das tradições inserindo-a num contexto totalmente novo ao lado da liberdade e da igualdade, um novum que é anunciado e logo em seguida decai. Permanecem em primeiro plano a liberdade e a igualdade – geralmente mais antagônicas do que aliadas (justamente por serem desprovidas de fraternidade) quase sempre integradas entre si no seio dos sistemas democráticos. Como observa ainda Baggio: Liberdade e igualdade conhecem, assim, uma evolução que as levou a se tornarem autenticas categorias políticas, capazes de se manifestarem tanto como princípios constitucionais quanto como idéias-força de movimentos políticos. A idéia de fraternidade não teve a mesma sorte. Com exceção do caso francês, como principio político, ela viveu uma aventura marginal, o percurso de um rio subterrâneo, cujos raros afloramentos não conseguiam irrigar sozinhos, a não ser esporadicamente, o terreno político. Enfim o pensamento democrático a respeito da fraternidade manteve-se em silêncio. (2008, 8-9). O ideário: liberdade, igualdade e fraternidade, têm sua origem almejada por vários grupos: iluministas, maçons como J. M. Roberts, dentre outros. Todavia, ‘12 encontra raízes na doutrina cristã dos padres da igreja, razão pela qual o seu reconhecimento e atuação no continente europeu são atribuídos aos autores católicos do século XVII. Referido ideário, deu ensejo ao constitucionalismo moderno, isto é, a compilação de um ordenamento jurídico, que possuía no topo de sua pirâmide normativa, a constituição. Ressalte-se que esse movimento não se restringiu apenas ao âmbito jurídico, tendo também alcance sociológico. Do ponto de vista jurídico o constitucionalismo refere-se a um sistema normativo, encabeçado pela constituição, que se coloca acima dos detentores de poder, como meio legítimo de organização e limitação. Por sua vez, sociologicamente simboliza um movimento social que dá suporte à limitação do poder, impossibilitando que os governantes façam prevalecer seus interesses na condução do Estado. Vale registrar, pois, que o estabelecimento de constituições escritas está diretamente ligado à edição das declarações de direitos do homem Moraes (2002, p. 58) e a normatização dos direitos fundamentais. Nas palavras de Bonavides (2007, p. 562): Em rigor, o lema revolucionário do século XVIII, esculpido pelo gênio político francês, exprimiu em três princípios cardeais todo o conteúdo possível dos direitos fundamentais, profetizando até mesmo a seqüência histórica de sua gradativa institucionalização: liberdade, igualdade e fraternidade. Nesse primeiro momento, pós-revolucionário, a parte material das regras constitucionais se apresentava teoricamente estável, pela ausência de opositores. Instituiu-se o Estado Liberal, que, como o próprio nome já evidencia, colocou em relevo a proteção da liberdade. No que pertine ao tema, clara a lição de Bonavides (1980, p. 31), in verbis: (...) no liberalismo, o valor da liberdade, segundo Vierkandt, cinge-se à exaltação do indivíduo e de sua personalidade, com a preconizada ausência e desprezo da coação estatal. Quanto menos palpável a presença do Estado nos atos da vida humana, mas larga e generosa a esfera de liberdade outorgada ao indivíduo. Caberia a este fazer ou ‘13 deixar de fazer o que lhe aprouvesse (...). As Constituições revolucionárias de fins do século XVIII destacavam sobremaneira uma concepção individualista dos direitos fundamentais, fundada no pensamento iluminista Silva (2004, p. 174). Nestes termos, destaca-se a célebre Constituição belga de 1831, que pioneiramente constitucionalizou os direitos do homem, causando impacto no mundo jurídico europeu Bonavides(2007, p. 229). Como relata Rufia apud Silva(2004, p 167),houve uma dupla transformação no que diz respeito à positivação e a subjetivação dos direitos e a constituição belga, cujo Título II efetivamente inscreve os direitos fundamentais dos belgas, fez com que daí por diante as constituições liberais democráticas passassem a trazer um capítulo em que os direitos fundamentais do homem da respectiva vinculação estatal foram subjetivados e positivados. Faz ainda um alerta Silva (2004 p. 167): Cumpre, no entanto, observar que Biscaretti di Rufia não conhece a constituição a constituição do Império do Brasil, de 1824, se não verificaria que a primazia da subjetivação e da positivação dos direitos do homem não cabe a constituição belga, mas a ela, que os enuncia, com as garantias pertinentes, em seu art. 179, cujo caput é bem característico, quando declara que a “inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte” (segue o rol de direitos em 35 incisos). O mundo conheceu, ainda nas primeiras décadas do séc. XIX, a constitucionalização da primeira geração ou primeira dimensão dos direitos fundamentais, direitos de status negativus, segundo a terminologia de G. Jellinek, Canotilho (1998, p. 360) que limitavam a atuação estatal, impondo ao Estado um dever de abstenção; e direitos de status activus, que possibilitavam a participação do cidadão na formação da vontade estatal. Para elucidar os direitos de primeira geração, úteis são as lições de Sarlet (2004b, p. 54), senão vejamos: ‘14 (...) são o produto do pensamento liberal-burguês do século XVIII, de marcado cunho individualista, surgindo e afirmando-se como direitos do indivíduo frente ao Estado, mais especificamente como direitos de defesa, demarcando uma zona de não-intervenção do Estado e uma esfera de autonomia individual em face de seu poder (...). Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, como bem assevera Bonavides (2007, p. 563), os primeiros a figurarem nos textos constitucionais: os direitos civis e políticos. Conclui o autor, ilustrando que tais direitos correspondem à fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente. Com o passar do tempo, contudo, um dos efeitos da conhecida Revolução Industrial foi o surgimento de uma enorme massa proletariada. Essa grande parcela da sociedade se ressentia das gritantes desigualdades pessoais e sociais que sofriam, passando a lutar para que o princípio da igualdade não fosse meramente formal, como era no liberalismo, mas juridicamente reconhecido. O período que simboliza o fim da primeira guerra mundial proporcionou um repensar do Estado e funcionou como um propulsor para que a sociedade constitui-se um novo marco: o Estado Social, que deu especial ênfase à igualdade. Nesse contexto, destacaram-se a Constituição de Weimar de 1919 e a Constituição do México de 1917, como pioneiras na sagração dos direitos de segunda geração ou dimensão: direitos sociais, econômicos e culturais. Deve-se citar, ainda, a Declaração dos direitos do povo trabalhador e explorado, de 1918, produzida com base no ideário da Revolução Russa de 1917, como expressão do constitucionalismo social-democrata Bonavides (2007, p. 564). Tais direitos germinaram em virtude da doutrina antiliberal do século XX e possuem status positivus, já que os indivíduos podem exigir do Estado prestações específicas, concretizadas por meio de políticas públicas. No Brasil foi a Constituição de 1934 que institucionalizou os direitos sociais e econômicos. Não obstante o reconhecimento normativo constitucional que passaram a ter em tantos países, os direitos de segunda geração, ou dimensão, tiveram a sua efetividade questionada, na medida em que importavam em prestações materiais inexeqüíveis pela ausência de recursos (reserva do possível), entre outros fatores. Assim, esses direitos foram remetidos à esfera programática, por não ‘15 conterem, em si, as garantias asseguradas pelos instrumentos processuais de proteção dos direitos da liberdade Bonavides (2007, p. 564). Dificuldade, esta, superada quando as Constituições passaram a formular preceitos que determinavam a aplicabilidade imediata desses direitos, como o faz a própria Constituição brasileira. Vencidas as duas primeiras dimensões dos direitos fundamentais, chegase à terceira geração, consubstanciada nos direitos da fraternidade. Direitos que inauguram um novo patamar, contribuindo para plena efetividade da liberdade e igualdade. Nos dizeres de Bonavides (2007, p. 569): A consciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas ou em fase de precário desenvolvimento deu lugar em seguida a que se buscasse uma outra dimensão dos direitos fundamentais, até então desconhecida. Trata-se daquela que se assenta sobre a fraternidade, conforme assinala Karel Vasak, e provida de uma latitude de sentido que não parece compreender unicamente a proteção específica de direitos individuais ou coletivos. Os direitos de fraternidade Sarlet (2004b, 56) trazem como nota distintiva o fato de se desprenderem, em princípio, da figura do homem-indivíduo como seu titular, destinando-se à proteção de grupos humanos (família, povo, nação). O ponto característico desta dimensão de direitos fundamentais é a sua titularidade coletiva ou difusa, razão pela qual, pode-se afirmar que o seu destinatário é o próprio gênero humano. Nesse contexto, esses direitos têm como diferencial o seu caráter universal, ou, pelo menos, transindividual. Figuram nesse diapasão, o direito à paz, a um meio ambiente equilibrado, à comunicação, entre outros. Alguns autores defendem, ainda, a existência de uma quarta geração dos direitos fundamentais, conseqüência da globalização dos direitos. Nesta vereda, Bonavides (2007, p. 571) cita o direito à informação, ao pluralismo, mas, sobretudo, o direito à democracia direta. A normatização dos direitos de terceira, ou de terceira e quarta dimensão (dependendo do entendimento), recepcionaram uma pueril fase da evolução do constitucionalismo, isto é, passou-se do liberal para o social; e agora, podemos ‘16 acompanhar a evolução do social para o fraternal. Concepção defendida, no Brasil, pelo Ministro Carlos Britto, do Supremo Tribunal Federal ,Britto (2006, p. 216). Assim, esclarecedoras as palavras de Ferreira Filho (1995, p. 57), quando diz que “a primeira geração seria a dos direitos de liberdade, a segunda, dos de igualdade, a terceira, assim, complementaria o lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade”. Estabelece-se, assim, a relação entre a evolução do constitucionalismo moderno, a normatização dos direitos fundamentais e os princípios da liberdade, igualdade e fraternidade. Com o advento dos direitos fraternais de terceira e quarta geração fica clara a necessidade de se aprofundar a relação destes com a dignidade da pessoa humana e seu aspecto relacional. ‘17 CAPITULO II - A FRATERNIDADE E O CARÁTER INTERSUBJETIVO DOS DIREITOS 2.1 A FRATERNIDADE E DIREITOS HUMANOS O processo de redação da Declaração Universal dos Direitos Humanos iniciado pelo conselho econômico e social da ONU em 16 de fevereiro de 1946 concluiu-se em 10 de dezembro de 1948 com a aprovação definitiva pela Assembléia geral. Esta conclusão de redação e aprovação, não por acaso aconteceu em menos de três anos depois das aberrações nazistas. Uma das primeiras questões que viriam a ser enfrentadas era justamente a forma da declaração. A declaração de Direitos Humanos de 1948 possui algumas características que a diferenciam das cartas de direitos anteriores, do século XVIII. Segundo Aquini (2008, p.28) esta diferenciação se da em três aspectos: A universalidade, pois houve a passagem de um projeto de declaração “internacional” para o de uma declaração “universal”; A defesa da autonomia do individuo perante a autoridade ampliou-se se destacando a necessidade de “uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente declaração possam ser plenamente realizados” (artigo 28) e evidenciando também uma responsabilidade individual pela aplicação dos direitos humanos “todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível” (artigo 29); e por ultimo diferencia-se com a definição dos direitos econômicos e sociais, sendo considerado um dos pilares da declaração. “Todos os homens são irmãos. Dotados de razão e consciência, são membros de uma única família. São livres e têm a mesma dignidade e os mesmos direitos”. Texto do 1º artigo proposto em junho de 1947 pelo comitê de redação à Comissão dos Direitos do Homem. Aquini (2008, p130) ‘18 O texto definitivamente aprovado em 1948 dirá: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Este primeiro artigo da declaração Universal dos direitos do homem apresenta-se como uma transposição para a esfera universal dos princípios da liberdade, da igualdade e da fraternidade. A declaração deveria incorporar os seguintes princípios: 1) unidade da família humana; 2) a idéia de que todo ser humano tem o direito de ser tratado como qualquer outro ser humano; 3) o conceito de fraternidade entre os homens. Aquini (2008, p 133). Neste sentido afirma ainda Aquini (2008,p.133): A fraternidade, todavia, não se apresenta apenas como enunciação de um conceito, mas como principio ativo, motor do comportamento, da ação dos homens, com uma conotação essencialmente moral. Assim, Ela deve ser considerada – a meu ver- estreitamente ligada ao mesmo tempo ao preâmbulo, nas partes em que evoca a idéia da família humana e considera a declaração um ideal comum a ser alcançado por todos os povos e nações, e ao artigo 29, que introduz a idéia dos deveres que todo ser humano tem para com a comunidade. Nesta perspectiva, amplia-se o leque de sujeitos sobre os quais recai potencialmente a responsabilidade de por em pràtica os direitos humanos. Como já foi visto anteriormente, tanto na visão liberal como na socialista, esta responsabilidade recai principalmente sobre o Estado, que deve assegurar um mínimo de direitos a todos, mas sem interessar-se pelo fato de outros direitos serem efetivamente respeitados ou não. Observa-se, portanto que a fraternidade tende a ampliar este numero de sujeitos “responsáveis” e, por isso, estimula que deveres e compromissos sejam assumidos além do que esta prescrito pelas autoridades publicas em nível nacional e internacional. O que não diminui a responsabilidade dessas autoridades que deverão diretamente interferir para que o direito seja aplicado, ou ao menos ‘19 predispor um quadro legislativo que promova a ação de outros sujeitos não-publicos, para que se preserve o objetivo fundamental que é a aplicação do Direito. Por fim, se constata que no atual contexto de globalização, onde há um maior número de sujeitos trabalhando em prol da aplicação dos direitos humanos, a fraternidade exerce um papel de permitir que neste campo os problemas sejam enfrentados de um ponto de vista universal, onde todo problema e toda solução passa a ter ligações de interdependência fraternal com outras pessoas, ou outras nações. 2.2 FRATERNIDADE E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O CARATER INTERSUBJETIVO DOS DIREITOS. Para estabelecer a correlação do caráter jurídico da fraternidade com o reconhecimento da dignidade da pessoa humana, foi necessária a anterior abordagem pela constitucionalização dos princípios defendidos na Revolução francesa. Entende-se a fraternidade como igualdade em dignidade. Logo, para se compreender a fraternidade, é indispensável o aprofundamento do princípio da dignidade, que está na base da consagração dos direitos fundamentais. Nesse sentido, urge reconhecer que a concepção de dignidade passou por um processo de racionalização, não obstante ter mantido o seu foco inicial, que é a concepção de igualdade de todos os homens. A consagração do princípio da dignidade da pessoa humana, inserido hoje na Constituição brasileira vigente, em seu artigo 1º, inciso III: TÍTULOI – Dos Princípios Fundamentais Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: c No plebiscito realizado em 21-4-1993, disciplinado na EC nº 2, de 25-8-1992, foram mantidos a república e o presidencialismo, como forma e sistema de governo, respectivamente. c Art. 60, § 4º, I e II, desta Constituição. I – a soberania; ‘20 c Arts. 20, VI, 21, I e III, 84, VII, VIII, XIX e XX, desta Constituição. c Arts. 201, 202, 210 e 211 do CPC. c Arts. 780 a 790 do CPP. c Arts. 215 a 229 do RISTF. II – a cidadania; c Artes. 5º, XXXIV, LIV, LXXI, LXXIII e LXXVII, e 60, § 4º, desta Constituição. c Lei nº 9.265, de 12-2-1996, estabelece a gratuidade dos atos necessários ao exercício da cidadania. c Lei nº 10.835, de 8-1-2004, institui a renda básica da cidadania. III – a dignidade da pessoa humana; c Artes. 5º, XLII, XLIII, XLVIII, XLIX, L, 34, VII, b, 226, § 7º, 227 e 230, desta Constituição. c Art. 8º, III, da Lei nº 11.340 de 7-8-2006, que dispõe sobre a criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 desta Constituição. IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; c Artes. 6º a 11 e 170 desta Constituição. V – o pluralismo político. c Art. 17 desta Constituição. c Lei nº 9.096, de 19-09-1995, dispõe sobre Partidos Políticos. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. Assim como em outras Cartas Políticas contemporâneas (Portugal, Alemanha, Itália etc.) abriga intensa influência da doutrina social da igreja católica. O conceito de pessoa que possui valor em si mesmo, isto é, que possui direitos subjetivos, ou ainda, direitos fundamentais, surge com a chamada filosofia patrística, sendo depois desenvolvida pelos escolásticos (Santos, 1998). Por seu turno, com o desenvolvimento da doutrina jus naturalista fundamentada em um processo de racionalização do tema, completa-se o processo de secularização da dignidade, passando ela a ser intrínseca ao ser humano (Sarlet, 2004a, p. 32). Nesse sentido, afirma Kant apud Machado (1980, p. 134): O Homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como nas que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim. ‘21 Infere-se, desta feita, que, independentemente de ter fundamento teocêntrico ou antropocêntrico, a dignidade será inexoravelmente compreendida como uma qualidade intrínseca da pessoa humana Sarlet(2004b, p. 41). Não podendo o homem ser tratado como um objeto, mas sempre como um fim em si mesmo. A dignidade da pessoa humana consiste, pois, no núcleo essencial de todo direito fundamental. Logo, se o Estado Democrático de Direito tem por fundamento a dignidade da pessoa humana, observa-se que todos os direitos fundamentais possuirão um mínimo de dignidade. Este conteúdo mínimo que é denominado núcleo ,Canotilho(1998, p. 321), mínimo existencial Britto(2007, p. 98), essencial minimum invulnerável Santos(1999, p. 94), ou ainda concebido como o “coração do patrimônio jurídico-moral da pessoa” Rocha(1999, p. 32), não pode deixar de ser assimilado com seu caráter absoluto, e inviolável. Nessa linha, Canotilho (1998, p. 321) assegura que esse mínimo deve ser sempre ressaltado, devendo prevalecer, caso entre conflito com outro direito constitucionalmente garantido. É a essência do direito fundamental, razão pela qual não pode ser objeto de anulação, revogação, mitigações ou relativizações. No texto da Constituição da República Federativa do Brasil, encontramos esse minimum invulnerável1, em todas as normas que tratam de direitos fundamentais. Assim sendo, fica o legislador vedado a criar condições desproporcionais ou que tornem impraticáveis tais direitos. Poderemos citar como exemplos desse mínimo intangível, previstos pela Constituição da República de 1988, a cláusula que assegura que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III), a que garante aos presos o respeito à integridade física (art. 5º, XLIX), ou ainda a regra que traz a garantia do salário mínimo (art. 7º, IV). Dessa maneira, o que se está protegendo é a dignidade da pessoa humana. Cada núcleo essencial representa o conteúdo mínimo de dignidade que há 1 ‘22 em cada direito fundamental. Nas palavras de Ingo Sarlet (2004b, p. 41), “a dignidade se afigura como a qualidade integrante e irrenunciável da condição humana, devendo ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida”. É, justamente, essa condição irrenunciável, que tornam dignas de destaque as observações de Delmas-Marty (2003, p. 52), quando afirma que: A proclamação pela comunidade internacional de um ‘núcleo intangível dos direitos do homem’ deve precisamente velar por ele, com a condição de não proceder por enumeração, fragmentária e sempre recomeçada, das necessidades consideradas como essenciais, mas de definir esta fonte comum a todos os direitos, a qual denominamos ‘igual dignidade’. Vale relembrar que o homem é anterior ao Direito e ao Estado. Logo, acima de qualquer circunstância, tem o homem o direito não só de ser reconhecido como ser humano, como também de ter a sua dignidade protegida constitucionalmente. Desse modo, cabe ao direito a garantia da paz social, isto é, o regular desenvolvimento das relações entre os cidadãos Caso (2005, p. 128). Nesse sentido, têm-se a lição de Freire (2008, p. 85) ao esclarecer que “a aceitação da normatividade do princípio da dignidade da pessoa humana impõe, assim, a aceitação da sua capacidade de produzir efeitos jurídicos, através das modalidades de eficácia positiva, negativa, vedativa do retrocesso e hermenêutica”. Convém anotar, também, a lição dada por Canotilho (1998, p. 542) quando esclarece haver uma base antropológica dos direitos fundamentais, composta não somente pelo ‘homem individual’, mas também pelo homem inserido em relações sócio-políticas e sócio-econômicas e em grupos de várias naturezas, com funções sociais diferenciadas. Com foco nesse paradigma, o caráter relacional e intersubjetivo dos direitos e dos sujeitos de direito receberá novos contornos. Não se concebe a convivência de direitos, experimentada no seio social, como excludente ou paralela. Ao reverso, entende-se o direito como um instrumento que regula condutas, visando fazer com que os sujeitos de direito vivam em relação com os outros e não apesar dos outros Machado(2008, p. 18). ‘23 Assim, em cada ser humano habita, num certo sentido, toda a humanidade. Todos se reduzem a um, à unidade. Desse modo, importante trazer à baila a lição de Delmas-Marty (2003, p. 49), quando elucida que “é o direito à igual dignidade de cada ser que consagra a humanidade do homem – pode-se dizer que sacraliza a humanidade em cada um de nós e contribui para o movimento de hominação.”. Há seu tempo, os ordenamentos jurídicos contemporâneos avançaram na proteção do ser humano, face às intervenções do Estado e dos detentores de poder, garantindo, dentro do possível, liberdade e igualdade. É indispensável garantir, entretanto, a fraternidade. Até porque, tal princípio torna-se premissa e condição dos outros dois (liberdade e igualdade), na medida em que consiste do seu elo humanizador. A fraternidade, mas do que como um princípio ao lado da liberdade e da igualdade, aparece como aquele que é capaz de tornar esses princípios efetivos. Aquini (2008, p 137). E o que afirma Baggio (2008 p 53- 54): O pensamento moderno desenvolveu a liberdade e a igualdade como categorias políticas, mas não fez mesmo com a fraternidade - embora esta seja o alicerce das outras duas -, seja por fraqueza, por medo das implicações, seja pela eclosão do conflito entre religião e modernidade, que tornou particularmente cheio de obstáculos o terreno da fraternidade. No entanto, a fraternidade e o princípio regulador dos outros dois princípios: se vivida fraternalmente, a liberdade não se torna arbítrio do mais forte, e a igualdade não degenera em igualitarismo opressor. A fraternidade poderia ajudar poderia ajudar na realização do projeto da modernidade. Esta ultima, de fato, não deve ser negada; ao contrário, seu projeto deve ser retomado, adequando-o, porém, à plenitude de valores que ele proclama. As Cartas Constitucionais, desta feita, ao consagrarem os princípios da liberdade e da igualdade, reforçaram somente os direitos individuais Voce (2008, p. ‘24 2). No entanto, como demonstramos acima, tal postura não é o bastante, na medida em que não assegura a plena efetivação dos direitos que garantem não só as relações intrapessoais, como as interestatais. Constata-se, pois, a importância e necessidade de aplicação do princípio fundamental da fraternidade. Nesse sentido, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, já indicava que os limites dos direitos individuais, encontravam-se nos direitos de cada cidadão em relação com o outro: Artigo 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo aquilo que não prejudique outrem: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. A Constituição da República de 1988 aponta como um dos seus objetivos: construir uma sociedade livre, justa e solidária. Ao assinalar tal escopo não está descrevendo, como aduz Sarmento (2006, p. 295): (...) uma diretriz política desvestida de qualquer eficácia normativa. Pelo contrário, ela expressa um princípio jurídico, que, apesar da sua abertura e indeterminação semântica, é dotado de algum grau de eficácia imediata e que pode atuar, no mínimo, como vetor interpretativo da ordem jurídica como um todo. Arremata, ainda, o mesmo autor: Na verdade, a solidariedade [aqui também é possível referir-se à fraternidade] implica reconhecimento de que, embora cada um de nós componha uma individualidade, irredutível ao todo, estamos também juntos, de alguma forma irmanados por um destino comum. Ela significa que a sociedade não deve ser um lócus da concorrência entre indivíduos isolados, perseguindo projetos pessoais antagônicos, mas sim um espaço de diálogo, cooperação e colaboração entre pessoas livres e iguais, que se reconheçam como tais. Nesse contexto, o princípio da fraternidade já é utilizado para consagrar os direitos transindividuais ou metaindividuais, além das práticas de ações afirmativas e de justiça distributiva. ‘25 O princípio da dignidade da pessoa humana está estritamente ligado ao da fraternidade, visto que compõe o seu conceito, além de orientar a sua atuação, portanto, a fraternidade, delimitada pela dignidade, norteia as relações entre os sujeitos de direito, garantindo uma convivência pacífica, além da solução justa dos conflitos, razão pela qual ocasionou o surgimento do constitucionalismo fraternal. ‘26 CAPITULO III - O PRINCIPIO DA FRATERNIDADE E O CONSTITUCIONALISMO 3.1 O PERSONALISMO CONSTITUCIONAL E O PRINCIPIO DA FRATERNIDADE O personalismo constitucional é possível ser vislumbrado segundo Pizzolato (2008, p.115-116) na constituição italiana onde se torna o valor fundamental, sendo o ponto de mediação antropológica no qual toda a arquitetura constitucional se sustenta, concepções estas totalmente contrárias as que as precederam próprias do estado totalitário que na Itália chamou-se fascismo e do estado liberal individualista. A primeira concepção é evitada por pesar o valor e dignidade do individuo na medida em que faz parte de um organismo maior ao qual deve ele dedicar sua existência individual, na segunda concepção o modelo individualista refutado por nossos constituintes como versão ideal-típica contesta a própria matriz de origem no direito natural iluminista e no contratualismo liberal. Ainda segundo Pizzolato, por traz de tudo isso, esta a idéia de individuo desconhecida anteriormente como entidade originária e titular de direitos naturais que cuja consistência precede a idéia de sociedade que neste caso tornase o fruto posterior e eventual de um livre ato de vontade (um contrato) estipulado entre indivíduos, todos livres, independentes e iguais. Esclarece ainda o mestre italiano, Pizzolato (2008, p.117). Não se chega, porém, ao personalismo apenas por diferença ou por oposição aos dois modelos repudiados. Ele tem um estatuto filosófico e antropológico bem definido, que se enraíza, na tradição, acolhida e desenvolvida também pela doutrina social da igreja, que parte de Aristóteles. Passa por Santo Tomás e chega justamente até o personalismo (comunitário) de Mounier e Maritain. Nessa perspectiva, o que se evidencia é o caráter naturalmente social e político da pessoa, cuja identidade só se constrói na relação social com o diferente de si, no pertencimento histórico e no enraizamento cultural. Mounier apud Pizzolato (1975, p.94) explica que a identidade humana esta constitutivamente inserida no sistema estruturado e solidário das relações sociais e segundo a ótica personalista, todo homem é um ser estruturalmente carente e aberto à relação com o diferente de si. Portanto, o que caracteriza o ‘27 homem é a interdependência estrutural. Para Baggio esta suposta estruturalidade do caráter relacional do homem, sustenta a afirmação de que o processo de constituição da personalidade desenvolve-se e aperfeiçoa-se por intermédio das estruturas da sociedade, pertencer a uma comunidade é constitutivo e estrutural da personalidade humana, não um dado acessório ou opção eventual. Permanecendo nessa concepção antropológica constitucional, afirma Pizzolato (2008, p.118): (...) o fraco, o carente, não representa um “homem menor”, mas constitui o ícone do homem em si, por manisfestar plenamente a abertura estrutural que todo homem tem à relação com os outros, dos quais tem necessidades a fim de formar uma identidade para si e a fim de viver. (...) Portanto, antes do individuo existe necessariamente uma comunidade, entendida como rede de relacionamentos, tecido de relações, quadro de solidariedade que sustenta o próprio individuo e permite o seu desenvolvimento. É através da análise deste personalismo que começa a se delinear de modo nítido a fraternidade, como observa Pizzolato (2008, p.119): Justamente por ser a fraqueza aquilo que identifica os homens entre si, não existe para a solidariedade o caminho do paternalismo, mas tão-somente o da fraternidade. O personalismo não corre o risco, ao menos no campo teórico, de cair no assistencialismo, pois não há nele uma separação entre uma categoria de “fortes”, que de maneira paternalista, deve prestar socorro, e uma categoria de “fracos”, destinatária do socorro. O que há é uma interdependência e uma fraternidade, na qual todo cidadão tem o dever de desenvolver uma atividade ou uma função que concorra para o progresso material e espiritual da sociedade. O principio da fraternidade penetrou, ainda que discretamente, no ordenamento jurídico, passando a ser aplicado por outras vias, como no caso italiano onde não há espaço para a vontade o “absolutista” dos direitos uma vez que o que regula a solidariedade, o reconhecimento e os conflitos de tais direitos e a solidariedade. ‘28 Não cabe, portanto como afirma Pizzolato nenhuma afirmação prioritária de liberdade, mas um reconhecimento contínuo dos direitos entre si e com as exigências sociais. Para bem esclarecer sobre este chamado balanceamento dos direitos promovido pela fraternidade nos diz Pizzolato (2008, p.124): Assim, a fraternidade age no ordenamento como solidariedade que nasce da ponderação entre as esferas de liberdade, e que é confiada não à intervenção do Estado enquanto sujeito ativo da relação jurídica, mas sim à ação do estado enquanto ordenamento jurídico. É oportuno esclarecer que o principio da fraternidade – reconstruídomesmo que fragmentado pelo ordenamento jurídico italiano primeiramente na sua Constituição, não tem o mesmo significado que esse termo assume na tradição jurídica e filosófica francesa. Na França, a fraternité nasce e desenvolve-se em pleno clima revolucionário, num ambiente cultural iluminista. Alerta ainda Pizzolato (2008,p.125) que não podemos, portanto, ao considerar o contexto histórico, encontrar, na fraternidade revolucionaria a idéia de uma solidariedade confiada à estruturação social, por meio de formações sociais responsáveis, tal como se deduz do ordenamento constitucional italiano. Nas palavras de Pizzolato (2008, p. 126): O principio de fraternidade conjugado em sentido personalista passa pelo reconhecimento e pela valorização institucional de um tecido social rico e solidário (as comunidades), de um sistema de relações estruturado em formações sociais, na qual seja continuamente recriada a interdependência entre os sujeitos, a base mais duradoura da solidariedade. A promoção desse tecido social interdependente e (por isso) solidário permite ao Estado buscar o desenvolvimento da pessoa humana sem substituir as formações sociais intermediárias, mas ao contrário, responsabilizando-as, promovendo sua lógica participativa e inserindo-se nelas. Trata-se, portanto, de uma fraternidade que segue o modelo comunitário, de cunho ético, não baseada em improváveis convergências espontâneas de interesses individuais e egoístas, nem na transferência integral ao estado das tarefas de socorro às fraquezas. ‘29 Neste sentido, a fraternidade torna cada individuo responsável pelo outro e consequentemente pelo bem da comunidade promovendo a busca de soluções para a aplicação do Direito sem que necessariamente dependam da autoridade publica, tendo como conseqüência a valorização de entidades associativas e econômicas voltadas à busca da ampliação das liberdades civis e políticas e, ao mesmo tempo, a melhoria das condições sociais e econômicas. 3.2 O CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL Após os dois grandes momentos do Constitucionalismo Moderno onde o primeiro foi marcado pelo constitucionalismo liberal e o segundo evidenciado pelo constitucionalismo social. Vislumbra-se agora o Constitucionalismo fraternal. Como visto, o constitucionalismo liberal firmou-se no fortalecimento do individualismo, baseando-se no ócio do poder estatal e na propriedade privada. Enquanto que o constitucionalismo social, fruto da continua racionalização do constitucionalismo, buscou ir além, para tentar restringir o poder econômico, com o intuito de limitar a concentração de renda e, via de regra, a exclusão social. Assim sendo, constata-se que na vertente liberal, a inação do Estado é condição de império do princípio da liberdade. Por outro lado, na corrente social, a ação estatal é utilizada com o fim de concretizar o princípio da igualdade. Princípios de cuja união indissolúvel emerge o futuro do constitucionalismo contemporâneo, isto é, o constitucionalismo fraternal, com base no princípio da fraternidade. Concretizando, desta feita, como bem asseverou Bonavides (2007, p. 562) a institucionalização do lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. Nesse sentido, o Estado Fraternal veio transcender o Estado Social, contudo sem o negar. Assim como, o Estado Social superou o Estado Liberal, não obstante ter mantido, igualmente, as suas conquistas Britto (2006, p. 216). Em verdade, só depois da Declaração Universal dos direitos do Homem é que as Leis Fundamentais de cada povo soberano foram ganhando uma funcionalidade fraternal Britto (2006, p. 179). ‘30 No Brasil, a Constituição da República de 1988 faz referências expressas tanto à fraternidade, como à solidariedade. Já no seu preâmbulo reconhece a sociedade brasileira como fraterna, pluralista e sem preconceitos. Por seu turno, o artigo 3º, inciso I, evidencia como um dos compromissos fundamentais da República Federativa do Brasil: a construção de uma sociedade livre (homenagem à liberdade, aspecto político), justa (é a dimensão social de ações distributivas) e solidária (é a dimensão fraternal) 2. No transcurso do texto magno, constata-se ainda a consagração dos direitos fundamentais de terceira e quarta gerações, como o direito ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à comunicação, dentre outros. Assim sendo, o corpo constitucional é formado por uma gama de princípios consagrados com força constitucional. De acordo com Britto (2006, p.180), a Constituição Cidadã de 1988 é fundada em princípios, os quais devem ser analisados como supernormas de Direito, na medida em que se adicionou a mera dignidade formal da Constituição, uma dignidade material, garantindo uma supereficácia normativa da Carta Constitucional. No mesmo diapasão, Miranda (1983, p.199) afirma terem os princípios fundamentais uma função ordenadora, bem como possuírem aplicação imediata, enquanto diretamente capazes de conformarem relações político-constitucionais. Arremata o autor, esclarecendo que a ação imediata dos princípios consiste, em primeiro lugar, em funcionarem como critério de interpretação e de integração, pois são eles que dão coerência geral ao sistema. Sem embargo, estes direitos nucleares dos seres humanos que lastreiam a dinâmica da atuação do poder originário estão se inclinando, abruptamente, na direção de um comando constitucionalista de estirpe fraternal, Stefanini (2006, p. 14). Essa nova fase do constitucionalismo moderno funda-se numa integração comunitária, como bem esclarece Britto (2006, p. 216), in verbis: 2 Pensamento expresso no voto do Ministro Carlos Ayres Britto, na ADI nº. 3.768-4/DF, julgada pelo Supremo Tribunal Federal e publicada no DJ. 26/10/2007. ‘31 (...) entendamos por Constitucionalismo Fraternal esta fase em que as Constituições incorporam às franquias liberais e sociais de cada povo soberano a dimensão da Fraternidade, isto é, a dimensão das ações estatais afirmativas, que são atividades assecuratórias da abertura de oportunidades para os segmentos sociais historicamente desfavorecidos, como, por exemplo, os negros, os deficientes físicos e as mulheres (para além, portanto, da mera proibição de preconceitos). De par com isso, o constitucionalismo fraternal alcança a dimensão da luta pela afirmação do valor do Desenvolvimento, do Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, da Democracia e até de certos aspectos do urbanismo como direitos fundamentais. Nesses termos, o reconhecimento de uma sociedade fraterna passa pela vivência de uma vida plural, onde cada cidadão tem suas especificidades, aceitas sem preconceitos. Esse respeito recíproco define uma ação que vai além da garantia da mera liberdade individual, ou de uma simples busca pela inclusão social, na medida em que se preocupa com a realização dos direitos do homem, por meio da fraternidade. O Estado Fraternal caracteriza-se, pois, pela plena integração dos princípios da liberdade, igualdade e fraternidade. Isto porque, não pode haver fraternidade sem a liberdade de todos os cidadãos, garantida pelo ordenamento jurídico; assim como também não há fraternidade senão entre iguais. Nessa linha, Britto (2006, p. 217) ensina que: (...) a compassiva ou aproximativa igualdade social é a condição material objetiva para o desfrute de uma liberdade real. Tanto quanto esse mesmo tipo de igualdade social é condição material objetiva para o desfrute de uma fraternidade como característica central de qualquer povo. A consagração da fraternidade depende, pois, da realização de uma igualdade que supere os simples gastos públicos com a massa populacional menos favorecida, para a ascensão a uma igualdade em dignidade. A lição de Bernhard (2008 p. 61-62): (...) a fraternidade está ligada aos princípios de liberdade e de igualdade, assegurados por constituições em todos os Estados Modernos. (...) a fraternidade pressupõe a liberdade individual ‘32 e a igualdade de todos os homens, e está numa relação de interdependência mútua com esses dois princípios. Os três conceitos têm por raiz a dignidade da pessoa humana. O objetivo atingido de proteger os Direitos Humanos quanto o alcance da tutela e da garantia do indivíduo, deve valer – segundo o conceito de fraternidade – como garantia mínima para cada indivíduo, em cada tempo e em cada lugar, inclusive os direitos sociais. Os tribunais brasileiros também já se utilizaram da fraternidade na resolução de certas lides. O julgamento da ADI 3.768-4/DF, quando o Supremo Tribunal Federal assegurou a gratuidade dos transportes públicos urbanos e semiurbanos para os idosos, reconhecendo a necessidade de se garantir uma vida digna, além de se fundamentar na dignidade humana como fundamento a ser garantido. O Ministro Carlos Ayres Britto Neste julgamento afirmou que o direito sob análise tratava-se de um direito fraternal, já que exigia do Estado “ações afirmativas, compensatórias de desvantagens historicamente experimentadas por segmentos sociais como os dos negros, dos índios, dos portadores de deficiências e dos idosos”. A lição de Bernhard (2008, p. 61- 62), confirma o entendimento esboçado, senão vejamos: (...) a fraternidade está ligada aos princípios de liberdade e de igualdade, assegurados por constituições em todos os Estados Modernos. (...) a fraternidade pressupõe a liberdade individual e a igualdade de todos os homens, e está numa relação de interdependência mútua com esses dois princípios. Os três conceitos têm por raiz a dignidade da pessoa humana. O objetivo atingido de proteger os Direitos Humanos quanto o alcance da tutela e da garantia do indivíduo, deve valer – segundo o conceito de fraternidade – como garantia mínima para cada indivíduo, em cada tempo e em cada lugar, inclusive os direitos sociais. Temos então, indispensáveis e esclarecedoras as palavras de Britto (2006, p. 218), esclarecendo que: (...) a Fraternidade é o ponto de unidade a que se chega pela conciliação possível entre os extremos da Liberdade, de um lado, e, de outro, da Igualdade. A comprovação de que, também nos domínios do ‘33 Direito e da Política, a virtude esta sempre no meio (medius in virtus). Com a plena compreensão, todavia, de que não se chega à unidade sem antes passar pelas dualidades. Este, o fascínio, o mistério, o milagre da vida. Desse modo, tem-se que a Carta Constitucional de 1988, consagrou a fraternidade em seu texto, o que proporcionou o desenvolvimento pela doutrina dos conceitos primários do constitucionalismo fraternal, o qual já vem sendo acolhido igualmente nos tribunais pátrios. 3.3 REFLEXOS DE UM CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL Cabendo ao direito regular os conflitos das relações jurídicas entre partes provocadas pelo caos da ruptura da convivência social, o principio da fraternidade è essencial para recomposição da harmonia entre estas bem como a pacifica coexistência entre as mesmas, de forma que os conflitos sejam reduzidos e rapidamente solucionados. Este objetivo vem sendo perseguido na vida de tantos que operam no campo da ética social, do direito, da justiça e da administração publica. Esta experiência vital dentro do Direito, o confronto e a troca de idéias entre aqueles que assumem a fraternidade como novo parâmetro o qual se possa basear todas as relações para recompor a sociedade, permitem individualizar formas novas de operar nos vários âmbitos do direito constitucional, como também formas novas de desenvolver as diferentes funções sejam aquelas que beneficiam o individuo ou aquelas que beneficiam a coletividade. Com esta finalidade verifica-se que em algumas partes do Brasil e do mundo formam-se ‘’grupos’’ de docentes de ética social e de direito, magistrados e advogados, funcionários do judiciário, agentes penitenciários e empregados públicos, que organizam congressos onde nascem e se concretizam iniciativas varias que vão desde a educação a legalidade à renovação dos ambientes e das estruturas. ‘34 Citamos dentre as varias algumas delas, inicialmente enunciando o resultado qual se obtém e em seguida expondo as iniciativas concretas que podem conduzir aos mesmos: Moralização da vida publica: perseguida seja mediante aos congressos de estudo, seja, em particular, através do empenho pessoal e coletivo para exercitar as funções publicas com honestidade e transparência, opondo-se ao fenômeno da corrupção e instaurando modalidades corretas de gestão publica; Educação à legalidade: atividades formativas e informativas nas escolas e na sociedade, valorizando os contributos de experiência e de vivencias pessoas de operadores de direito e de administração publica; Ordenamento jurídico e administração da justiça: através do empenho dos diversos operadores em atuar as atividades em favor de uma administração jurídica eficaz e que responde às necessidades tutelares de cada individuo e da coletividade; estudos, pesquisas e congressos que contribuem para a renovação do direito e da justiça; Prevenção e recuperação social: ação interna nos institutos penais para reabilitação humana e social dos detentos, e para o melhoramento da função do sistema carcerário. É exemplo disto quanto fazem operadores na Itália, nos Camarões, na Nigéria e Espanha; e em muitos outros paises em que os momentos de violência e retaliação foram substituídos por um confronto de ações e idéias entre agentes penitenciários e detentos, com a participação de psicólogos, magistrados, ex-detentos, chapelões, diretores e advogados; Proteção e promoção dos direitos humanos: participação e colaboração com os Órgãos Internacionais (ONU e ONG), para estudo de soluções e atividades concretas que promovem a fraternidade; ‘35 CONSIDERAÇÕES FINAIS É a abertura ao novo e as mudanças, que possibilita ao Direito Constitucional o contínuo resgate de seu compromisso com a Democracia, na medida em que se voltará com toda atenção àqueles que buscam a justiça, por meio da plena efetivação de seus direitos fundamentais. Entre os bons resultados na elaboração deste trabalho, para um enriquecimento acadêmico, destaca-se o reforço a uma leitura do Direito Constitucional abrangendo sua evolução histórica e, portanto, vislumbrando sua capacidade de amplitude e sua possibilidade de incorporar novos paradigmas, entre eles a aplicação do princípio da fraternidade como uma nova tendência nos tribunais e no atuar jurídico. Deve-se frisar a importância desse momento de transformação, com o acolhimento do princípio da fraternidade nos foros jurídicos. Descortina-se um novo momento para Direito, acrescentando-se uma nova exigência de eficácia das normas constitucionais, para que criem não só a ordem, mas também aprimorem a relação entre os indivíduos, e as leis devem refletir e inspirar este caráter humanizador. A valorização do princípio da fraternidade no meio jurídico vem, justamente, aprimorar a efetivação de direitos, garantindo maior segurança, e ampliando a visão sobre os conflitos e seus envolvidos. Acredita-se que o futuro do constitucionalismo será marcado por valores como a verdade, não cabendo mais as promessas impossíveis de serem realizadas, será um constitucionalismo transparente, e eficaz acima de tudo. As constituições do futuro deverão aproximar-se de uma nova idéia de igualdade, baseada na solidariedade dos povos, na dignidade da pessoa humana e na justiça social. As reformas constitucionais, embora objetivando adaptar os textos constitucionais às exigências da realidade, deverão ocorrer com ponderação e equilíbrio, sem descartar ou romper com as varias idéias antecedentes. Será um processo continuo onde a sociedade participará de forma ativa, integral e equilibrada no processo. ‘36 Em razão disso, este trabalho comunga com aqueles que acreditam na consagração do princípio da Fraternidade no direito constitucional de modo a aprimorar a prestação jurisdicional, bem como a vida em sociedade, colocando em relevo o ser humano. A Fraternidade vem sendo debatida em congressos, além de alguns artigos na doutrina. Vem, igualmente, sendo contemplada em algumas decisões jurisprudenciais, mas ainda é pouco, razão pela qual se sugere o amplo debate do tema não só em seminários, mas por todos os meios, de modo a alcançar o maior número de operadores jurídicos e a sociedade como um todo. Finaliza-se este trabalho, reconhecendo-se, ainda, a existência de várias questões não resolvidas na matéria estudada, o que é natural em assunto de tão pouca tradição. Nossa expectativa é contribuir com a demonstração de que a fraternidade pode e deve ser reconhecida no âmbito jurídico-constitucional, a fim de melhorar não só a solução dos conflitos emergentes de disputas diversas como também todo o atuar jurídico. É importante perceber que neste contexto, já emergem resultados benéficos, junto aos grandes grupos envolvidos nos casos já julgados (idosos deficientes físicos etc.). Temos os exemplos da incidência do principio da fraternidade no campo da justiça restaurativa e na mediação de conflitos. O pleno reconhecimento da fraternidade no âmbito constitucional, certamente irá contribuir para a exata compreensão e construção do bem comum e na solução de varias demandas, o que provocara a conseqüente jurisprudência, o que é de costume acontecer no andamento do Direito. ‘37 REFERÊNCIAS: ANDREA, Moreira. Direito e Fraternidade se encontram. Revista Cidade Nova, Sao Paulo, v. 11, p. 20-23, nov.2007. BAGGIO, Antonio Maria(Org.);Pizzolato,Filippo;AQUINI,Marco.(2008). O princípio esquecido. São Paulo, Ed. Cidade Nova. BARZOTTO, Luiz Fernando. Pessoa, Fraternidade e Direito. Disponível em http://www.maritain.com.br/index2.php?p=productMore&iProduct=13. Acesso em 20/07/2008. BERNHARD. Agnes. Elementos do Conceito de Fraternidade e de Direito Constitucional. In. CASO, Giovani, CURY, Munir, CURY, Afife, Souza, Carlos Aurélio Mota de (Coords.). 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