UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ – UNOCHAPECÓ ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO TAMARA GRANDO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR DA CRIANÇA COM A GENITORA CARCERÁRIA Chapecó (SC), 2010 TAMARA GRANDO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR DA CRIANÇA COM A GENITORA CARCERÁRIA Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito, sob a orientação da Profª. Me. Helenice Aparecida Dambós Braum. Chapecó (SC), jun. 2010 UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ – UNOCHAPECÓ ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR DA CRIANÇA COM A GENITORA CARCERÁRIA TAMARA GRANDO ________________________________________ Profª. Me. Helenice Aparecida Dambrós Braum Professora Orientadora ________________________________________ Prof. Me. Glaucio Wandre Vicentin Coordenador do Curso de Direito ________________________________________ Profª. Me. Silvia Ozelame Rigo Moschetta Coordenadora Adjunta do Curso de Direito Chapecó (SC), jun. 2010 TAMARA GRANDO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR DA CRIANÇA COM A GENITORA CARCERÁRIA Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de BACHAREL EM DIREITO no Curso de Graduação em Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ, com a seguinte Banca Examinadora: ____________________________________________ Me. Helenice Aparecida Dambrós Braum – Presidente ____________________________________________ Me. Kassiana Ventura Oliveira – Membro ________________________________________ Me. Silvia Ozelame Rigo Moschetta – Membro Chapecó (SC), jun. 2010 AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer à minha família, que não mediu esforços para que eu chegasse até esta etapa da minha vida. E, em especial, gostaria de agradecer ao meu namorado, Nelson Gustavo Guarezi, que jamais me negou ajuda nos momentos de dificuldade na elaboração do presente trabalho e quem sempre esteve ao meu lado nos bons e maus momentos da vida. “O que me preocupa não é o grito dos maus, é o silêncio dos bons”. (M. L. King) RESUMO O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR DA CRIANÇA A GENITORA CARCERÁRIA. Tamara Grando. Helenice Aparecida Dambrós Braun. (ORIENTADORA). (Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ). (INTRODUÇÃO) A convivência familiar é de extrema importância para o pleno desenvolvimento do ser humano, sendo um direito amplamente defendido pela legislação brasileira. No entanto, sabe-se das condições desumanas em que vivem os condenados e as crianças de nascem e crescem nos presídios brasileiros. Diante disso, aborda-se como problema passível de análise a permanência ou não das crianças em companhia de sua genitora condenada, após o aleitamento materno, frente ao princípio da dignidade da pessoa humana. (OBJETIVOS) Tem-se como objetivo geral da presente pesquisa apontar qual a melhor solução perante o conflito existente entre o direito à dignidade e o direito da criança à convivência familiar, levando-se em consideração o fato da genitora estar reclusa em um estabelecimento penal. Os objetivos específicos são conceituar o princípio da dignidade humana; caracterizar o direito de convivência da criança com sua genitora, previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo Código Civil e pela Constituição Federal; apresentar os benefícios resultantes da convivência familiar e os malefícios que a sua ausência causa; analisar o direito de convivência da criança com sua genitora carcerária à luz da Lei de Execuções Penais, e por fim, identificar a melhor solução diante do impasse existente entre o princípio da dignidade da pessoa humana e a convivência da criança com sua genitora condenada. (EIXO TEMÁTICO) A pesquisa vincula-se ao Eixo Temático Cidadania e Justiça do Curso de Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ. (METODOLOGIA) O aprofundamento teórico do estudo teve como base a pesquisa bibliográfica, consistindo na análise da legislação, doutrinas e artigos jurídicos, utilizando-se o método dedutivo para formalizar o trabalho. (CONCLUSÃO) Considerando as condições precárias em que se encontram os presídios brasileiros e a frágil saúde física e mental do recém-nascido, é necessário que haja uma efetiva ação do Estado para o cumprimento da legislação, dotando os presídios femininos de creches e berçários para que as crianças possam ficar acomodadas durante o aleitamento materno. (PALAVRAS-CHAVE) Dignidade da pessoa humana, convivência familiar, presídios femininos, criança. LISTA DE ANEXOS ANEXO A – Atestado de Autenticidade da Monografia ......................................................... 83 ANEXO B – Termo de Solicitação de Banca........................................................................... 85 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10 CAPÍTULO I .......................................................................................................................... 13 1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS ................................................................................................................. 13 1.1 Análise conceitual de princípios ......................................................................................... 13 1.1.1 Princípios e regras .......................................................................................................... 16 1.1.2 Classificação dos princípios............................................................................................ 17 1.2 Aspectos históricos do princípio da dignidade da pessoa humana ..................................... 18 1.2.1 Revolução Francesa ........................................................................................................ 19 1.2.2 A Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho .................................... 20 1.2.3 A Segunda Guerra Mundial – O Pós-Guerra .................................................................. 20 1.2.4 A Carta das Nações Unidas de 1945 ............................................................................... 22 1.2.5 Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 ................................................... 23 1.2.6 A Constituição Federal de 1988 e a Dignidade da Pessoa Humana .............................. 25 CAPÍTULO II ......................................................................................................................... 31 2 DIREITO DE FAMÍLIA E DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR .............................. 31 2.1 O direito de família na Constituição Federal de 1988 ........................................................ 32 2.2 Os princípios de direito de família ..................................................................................... 36 2.2.1 O princípio da proteção integral da criança e do adolescente ....................................... 37 2.2.2 O princípio da afetividade ............................................................................................... 40 2.2.3 O princípio da solidariedade........................................................................................... 42 2.3 O direito à convivência familiar ......................................................................................... 44 CAPÍTULO III ....................................................................................................................... 50 3 A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E A CONVIVÊNCIA FAMILIAR ................................... 50 3.1 Aspectos históricos e conceituais da pena .......................................................................... 51 9 3.2 A Lei de Execução Penal .................................................................................................... 57 3.2.1 Princípio da legalidade ................................................................................................... 58 3.2.2 Princípio da humanização da pena ................................................................................. 61 3.2.3 Princípio da individualização da pena............................................................................ 63 3.3 Direito à convivência familiar da criança com a mãe carcerária à luz da Lei de Execuções Penais ................................................................................................................ 65 CONCLUSÃO......................................................................................................................... 72 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 75 ANEXOS ................................................................................................................................. 83 INTRODUÇÃO Esta pesquisa tem como tema a análise do princípio da dignidade humana e o direito de convivência da criança com sua genitora carcerária. A precária situação dos presídios no Brasil não é nenhuma novidade. Além dos inúmeros problemas existentes no sistema prisional, como a superlotação e a ausência das mínimas condições de vida, outro fato vem chamando a atenção: as crianças que nascem e crescem nesse ambiente. O Estatuto da Criança e do Adolescente, a Constituição Federal e o Código Civil de 2002 regulamentam o direito de convivência do infante com seus genitores, para que os princípios da afetividade, solidariedade e proteção integral da criança e do adolescente tenha sua efetivação plena. Sabe-se da importância da convivência da criança com sua genitora para o desenvolvimento psicológico e social desta e todas as consequências que a ausência de carinho e amor materno acarreta ao longo da vida. Contudo, o princípio da dignidade da pessoa humana, o mais importante do nosso sistema jurídico, defendido também pela Constituição Federal, não encontra efetividade dentro do sistema penal brasileiro, pois a criança, já nos seus primeiros dias de vida fica exposta a ambientes insalubres e totalmente inadequados para seu crescimento. No atual contexto normativo, a dignidade da pessoa humana constitui-se em um dos princípios basilares do direito brasileiro, a irradiar efeitos sobre todas as áreas jurídicas e exigir a atuação do Estado na busca de sua concretização de forma constante. A abordagem desta temática é relevante, uma vez que o problema das crianças nascendo e crescendo em condições precárias é uma realidade nos presídios do Brasil. Dentro do sistema penitenciário brasileiro, as crianças ficam expostas as mais diversas doenças, 11 notadamente problemas respiratórios, em razão do ambiente úmido e mal ventilado, agravado pelo fato da grande maioria das presidiárias fazer uso de cigarro dentro das celas. Embora a lei regulamente a situação das crianças vivendo em presídios juntamente com sua mãe, a legislação mostra-se omissa em diversas situações, como por exemplo, o tempo em que a criança permanecerá no sistema prisional. Além disso, o Estado não cumpre a legislação de forma a garantir o mínimo de condições de vida das crianças no sistema carcerário, não dotando os presídios e penitenciárias femininas de creches e berçários. Surge desta forma, um impasse na legislação brasileira entre dois direitos previstos no nosso ordenamento jurídico, o direito de convivência da criança com sua genitora presidiária e o direito à dignidade da pessoa humana, ambos protegidos constitucionalmente. O objetivo geral desta pesquisa é identificar qual é a melhor solução perante o conflito existente entre dois direitos garantidos ao indivíduo, quais sejam, a dignidade da pessoa humana e o direito da criança à convivência familiar, levando-se em consideração o fato da genitora estar reclusa em um estabelecimento penal. Tem-se, ainda, como objetivos específicos, conceituar o princípio da dignidade humana; caracterizar direito de convivência da criança com sua genitora, previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo Código Civil e pela Constituição Federal; observar os benefícios resultantes da convivência familiar e os malefícios que a sua ausência causa; analisar o direito de convivência da criança com sua genitora carcerária decorrente da Lei de Execuções Penais, e por fim, apontar a melhor solução diante deste problema que vem ocorrendo nos presídios brasileiros. O tipo de pesquisa utilizada é a bibliográfica, com base em leituras de doutrinas específicas, artigos jurídicos e a própria legislação. O método de pesquisa utilizado para o desenvolvimento do presente trabalho é o dedutivo, pois partiremos de argumentos gerais para argumentos específicos, levando-se em consideração a análise de princípios constitucionais e de direito de família, doutrinas, artigos jurídicos e a legislação vigente. Esta pesquisa é vinculada ao eixo Cidadania e Justiça, do Curso de Direito da Universidade Comunitária da Região de Chapecó. No primeiro capítulo aborda-se sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, realizando-se um estudo sobre sua evolução história e uma análise conceitual do referido 12 princípio. Posteriormente, estuda-se o conceito de família, sua evolução na legislação pátria, os princípios que regem este ramo do direito e ainda a caracterização do direito de convivência da criança com sua mãe, sob a ótica do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Código Civil e da Constituição Federal de 1988. Por fim, no terceiro capítulo, analisa-se o instituto da pena, sua evolução, seu conceito e sua finalidade, sendo após analisada a Lei de Execução Penal, seus princípios norteadores e sua previsão acerca do direito à convivência familiar e discutida a melhor solução para a problemática da pesquisa. CAPÍTULO I 1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS O presente capítulo tem por objetivo fazer uma abordagem histórica do princípio da dignidade da pessoa humana, com destaque para a Constituição Federal brasileira de 1988, notadamente neste tópico. Para tanto, parte-se do estudo dos princípios em geral e sua relevância para o estudo do Direito, após serão abordados fatos históricos que culminaram para a efetivação dos Direitos Fundamentais e a Dignidade da Pessoa Humana. Em seguida, é analisado especificamente o princípio da dignidade humana e sua consagração no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que se constitui como fundamento da República Federativa do Brasil. Desta feita, o propósito deste capítulo é fornecer subsídios para a compreensão da Dignidade da Pessoa Humana e sua importância, enquanto princípio fundamental. 1.1 Análise conceitual de princípios No direito brasileiro, os princípios são a base de todo sistema jurídico, são eles que dão sustentação ao conjunto de leis que compõe o nosso sistema normativo. São normas de grande relevância no ordenamento jurídico e que estabelecem fins. Por esta razão, os princípios em hipótese alguma poderão ser desprezados quando da interpretação da norma jurídica. 14 Os princípios são uma reminiscência do direito. São eles que compõem a estrutura dos sistemas e constituem as relações jurídicas entre todas as normas, bem como fazem parte do sistema jurídico como regras estruturais (FERRAZ JUNIOR, 2005, p. 247-248). Barcellos e Barroso (2009) estabelecem que “os princípios contêm, normalmente, uma maior carga valorativa, um fundamento ético, uma decisão política relevante, e indicam uma determinada direção a seguir”. No mesmo sentido, Alexandrino e Paulo (2009, p. 269): Os princípios são as idéias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que possibilita uma adequada compreensão da sua estrutura. Os princípios determinam o alcance e o sentido das regras de um dado subsistema do ordenamento jurídico, balizando a interpretação e a própria produção normativa. Os princípios não especificam a direção a ser tomada, eles são mais abstratos e se aplicam de forma ampla. Para sua aplicação, é necessária a ponderação. Diante do caso concreto, o intérprete devera atribuir a cada princípio seu peso, não se utiliza a política do tudo ou nada, mas sim se levar em conta a situação de fato (BARCELLOS; BARROSO, 2009). Para Mello (1980, p. 230), princípio é por definição: [...] mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico [...]. Ferreira Filho (2008, p. 394-495), afirma que os princípios são normas jurídicas gerais e importam em uma ordem de aproveitá-los ao máximo nos casos em que cabe sua aplicação. Nas palavras de Bonavides (1998, p. 254), os princípios são “qualitativamente a viga mestra do sistema, o esteio da legitimidade constitucional, o penhor da constitucionalidade das regras de uma constituição”. Nunes (2007, p. 37), por sua vez, define princípios como “verdadeiras vigas mestras, alicerces sobre os quais se constrói o sistema jurídico”. Quanto à importância dos princípios no ordenamento brasileiro jurídico Gama (1999, p. 223) acrescenta ainda que os direitos básicos previstos na Constituição Federal consagram verdadeiros princípios. Foi por meio de lutas, conquistas e evoluções históricas que o direito à vida, à igualdade, à liberdade, à segurança e à propriedade se tornaram inerentes ao seres humanos e os princípios, por sua vez, precedem sua inclusão ao texto constitucional. Por isso, 15 a importância dos princípios é indiscutível. Nunes (2007, p. 38), por sua vez, ensina a importância dos princípios no sistema normativo: [...] os princípios exercem função importantíssima dentro do ordenamento jurídicopositivo, uma vez que orientam, condicionam e iluminam a interpretação das normas jurídicas em geral. Os princípios, por sua qualidade normativa especial, dão coesão ao sistema jurídico, exercendo excepcional fator aglutinante. Nos dizeres de Mello (1980, p. 230), os princípios exercem a relevante função de fundamentar a ordem jurídica, fazendo com que as relações jurídicas em geral busquem na principiologia o berço das estruturas e instituições jurídicas. Mello (1980, p. 620) leciona ainda: Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todos os comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão aos seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Os princípios constituem então, a estrutura do sistema jurídico, devendo ser estritamente obedecidos, sob pena de corromper o sistema normativo. São eles que protegem os valores fundamentais da existência humana e jurídica, por isso são chamados de leis das leis. Eles estão ligados à idéia de moralidade1 e justiça2. São ainda considerados absolutos, pois são independentes e auto-suficientes; universais, uma vez que se estendem a todos e permanentes, porque são eternos e sempre estarão presentes no ordenamento jurídico. Em razão dos princípios possuírem um caráter abstrato, eles são aplicados a um maior número de situações. São os princípios, portanto, a fonte primária e imediata do direito, trazendo sempre valores a serem seguidos. São os princípios que dão o norte, que mostram a melhor forma de garantir o direito do cidadão. 1 Para os romanos, Justiça significa dar a cada um o que lhe pertence (GUIMARÃES, 2007, p. 117). No mesmo sentido, Ferraz Junior (2005, p. 352-353) ensina que a justiça está ligada como “um fator ético-social de proporcionalidade em conformidade com o qual, em situações bilaterais normativamente reguladas, exige-se a atribuição a alguém daquilo que lhe é devido”. 2 Ferraz Junior (2005, p. 356-357) estabelece que a moralidade, os preceitos morais estão ligados aos aspectos internos do comportamento do ser humano. A moralidade refere-se à subjetividade dos atos de quem age, diz respeito à própria consciência. 16 1.1.1 Princípios e regras O ordenamento jurídico é composto por princípios e regras, sendo que ambas possuem o status de norma jurídica. No entanto, é necessário tecer distinções acerca destas duas figuras jurídicas. Dias (2007, p. 55) ensina que os princípios estão acima das regras, pois possuem um valor ético e uma exigência de justiça, além disso, conferem ao ordenamento jurídico uma coerência interna e uma estrutura harmônica. Esclarece ainda Dias (2007, p. 55): Se exceções forem admitidas, não se estará frente a um princípio, mas a uma regra concorrente ou subordinada a outra que lhe é incompatível ou contraria. Um princípio, para ser reconhecido como tal, dever ser subordinante, e não subordinado a regras. Os princípios se harmonizam na feliz expressão “diálogo das fontes”. As regras são normas que incidem sob a forma “tudo ou nada”, o que não sucede com os princípios [...]. (grifo do autor) Já as regras, normalmente, possuem um conteúdo mais objetivo, com uma incidência mais restrita e a situações mais específicas. São relatos objetivos, descritivos em relação às condutas a serem adotadas. A regra opera-se na hipótese do tudo ou nada. Os princípios, por sua vez, possuem um maior grau de abstração e incidem sobre uma quantidade maior de situações. Eles não especificam uma determinada conduta a ser adotada, o princípio se aplica a um conjunto amplo de situações (BARCELLOS; BARROSO, 2009). No entendimento Alexy (2008, p. 65) as normas possuem um grau de baixa generalidade, enquanto os princípios são normas constituídas de um alto grau de generalidade. As regras, portanto, se traduzem a uma específica e determinada situação jurídica. As regras são ou não são. Elas se referem a uma conduta a ser tomada, uma obrigação a ser cumprida, uma proibição, uma permissão e ainda determina comportamentos. Já os princípios atuam como um fundamento, uma base principal para as regras. Além disso, são mais amplos, possuem uma grande dimensão, aplicam-se a um número elevado de situações. Barcellos e Barroso (2009) enumeram três critérios de diferenciação entre regras e princípios, que se referem ao conteúdo, a estrutura normativa e as particularidades de aplicação. Quanto ao conteúdo, os princípios são valores ou fins a serem alcançados, enquanto as regras se limitam a delinear uma conduta. Referente à estrutura normativa, as 17 regras especificam atos que devem ser praticados para que possa ser cumprida. Os princípios, por sua vez, relatam estados ideais a serem transformados em realidade. Por fim, em relação às particularidades de aplicação, os princípios devem ser aplicados, preferencialmente, através de ponderação, bom senso e equilíbrio. Já as regras, dever ser aplicadas a partir da subsunção, ou seja, quando o fato sucumbe à norma, nela se enquadra. São inúmeras as distinções existentes entre regras e princípios, entretanto, como ambos constituem o ordenamento jurídico, necessária se faz a convivência harmônica destes elementos, com vistas preservar as garantias individuais, sociais ou coletivas. 1.1.2 Classificação dos princípios Após a diferenciação entre princípios e regras, importante se faz singularizar os princípios, por meio da sua classificação. Barcellos e Barroso (2009) ensinam que é de extrema importância classificar os princípios, uma vez que estes expressam valores e fins diferentes a serem alcançados tanto pelo Estado como pela sociedade em geral, bem como não possuem o mesmo raio de ação. Entre os princípios existe uma variação na amplitude de seus efeitos e no seu grau de influência. As classificações dos princípios se dão por intermédio de posições doutrinárias. Muito embora existam divergências entre entendimentos dos autores, é por meio dela que conseguimos entender e reconhecer uma determinada norma jurídica. Barcellos e Barroso (2009) classificam os princípios em três categorias diversas, quais sejam: a) princípios fundamentais, que expressam as principais decisões políticas de um Estado, e determinam a sua estrutura principal, como a forma, o regime e o sistema de governo. Também se incluem os objetivos3 indicados pela Constituição Federal brasileira, os princípios4 3 Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 4 Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I – independência nacional; II – prevalência dos direitos humanos; III – autodeterminação dos povos; IV – nãointervenção; V – igualdade entre os Estados; VI – defesa da paz; VII – solução pacífica dos conflitos; VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X – concessão de asilo político. 18 que regem as relações internacionais e os fundamentos5 da República, notadamente o princípio da dignidade da pessoa humana, que se tornou pilar do ordenamento jurídico brasileiro; b) princípios gerais, que possuem menor grau de abstração e são facilmente determinados. Grande parte dos princípios gerais encontram-se no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que estabelece os direitos e garantias fundamentais, individuais e coletivos; c) princípios setoriais, que são os que presidem um conjunto específico de normas, determinando o título, tema ou capítulo da Constituição. São um detalhamento dos princípios gerais. Canotilho (2003, p. 1165-1167), por sua vez, classifica os princípios em quatro níveis: a) princípios jurídicos fundamentais, que constituem um importante fundamento para a interpretação e aplicação do direito positivo, são os princípios gerais do direito; b) princípios políticos constitucionalmente conformadores, representando as opções e os valores políticos centrais, são os princípios que definem a forma e a estrutura do Estado e definem a forma de governo, são princípios normativos; c) princípios constitucionais impositivos, que representam a imposição à realização de fins e a execução de tarefa aos legisladores; d) princípios – garantia, que possuem força normativa e estabelecem garantias ao cidadão. São inúmeras as referências classificatórias dos princípios, com os autores apresentando diversas concepções. Porém, apesar de diferenças observadas, os princípios possuem grande aplicabilidade e respeito, garantindo o funcionamento do ordenamento jurídico, sendo, portanto, a parte mais importante do Direito. 1.2 Aspectos históricos do princípio da dignidade da pessoa humana Após a análise das características dos princípios, passamos agora ao estudo específico do princípio da dignidade humana, partindo da sua evolução histórica até sua afirmação como fundamento da Constituição Federal brasileira de 1988. 5 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. 19 1.2.1 Revolução Francesa No ano de 1789, na França, foi constituída a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em resposta à miséria que assolava o povo francês, que via sua dignidade ser esquecida enquanto o poder político e econômico se concentrava nas mãos dos poderosos. Foi na França que surgiu a expressão direitos fundamentais (droits fondamentaux), no ano de 1770, que foi o marco do movimento político e cultural que ensejou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789 (ZISMAN, 2005, p. 55). Referida declaração, votada pela Assembléia Nacional da França, em 1789, proclamava a liberdade e a igualdade de direitos de todos os homens, e reivindicava direitos naturais, como a liberdade e a segurança (ZISMAN, 2005, p. 75). Moraes (2006, p. 10), por sua vez, ensina que a consagração normativa dos direitos humanos fundamentais ocorreu na França, no ano de 1789, quando foi promulgada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Referida declaração garantia o direito à igualdade, à liberdade, à propriedade, à segurança, à resistência à opressão, à associação política, à legalidade, à presunção de inocência, à liberdade religiosa e à livre manifestação de pensamento. Comparato (2006, p. 132) dispõe que: A Revolução Francesa desencadeou, em curto espaço de tempo, a supressão das desigualdades entre indivíduos e grupos sociais, como a humanidade jamais experimentara até então. Na tríade famosa, foi sem dúvida a igualdade que representou o ponto central do movimento revolucionário. A liberdade, para os homens de 1789, limitava-se praticamente à supressão de todas as peias sociais ligadas à existência de estamentos ou corporações de ofício. E a fraternidade, como virtude cívica, seria o resultado necessário da abolição de todos os privilégios. Ensina Zisman (2005, p. 65) ainda, que “a Declaração Francesa colaborou para a fixação dos direitos individuais. Os direitos humanos foram colocados como coerentes com a soberania nacional, de acordo com os princípios da Revolução Francesa”. Por sua vez, Binenbojm (2002, p. 223), esclarece que os ideais da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade) constituem a essência das duas maiores conquistas jurídicas da humanidade: a teoria dos direitos humanos e a justiça. 20 1.2.2 A Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho Após a Revolução Francesa, época na qual surgiu a expressão direitos humanos, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho são considerados os marcos da internacionalização dos direitos humanos. Criada após a Primeira Guerra Mundial, no ano de 1920, a Liga das Nações teve como finalidade promover a paz, a segurança e a cooperação internacional. A Convenção da Liga das Nações possuía previsões genéricas acerca dos direitos humanos, pois estabelecia sanções econômicas e militares aos Estados que não assegurassem condições dignas e justas de trabalho aos homens, mulheres e crianças (PIOVESAN, 2007, p. 112). Cumper (2002, p. 22-23) por sua vez, esclarece que a Liga das Nações não previa em nenhum de seus artigos uma maneira efetiva de garantir os direitos do homem. Muito embora tenha alargado internacionalmente os direitos dos homens, a própria história confirma que o texto da Liga das Nações era deslocado e impotente. Em se tratando da Organização Internacional do Trabalho, Piovesan (2007, p. 113) ensina que esta, juntamente com a Liga das Nações de 1920, também contribuiu para o processo de internacionalização dos direitos humanos. Referida Organização foi criada imediatamente após a Primeira Guerra Mundial, e tinha como objetivo promover melhores condições de trabalho e bem estar no âmbito internacional. Vê-se, portanto, que a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho, contribuíram para que a idéia de direitos humanos fosse divulgada mundialmente, seja promovendo padrões mundiais de condições de trabalho e bem estar social ou buscando a paz e a manutenção da justiça, mas sempre com a finalidade de garantir os direitos do ser humano. 1.2.3 A Segunda Guerra Mundial – O Pós-Guerra Embora a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho tenham contribuído para a internacionalização dos direitos humanos, foi a Segunda Guerra Mundial, ocorrida entre os anos de 1939 e 1945, que consolidou tais direitos. 21 Barcellos (2008, p. 125) ensina que: O último momento especialmente marcante no percurso histórico da noção de dignidade da pessoa humana é também o mais chocante. A revelação dos horrores da Segunda Guerra Mundial transtornou completamente as convicções que até ali se tinham como pacíficas e “universais”. A terrível facilidade com que milhares de pessoas – não apenas alemãs, diga-se, mas de diversas nacionalidades européias – abraçaram a idéia de que o extermínio puro e simples de seres humanos podia consistir em uma política de governo válida ainda choca. Comparato (2006, p. 210) ensina que a Segunda Guerra Mundial desenrolou-se a partir de projetos de dominar e reprimir as civilizações consideradas inferiores. O ato final da Segunda Grande Guerra – a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki em 06 e 09 de agosto de 1945, respectivamente – significou um anúncio do apocalipse: o ser humano já era capaz de acabar com toda a vida na face da Terra. Piovesan (2007, p. 118), ao tratar sobre os direitos humanos após a Segunda Guerra, ensina: No momento em que os seres humanos se tornam supérfluos e descartáveis, no momento em que vige a lógica da destruição, em que cruelmente se abole o valor da pessoa humana, torna-se necessária a reconstrução dos direitos humanos como paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável. A barbárie do totalitarismo significou assim a ruptura do paradigma dos direitos humanos, através da denegação do valor da pessoa humana como valor fonte do Direito. Diante dessa ruptura, emerge a necessidade de reconstrução dos direitos humanos, como referencial e paradigma ético que aproxime o direito da moral [...]. Após as atrocidades cometidas na Segunda Guerra, as consciências se abriram para o fato de que, para preservar a existência da humanidade, era necessária a colaboração de todas as nações e a reorganização das relações internacionais a fim de que a dignidade humana fosse respeitada de forma incondicional (COMPARATO, 2006, p. 210). Barcellos (2008, p. 126), estabelece que após as barbáries nazistas cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, a dignidade da pessoa humana foi consagrada no plano internacional como o valor máximo e o princípio orientador. Nunes (2007, p. 48) acrescenta que foi o nazismo que gerou a consciência de que a dignidade da pessoa humana deve ser protegida a qualquer custo. Foi através de atrocidades cometidas contra o ser humano que a dignidade humana foi consolidada como uma conquista ética e jurídica. Foi, portanto, após a descoberta das atrocidades e crueldades cometidas durante a Segunda Guerra, que o ser humano, de fato, passou a ser o centro da atenção e um sujeito de direito. 22 1.2.4 A Carta das Nações Unidas de 1945 As Nações Unidas, ou Organização das Nações Unidas (ONU), surgiram após a Segunda Grande Guerra, com a finalidade de alcançar a cooperação internacional na solução dos conflitos na comunidade internacional, seja de caráter cultural, social, econômico ou humanitário e as liberdades fundamentais para todos, sem qualquer discriminação. Foi após a Segunda Guerra Mundial que surgiram importantes fatores que concorreram para que a internacionalização dos direitos humanos fosse fortalecida (PIOVESAN, 2007, p. 125). Foi o holocausto e a capacidade da Alemanha em cometer atrocidades contra milhares de pessoas durante a Segunda Guerra Mundial que fez com que a comunidade internacional criasse regras capazes de proteger os direitos dos homens, sendo criada então a Carta das Nações Unidas, que se preocupava com os direitos humanos, corroborando os próprios propósitos das Nações Unidas (CUMPER, 2002, p. 25). Comparato (2006, p. 210) ensina que “[...] as Nações Unidas nasceram com a vocação de se tornarem a organização da sociedade política mundial, à qual deveriam pertencer, portanto, necessariamente, todas as nações do globo empenhadas na defesa da dignidade humana”. Prossegue Comparato (2006, p. 213) estabelecendo que a Carta das Nações Unidas afirma a existência de um direito de autodeterminação dos povos. Para Piovesan (2007, p. 131), “a Carta das Nações Unidas de 1945 consolida, assim, o movimento de internacionalização dos direitos humanos, a partir do consenso de Estados que elevam a promoção desses direitos a propósito e finalidade das Nações Unidas”. O objetivo da referida Carta era fornecer uma base jurídica permanente aos Estados em defesa da paz mundial (ZISMAN, 2005, p. 160). A Carta das Nações Unidas, de 26 de junho de 1945, criada em substituição à Liga das Nações de 1920, lutou para garantir ao ser humano uma existência digna, com seus direitos respeitados, sem qualquer forma de discriminação em razão de cor, sexo, religião ou nacionalidade. A Carta de 1945 possuía a preocupação de evitar guerras e manter a paz e a segurança internacional. 23 1.2.5 Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 é, sem dúvidas, um dos mais importantes documentos da história da humanidade e foi redigida após o impacto dos horrores cometidos pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial. Também conhecida como a Magna Carta do mundo e como a pedra angular das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos do Homem garante direitos econômicos, sociais e culturais e é considerada única, pois desde a sua criação nenhum documento teve tamanha influência em relação aos direitos humanos fundamentais. Ensina Alves (1997, p. 26): Adotada e proclamada na terceira sessão da Assembléia Geral das Nações Unidas, em Paris, pela Resolução 217 A (III), de 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, com seus trinta artigos, define de maneira clara e singela os direitos essenciais, iguais e inalienáveis de todos os seres humanos como alicerces da liberdade, da justiça e da paz no mundo [...]. A mencionada declaração é a raiz de todos os instrumentos normativos internacionais, que elevou o ser humano à condição de sujeito de direito (ALVES, 1997, p. 30). Para Moraes (2006, p. 18-19) a Declaração Universal dos Direitos do Homem reconheceu que a dignidade da pessoa humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz mundial, sendo que o desprezo e o desrespeito dos direitos inerentes aos seres humanos resultam em atos bárbaros. A Declaração Universal fez renascer a crença dos povos nos direitos humanos, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos entre homens e mulheres e, ainda, no direito a uma vida capaz de assegurar a saúde e bem-estar a si e a sua família. Zisman (2005, p. 163) ensina que a Declaração Universal dos Direitos Humanos preocupa-se com quatro ordens de direitos humanos fundamentais: A declaração visa não só conservar os direitos fundamentais que elenca, mas também alcançar: a sua certeza, exigindo que haja uma fixação prévia e clara dos direitos e deveres para que os indivíduos possam gozar dos direitos ou sofrer imposições; a sua segurança, ao impor uma série de normas que garantem, em qualquer circunstância, o respeito a tais direitos; e a sua possibilidade, ao exigir que se procure assegurar a todos os indivíduos os meios necessários à fruição dos direitos, não se permanecendo no formalismo cínico e mentiroso da afirmação de igualdade de direitos, onde grande parte do povo vive em condições subumanas. (grifo do autor) Alves (1997, p. 24), esclarece que um dos principais elementos que dá sustentação a toda arquitetura internacional de mecanismos e normas de proteção aos direitos humanos é a 24 Declaração Universal de 1948. A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi o primeiro documento que estabeleceu no âmbito internacional os direitos inerentes aos homens e as mulheres, independente de suas particularidades. Juntamente com o Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos6 e o Pacto Internacional Sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais7, os direitos estabelecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos possuem força jurídica, que deverão ser implementados pelos Estados-partes. Alves (1997, p. 26-27) ensina ainda que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 representa para os Estados participantes, o referencial do Estado de Direito. Referida Declaração “se proclama o ideal a ser atingido por todos os povos e todas as nações”. Comparato (2006, p. 223-224), por sua vez, esclarece que a Declaração Universal de 1948 é, tecnicamente, uma recomendação que a Assembléia Geral das Nações Unidas faz aos seus membros, e não possui força vinculante. Contudo, acrescenta Comparato (2006, p. 224): [...] Reconhece-se hoje que a vigência dos direitos humanos independe de sua declaração em constituições, leis e tratados internacionais, exatamente porque se está diante de exigências de respeito à dignidade humana, exercidas contra todos os poderes estabelecidos, oficiais ou não [...]. Alves (1997, p. 26-27) acrescenta que referida a Declaração Universal dos Direitos Humanos evita fundamentar seus artigos do ponto de vista religioso ou filosófico, atribuindo a eles somente a dignidade inerente a todos os seres humanos e seus fundamentos são a liberdade, igualdade e fraternidade, fundamentos também da Revolução Francesa. Portanto, a Declaração Universal de 1948, representa o apogeu da ética que fez com que fosse reconhecida a igualdade de todos os seres humanos em sua dignidade de pessoa, significando uma fonte de valores que independem das diferenças raciais, culturais, econômicas, sexuais, religiosas, nacionais, de opinião, de riquezas ou de qualquer outra condição (COMPARATO, 2006, p. 225). Conclui-se, portanto, que os direitos humanos fundamentais e a dignidade da pessoa humana são o resultado de conquistas históricas, repletas de sofrimento, dor, e desrespeito a 6 Alves (1997, p. 35) esclarece que o Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, amplia, descreve e aprofunda os direitos garantidos pela Declaração Universal de 1948, devendo os Estados que o ratificaram garanti-los a todos os cidadãos que estejam em seu território. 7 O Pacto Internacional Sobre Direitos Econômicos, Sociais E Culturais, da mesma forma que o Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, amplia e aprofunda os direitos inerentes a pessoa humana consagrados na Declaração de 1948, devendo os Estados – partes garantir tais direitos até o máximo de seus recursos disponíveis (ALVES, 1997, p. 43). 25 qualidade de ser humano. Contudo, hoje temos a certeza e a garantia de que ambos são reconhecidos e possuem eficácia no ordenamento jurídico universal. Assim, depois de concluído o estudo sobre os aspectos históricos da dignidade da pessoa humana, passa-se ao estudo deste princípio fundamental na Constituição Federal brasileira de 1988, especificamente. 1.2.6 A Constituição Federal de 1988 e a Dignidade da Pessoa Humana A Constituição Federal é a lei suprema de um país. É hierarquicamente superior a todas as demais normas existentes, devendo estas sempre serem compatíveis com o texto constitucional. A Constituição Federal é o alicerce de todo o sistema normativo, positivando desde a estrutura do Estado até os direitos fundamentais. Além disso, possui um significado ideológico, representando através do preâmbulo8, o que uma nação é ou o que ela deseja ser. Moraes (2008, p. 06) define Constituição: [...] Juridicamente, porém, Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes á estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos [...]. Prossegue Moraes (2008, p. 02), esclarecendo que a Constituição tem como objeto a estruturação e organização do Estado, definindo e limitando as formas de poder, garantindo, ainda, direitos fundamentais. No mesmo sentido, ensina Temer (2003, p. 15-17) que a Constituição é a estrutura do Estado, sendo nela localizados os direitos, os deveres, as competências, que no fim formam a estrutura social, interligando pessoas que vivem em certa época em dado local. No Brasil, após longos vinte e um anos da incidência do regime militar, durante os anos de 1964 a 1985, iniciou-se o processo de democratização. Foi um processo que teve origem em razão da liberdade política do regime autoritário instalado no país. Foi uma transição lenta e gradual, mas que permitiu o controle das forças militares que atuavam no 8 Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. 26 país. A partir daí, tornou-se necessário um novo código, que reedificasse o pacto políticosocial. Foi este processo que fez com que fosse promulgada uma nova ordem constitucional, tendo origem, assim, a Constituição Federal de 1988 (PIOVESAN, 2007, p. 21-24). Prossegue Piovesan (2007, p. 24): A Carta de 1988 institucionaliza a instauração de um regime político democrático no Brasil. Introduz também indiscutível avanço na consolidação legislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteção de setores vulneráveis da sociedade brasileira. A partir dela, os direitos humanos ganham relevo extraordinário, situando-se a Carta de 1998 como o documento mais abrangente pormenorizado sobre os direitos humanos jamais adotados pelo Brasil [...]. No mesmo sentido é o ensinamento de Martins (2006, p. 50), que dispõe que a Constituição Federal de 1988 foi uma reação ao período autoritário pelo qual o Brasil passava, sendo que ao final da ditadura militar foram desenvolvidos trabalhos que culminaram com a promulgação da atual Carta Constitucional. Durante o período ditatorial houve todo tipo de violação aos direitos individuais do povo brasileiro, sendo que somente após vinte e um anos de repressão, a Assembléia Constituinte elabora a Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988. A Constituição Federal brasileira de 1988 é também chamada de Constituição Cidadã, pois foi criada de forma democrática, liberal e contou com uma grande participação do povo, bem como pelo fato de objetivar o pleno e efetivo exercício da cidadania. Foi a partir da promulgação da Carta de 1988 que o Brasil tornou-se um país democrático. A Lei Maior de 1988 garantiu aos cidadãos direitos e garantias individuais e coletivas, ampliou os direitos dos trabalhadores, assegurou o acesso à Justiça, fez pela primeira vez uma previsão sobre o meio ambiente e, de forma inédita, consolidou os direitos humanos fundamentais (LENZA, 2009, p. 80-81). Foi a Constituição de 1988 que ampliou o alcance dos direitos e garantias fundamentais, que objetivava fundar um país que assegurasse a liberdade, a igualdade, o acesso à justiça, com direitos e garantias individuais protegidos, sem qualquer forma de preconceito (LEAL, 1997, p. 131). Para Martins (2006, p. 72): “[...] Passa-se, a partir do texto de 1988, a ter consciência constitucional de que a prioridade do Estado (política, social, econômica e jurídica) deve ser o homem, em todas as suas dimensões, como fonte de sua inspiração e fim último [...]”. A Carta Magna de 1988 adotou como fundamento do Estado Democrático de Direito, no qual se constitui, a dignidade da pessoa humana, estando presente no artigo 1º da 27 Constituição Federal de 19889. Tendo a Constituição de 1988 eleito a dignidade humana como fundamento, aponta sua preocupação com o bem-estar da sociedade e constitui o ser humano como prioridade e centro do sistema jurídico. A Constituição Federal de 1988, inspirada nas constituições alemã, francesa e portuguesa, foi a primeira a tratar da dignidade da pessoa humana, declarando-a como fundamento da República (MARTINS, 2006, p. 47). Ensina Piovesan (2007, p. 28) que “[...] a Carta de 1988 elegeu a dignidade da pessoa humana como um valor essencial que lhe dá unidade de sentido. Isto é, o valor da dignidade humana informa a ordem constitucional de 1988, imprimindo-lhe uma feição particular”. A Carta Constitucional demonstra claramente que a dignidade da pessoa humana é um elemento central e fundamental ao sistema jurídico e hierarquicamente superior a todos os demais bens protegidos constitucionalmente (BARCELLOS, 2008, p. 156-161). Martins (2006, p. 51) leciona que a Carta Constitucional de 1988 foi um marco de superação no sistema jurídico brasileiro, pois promoveu a dignidade da pessoa humana como norma jurídica e a projetou no sistema jurídico, político e social. Além disso, Martins (2006, p. 63-71), ressalta que o princípio da dignidade humana, por ser considerado a base, o alicerce e o fundamento da República Federativa do Brasil, deve servir de parâmetro ou de critério no momento da interpretação e aplicação de todo o ordenamento jurídico, salientando que caso isso não ocorra, estará evidenciado uma flagrante inconstitucionalidade. Isto significa dizer que a solução a ser adotada deverá ser aquela que garanta maior efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana. Considerando a relevância dos princípios no sistema jurídico brasileiro, notadamente a importância do princípio da dignidade da pessoa humana, indispensável se faz esclarecer o que significa a dignidade humana. Nunes (2007, p. 45-53) afirma que a dignidade da pessoa humana é o fundamento do sistema jurídico, é inerente a todo ser humano, independentemente dele ser bom ou mau, é da natureza da pessoa, basta ser humano para ter direito a dignidade. 9 Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. 28 Moraes (2006, p. 48), ensina: [...] a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo vulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. O direito à vida privada, à intimidade, à honra, à imagem, dentre outros, aparece como consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil [...]. (grifo do autor) Ensina Dias (2007, p. 59), que o princípio da dignidade humana é o mais abrangente de todos os princípios. É um princípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, enfim, uma coleção de princípios éticos. Para se efetivar e assegurar o princípio da dignidade humana é preciso respeitar os direitos sociais previstos no artigo 6º da Constituição Federal de 198810, que garantem ao ser humano o direito a educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, meio ambiente equilibrado, o mínimo necessário a uma vida “digna”. Importante salientar, que o princípio da dignidade humana não é a mera existência do ser humano, com tal princípio se busca a garantia de uma vida digna, com direitos assegurados e devidamente respeitados, sem qualquer forma de discriminação em razão de cor, sexo ou religião. Para Martins (2006, p. 115): [...] A dignidade deve acompanhar o homem desde seu nascimento até sua morte, posto que ele é a própria essência da pessoa humana. Assim, parece-nos que a “dignidade” é um valor inerente à própria condição humana, que identifica o homem como ser único e especial, e que, portanto, permite-lhe exigir ser respeitado como alguém que tem sentido em si mesmo. A dignidade da pessoa humana é o princípio-matriz de todos os direitos humanos fundamentais, que toda e qualquer pessoa possui e deve ser respeitado em todas as circunstâncias, por todas as pessoas, devendo ser garantida a todos pelo próprio Estado. A dignidade não tem preço, é insubstituível e inviolável. Além disso, não aceita renúncia. A manifestação de vontade não permite que o ser humano abra mão de sua 10 Art. 6o. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. 29 dignidade. É a dignidade humana que garante ao homem a proteção contra tratamentos humilhantes e degradantes, tortura, e de toda e qualquer atitude que coloque em risco a saúde física e mental do indivíduo. Ela se apresenta como uma proteção jurídica ao ser humano. Sarlet (2001, p. 60) define dignidade da pessoa humana como sendo uma [...] qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. No entendimento de Barcellos (2008, p. 288-289) a dignidade da pessoa humana é o mínimo existencial, que se constitui a partir de quatro elementos: educação fundamental, saúde básica, assistência aos desamparados e acesso à justiça. Ressalta ainda, que tais elementos correspondem ao núcleo da dignidade humana, a qual possui eficácia jurídica bem como é exigível perante o Poder Judiciário. Destaca também que a saúde e a educação são o primeiro momento da dignidade da pessoa humana, no qual o indivíduo pode construir sua própria dignidade com autonomia. A saúde acompanhará o ser humano por toda sua vida e a educação será prestada em qualquer fase de sua existência. A assistência aos desamparados tem como objetivo evitar a indignidade, principalmente em relação à alimentação, o vestuário e o abrigo. É o complemento à saúde e à educação. Por fim, o acesso à justiça é o elemento indispensável para a efetivação dos elementos materiais acima descritos. Para Kant (2003, p. 306): Todo ser humano tem um direito legítimo ao respeito de seus semelhantes e está, por sua vez, obrigado a respeitar todos os demais. A humanidade ela mesma é uma dignidade, pois um ser humano não pode ser usado meramente como um meio por qualquer ser humano (que por outros quer, inclusive, por si mesmo), mas deve sempre ser usado ao mesmo tempo como um fim. É precisamente nisso que sua dignidade (personalidade) consiste, pelo que ele se eleva acima de todos os outros seres do mundo que não são seres humanos e, no entanto, podem ser usados e, assim, sobre todas as coisas. Salienta-se que definir a dignidade da pessoa humana é uma tarefa bastante complexa, contudo, fica claro que a dignidade humana é algo inerente a todo e qualquer ser humano, impõe-se a ela um dever de intocabilidade e respeito, sendo que cabe ao sistema normativo sua efetivação e ao Poder Público a sua garantia e proteção. Porém, muito embora a definição do conceito de dignidade da pessoa humana seja difícil, isso não implica que ela possa ser violada. Assim, ainda que seu conceito não seja definido, quando ocorre sua violação, esta é visível e indiscutível. 30 Por todo o exposto, não restam dúvidas que os princípios de forma geral são o alicerce do sistema jurídico. O princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado como fundamento da República Federativa do Brasil, por sua vez, mostra-se como o mais importante de todos os princípios, seja pelos séculos de luta pela sua efetivação, seja pelo bem maior que visa proteger, qual seja uma vida digna, com o mínimo de qualidade e conforto que o ser humano necessita e merece para sobreviver, uma vida livre da violência, da exploração e da miséria. Assim, abordada a história e a relevância deste princípio no ordenamento jurídico brasileiro, passa-se a estudar o direito de família, seus princípios e sua previsão acerca do direito de convivência familiar. CAPÍTULO II 2 DIREITO DE FAMÍLIA E DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR Conforme estudado no capítulo anterior, são os princípios que constituem a estrutura do sistema normativo e estão sempre relacionados à idéia de valores a serem seguidos. Possuem, ainda, a função de direcionamento no momento da interpretação da norma jurídica e tem por objetivo a busca pela verdade e pela justiça e se constituem como um fundamento. Após a análise conceitual dos princípios, sua importância no sistema jurídico e sua função, passamos ao estudo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que se constitui como fundamento da República Federativa do Brasil e está consagrado na Constituição Federal de 1988 como um dos mais importantes princípios. No decorrer do estudo do referido princípio constitucional, foi analisada sua evolução histórica, desde a Revolução Francesa até os dias de hoje, sendo, por fim, expostos definições a respeito do princípio da Dignidade da Pessoa Humana. O presente capítulo, por sua vez, tem por fundamento o estudo do Direito de Família, sua evolução história, seu conceito, seu objeto de estudo, sua importância para a sociedade, além de sua previsão constitucional. Por fim, serão analisados os princípios relacionados a este ramo do Direito, notadamente a afetividade, a solidariedade e a proteção integral da criança e do adolescente e o estudo do direito à convivência familiar, a partir de sua previsão na Constituição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil. 32 2.1 O direito de família na Constituição Federal de 1988 De acordo com o estudo realizado no primeiro capítulo, a Carta Constitucional de 1988 revolucionou o sistema normativo brasileiro, transformou a sociedade e a vida das pessoas. A Constituição Federal promulgada em 1988 se volta ao indivíduo e à coletividade, contempla direitos fundamentais e coletivos e constitui, novamente, o ser humano como um sujeito de direito. Da mesma forma, a Constituição de 1988 reconhece a família como a base da sociedade e recebe proteção do Estado11, pois é no âmbito familiar que se forma a pessoa humana. Anteriormente ao advento da Constituição Federal de 1988, o Direito de Família tinha seus princípios solidificados na legislação civil, que estabelecia uma família patriarcal, hierarquizada, em que prevalecia a desigualdade dos cônjuges e somente o casamento era capaz de constituir uma família protegida pelo Estado (CACHAPUZ, 2003, p. 92). Até a promulgação da Carta Magna de 1988 o conceito de família era extremamente fechado, limitado e taxativo, ou seja, a legislação civil de 1916, que até então regulava as relações familiares, somente conferia status de família aos agrupamentos originados do matrimônio. O modelo de família era voltado para si mesmo, onde a felicidade pessoal de cada membro era deixada para traz pela manutenção do vínculo familiar, razão pela qual o divórcio era proibido (ALVES, 2007, p. 131). O Código Civil de 1916, que tinha por objetivo controlar a dinâmica social, tentou impor à sociedade brasileira um conceito único de família, ao prever em seus cento e quarenta e nove artigos, que somente o casamento poderia legitimar a formação de uma entidade familiar. Referido Código ignorou que é no ramo do Direito de Família que deve existir a 11 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º. O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º. O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º. Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º. O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. § 7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. § 8º. O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. 33 maior valorização do ser humano. Importante ressaltar, que nesta época, o casamento possuía uma finalidade econômica, onde a procriação, a coabitação e o dever de educar e manter a prole eram as outras finalidades do matrimônio, o que só revelava a completa ausência de interesses pessoais. Pouco importava, naquela época, a felicidade dos integrantes de uma família. A dignidade do ser humano era um dado secundário. O machismo e a desigualdade imperavam. O que realmente importava era a paz doméstica, a coesão formal da família, o equilíbrio e a segurança, mesmo que em detrimento da realização pessoal de seus membros, principalmente da mulher (ALVES, 2007, p. 134 e 136). Porém, como o direito não é estático e acompanha a evolução da sociedade, surgiu a necessidade de rever certos conceitos, uma vez que a forma de viver em família foi se transformando no decorrer do tempo. A Carta Magna de 1988 modificou completamente o conceito e a estrutura familiar no Brasil. A nova legislação constitucional impediu que fossem feitas distinções, transformando a família brasileira em um instituto livre, moderno e democrático. A partir dela, instaurou-se a igualdade entre os cônjuges e todos os membros da família passaram a ser protegidos. Além disso, resguardou-se à família constituída a partir da união estável e a família monoparental, aquela formada por qualquer um dos cônjuges e seus descendentes. Consagrou-se a igualdade entre todos os filhos, advindos ou não do casamento ou por adoção, e principalmente, o dignidade da pessoa humana foi consagrada (DIAS, 2007, p. 30-31). Foi a Constituição Federal de 1988 que provocou imensas alterações no conceito de família, através do princípio da dignidade da pessoa humana, considerado o marco da mudança do paradigma familiar. Foi a partir deste princípio constitucional que a entidade familiar passou a buscar a promoção pessoal de cada um de seus integrantes, onde o único requisito para a constituição de uma família é o afeto. Alves (2007, p. 132) assinala que: Nesta esteira, observa-se que a entidade familiar ultrapassa os limites da previsão jurídica (casamento, união estável e família monoparental) para abarcar todo e qualquer agrupamento de pessoas em que permeie o elemento afeto (affectio familiae). Em outras palavras, o ordenamento jurídico deverá sempre reconhecer como família todo e qualquer grupo no qual os seus membros enxergam uns aos outros como seu familiar. (grifo do autor) Bittar (2006, p. 35), leciona que, na Constituição de 1988, a família passou a ser uma 34 comunidade plena de interesses e responsabilidades, fundada na afetividade e respeito entre seus componentes, buscando-se a realização dos objetivos de cada integrante. Farias (2007, p. 20-21), por sua vez, ensina que a família na Lei Maior está cimentada a valores sociais e humanos, especialmente a dignidade humana, a solidariedade social e a igualdade. É na entidade familiar que se deve promover a realização da personalidade de seus membros, integrando-se sentimentos, esperanças e valores. Além disso, ressalta que não há mais espaço para condutas egoístas, impondo-se a idéia de solidariedade e buscando-se o desenvolvimento da personalidade humana e a felicidade pessoal. Vê-se, portando, que somente após a promulgação da Constituição Federal de 1988 a entidade familiar teve seu valor amplamente reconhecido, tanto é que foi constituída como a base de toda sociedade brasileira. Antes disso, as Constituições brasileiras de 1934, 1937, 1946 e 1967-1969 faziam referência à família, contudo, somente eram reconhecidas àquelas constituídas pelo casamento indissolúvel, as chamadas famílias legitimas. As demais Constituições do Brasil (1824 e 1891) não faziam menção à entidade familiar. Analisada a transformação que a família brasileira sofreu a partir do advento da Constituição Federal de 1988, passamos agora ao estudo do direito de família, ramo que regula as relações familiares. O direito de família representa os princípios e regras que regulam as relações entre casais e familiares, sendo estas ligadas por vínculos naturais ou jurídicos, conjugais ou de parentesco (BITTAR, 2006, p. 01). Dias (2007, p. 33-35), leciona que o direito de família disciplina a organização familiar e constitui direitos intransmissíveis, irrevogáveis, indisponíveis e irrenunciáveis. Para Diniz (2004, p. 04), O Direito de Família é o ramo do direito civil concernente às relações entre pessoas unidas pelo matrimônio, pela união estável ou pelo parentesco e aos institutos complementares de direito protetivo ou assistenciais, pois, embora a tutela e curatela não advenham de relações familiares, têm, devido à sua finalidade, conexão com Direito de Família. Já para Cassettari (2008, p. 89), o objeto de estudo do direito de família é simplesmente a família. Esclarecido o objeto de estudo do Direito de Família, necessário se faz conceituar entidade familiar. 35 Dias (2004, p. 19-20), conceitua família como um vínculo afetivo que une as pessoas, gerando um comprometimento mútuo, baseado na busca pela felicidade, na supremacia do amor, e ainda, afirma que somente o afeto é capaz de preservar a vida. Cassettari (2008, p. 90) leciona que a família é constituída pela união das pessoas através do casamento, da união estável, da relação monoparental, da adoção ou da relação paterno filial resultante de inseminação artificial. Silva (1997, p. 775-776), por sua vez, conceitua família da seguinte forma: A família é uma comunidade natural, composta, em regra, de pais e filhos, aos quais a Constituição, agora, imputa direitos e deveres recíprocos, nos termos do art. 227, pelo qual os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, havidos ou não da relação do casamento (art. 227, § 6º), ao passo que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Já Alves (2007, p. 133) entende que família é a mais importante influência para a formação da personalidade humana. É este ente que proporciona as recompensas e punições, e através da qual são adquiridas as primeiras respostas para os obstáculos da vida. É no seio familiar que o ser humano encontra amparo incondicional, é a família a fonte de sua felicidade. Destaca, ainda, que a família não é apenas uma instituição de origem biológica, é um organismo com caráter social e cultural. Para Meireles (2010), a família não se constitui somente com o casamento. Existem também as uniões informais. A família não é constituída apenas biologicamente, com as relações de parentesco consanguíneo. O vínculo sócio-afetivo é tido cada vez mais como fonte de parentesco. É por meio dessas variadas estruturas que diversas as pessoas se unem com o intuito de constituir uma família. É a vontade de conviver que faz com que as pessoas constituam uma família. É a entidade familiar a verdadeira expressão de solidariedade. É através da família que encontramos o reconhecimento e a maneira como cuidamos uns dos outros. É por meio desse cuidado recíproco entre os integrantes do ente familiar que a sua função maior é alcançada. Afinal, é na família o lugar onde seus componentes encontram campo para se desenvolverem como seres humanos. Aliás, é para a promoção e desenvolvimento de cada membro deste instituto que a família recebeu do legislador constitucional especial proteção (MEIRELES, 2010). São diversos os conceitos atribuídos pelos doutrinadores à família, contudo, todos eles reconhecem que a família é porto seguro do ser humano. É no âmbito familiar, e somente ali, que encontramos o amor e o apoio incondicionais e o local onde formamos o nosso caráter. 36 A família, que constitui a base da sociedade brasileira, amplamente protegida pela legislação constitucional, tem como fundamento o amor, o afeto, a valorização de cada membro, a convivência respeitosa e principalmente a busca pela própria felicidade e dignidade. Não há como não relacionar a instituição familiar à idéia de proteção, de calor humano e de abrigo diante das adversidades da vida. É na família que devemos buscar ajuda e apoio e onde devemos encontrar nossa principal fonte de felicidade, orgulho, amizade e amor. Nas palavras de Hironaka (2010), a família é o “ponto de referência central do indivíduo na sociedade; uma espécie de aspiração à solidariedade e à segurança que dificilmente pode ser substituída por qualquer outra forma de convivência social”. Desta forma, conforme visto no decorrer do estudo, a família atual é o oposto da família brasileira regrada pela legislação civil de 1916. Naquela época, a entidade familiar era baseada no medo, na subordinação, no preconceito, nas diferenças, em que o pai assumia o papel principal de chefe da família, era o senhor absoluto da razão, enquanto os filhos eram meros obedientes, sem voz, nem vez e a mulher vivia oprimida, em posição inferior e sem perspectivas de mudanças. Neste sentindo é o entendimento de Lauria (2003, p. 18-19), que alega que a Constituição de 1988 foi a consagração da evolução no âmbito familiar, quando rompeu com os paradigmas da família patriarcal, transformando a família brasileira em uma entidade constitucionalizada e contemporânea. Concluídos os estudos sobre a evolução social, cultural e jurídica pela qual a entidade familiar brasileira passou, sua previsão no texto constitucional de 1988 e expostos alguns conceitos a respeito de família e direito de família, passamos agora a análise dos princípios de direito de família. 2.2 Os princípios de direito de família Primeiramente, importante ressaltar que existem no direito brasileiro os princípios constitucionais de direito de família e os princípios de direito de família, os chamados princípios específicos. Dias (2007, p. 57-58) esclarece que a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido 37 inúmeros princípios constitucionais de direito de família, destacando que é difícil quantificar ou tentar nominar todos os princípios que regem o direito das famílias. Ressalta, ainda, que cada autor traz uma quantidade diferenciada de princípios, não sendo possível sequer encontrar um número mínimo em que haja consenso. Contudo, é certo que existem os princípios gerais, que se aplicam a todos os segmentos do direito, tais como a dignidade, a igualdade, a liberdade, a proibição do retrocesso e a proteção integral da criança e do adolescente. Aponta que existem, ainda, os princípios especiais, que são próprios do direito de família, tais como a afetividade e solidariedade, que devem sempre servir de norte no momento da apreciação de casos em que se envolvam questões de família. Na presente pesquisa, abordaremos somente um princípio constitucional de direito de família, qual seja, o da proteção integral da criança e do adolescente e estudaremos dois princípios de direito de família, quais sejam, afetividade e solidariedade. Iniciaremos o estudo pelo princípio constitucional da proteção integral da criança e do adolescente, em seguida passamos à análise do princípio da afetividade e por fim, estudaremos o princípio da solidariedade, uma vez que tais princípios demonstram claramente a importância e a necessidade de amor, de carinho, de proteção e de afeto que as crianças e os adolescentes necessitam para seu pleno desenvolvimento, o qual somente se concretiza a partir da vida em comum com sua família. 2.2.1 O princípio da proteção integral da criança e do adolescente O princípio da proteção integral da criança e do adolescente, consagrado na Constituição Federal de 1988, tem como argumento o fato de que os cidadãos, até os dezoito anos de idade carecem de maior proteção, uma vez que estão em fase de desenvolvimento e formação psíquica. Dispõe Liberati (2003, p. 16) que tal princípio tem seu alicerce jurídico e social na Convenção Internacional sobre Direitos das Crianças, adotado pela Organização das Nações Unidas na década de 80. No ordenamento jurídico brasileiro, referido princípio encontra-se positivado no 38 Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual veio ao encontro da Constituição Federal12, que em seu primeiro artigo13 enfatiza a proteção integral da criança e do adolescente. Foi no Estatuto da Criança e do Adolescente que o legislador implementou os direitos assegurados na Carta Magna, uma legislação que traz normas que reconhecem a criança e o adolescente como sujeitos de direito, possuindo acesso irrestrito e privilegiado na Justiça. Reconhece ainda que, para que a criança tenha um pleno desenvolvimento de seu caráter e personalidade, ela precisa crescer em um ambiente familiar, em clima de amor, felicidade, respeito, dignidade e solidariedade. Cabe ressaltar que a Lei n. 8.069/90 revolucionou a legislação infanto-juvenil quando adotou o princípio da proteção integral como marco e representa um grande avanço na proteção de direitos das crianças e adolescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente adotou a proteção integral, princípio que se baseia na total proteção aos seus destinatários. O artigo 1º imprime esse entendimento, quando diz que dispõe sobre a proteção integral da criança e do adolescente. E o artigo 3º14, enfatiza que são eles titulares de todos os direitos fundamentais inerentes ao ser humano, prevalecendo, sempre, o caminho que leve ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de dignidade e liberdade (VIANA, 1993, p. 286). Dias (2007, p. 65), ensina que referido princípio não é uma simples recomendação ética, e sim, constitui-se como uma diretriz determinante nas relações entre os pais, a sociedade e o Estado com as crianças e adolescentes, uma vez que até os 18 anos de idade, os cidadãos são mais vulneráveis e frágeis. Nas palavras de Costa (1992, p. 19), o princípio da proteção integral [...] afirma o valor intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadora da continuidade do seu povo e da espécie e o reconhecimento de sua vulnerabilidade o que torna a criança e o adolescente merecedores de proteção integral por parte da família, da sociedade e do Estado, o qual deverá atuar através de políticas específicas para promoção e defesa de seus direitos. 12 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 13 Art. 1º. Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. 14 Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 39 A proteção integral à criança e ao adolescente garante a esta parcela da população os direitos fundamentais, entendendo serem eles os detentores de todos os direitos atribuídos aos seres humanos, deferindo-lhes proteção especial por se encontrarem em fase de desenvolvimento (SAPKO, 2005, p. 90). Indispensável se faz citar o conceito de Almeida (2010) acerca do princípio em comento: O Estatuto tem por objetivo a proteção integral da criança e do adolescente, de tal forma de cada brasileiro que nasce possa ter assegurado seu pleno desenvolvimento, desde as exigências físicas até o aprimoramento moral e religioso. Este Estatuto será semente de transformação do País. Sua aplicação significa o compromisso de que, quanto antes, não deverá haver mais no Brasil vidas ceifadas no seio materno, crianças sem afeto, abandonadas, desnutridas, perdidas pelas ruas, gravemente lesadas em sua saúde e educação. (grifo do autor) Denota-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente despertou para uma mudança de mentalidade da sociedade brasileira, a qual está habituada a se omitir diante das injustiças de que as crianças e adolescentes são vítimas. O respeito à legislação fará com que o sofrimento dos menores dê lugar à justiça, ao amor e à solidariedade. Um país que aprende a valorizar a criança e o adolescente e a empenhar-se em sua formação, manifesta sua decisão de construir uma sociedade solidária, capaz de vencer discriminações, violências e exploração. O Estatuto da Criança e do Adolescente veio proteger de forma integral todos aqueles que possuem até dezoito anos de idade de qualquer forma de ameaça e violação aos seus direitos, seja por parte da família, da sociedade e até do Estado, adotando medidas protecionistas, pois o princípio da proteção integral garante aos menores de idade defesa ampla e irrestrita. A atual legislação infanto-juvenil tem por objeto o desenvolvimento da população jovem do Brasil, garantindo uma proteção especial àqueles considerados social e pessoalmente mais sensíveis (LIBERATI, 2003, p. 16). Fica claro que toda essa proteção dispensada à criança e o adolescente é uma forma de garantir o seu desenvolvimento físico, social e psicológico, pois é nessa fase que a personalidade e o caráter da pessoa humana se formam. Cabe destacar que as demais legislações brasileiras que tratam do direito a alimentos, investigação de paternidade, assistência social, previdência social, Direito do Trabalho, Direito do Consumidor, Código Civil, Código Penal, dentre outros, atuam conjuntamente com o Estatuto da Criança e do Adolescente para proteger, de forma objetiva, a população infanto- 40 juvenil. Desta forma, vê-se que o princípio da proteção integral da criança e do adolescente estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é a garantia de uma vida digna aos menores de idade, pois a proteção à vida, à saúde, ao lazer, à educação, à liberdade, dentre outros direitos garantidos constitucionalmente, está estritamente vinculada ao princípio da dignidade humana, que serve de fundamento ao direito brasileiro vigente. 2.2.2 O princípio da afetividade Considerado o princípio norteador do Direito de Família, o princípio da afetividade, como já diz seu nome, refere-se ao afeto e ao amor nas relações familiares. A afetividade se concretiza a partir da convivência e da comunhão de vida em família, uma vez que o afeto, juntamente com outros fatores, é essencial à formação da personalidade e do caráter da pessoa humana. Ensina Pereira, Pereira e Madaleno (2006, p. 152), que a criança e o adolescente necessitam do afeto dos pais, o que se dá pela sua proximidade física e emocional com estes, o que dará suporte ao desenvolvimento psíquico e sua convivência com a sociedade em geral. Não importa se esse afeto seja de origem biológica, civil ou socioafetiva. Sabe-se que é o amor proveniente das relações de afeto dos pais que molda o caráter da pessoa. No entendimento de Nogueira (2001, p. 53), as pessoas se unem em função do afeto. Este afeto está presente nas relações familiares, tanto entre homem e mulher, quanto entre pais e filhos, onde todos estão unidos por um sentimento, pela felicidade e pelo prazer de estarem juntos. É a chamada família sociológica, a família alicerçada no afeto cultivado dia a dia, alimentada pelo cuidado recíproco, pelo companheirismo, pela amizade e cumplicidade. Na família atual, o afeto é a sua razão de existir, o fator responsável pela sua formação e continuidade. Prossegue Nogueira (2001, p. 55): [...] a família sociológica é aquela onde existe a prevalência dos laços afetivos, onde se verifica solidariedade entre os membros que a compõem, família em que os pais assumem integralmente a educação e a proteção de uma criança, que, independentemente de algum vínculo jurídico ou biológico entre eles, a criam, a amam e a defendem, fazendo transparecer a todos que são seus pais. Dias (2007, p. 68-69), no mesmo sentido, entende que o afeto não provém da biologia. 41 O afeto e a solidariedade estão ligados à convivência e não ao sangue. O afeto não é apenas um laço que envolve os membros de uma família, ele põe humanidade a esta instituição. Ballone (2010) dispõe que é a afetividade quem determina as atitudes em geral das pessoas diante dos acontecimentos da vida. Enumera, ainda, consequências decorrentes da falta de afeto na pessoa humana: a) Incontinência emocional15; b) Sugestibilidade16; c) ambivalência afetiva17; d) Fobia18; e) Irritabilidade19; f) Angustia20. O afeto está ligado ao sentido de família, respirando solidariedade, carinho, desvelo e não mais a coisificação, a monetarização das pessoas. Significa dizer que o afeto é o alicerce das relações familiares (FRAGA, 2005, p. 17). Conforme visto, o afeto é a estrutura da família, que por sua vez é considerada a base da sociedade brasileira. Uma existe em razão da outra, elas se complementam. Uma família que tem por fundamento o afeto é, de fato, uma família humanizada, onde reina o amor, o respeito, o companheirismo e a camaradagem. Não há espaço para atitudes egoístas e irresponsáveis. E conforme acima exposto, a falta desse sentimento acarreta diversas alterações psicológicas nos seres humanos, pois o afeto é o fundamento da família e sua razão de existir. Importante ressaltar, que nas relações onde exista o afeto, a construção familiar independe de laços consanguíneos. É irrelevante quem ou quantos sejam os integrantes dessa família, o que realmente importa é que prevaleça nesta relação tudo aquilo que possa promover a felicidade, o bem-estar e a realização de cada membro. 15 Incontinência emocional é considerada uma espécie de valores invertidos sobre a própria imagem, fazendo as pessoas acreditarem que são piores que todos, não possuem ideais, choram facilmente e não acreditam em si mesmos (BALLONE, 2010). 16 Para Ballone (2010), sugestibilidade é a alteração de sentimentos ou vontade. São pessoas submissas que vivem em uma situação de aceitação. 17 Ambivalência afetiva é definida quando uma pessoa não consegue identificar os seus próprios sentimentos em relação a outrem, ora ama, ora odeia (BALLONE, 2010). 18 Ensina Ballone (2010), que fobia é medo obsessivo, terror exagerado que a pessoa humana sente em relação a algo ou alguma situação sem motivo aparente ou razoável para se sentir algum temor. 19 Irritabilidade pode ser definida como falta de paciência, ausência de humor, é uma pessoa que se irrita com facilidade e sem motivos para tamanha fúria (BALLONE, 2010). 20 Angústia é um sentimento torturante e frequente sem que exista uma razão (BALLONE, 2010). 42 2.2.3 O princípio da solidariedade A solidariedade social no direito brasileiro é reconhecida como um objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, no sentido de se buscar uma sociedade livre, justa e solidária (artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal de 198821). Tal princípio se estende por todo ordenamento jurídico e, por óbvio, a solidariedade acaba também repercutindo nas relações familiares, pois tal princípio faz parte das relações pessoais de cada ser humano. Ser solidário significa ter compaixão e amor ao próximo. O princípio da solidariedade, no direito de família, consiste em respeito, consideração e responsabilidade entre cada integrante da família. No direito brasileiro, o artigo 229 da Constituição Federal de 198822, é quem estabelece o princípio da solidariedade nas relações de família, quando impõe aos pais o dever de dar assistência ao filho. Cabe ressaltar, que estudaremos a solidariedade a partir de sua concepção afetiva e psicológica, e não patrimonial. Além disso, conforme positivado no artigo 227 da Constituição Federal de 198823, é dever da família assegurar a criança seus direitos básicos à vida, saúde, educação, alimentação, lazer, dignidade, respeito, convivência familiar e social, além de protegê-los de toda forma de violência e qualquer ato que viole tais direitos. No mesmo sentido, Dias (2007, p. 64): Aproveita-se a lei da solidariedade no âmbito das relações familiares. Ao gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, safa-se o Estado do encargo de prover toda a gama de direitos que são assegurados constitucionalmente ao cidadão. Basta atentar que, em se tratando de crianças e adolescentes, é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e finalmente ao Estado (CF 227) o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos inerentes aos cidadãos em formação [...]. Solidariedade é o que cada ser humano deve ao seu próximo. É a capacidade de ajudar seu semelhante, de se envolver com outra pessoa, pois ninguém consegue viver sozinho e 21 Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária. 22 Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. 23 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 43 isolado no mundo, sem precisar do apoio e do auxílio de alguém. O ser humano só existe quando convive com outrem. Assim é o entendimento de Scheleder e Tagliari (2010), que afirmam que é a solidariedade que une os mundos, enquanto a solidão vive de separações e distâncias. A solidariedade coloca em discussão a solidão do indivíduo e a falta de imperatividade que isto lhe impõe. Tal princípio representa, no âmbito familiar, repartir carinho, dividir conversas, conquistas, preocupações e esperanças, significa mostrar o caminho, fornecer ajuda, e prestar informações. Para Lôbo (2010), o princípio da solidariedade é o estruturante e fundamental ao direito de família, pois perpassa os demais princípios deste ramo do direito. A solidariedade resulta da superação do individualismo jurídico, pois supera o modo de viver e pensar em sociedade em face dos interesses individuais. Destaca ainda, que tal princípio caracteriza a transformação do Brasil em um Estado democrático e social. Prossegue Lôbo (2010), esclarecendo que a solidariedade no núcleo familiar corresponde à solidariedade recíproca dos cônjuges e companheiros quanto à assistência moral e material. Em relação aos filhos, a solidariedade corresponde à exigência de a pessoa ser cuidada, educada, instruída e mantida até que complete a idade adulta. O princípio da solidariedade representa para o autor a atenção e os cuidados devotados a cada integrante da família, o apoio recíproco, o ombro amigo, o conforto moral, nos momentos bons e difíceis da vida, nas crises psicológicas e espirituais, entre aqueles que estão unidos pelo amor e amizade em seu grau máximo. O ser humano não nasceu para viver sozinho, nem conseguiria, pois foi criado para pertencer a uma sociedade e a conviver com seus semelhantes. Nas relações familiares, a solidariedade revela-se fundamental, pois em todos os momentos da vida o apoio e a participação da família são de suprema importância. A solidariedade é isso, é estar junto, conviver, é ajudar sem se esperar nada em troca, ser bom, saber ouvir e respeitar o outro sem preconceitos ou discriminação. Assim, concluídos os estudos sobre os princípios da proteção integral da criança e do adolescente, da afetividade e solidariedade, passamos agora a análise do direito à convivência familiar, a partir da Constituição Federal de 1988, do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código Civil e sua importância para o pleno desenvolvimento da pessoa humana. 44 2.3 O direito à convivência familiar Aliado a todos os princípios acima estudados, que almejam a proteção da criança e do adolescente, seu desenvolvimento psíquico e social e seu bem estar, existe no sistema normativo brasileiro o Direito de Convivência Familiar, positivado na Constituição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil de 2002. O direito à convivência familiar é um direito fundamental personalíssimo e inalienável que garante que os menores de idade cresçam e se desenvolvam sob o amparo e cuidados de uma família. Conviver significa, basicamente, viver em comum. Mas viver em comum pressupõe muito mais, é necessário interagir, criar vínculos, superar desafios, obstáculos, trocar experiências e ter intimidade, ajudar-se, manter uma relação de amizade, respeito e lealdade. O direito à convivência familiar, na Constituição Federal de 1988 está consagrado no artigo 227, onde fica estabelecido que a família, juntamente com a sociedade e o Estado, devem garantir às crianças o direito à vida, à saúde, à educação, à alimentação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária. Ensina Silva (2003, p. 823), que a Carta Constitucional é minuciosa e redundante na previsão dos direitos e vantagens das crianças e adolescentes, especificando a eles os direitos já consignados para todos em geral. Já no Estatuto da Criança e do Adolescente, a convivência familiar esta prevista em seu artigo 1924, que determina que toda criança ou adolescente tem o direito de crescer e ser educado no seio familiar, sendo assegurada a convivência familiar e comunitária. O artigo acima citado complementa o artigo 4º25 do mesmo diploma legal, que, por sua vez, vem de encontro ao artigo 227 da Constituição Federal de 1988, asseverando que a efetivação dos direitos garantidos constitucionalmente às crianças e adolescentes tenham 24 Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. 25 Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 45 absoluta prioridade. Também o artigo 9226, inciso I, do Estatuto da Criança e do Adolescente enfatiza a necessidade da preservação dos vínculos familiares, como um princípio que deve ser adotado por instituições que desenvolvam atividades de acolhimento familiar. Tamanha a importância da convivência em família que o Novo Código Civil também elencou em seus artigos 1.63227 e 1.63428, que estabelecem que a dissolução da sociedade conjugal não altera a relação familiar já existente entre pais e filhos e prevê a obrigação dos pais em manter os filhos menores em sua guarda e companhia. Ou seja, mesmo após a separação, divórcio ou dissolução da sociedade conjugal, os pais devem ter os filhos em sua companhia e os filhos têm o direito de crescer sob seu carinho, afeto e proteção. Portanto, independentemente da previsão legal do direito à convivência familiar, a efetivação desse direito é de absoluta importância para o desenvolvimento da criança e do adolescente, pois é somente com a vida em comum que os princípios da proteção integral, solidariedade e afetividade atingirão sua finalidade. Liberati (2003, p. 24-25) dispõe que é a família o primeiro agente socializador do ser humano. A falta de amor e de afeto agravará para sempre seu futuro, pois é dos pais a responsabilidade pela formação e proteção dos filhos, possuindo o dever de garantir-lhes os direitos fundamentais assegurados pela Carta Constitucional de 1988. Não basta por um ser um humano no mundo. É fundamental complementar sua criação com a ambiência, o aconchego, o carinho e o afeto indispensáveis ao ser humano. A família é o lugar normal e natural de se efetuar a educação, onde se deve aprender o uso adequado da liberdade e onde se inicia, de forma gradativa, o mundo do trabalho. A família é onde o ser humano em desenvolvimento se sente protegido e de onde ele é lançado para conviver em sociedade (CINTRA, 2002, p. 85). O Plano de Ação para a Implementação da Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, a Proteção e o Desenvolvimento da Criança nos Anos 90 (2010), assinado em Nova Iorque em 30 de setembro de 1990 destaca: 26 Art. 92. As entidades que desenvolvam programas de acolhimento familiar ou institucional deverão adotar os seguintes princípios: I – preservação dos vínculos familiares e promoção da reintegração familiar; [...]. 27 Art. 1.632. A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos. 28 Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: [...] II – tê-los em sua companhia e guarda; [...]. 46 A família é a principal responsável pela alimentação e pela proteção da criança, da infância à adolescência. A iniciação das crianças na cultura, nos valores e nas normas de sua sociedade começa na família. Para um desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança deve crescer num ambiente familiar, numa atmosfera de felicidade, amor e compreensão. Portanto, todas as instituições da sociedade devem respeitar e apoiar os esforços dos pais e de todos os demais responsáveis para alimentar e cuidar da criança em um ambiente familiar. No mesmo sentido, a Declaração Universal dos Direitos da Criança, proclamada na Declaração de Genebra de 1924 e reconhecida na Declaração Universal do Homem prevê, em seu 6º Princípio29 que a criança precisa de amor e compreensão para que possua um desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade. Deverá ser criada sob a responsabilidade e cuidado dos pais, em um ambiente de afeto, segurança moral e material (salvo hipóteses excepcionais), e destaca que a criança de tenra idade não será apartada da mãe. Ishida (2006, p. 24) entende que nos procedimentos relativos à infância e a juventude existe a preferência de que o menor seja sempre mantido junto aos seus genitores biológicos e somente quando verificada a falta de condições dos genitores, os menores serão colocados em um lar substituto. No mesmo sentido é o entendimento de Milano Filho e Milano (1996, p. 39), que afirmam que a família é o local que propiciará à criança e ao adolescente melhor estabilidade, segurança emocional e vigilância, e somente em casos excepcionais o menor será colocado em família substituta e em ambiente livre de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. Toda criança precisa e tem o direito a uma convivência próxima com seus genitores, para que tenha um desenvolvimento psicossocial adequado, uma melhor relação interpessoal, metas de vida, crescimento pessoal, satisfação e bem estar social e psicológico. A convivência familiar tem papel fundamental nas relações humanas, pois é durante a infância e adolescência que os seres humanos necessitam de acompanhamento para seu frágil crescimento pessoal e moral, uma vez que a vida em família dignifica o ser humano. 29 6º Princípio – A criança precisa de amor e compreensão para o pleno e harmonioso desenvolvimento da sua personalidade. Na medida do possível, deverá crescer com os cuidados e sob a responsabilidade dos seus pais e, em qualquer caso, num ambiente de afeto e segurança moral e material; salvo em circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não deve ser separada da sua mãe. A sociedade e as autoridades públicas têm o dever de cuidar especialmente das crianças sem família e das que careçam de meios de subsistência. Para a manutenção dos filhos de famílias numerosas é conveniente a atribuição de subsídios estatais ou outra assistência. 47 É o entendimento de Cintra (2002, p. 87): É no dia-a-dia da vivência no pequeno núcleo familiar e no círculo mais amplo das relações de vizinhança, de bairro e de cidade, na escola e no lazer que a criança e o adolescente vão se abrindo para o mundo e assimilando valores, hábitos e modos de superar as dificuldades, de formar o caráter e introduzir-se na vida social [...]. Dallari (2002, p. 23) afirma que a responsabilidade da família, com um dever moral, decorre do fato de ser o primeiro ambiente em que a criança toma contato com a vida em sociedade. A família é juridicamente responsável pela criança e adolescente, pois em caso de omissão no cumprimento de seus deveres ou se agir de modo inadequado, poderá causar graves prejuízos aos menores, bem como a toda sociedade que se beneficiaria com seu bom comportamento e que poderão sofrer os males de um eventual desajuste psicológico e/ou social. Prossegue Dallari (2002, p. 23): [...] Além disso, pela proximidade física, que geralmente se mantém, é a família quem, em primeiro lugar, pode conhecer as necessidades, deficiências e possibilidades da criança, estando, assim, apta a dar a primeira proteção. Também em relação ao adolescente, é na família, como regra geral, que ele tem maior intimidade e a possibilidade de revelar mais rapidamente suas deficiências e as agressões e ameaças que estiver sofrendo. No mesmo sentido é o entendimento de Carvalho (2000, p. 65), que assevera que é através da convivência familiar que a criança e o adolescente se preparam para a vida social e comunitária, e se essa convivência em família for baseada no amor, no afeto e no carinho haverá, com certeza, uma diminuição considerável nos desvios de comportamento dos menores e a base da sociedade, fortalecida, formará uma sociedade sólida. A família é a estrutura fundamental que molda o desenvolvimento psíquico da criança, pois é, por excelência, o primeiro local de troca de emoções. É a instituição responsável e catalisadora de todos os processos mentais que se dão na relação e transmissão de afetos e emoções determinantes para o desenvolvimento e crescimento do indivíduo (FRAGA, 2005, p. 50). Indiscutível também, por sua vez, as consequências que a falta de vida comum com os genitores acarreta para a vida pessoal e social do ser humano. A falta de amor, carinho, afeto, cumplicidade, apoio e demais sentimentos provenientes da relação familiar, torna o ser humano frio, “fechado”, isolado e incapaz de expressar seus sentimentos. A distância da criança e do adolescente da vida em família pode trazer resultados irreversíveis ao desenvolvimento psicossocial da pessoa humana. 48 Durante a infância e a adolescência, a pessoa humana se encontra em uma fase bastante peculiar da sua vida e as experiências que vivenciar durante essa etapa de sua existência terá repercussões na formação de sua estrutura psicológica. Entre os fatos mais importantes desse momento ímpar estão aqueles que dizem respeito ao relacionamento da criança e do adolescente com sua família. Ressalte-se que essa convivência deverá se dar com ambos os pais, pois apenas assim a criança terá um desenvolvimento completo e saudável (LAURIA, 2003, p. 57-58). O que a criança necessita é que a olhem e a vejam como alguém de importância emocional para poder se reconhecer como alguém merecedor de amor. Tal papel cabe ao pai e a mãe. À função materna cabe assegurar os primeiros cuidados de sobrevivência física e estimulação psicológica necessária e indispensável à formação do ego, bem como o envolvimento afetivo mãe-bebê. Ao pai, cabe a função de inserção social, representando o pensamento lógico, a linguagem escrita, regras morais, de vida em sociedade e valores culturais (FRAGA, 2005, p. 62-71). Os danos resultantes de problemas ocorridos durante a infância e adolescência podem ter repercussões psíquicas na pessoa na idade adulta, sendo algumas passíveis de cura ou atenuação apenas com psicoterapia. Os danos psíquicos ocasionados pela ausência materna ou materna se apresentam em meninos e meninas. As mulheres, por exemplo, que cresceram sem a presença do pai podem demonstrar complicações na aquisição de feminilidade e ainda podem apresentar consequências mais graves como potencial homicida ou suicida. A rejeição materna, por sua vez, também está relacionada à violência, sendo associada à produção de crimes antes mesmo de completar 18 anos (LAURIA, 2003, p. 152). Moura (2009) destaca que a ausência, o descaso e a rejeição dos pais em relação aos filhos recém nascidos ou em desenvolvimento violam sua honra, pois basta atentar para os jovens usuários de substâncias entorpecentes e ver-se-á que a maioria deles deriva de pais que não lhes dedicam amor e carinho, ressaltando que em relação aos criminosos a situação é a mesma. Fraga (2005, p. 74) dispõe que a falta das figuras maternas e paternas causam depressões, toxicomania, perturbações de caráter, falhas no ego – orientando-se para o narcisismo, falta de criatividade, vazio, ausência de objetivos e esperanças. Por todo exposto, fica evidente que a família é a base da sociedade brasileira e que sem ela o ser humano não é capaz de se desenvolver social e psicologicamente. A pessoa 49 humana, durante a infância e a adolescência, está passando por uma fase de construção de seu caráter e de sua personalidade, necessitando de muito amor, carinho, apoio, compreensão, fiscalização e limites. Tamanha a importância da convivência em família, que a atual Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da Classificação Internacional de Doenças (CID 10), prevê uma seção dedicada aos transtornos do desenvolvimento psicológico e, inseridos nela, os transtornos da infância e adolescência. Dentre as categorias, a F93 (transtornos emocionais com início específico na infância) e a F94 (transtornos de funcionamento social com início específico na infância e adolescência) apresentam como diretrizes diagnósticas fatores associados ao abandono e à ausência de figuras parentais, com rompimento de vínculos afetivos (FRAGA, 2005, p. 75). Destaca-se que o desenvolvimento completo e saudável se efetiva com a convivência familiar, direito este regulamentado em várias legislações pátrias e em conformidade com a Constituição Federal de 1988. É somente através da vida em comum com a família que os princípios da afetividade, solidariedade e proteção integral da criança e do adolescente atingem sua finalidade. Desta forma, concluídos os estudos acerca da família e sua evolução na legislação brasileira, dos princípios relacionados à criança e ao adolescente, a regulamentação e a importância da convivência familiar, passamos a análise da Lei de Execuções Penais, sua alteração e sua previsão acerca da convivência familiar da criança com sua mãe carcerária. CAPÍTULO III 3 A LEI DE EXECUÇÃO PENAL E A CONVIVÊNCIA FAMILIAR De acordo com o estudo realizado no capítulo anterior, a família, na legislação pátria tem proteção integral do Estado e se constitui como base da sociedade brasileira. A entidade familiar, objeto de estudo do Direito de Família, passou por profundas e significativas mudanças a partir do advento da Constituição Federal de 1988. Até então, o direito de família era regulamentado pelo Código Civil de 1916, em que prevalecia a concepção de uma família patriarcal e machista, onde apenas a figura do homem era digna de proteção estatal e a mulher e os filhos não tinham vez. Foi então, com promulgação da Carta Constitucional de 1988 que a família brasileira passou a ter como base o amor, o carinho, a felicidade e a realização pessoal de cada integrante, a chamada família endemonista. Após o estudo do conceito de família e sua evolução na legislação brasileira, passamos ao estudo dos princípios da proteção integral da criança e do adolescente, da afetividade e da solidariedade, princípios estes fundamentais para a compreensão da importância da convivência familiar. Posteriormente, analisamos o direito à convivência familiar, a partir de sua previsão na Constituição Federal de 1988, no Código Civil de 2002 e no Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como foi demonstrada a importância da efetivação desde direito e as consequências que a ausência de vida em comum com a família causa ao ser humano. No presente capítulo, por sua vez, é realizado um estudo sobre o instituto da pena, abordando sua evolução, seu conceito e sua finalidade. Por fim, serão analisadas a Lei de Execução Penal, os princípios referentes a este ramo do direito, destacando-se o princípio da legalidade, da humanização da pena e da individualização da pena e sua previsão acerca do 51 direito à convivência familiar. 3.1 Aspectos históricos e conceituais da pena Iniciaremos o presente capítulo realizando uma abordagem história do instituto da pena, seu surgimento, seu conceito e sua finalidade, para que se possa entender a legislação penal em nosso ordenamento jurídico, no que se refere a sua execução. Para Zvirblis (2001, p. 19), a pena surgiu juntamente com a própria humanidade. Referido autor ensina que, primeiramente, puniam-se as violações aos chamados totens, sendo esses objetos considerados sagrados pelos povos primitivos e merecedores de respeito e devoção. Nessas relações, aquele que desagradasse aos totens deveria ser penalizado. A pena imposta para o infrator era a perda de sua vida, onde inexistia qualquer proporcionalidade entre a pena e a infração cometida. Neste período há a necessidade de satisfação da divindade aviltada pelo infrator e cuja pena deveria ser tão cruel quanto fosse o deus, servindo tal pena como forma de expiração da alma e de busca pelo perdão da divindade (BITENCOURT, 2006, p. 36). Verifica-se que nesta fase há uma forte influência do sagrado, da religião e da vida em sociedade, razão pela qual, tal fase da pena é chamada de vingança divina. O período de vingança divina se caracteriza pela circunstância da justiça penal ser realizada para satisfazer ao desejo da autoridade divina, que estava interessada em punir o criminoso, e ao mesmo tempo, punir o pecador (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 48). Nesta fase, a pena de morte, de desterro, de açoitamento, de espancamento e de tortura era vista como uma manifestação de vingança divina Passada a fase de vingança divina, a pena evolui para a chamada fase de vingança privada. Na vingança privada, os próprios membros da sociedade impunham suas sanções, que poderia ser de banimento, caso o infrator fosse do mesmo grupo dos executores da pena, ou de vingança de sangue, caso o autor fosse de grupo diverso, o que resultava em uma guerra entre os grupos (BITENCOURT, 2006, p. 36). Nesta fase, cometido um crime, ocorria a reação da vítima, dos parentes ou até do grupo social ao qual pertencia, os quais agiam sem qualquer proporcionalidade à ofensa, 52 atingindo não só o ofensor, como todo o seu grupo. Em relação à sua origem psicossocial, deriva a necessidade instintiva do homem em vingar-se da ofensa, que nada mais era do que uma forma de defesa, outra necessidade do homem (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 48). Foi nesta época que surgiu a Lei de Talião, conhecida popularmente pela expressão “olho por olho, dente por dente”, que estabeleceu certa proporcionalidade entre a pena aplicada e o crime cometido, representando a primeira tentativa de limitar a sanção. Foi na Lei de Talião que surgiu também a composição, na qual a pena era o pagamento de certa quantia, mediante a qual o ofensor se livrava da punição. A composição se desenvolveu principalmente no direito germânico, que conferia à vítima e à sua família o direito de vingança contra o agressor, resolvido com a compensação do prejuízo sofrido mediante o pagamento de certa importância em dinheiro (CATÃO, 2010). A composição contribuiu significativamente para o surgimento da proporcionalidade da pena, uma vez que o ofendido fixava um preço que deveria ser pago pelo ofensor, iniciando uma correspondência entre o dano cometido e o valor a ser pago para compensar a vítima (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 49). Desta fase de vingança privada, evoluiu-se para fase de vingança pública, em que o Estado tem o poder e o dever de punir. Bitencourt (2006, p. 37), ensina que esta fase da pena tinha como finalidade a proteção do monarca soberano, onde o poder político restava bastante influenciado pela religião, onde a vontade de um monarca era equiparada a vontade de um deus, e as penas aplicadas continuavam cruéis e desumanas. Já para na chamada fase da vingança pública, a finalidade da justiça se volta para o príncipe, não para o particular e nem para Deus. Durante as fases da vingança, a pena era desproporcional, sendo que o autor de um crime era punido pela vítima, por sua família, ou pela própria tribo a que pertencia. Às vezes, a pena se estendia não só ao agressor, mas a todo seu clã. Nas fases de vingança, a pena era concebida apenas para a satisfação de alguém. Na vingança divina, aplacava-se a ira de Deus, na vingança privada, a do particular, e na vingança pública, a do príncipe (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 48). Acabada as fases de vingança, surgiu um movimento reformador, durante o século XVIII, chamado de Iluminismo, que contribuiu para consideráveis mudanças não só no instituto das penas, mas de todo o Direito Penal, dando início a uma fase com sanções que respeitassem a condição e a dignidade da pessoa humana, dando fim às penas cruéis e 53 desumanas. Durante o Iluminismo, tendo como ápice a Revolução Francesa, é que começaram a eclodir grandes e severas críticas ao regime de aplicação das penas até então praticado. Nas palavras de Zvirblis (2001, p. 24): O Iluminismo foi, em Direito Penal, uma forte reação contra as penas corporais, aplicadas em larga escala, promovendo a substituição da pela pena de prisão. A liberdade foi dignificada com o movimento iluminista e entendeu-se que a eficácia intimidativa e repressiva da pena só teria razão de ser se traduzisse em privação da liberdade, privação esta que deveria estar ligada ao espírito de regeneração ou de readaptação do delinquente à vida social. Para Mesquita Júnior (1999, p. 48) o período humanitário iniciou no século XVIII, motivado pelos ideais revolucionários, sendo que referido período foi inaugurado pelo desenvolvimento do princípio da legalidade e das idéias de Beccaria, que visavam, basicamente, propiciar a humanização da pena, tendo em vista que não é a severidade da punição, e sim a certeza da mesma, que torna eficaz o combate à criminalidade. Com a obra “Dos Delitos e das Penas”, Beccaria contribuiu para a reforma do direito penal, por meio da crítica à crueldade que reinava no sistema punitivo, defendendo a humanidade das penas, defendendo a idéia de que a pena não deveria ser um ato de violência contra o cidadão, e sim ser pública, proporcional ao crime cometido e pré-determinada pela legislação (ZAFARONI; PIARAGELI, 2002, p. 271). Destacam-se também as idéias de John Howard, outro importante teórico, que defendia a necessidade de humanização da pena e a recuperação do segregado. Howard foi considerado o precursor do penintenciarismo, pois se preocupava com a construção de estabelecimentos penais adequados, sugerindo a separação dos condenados homens e mulheres, primários e reincidentes, isolamento noturno dos presos e trabalho obrigatório, como forma de recuperação e regeneração moral do condenado (CATÃO, 2010). No mesmo sentido, salientam-se os ideais defendidos por Jeremy Bentham, que também trouxe mudanças significativas para o direito penal, o qual entendia que a pena deveria assumir um papel de prevenção a novos crimes, condenando os castigos desumanos e enfatizando a importância da arquitetura das prisões, por meio do panótipo, que consistia em uma construção celular, com uma torre situada no centro com o objetivo de ver todas as celas. Relevante ainda o entendimento de Foucault (2006, p. 31), que defendia a necessidade de tornar as penas mais humanas e menos cruéis, não podendo a pena servir para afirmação do poder do Estado, nem para expiação da culpa através do sofrimento produzido pelos suplícios. 54 Assim, verifica-se que com o desenvolvimento das sociedades, o sistema de aplicação das penas também evoluiu, passando por diversas fases, destacando-se as fases de vingança (divina, privada e pública) onde prevalecia a aplicação de penas de morte, de castigos cruéis e desumanos, até chegarmos à época do Iluminismo, período em que se defendeu a humanização da pena. Destaca-se ainda a grande e importante influência exercida Beccaria, Howard, Bentham e Foucault, os quais contribuíram significativamente para a afirmação das penas privativas de liberdade (prisão), que surgiram com o objetivo de transformar, regenerar e reeducar o criminoso. Desta forma, após análise acerca da evolução da pena, passamos agora ao estudo do significado e da finalidade da pena. O significado da pena sempre será variável quando analisado sob o ponto de vista de cada pessoa envolvida no evento criminoso. Destaca Reale Júnior (2003, p. 45) que, sob o aspecto do condenado, a pena será sempre um castigo. Para a sociedade, a pena será vista como uma forma de intimidação e punição. Para a família do condenado, a pena será um castigo. Para a vítima, será sempre uma vingança. Para o Estado, a pena será uma forma necessária de controle social, para garantir respeito a certos valores. A pena é um instituto de controle social, que tem o significado de reprovação ou de castigo público. Esse castigo é entendido, sobretudo, como privação de liberdade. A pena ainda hoje é considerada um mal necessário numa sociedade de seres humanos imperfeitos (DIAS, 2010). Já no entendimento de Fragoso (2003, p. 348), a sanção penal é a perda de bens jurídicos, imposta pelo órgão da justiça, a quem comete crimes, atribuindo-lhe um caráter de retribuição. Mirabete (2002, p. 246) afirma que a pena: Substancialmente, consiste na perda ou privação de exercício de direito relativo a um objeto jurídico; formalmente está vinculada ao princípio da reserva legal, e somente é aplicada pelo Poder Judiciário, respeitando o contraditório; e teologicamente mostra-se, concomitantemente, como castigo e defesa social. (grifo do autor) Bitencourt (2006, p. 104), conceitua pena como sendo um castigo. Destacando que isso não significa que a função, fim essencial da pena, seja a retribuição. 55 A pena apresenta ainda, algumas características, dentre as quais se destaca a personalidade, não podendo passar da pessoa do condenado; submete-se ao princípio da legalidade, não podendo ser aplicada sem cominação legal anterior; é inderrogável, não podendo deixar de ser aplicada quando houver condenação; e por fim, deve ser proporcional ao crime, devendo guardar equilíbrio entre o delito praticado e a sanção imposta (SANTOS, C., 2010). A pena sempre será uma consequência. Muito embora os doutrinadores apresentem diversas definições para este instituto, a pena pode ser definida como uma reprimenda, uma espécie de reprovação diante de determinada conduta delituosa praticada pelo indivíduo. Para o estudo das finalidades da pena, utilizam-se teorias com o objetivo de garantir fundamentação à aplicação da pena. São as chamadas teorias das penas, divididas pela doutrina em absolutas, relativas e mistas. Para a teoria absoluta, a pena tem um único fim, o retributivo. Pune-se o agente porque ele cometeu um crime. Se a pena e o crime são males, deve imperar a igualdade entre eles, uma vez que só o igual é justo. As teorias absolutas negam fins utilitários à pena (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 47). As teorias absolutas, retribucionistas ou de retribuição determinam que a pena é um castigo, ou seja, um pagamento pelo mal praticado. O castigo compensa o mal e dá reparação moral, sendo a pena imposta como uma exigência ética. Para esta teoria, a pena era nitidamente retributiva, não havendo qualquer preocupação com a pessoa do delinquente, já que a sanção se destinava a restabelecer a ordem pública alterada pelo delito (MIRABETE, 2008, p. 24). As teorias relativas atribuem à pena a prevenção geral30 ou especial31, por meio da cominação abstrata. A cominação da pena é forma de coação psicológica, sendo que sua aplicação em concreto decorre do fato de a cominação não ter intimidado de forma suficiente. Para essas teorias, o crime não é a causa da pena, mas a ocasião para que ela seja aplicada. A pena não se explica pela idéia de justiça, mas pela idéia de necessidade social (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 47). 30 A prevenção geral atribui à pena o fim de evitar novos delitos, dirigindo-se a toda a sociedade (CATÃO, 2010). 31 Já para a prevenção especial, a pena direciona seus fins preventivos ao próprio criminoso. A função preventiva especial justifica a pena com base na criação de condições para que o criminoso não reincida (CATÃO, 2010). 56 Para a teoria relativa, a pena tem a função de prevenir a prática do delito. Muito embora considerem a pena como um mal necessário, este se justifica pela necessidade de prevenir que ocorram novos delitos (CATÃO, 2010). As teorias relativas, utilitárias ou utilitaristas, davam à pena um fim exclusivamente prático, em especial o de prevenção geral (com relação a todos) ou especial (com relação ao condenado). Nestas teorias, a pena já não era mais um castigo, e sim uma oportunidade para ressocializar o criminoso e a segregação deste era um imperativo de proteção à sociedade, considerando-se sua periculosidade (MIRABETE, 2008, p. 24). Para as teorias mistas, a pena tem um fim retributivo e fins de reeducação do delinquente e intimidação social (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 47). No mesmo sentido é o entendimento de Mirabete (2008, p. 25), afirmando que para as teorias mistas (ecléticas ou intermediárias) a pena tem uma função retributiva, tem seu aspecto moral, mas tem como finalidade não apenas a prevenção, mas um misto de educação e correção. O Código Penal brasileiro adotou a teoria mista ou unificadora da pena, que uniu em um único conceito o caráter preventivo e retributivo da pena, pois no momento de aplicação da pena, o juiz estabelecerá a pena que suficiente e necessária para a prevenção e reprovação do crime.32 Encerrado o estudo sobre o instituto da pena, onde foram abordados sua evolução histórica, seu conceito e sua finalidade, passamos agora a análise da Lei de Execuções Penais, os princípios referentes ao ramo de execução da pena, destacando-se os princípios da legalidade, da humanização da pena e da individualização da pena, sendo por fim, observada sua previsão acerca do direito de convivência da criança com sua genitora, que cumpre pena em um estabelecimento prisional. 32 Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I – as penas aplicáveis dentre as cominadas; II – a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III – o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV – a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. 57 3.2 A Lei de Execução Penal No Brasil, a primeira referência à prisão foi dada pelo Livro V das Ordenações Filipinas do Reino, Código de Leis portuguesas que vigoraram no país durante o período colonial. Após, foi na Carta Régia de 1769 a menção da instalação da primeira prisão brasileira. A Constituição de 1824, por sua vez, determinava que os réus devessem ficar separados, as prisões deveriam ser adaptadas ao trabalho, limpas, arejadas e seguras. No ano de 1830, surgia o Código Criminal do Império, que regulava a individualização da pena e julgamento especial para menores de quatorze anos. Este código trazia idéias de justiça e equidade. Mas previa penas de morte, galés, prisão, dentre outras. Em 1890, o Código Penal estabeleceu novas modalidades de pena, como a de prisão celular, de banimento, reclusão, prisão com trabalho obrigatório, prisão disciplinar e outras. Em 1933 surge a primeira tentativa de codificar a execução penal, com o Código Penitenciário da República, o qual foi abandonado, pois discrepava do Código Penal de 1940 que estava em discussão. Contudo, uma lei que regulamentava a execução penal era necessária, pois julgavam os doutrinadores que o Código Penal e de Processo Penal não eram adequados para regulamentar a execução da pena. Foi criado então um projeto de lei em 1951, que dispôs de normas gerais para a execução da pena, mas por carecer de eficácia, tornou-se letra morta. Em 1957, 1964 e 1970, mais projetos foram criados e também abandonados. Finalmente, em 1981, uma comissão composta por professores apresentou o projeto da nova Lei de Execuções penais, a qual foi promulgada em 11 de julho de 1984, que levou o n. 7.210 (MIRABETE, 2008, p. 23-4). Referida lei tem como objeto a efetivação das disposições contidas na sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a integração social do condenado e do internado.33 Nogueira (1996, p. 03) esclarece que a execução penal é a fase mais importante do direito punitivo, pois de nada adianta a condenação sem que haja a respectiva execução da pena imposta. Desta forma, fica claro que o objeto da execução penal é justamente tornar exequível ou efetiva a sentença penal condenatória que impôs ao réu determinada sanção pelo 33 Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. 58 crime cometido. A Lei de Execução Penal tem como característica a busca pela reinserção social, prestando assistência e ajuda necessárias para permitir o retorno do apenado e do internado à sociedade. Além disso, adotou o sistema progressivo de cumprimento da pena, que consiste em uma reinserção gradativa dos condenados ao meio social. Esse sistema adotado pela Lei de Execuções Penais faz com que o apenado receba de forma crescente doses de responsabilidade, preparando-o assim para o retorno à vida em liberdade, passando de um regime mais severo para um regime mais brando. O cumprimento da pena deve objetivar a integração social do apenado, já que adotada a teoria mista, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Por meio da execução da pena, objetiva-se punir e humanizar (MARCÃO, 2005, p. 01). Como nos demais ramos do direito, vigoram na execução penal diversos princípios relacionados ao cumprimento da pena, os quais são considerados essenciais para que haja uma execução penal digna, que garanta ao condenado seus direitos. Dentre todos os princípios que almejam um regular cumprimento da pena, estudaremos apenas três princípios, quais sejam, o da legalidade, da humanização da pena e da individualização pena, pois referidos princípios apresentam uma relação maior com o objeto da presente pesquisa, que tem com objetivo analisar a convivência da criança com sua genitora reclusa em um estabelecimento prisional. Iniciaremos o estudo pelo princípio da legalidade, em seguida passamos à análise do princípio da humanização da pena e por fim, examinaremos o princípio da individualização da pena. 3.2.1 Princípio da legalidade O princípio da legalidade encontra-se de forma expressa no artigo 2º da Lei de Execuções Penais, o qual dispõe que a jurisdição será exercida na forma da própria legislação de execução penal e do Código de Processo Penal.34 34 Art. 2º. A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal. Parágrafo único. Esta Lei aplicar-se-á igualmente ao preso provisório e ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária. 59 Este princípio é previsto também na Constituição Federal de 1988, como sendo um direito e garantia fundamental, estabelecendo que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de previsão legal. Também na Carta Constitucional encontramos referido princípio sedimentado no artigo 5º, inciso XXXIX, estabelecendo que não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem haverá pena sem prévia cominação em lei.35 Araújo (2010) entende que o princípio da legalidade é a pedra de toque do sistema penal. De inspiração Iluminista, consagra o clássico axioma do nullum crimen, nulla poena sine lege (não há crime sem lei), reconhecido por todas as nações civilizadas. A legalidade se situa no ponto em que impõe ao legislador o dever de formular tipos penais taxativos e fixar suas penas, evitando o uso de tipos abertos, abrangentes ou indeterminados. A legalidade demonstra evidente intenção de circunscrever a sanção penal a parâmetros fixados em lei, distantes do abuso e do arbítrio de quem quer que seja. Assim, é indispensável que haja pena cominada de antemão, bem como sejam previstos, expressamente, todos os critérios orientadores para sua quantificação e execução (NUCCI, 2005, p. 35). Referido princípio, tem como objetivo principal, impedir que o excesso e o desvio da execução penal comprometam a dignidade e a humanidade do condenado (MESQUITA JÚNIOR, 1999, p. 24). A legalidade na execução penal consiste em demarcar com nitidez o alcance da sentença e a reserva de direitos do condenado não atingidos pela decisão. Ou seja, a lei de execução das penas não deve permitir que o condenado sofra privações ou restrições além dos limites necessários para a execução da pena, para que não ocorra uma execução penal desorientada (DOTTI, 1998, p. 465-466). O princípio da legalidade na execução penal é um dos instrumentos legais existentes para que haja controle da atuação do Estado, desde o estabelecimento de normas incriminadoras, até o momento da fixação e execução das penas no estabelecimento penitenciário (SIQUEIRA; OLIVA, 2010). 35 Art. 5º. [...]; XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; [...]. 60 No mesmo sentido é o entendimento de Toledo (1994, p. 21): O princípio da legalidade, segundo o qual nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes desse mesmo fato tenham sido instituídos por lei o tipo delitivo e a pena respectiva, constitui uma real limitação ao poder estatal de interferir na esfera das liberdades individuais. Nogueira (1996, p. 07), por sua vez, dispõe que a execução da sanção imposta deve ser feita conforme normas estabelecidas pela Lei de Execuções Penais e nos regulamentos dos estabelecimentos penais (presídio, casa do albergado, conselhos da comunidade). Contudo, isso não significa dizer que durante a execução das sanções penais o preso possa ficar submetido ao arbítrio dos diretores, funcionários e carcereiros dos estabelecimentos prisionais, devendo haver sempre a intervenção do juiz, do Ministério Público e demais órgãos (MIBABETE, 2008, p. 30). Assim, verifica-se que princípio constitucional da legalidade norteia a execução penal em todos os seus aspectos, devendo ser respeitado por todos que fazem parte deste processo de cumprimento da pena. O princípio da legalidade representa uma forma de limitação ao poder jurídico do Estado, que não poderá ferir direitos e liberdades fundamentais, restringir direitos e garantias e transpor barreiras legais. Por este princípio, fica claro que quaisquer determinações que impliquem certos comportamentos deverão provir de uma norma devidamente elaborada pelos ditames do devido processo legislativo. O referido princípio na execução penal atinge todo o sistema penal, desde a sentença penal condenatória até o efetivo cumprimento da reprimenda imposta em um estabelecimento criminal, onde passa a vigorar a Lei de Execuções Penais, que prevê todos os direitos36, 36 Art. 41. Constituem direitos do preso: I – alimentação suficiente e vestuário; II – atribuição de trabalho e sua remuneração; III – Previdência Social; IV – constituição de pecúlio; V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado; X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI – chamamento nominal; XII – igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV – representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes; XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente. 61 deveres37 e garantias dos condenados. 3.2.2 Princípio da humanização da pena O princípio da humanização das penas tem origem iluminista e surgiu em oposição aos atos abusivos e tirânicos típicos da Idade Média. Na legislação brasileira, o princípio da humanidade da pena tem sua essência em um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, qual seja a dignidade da pessoa humana. Referido princípio se encontra ainda consagrado na Carta Constitucional de 1988, dentre os direitos fundamentais da pessoa, previstos no artigo 5º, destacando-se o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como na vedação de tratamentos desumanos, degradantes e torturantes, na proibição de penas de morte, perpétuas, de trabalhos forçados, de banimento ou cruéis, assegurando ao preso o respeito à sua integridade física e moral, e proporcionando o cumprimento da pena em ambiente adequado, de acordo com sexo, idade e natureza do delito.38 A Lei de Execução Penal, também prevê em seus artigos o princípio da humanização da pena, garantindo ao preso assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa39, bem como impõe a todas as autoridades o respeito à dignidade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.40 37 Art. 39. Constituem deveres do condenado: I – comportamento disciplinado e cumprimento fiel da sentença; II – obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deva relacionar-se; III – urbanidade e respeito no trato com os demais condenados; IV – conduta oposta aos movimentos individuais ou coletivos de fuga ou de subversão à ordem ou à disciplina; V – execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas; VI – submissão à sanção disciplinar imposta; VII – indenização à vitima ou aos seus sucessores; VIII – indenização ao Estado, quando possível, das despesas realizadas com a sua manutenção, mediante desconto proporcional da remuneração do trabalho; IX – higiene pessoal e asseio da cela ou alojamento; X – conservação dos objetos de uso pessoal. 38 Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]; III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; [...]; XLVII – não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; [...]. 39 Art. 11. A assistência será: I – material; II – à saúde; III – jurídica; IV – educacional; V – social; VI – religiosa. 40 Art. 40. Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios. 62 Em consonância com os dispositivos acima descritos, a Lei n. 9.455/1997, que define os Crimes de Tortura, tipifica como crime a submissão de pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, bem como aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de apurá-las41. Nogueira (1996, p. 07) dispõe que referido princípio estabelece que o condenado é um sujeito de direitos e deveres, os quais devem ser respeitados, ressalvando, contudo, que não deve haver excessos de regalias, sob pena da punição perder sua finalidade. Para Mesquita Júnior (1999, p. 29), o princípio da humanidade da pena determina que a execução da pena deve obedecer aos parâmetros modernos de humanidade, mantendo-se a dignidade humana do condenado. As penas de morte, perpétuas, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis, ferem o estágio atual da civilização humana, tendo sido, desta forma, abolidas do ordenamento jurídico brasileiro. Nucci (2005, p. 43) entende que o princípio da humanidade da pena: [...] deve pautar-se pela benevolência na aplicação da sanção penal, buscando o bem-estar de todos na comunidade, inclusive dos condenados, que não merecem ser excluídos somente porque delinquiram, até porque uma das finalidades da pena é a sua ressocialização [...]. O tratamento desumano e degradante do apenado só ajudará a embrutecê-lo, contribuindo para que, ao sair do cárcere retorne em condições piores, trazendo mais mal a todos nós. A pena deve ser privativa de liberdade e não da dignidade, do respeito e demais direitos inerentes ao ser humano (SANTOS, M., 2010). Para Boschi (2000, p. 40), o princípio da humanização das penas é iluminista, contratualista e moderno. Ele é considerado um divisor de águas entre a opressão e a libertação, entre a barbárie e a modernidade, na medida em que, em nome dele, se considera o ser humano em primeiro lugar e desconsidera-se tudo aquilo que afronta sua dignidade e “humanidade”. Desta forma, verifica-se que o princípio da humanização da pena, previsto na Constituição Federal de 1988 propõe o respeito e a dignidade ao condenado, tanto é que na 41 Art. 1º. Constitui crime de tortura: [...]; II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena – reclusão, de dois a oito anos. § 1º. Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal. § 2º. Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos [...]. 63 legislação constitucional são vedadas as penas de morte, perpétuas, cruéis, indignas e desumanas. Não é porque o indivíduo infringiu a legislação penal que este deverá ser tratado de forma degradante, como um animal ou uma coisa, pois conforme acima demonstrado, um dia este ser humano voltará ao convívio social, e poderá voltar muito mais violento do que quando entrou para o sistema prisional. Para que haja a ressocialização do condenado e a pena cumpra sua função, é necessário que o apenado seja tratado como um ser humano sujeito de direitos e não como um objeto. Para tanto, é necessário que o princípio da humanização da pena, que tem como berço a dignidade da pessoa humana, seja efetivado no sistema penitenciário brasileiro, com vistas a evitar que o cumprimento da pena em um estabelecimento penal modifique sua condição humana. 3.2.3 Princípio da individualização da pena O princípio da individualização da pena está previsto na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso XLV, que estabelece que a pena não passará da pessoa do condenado42, bem como está consagrado também no artigo 5º, inciso XLVI, que determina que a legislação infraconstitucional regule a individualização da pena, sendo estas de privação ou restrição da liberdade, de perda de bens, de multa, de prestação alternativa e de suspensão ou interdição de direitos.43 Individualizar a pena é torná-la pessoal, específica e individual a uma determinada situação, algo ou alguém, é particularizar o que antes era genérico. A individualização da pena tem o significado de eleger a justa e adequada sanção penal, quanto ao montante, ao perfil e aos efeitos sobre o sentenciado, tornando-o único e distinto dos demais infratores. Sua finalidade e importância é a fuga da padronização da pena, da mecanizada aplicação da sanção penal (NUCCI, 2005, p. 31). 42 XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. 43 XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos. 64 A individualização da pena possui três fases distintas. A primeira etapa é a individualização legislativa, a segunda fase é a individualização judiciária e a terceira etapa é a individualização executória. Por individualização legislativa, entende-se que cabe ao legislador fixar, no momento da elaboração do tipo penal incriminador, as penas mínimas e máximas específicas de determinado delito, sendo estas suficientes e necessárias para a reprovação e prevenção da criminalidade (NUCCI, 2005, p. 33). A segunda fase, chamada de individualização judicial, se dá no momento em que o magistrado, após aferir um leque de circunstâncias de natureza subjetiva – culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do agente – e de natureza objetiva – motivo, circunstâncias e consequências do crime –, fixará a pena elegendo seu montante adequado e concreto ao condenado, objetivando também a reprovação e a prevenção dos delitos (ARAÚJO, 2010). Já a terceira etapa, denominada fase executória, conjuga-se ações judiciais e administrativas indispensáveis para a ressocialização e reinserção social do condenado à vida em sociedade, onde o juiz responsável pela execução penal irá determinar o cumprimento individualizado da sanção penal aplicada (ARAÚJO, 2010). Ensina Nucci (2005, p. 09): A individualização da pena é um princípio constitucional (art. 5º, XLVI), representando, ainda, um direito humano fundamental e, concomitantemente, uma garantia humana fundamental. Trata-se do direito de todo o acusado obter, em caso de condenação, a pena justa, livre de qualquer padronização, decorrência natural da condição individualizada do ser humano, cada qual com vida e personalidade ímpares. Cuida-se de garantia das na relação processual contra o arbítrio excessivo ou mesmo abusivo do Estado-juiz na eleição da pena cabível. No mesmo sentido é o entendimento de Araújo (2010), que dispõe que a individualização da pena se contrapõe às concepções do jus puniendi do passado, quando a fixação da pena dependia do puro arbítrio do magistrado, sem qualquer consideração sobre a pessoa do condenado ou sobre as circunstâncias particulares do crime. Individualizar a pena implica no reposicionamento do intérprete e aplicador da legislação penal perante um caso concreto e seu autor, sendo vedadas todas as abstrações e as generalizações que ignoram o fato de que cada homem tem suas particularidades (BOSCHI, 2000, p. 47). Desta feita, verifica-se que o princípio constitucional da individualização da pena é de 65 extrema importância para o âmbito penal, em todas as suas fases, sendo proibida toda e qualquer forma de generalização e discricionariedade. A pena deverá adaptar-se às circunstâncias e particularidades do crime e do autor do delito, e não o contrário. O princípio ora analisado atua como uma espécie de limite ao legislador, que não poderá criar tipos penais e penas degradantes à sua própria vontade, age também como um impedimento ao magistrado no momento da aplicação da pena, que deverá atuar sempre nos limites da lei penal, com vistas a evitar eventual excesso, e garante ao apenado, que no momento do resgate da pena não haverá nenhuma modificação quanto à sanção a ele imposta, propiciando a todos uma segurança jurídica. Assim, finalizado o estudo acerca do instituto da pena, onde foi observado seu surgimento, sua evolução, seu conceito e sua finalidade, bem como concluída a análise da Lei de Execuções Penais brasileira e seus princípios norteadores, destacando-se os princípios da legalidade, da humanidade da pena e da individualização da pena, passamos agora ao estudo do direito à convivência familiar da criança com sua mãe carcerária, direito este previsto na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Execuções Penais. 3.3 Direito à convivência familiar da criança com a mãe carcerária à luz da Lei de Execuções Penais Conforme anteriormente estudado, a legislação brasileira que trata do cumprimento da pena é a Lei de Execução Penal, a qual estabelece todos os direitos e deveres dos presos e ainda garante à mãe presidiária sua convivência com a criança que nascer dentro do estabelecimento prisional. A Constituição Federal de 1988 também garante em seu artigo 5º, inciso L44, que as presidiárias terão direito a permanecer com seus filhos durante a amamentação. Anteriormente à reforma da Lei de Execuções Penais, ocorrida em 29 de maio de 2009, através da Lei n. 11.942, o artigo 83, parágrafo 2º45 da referida lei estabelecia que os estabelecimentos prisionais femininos teriam berçários onde as apenadas poderiam 44 L – às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; [...]. 45 Art. 83. [...] § 2º. Os estabelecimentos penais destinados a mulher serão dotados de berçário, onde as condenadas possam amamentar seus filhos. 66 amamentar seus filhos. O artigo 8946 do mesmo diploma legal estabelecia que a penitenciária de mulheres poderia ter uma seção para gestante e parturiente e uma creche para o recém-nascido, cuja sua responsável estivesse reclusa. Contudo, conforme se verifica nos dispositivos legais acima mencionados, a Lei de Execuções Penais mostrava-se omissa no que se refere ao tempo em que a criança permaneceria no sistema prisional em companhia de sua genitora, alegando apenas que seria durante o período de amamentação, dando margem a diversas interpretações, o que consequentemente acarretou divergências entre um estabelecimento prisional e outro em relação ao tempo de permanência das crianças nos presídios, pois cada um estabelecia o período de amamentação que entendesse correto. Diante disso, foi publicada a Lei n. 11.942 de 29 de maio de 2009, que altera a redação dos artigos 83, parágrafo 2º e 89 da Lei de Execuções Penais, para que fosse assegurado às mães presas e aos recém-nascidos condições mínimas de assistência. Assim, o artigo 83, parágrafo 2º47, com sua nova redação, determina que os estabelecimentos prisionais destinados às mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas poderão cuidar de seus filhos e amamentá-los por no mínimo seis meses. Ocorre que a nova redação do artigo acima citado, não modificou em nada a situação que vem ocorrendo nos estabelecimentos prisionais femininos do Brasil, o problema do tempo limite que o recém-nascido pode ficar com sua genitora condenada persiste, uma vez que o artigo determina apenas o tempo mínimo que o menor ficará no estabelecimento penal. A nova redação do artigo 8948, por sua vez, estabelece que os estabelecimentos prisionais destinados às mulheres serão dotados de seção para gestantes e parturientes, e de creches para abrigar maiores de seis meses e menores de sete anos, com vistas a assistir a criança desamparada cuja responsável encontra-se reclusa. Neste artigo, o legislador tenta estabelecer um limite de tempo máximo para que as 46 Art. 89. Além dos requisitos referidos no artigo anterior, a penitenciária de mulheres poderá ser dotada de seção para gestante e parturiente e de creche com a finalidade de assistir ao menor desamparado cuja responsável esteja presa. 47 Art. 83. § 2º. Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade. 48 Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa. 67 crianças fiquem nos presídios juntamente com suas mães. Contudo, o tempo prescrito no artigo, qual seja, 07 (sete) anos é excessivo e beira o absurdo. Mais uma vez denota-se que o problema persiste. É indiscutível a importância da convivência da criança com sua genitora e todos os benefícios que essa vida em comum traz para o ser humano, bem como a relevância dos princípios da afetividade, da solidariedade e da proteção integral da criança e do adolescente para o seu desenvolvimento pessoal, social e psíquico. O convívio afetivo com a mãe propicia a criação de vínculos essenciais e assegura o desenvolvimento biopsicosocial sadio da criança (GUIMARÃES, 2010). Marcão (2005, p. 87) esclarece que a convivência da criança junto com as suas mães no presídio pode ser benéfica, pois é capaz de influenciar de forma positiva na ressocialização da presa, no sentido de despertar na mãe sentimentos e valores ainda desconhecidos por ela. No mesmo sentido, entende Santos, J. (2010), que defende que na vida em comum da mão presa e do recém-nascido há predominância de aspectos mais saudáveis ao psiquismo da mãe, tais como a maturidade emocional, a flexibilidade de personalidade, a capacidade de aprender por meio da experiência e de superação de angustias, bem como favorece o desenvolvimento de uma experiência de maturidade mais feliz e gratificante para ela e promotora para o filho. Por outro lado, também são claros os prejuízos psicológicos e as consequências desastrosas causadas na criança diante da ausência materna nos primeiros meses e talvez anos de vida da criança, pois é através da convivência, do amor e do carinho da mãe que o ser humano deve crescer e se desenvolver. Sabe-se que as condições de vida dentro de um presídio ou penitenciária são desumanas e degradantes. O sistema prisional não oferece o mínimo de condições humanas de sobrevivência para os presos, que estão constantemente expostos a ambientes insalubres, em uma precariedade absoluta. A falta de estrutura dos presídios é gritante e atenta diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, pois os condenados vivem em cadeias fétidas, sem respeito a sua integridade física, a sua intimidade, sem trabalho, sem atendimento jurídico, a saúde, consumidos por todo tipo de droga que entra na prisão (SANTOS, M., 2010). Superlotação, falta de assistência médica e judiciária, falta de atividades, péssimas 68 acomodações, falta de ventilação, sol, instalações sanitárias, são os mais superficiais problemas apresentados pelos presídios brasileiros. As crianças que nascem e crescem dentro de estabelecimentos penais, assim como todos os demais reclusos, ficam expostas a ambientes fechados, depressivos, agressivos, agitados e conflituosos, os quais são extremamente prejudiciais à saúde física e mental da criança, tão frágil em seus primeiros meses e anos de vida. Além disso, muito embora a nova redação da Lei de Execuções Penais determine a existência de creches e berçários para as crianças que estão nascendo e crescendo dentro de presídios, a maioria dos estabelecimentos penais brasileiros não apresenta tais ambientes. Fica evidente, portanto, que existe um impasse na legislação brasileira, no que se refere ao direito de convivência da criança com sua genitora que cumpre pena em um estabelecimento prisional, e todo o benefício que essa vida em comum traz para o ser humano e o princípio da dignidade da pessoa humana, inerente a todo ser humano e que garante a todos uma vida com condições mínimas de conforto e de dignidade, princípio este, consagrado na Constituição Federal como fundamento da República Federativa do Brasil, que é completamente desrespeitado nos presídios e penitenciárias brasileiras. Para a solução desta difícil situação, Nogueira (1996, p. 130) observa que o artigo 83 da Lei de Execuções Penais é ocioso, tanto pela inércia dos governantes em não dar condições materiais de executá-las como pela sua inutilidade, pois defende que as mulheres que estão amamentando têm direito à prisão domiciliar, o que dispensaria, perfeitamente, berçários em presídios. O artigo 117, incisos III e IV da Lei de Execuções Penais49, estabelece que para as condenadas com filho menor ou deficiente físico ou mental ou gestante, será admitido o benefício de prisão domiciliar e a condenada passaria a cumprir a pena em casa, cumprindo, claro, algumas condições a serem impostas pelo juiz da Execução Penal. Porém, colocar a mãe em liberdade pode servir de incentivo para que outras presidiárias engravidem para obter a liberdade e a mãe acabará utilizando a criança como um alvará de soltura. 49 Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: [...]; III – condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV – condenada gestante. 69 A solução desta difícil situação que vem ocorrendo nos presídio femininos do Brasil seria, em primeiro lugar, que a legislação de execução penal determinasse o tempo máximo em que a criança deveria ficar no presídio e não fazendo referência apenas ao tempo mínimo de vida dentro do sistema prisional, como se verifica no artigo 83, parágrafo 2º, da Lei de Execuções Penais. Conforme demonstram diversos estudos, a criança com apenas seis meses de vida já tem condições internas de lidar com a separação e mudança, adaptando-se à realidade do mundo em que vive. A criança, desde muito pequena, precisa de contato com o mundo externo (GUIMARÃES, 2010). A criança pode e precisa se afastar da mãe, ter outras relações, frequentar jardins de infância, brincar, correr, criar outros vínculos pois já possui condições internas para lidar com isso. É possível e importante afastar-se da mãe, pois assim a criança consegue lidar com situações boas e ruins. Ao passar pela fase em que se apresenta em posição depressiva, a criança já pode e deve manter uma relação com o mundo exterior e seu ego vai se fortalecendo para lidar com o que é novo, bem como para desenvolver mecanismos de defesa (KLEIN, 1982, p. 285-288). Da mesma forma entende Aberastury (1982, p. 274), que dispõe que “já na segunda metade do primeiro ano a criança precisa explorar o mundo e, além disso, distanciar-se da mãe”. Nos primeiros meses de vida de uma criança, um adulto irá suprir suas necessidades, pois seu ego ainda é frágil. Por volta dos seis meses, o ego está bem estruturado, podendo a criança entrar em contato com seus conflitos para que seu ego vá se fortalecendo cada vez mais, para que possa se defender. O conflito é evolutivo e enfrentá-lo é essencial à adaptação. Inicialmente a separação da mãe e do bebê causa uma sensação de abandono na criança, depois desenvolve o desapego (ABERASTURY, 1982, p. 274). A separação entre a mãe e o filho, após a amamentação, direito este garantido constitucionalmente, é a melhor alternativa para a criança, ao invés de crescer dentro de um presídio. A experiência de separação do bebê com a mãe é menos prejudicial, se bem encaminhada, do que a vida dentro de um estabelecimento penal, mesmo que com a mãe, pois isso significa conviver com outras sentenciadas e com a hostilidade do sistema prisional, fatos que, sem dúvida, influenciarão no desenvolvimento da criança, pois no ambiente de privação 70 de liberdade não há vinculação social (GUIMARÃES, 2010). Dias (2007, p. 65), no mesmo sentido, afirma que o princípio da dignidade da pessoa humana e o desenvolvimento integral da criança é o que deve prevalecer e isso muitas vezes não é alcançado no âmbito familiar. Importante ressaltar, ainda, que além do princípio da dignidade da pessoa humana e sua essencialidade indiscutível, pode-se trazer à presente discussão, o princípio constitucional da individualização da pena, já estudado, que dispõe que a pena não passará da pessoa do condenado. Destaca-se ainda, que a própria Constituição garante o princípio da liberdade como um direito humano fundamental, que por sua vez integra o princípio da dignidade da pessoa humana. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, também garante a estes cidadãos o direito à liberdade, respeito e à dignidade da pessoa humana.50 Para o Estatuto, a liberdade da criança e do adolescente compreende o direito de ir e vir, o direito de brincar, de praticar esportes, divertir-se além de diversas outras formas de expressão e manifestação do direito de liberdade.51 Após a reforma da legislação de execução penal, no que diz respeito à fixação do limite de tempo máximo que a criança deve permanecer no presídio em companhia da mãe, qual seja, seis meses, conforme estudos realizados, o segundo passo para a solução deste conflito seria a adequação dos presídios e penitenciárias, com a criação de berços e creches para que as mães e os bebês possam ficar acomodados durante o período de amamentação. A ausência de creches e berçários nos presídios e penitenciárias brasileiras vêm prejudicando flagrantemente a criança e a mãe presa. A criação de ambientes adequados para o aleitamento materno não é mera faculdade, é obrigatória. Não é difícil, basta um pouco de boa vontade, espírito humanitário e competência para cumprir a legislação em vigor. Há uma omissão do Estado no cumprimento da Lei de Execuções Penais e da Constituição Federal, pois toda a criança tem direito ao aleitamento materno, uma garantia eminentemente humanitária (SANTOS, J., 2010). 50 Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. 51 Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; II – opinião e expressão; III – crença e culto religioso; IV – brincar, praticar esportes e divertir-se; V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; VI – participar da vida política, na forma da lei; VII – buscar refúgio, auxílio e orientação. 71 Desta forma, conforme estudado no decorrer da presente pesquisa, a vida em comum com a família tem papel fundamental no desenvolvimento pleno da criança, pois é no seio familiar que encontramos o apoio e amor incondicional. O aleitamento materno, por sua fez, contribui de forma inestimável para o crescimento sadio da criança e o fortalecimento da relação mãe-bebê. Assim, é ideal e recomendável que a criança permaneça na companhia de sua genitora somente durante o período de amamentação (seis meses), para que, mesmo em um estabelecimento penal, cresça e desenvolva-se com saúde física e mental. Transcorrido referido tempo, deverá a criança ser separada de sua mãe, uma vez que a permanência no ergástulo poderá prejudicar seu desenvolvimento efetivo, assim como violar sua dignidade e seu direito à liberdade. Diante de todo o exposto, conclui-se que, havendo a iniciativa do legislador em fixar o limite máximo de tempo em que a criança pode permanecer em companhia de sua genitora condenada durante o aleitamento materno, e uma ação eficaz do Estado no sentido de fazer cumprir a legislação constitucional e de execução penal, no que se refere à estruturação dos estabelecimentos prisionais femininos, dotando-os com berçários e creches, o problema que vem acontecendo nos presídios e penitenciárias brasileiras estariam perto do fim e o direito à convivência familiar e a dignidade da criança estariam sendo preservadas. CONCLUSÃO No ordenamento jurídico, os princípios, de forma geral são o alicerce do sistema normativo. Eles constituem a estrutura do sistema jurídico, devendo ser estritamente obedecidos, sob pena de corrompê-lo. São os princípios, portanto, que protegem os valores fundamentais da existência humana e jurídica, por isso são chamados de leis das leis. Os princípios estão ligados à idéia de moral e justiça e são considerados absolutos, universais e permanentes. Além disso, possuem um caráter abstrato, sendo aplicados a um maior número de situações. São os princípios, portanto, a fonte primária e imediata do direito, trazendo sempre valores a serem seguidos. São eles que dão o norte, que demonstram a melhor forma de garantir o direito do indivíduo. O princípio da dignidade da pessoa humana, por sua vez, foi consagrado como fundamento da República Federativa do Brasil, pois é considerado o mais importante de todos os princípios, sendo também chamado de macro-princípio. Definir a dignidade humana é uma tarefa bastante complexa, porém, é inegável que ela esta intimamente ligada ao ser humano. É um princípio-matriz que almeja sempre um mínimo de qualidade e conforto, livre de violência, exploração, humilhação e miséria. Tão importante quanto o princípio da dignidade da pessoa humana, a família, no sistema normativo brasileiro, é considerada base da sociedade e sem ela o ser humano não é capaz de se desenvolver social e psicologicamente de forma efetiva. Diante disso, salienta-se a importância da vida em comum da criança e do adolescente com a entidade familiar, na qual encontramos todo amor e compreensão de que necessitamos para sermos felizes, realizados e nos sentirmos únicos e especiais. A ausência de carinho, respeito, afeto, cumplicidade, apoio e demais sentimentos 73 provenientes da relação familiar, nesta fase da vida em que a pessoa está passando pela construção de seu caráter e de sua personalidade, pode trazer consequências desastrosas, como depressões, desvio de conduta, tornando o ser humano frio, “fechado”, isolado e incapaz de expressar seus sentimentos. O desenvolvimento completo e saudável do ser humano se efetiva com a convivência familiar, direito este regulamentado na legislação pátria e consagrado na Constituição Federal de 1988. É somente através da vida em comum com a família que os princípios da afetividade, solidariedade e proteção integral da criança e do adolescente atingem sua finalidade, qual seja, o bem estar e desenvolvimento efetivo do indivíduo. A convivência do ser humano com sua família é tão relevante e tão essencial para o seu pleno desenvolvimento, que a Lei de Execuções Penais, que na legislação brasileira trata do cumprimento da pena, garante à mãe presidiária sua convivência com a criança que nascer dentro do estabelecimento prisional. Entretanto, referida previsão na Lei de Execuções Penais mostra-se omissa no que se refere ao tempo em que o menor permaneceria no sistema prisional em companhia de sua genitora. A legislação dispõe que a criança ficará no estabelecimento penal no mínimo seis meses e prevê, ainda, que os estabelecimentos prisionais destinados às mulheres serão dotados de seção para gestantes e parturientes, e de creches para abrigar maiores de seis meses e menores de sete anos, com vistas a assistir a criança desamparada cuja responsável encontrase reclusa. Nestes termos, verifica-se que o legislador tenta estabelecer um limite de tempo máximo para que as crianças fiquem nos presídios juntamente com suas genitoras. Contudo, o tempo prescrito na legislação de execução penal, qual seja, sete anos é excessivo. É inquestionável a importância da convivência da criança com sua genitora e todos os benefícios que essa vida em comum traz para o ser humano, bem como a relevância dos princípios da afetividade, da solidariedade e da proteção integral da criança e do adolescente para o seu desenvolvimento pessoal, social e psíquico. Da mesma forma, são inegáveis os prejuízos psicológicos e as consequências desastrosas causadas na criança diante da ausência materna nos primeiros meses e talvez anos de vida da criança, pois é através da convivência, do amor e do carinho da mãe que o ser humano deve crescer e se desenvolver. 74 Contudo, as condições de vida dentro de um estabelecimento penal são desumanas e degradantes, há superlotação, falta de assistência médica e judiciária, ausência de atividades, péssimas acomodações, falta de ventilação, sol, instalações sanitária, dentre outras. Desta forma, conclui-se que havendo a iniciativa do legislador em fixar na Lei de Execuções Penais o limite máximo de tempo em que a criança pode permanecer em companhia de sua genitora condenada durante o aleitamento materno (seis meses), e não fazer referência apenas ao tempo mínimo de vida dentro do sistema prisional e uma ação eficaz do Estado no sentido de fazer cumprir a legislação constitucional e de execução penal, no que se refere à estruturação dos estabelecimentos prisionais femininos, dotando-os de berçários e creches, o problema que vem acontecendo nos presídios e penitenciárias brasileiras estaria perto do fim e o direito à convivência familiar e a dignidade da criança estariam sendo preservadas. REFERÊNCIAS ABERASTURY, Arminda. Psicanálise da criança: teoria e técnica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982. ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. São Paulo: Método, 2009. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 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ANEXOS ANEXO A Atestado de Autenticidade da Monografia UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ – UNOCHAPECÓ ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO ATESTADO DE AUTENTICIDADE DA MONOGRAFIA Eu, Tamara Grando, estudante do Curso de Direito, código de matrícula n. 200420075, declaro ter pleno conhecimento do Regulamento da Monografia, bem como das regras referentes ao seu desenvolvimento. Atesto que a presente Monografia é de minha autoria, ciente de que poderei sofrer sanções nas esferas administrativa, civil e penal, caso seja comprovado cópia e/ou aquisição de trabalhos de terceiros, além do prejuízo de medidas de caráter educacional, como a reprovação no componente curricular Monografia II, o que impedirá a obtenção do Diploma de Conclusão do Curso de Graduação. Chapecó (SC), _____ de _______________ de 2010 _________________________________________ Assinatura da Estudante ANEXO B Termo de Solicitação de Banca UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ – UNOCHAPECÓ ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO TERMO DE SOLICITAÇÃO DE BANCA Encaminho a Coordenação do Núcleo de Monografia o trabalho monográfico de conclusão de curso da estudante Tamara Grando, cujo título é O princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à convivência familiar da criança com a genitora carcerária, realizado sob minha orientação. Em relação ao trabalho, considero-o apto a ser submetido à Banca Examinadora, vez que preenche os requisitos metodológicos e científicos exigidos em trabalhos da espécie. Para tanto, solicito as providências cabíveis para a realização da defesa regulamentar. Indica-se como membro convidado da banca examinadora: ___________, telefone para contato ___________________. Chapecó (SC), _____ de ______________ de 2010 ________________________________ Assinatura da Orientadora