3 SÉRIE SELO UNICEF MUNICÍPIO APROVADO - 2008 Folha Educativa Cultura e Identidade Afro-brasileira e Indígena O que é cultura? Existe uma cultura melhor que outra? Cultura superior e cultura inferior? Se o Brasil é resultado da mistura/soma de várias culturas, porque algumas sofrem preconceito, como a indígena e a afro-brasileira? Você conhece as manifestações culturais desses povos? Saberia identificá-las? Que tal aprender um pouco sobre elas e passar a não só identificar, mas reconhecer e valorizar seu papel na nossa formação? Cultura vem do latim cultura, cultivar, cuidar. E, pra nós, quer dizer aquelas características humanas que não são naturais, inatas, mas são “cultivadas”, criadas, aprimoradas através das relações interpessoais. No Guia Cultura e Identidade Afro-Brasileira e Indígena (UNICEF), cultura é vista como “tudo que as pessoas lançam mão para construir sua existência, tanto em termos materiais como espirituais. É um patrimônio importante de um povo, porque resulta dos conhecimentos compartilhados entre as pessoas de um lugar, e vai passando, sendo recriada de geração em geração. A cultura influencia nosso modo de ser e agir e nos diz em que acreditar e como nos relacionar com o mundo.” Herança afro-brasileira e indígena Violência e Preconceito Por séculos, indígenas e afro-brasileiros formaram a base da identidade do semi-árido. Mas além de nem sempre terem sido reconhecidos, chegaram a ter sua existência negada, virando invisíveis perante as políticas públicas brasileiras. Ambos sofreram preconceito e violência. Não só física, mas especialmente cultural. Negros e índios tiveram que, em muitos momentos, ver suas tradições serem deturpadas e se ajustarem a modos de vida que não lhes eram próprios. Reconhecer sua herança em nossa formação e fortalecer suas identidades é uma maneira de promover a igualdade na diversidade e disseminar políticas públicas afirmativas. Mas como identificar as culturas afro e indígenas? Elas estão no cotidiano, nos modos de agir e falar de seus representantes, nos modos de celebrar a vida e a morte, o brincar e o comer, de encararem o sagrado e o profano. Elas também podem ser identificadas através do respeito que guardam às crianças e às pessoas mais velhas, que são os guardiões da história e do passado de seu povo. São elas que, oralmente e, de geração em geração, dão continuidade às tradições. Ouvindo os mais velhos se conhece mais as culturas indígenas e/ou afro que podem estar presentes nas suas mais variadas formas, locais e representantes. Mesmo que não seja tão explícito. É assim, através de suas maneiras de ver o mundo, que vão conseguindo sobreviver. Daí a importância de crianças e adolescentes serem estimulados a reconhecer e valorizar a riqueza desses povos em quilombos, aldeias e bairros. E saberem que a cultura de sua localidade integra a diversidade que caracteriza a cultura brasileira. Identidade, Ancestralidade e Resistência Idéias centrais para identificar, reconhecer e valorizar as culturas Segundo o Guia Cultura e Identidade Afro-Brasileira e Indígena, as identidades desses povos podem ser encontradas nas manifestações artísticas e religiosas, ou ainda em re-interpretações dessas manifestações, por isso, em cada município elas podem se apresentar de forma diferente. Daí a importância de perceber como essas identidades se fazem presentes. A ancestralidade é o respeito aos que vieram antes de nós e aos que virão e darão continuidade ao que os antepassados começaram. É o equilíbrio entre passado, presente e futuro visando a permanência de uma cultura, valorizando suas lutas, conquistas e histórias. Já a resistência nos indica como esses povos têm conseguido permanecer física e culturalmente entre nós, mesmo após tanto preconceito e imposições culturais. A identidade e a ancestralidade fizeram com que a cultura indígena e/ou afro conseguissem através de suas mais diversas manifestações políticas, sociais e culturais - manter-se de pé. Como? O Guia dá alguns exemplos de manifestações/ expressões culturais que você pode selecionar para montar o Álbum Cultura e Identidade. Festas, apresentações teatrais e maracatus são os EVENTOS. Os processos típicos de trabalho de um indivíduo ou comunidade e os produtos resultantes (como uma comida, um produto artesanal ou uma pintura) mostram modos característicos desses grupos e são os OFÍCIOS E MODOS DE FAZER. Os MITOS e LENDAS que fazem parte da tradição desses povos e são geralmente passados de geração em geração são outras formas de expressão cultural; dependendo do município há LOCAIS como terreiros de Umbanda, aldeias, quilombolas, e reservas indígenas que traduzem a experiência desses grupos e são testemunhas da história local. O próprio município pode ter um nome de origem indígena ou negra. Isso pode ser descoberto buscando a história do lugar e de seus pioneiros e maiores representantes. Outras maneira que esses grupos encontraram para sobreviver é através de INSTITUIÇÕES REPRESENTATIVAS como associações e ong´s que procuram não só preservar o que existe, mas descobrir e reconhecer o que é novo. Por fim, há os modos de falar do povo que podem revelar EXPRESSÕES e palavras típicas de uma ou outra cultura, fortalecendo sua identidade étnico-racial. Um olhar sobre a realidade Segundo a pesquisa “Adolescentes e Jovens do Brasil – Participação Social e Política”, do UNICEF, Instituto Airton Senna e da Fundação Itaú Cultural, que entrevistou 3220 adolescentes - sendo 210 indígenas - de 221 municípios brasileiros, o número de jovens que destaca a discriminação racial como a principal causa dos problemas sociais no país chega a quase 4 em cada 10 entrevistados. O reconhecimento por parte desse público de que o país é racista e de que é preciso fazer algo para superar essa questão foi a grande surpresa da pesquisa e pode ser vista como algo muito positivo; afinal, só podemos resolver um problema quando reconhecemos sua existência. Quando perguntados pelos fatores que mais geram desigualdade no país o preconceito étnico fica em segundo lugar. E são justamente os indígenas aqueles que mais se sentem discriminados (44%). Os motivos seriam: aparência (35%), pobreza (17%) e pouca escolaridade (14%). Entre os adolescentes afro-brasileiros que também se sentem discriminados (43%), os motivos são: serem afro-descendentes (23%), serem pobres (19%) e não estarem trabalhando (12%). Bases legais para a Educação Escolar Indígena A educação escolar diferenciada de qualidade e com respeito à diversidade – uma das lutas das comunidades indígenas – é garantida pela Constituição Federal de 1988 (artigos 210, 215, 231 e 232) e pela resolução 03 da Câmara de Educação Básica (CEB), de novembro de 1999. Além desses documentos, há outros que dão suporte legal à educação indígena: • Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Artigos 26, 32, 78 e 79 • Plano Nacional de Educação (Lei 10.172/9 de janeiro de 2001) – Capítulo sobre Educação Escolar Indígena • Parecer 14/99 – Conselho Nacional de Educação – 14/09/99 • Resolução 03/99 – Conselho Nacional de Educação – 10/09/99 • Decreto Presidencial 5.051, de 19 de abril de 2004, que promulga a Convenção 169 da OIT Dois documentos são fundamentais para ajudar a escola a mudar a visão estereotipada dos indígenas: Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas (RCNEI) e Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-brasileira e africana. Em relação ao Brasil e seu povo, foram os indígenas que demonstraram ter uma visão mais otimista, positiva. A questão ambiental também está no centro de suas preocupações, diferentemente de outros grupos. Porém, além de se sentirem mais discriminados, enfrentam as maiores dificuldades na hora de conseguir um trabalho formal. Tema que pode, inclusive, ser orientador da construção de políticas públicas para História e Cultura Afro-brasileira o grupo. Outra questão ligada aos A obrigatoriedade imposta pela Lei indígenas é o direito a uma escola 10.639/2003 do ensino da história e diferenciada. Normalmente essas cultura afro-brasileira em todos os escolas atendem apenas da 1ª à 5ª níveis e modalidades de ensino no série e, depois, os alunos têm que Brasil ainda é um desafio a ser colocado sair de suas aldeias e procurar outras em prática. As escolas devem escolas, especialmente as de Ensino ensinar História da África e Médio que são as mais raras. dos africanos, a cultura negra, Segundo dados do Censo Escolar seus maiores representantes, sua luta INEP/MEC 2006 a oferta de educação em prol da efetivação de seus direitos, escolar indígena cresceu 48,7% sua contribuição a nossa formação e às entre 2002 e 2006 e o crescimento áreas econômica, social e política. Esses anual de matrículas está em torno conteúdos devem ser trabalhados de 10%. Hoje são cerca de 174.255 especialmente nas disciplinas de Artes, estudantes em 2422 escolas com Literatura e História Brasileira. cerca de 10.200 professores, sendo que 90% são indígenas. Realização NA ESCOLA Para o município ganhar pontuação no Selo UNICEF terá que apresentar o Álbum Cultura e Identidade, contendo a Ficha da Expressão Cultural representativa da cultura afrobrasileira e/ou indígena escolhida e os seus registros. E a ficha da Proposta de Política Pública e os seus registros. A partir de agora, daremos algumas dicas de como você e seus alunos poderão construir os seus produtos e ajudar o seu município a ser pontuado. A primeira coisa que você precisa saber é que tudo começa com uma pesquisa para identificar expressões afro-brasileiras e/ou indígenas no município e sempre com a participação de crianças e adolescentes em todo o processo, que deve ser monitorado e avaliado ao final. Mas como identificar e sistematizar informações referentes às culturas afro-brasileiras e indígenas? Vamos às etapas do trabalho. Preparação É hora de pesquisar, ler o material indicado como referência no Guia, distribuir responsabilidades na escola, dividir alunos em equipes e escolher um local para os encontros do grupo e para guardar todo o material usado. Você pode dividir sua turma em duas equipes ou, junto com outro professor, dividir os alunos em duas turmas por assuntos: questões afro-brasileiras e questões indígenas. Depois, todos estudarão juntos os materiais sugeridos pelo Guia, para ver que expressão será escolhida por ter mais possibilidades da realização de um bom trabalho. Em seguida, é preciso conhecer e entender o instrumento onde as informações serão sistematizadas: o Álbum Cultura e Identidade, com a Ficha de Identificação da Expressão Cultural e a Ficha de Proposta de Política Pública. Por fim, listem as atividades que devem fazer e as pessoas que precisarão entrevistar para saber mais sobre o tema. Além de irem aos locais onde os grupos pesquisados se encontram. Dica: Vocês podem criar eventos na escola como festivais de música, dança, poesia, palestras e visitas de pessoas dessas comunidades à escola... Nessa etapa do trabalho - que é dividido em três fases - vocês escolherão a expressão representativa do município e também a política pública a ser adotada pelo poder público municipal. Prepare sua turma para entrevistas, com o objetivo de obter informações, curiosidades, histórias, denúncias de violências culturais... a. Selecionando a expressão cultural Para selecionar a expressão cultural que irá representar o município é preciso ter muitas informações sobre ela. Observar, conversar com pessoas da comunidade, entrevistar estudiosos, pesquisadores e lideranças. Cuidado para não se deixarem levar por expressões que tenham tendência à folclorização e ao estereótipo (o negro sempre visto como escravo; o índio sempre visto como um selvagem). A expressão cultural selecionada deve seguir alguns critérios como: estar verdadeiramente vinculada às tradições afro-brasileiras ou indígenas; ressaltar as contribuições desses povos na formação cultural do município; reforçar suas identidades; expressar uma forma de resistência cultural e incluir a participação de crianças e adolescentes no processo. b. Construindo o Álbum Cultura e Identidade O Álbum revela as características da expressão cultural escolhida e da proposta de política pública elaborada, por isso deve ser rico, para explorar todas as possibilidades dessa expressão e dessa política. Vale colocar fotos, textos, fitas cassetes com depoimentos, músicas e entrevistas, dvd’s... Você e sua turma devem se preparar para discutir a melhor maneira de, não só sistematizar, mas também de apresentar os dados que vão colher. Lembre-se que junto ao álbum devem ser anexadas a Ficha de Identificação da Expressão Cultural e a Ficha de Política Pública, que devem ser feitas apenas após as entrevistas e observações do contexto de grupo escolhido. Dica: Você pode chamar os meios de comunicação locais para fazer o lançamento do álbum. Ele deve fazer parte do acervo da biblioteca do município, para que todos da comunidade tenham acesso. c. Construindo uma proposta de política pública Quando você e sua turma estiverem entrevistando sujeitos de grupos afro-brasileiros ou indígenas, observando suas realidades, ouvirão as dificuldades pelas quais passam e as suas demandas. Esse é o primeiro ponto a ser observado na hora de se pensar em uma política pública para esses grupos. Estimule o debate entre os alunos e o grupo acerca das possibilidades de saídas para os problemas apresentados. Discutam que política pública daria conta de resolvê-los e levem a sugestão às secretarias de Educação e Cultura. Vejam quais são os passos para que ela comece a ser implantada. Para que a proposta de política pública seja realmente eficaz e bem avaliada no Selo UNICEF é importante que seja relevante para a promoção da identidade cultural afro ou indígena, inclua a participação de lideranças dos grupos e crianças e adolescentes em todo o processo, tenha um nome/título (Política de Incentivo à Educação Indígena, por exemplo) e um órgão responsável pela sua implementação, além da demonstração de que ela é viável e vem sendo ou pode ser desenvolvida. Monitoramento e Avaliação Todo esse processo deve ser monitorado, para que caso aconteça alguma falha no meio de uma fase, ela possa ser corrigida. E também avaliado ao final, com a participação de todos os envolvidos. Isso pode gerar uma mobilização cultural e transformar-se em uma ação poderosa no município, no sentido de desenvolver políticas públicas para esses grupos. Sugestão de Atividades - Álbum Cultura e Identidade Atividade 1: Contando as histórias da região através de seus moradores afro-brasileiros e/ou indígenas Atividade 3: Mobilização Junto com funcionários das secretarias de Turismo e/ou Cultura de seu município, identifique locais com maior influência negra e/ou indígena. Leve sua turma para conhecer a realidade local e convide esses grupos para produzirem um jornal com seus alunos. A idéia é colher as histórias de cada um. Os participantes conversam com crianças negras e/ou indígenas e, depois, juntos, produzem a história para o jornal. Que tal organizar uma passeata em prol dos direitos dos afro-brasileiros e índios, e também da valorização de sua herança? Vocês podem juntar um grupo com raças e etnias diferentes para que os participantes produzam cartazes, pinturas e faixas.Mas lembre que para fazer essa passeata será necessário o apoio dos órgãos de trânsito e segurança. Não esqueça também de chamar os meios de comunicação. E, mais importante, não são os alunos fazendo tudo por outros grupos, mas todos se mobilizando juntos e aprendendo com as diferenças. Atividade 2: Como afro-brasileiros e/ou indígenas se vêem? Obs: Antes da passeata, trabalhe com seus alunos a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Há índios e negros na sua escola? Como os outros alunos os vêem? Há preconceito em relação a eles? E eles mesmos, como se vêem? Consiga câmeras fotográficas para que o grupo escolhido (afro ou indígena) possa produzir imagens do que considera mais representante em suas culturas, em seu cotidiano. Depois, vocês podem imprimir algumas fotos e discutirem, juntos, o porquê daquelas escolhas. Outra variação da mesma atividade é fazer com que os alunos também fotografem o que consideram mais relevante no cotidiano do povo escolhido. Será que, ao compararem as fotos dos dois grupos (afro-brasileiros e/ou indígenas e aqueles que não fazem parte de nenhum dos dois grupos culturais), serão percebidas muitas diferenças? Alguma foto revela preconceito ou reforça estereótipos? Por quê? A turma pode escrever textos sobre cada foto que mais chamou a atenção e vocês podem montar uma exposição. Além dos comentários dos alunos, abaixo das fotos, você pode deixar um espaço para que os visitantes também escrevam o que sentem. Lembre-se de guardar tudo para o Álbum Cultura e Identidade. Lançando a Proposta de Política Pública Professores e alunos podem lançar a Proposta de Política Pública para o grupo escolhido em um evento da escola ou do município, com muita gente e a presença dos meios de comunicação. Isso porque vocês devem convidar os responsáveis pela implantação da política pública para receberem o documento de vocês em mãos e publicamente. Realização: Produção: Atividade 4: Feira de Cultura Que tal fazer uma Feira de Cultura na escola? Se a escola escolheu trabalhar com índios, cada turma fica com uma manifestação cultural para ser pesquisada e exposta: culinária, artesanato, danças, palavras (ditos, expressões), religião etc. Cada turma pesquisa um tema e entrevista pessoas, traz artesãos para que façam sua arte ao vivo na escola, traz objetos, comidas e se prepara para apresentar essa manifestação. Mas sempre junto com crianças e adolescentes que pertencem ao grupo escolhido. Ainda como fazendo parte da feira, você pode separar um espaço para contação de histórias, onde um índio ou negro mais idoso possa contar histórias do seu povo para o público. Tudo pode ser registrado em filmadora e fazer parte do Álbum Cultura e Cidadania. Atividade 5: O que é política pública? Para que seus alunos entendam melhor a Proposta de Política Pública para afro-brasileiros e/ou indígenas, que tal chamar um gestor público de seu município para conversar na escola, sobre todo o processo de discussão de uma lei e de uma política pública; como a sociedade pode participar dessa discussão e construção; como pode ser vigilante em relação à sua execução; de que maneira os principais beneficiários das políticas públicas são “ouvidos”? Todo esse debate pode estar no jornal da escola, com pequenas enquetes ou entrevistas mostrando as opiniões de cada pessoa. Expediente | Direção: Daniel Raviolo. Edição e Textos: Cristiane Parente. Revisão: Cristiane Parente e Daniel Raviolo. Diagramação e arte: Paula Azevedo. Material de livre reprodução, desde que citada a fonte. | Contatos: UNICEF (85) 3306.5702, 3306.5704 e [email protected] | COMUNICAÇÃO E CULTURA (85) 3455.2150, 3455.2168 e [email protected] Fontes de pesquisa: Pesquisa Adolescentes e Jovens do Brasil - Guia Cultura e Identidade Afro-Brasileira e Indígena - UNICEF