Na ponte entre continentes
Em setembro deste ano tive uma oportunidade única de visitar Istambul, uma cidade
que foi, desde há séculos, uma capital do comércio e do conhecimento. Uma viagem no qual
imergi com a amiga e colega portuguesa, Inês Ferreira.
Muito nos maravilhou na cidade. Não sei se foi mais o que nos surpreendou pela
positiva, pela negativa, ou se simplesmente nos tirou o fôlego ao longo do intercâmbio.
A colega e amiga turca que nos hospedou chama-se Zeynep. Ela vive num bairro
bastante calmo da colossal metrópole, do lado europeu de Istambul, estuda na escola Istek, que
também se situa no lado europeu. Para lá chegarmos, contudo, era necessário apanhar o metro
e caminhar durante algum tempo.
Talvez seja mais fácil descrever um dos dias lá passados, de forma a mostrar-lhes mais
rigorosamente um pouco da Turquia.
Tendo chegado o primeiro sábado da nossa estadia na casa da colega turca, Zeynep,
tivemos a excelente oportunidade de repousar um pouco mais sobre as camas, sem olhar para
o relógio (uma atividade que, nos dias de escola, terá sido deveras desejada).
Depois de comermos, encontrámo-nos as três com o pai da Zeynep, que nos guiaria
pelo Grande Bazar, sempre com o seu andar frenético e despachado, pelos bazares.
Apanhámos o metro, e a viagem foi um tanto longa; contudo, passámos sobre o
Bósforo (o colossalmente belo rio que atravessa a metrópole turca), algo notavelmente
magnífico. Lá, os metros têm muito melhores condições.
Ao longo da viagem recordei o que no dia anterior conversei com colegas turcos.
Quando a vergonha deixou de ser problema na escola, muitos alunos e alunas dirigiram-se a
nós, simultaneamente com alguma reserva e curiosidade, perguntando-nos desde as coisas
mais simples - "Where are you from?", "Do you have any sisters or brothers?" - até a outras
relativamente mais complexas - "What did you enjoy the most in our city at the moment?",
"How is Portugal like? Is it culturally similar to Brazil?".
Lembro-me também de perguntar a uma menina qual era a sua zona preferida
de Istambul; logo na altura, assim como na viagem de metro, a sua resposta fez sentido: "O
Bósforo". O Bósforo; uma ponte entre Europa, Ásia e talvez o Mundo Árabe. Um ponto de vista
inteligente.
Entretanto, chegámos à nossa paragem. Saímos e percebi no momento que aquele sítio
era muito diferente dos bairros mais “europeus” da cidade; as pessoas eram mais pobres,
muitos homens tentavam vender coisas, aproximando-se e tocando-nos nos cabelos, e outros
observavam os turistas, na busca de carteiras requintadas.
Apanhámos um outro metro à superfície (onde parecíamos sardinhas em latas, com
muito suor suspeito entre nós…) e enfim, chegámos ao Grande Bazar.
Para nossa surpresa, fomos apanhados numa manifestação.
Procurámos entrar no Bazar o mais depressa possível, de forma a não sermos engolidos
pela multidão.
Foi só ao entrar que me apercebi da esplêndida persuasão dos vendedores turcos. Para
além disso, por todo o lado havia candeeiros coloridos, pulseiras brilhantes, ourivesaria em ouro
e em prata, tapeçaria de luxo, doces tradicionais... era um outro mundo.
Decidimos então procurar uma loja de confiança para comprar as famosas delícias
turcas. No decorrer do passeio, demos com uma que apresentava uns docinhos com um bom
aspeto original. Como sempre, uma pessoa mal desviava o olhar, já os vendedores se
posicionavam à nossa frente, argumentando, sorrindo, perguntando de onde éramos, que
língua falávamos, o que nos encantava mais em Istambul e, claro, chegava sempre, mais cedo
ou mais tarde, o "Senhoras tão bonitas e elegantes devem saber que estes
doces/colares/candeeiros são os de melhor qualidade", sempre com um honesto sorriso na
cara.
Acontece que de facto o senhor dessa loja demonstrou ser um bom orador; refutava
bem contra-argumentos, colocava as perguntas corretas e, apesar de tudo, não parecia ser
enganador. Se bem que ter a companhia de dois cidadãos turcos, como a Zeynep e o seu pai,
nos facilitou sempre a vida.
Perguntou se éramos Portuguesas. Para nossa surpresa, também ele falava Português.
E, enquanto nos fazia um desconto nos preços e punha umas 150g a mais em cada caixa de
doces (os turcos sim, sabem vender), explicava como falava Português, Inglês, Espanhol,
Alemão, Italiano e Francês. Aparentemente era Licenciado em Ciências Políticas. Outros colegas
seus gozavam do mesmo tipo de fluência, embora nem sempre nas mesmas línguas (ouvia-se
japonês, árabe e russo), e também eles tinham Mestrados em diferentes áreas do
Conhecimento.
Caminhando um pouco mais, com os doces que provámos a encher a barriga, sentimos
o aroma a café, a canela, a especiarias desconhecidas e a tecidos ao encontrarmos o Bazar
Egípcio. Tal como no Grande Bazar, a disposição das coisas chamava a atenção e os vendedores
colocavam toda a sua alma e coração nas vendas.
Depois desta viagem no tempo e no comércio, retornámos à rua Taksim pelo metro
mais antigo da Turquia (muito bem conservado e magnífico).
Nessa viagem estávamos ainda a saborear o gelado tradicional que havíamos
comprado, e com o qual o empregado tinha brincado connosco.
Voltámos a casa, sempre com conversas interessantes com a minha amiga turca, e
repousámos no sofá, contanto histórias e rindo das mesmas.
No dia seguinte o cansaço caiu sobre as portuguesas, de modo a que tirámos o dia para
dormir e descansar.
Agradeço esta esplêndida experiência ao projeto ESN (European School Network). Foi
uma viagem excepcional, embora exaustiva e radical em todos os sentidos da palavra.
Clara João Sousa
Novembro/15
Istambul Review
Olá!
O meu nome é Inês e participei no intercâmbio na Turquia, em Istambul, de dia 2 a 15 de
Setembro de 2015.
No ano passado, conheci uma aluna alemã que fez um intercâmbio com a Escola Secundária de
D. João II e a partir daí também quis participar num projeto semelhante. Sempre achei que seria
um processo de aprendizagem, que iria conhecer pessoas novas e culturas novas. Também
achei que seria um grande desafio, estar duas semanas muito longe de casa e ter de me
desenrascar sozinha.
Quando cheguei a Istambul às 18:20 da tarde, estava imenso calor (40ºC) e, já do avião, a
cidade parecia enorme. Havia pessoas por todo lado, o que me fez pensar um pouco em Lisboa.
No caminho para a nossa casa temporária, percebi imediatamente a razão pela qual toda a
gente andava na rua: o trânsito era horrível. A maioria das pessoas usava transportes públicos.
A casa onde fiquei com a Clara era pequena mas moderna. A família era constituída pela
rapariga que nos acolheu, Zeynep, e a sua mãe. Uma das partes que mais gostei foi a comida.
Não consegui decorar quase nomes nenhuns de pratos típicos mas tudo o que comemos lá era
bom, principalmente aquilo que era feito em casa.
A escola que tivemos de frequentar durante alguns dias era uma escola privada no meio de
Istambul e era enorme porque era para alunos desde o infantário até ao 12º ano. Achei que era
tudo muito organizado: cada turma tinha uma sala e todos os alunos da escola tinham o mesmo
horário. Toda a gente dava uma importância enorme à educação visto que todos os alunos
sabiam a sorte que tinham em estar numa escola privada e todos se esforçavam por dar o seu
melhor. Havia sempre na segunda de manhã e na sexta à tarde uma cerimónia de abertura e de
fecho da semana. Talvez um dos momentos mais embaraçosos tenha sido quando na cerimónia
do primeiro dia de aulas toda a gente estava de pé e eu não percebi que era suposto fazer isso
sempre que o diretor ou professor entrava. Mas foi só uma questão de tempo até me habituar
não só às pequenas partes e pormenores mas ao horário em que todos os dias tínhamos de
acordar às 6 horas da manhã, ou até à oração da mesquita que todos os dias soava às 5:20, mais
as outras 4 vezes diárias.
Aprendi bastante sobre a religião muçulmana. Em Portugal alguns de nós têm a ideia de que
todos os muçulmanos usam burkas enormes e que são todos antipáticos e terroristas mas não é
bem assim. Há vários tipos de muçulmanos. Nem todas as mulheres usam burkas e nem todas
as burkas são enormes e pretas. Há muitos mal entendidos sobre as pessoas muçulmanas. E
nem todos o eram, pois havia igrejas cristãs.
As maiores dificuldades que tive foram, para além da adaptação ao local e ao horário, ter de ir
às aulas – porque era quase tudo em turco e obviamente que eu não percebia nada – e
pronunciar o que quer que seja, e a quantidade de comida. Explicando melhor a última parte,
toda a gente estava sempre a oferecer comida, e insistiam, eu achava que tudo era bom, mas
estava constantemente a recusar porque era mesmo muita coisa.
A cidade em si era muito bonita, quer o lado asiático quer o europeu, embora diferentes. O lado
europeu era mais cultural porque era onde estavam a maioria dos monumentos, as mesquitas e
palácios. O lado asiático era mais moderno e mais habitacional.
Os meus passeios favoritos foram a ida ao Grande Bazar, as viagens de barco entre os lados de
Istambul (através do Bósforo), e a praça Taksim.
Era tudo incrivelmente barato, incluindo a comida. A única coisa que era muito cara era a
educação. As universidades públicas são extremamente caras e todo o ensino público tem uma
qualidade inferior ao ensino privado. Por esta razão, quase todos os alunos turcos que conheci
queriam ir para os EUA estudar. Talvez seja por isso que tenham aulas de inglês desde
pequenos e na escola onde andei todos os professores de American English eram professores
nativos, mesmo americanos. Todos os alunos eram obrigados a ter este AE e também BE (British
English), embora este seja com um professor turco. O inglês da maioria das pessoas não era tão
bom quanto estava à espera, tendo eles tantos anos de inglês. Nós em Portugal também temos
mais facilidade a aprender esta língua porque a nossa televisão, na maioria dos canais, tem
legendas e não é traduzida. Na Turquia e na maioria dos países da Europa, a televisão é toda
traduzida e eles não estão tão habituados a ouvir o inglês.
A parte que mais me impressionou pela negativa foi a diferença entre géneros. Os homens, na
maioria das situações, tinham sempre mais privilégios do que as mulheres. E havia uma espécie
de sentido de superioridade que os homens tinham. Essa parte não me agradou nada porque,
por exemplo, se uma mulher for agredida por um homem, e se se descobrir esse homem, ele
nunca vai preso. Nesse aspeto acho que Portugal é um país mais desenvolvido.
Outra parte que achei que se podia mudar em Istambul é a preocupação pelo ambiente. O
único caixote de recolha de material para reciclagem que vi em 13 dias foi num centro
comercial. Só aquela cidade tem mais de 14 milhões de pessoas; imaginar a quantidade de lixo
que cada pessoa faz sem reciclar é bastante impressionante…
No geral, achei que foi uma ótima experiência, e claro que também tem as suas vantagens
visitar a cidade com quem a conhece. Recomendo a qualquer pessoa que visite a cidade, com
um guia se puderem e sem ser no verão – se em setembro estão 40º nem imagino a meio de
julho. Agradeço imenso a possibilidade que me foi dada, nomeadamente ter conhecido imensas
pessoas que nunca vou esquecer. Espero poder voltar a Istambul daqui a alguns anos.
Inês Ferreira
(13 de outubro de 2015)
Ao fundo à direita a Inês e à esquerda a Clara, ao lado dela a Zeynep. Os restantes comensais
são da família desta amiga turca.
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o relato - Escola Secundária D. João II