DOUTRINA DA AÇÃO PREVENTIVA: ANÁLISE NO ÂMBITO DO
DIREITO INTERNACIONAL
DOCTRINA DE LA ACCIÓN PREVENTIVA: ANÁLISIS EN EL
ÁMBITO DEL DERECHO INTERNACIONAL
Fernando Lee do Nascimento
Jamile Bergamaschine Mata Diz
RESUMO
A doutrina da ação preventiva adotada pelo governo americano representa,
atualmente, um tema controverso no cenário internacional, seja na esfera jurídica ou na
esfera política. Tal estratégia consiste na intervenção e implementação de medidas,
pelos estadunidenses, incidentes sobre os países que, hipoteticamente, possam
representar um risco iminente à segurança ou aos interesses quaisquer do governo
americano. Os ataques de 11 de setembro de 2001 exigiram uma transformação
significativa na política externa americana para que se combatesse o terrorismo e se
evitasse tragédias como aquelas ocorridas naquele ano. A estratégia estudada e
aplicada legalmente, encontra-se legitimada pelo art. 51 da Carta da ONU. A estratégia
preventiva abrange algumas medidas de caráter diplomático, jurídico ou econômico,
tais como a aplicação de sanções ou represálias e, como tal, pode-se afirmar que, numa
escala de condutas juridicamente fixadas, o uso da força deve ser o último recurso a
ser utilizado. Os países alvos desta doutrina são aqueles que compõem o “eixo do
mal”, quais sejam Iraque, Iran, Coréia do Norte, Síria, entre outros. A principal
controvérsia quanto à adoção e conseqüente aplicação da teoria da Ação Preventiva

Acadêmico de Direito da Universidade Federal de Viçosa. Bolsista do programa PIBIC/CNPq. Email: [email protected].

Professora do Departamento de Direito da Universidade Federal de Viçosa/MG. Doutora em Direito
Público/Direito comunitário pela Universidad de Alcalá. E-mail: [email protected].
reside justamente no fato da não formulação – jurídica - de condicionantes objetivos
para o uso, de modo anterior a um ataque, da força militar. Como o documento norteamericano NSS 2002 (National Security Strategy – documento que regulamenta a
política de segurança nacional dos EUA), não adota uma definição clara de iminência,
corre-se o risco da relativização deste conceito, permitindo-se que se baseie na
legítima defesa antecipada como pretexto para uma agressão a um país tendo–se
interesses outros que não se apóiem na defesa, especificadamente, contra uma ameaça.
No próprio artigo que serve como base jurídica para a implementação da doutrina da
Preemptive Action, ou seja, o artigo 51 da Carta da ONU, constata-se que o instituto da
legítima defesa é garantido até que o Conselho de Segurança desta organização tome
medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. A
legitimidade e os limites para a implementação de tal política tornam-se requisitos
lógicos para a preservação dos pilares fundamentais do Direito, quais sejam a
segurança jurídica e a cooperação pacífica entre os Estados.
PALAVRAS CHAVES:
Preemptive Action; Ação Preventiva; Direito Internacional; Direitos; Garantias
RESUMEN
La doctrina de la acción preventiva adoptada por el gobierno americano
representa, actualmente, un tema controverso en el escenario internacional, sea en la
esfera jurídica o en la esfera política. Tal estrategia consiste en la intervención e
implementación de medidas, por los estadunidenses, incidentes sobre los países que,
hipotéticamente, puedan representar un riesgo inminente a la seguridad o a los
intereses cualesquiera del gobierno americano. Los ataques de 11 de septiembre de
2001 exigieron una transformación significativa en la política externa americana para
que se combatiera el terrorismo y se evitara tragedias como aquellas ocurridas aquel
año. La estrategia estudiada y aplicada legalmente, se encuentra legitimada por el art.
51 de la Carta de la ONU. La estrategia preventiva comprende algunas medidas de
carácter diplomático, jurídico o económico, tales como la aplicación de sanciones o
represalias y, como tal, se puede afirmar que, en una escala de conductas jurídicamente
fijadas, el uso de la fuerza debe ser el último recurso a ser utilizado. Los países blancos
de esta doctrina son aquellos que componen el “eje del mal”, cuáles sean Irak, Iran,
Corea del Norte, Siria, entre otros. La principal controversia relacionada con la
adopción y consecuente aplicación de la teoría de la Acción Preventiva reside
justamente en el hecho de la no formulación – jurídica – de condicionantes objetivos
para el uso, de modo anterior a un ataque, de la fuerza militar. Como el documento
norteamericano NSS 2002 (National Security Strategy – documento que reglamenta la
política de seguridad nacional de los EUA), no adopta una definición clara de
inminencia, hay un riesgo de la relativização de este concepto, permitiéndose que se
base en la legítima defensa anticipada como pretexto para una agresión a un país con
intereses otros que no se apoyen en la defensa, especificadamente, contra una
amenaza. En el propio artículo que sirve como base jurídica para la implementación de
la doctrina de la Preemptive Action, o sea, el artículo 51 de la Carta de la ONU, se
constata que el instituto de la legítima defensa es garantizado hasta que el Consejo de
Seguridad de esta organización tome medidas necesarias para el mantenimiento de la
paz y de la seguridad internacionales. La legitimidad y los límites para la
implementación de tal política demandan requisitos lógicos para la preservación de los
pilares fundamentales del Derecho, cuáles sean la seguridad jurídica y la cooperación
pacífica entre los Estados.
PALAVRAS-CLAVE:
Preemptive Action; Acción Preventiva; Derecho Internacional; Derechos; Garantías
1. INTRODUÇÃO
“Os Estados Unidos têm mantido a opção das ações
preventivas para conter uma ameaça relevante para nossa
segurança nacional. Quanto maior a ameaça, maior é o risco
da incapacidade de agir – e mais necessário será o caso de
tomar medidas antecipatórias para nos defender, mesmo com
alguma incerteza de quando e onde será o ataque do inimigo.
Para antecipar ou prevenir tais atos hostis por nossos
adversários, os Estados Unidos irão, se necessário, agir
preventivamente.” .1
A afirmativa acima transcrita corresponde a um trecho do documento
apresentado pelo Governo estadunidense, em setembro de 2002, que expõe as
diretrizes da política externa americana no âmbito da segurança nacional: The National
Security Strategy of the United States of America.
A análise do contexto político e social dos Estados Unidos da América no ano de
2002 possibilita uma melhor compreensão de todo o conteúdo do referido documento.
Exatamente um ano antes, mais precisamente em 11 de setembro de 2001, os
americanos e o mundo foram surpreendidos com o maior ataque terrorista da história,
quando os centros econômico e político dos EUA foram atacados com o uso de aviões
civis.
Desde sua independência, em 1776, até 2001 os Estados Unidos nunca haviam
visto seu território ser atingido como naquela manhã. Apesar de participarem
ativamente de várias guerras como a Primeira e Segunda Guerra Mundial, bem como a
Guerra Fria, nunca os americanos haviam se sentido tão expostos dentro de seus
limites territoriais.
Diante de tal exposição, bem como do anseio popular por uma resposta aos
ataques de 2001, o governo Bush levantou a doutrina da Preemptive Action, que serviu
1
The United States has long maintained the option of preemptive actions to counter a sufficient threat
to our national security. The greater the threat, the greater the risk of inaction—and the more
compelling the case for taking anticipatory action to defend ourselves, even if uncertainty remains as
to the time and place of the enemy’s attack. To forestall or prevent such hostile acts by our
adversaries, the United States will, if necessary, act preemptively” Presidente George W. Bush, The
National Security Strategy of the United States of America, Washington, DC: The White House,
September 2002, p. 15 (NSS, 2002).
como fundamento para ações militares como as invasões do Afeganistão, ocorrida já
em 2001 e a do Iraque (2003).
Entretanto, a doutrina da ação preventiva não surgiu com a apresentação do NSS2002, pois conforme o coronel do exército americano Harold H. Worrel Jr.2 afirma que
a teoria da Ação Preventiva havia sido anteriormente utilizada na Guerra dos Seis
Dias, na qual Israel se encontrava ameaçado explicitamente pelos governos da Síria,
Egito e Iraque, sendo necessário o uso da força militar com o objetivo de impedir um
ataque iminente e restaurar a segurança naquele país.
A principal novidade trazida pelo NSS 2002, não seria a estratégia em si, mas sim
o debate aberto e a exposição política da mesma. Anteriormente, nenhum governo
havia explicitado o uso da Preemptive Action de forma tão clara, conforme leciona M.
Elaine Bunn.3
Anteriormente à Ação Preventiva, a política de segurança nacional americana
esteve alicerçada em duas outras doutrinas utilizadas em momentos históricos
diferentes.
A doutrina da contensão correspondia a medidas tomadas para garantir os
objetivos dos EUA. Desta forma era preciso manter “bases” de influência espalhadas
por todo o mundo de modo que fosse possível impedir qualquer surgimento de uma
potência capaz de fazer frente ou desafiar os americanos. Exemplo disso é o apoio
concedido pelo governo americano a muitos golpes militares ocorridos na América
Latina no século passado.
Implementada pelo governo do presidente Harry Truman em 1947, a política da
dissuasão foi amplamente aplicada no período da Guerra Fria. Naquele contexto as
relações mundiais de força se apresentavam bipolares tendo-se de um lado a antiga
União Soviética e do outro tínhamos os Estados Unidos. O mundo assistia perplexo a
uma corrida armamentista cujo resultado se mostrava imprevisível. Ambos os países
eram detentores da tecnologia de produção de armamentos nucleares e de destruição
em massa de modo que um conflito entre tais Estados poderia atingir dimensões
2
WORREL JR., Harold, Preemptive Action – Setting the left and right limits, USA WC Startegy
Research Project, pág. 5 e 6.
3
BUNN, Elaine M. Preemptive Action: when, how, and to what affect?, Strategic Forum, Institute of
Nacional Strategic Studies, National Defense University, Nº.200, July 2003, pág.
inimagináveis. Ambos os países tinham consciência de que um ataque ao país inimigo
implicaria em um contragolpe, visto que ambos eram capacitados para realizar o que
Geraldo Lesbat Cavagnari Filho4 denomina de o “segundo golpe”. Desta forma, o
objetivo dos países em conflito não apontava ao ataque direto do inimigo, mas sim
para destruir a sua intenção de atacar. “A existência de um equilíbrio do terror
acarretou como corolário, que fosse evitada uma confrontação direta entre os Estados
Unidos e a União Soviética e, conseqüentemente, o desencadear de uma nova guerra
mundial”. 5
A utilização da doutrina da dissuasão possibilitou que “as relações
internacionais fossem discutidas de forma a respeitar-se o equilíbrio entre as diferentes
entidades políticas soberanas, mesmo que de uma maneira teórica e distanciada dos
padrões empíricos ideais para o fomento da verdadeira amizade entre as nações.”6
Após o fim da Guerra Fria o cenário da relação de forças no âmbito mundial se
apresentou unipolar de modo que os Estados Unidos não mais possuíam nenhuma
potência bélica capaz de ameaçá-los. Deste modo a questão da segurança interna
passou a não mais freqüentar o epicentro dos objetivos dos governos americanos.7
A maior preocupação passou a ser a consolidação dos EUA como única
potência mundial, reforçando seu poder de influência por todo o mundo na década de
80 e estabelecendo um crescimento econômico, na década de 90, capaz de financiar
esse esforço de implantação de “bases” estratégicas em diversas regiões do globo. O
principal objetivo passou a ser o surgimento da Pax Americana em um âmbito mundial
e não mais regional.
Conforme mencionado anteriormente, os atentados de 11 de setembro alteraram
o direcionamento da política externa americana com a consolidação da Ação
Preventiva.
4
FILHO, Geraldo Lesbatt Cavagnari, O Argumento do Império, disponível em:
http://www.unicamp.br/nee/argumento_do_imperio3.htm, acesso em: 22-04-07.
5
JUNIOR,
Manuel
Cambeses,
A
Doutrina
da
Ação
Preventiva,
extraído
de
http://www.esg.br/publicacoes/artigos/a080.html em 14/08/2007
6
MATA DIZ, J. B. A Nova Teoria do Ataque Preventivo formulada pelos EUA pode ser considerada
legítima?, Trabalho apresentado na Disciplina de Iniciación a la práctica de Derecho Internacional e
publicado nos Anales del X Congreso de Derecho Internacional de la Fundación Ortega y Gasset,
Madrid, 2003, (mimeo)
7
MATA DIZ, J. B. e NASCIMENTO, F. Lee, Teoria da Ação Preventiva: Impactos e Conseqüências
sobre a Pax Mundial, Trabalho publicado nos Anais do XVI Congresso Nacional do CONPEDI –
Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito, Belo Horizonte, 2007, pág.5
2. PREVENÇÃO E PREEMPÇÃO: DEFINIÇÕES
A definição de Preemptive Action tem sido motivo de controvérsia entre os
teóricos que escrevem acerca de Direito Internacional.
Para alguns o conceito de Preemptive Action abrangeria uma séria de medidas
que poderiam ser tomadas com o fim de evitar que uma ameaça proporcionada por um
Estado se concretizasse.
A adoção das medidas preventivas abrangeria uma série de fatores que
perfazem a estratégia de segurança nacional dos Estados Unidos. Haveria várias áreas
que compõem tal medida. O uso da força, portanto, deveria ser o último recurso a ser
utilizado. Outros meios poderiam ser: diplomáticos, políticos e econômicos.
Worrel 8apresenta uma escala com quatro desdobramentos (spill-over) que
poderiam ser utilizados para a análise da Ação Preventiva:
1) O primeiro seria o uso diplomático, econômico ou informacional que
possibilitaria deter ou limitar ameaças de modo que os meios militares não seriam
necessários;
2) O segundo desdobramento seria uma amostra de forças e ataques limitados
contra alvos específicos para deter qualquer ameaça ou um sistema hostil aos EUA;
3) O penúltimo grau de atuação seria o uso ataques militares em alta escala
incluindo o uso de força aérea, terrestre e naval a fim de combater as ameaças e
alcançar determinados objetivos;
4) O último desdobramento seria uma combinação de todas as medidas acima
citadas, para destruir ameaças a interesses vitais dos estadunidenses.
Para outros autores o conceito de Ação Preventiva se desmembraria em dois,
distintos entre si: Preemptive Action (Ação Preemptiva) e Preventive Action (Ação
Preventiva).
Daniel Webster, em 1842, afirmou que a preemptive action só teria cabimento
diante de uma situação em que não haveria mais tempo para qualquer outra medida.
Elihu Root entretando defendeu a preventive action, situação essa em que o paísvítima dispôs de tempo suficiente para tomar precauções que evitem que a ameaça
8
WORREL JR., Harold, op cit, pág. 16 e 17.
ocasione prejuízos concretos. Desta forma diferenciam-se os conceitos de Preemptive
Action e Preventive Action.9
Para este estudo adotou-se a primeira corrente, de Worrel, em que a Ação
Preventiva ou Preemptive Action seria aplicável em todas as situações em que há
perigo iminente à nação que se vale desta teoria, sendo aplicáveis várias medidas que
não somente o uso da força.
Tal escolha se baseia no fato de que o Governo Americano em sua política
externa (NSS), alvo do presente estudo, se vale do termo Preemptive Action para
denominar a teoria em estudo, teoria esta que não se resume à utilização da força.
Outro fundamento para a presente opção de nomenclatura encontra-se na falta de
vocábulo no idioma Português para diferenciar as duas denominações apresentadas por
Daniel Webster e Elihu Root (Preemptive Action e Preventive Action).
3. PAÍSES-ALVO DA AÇÃO PREVENTIVA DO GOVERNO AMERICANO
Os países alvos da doutrina objeto deste estudo são aqueles que compõem o
“eixo do mal”, termo utilizado pelo presidente americano em seus discursos. Estes
países apresentam algumas características em comum quais sejam:
- brutalizam seu próprio povo;
- desrespeitam as normas internacionais;
- ameaçam os países vizinhos;
- estão determinados em adquirir armas de destruição em massa;
- patrocinam o terrorismo por todo o globo;
- rejeitam os valores humanos básicos.10
Dentre estes países alvo estaria o Iraque, Iran, Coréia do Norte, Líbia, Síria e até
mesmo Rússia e China.
9
GRAY, Colin S., The implications of Preemptive and Preventive War doctrines: a reconsideration,
Strategic Studies Institute (SSI) publication, julho de 2007, summary, pág. V.
10
BUNN, Elaine M. Preemptive Action: when, how, and to what affect?, disponível
em:
http://findarticles.com/p/articles/mi_m0QZY/is_200/ai_n13803171/print, acesso em:14/08/2007.
4. EMBASAMENTO LEGAL DA APLICAÇÃO DA TEORIA DA AÇÃO
PREVENTIVA
O art. 51 da Carta das Nações Unidas se mostra como o dispositivo legal que
serve de justificação para aqueles Estados que se valem da Ação Preventiva.
O mencionado artigo garante aos países membros da ONU que “nada na
presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual e coletiva
no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que
o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da
paz e da segurança internacionais”11.
A Preemptive Action se caracteriza como uma legítima defesa antecipada. Assim
a ocorrência do ataque não se mostra como único fato capaz de tornar justificável o
uso da força ou qualquer ato hostil. A presença de ameaça grave e iminente garante o
direito ao país que sofre tal intimidação de se defender valendo-se dos meios que
possibilitam afastar aquela possível agressão, preservando e garantindo sua segurança
nacional.
Celso D. Albuquerque conceitua a legítima defesa como “uma noção
complementar, permitindo a conciliação da manutenção de proibição do recurso à
força e o direito internacional do Estado à existência em um período de não efetividade
do sistema de segurança coletiva estabelecida pela ONU.”12
A ausência de uma teoria jurídica baseada em requisitos ou condicionantes
claros a serem cumpridos para que se possa utilizar, de modo anterior a um ataque, a
força militar se mostra como o principal obstáculo para que a aplicação de medidas
vinculadas à Ação Preventiva não possibilite, em maior o menor grau, condutas
abusivas por parte dos países que a invocam como justificativa para ações militares.
O ponto chave para ser discutido é o conceito de iminência. Pelo fato de, no
documento norte-americano NSS 2002, não se ter uma definição clara de iminência,
corre-se o risco da relativização deste conceito permitindo-se que a argumentação se
baseie na legítima defesa antecipada como pretexto para uma agressão a um país,
11
Carta das Nações Unidas
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Público. 1º volume, 15ª ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004.
12
alicerçada em interesses outros que não se apóiem na defesa especificadamente contra
uma ameaça.
A justificação para a aplicação do art. 51 da Carta da ONU estaria
contextualizada diante de uma ameaça iminente de um ataque de um país hostil ou de
terroristas. A conceituação e a caracterização de iminência se mostram como o
principal ponto de divergência e discussão entre os estudiosos do tema.
A secretária de Estado do Governo americano, Condoleezza Rice, afirma que
“as novas tecnologias requerem um novo pensamento sobre quando uma ameaça
realmente se torna ‘iminente’. Nós devemos adaptar o conceito de ameaça iminente
em relação às capacidades e objetivos de nossos adversários de hoje.”13
Segundo o filósofo político americano Michael Waltzer, a caracterização do
conceito de iminência compõe-se de três elementos: “uma manifestação com o
objetivo de atacar, um grau de preparação ativa que faça da intenção de atacar um
possível perigo e uma situação geral, em que a espera, ou qualquer ação que não seja a
guerra, aumente o risco grandiosamente”14.
Após os atentados em Nova York, Washington e Pittsburg, os Estados Unidos
obtiveram apoio mundial para invadir o Afeganistão em 2001 visto que não havia
dúvidas quanto à existência de focos terroristas naquele país. Entretanto, dois anos
mais tarde o governo americano invadiu o Iraque invocando a teoria da Ação
Preventiva, alegando a presença de armas químico-bacteriológicas. Entretanto, neste
caso não havia consenso quanto à presença destes armamentos naquele país. Cinco
anos após a invasão do país de Saddam Hussein comprovou-se que não havia armas de
destruição em massa naquele Estado .
No próprio artigo que serve como fundamento jurídico para a implementação da
doutrina da Preemptive Action, ou seja, o artigo 51 da Carta das Nações Unidas
constata-se que o instituto da legítima defesa é garantido até que o Conselho de
Segurança da ONU tome as medidas necessárias para a manutenção da paz e da
segurança internacionais.15
13
CONDOLEEZZA RICE, Remarks on the President’s National Security Strateg.
WALZER, Michael, Just and Unjust Wars, Nova York: Basic Books, 1977, pág. 81.
15
Carta da ONU, art.51
14
Na invasão do Iraque, tal preceito jurídico não foi respeitado visto que o
Conselho de Segurança, a priori, não aprovou o uso da força no caso em tela. Países
como França e Alemanha, defendiam a aplicação correta da Resolução 1441 do
Conselho de Segurança da ONU. O objetivo em questão era o desarmamento do
Iraque. Para tal, defendia-se um ataque após uma inspeção de agentes da ONU
responsáveis pela fiscalização e comprovação da existência ou não destes armamentos
de destruição em massa.
Valendo-se do argumento de que, em prol da segurança nacional os Estados
Unidos não esperariam tal inspeção, o Iraque foi invadido em 20 de março de 2003.
A guerra no Iraque é, portanto, um exemplo clássico em que a estratégia da
Ação Preventiva deve ser posta em prática sem descuidar-se dos possíveis impactos
sobre a ordem jurídica internacionalmente “estabelecida”. A presença de outros
objetivos, como a destituição de um governo tirano, não justifica o uso da força sem o
consentimento dos outros países pertencentes a ONU visto que há outros meios que
permitiriam alcançar tais metas sem a utilização da mesma, que provoca a morte de
dezenas de inocentes diariamente e arrasa e desola um país.
A justificativa de que os interesses dos americanos estão acima de qualquer
condicionamento imposto pelos outros países não pode prosperar, pois desta forma se
abriria um precedente que poderia ocasionar um caos no cenário mundial.
Desta forma há a necessidade de se criar elementos condicionantes à aplicação
da política da Preemptive Action. .
Worrel apresenta uma série de critérios extraídos do próprio NSS 2002 que
comporiam os requisitos para uma ação de legítima defesa antecipada com menores
riscos de ilegitimidade:
- uma clara, específica e iminente ameaça à segurança nacional (terroristas e Estados
hostis);
- uso da força controlado;
- uma causa justa;
- uma análise dos riscos;
- uma ação que não implica somente no uso da força;
- uma ação que não seja somente pretexto para uma agressão;
- uma ação deliberada.16
Estes requisitos poderiam ser adotados como balizamentos normativo-políticos
que viessem, em maior ou menor medida, estabelecer critérios para a construção de
uma teoria preventiva e, conseqüente, ações de estratégia e defesa baseadas em
premissas de inegável valor jurídico.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os ataques de 11 de setembro de 2001 exigiram uma completa reformulação na
política externa americana para que se combatesse o terrorismo e se evitasse tragédias
como aquelas ocorridas naquele ano.
A implementação da doutrina da Preemptive action, é legitima, visto que como
Estado soberano que é, o Estados Unidos tem o direito de se defender em caso de um
ataque ou forte ameaça.
Entretanto, a caracterização desta ameaça tem que ser precisa e qualquer uso da
força, respeitando a Carta das Nações Unidas, deve ser primeiramente debatido no
Conselho de Segurança da ONU para que seja considerado legítimo baseado em
requisitos como os elencados acima.
O descumprimento de tal dispositivo da legislação internacional provocaria uma
insegurança jurídica, política e social no âmbito internacional de modo que a
freqüência de tal descumprimento acarretaria em um desprestígio do Conselho de
Segurança da ONU, perdendo este órgão sua razão de existência, qual seja, a
administração das relações entre os Estados a fim de garantir a paz e a segurança
internacionais.
Os Estados Unidos afirmam que a segurança nacional daquele país representa a
segurança mundial. Contudo, após a análise da Ação Preventiva, conclui-se que a
aplicação ilegal da mesma provocaria uma insegurança internacional e poderia
provocar um grave precedente de instabilidade mundial.
16
WORREL JR., Harold, op cit, pág. 08 e 09.
A estratégia estudada, aplicada legalmente, é totalmente legitimada pelo art. 51
da Carta da ONU. Entretanto, se desrespeitado tal dispositivo, o país que assim a
utilizou é merecedor de repreensão pela comunidade internacional e pela ONU.
REFERÊNCIAS
BUNN, Elaine M. Preemptive Action: when, how, and to what affect?,
disponível
em:
http://findarticles.com/p/articles/mi_m0QZY/is_200/ai_n13803171/print, acesso em:
14/08/2007.
BUSH, George WE. The National Security Strategy of the United States of
America. September 2002, National Security Council and The White House, pag.15,
extraído do site: http:// www.whitehouse.gov/nsc, acessado em 29 de setembro de
2004. Reeditado anualmente, com pequenas modificações.
CONDOLEEZZA RICE. Remarks on the President’s National Security
Strategy, Waldorf-Astoria, Nova York, NY, 1º de outubro, 2001.
DINIZ, Eugenio. Clausewitz e a Teoria do Balanço Ataque-Defesa, trabalho
apresentado no REDES 2002 – Pesquisa e Educação em Estudos de Defesa e
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http://www.unicamp.br/nee/argumento_do_imperio3.htm, acesso em: 22-04-07.
GOLDWATER, Nichols. Department of Defense Reorganization. Act of 1986,
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GONÇALVES PEREIRA, A. e QUADROS, F., Manual de Direito
Internacional Público, 3ºed., Coimbra 1993
JUNIOR, Manuel Cambeses. A Doutrina da Ação Preventiva, extraído de
http://www.esg.br/publicacoes/artigos/a080.html em 14/08/2007, acesso em: 21-04-07.
MATA DIZ, Jamile Bergamaschine. A Nova Teoria do Ataque Preventivo
formulada pelos EUA pode ser considerada legítima?, Trabalho apresentado na
Disciplina de Iniciación a la práctica de Derecho Internacional e publicado nos Anales
del X Congreso de Derecho Internacional de la Fundación Ortega y Gasset, Madrid,
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MATA DIZ, J. B. e NASCIMENTO, F. Lee, Teoria da Ação Preventiva:
Impactos e Conseqüências sobre a Pax Mundial, Trabalho publicado nos Anais do
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MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Público. 1º volume,
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MIRANDA, JORGE, Curso de Direito Internacional Público, Almedina,
Cascais, 2004.
WORREL JR., Harold. Preemptive Action – Setting the left and right limits.
USAWC Strategy Research Project.
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