MAPEAMENTO DAS UNIDADES DO RELEVO NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO DO PARI /MG Cristina Silva de Oliveira1 Roberto Marques Neto2 1,2 Universidade Federal de Juiz de Fora Departamento de Geociências 1 2 [email protected] ; [email protected] RESUMO O mapa de unidades de relevo é um produto cartográfico obtido através da individualização de feições do relevo na paisagem. A divisão da área em unidades (em função da escala e do objetivo do trabalho) a partir das mais variadas técnicas, associada a trabalhos de campo, possibilitam que as informações sobre as formas, idade e gênese do relevo sejam espacializadas. Nesse sentido, a sistematização cartográfica do relevo constitui um importante instrumento de espacialização dos condicionantes estruturais e de outros segmentos da paisagem (solo, vegetação, hidrologia) que comandam o modelado terrestre. Para tanto, o uso dos sistemas de informação geográfica (SIG), devido a sua funcionalidade e fácil manipulação, integração de dados, análise, simulação de modelagens e a visualização de dados georreferenciados, possibilita a obtenção de resultados consistentes sobre o espaço geográfico, tornando-se de grande valia nos mapeamentos do relevo. Partindo dessa premissa, o presente trabalho objetiva mapear as unidades de relevo da bacia hidrográfica do Ribeirão do Pari /MG. As unidades de relevo foram delimitadas a partir da interpretação integrada de cartas temáticas e imagens de satélite que permitiram observar variações na morfologia, na altimetria, na declividade, na litologia e no padrão da rede de drenagem. Para auxiliar na análise integrada dos mapas e realçar as variações de relevo da área foi gerada uma imagem de relevo sombreado a partir da Imagem Aster (Advance Space Borne Thermal Emission and Reflection Radiometer) da NASA disponibilizados livre e eletronicamente no site (http://gdex.cr.usgs.gov/gdex/), resolução espacial de 30 x 30 metros. Além disso, foram gerados modelos digitais de elevação e perfis topográficos. As análises dos dados geológicos e tectônicos da área tiveram como base os mapas dos levantamentos geológicos básicos do Brasil, realizado pela CPRM (1991) folha Lima Duarte (SF-23-X-CVI) e o mapa de Geologia e recursos minerais do sudeste mineiro, Projeto Sul de Minas, elaborado pela COMIG, UFMG, UFRJ, UERJ (2003), escala 1:100.000, folha Andrelândia (SF-23-X -C-V). O processamento dos dados foi realizado nos softwares ArcGis 10.2.1 e envi 4.2. Após a geração e cruzamento dos mapas temáticos (geologia, hipsometria, hidrografia e declividade), chegou-se ao mapa das unidades de relevo. Individualizam-se, na área de interesse dois sistemas de relevo: um caracterizado pelas feições mais elevadas, compreendendo as unidades dos patamares de cimeira, frentes escarpadas alongadas e alinhadas, e as vertentes dissecadas em bloco falhado, associadas a vales profundos e encaixados, e outro que apresenta formas mais rebaixadas predominando as unidades de rampas de colúvio, morros, colinas e feições de planícies estreitas. O sensoriamento remoto e os sistemas de informação geográfica foram importantes na integração dos dados e na análise da distribuição espacial das unidades de relevo identificadas na área de estudo. Palavras chave: Unidades de relevo; Modelo digital de elevação; Perfis topográficos; Sensoriamento remoto; SIG. ABSTRACT The map units of relief is a cartographic product obtained through the individualization of relief features in the landscape. The division of the area into units (depending on the scale and the scope of work) from the various techniques associated with the field work, enable the information about the shapes, age and genesis of relief are spatialized. In this sense, the systematic mapping of the relief is an important tool for spatialization of structural constraints and other segments of the landscape (soil, vegetation, hydrology) which control the terrestrial modeled. Thus, the use of geographic information systems (GIS), due to its functionality and easy handling, data integration, analysis, simulation modeling and visualization of georeferenced data, allows to obtain consistent results over geographic space, making it be of great value mappings in relief. From this premise, this paper aims to map the relief units of the watershed of Ribeirão Pari / MG. The relief units were delimited from the integrated interpretation of thematic maps and satellite images it was possible to observe variations in morphology, altimetry, the slope, and lithology in the pattern of the drainage network. To assist in the integrated analysis of questions and highlight the variations in relief of the area was an image generated shaded relief from the Aster image (Advance Space Borne Thermal Emission and Reflection Radiometer) from NASA free and available electronically on the website (http:// gdex.cr.usgs.gov / DEXG /), spatial resolution of 30 x 30 meters, available for free. Moreover, to generate digital elevation models and topographic profiles. The analysis of geological and tectonic area data were based on the maps of basic geological surveys of Brazil, held by CPRM (1991) Leaf Lima Duarte (SF-23-XC-VI) and the Geology and mineral resources map of southeastern mining, South Mine Project, prepared by COMIG, UFMG, UFRJ, UERJ (2003), scale 1:100,000, sheet Andrelândia (SF-23-X-CV). Data processing was performed in the software ArcGIS 4.2 and send 10.2.1. After generation and cross thematic maps (geology, hypsometry, hydrology and slope), we arrived at a map of the relief units. Individualises-in area of interest relief of two systems: one characterized by higher features, comprising units of the heights of the summit, elongated and aligned steep fronts, and sheds dissected in failed block, associated with deep valleys and embedded, and one that presents more debased forms predominating units colluvial ramps, hills, hills and plains of narrow features. Remote sensing and geographic information systems were important in data integration and analysis of the spatial distribution of the relief units identified in the study area. Keywords: relief units; Digital elevation model; Topographic profiles; Remote sensing; SIG. 1. INTRODUÇÃO Uma das principais teorias geralmente aceitas no âmbito cognitivo da ciência geomorfológica é que o relevo da superfície da Terra é formado e desenvolvido como resultado da interação de fatores endógenos e exógenos. Ambos os fatores ao longo da história geomorfológica e geológica da Terra atuam concomitantemente, mas em diferentes intensidades e direções, modelando as mais variadas paisagens terrestres. Enquanto os fatores endógenos trabalham para construir geoformas através dos fluxos de matéria e energia do interior terrestre em direção aos níveis crustais, por outro lado, os fatores exógenos estão ativamente exercendo seu ímpeto na evolução do relevo através dos processos de intemperismo, remoção, transferência e acumulação de materiais. Do ponto de vista geomorfológico, o atual cenário encontrado no território brasileiro foi formado e delineado por esses processos a partir de fins do Cretáceo com: a progressiva abertura do oceano Atlântico; a orogênese Andina ao longo do Cenozoico; o desequilíbrio isostático da Placa Sul-Americana; a subsidência da Amazônia Ocidental, do Chaco e do Pantanal; o magmatismo alcalino e basálticotoleítico da Formação Serra Geral; o soerguimento epirogenético da plataforma brasileira. Destacam-se, nesse contexto, os grandes falhamentos cenozóicos na fachada atlântica brasileira, gerando as escarpas das serras do Mar e da Mantiqueira, e as bacias sedimentares interiores e da plataforma continental (DANTAS et al. 2008). Quanto às formas esculpidas por processos quaternários, destacam-se: superfícies de aplainamento, encostas, feições de erosão diversas e feições de acumulação (MELLO et al., 2005). As escarpas erosivas da serra da Mantiqueira estendem-se de São Paulo ao Espírito Santo, atravessando os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Apresenta direção preponderante WSW-ENE, separando o vale do rio Paraíba do Sul do Planalto Sul-Mineiro (Bacia do alto rio Grande). Seus pontos culminantes atingem cotas superiores a 2.700 m, como no maciço do Itatiaia (2.787 m, na divisa entre Rio de Janeiro e Minas Gerais) e no maciço do Caparaó (2.890 m, na divisa entre Minas Gerais e Espírito Santo), com uma linha de cumeada que oscila mais frequentemente entre 1.000 e 1.600 m. No interior de Minas Gerais, diversos alinhamentos serranos se destacam da paisagem de “mar de morros” dominante, relevo esculpido em formações cristalinas antigas, dominantemente gnáissicas, apresentando extensões homogêneas de formas mamelonares, oriundas da erosão e decomposição das rochas em clima tropical úmido (AB’SÁBER, 1950). Esses alinhamentos serranos resultam dos processos de erosão diferencial, ou seja, do desgaste desigual dos corpos rochosos produzidos pelos agentes erosivos devido à resistência oferecida por estes pacotes quartzíticos, tais como as serras de Ibitipoca (em cotas que alcançam 1.784 m), do Caraça, esta no Quadrilátero Ferrífero (em cotas que superam os 2.000 m) e do Cipó, situada no Espinhaço (em cotas que alcançam 1.700 m). Dentro desse contexto geomorfológico, mais precisamente nos setores sul/sudeste de Minas Gerais, a bacia hidrográfica do Ribeirão do Pari encerra um quadro típico de paisagens sustentadas por serras quartzíticas, que ao serem cartografadas expressam a diferenciação espacial e tipológica das formas do relevo encontradas na região. O Ribeirão do Pari, afluente pela margem direita do Rio do Peixe, tem seus divisores nos patamares de cimeira da Serra da Mantiqueira localizada no município de Olaria. Ao longo do seu percurso, com aproxidamente 14,94 km de comprimento, atravessa a bacia hidrográfica homônima do sentido oeste para leste. As cotas altimétricas mais elevadas da bacia situam-se na sua nascente, a 1580 metros de altitude no pico denominado Alto da Capoeira Grande, na tríplice divisa entre os municípios de Olaria, Lima Duarte e Bom Jardim de Minas (Fig. 1). Sua área de drenagem é de aproximadamente 64,38 km2. No conjunto o Ribeirão do Pari e seus afluentes formam um padrão de drenagem do tipo dendrítico e em alguns trechos paralelo. O relevo é caraterizado pela existência de compartimentos topográficos bem marcados, com altitude crescente para oeste (fig. 2), representado pelas escarpas da Serra da Mantiqueira decrescendo para leste onde são encontrados morros e colinas e vales resultantes da morfogénese fluvial. Na região dominam as rochas quartzíticas e quartzo xisto, em geral com muscovita esverdeada, filitos ou xistos cinzentos e quartzito, biotita gnaisses bandados com intercalações de filitos / xistos cinzentos, muscovita xistos, quartzitos, anfibolitos e rochas ultramáficas e Ortognaisses migmatíticos indivisos. Trata-se de um a sucessão metassedimentar de idade neoproterozóica (1,0 - 0,6 Ga), com rochas metaígneas máficas associadas (PACIULLO, RIBEIRO, TROUW, 2003b; PINTO et al., 1991). Os principais depósitos aluviais constituídos, principalmente, por areia fina a grossa com intercalações ou coberturas siltíco-argilosa, podem ser encontrados na foz do Ribeirão Pari, no vale do Rio do Peixe. Os depósitos coluviais são encontrados nas encostas das principais serras da área, com destaque para as quartzíticas (PINTO et al. 1991). Na região de Olaria duas estações climáticas são bem definidas, uma seca, nos meses de maio a outubro e outra, chuvosa, de novembro a abril. Na serra da Mantiqueira as temperaturas mínimas podem ser inferiores a 10º C. Nela a precipitação média anual situa-se ao redor de 1500 mm (PINTO et al. 1991). Na área de estudo, parte integrante do município de Olaria, a principal atividade econômica é a pecuária leiteira, com números expressivos de pequenas e médias propriedades distribuídas pela zona rural. A agricultura é pouco desenvolvida, predominando a de subsistência. Diante desse quadro, apresenta-se este estudo que objetiva mapear as unidades de relevo da bacia hidrográfica do Ribeirão do Pari /MG, bem como descrever suas características morfológicas, hipsométricas, litoestrutura e rede de drenagem. Fig. 1 - Mapa de localização da bacia hidrográfica Ribeirão do Pari/MG. 2. COMPARTIMENTAÇÃO DO RELEVO O mapa de unidades de relevo é um produto cartográfico obtido através da individualização de feições do relevo na paisagem. A divisão da área em unidades (em função da escala e do objetivo do trabalho) a partir das mais variadas técnicas, associada a trabalhos de campo, possibilitam que as informações sobre as formas, idade e gênese do relevo sejam especializadas. Conforme enfatizado por Ross (1990, 1992), a identificação e a classificação das formas do relevo são procedimentos que implicam em considerar a gênese, idade ou ainda os processos morfogenéticos atuantes na paisagem. Ressalta ainda o autor que a questão da escala de tratamento ou de representação constitui a premissa básica para o grau de detalhamento ou de generalização da informação. De acordo com Ross (1992), ao se elaborar uma carta geomorfológica devem-se fornecer elementos de descrição do relevo, identificar a natureza geomorfológica de todos os elementos do terreno e datar as formas, ou seja, as formas constituem um dos critérios de classificação e cartografia do relevo, que permitem inferir sobre suscetibilidade a processos erosivos, comportamento da água subterrânea, ocorrência de minérios e o comportamento geotécnico dos materiais superficiais (MELLO et al., 2005) . Disso ocorre que uma boa carta geomorfológica deve atender, sobretudo, à representação dos fatos relativos à compartimentação topográfica e às formas de relevo, deixando margem para que se deduzam fatos de uma ordem morfoclimática, pela análise das assembleias regionais de fatos de vertente, dos vales e de interflúvios, assim como pela leitura dos memoriais descritivos que necessariamente devem acompanhar os bons documentos cartográficos, de ordem geomorfológica (AB’SÁBER, 1969). Nesse sentido, a sistematização cartográfica do relevo constitui um importante instrumento de espacialização dos condicionantes estruturais e de outros segmentos da paisagem (solo, vegetação, hidrologia) que comandam o modelado terrestre. Para tanto, o uso dos sistemas de informação geográfica (SIG), devido a sua funcionalidade e fácil manipulação, integração de dados, análise, simulação de modelagens e a visualização de dados georreferenciados, possibilita a obtenção de resultados consistentes sobre o espaço geográfico, tornando-se de grande valia nos mapeamentos do relevo. Segundo o IBGE (2009) além da significativa contribuição às atividades ligadas à área de mapeamento, seja na classificação dos domínios nos aspectos morfoestruturais do relevo, ou na sua subdivisão em regiões e unidades geomorfológicas de acordo com o seu contexto evolutivo, as geotecnologias também oferecem inúmeras vantagens a estudos relacionados à morfogênese. Quando associadas às análises estratigráficas e à utilização de imagens tridimensionais das feições e dos depósitos, por exemplo, subsidiam os estudos de evolução integrada das vertentes e dos sistemas de drenagem durante o Quaternário. Em consonância ao explanado, Argento (2009) argumenta que sem a utilização de Sistemas de Informação Geográfica (SIG’s), fica praticamente inviável a elaboração de projetos ambientais, pois a presença de um plano de informações, representado por mapeamentos geomorfológicos, é indispensável. Dessa forma, a incorporação das técnicas de sensoriamento remoto conjugadas a outras técnicas igualmente relevantes, integrados a outras variáveis organizadas dentro de um Sistema de Informações Geográficas (SIG), potencializa o estudo do relevo. Tal abordagem e procedimentos operacionais oferecidos pelos SGI’s são fundamentais para a compartimentação do relevo, e posterior mapeamento geomorfológico. Tendo em conta o explanado, ressalta-se que apesar do trabalho fazer uma sucinta discussão sobre a cartografia geomorfológica, o produto cartográfico final deste trabalho pauta-se em um mapa de unidades de relevo, documento importante que define a distribuição espacial dos agrupamentos topográficos na paisagem. 3. PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS As unidades de relevo foram delimitadas a partir da interpretação integrada de cartas temáticas de hipsometria, declividade, hidrografia e das cartas topográficas do IBGE, folhas Lima Duarte (SF-23X-C-VI) e Bom Jardim de Minas (SF-23-X-C-IV), além de imagens de satélite que permitiram observar variações na morfologia, na altimetria, na declividade, na litologia e no padrão da rede de drenagem. Foi utilizada composição RGB das bandas 2,4 e 7 da imagem TM/LANDSAT de 13 de agosto de 2011, cena de código de órbita/ponto 217/75, com resolução espacial de 30 metros. Para auxiliar na interpretação integrada dos mapas e realçar as variações de relevo da área foi gerada uma imagem de relevo sombreado a partir da Imagem Aster (Advance Space Borne Thermal Emission and Reflection Radiometer) da NASA disponibilizados livre e eletronicamente no site (http://gdex.cr.usgs.gov/gdex/), resolução espacial de 30 x 30 metros. Além disso, foram gerados modelos digitais de elevação e perfis topográficos. As análises dos dados geológicos e tectônicos da área tiveram como base os mapas dos levantamentos geológicos básicos do Brasil, realizado pela CPRM (1991), folha Lima Duarte (SF-23-X-C-VI) e o mapa de Geologia e recursos minerais do sudeste mineiro, Projeto Sul de Minas, elaborado pela COMIG, UFMG, UFRJ, UERJ (PACIULLO, RIBEIRO, TROUW, 2003b), escala 1:100.000, Folha Andrelândia (SF-23-X -C-V) . O processamento dos dados foi realizado nos softwares ArcGis 10.2.1 e Envi 4.2. A designação da nomenclatura para as unidades de relevo mapeadas teve como base os procedimentos propostos pelo IPT (1981) no mapeamento geomorfológico do estado de São Paulo, conforme (quadro 1), que toma como critério as declividades dominantes nas vertentes e amplitude altimétrica entre os topos e talvegues de referência, o que revela a profundidade de entalhe dos canais. Partindo dessa premissa, as formas de relevo foram identificadas, individualizadas e delimitadas a partir da superposição da carta de declividade e das cartas topográficas do IBGE, na escala 1:50.000. Tal abordagem foi levada a efeito em consonância à interpretação taxonômica de representação do relevo (TRICART, 1956; ROSS, 1992). Na prática foi mapeado o 3º nível taxonômico proposto por Ross (op cit.), os padrões de formas semelhantes. Quando exequível, foi mapeado o 4° táxon, sobretudo no que concerne à individualização das feições de acumulação. Quadro 1. Critérios morfométricos aplicados pelo IPT para a definição de categorias de relevo (adaptado). Sistemas de Relevo Declives predominantes Amplitude do Relevo Relevo plano ou suavemente colinoso 0% a 5% < 50m Colinoso 0% a 15% < 100m Relevo de morros com encostas suavizadas 0% a 15% 100m a 300m Relevo de Morrotes > 15% < 100m Relevo de Morros > 15% 100m a 300m Relevo Montanhoso > 15% > 300m O trabalho de campo desenvolveu-se visando dar suporte as interpretações cartográficas elaboradas com base no banco de dados geográficos da área, bem como a obtenção de informações complementares acerca das características morfológicas, uso e ocupação, frente de intemperismo e elementos específicos do relevo, como por exemplo, as frentes escarpadas e rampas coluviais da Serra da Mantiqueira. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na área em estudo podem ser identificados dois sistemas de relevo: um caracterizado pelas feições mais elevadas, compreendendo as unidades dos patamares de cimeira, frentes escarpadas alongadas e alinhadas, e as vertentes dissecadas em bloco falhado, associadas a vales profundos e encaixados, e outro que apresenta formas mais rebaixadas predominando as unidades de rampas de colúvio, morros, colinas e feições de planícies estreitas (fig. 3). Fig. 2 - Mapa de hipsometria da bacia hidrográfica Ribeirão do Pari/MG. A partir do mapa hipsométrico (Fig. 2), a distinção de tais sistemas se faz perfeitamente perceptível. As altitudes superiores a 1200 metros representam os compartimentos serranos da bacia (morfologia individualizada como Patamares de cimeira e Vertentes dissecadas em bloco falhado), relevo movimentado, interrompido em contatos litológicos bem definidos. Nesses compartimentos, as vertentes dissecadas situadas na margem esquerda do Ribeirão do Pari (a norte e noroeste da bacia) apresentam um nível altimétrico mais elevado do que as vertentes situadas à direita, que faz divisa com a bacia do córrego Três Pontes, apresentando, portanto, gradientes topográficos relativamente mais elevados. Esses gradientes topográficos contribuem para que ocorram ao longo dos canais principais diversos níveis de base rochosos, compondo cachoeiras com quedas que podem variar de poucos metros a mais de 100 metros, nos dois compartimentos topográficos, configurando uma bacia escalonada com vales suspensos. Para jusante da bacia, prevalecem os compartimentos mais rebaixados com morfologias dominantes de morros e colinas convexo-côncavas com fundos de vales com as planícies estreitas do Ribeirão do Pari, onde as altitudes variam entre as cotas de 800 a 1100 metros, discriminadas pelas cores mais claras na fig. 2. Fig. 3 - Unidades de relevo na bacia do Ribeirão do Pari. A unidade Patamares de cimeira corresponde ao divisor hidrográfico entre as bacias do Ribeirão Imbutaia (afluente do Rio Grande), a oeste e do Córrego Porteira de Chave (afluente do Rio do Peixe), a nordeste. Sustentada essencialmente pelos quartzitos da Megassequência Andrenlândia, esta elevação possui direção aproximada NE-SW e se encontra delimitada por escarpas com até 300 m nos pontos mais conservados. Fig. 4 - Vista das altas escarpas e dos alinhamentos das superfícies mais elevadas da serra da Mantiqueira no contexto estudado. No primeiro plano, morros recobertos por pastagens intercaladas com corredores de Floresta Estacional Semidecidual. No segundo plano, vertentes dissecadas e frente escarpada da Serra da Mantiqueira. Foto: Cristina Silva de Oliveira. Data: 22/05/2014. Predominam topos extensos e alongados posicionados acima de 1550 m de altitude (fig. 4). Em direção a leste as cristas quartzíticas cedem lugar a morfologias mamelonares balizadas em biotita gnaisses bandados com intercalações de filitos / xistos cinzentos, muscovita xistos, e ortognaisses migmatíticos indivisos (PACIULLO, RIBEIRO, TROUW, 2003b), o que provoca dissecação mais intensa e decréscimo nas altitudes. A unidade de Vertentes dissecadas em bloco falhado contorna a bacia hidrográfica do Ribeirão do Pari de oeste/sudoeste seguindo para norte e terminando a leste nas proximidades da sua foz. Esses blocos dissecados se estreitam no setor noroeste da bacia, onde estão interligados a morros altos com encostas retilíneas e vales fechados. Essas áreas de cabeceira do Ribeirão do Pari e do Córrego São João do Pari compreendem as zonas de maior erosão da bacia, onde os cursos d’água percolam em leito rochoso. No córrego São João do Pari, a distribuição de trechos rochosos está vinculada aos escarpamentos e vertentes abruptas da Mantiqueira, onde as declividades são substancialmente maiores, conforme verificado na figura 4. O curso do córrego São João do Pari apresenta-se adaptado à falha no substrato quartzitico, que está submetido a um controle estrutural de expressão regional ao longo da Serra da Mantiqueira. Para jusante do canal, as declividades vão se atenuando até formarem estreitas áreas de acumulação. Nessa unidade, em todas as direções, rupturas de declive bruscas separam os níveis ondulados superiores das rampas e degraus inferiores rebaixados pelos afluentes do Ribeirão do Pari. Tais áreas apresentam vales profundos com vertentes dissecadas ocupadas por um mosaico de corredores de vegetação intercaladas com pastagem. A unidade Rampas de colúvio localizada na seção sudoeste da bacia, a 960 m de altitude, tem por propriedade separar as vertentes abruptas dissecadas em bloco falhado (patamares altitudinais mais elevados), onde está localizada a cascata do Córrego São João do Pari a 1500 m de altitude (fig. 6), dos morros e colinas mais rebaixados do médio curso da bacia. Esse contraste pode ser visualizado através do perfil longitudinal A-A’ (fig. 5). O eixo y do perfil faz referência a altitude, medida em metros e o eixo x à distância horizontal acumulada da nascente à foz do Córrego São João. Fig. 5- Perfil longitudinal do Córrego São João do Pari, afluente pela margem direita do Ribeirão do Pari. Fig. 6 - Cachoeira do Córrego São João do Pari. Fonte: Sander Victor de Paula. Na porção centro-sul da bacia pode ser visualizada a unidade mapeada como colinas, caracterizadas por topos arredondados e angulosos posicionados entre 940 m e 965 m de altitude. Suas vertentes intercalam trechos levemente convexizados com declives predominantes inferiores a 15% e trechos côncavos, que abrigam as inúmeras cabeceiras de drenagem. A unidade de morros é a que ocupa a maior área da bacia (figura 7). A diferença entre o topo dos morros e o fundo dos vales chega a atingir 250 metros nos setores a noroeste e norte da bacia, nas proximidades do córrego da Cruz, à medida que se aproxima do baixo curso da bacia. Esse aspecto morfológico deriva da acentuada decomposição das rochas graníticas ou gnáissicas que compõem essa unidade. Fig. 7- Vista para os morros de formas arredondadas com vertentes convexas, esculpidos em ortognaisses migmatíticos. Ao fundo, vertentes florestadas da Serra da Mantiqueira. Foto: Cristina Silva de Oliveira. Data: 22/05/2014. Além dessas feições, morros com encostas côncavas, marcadas por corredores de mata ciliar e matas de encosta, sobressaem-se na paisagem, conforme acentuado na figura 8. Nesses compartimentos de encostas com topografias côncavas se desenvolvem as cabeceiras de drenagem que originam a rede hidrográfica do setor centro-norte da bacia. Essas áreas de ocupação pretérita predominantemente rural, por vezes associada ao uso extensivo das pastagens, contribuem para a ocorrência de processos erosivos mais acentuados nos trechos mais declivosos da bacia. Fig. 8- Morros com setores côncavos no primeiro e segundo plano da fotografia; ao fundo, destaque aos alinhamentos da Serra da Mantiqueira e à exposição de uma parcela de solo em encosta íngreme. Foto: Cristina Silva de Oliveira. Data: 22/05/2014. A unidade Planícies de inundação é caracterizada por apresentar relevo plano, com declividade inferior a 5%. Apesar de descontínua espacialmente, essas áreas estreitas se desenvolvem, sobretudo no médio curso do Ribeirão do Pari e do Córrego São João do Pari, voltando a aparecer nas proximidades da sua foz próxima ao Rio do Peixe. Essa interrupção no desenvolvimento da planície se deve a um estrangulamento sofrido pelo canal na área localizada em um dos pontos interceptados pela zona de cisalhamento Pirapitinga, que preserva uma feição proeminente na paisagem emoldurada em rochas eminentemente quartzitícas, localizada no seu baixo curso (fig. 9). Fig. 9 - Vista da unidade de Morros e ao fundo vista para a serra. Os morros estão cobertos por matas de topo, geralmente matas secundárias iniciais e pastagem, destinadas a pecuária leiteira. Foto: Cristina Silva de Oliveira. Data: 22/05/2014. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados obtidos através da aplicação dos procedimentos cartográficos propostos e dos trabalhos de campo permitiram o discernimento e interpretação do sistema geomorfológico ocorrente na área de estudo, assim como tecer algumas considerações iniciais a respeito das inter-relações entre a base geológica e as formas de relevo associadas e destas com os processos espaciais superficiais sobre as morfologias discernidas e mapeadas. No entanto, a escassez de mapas geológicos e pedológicos em escalas de detalhe dificultam as investigações de meso e microestruturas da paisagem, e possíveis generalizações sobre a dinâmica e evolução pela influência dos processos geomorfológicos exógenos atuando na geração e retrabalhamento de coberturas de alteração. A utilização de Sistemas de Informação Geográfica no mapeamento do relevo supre parcialmente a relativa escassez de informações de base. O desenvolvimento de programas computacionais específicos e até mesmo o uso de modelos matemáticos aplicados às geociências vem sendo aprimorados para auxiliar essas investigações em diferentes escalas, abrindo perspectivas para reconstituições do arranjo tridimensional de antigas superfícies geomorfológicas em diferentes contextos do Brasil, bem como para o aprimoramento geral da pesquisa acerca da evolução e dinâmica do relevo. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS AB’SABER, A. N. A Serra do Mar e a Mata Atlântica em São Paulo. Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, n. 4, p. 61-70, 1950. _______________. Problemas do mapeamento geomorfológico no Brasil. Geomorfologia, São Paulo, Instituto de Geografia da Universidade de São Paulo, n. 6, p. 1-16, 1969. ARGENTO, M. S. Mapeamento geomorfológico. In: Geomorfologia: Uma Atualizagão de Bases e Conceitos. GUERRA, A. J. T. & CUNHA, S. B. (orgs.). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. 9º ed. DANTAS, M.E.; ARMESTO, R.C.G.; ADAMY, A. 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