João: A Jornada da Fé “Eis o Cordeiro de Deus” (1:19–51) Bruce McLarty Um maravilhoso livro infantil, intitulado Sarah, Plain and Tall (“Sara, Simples e Alta”) conta a história de uma mulher de Maine, que decidiu sair do litoral e mudar-se para as campinas como uma espécie de esposa encomendada pelos correios. Antes de se tornar esposa de um fazendeiro viúvo, ela trocou cartas com ele e com seu casal de filhos. Ela falou para eles do seu gato e do oceano, e as crianças escreveram perguntando se ela sabia fazer tranças e cantar. Quando chegou a hora de Sara fazer a viagem para o oeste para fazer parte de uma família que ela ainda não conhecia, ela escreveu o seguinte: Querido Jacó, Estarei chegando de trem. Vou usar um chapéu amarelo. Sou simples e alta. Sara1 Você consegue imaginar a ansiedade deles enquanto iam ao encontro do trem no dia em que Sara chegou? O que estaria passando pela cabeça deles? As quatro pessoas envolvidas nesse drama tinham pouca idéia do que esperar. O texto bíblico desta lição, João 1:19–51, começa com o mesmo senso de incerteza e confusão. Alguma coisa grandiosa e maravilhosa estava acontecendo com as pessoas envolvidas nesses acontecimentos, mas não tinham certeza de como deveriam reagir a tudo aquilo. Jesus entrou num mundo que esperava ansiosamente por alguma 11 Patricia MacLachlan, Sarah, Plain and Tall [“Sarah, Simples e Alta”]. Nova York: Harper Trophy, 1985, p. 15. coisa; o único problema era que as pessoas não sabiam exatamente o que era essa coisa. Esta seção do Evangelho de João começa a nos mostrar através das perspectivas de testemunhas sofridas quem realmente era esse Jesus de Nazaré. O TESTEMUNHO DE JOÃO BATISTA (1:19–34) Na época em que Jesus veio a ser batizado no rio Jordão, João Batista já havia criado um considerável tumulto na Judéia. A poderosa pregação de que o reino de Deus estava próximo e a aparência rústica de João Batista, típicas de um profeta, comoveram as pessoas de Jerusalém e também da “Judéia e toda a circunvizinhança do Jordão” (Mateus 3:5). Talvez porque muitos esperavam que o Messias reunisse seus seguidores no deserto2 , o povo começou a especular sobre quem era realmente João Batista. Quando a agitação tornou-se grande o bastante, os judeus3 mandaram até João alguns sacerdotes e levitas de Jerusalém com o intuito de descobrir o que ele tinha a dizer sobre si mesmo (1:19). Tanto na sua pregação como nas conversas, João Batista parece ter sido um homem franco, não deixando dúvida sobre o que ele queria dizer. 12 Veja Atos 21:38. A expressão “os judeus” deve ser cuidadosamente definida quando se prega com base neste Evangelho. Obviamente, não é uma referência a toda uma raça, pois Jesus e Seus discípulos eram judeus também. Parece melhor definir “os judeus” como “os líderes judeus de Jerusalém”, aqueles que mais teriam a perder se algum profeta incitasse o povo a uma revolta. 13 1 Ele disse aos homens de Jerusalém: “Eu não sou o Cristo” (1:20). Além disso, declarou que não era Elias 4 nem o Profeta sobre o qual Moisés falara (1:21; veja Deuteronômio 18:15). Em suma, ele estava dizendo que ele não era Aquele pelo qual estavam esperando. Em vez disso, citando Isaías 40:3, ele se identificou como “a voz do que clama no deserto: Endireitai o caminho do Senhor” (1:23). Ele era simplesmente um mensageiro e precursor. Após João viria Aquele cujas sandálias ele não era digno de desatar. João Batista foi fiel à sua palavra e à sua missão. No dia seguinte, quando João viu Jesus vindo até ele, declarou: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (1:29). Embora o batismo de Jesus não esteja registrado neste Evangelho, João fez alusão a esse acontecimento quando revelou que vira o Espírito de Deus descendo do céu como pomba e pousando sobre Jesus (1:32). E confessou a seguir: “…tenho testificado que ele é o Filho de Deus” (1:34). Aos olhos de João Batista, Jesus não era um filho de Deus; Ele era o Filho de Deus. Ele não era um cordeiro de Deus, mas sim o Cordeiro de Deus. O TESTEMUNHO DE ANDRÉ (1:35–42) No dia seguinte, João indicou novamente para os seus discípulos que Jesus era “o Cordeiro de Deus” (1:36), então eles o deixaram e seguiram Jesus. Um deles, André 5 , começou a chamar Jesus de “Rabi” (1:38), mostrando que estava pronto para segui-lO numa relação aluno-professor. A razão para ele seguir Jesus, porém, era muito mais profunda do que simplesmente o fato de estar impressionado com a sabedoria de Jesus. Imediatamente, ele chamou seu irmão Simão Pedro, a quem disse: “Achamos o Messias” (1:41). Até essa altura do texto, Jesus já havia sido declarado como o Cordeiro de Deus, o Filho de Deus, um rabi e o Messias. 14 Veja Malaquias 4:5. Em Mateus 11:14, Jesus afirmou que João Batista era o Elias citado em Malaquias. Em João 1:21 João Batista não estava contradizendo o que Jesus havia dito sobre ele e, sim, rejeitando a idéia literal de que ele era o profeta Elias do Antigo Testamento, ressurreto dos mortos. 15 Nos Evangelhos André é descrito como um personagem silencioso; apesar disso, em todas as três ocasiões em que ele aparece no Evangelho de João, ele está levando alguém até Jesus. Primeiro, levou Pedro (1:41, 42), depois, o menino com os pães e os peixes (6:8, 9) e finalmente os gregos (12:20–22). 2 O TESTEMUNHO DE FILIPE E NATANAEL (1:43–49) Jesus chamou Filipe com aquelas palavras que transformavam vidas: “Segue-me” (1:43). Filipe então encontrou Natanael e lhe disse que havia achado aquele que fora prometido por Moisés e os profetas; era Jesus de Nazaré, filho de José (1:45). A resposta de Natanael foi menos entusiasta, ao dizer cinicamente: “De Nazaré pode sair alguma coisa boa?” (1:46). Embora não tivesse se impressionado, Natanael foi com Filipe ver Jesus. Ao aproximar-se de Jesus, Este lhe disse: “Eis um verdadeiro israelita, em quem não há dolo!” (1:47). Natanael imaginou como Jesus o conhecia e perguntou isto a Ele. A resposta de Jesus foi um golpe no coração de Natanael: “Antes de Filipe te chamar, eu te vi, quando estavas debaixo da figueira” (1:48). Talvez Natanael estivesse meditando ou orando debaixo da figueira, e as palavras de Jesus insinuavam que Ele conhecia os pensamentos íntimos do coração de Natanael. Qualquer que seja a razão de sua mudança, Natanael rapidamente foi transformado de um cínico endurecido para um discípulo entusiasta, proferindo a confissão mais radical de todas: “Mestre, tu és o Filho de Deus, tu és o Rei de Israel!” (1:49). Em todos esses primeiros encontros entre Jesus e as testemunhas oculares, as pessoas pareciam tentar encontrar palavras para descrever sua crença naquele homem. Era como se estivessem tentando colorir um quadro de um belo pôr-do-sol com apenas cinco gizes de cera (“Cordeiro”, “Filho de Deus”, “Rabi”, “Messias” e “Rei”). Nenhum desses termos fazia jus ao brilhantismo do que viam! A confissão mais importante ainda estava por ser dita, pois Jesus declarou mais tarde quem Ele era com Suas próprias palavras (4:26). O TESTEMUNHO DE JESUS (1:50, 51) Jesus pareceu um tanto admirado com a resposta efusiva de Natanael a uma questão tão mínima como a de saber que Jesus o vira debaixo da figueira, antes de Filipe chamá-lo. Jesus informou-lhe que mais tarde ele veria sinais muito mais impressionantes do que aquele: “Em verdade, em verdade vos digo que vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem” (1:51). O céu, disse Jesus, seria aberto. A construção grega (particípio perfeito) indica que o céu seria aberto e permaneceria aberto. Ele ficaria aberto. Jesus, de Nazaré, estava declarando que Ele mudaria a relação entre o céu e a terra para sempre! Ele não estava prometendo a Natanael uma olhada no céu, mas estava dizendo que a glória do céu estava sendo revelada para sempre na pessoa dEle. Por isso Jesus referiu-Se a Si mesmo como “o Filho do Homem”, Sua auto-descrição favorita nos Evangelhos. Essa expressão interessante tem um rico histórico no Antigo Testamento. Parece que Jesus a usou primeiramente porque fazia parte da linguagem profética que ainda não caíra em desuso naquele tempo. “Messias” e “Rei de Israel” tinham conotações militares que Ele não quis aplicar a Si mesmo, e todas as demais designações só eram descrições parciais de quem e o que Jesus de Nazaré veio a ser. Sendo assim, Jesus chamou-Se a Si mesmo de “Filho do Homem”. Essa expressão apontava para Sua divindade e Sua humanidade ao mesmo tempo. Ela permitia que Jesus expressasse a idéia de que Ele era Aquele de quem os profetas falaram, ao mesmo tempo em que deixava espaço para Jesus identificar-Se utilizando Seus próprios termos. ❧ tenhamos bacharelado em Bíblia, veremos coisas maiores do que estas. Cada vez que olhamos novamente para Jesus de Nazaré, vemos o céu aberto. Um dos maiores perigos em qualquer relacionamento é uma das partes parar de aprender sobre a outra. Pensar que você conhece a outra pessoa “por dentro e por fora” é predispor-se a uma surpresa desagradável! A vida de qualquer relacionamento consiste em descobertas contínuas e mútuas. Pessoas que se conhecem desde a infância ou casais que estão juntos há mais de cinqüenta anos ainda têm muito a aprender um do outro. Você se sente assim em relação a Jesus? O texto bíblico que estudamos nos faz lembrar que a caixa de lápis de cera é pequena demais: as categorias pelas quais definimos Jesus sempre serão insuficientes. Ciente disto, você continuará permitindo que Ele o surpreenda? Você continuará lendo sobre Ele, sabendo que Ele às vezes repreende você e desafia suas suposições confortáveis? Você continuará deixando Jesus definir-Se a Si mesmo através de Seus atos e palavras, em vez de insistir que Ele Se encaixe na imagem que você acha que Ele deve ter? Em qualquer fase da vida que você esteja hoje, se CONCLUSÃO você continuar buscando Jesus neste Evangelho, Pelo fato de estarmos no começo do Evange“maiores coisas do que estas verá”. lho de João, as palavras “maiores coisas do que Quando Jesus chamou Filipe, Ele simplesmente estas verás” (1:50) aplicam-se também a nós. disse: “Segue-me”. Naquela altura da vida de Ainda que conheçamos Jesus há anos, veremos Filipe, havia muita coisa que ele não entendia e coisas maiores do que estas. Ainda que tenhamos pouca que ele entendia a respeito da vida de Jesus. ido a aulas bíblicas desde os seis anos de idade, Apesar disso, ele seguiu — e, fazendo isto, veremos coisas maiores do que estas. Ainda que gradativamente ele foi vendo quem era Jesus. Se quisermos entender Jesus, devemos estar Ver Algo Novo dispostos a segui-lO; Poucos anos atrás, eu era membro de uma congregação em que lemos pois fazendo isto O ena Bíblia toda juntos, usando um programa especial de leitura. Cada semana tenderemos. líamos cerca de vinte e oito páginas de texto e cada domingo à noite eu pregava com base em uma porção da leitura daquela semana. Foi uma boa experiência para todos nós, pois isso encorajou cada membro, semana após João 3:16 semana, a praticar a disciplina da leitura diária da Bíblia. Sempre que me O fato: “Porque Deus recordo dessa experiência, lembro-me de um homem em particular, um examou ao mundo de tal presbítero da congregação, um velho cristão fiel que sempre me contava maneira”. alguma coisa que ele havia observado em sua leitura daquela semana e que O ato: “Que deu o não notara antes. Ele havia lido a Bíblia de capa à capa muitas vezes, mas seu Filho unigênito”. ainda admitia que tinha muito que aprender. Sempre vou me lembrar e O pacto: “Para que estimar o som de entusiasmo de sua voz ao dizer: “Nunca vi isso antes!” O todo o que nele crê não espírito desse irmão está muito longe da atitude daqueles que se recusam pereça, mas tenha a a estudar a Bíblia e resistem aos estudos textuais nas salas de aula da escola bíblica, dizendo: “Já sabemos tudo isso. Vamos falar só da aplicação!” vida eterna”. ©Copyright 2004, 2006 by A Verdade para Hoje TODOS OS DIREITOS RESERVADOS 3