Cerrado na formação territorial brasileira
Helio de Araujo Evangelista
(Departamento de Geografia / UFF- [email protected])
Resumo
A formação territorial brasileira apresenta nuances pouco conhecidas. O grande desafio,
no entanto, não está na obtenção de mais dados propriamente, mas, fundamentalmente,
na forma que se constrói o olhar sobre este processo de formação. É partir de uma dada
cognição, de uma forma de elencar fatores, de traçar relações a princípio inimagináveis
que ensejará uma produção geográfica que ajude a compreender este enigma chamado
Brasil, um enigma que comportou a unidade de um componente territorial gigantesco.
Um território que passou por momentos decisivos tais como colônia, independência,
república e nesta várias fases sem assistir uma cissão ou perda territorial. Segue abaixo
um exercício de como abordar a formação territorial brasileira.
Palavras-chave: cerrado, formação territorial, viajantes, Brasil.
Abstract
The brazilian territorial development has aspects low known . But, the big task isn’t to
discover new aspects about it, it’s more important to look for the way this development
was studied by researchers, so through the way a knowledge is built it`s possible to give
more importance for one or another aspects. Brazil is like a mistery, it`s difficult to
understand this country, one of the reason is the way it faced difficulties moments
without lose its integrity, for example. This article aims to show how to understand the
Brazilian territorial development.
Key-words – cerrado, territorial development, researches, Brazil
Introdução
O Cerrado localiza-se basicamente no Planalto Central do Brasil e vem a ser a segunda
maior formação vegetal brasileira, só perdendo para a Amazônia. Representa 22% do
território brasileiro e abrange os seguintes estados da federação: Mato Grosso, Mato
Grosso do Sul, Maranhão, Piauí, Bahia, Minas Gerais, Rondônia, Goiás, Tocantins São
Paulo e Distrito Federal
Assim, a consideração da formação territorial desta vasta área, com
diferenciações internas tão acentuadas, nos cria um desafio de como considerá-la. Numa
perspectiva didática, procurando destacar os grandes momentos do processo de inserção
do Cerrado no território brasileiro, entendemos que a região apresenta duas grandes
lógicas em seu processo de formação territorial. Na primeira importa a ocupação do
interior, via monções, aproveitando a bacia hidrográfica do Rio Paraná, uma lógica que
caracterizaríamos como dominadora do que aqui chamamos o grande Mato Grosso; a
segunda, via Oceano Atlântico, alcançando a orla da região dos atuais estados do
Maranhão e do Piauí, aqui designado como o grande Maranhão.
Grande Mato Grosso
Por Grande Mato Grosso consideramos aqui uma vasta área que atinge não só os atuais
estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, mas também, Goiás. Ou seja, estamos
tratando de uma área cujo êmulo foi a busca por minerais.
Começa ao início do século XVIII, com a sucessiva escalada em direção a
Cuiabá e adjacências. O que é curioso neste processo de formação territorial destas
paragens brasileiras é a similitude de situação entre o que a área representava naquela
época com o que representa agora, século XXI, ou seja, tanto num caso quanto noutro a
região é nitidamente área de fronteira.
No século XVIII, com a sua ocupação, Portugal definitivamente rompeu o então
limites pré-indicados pelo Tratado de Tordesilhas. A partir do que foi realizado em fato
pela ocupação e pelo que foi reconhecido juridicamente pelos sucessivos tratados de
limites do século XVIII podemos interpretar que sucessivamente ao longo da história
brasileira esta grande região do Mato Grosso foi palco de sucessivos esforços para de
fato configurar um país além do que seria inicialmente indicado por Tordesilhas.
Origem:
As expedições que tiveram sucesso nas chamadas minas gerais em muito estimularam o
avanço por novas veredas. Assim, nossa área em destaque veio a ser sistematicamente
ocupada a partir do início do século XVIII. E é desta época que temos em 1º de janeiro
de 1727 a transformação de um arraial garimpeiro na primeira vila da região, a vila de
Cuiabá.
Esta fase pioneira foi marcada por constantes ataques indígenas aos que
tentavam encontrar fortuna na área. O livro de Sérgio Buarque de Hollanda ( 1976 )
chega a tratar desta face que só veio a conhecer melhor sorte quando a Coroa
Portuguesa decidiu construir um forte, o forte de Coimbra. Este foi construído pelo
então capitão-general de Mato Grosso, Sr. Luís de Albuquerque de Melo Pereira e
Cáceres; este expediente em muito dificultou a atuação dos índios, particularmente os
paiaguás, que ao saquear refugiam para domínios espanhóis para lá, em Assunção,
negociar as mercadorias apreendidas.
Esta situação conflituoso perdurou até o final do século XVIII, quando então,
estando não mais a área objeto de maiores explorações de minerais, passou a se destacar
a pecuária. A partir de então a região conhecerá a fase dos longos ciclos de tempo. A
vida corre mais lenta; os dias são mais semelhantes; vigoraria a rotina da agricultura da
subsistência, o recurso de extração de recursos para alimentação, particularmente a
pescaria; vão criar a noção de uma paisagem que não se altera.
Ledo engano!
Embora com um ritmo lento, a sua ocupação, mesmo que esparsa, é que configurará o
novo mapa do Brasil. Ou seja, é a grande região do Mato Grosso com todo o seu grau
de acesso à região amazônica, é que dará condições estratégicas e logísticas para que a
Coroa e mais tarde o Império brasileiro requeira o reconhecimento de que o Brasil seria
muito mais que a princípio indicaria o Tratado de Tordesilhas.
Mato Grosso mostrou-se uma região de baixa ocupação mas sumamente
estratégica. Desde cedo, até os dias de hoje, Mato Grosso se constitui em fronteira e
garantia de acessar novas áreas em favor do Brasil.
Como sinal desta situação temos sucessivas excursões pioneiras na região que
serviram para desbravar aqueles rincões.
Expedições
Duarte da Ponte Ribeiro1 nos seus esforços no século XIX em delinear um processo
negociador na demarcação das fronteiras brasileiras com seus vizinhos sul-americanos,
processo este que muito sabiamente Barão do Rio Branco soube utilizar mais tarde,
reconheceu o caráter estratégico que havia na grande região do Mato Grosso; havendo
não só necessidade de fortificar as fronteiras como também melhor conhecer o
território.
Neste esforço de reconhecimento temos a atuação da Sociedade de Geografia do
Rio de Janeiro ao final do referido século que promove uma grande excursão na região.2
Na época, ocorriam convites a sucessivos viajantes que tendo percorrido o
interior do Brasil relatassem as suas impressões. Neste aspecto, chama especial relevo
as discussões que existiam, à época, de se comunicar a região de Mato Grosso com o
Pará, no intuito de se quebrar o isolamento daquela região, que costumava ser acessada
através da Bacia do Prata . 3
A expedição dos militares
Já na sessão extraordinária de 2 de março de 1888, sobre a presidência do
Visconde do Paranaguá e presença do Sr. Conde d’Eu e do Ministro da Guerra, consta
na Revista da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, tomo V, 3º boletim, ano de
1889, p. 194:
1
Veja artigo de nossa autoria em www.feth.ggf.br/Duarte.htm
2
Veja artigo de nossa autoria em www.feth.ggf.br/Socgeorio.htm
3
Cabe frisar que as seqüelas da Guerra Paraguai ( 1865-1870 ) ainda encontravam-se vivas nas memórias dos
políticos. Deste modo, procurava-se evitar o uso da Bacia do Prata como meio de acesso ao Mato Grosso e
adjacências.
Do Sr. Coronel Pêgo Junior, como effectivos, os Srs. capitão Antonio Lourenço
Telles Pires, Drs. 1º tenente Augusto Ximenes Villeroy, 2º tenente Oscar de
Oliveira Miranda e 1º tenente José Carlos da Silva Telles.
Annunciando-se a chegada de sua Alteza o Sr. Conde d’Eu, que é recebido com as
devidas formalidades, obtida a venia, o Sr. Presidente abre a sessão, dizendo que
vai apresentar á sociedade os distinctos conferentes que pretendem, sob a
responsabilidade desta associação, fazer uma viagem de exploração em diversos
rios da província de Matto Grosso; que todas comprehendem bem a importancia
desta commissão, pela honra que resulta para a sociedade que consta apenas cinco
annos da existencia, e tem sido para o paiz de grande utilidade
Não precisa declarar á Sociedade, que os distintos chefes de tão importante viagem
são dignos brasileiros que muito enobrecem a classe militar brasileira.
Consta que o Governo Imperial prestara todo o seu auxilio a esses novos, cujo fim é
tornar conhecida a geographia de nosso paiz .
Segue-se a conferência ...
E Fawcett não voltou
Uma das mais recentes expedições, tendo em conta o largo espectro histórico que
estamos a analisar, foi a do coronel britânico Percy Harrison Fawcett que junto a seu
filho veio a ser trucidado por indígenas conforme esclarecimento proporcionado pelo
jornalista Edmar Morel em sua obra – E Fawcett não voltou. 4
O trabalho do referido jornalista é pitoresco pois relata uma excursão por quem
era estimulado, nada mais, nada menos, pela Sociedade Britânica de Geografia. Fawcett
representava então, naqueles anos das décadas de 20 e 30 do século XX, uma das
últimas expressões daqueles pioneiros que na base da fé e coragem avançavam terra
adentro para reconhecer a região.
Grande Maranhão
4
MOREL, Edmar – E Fawcett não voltou. Rio de Janeiro: Seção de livros da Empresa Gráfica “O Cruzeiro” S. A . ,
1944.
Após as considerações relacionadas ao Mato Grosso, devemos agora destacar uma segunda
lógica que perpassa a ocupação do cerrado brasileiro, a saber: Maranhão, o grande Maranhão
não diz respeito somente a uma outra área, mas também a uma outra lógica no tempo e nos
interesses.
Enquanto no grande Mato Grosso a lógica de ocupação foi terrestre, ou seja, afeita a
uma ocupação visando a expansão das fronteiras no interior do país; a lógica do Maranhão está
muito mais afeita aos condicionantes marítimos da ocupação do território brasileiro. Ou seja,
Maranhão decorreu de uma busca de ocupação do território brasileiro via faixa litorânea.
Enquanto Mato Grosso esteve afeito à ocupação promovida pelos elementos endógenos
do país, pelos bandeirantes que em seguida foram seguidos pelos elementos da ordem da Corte
português; Maranhão está intrinsecamente ligado a um projeto de expansão imperial via
Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão.
O contexto do século XVIII
Durante o século XVIII ocorreram a construção arsenal de Marinha instalado no Rio de Janeiro
em 1763 ( ano de mudança da capital de Salvador para o Rio de Janeiro ) e outro em 1790, na
Bahia.5 Correlato a este período de expansão econômica em todo o território verificaram-se
profundas alterações na malha político-administrativa da colônia em termos territoriais, ou seja,
de pequenos povoados e núcleos gradativamente iriam sendo formadas novas capitanias para
além do litoral. Foi desta época, por exemplo, a criação da capitania de São Paulo e Minas do
Ouro ( 1709 ), capitania das Minas Gerais ( 1720 ), a criação da capitania do Pará ( 1737 ), em
1738 foi criada a capitania de Santa Catarina, dando assim configuração institucional à
transgressão aos limites do Tratado de Tordesilhas; em 1742 foi fundada o Porto dos Casais (
Porto Alegre do Rio Grande do Sul ); em 1748 foram criadas as capitanias de Mato Grosso e de
5
Esta época correspondeu a ascensão do Rio de Janeiro sobre Salvador crescendo em opulência e riqueza.
Goiás, e, em 1799, Pernambuco perdeu tanto a Paraíba que se viu emancipada, já que em 1753
tinha sido incorporada a Pernambuco, quanto o Ceará . Em 1772, Maranhão e Piauí se
separaram do Pará. Sobre este capítulo da vida política-administrativa consulte Albuquerque (
1980 )6
A separação do Maranhão tem uma imediata relação com o papel desempenhado pela
restabelecida Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão que beneficiou,
sobretudo, Maranhão com créditos, ferramentas e, principalmente, africanos. Tais iniciativas
facilitariam o incremento do cultivo do algodão que em 1760 foi realizada a primeira remessa
brasileira do produto para o exterior, um rápido crescimento para uma área que só em 1749 veio
a adotar moeda provincial em substituição aos grãos de cacau como meio circulante ( Holanda,
1985, p. 42 ) .
Cabe assinalar que esta proliferação de novas unidades territoriais correspondeu a
expressão de uma lógica de controle da colônia, na qual a centralização administrativa veio
acompanhada por desmembramentos das unidades de controle do território ( exatamente uma
forma para facilitar a centralização )
Portugal, por sua vez, passava por fortes crises sócio-econômicas ( agravadas pelo
terremoto em Lisboa que chegou a matar 60.000 pessoas ), porém, chegou a crescer, por um
breve período, durante a administração de Marquês de Pombal, caracterizado pelo afastamento
da Inglaterra. 7
6
Neste período, meado do século XVIII, temos a constituição da Comissão de Limites chefiada por Francisco Xavier
de Mendonça Furtado, irmão de Marquês de Pombal e também comandante da Grão-Pará e Maranhão a partir de 5
de junho de 1751 ( Holanda, 1989, p. 267 )
7
Foi adotado, neste período, um protecionismo alfandegário para proteger as manufaturas locais, apoiaram ainda a
Cia. de Comércio, o refino de açúcar e a abolição dos escravos para aumentar o consumo. Correlato a uma clara
política anti-eclesial à ordem dos jesuítas, em sua administração o próprio chegou a veicular um folheto sobre o –
Império Jesuíta – no Paraguai, portanto, colônia da Espanha, no intuito de indispor o rei espanhol, Fernando VI,
frente aos religiosos ( in Araújo, 1992, pp. 376-377 ). Pombal, por sua vez, contava no Rio de Janeiro com quem
nutria particular aversão aos jesuítas, particularmente Gomes Freire; a rigor, a situação de animosidade frente a
estes religiosos só cresceu o que despertou sucessivas medidas de hostilidade até culminar com a assinatura de uma
lei, em 3 de setembro de 1759, que expulsava os jesuítas de Portugal e colônias que ainda lhes restavam ( Brasil,
Angola, etc. ) ( Araujo, ibidem, pp. 421-424 ) Em 1764 os jesuítas foram expulsos da França, ( ibidem, p. 449 ) e
em 23/7/1773 o Papa Clemente XIV diante da pressão da França, Portugal e Espanha que teria atingido
Cabe considerar que esta época de Marquês de Pombal coincidiu com uma mudança no
mercado mundial de produtos tropicais, segundo a qual a guerra pela independência nos
Estados Unidos combinada pela revolução industrial inglesa geraram, simultaneamente, uma
menor oferta de produtos tropicais com maior demanda por estes mesmos produtos; assim,
ocorreu no Brasil, destacadamente no Maranhão e Pará, um acréscimo na busca por mão-deobra escrava para melhor otimizar a produção; neste período, final da época colonial,
Maranhão que recebia um a dois navios por ano passou a receber de 100 a 150 ! Um apogeu
que contrastava com a situação do resto da colônia brasileira ( Furtado, 1991, p. 90-91 ). 8
Durante a administração de Marquês de Pombal a frente do governo português,
importantes medidas foram tomadas em relação ao Brasil, das quais destacam-se a instalação da
capitania de Mato Grosso, a criação das capitanias fronteiriças de São José do Rio Negro e Rio
Grande de São Pedro, além da capitania de Piauí. A capital da colônia foi transferida de
Salvador para o Rio de Janeiro ( Enciclopédia Larousse Cultural, vol. 19, pp. 4694-4695 ).
particularmente seu antecessor ( Clemente XIII ) extinguiu a ordem dos jesuítas e durante quarenta e um anos esta
ordem ficou clandestina !
“O advento de Pombal trouxe a todos os campos do pensamento o predomínio do Estado: na cultura e na política. O
ensino passou a servir à supremacia do direito civil sobre o canônico. A escolástica foi oficial e explicitamente
banida do reino por solene decreto. Tanto em relação à Santa Sé quanto às próprias autoridades internas da Igreja,
passou o Estado a usar de uma política fundamentalmente controladora. A Mesa da Consciência e Ordens, a Real
Mesa Censório e outros organismos representaram poderosas armas de uma crescente laicização que não cessou,
apenas mitigou-se com a queda do pombalismo.” ( Holanda, 1985, p. 74 )
8
Neste época, a ação dos religiosos, particularmente dos jesuítas na luta contra o aprisionamento desta mão de obra
despertava sérias divergências com os colonos locais. E os conflitos eram cada vez mais intensos porque os
indígenas, segundo Holanda ( 1989, p. 269 ), representavam para a Amazônia “... a força material e a inteligência
pragmática para a vida local.”
Em 3 de julho de 1759 após complexas pendências, sob direto influxo de Marquês de Pombal, a Sociedade dos
Jesuítas foi extinta nos reinos de Portugal, tendo sido expulso mais de 500 religiosos; mais tarde, em 1764 o
mesmo ocorreu na França e, em 1767, na Espanha; poucos anos mais tarde, pela Bula de 21 de julho de 1773 a
próprio Companhia viria a ser abolida em toda Cristandade, porém, restabelecida em 1814, no Brasil o
restabelecimento ocorreu em 1841 ( Enciclopédia Larousse Cultural, vol. 7, pp. 1521-1522, 1972.
E como prova da importância do Brasil, o Marquês de Pombal elevou o Brasil à
categoria de Vice-Reinado, em 1763, e passou a ser governado por vice-reis com amplos
poderes.9
Conclusão
Ao término do século XVIII, nós temos a fermentação de um movimento político
voltado para os interesses internos da colônia ( como que numa espécie de nativismo, como nos
lembra Andrade ( 1997 ) ) a ponto de estar mais próxima, que no início do século, de uma
ruptura com Portugal. 10
De modo primoroso, Furtado ( 1992, p. 90 ) assim sumariza a economia espacial da
época:
Observando em conjunto, a economia brasileira se apresentava
com uma constelação de sistemas em que alguns se articulavam
entre si e outros permaneciam praticamente isolados. As
articulações se operavam em torno de dois pólos principais: as
economias do açúcar e do ouro. Articulado ao núcleo açucareiro,
se bem que de forma cada vez mais frouxa, estava a pecuária
nordestina. Articulado ao núcleo mineiro estava o hinterland
pecuário sulino, que se estendia de São Paulo ao Rio Grande.
Esses dois sistemas, por seu lado, ligavam-se frouxamente através
9
Ao contrário do ocorria no Brasil, onde se procurava uma menor dispersão da estrutura de gerência do território, na
colônia espanhola já se reconhecia processos de diversificação administrativa que se mostrariam poderosos fatores
na fragmentação da mesma em diferentes países após a sua independência.
Cabe destacar, como lembra Araújo ( 1992, p. 457-466 ), que a esta época a América espanhola estava dividida em
três vice-reinados: o do México ( ou Nueva España ), o do Peru ( tendo se destacado de Granada em 1718 ) e o do
Rio de la Plata ( que abrangia Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia, além de Rio Grande e Santa Catarina que
deveriam ser reconquistados ). Na tentativa de se conquistar o sul do Brasil em favor dos espanhóis após a criação
do vice-reinado do Rio de la Plata, em 1777 Cevallos deparou-se com 146 canhões distribuídos em fortificações
costeiras de Santa Catarina, mas obteve sucesso em sua empreitada; no entanto, naquele mesmo ano, rei José I de
Portugal faleceu e caiu em desgraça Marquês de Pombal, subindo ao trono a sobrinha de Carlos III da Espanha,
Maria I; o resultado desta mudança foi a manutenção da Colônia do Sacramento para Espanha mas Rio Grande e
Santa Catarina foram devolvidos para Portugal.
10
Neste período, ocorreram, simultaneamente, uma queda da produção do ouro e uma queda dos preços da cana-deaçúcar e uma notória expansão demográfica, gerando, provavelmente, o nível de renda mais baixo já conhecido no
Brasil durante sua fase colonial, Furtado ( 1992, pp. 89-90 ). Maiores informações sobre este período cabe a
consulta da obra de Fernando NOVAIS - Portugal e Brasil na crise do Antigo Sistema Colonial ( 1777 - 1808 ) .
São Paulo: Ed. Hucitec, 1979.
do rio São Francisco, cuja pecuária se beneficiava da meiadistância a que se encontrava entre o Nordeste e o centro-sul para
dirigir-se ao mercado que ocasionalmente apresentasse maiores
vantagens. No norte estavam os dois centros autônomos do
Maranhão e do Pará. Este último vivia exclusivamente da
economia extrativa florestal organizada pelos jesuítas com base na
exploração de mão-de-obra indígena. O sistema jesuítico, cuja
produtividade aparentemente chegou a ser elevada mas sobre o
qual não se dispõe de muitas informações - a Ordem não pagava
impostos nem publicava estatísticas – entrou em decadência com
a perseguição que sofreu na época de Pombal. O Maranhão, se
bem constituísse um sistema autônomo, articulava-se com a
região açucareira através da periferia pecuária. Desta forma,
apenas o Pará existia como um núcleo totalmente isolado. Os três
principais centros econômicos – a faixa açucareira, a região
mineira e o Maranhão – se interligavam, se bem que de maneira
fluida e imprecisa, através do extenso hinterland pecuário.
Dos três sistemas principais o único que conhecia uma efetiva
prosperidade no último quartel do século foi o Maranhão ...
Adentramos o séc. XIX de corpo territorial quase inteiro, com as fronteiras externas e
internas
11
bem
próximas
aos
que
elas
assumem
nos
dias
atuais.11
Em Abreu ( 1998, pp. 261-263; 267-276 ), temos uma aprofundada análise dos termos que regeram a questão dos
limites em diferentes momentos históricos; na mesma obra, nas págs. 265-266, nós temos a expansão como um
todo, e, por fim, nas págs. 267-268 o tratamento da delicada questão sobre a Colônia do Sacramento.
Fonte de consulta
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