SALAS ANEXAS DE ENSINO MÉDIO EM CUIABÁ
COSTA NETO, Aristides J. - PUC/SP – Bolsista Capes – [email protected]
RESUMO
Esta comunicação é um pequeno relato feito a partir da análise dos dados de uma
pesquisa etnográfica sobre o ensino médio que funciona na Escola Municipal Antônia
Tita Maciel de Campos em Cuiabá. Essa agência pública recebe a incumbência dos
Poderes Municipal e Estadual – por meio de convênio assinado anualmente - de atender
aos jovens e adultos trabalhadores estudantes secundaristas do período noturno. Mas o
ensino médio dali não tem reconhecimento do Conselho Estadual de Educação, é
caracterizado por este como “salas anexas”. Os problemas de infra-estrutura
(laboratórios, etc.), estruturação administrativa (falta de equipe técnico-administrativa, a
instabilidade dos professores temporários etc.) e pedagógica se acumulam, o que faz
pensar no selo de uma aliança perversa. Falta um calendário escolar com o cumprimento
de uma carga horária escolar mínima prevista por lei, a construção de projeto
pedagógico compatível com as necessidades dos jovens e adolescentes trabalhadores,
condições para prática de ensino que gerem o interesse dos alunos e evite o
esvaziamento das salas de aula.
Palavras-chave: Escola Pública – Mato Grosso - Salas Anexas.
A escola Antônia Tita Maciel de Campos (a partir de agora ATMC) é uma agência que
protagoniza uma ação política em favor dos estudantes secundaristas do bairro Jardim
Florianópolis, na região norte de Cuiabá, “marcados” com a identidade biossocial e
econômica: adolescentes/jovens/adultos trabalhadores. Na parceria com o Estado, o
Poder Municipal cede os recursos e ambientes dessa escola para o funcionamento de
“salas anexas” das escolas estaduais.
A justificativa para a oferta do ensino médio noturno na ATMC – dada pelos
profissionais da escola - é a de que esse “lugar” (loci) está relacionado com a “maior
permanência” dos estudantes na escola. O problema é que o sistema educacional, pela
normativa do CEE-MT, impõe ao Estado a obrigatoriedade de construir uma nova escola
por causa da quantidade de matrículas efetuadas no bairro. Não obstante isso, o ensino
(médio) continua sendo ofertado, ano após ano, de modo irregular e com caráter
provisório, acumulando toda espécie de problemas infra-estruturais e organizacionais.
A equipe gestora como os assessores do executivo sabem que a documentação
da escola não avança – e nem pode avançar - porque as exigências do Conselho
Estadual de Educação são claras, os 224 (duzentos e vinte e quatro) alunos matriculados
na ATMC já deveriam ter sido conduzidos para uma nova escola estadual nessa região
norte da cidade.
Mais do que empecilhos legais, são muitos os problemas estruturais que
necessitariam ser resolvidos para que a ATMC pudesse ser habilitada para ofertar o nível
de ensino médio. Problemas que se acumularam principalmente nos quesitos infraestrutura (laboratórios, etc.) e estruturação administrativa (falta de equipe técnicoadministrativa, a instabilidade dos professores temporários etc.).
Os fatos demonstram uma estruturação pedagógica precária da escola,
dependente de recursos físicos e mobiliários tanto quanto de uma organização e
administração do tempo e do espaço escolar.
Na ATMC há dificuldades para constituir um calendário escolar factível mesmo
nos parâmetros da seriação com suas fragmentações. Em 2007 a grande carência de
recursos didático-pedagógicos – entre os quais, livros - acarretaram conseqüências
muito negativas para o trabalho dos profissionais e a aprendizagem dos alunos devido
ao dispêndio de tempo dos professores em transcrição de textos a serem copiados.
Contudo, o problema crucial que se evidenciou na escola está longe de ser uma
exceção. Trata-se do mesmo problema enfrentado pela educação e o ensino médio de
Mato Grosso; lembrados, vagamente, por um professor de história que reconheceu na
sua prática as dificuldades estruturais para o trabalho de construção de projetos
pedagógicos específicos e voltados para um público caracterizado pela sua vivência do
trabalho.
Prof. Amazonino é o único que possuía um vínculo efetivo com o Estado na
cadeira de História e demonstrou um esforço de engajamento profissional e político
além de comportamento irrequieto e descontente em relação aos títulos de livros
disponibilizados pelo PNLEM/FNDE.
Amazonino julgava a importância o conteúdo da história regional e local para a
prática do ensino dos professores de história. Por isso se interessou por discussões sobre
esse assunto, buscou informações acerca de subsídios de fácil acesso para alunos e
professores. Aldo reclamou a falta de investimentos na própria formação, a falta de
oportunidade para discutir e analisar as perspectivas sobre o ensino da História.
A Secretaria de Educação promoveu alguns eventos de formação profissional,
mas com gerenciamento falho: não fazendo divulgação ampla para as escolas e/ou não
garantindo a inscrição para todos os professores da rede. Necessário dizer que o sistema
educacional estadual é descuidado para designar a ação política (do estado) sem
nenhuma obstinação.
Não é objetivo desenvolver neste relato uma compreensão do contexto mais
amplo em que se delineiam as ações do Poder Municipal e Estadual. A intenção é
evidenciar melhor a relação entre os diagramas que orientam a ação dos diversos
agentes que se encontram na ATMC.
O conceito “Diagrama”, aqui, indica as ações estratégicas ou minimamente
planejadas em oposição às ações meramente impulsivas ou espontâneas das pessoas.
Ensaio, apoiado neste conceito, um desenho teórico do diagrama real ou efetivo que se
desdobra desde o interior da ATMC, que por ser um estabelecimento educacional de
caráter público, é necessariamente complexo.
A sala de aula do ensino médio na ATMC, ainda que “anexa” e separada do
organismo que lhe atribui legitimidade, é um estrato da máquina pública sob influência
e responsabilidade do poder instituído em âmbito de Estado, in concreto. Esse é o
entendimento implícito dos educadores sobre a realidade social da sala de aula com suas
dimensões finitas, sua complexidade e entropia em um plano que não tem consistência
apenas em si mesmo.
O problema “crucial” enfrentado pela escola relativo às “dificuldades estruturais
que dificultam a construção de projetos pedagógicos específicos” só aparece e pode ser
desenhado por causa da crise gerada pela ineficiência da ação dos “professores”, que
tem um incômodo papel de cúmplices (co-responsáveis) do sistema e, pelo seu
comprometimento, também se torna um refém (como uma garantia) no sistema.
Aqui, numa “transferência” sutil, a ambigüidade dos agentes é metaforicamente
projetada sobre a subjetividade do “professor”, este encarnando ex officio as instituições
ou o horizonte em que essas se estabelecem num imaginário do destino dele, posto
“entre a cruz e a espada”.
Mutatis mutandis, os “professores” (os mestres e mestras de ensino) são aquelas
pessoas na linha de frente para enfrentar as dificuldades postas pela educação popular
(pública) e sem o apoio substantivo do sistema educacional. Por dever de ofício são
colocados diante da tarefa ou “obrigação” de desenvolver um plano de ensino, escolher
recursos didáticos para a o trabalho com os alunos mesmo quando não amparado por
uma proposta construída no âmbito dos estabelecimentos escolares, do município e do
Estado.
O “desamparo” dos profissionais da educação pública e popular atuantes no
âmbito da ATMC não é uma exceção. Por isso, esse estabelecimento escolar - e a
“máquina” política que o envolve - pode ser visto em platôs (planos) de um mesmo
horizonte, como a urdidura ou trama em um “pano de fundo” diagramático sobre o qual
se “enquadram” ou se inserem os acontecimentos da sala de aula.
No início de 1995 os profissionais da educação do Estado de Mato Grosso já
haviam se engajado em uma discussão para construir as diretrizes da educação matogrossense, num movimento de democratização atento aos multifacetados aspectos
natural – com três ecossistemas - e sócio-cultural.
O livro organizado por Acácia Kuenzer, Intitulado “Ensino Médio: Construindo
uma proposta para os que vivem do trabalho”, foi inspirado nos seminários regionais
constituídos por todo o Estado.1
Este processo iniciou-se em 1995, com a realização de seminários por todas
as regiões do Estado de Mato Grosso, para definir os rumos do Ensino
Médio, cujos resultados foram apresentados e discutidos por todo o Estado.
1
Kuenzer foi contratada pelo governo do Estado como consultora. Ver: KUENZER (org). Ensino Médio:
Construindo uma proposta para os que vivem do trabalho. São Paulo: Cortez, 2000. p.38.
Neste documento já se explicitava a necessidade de ultrapassar o discurso
meramente formal acerca da unidade entre educação para a cidadania e para o
trabalho, que tem obrigado todo tipo de proposta, e mais particularmente as
de fundo propedêutico, sob a alegação de que qualquer educação é educação
para o trabalho. (KUENZER, 2000, p. 12)
Os professores, especialistas e técnicos da rede estadual se reuniram desde o
início de 1995 para construir coletivamente uma proposta para o Ensino Médio, ou, pelo
menos, alguns “princípios orientadores da ação das escolas na construção de seu projeto
político-pedagógico, a partir das demandas de sua principal clientela: os que vivem do
trabalho”, como diz Kuenzer (KUENZER, 2000, p. 11).
O livro seria apenas um subsídio para o debate na primeira Conferência Estadual
de Educação em 2006, por isso, na segunda parte sobre os diversos componentes
curriculares os autores compilam os temas que os escritores (paranaenses) escolheram
para estimular a construção de uma nova ordenação do ensino médio, na tentativa de
traduzir para Mato Grosso algo das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio
– DCNEM – publicados em 1998 pela Resolução 03 do Conselho Nacional de
Educação/CNE.
Para fazê-lo, foram chamados pesquisadores com tradição em Ensino Médio,
entre eles a organizadora deste livro, que constituiu a equipe multidisciplinar
responsável pela continuidade do trabalho formada por professores da UFPR e
CEFET/PR que já vinham desenvolvendo pesquisas com trabalhadores e
desempregados. (KUENZER, 2000, p. 14)
A discussão sobre o ensino da história no ensino médio, por exemplo, girou em
torno de uma “ruptura com o ensino tradicional de história”, caracterizado como
“despolitizado e intelectualizado”.
Numa perspectiva historiográfica, o ensino tradicional de História é herdeiro
do século XIX. Assim, caracteriza-se por reproduzir uma visão factual,
desarticulada e fragmentada do social, em que caberia à História apenas o
estudo do passado por meio de um conhecimento despolitizado e
intelectualizado, do qual o professor participa como transmissor e
vulgarizador, e o educando como mero receptor passivo. Essa perspectiva é
ainda muito real em nossos dias. (KUENZER, 2000, p. 204. Itálico meu)
Para o ensino de história é apresentado como desafio o estímulo à “participação
consciente e ativa na realidade”.
(...) o de oferecer, a professores e alunos, condições para uma prática de
ensino que possibilite a aquisição de elementos fundamentais para uma visão
crítica da realidade em que vivem. A perspectiva de uma visão crítica não
exclui, pela sua própria natureza, a necessidade de que a educação histórica
instrumentalize para uma participação consciente e ativa na realidade local,
nacional e mundial (...) (KUENZER, 2000, p. 203. Itálico meu)
A postura governamental adotada entre os anos de 1995 a 1998 teve muitas
conseqüências positivas para a educação em Mato Grosso além da realização da
primeira Conferência Estadual de Educação em novembro de 1996.
Na primeira conferência houve uma convocação ampla para a participação dos
profissionais da educação. Foram mais de 10 mil participantes e 490 emendas, somando
o trabalho de base em 90 dos 119 municípios mato-grossenses.
Em 1996 a idéia do Sistema Único de Ensino se apresentou como uma
“possibilidade real de se reorganizar o sistema educacional público, eliminando a
divisão entre a rede estadual e as municipais por meio de uma gestão única e cooperada
entre estado, municípios e as comunidades escolares” (CARDOSO NETO, 2004, p. 64).2
Entre o que se pode apontar como uma nova característica da gestão
democrática está a proposição da fundação pública, na esteira da proposição
do Sistema Único de Ensino. (...) Essa fundação deveria gerir todos os
recursos da educação em nível de estado e de municípios. O novo desenho da
política pública e de oferta pública rompe com a prática concorrencial entre
estado e municípios: o estado, proprietário de uma rede e de um corpo
funcional, e os municípios, que são proprietários de outra rede e de outro
corpo funcional. O modelo representa uma ameaça, do ponto de vista da
lógica tradicional de governo, que passaria a ter uma instância maior que a
soma de seus secretários, já que a fundação seria maior que a soma de
qualquer secretaria. O grau de autonomia conferido à fundação também
escapa ao controle individual dos secretários municipais e do secretário
estadual de Educação. O caráter supragovernamental supera o mandato de
um governo, já que as eleições não coincidem. O patrimônio coletivo do
maior serviço público ofertado seria superior ao de cada um dos municípios.
(LECLERC, 2004, p.1412)
A proposição do estabelecimento de um Sistema Único de Ensino fez convergir
os esforços de militância do Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato
Grosso (SINTEP-MT) e a plataforma democratizante do plano de governo das forças
políticas coligadas na Frente Cidadania e Desenvolvimento (1994-1998), numa mesa de
negociação ampliada, envolvendo a representação dos usuários da escola pública, para
definir os termos de reordenamento do ensino.
A primeira conferência Estadual de Educação impulsionou a construção de um
modelo de gestão democrática nas escolas Públicas de Mato Grosso que apresenta, em
suas características, a adoção de eleição de diretores, a instalação de conselhos
deliberativos nos quais têm assentos – com voz e voto – representantes de todos os
segmentos da comunidade escolar, a preconização da autonomia financeira das escolas
desde 1998.
2
CARDOSO NETO, Odorico Ferreira. Dissensos no consenso: a democratização da escola pública em Mato
Grosso. Cuiabá: EdUFMT, 2004.
Em termos de mobilização, o I Fórum de Educação e a Conferência sobre o
Plano Estadual de Educação que aconteceram em 2006 foram apenas um arremedo
daquela. No último quase não houve mobilizações.
Estabelecido como uma instância deliberativa no âmbito do Sistema Estadual de
Ensino e legalizado pelo Art. 23 inciso VI da Lei Complementar n. 49 em 1998, o
Fórum Estadual tem por objetivos principais: reunião anual ordinária e a realização
trienal da Conferência Estadual de Educação para proposição das diretrizes e
prioridades das políticas estaduais e elaboração do Plano Estadual de Educação.
A 1ª Conferência do Plano Estadual de Educação realizada pelo Fórum Estadual
de Educação aconteceu dez anos após a primeira conferência, nos dias 09 a 13 de maio
de 2006. Isso significa que os governantes que ocuparam o executivo em Mato Grosso
ignoraram até a importância dos objetivos do Fórum Estadual.
Outro aspecto, talvez o mais importante, foi o estreitamento da pauta, que deixou
de discutir ou aprofundar as propostas de democratização aventadas no primeiro fórum
de 1996.
O Fórum de 2006 com a Conferência Estadual sobre o Plano Estadual de
Educação (PEE) não despertaram o mesmo entusiasmo ou novas discussões, nem o
Estado se engajou em uma ação política em favor da produção de recursos didáticos
indispensáveis sobre os diversos temas de interesse regional para auxiliar, desse modo,
os profissionais em sua prática de ensino, assim como foi estabelecido pela diretriz 10 e
14 do PEE:
10. Garantir a participação dos profissionais da educação em exercício da
função, na realização de pesquisas e inovações pedagógicas, assegurando
recursos financeiros à realização dos projetos e também que o profissional
pesquisador tenha dedicação exclusiva nos projetos em andamento na escola.
14. Redefinir a organização curricular (didático-pedagógica e administrativa)
do ensino noturno, de forma a atender às necessidades do aluno-trabalhador,
sem prejuízo da qualidade do ensino, com amplo debate com os profissionais
da educação e comunidade escolar.
Um ano após o Fórum de 2006, em 14/09/2007 o governo constitui nova
comissão para organizar a Conferência Estadual da Educação Básica, com o explícito
objetivo de preparar um documento específico a ser enviado para a Conferência
Nacional de Educação Básica. Em 17/09/2007 essa comissão define o regimento interno
da conferência para o mês de dezembro e os encontros regionais para outubro e
novembro. Foi uma conferência feita “à toque de caixa”, com um número de
participantes reduzidos - 408 delegados e apenas 68 Trabalhadores da Educação Pública
– e sem nenhum textos base de discussão, demonstrando as distorções sofridas pelas
intuições originais do Fórum e Conferência Estaduais.3
A pasmaceira governamental não se altera significativamente nem mesmo
quando as coligações partidárias aproximam o Partido dos Trabalhadores – com vários
militantes sindicais que lideraram os trabalhos da primeira conferência – ao governo do
estado, assumindo a Secretaria de educação no primeiro semestre de 2007.
A reunião foi pautada pela avaliação do trabalho dos trabalhadores e
trabalhadoras da educação no interior do Estado e os encaminhamentos
propostos para o próximo ano. O presidente do Sintep-MT, Gilmar Soares
Ferreira, destacou a fragilidade na realização da Conferência Estadual em
função da precedência dos encontros regionais. “A falta de dotação
orçamentária do Estado prejudicou a realização na ponta do problema, que
são as escolas nos municípios”, disse. “Esses encontros foram pouco
articulados e com baixa participação”, completou.
Ferreira também evidenciou a discrepância das datas na realização das
conferências nacionais e ainda a separação dos “temas” da educação,
postergando assim decisões importantes para o setor. “Temos que discutir a
educação como uma unidade”, frisou. A Conferência Nacional da Educação
Básica será realizada em abril, em Brasília (DF), e a Conferência Nacional de
Ensino Superior em 2009, para que então, em 2010, seja realizada a
Conferência Nacional da Educação. “Não entendo que a segmentação seja
um bom caminho”. 4
A Conferência de 2007 estabelece apenas um objetivo pro forma: elaborar e
entregar ao Ministério da Educação o Plano de Ações Articuladas (PAR), em
conformidade com as diretrizes do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).
Nela não se verificou mais um esforço e investimentos para que a Conferência
Estadual “transpirasse” o trabalho da base - dos trabalhadores da educação pública. Por
isso, “a realização (de debates) na ponta do problema, que são as escolas nos
municípios...” praticamente não houve, os “encontros foram pouco articulados e com
baixa participação”.
Esse olhar atento à atmosfera dos atritos num altiplano (o do Poder Estatal)
expõe a mitigação dos conflitos e uma assimetria nas relações de poder. O exemplo das
deliberações do Fórum Estadual de Educação mostra que a ação “política” do executivo
estadual não é determinada pelos “interesses” públicos em sentido amplo, pois as
3
Na Conferência de 2007 aparece um objetivo pro forma: elaborar e entregar ao Ministério da Educação
o Plano de Ações Articuladas (PAR), em conformidade com as diretrizes do Plano de Desenvolvimento da
Educação (PDE), lançando mão de estratégia “viciada” e com fraca representatividade – pelo que se
deixou de fazer de trabalho de base - dos trabalhadores da educação pública. Ver toda documentação
disponível
em <http://www.seduc.mt.gov.br/conteudo.php?sid=334&parent=0> Acessado em
08/08/2008.
4
Num texto do SINTEP exposto em uma de suas reuniões ampliadas. Disponível em
<http://www.sintep.org.br/Home/index.php?codigo=2379&phpDo=noticias&lista=sim> Acessado em 08/08/2008.
“diretrizes” estabelecidas pelos representantes dos setores sociais em assembléia são
deliberações divergentes das “estratégias” de ação governamental adotada.
Diante desse cenário de conflitos minimizados e escolhas paradoxais (cruz e
espada), a simples distribuição de livros realizada por um programa (PNLEM) do Fundo
Nacional do Desenvolvimento da Escola (FNDE/MEC) surge como um problema ao invés
de uma solução.5
A história construída pelos profissionais da educação de Mato Grosso e Cuiabá é
profícua em exemplos - e contra-exemplos - sobre a diferença entre a perspectiva de
Gestão (escolar e estatal) “democrática” e a não democrática. Diferente desta, a primeira
perspectiva é a que prioriza o engajamento da comunidade educativa juntamente com os
profissionais da educação na definição das propostas pedagógicas como um todo.
Na perspectiva de uma gestão democrática a distribuição de livros gratuitos para
os alunos é um programa importante, mas o livro é apenas uma dentre outras das ações
estratégicas. A inversão dessa perspectiva induz a pensar em um modo de
verticalização das relações, ou “autoritarismo”. Como não imaginar que nesta última se
enquadre a situação em que cada professor e professora são obrigados a “escolher”
conteúdos pré-selecionados para a escola, conteúdos homogeneizados para um universo
cultural do tamanho do Brasil?
No plano da escola há problemas muito sérios relativos à organização do espaço
e tempo escolares. O modelo da seriação se torna ainda mais prejudicial quando a carga
horária semanal das disciplinas é reduzida a ínfimos 20 (vinte) minutos, que servem
apenas para a transcrição de pequenos textos do livro para a lousa e da lousa para os
cadernos.
O problema do esvaziamento das salas de aula não é causado, como se imagina,
pela feira do bairro, tão importante para a comunidade e que funciona na rua principal.
Esse fenômeno se explica pelo funcionamento (barulhento) dos bares durante o período
letivo, um atrativo que, antes de chamar a atenção dos alunos para fora da escola,
dificulta o trabalho dos educadores dentro de sala de aula.
5
O Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (PNLEM ) começou a distribuir gratuitamente para
os estudantes das três séries do ensino médio em todo o Brasil as obras de português e de matemática.
“Em 2007, foram gastos R$ 661 milhões no PNLD, R$ 221 milhões no PNLEM”. Disponível em
<http://portal.mec.gov.br/index.php> Acessado em 31/07/2008. Os livros de história foram planejados
para distribuição em 2008. “São 15,5 milhões de exemplares, num investimento de R$ 135 milhões, que
vai
beneficiar
alunos
de
13.253
escolas.”
Disponível
em
<http://www.mt.gov.br/redirect.php?url=http://www.seduc.mt.gov.br> Acessado em 20/07/2007.
Se tomado como uma simples afronta, o funcionamento barulhento dos bares
indica um não comprometimento de alguns moradores do bairro com as atividades
escolares. A tática dos micro-empresários é utilizar músicas juvenis, DJ’s, entre outras,
na disputa para conseguir maior afluência dos clientes (alunos). Contudo, os donos dos
bares não são os únicos responsáveis pela desestabilização do agrupamento escolar.
Os bares não funcionam sem os “clientes”, os jovens estudantes que saem das
salas de aula em busca de entretenimento e diversão. O prof. Jorge reconhece que, em
termos de atrativos, a escola “perde” também para os programas de televisão.
De qualquer modo, a gravidade dos problemas causados pelo barulho dos bares
faz muitos pensarem em uma ação policial ostensiva. Nesse momento aparece certa
descrença na ação política, na articulação dos membros da comunidade para a busca de
soluções pela união de esforços, para prevenir a intervenção externa e “violenta”.
Enquanto pai de aluna, aluno e representante dos alunos no Conselho Escolar
Comunitário (CEC), seu Mário reclama a falta de participação de outros pais que não
dão apoio à escola. Por outro lado, reconhece que a escola não faz a chamada da
comunidade para participar da Assembléia (deliberativa) Comunitária, para tratar essas
questões que são importantes para todos.
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