UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – I
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS
MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS
GABRIELLA SANTANA SANTOS
DAS SALAS AOS CHATS:
FACEBOOK E OUTRAS REDES DE RELACIONAMENTO NUMA PERSPECTIVA
EDUCOMUNICACIONAL
Salvador,
2014
2
GABRIELLA SANTANA SANTOS
DAS SALAS AOS CHATS:
FACEBOOK E OUTRAS REDES DE RELACIONAMENTO NUMA PERSPECTIVA
EDUCOMUNICACIONAL
Texto apresentado ao Programa de Pós graduação em estudos de Linguagens da
UNEB – Campus I, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestra em
Estudos de Linguagens, na área de
concentração:
Leitura,
Literatura
e
Identidades.
Orientador: Prof. Dr. Silvio Roberto dos
Santos Oliveira
Salvador,
2014
3
FICHA CATALOGRÁFICA
Sistema de Bibliotecas da UNEB
Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592
Santos, Gabriella Santana
Das salas aos chats: facebook
e outras
de relacionamentos numa perspectiva
FOLHA
DE redes
APROVAÇÃO
educomunicacional / Gabriella Santana Santos . - Salvador, 2014.
90f.
Orientador: Silvio Roberto dos Santos Oliveira.
GABRIELLA SANTANA SANTOS
Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação.
Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens. Campus I. 2014.
Contém referências.
1. Comunicação na educação. 2. Linguagem e cultura. 3. Redes sociais on-line. 4.
Facebook. 5. Comunicações digitais. I. Oliveira, Silvio Roberto dos Santos. II. Universidade
do Estado da Bahia, Departamento de Educação.
CDD: 371.33
DAS SALAS AOS CHATS:
4
FACEBOOK E OUTRAS REDES DE RELACIONAMENTO NUMA PERSPECTIVA
EDUCOMUNICACIONAL
Texto apresentado ao Programa de Pós graduação em estudos de Linguagens da
UNEB – Campus I, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestra em
Estudos de Linguagens, na área de
concentração:
Leitura,
Literatura
e
Identidades.
Aprovada em ___________________________________
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________
Orientador: Professor Doutor Silvio Roberto dos Santos Oliveira – PPGEL/UNEB
___________________________________________________________________
Professor Doutor Edson Dias Ferreira - UEFS
___________________________________________________________________
Professora Doutora Elisabeth Gonzaga de Lima – PPGEL/UNEB
5
Para Erivaldo Silva e Mayra Landim, em memória.
6
AGRADECIMENTOS
“E nada a pedir, só agradecer...” esse agradecimento, por mais estranho que
pareça, começou a ser escrito no dia 31 de julho de 2011, dentro de um ônibus, a
caminho do Campus I, quando eu ainda fazia a minha inscrição para esse programa
de mestrado. Podem chamar de certeza, autoconfiança, destino. Mas eu sabia que
ia acontecer, mesmo com todos os medos que pairaram durante essa jornada.
Algumas pessoas me ajudaram a ter essa certeza e a elas eu agradeço, sempre:
Ana, minha mãe. Meu escudo, meu braço direito, meu coração fora do corpo. É por
você, e por mais ninguém que eu vivo todos os meus dias. Você sempre acreditou,
mesmo antes de eu tentar. Desculpe por tudo, obrigada.
Meus sobrinhos, meus anjos em forma de criança.
Alex, meu ex e eterno companheiro. Mesmo em meio a tantos percalços, você
sempre esteve do meu lado. Graças a você serei “mestrinha”, viu!?
Nadjena, Socorro, que revisaram esse projeto quando ele ainda era um projeto. Que
aguentaram tanta coisa ao meu lado, que me ensinaram a “abraçar o mar...”.
Obrigada, sempre.
Aos meus amigos, de perto e de longe: Charlene, Daniela, Dayse, Éden Nilo Flávia,
Francileide, Maria Luiza, Leila, Raimundo Filho, Rangel, Rouse, Sérgio, Taísa...
todos vocês me ensinaram muito a acreditar.
Às professoras Priscila Possidônio e Cida Ferraz, e aos seus respectivos alunos, por
me permitirem acompanhar suas turmas para análises nesse trabalho.
Aos colegas, professores e funcionários do PPGEL. Obrigada pelas horas
compartilhadas, pelas angústias divididas, pelas dúvidas sanadas. EU AMO VOCÊS
(FERREIRA, Naiara. 2012).
7
Ao meu orientador, professor Doutor Silvio Roberto Oliveira e à minha primeira
orientadora, professora doutora Maria do Socorro Carvalho. Obrigada pelos links,
toques, orientações.
Ao professor Doutor Edson Ferreira e à professora Doutora Elisabeth Lima, pelas
sinceras, diretas e importantes colaborações dadas na qualificação.
Aos meus alunos ao longo desses anos, do SENAI, da Fasup e do Colégio Estadual
Alaor Coutinho, e os que eu pude acompanhar como estagiária na Uneb, Campus I,
que muito me ensinaram.
E ao meu pai, sempre na memória. O primeiro que me ensinou o verdadeiro valor do
termo “Mestre”.
8
RESUMO
Este trabalho aborda o uso das redes sociais de relacionamento on line, a
saber, Facebook e Youtube¸ especialmente, numa visão educacional, levando-se em
conta os princípios educomunicativos, embasados, sobretudo, nos estudos
realizados pelos professores Adilson Citelli e Ismar Soares, da Universidade de São
Paulo (USP), sobre a inter-relação entre as ciências da Educação e da
Comunicação. Nessa perspectiva, analiso, por meio da modalidade de observação
participada, duas experiências de uso da rede social Facebook em sala de aula,
além dos casos de aplicabilidade das redes propostos por projetos como a Khan
Academy, o Youtube Educação e o Ginásio Experimental de Novas Tecnologias
Educacionais (GENTE), do Rio de Janeiro. Assim, a presente dissertação está
estruturada em cinco seções, que versam sobre a natureza e a aplicabilidade da
pesquisa (Introdução, seção 1); uma breve contextualização sobre o uso da internet
atrelado às práticas educativas formais e não formais (seção 2); explanação a
respeito da diversidade dos canais disponíveis para abordar o tema na perspectiva
educacional (seção 3); análise, à luz da semiótica peirciana, dos casos de utilização
do Facebook em duas experiências de sala de aula (seção 4); e considerações
finais. Foram utilizados como arcabouço teórico, além dos já citados autores,
Marshall McLuhan, Zygmunt Bauman, Pierre Levy, Paulo Freire, entre outros.
Palavras-chave: Educomunicação; Linguagens; Redes sociais de relacionamento;
Aprendizado em rede; Internet.
9
ABSTRACT
This paper addresses the use of social networking relationship on line, namely
Facebook and Youtube¸ principally in educational vision, considering the
educommunicative principles, based especially on studies conducted by professors
Adilson Citelli and Ismar Soares, from University São Paulo (USP), on the
interrelationship between education and communication sciences. In this perspective,
analyze, by means of the modality of participatory observation, two experiences of
using social network Facebook in the classroom, and cases of applicability of the
networks proposed by projects, like of Khan Academy, YouTube Education and
Experimental Gymnasium New Educational Technologies (GENTE) of Rio de
Janeiro. Therefore, the present dissertation is organized into five sections, which
discusses about the nature and applicability of the research (Introduction , section 1);
a brief contextualization about the use of the internet coupled with the formal and
non-formal educational practices (section 2); explanation about diversity available
channels to approach the topic in educational perspective (section 3); analysis, in the
light of semiotics of Peirce, of cases of use of Facebook in two classroom
experiments (section 4), and final thoughts. Were used as theoretical framework,
besides the already mentioned authors, Marshall McLuhan, Zygmunt Bauman, Pierre
Levy, Paulo Freire, among others.
Keywords: Educommunication; Languages; Social network relationship; Learning
network; Internet.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Página inicial do Projeto Gente
56
Figura 2 – Página inicial da Khan Academy no Brasil
60
Figura 3 – Página inicial do Youtube Educação
61
Figura 4 – Gráfico sobre tendências educacionais no ano de 2014
63
Figura 5 – Visão geral do grupo no Facebook da Escola Municipal Ana Lúcia
Magalhães
71
Figura 6 – Imagens postadas pelos discentes no grupo do Facebook
73
Figura 7 – Pesquisa proposta pela Professora Priscila Posssidônio sobre uso do
Facebook em sala de aula
75
Figura 8 – Comentários dos alunos sobre a pesquisa
76
Figura 9 – Página inicial do grupo Baú de Retalhos no Facebook
82
11
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
1.1 DAS SEÇÕES
11
19
2. REDES, INTERNET E EDUCAÇÃO: CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA
RELAÇÃO NÃO TÃO JOVEM ASSIM
23
2.1 VIRTUALIZAÇÃO E HOMINIZAÇÃO: LEVY E FREIRE
35
2.2 SALAS OU CHATS?
41
3. A DIVERSIDADE DOS CANAIS: FACEBOOK, YOUTUBE, SALMAN KHAN
E PROJETO GENTE
48
3.1 NOVOS PERSONAGENS, VELHOS ROTEIROS
52
3.2 TEMPO: O MOVIMENTO É INVERSO?
57
4. A SALA DE AULA DO 9º ANO DA ESCOLA ANA LÚCIA MAGALHÃES: UM
“BAÚ DE RETALHOS” NO FACEBOOK E NO BLOGSPOT
64
4.1 DE KKK´S E SILÊNCIOS
69
4.2 RETALHOS E MOSAICOS
78
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
85
6. REFERÊNCIAS
90
12
1 INTRODUÇÃO
A minha graduação na área de educação me deu bases e questionamentos a
respeito das práticas educacionais correntes no século XXI. Minha formação
acadêmica ainda era baseada em conceitos construídos ao longo de décadas,
segundo os quais o discente era tido como ser depositário de saberes, saberes
esses que seriam ofertados pelos professores, pelos educadores e, principalmente,
pelos livros. Era o que Paulo Freire classificava como educação bancária,
constantemente contestada no ambiente acadêmico, mas reproduzida, com bastante
frequência, dentro dos espaços escolares ou de formação. Claro que, em pleno
início do século XXI – época em que cursei minha graduação em Letras – esse
cenário já se mostrava bem diferente. Vivíamos o ápice da revolução na área das
Tecnologias de Informação e da Comunicação (TIC´s), que passavam a estar cada
vez mais disponíveis para muitos, levando-se em conta as limitações geográficas,
econômicas e sociais.
Nesse contexto, o educando do século XXI é aquele que, além de possuir dentro do
seu arcabouço de informações e formações os saberes pessoais – de formação
individual e social que não raro são descartados pelas instituições de ensino –
apodera-se de tantos outros saberes culturais em um click, em uma mudança de
canal, em uma rápida consulta aos tablets, celulares e ferramentas cada vez mais a
disposição. Esse novo personagem tem papel importante na nova história da
educação, porque a pode impulsionar para reagir a antigas demandas, como
reformulação de velhas práticas. Essa proposta abre espaço para questionamentos
que norteiam o ponto de partida dessa pesquisa: como lidar com o novo perfil de
aluno/leitor, frente às novas tecnologias e as antigas práticas educacionais?
Tenho que deixar claro: talvez você não encontre as respostas para essa pergunta
nesta dissertação. Isto porque os desafios educacionais não são ideias a serem
pensadas apenas nos campos teóricos educacionais, até porque o campo é cíclico.
Como bem questiona MORIN (2010, p. 49) “quem educará os educadores?”
Ou seja, talvez seja possível perceber que as respostas não estarão postas nesta
dissertação, porque o que levanto como objeto de análise são as práticas docentes
13
e discentes em relação às novas tecnologias, e, apesar de elas serem embasadas
em pressupostos teóricos são em sua maioria fruto de ações que precisam ser
efetivadas diariamente, no exercício do fazer educativo, levando-se em conta o
chamado “aprender fazendo”.
Por isso reitero que você, talvez, também não encontre essa resposta em outras
dissertações ou teses a respeito do tema. Mas, no caminho contrário, a prática tem
apontado para tantos possíveis caminhos quantos sejam pensados no campo das
ações pedagógicas, de leitura/escrita ou das relações com os meios de
comunicação e interação tecnológica. E esses caminhos passam, quase sempre,
pelo estreitamento da relação entre Educação e as Ciências de Comunicação.
A afinidade entre as duas ciências não é algo novo. Projetos como Jornal Escola
versam de mais de cinco décadas atrás. Antes disso, já se educava a distância por
correspondência ou via rádio. Entretanto, é necessário entender, antes de passar
para a seara das possíveis tentativas de respostas às perguntas elencadas, que as
duas ciências são co-irmãs, por lidarem com saberes, conhecimento, formação e
informação. É prerrogativa necessária desse século, muito mais que se acrescentar
ferramentas ou ter um celular que acesse internet, entender que buscamos conhecer
e saber por sermos constantemente estimulados a conhecer e saber.
Por isso, é essencial, principalmente, entender a distinção entre esses dois termos –
conhecer e saber – levando-se em conta que conhecemos muitas coisas sem
necessariamente sabermos muito sobre elas. Principalmente por conta do aumento
da acessibilidade aos conteúdos on line, podemos dizer, por exemplo, que
conhecemos diversos países do mundo, sem necessariamente termos estado neles
e tido acesso aos seus saberes. Como bem afirma a filósofa Viviane Mosé, o saber
é o momento em passamos para a reflexão crítica do que conhecemos. Porém,
numa sociedade que “democratiza” os seus conhecimentos como a nossa –
transformando a internet numa grande enciclopédia ao alcance da mão – temos tido
tempo para exercitar as reflexões críticas e transformar o conhecer em saber, o
decorar em aprender? Creio que não. E isso não acontece apenas dentro do
ambiente escolar, mas, mais do que nunca no século vigente, em ambientes virtuais,
14
tecnológicos e no que antes eram conhecidas as Redes Sociais ou de
entretenimento.
Essa sociedade, que nasceu como sociedade da informação e que,
com as redes sociais, se tornou sociedade do conhecimento, porque
produz conhecimento em tempo real, desfez as antigas estruturas de
poder, ao mesmo tempo que deu à luz novas. (MOSÉ, 2013, p. 23)
Por isso, com as análises propostas nessa dissertação, pretendo refletir a respeito
das possibilidades de interação desses jovens produtores de conhecimento com o
mundo do saber, dentro dos espaços formais destinados a isso, como as salas de
aula, e os considerados não formais, como os chats e canais de interação on line.
Para tanto, proponho pensar nisso baseando-me nas interações entre educação e
comunicação.
Não são raras as correntes que pensam na relação educação/comunicação. De
forma bastante sintética, temos três principais sendo adotadas especialmente no
Brasil:
Educação
para
os
Meios;
a
Pedagogia
da
Linguagem
Total; e
Educomunicação1. Emprego nesta dissertação a análise de práticas que associem
as ideias propostas por esta última prática, mesmo que não adotem o termo
especificamente ou intitulem as suas ações como sendo educomunicativas. A
Educomunicação (e suas aplicações) vem sendo estudada há aproximadamente
vinte anos pelo Núcleo de Educação e Comunicação da Universidade de São Paulo
- USP, mas vem sendo aplicada há cerca de trinta anos por movimentos populares e
sociais da América Latina, que pretendem dar ênfase a construção de uma
sociedade mais participativa e ativa frente aos meios. No Brasil, o termo foi cunhado
pelo professor Ismar Soares, coordenador do NEC-Usp e autor do livro
“Educomunicação: o conceito, o profissional, a aplicação”, que teve sua primeira
edição em 2009. Antes disso, o assunto era tema da revista Comunicação &
Educação2, editada, também pela Usp, há dezoito anos. Ismar Soares – que
também já foi um dos editores da revista define a Educomunicação como sendo:
1
Sobre as diferenças entre as três vertentes ver OROFINO, M. I, 2005, p. 31
2
“A Revista Comunicação & Educação possui como missão, basicamente, evidenciar que: os meios
de comunicação estão nas salas de aula, quer das escolas que possuem um aparato tecnológico de
primeira linha (escolas e clientela de nível sócio-econômico A), quer naquelas que muitas vezes são
classificadas como "carentes" (escolas e clientela de nível sócio-econômico C, D e E); os meios de
15
o conjunto de ações voltadas ao planejamento e implementação de
práticas destinadas a criar e desenvolver ecossistemas
comunicativos abertos e criativos em espaços educativos,
garantindo, dessa forma, crescentes possibilidades de expressão a
todos os membros das comunidades educativas (SOARES, 2003)
Seriam práticas que implementariam no quefazer (FREIRE, 1983) educacional um
exercício de apropriação das vivências e saberes dos estudantes. No âmbito da
leitura, especificamente, aproximaria as suas práticas voltadas para o campo dos
media, modificando, assim, a ideia de que a leitura e a interação com os campos
midiáticos não se constitui também num exercício de leitura e, principalmente, de
produção escolar.
Os ecossistemas comunicativos, como afirma Soares, seriam formados por
educadores, estudantes, coordenadores, pais, pesquisadores e toda uma gama de
agentes sociais que não estariam apenas dentro dos espaços escolares, mas
“conectados” às vivências deste aluno, levando-as sempre em conta no momento da
construção do saber. Na Bahia, o professor da Universidade Federal da Bahia –
UFBa, Nelson Pretto (2013), um dos nomes de destaque na discussão e estudos
sobre o tema, emprega o termo “ecossistema pedagógico” para designar a rede de
manutenção das práticas educativas voltadas para as demandas tecnológicas e
midiáticas do terceiro milênio.
Pelos motivos elencados acima, penso que a vertente educomunicacional seja a
mais apropriada para responder aos atuais questionamentos quanto às formas de
atrelar o conhecimento previamente estabelecido ou formado pelos educandos
através dos contatos, tão precoces e constantes com as mídias, especialmente as
digitais. Isso porque tal vertente envolve bem mais que o simples desejo de educar
para os meios – ou estabelecer a formação de leitores críticos para o processo de
mediação existente entre as informações que são passadas pelas mídias. Esta
vertente questiona, entre outras coisas, qual o papel do formador frente às novas
tecnologias, propõe uma relação mais estreita entre educador/comunicador (este
comunicação estão presentes no cotidiano das pessoas e nelas introjetados, de tal modo que, onde
houver seres humanos, os meios estarão presentes.” Retirado da página da revista, disponível em
http://www.revistas.usp.br/comueduc/
16
último como organizador de informações para que sejam transformadas em mídia ou
não), entende que o conhecimento prévio e corriqueiro de cada agente educacional
deve ser atrelado ao processo de formação de saber instrumentalizado –
acadêmico, escolar, para o mercado ou no que ele finalmente tenha se transformado
para atender as demandas sociais.
Percebemos, claro, que as práticas propostas pela Educomunicação viriam, assim,
preencher uma lacuna na educação formal que já deveria ter sido ocupada pela
reformulação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação, a LDB ou pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCN´s. Tanto um documento quanto o outro
defendem o princípio da interação entre os conhecimentos e vivências do educando,
obtidos fora dos ambientes de educação formal, com os que são obtidos através da
abordagem dos temas elencados nas grades curriculares escolares. As bases para
formatação dos documentos são as mesmas, inclusive, que norteiam os princípios
educomunicativos, como o pensamento freiriano de que discentes não são depósitos
vazios que se encherão de conhecimento apenas dentro de salas de aula.
Entretanto, as dificuldades elencadas por docentes na realização entre o que está
dito na lei e o que pode ser feito em ambiente escolar ainda persistem, e, talvez,
ainda seja necessário reformular ações para que não prossigamos num abismo que
separa o que está escrito do que está sendo feito. Ainda Mosé, ao entrevistar Maria
do Pilar, uma das responsáveis pela reformulação de políticas públicas educacionais
no Brasil aborda essa questão:
Viviane Mosé: a LDB surpreende a quem a lê. Porque ela realmente
abre espaços muito interessantes. No entanto, a maioria dos nossos
professores e, principalmente, diretores não tem tanta clareza a
respeito disso. A minha pergunta é: que inovações a LDB permite? O
que a LDB permite à escola, novos projetos?
Maria do Pilar: (...) quem conhece a LDB e tem uma formação teórica
sólida e quer ousar em termos de organização da escola pode fazer
isso tranquilamente. Tranquilamente pode derrubar as paredes, os
muros e tornar essa escola um espaço de aprendizagem no qual os
meninos se sintam efetivamente acolhidos (...). (MOSÉ, 2013, p. 231)
Através dos ecossistemas educomunicativos, que seriam ecologias do saber, que
envolvem toda uma cadeia formativa onde todos os seres – conceitos importados da
17
Biologia – penso que podemos abordar todos os entes envolvidos nessa cadeia,
sugerindo que tornem-se atuantes e importantes nos processos de formação
escolar, derrubando os muros e as paredes que impedem que o conhecimento
circule livremente. É importante pensar que através dessa vertente podemos
acreditar, por exemplo, que o Facebook3, uma rede social nascida nos ambientes
acadêmicas,
“invadida”
depois
por
usuários
ávidos
por entretenimento
e
estreitamento de laços com pessoas conhecidas e desconhecidas pode ser
agregada às práxis educacionais justamente pelo fato de ser uma ferramenta de
interação social!
Entendo que a Educomunicação é a possível chave – como vertente de estudo, não
como solucionadora – para dirimir a dicotomia criada por alguns educadores no trato
com as mídias aliadas ao ato educativo. Reitero a minha proposta de trazer à luz a
discussão a respeito do uso das mídias em educação, focando especialmente no
uso das redes sociais por serem espaços frequentemente utilizados pelos jovens
como mais um espaço de interação social e apreensão de saberes.
Além disso, estreitando os laços cooperativos entre as ciências, criando um
ecossistema onde o saber não seja hierarquizado de forma a relegar as culturas
midiáticas para um papel de mero entretenimento vazio e anti-reflexivo, é possível
questionar a forma como os produtos comunicativos são elaborados. Trazê-los para
o campo dos saberes importantes à formação escolar e acadêmica pode ajudar a
questionar as vontades de vigilâncias que cercam todos os meios e instrumentos,
como as possibilidades aventadas de observação com e sem controle de postagens
e publicações por órgãos governamentais, especialmente norte-americanos; a
padronização identitária proposta por esses meios ou até mesmo o silenciamento de
vozes dissonantes dentro do sistema vigente.
3
Lançado em 2004 nos Estados Unidos por Mark Zuckeberg enquanto estudava na Universidade de
Harvard, o Facebook (originalmente thefacebook), foi concebido para focar em alunos que estavam
saindo do ensino secundário (High Scool, nos Estados Unidos). (...) A ferramenta propunha criar
uma rede de contatos em um momento crucial da vida de um estudante universitário, que é o
momento em que este sai da escola e vai para a universidade, representando na maioria das vezes,
a mudança de cidade e um espectro novo de relações sociais. No entanto, o sistema inicialmente
era fechado e para entrar nele era necessário ser membro de uma das instituições reconhecidas já
que o foco era escolas, colégios e universidades. (CARMO, 2013, p. 2)
18
Ou seja, pelo viés da Educomunicação somos levados a ver aquilo que Pierre Levy
afirmava em seu ensaio metodológico sobre os conhecimentos diversos e dispersos,
“Árvores do Conhecimento”:
Como conectar, na verdade, o que você sabe ou pode fazer e o que
nós podemos ou sabemos fazer juntos? Em outras palavras, como
fecundar o coletivo perito pelas perícias individuais, ou identidades
pela pertinência, como em uma corrente positiva? Desde que o
mundo tem uma história, o conjunto das respostas a esta dupla
questão se nomeia por cultivo e educação, instrução e pedagogia,
formação e aprendizado. (LEVY, 1992, p. 21)
Entretanto, apesar de entender que a Educomunicação é um campo extremamente
relevante para as práticas pedagógicas, acredito que o seu perfil de atuação ainda
encontra-se muito mais restrito ao uso instrumental das tecnologias do que no seu
escopo metodológico, social e totalizante. Aliás, não só sobre a égide de práticas
educomunicativas, mas grande parte das práticas que se autointitulam como
educacionais “inovadoras”, “educação para o século XXI” ou coisas parecidas são,
não raro, entendidas como práticas que acreditam mais na instrumentalização – dos
estudantes, dos professores, do ambiente escolar – do que na reformulação de
perguntas básicas.
Por
esse
motivo,
coadunando
o
meu
pensamento
com
pesquisadores
contemporâneos das práticas educacionais e comunicativas – não só das
educomunicativas – acredito que o papel dessa pesquisa deva ser um pouco mais
amplo.
Além
de
questionar
como
a
escola,
através
dos
princípios
educomunicacionais, pode tentar se aprimorar para enfrentar os desafios do século
vigente, tento, através da observação participante responder, ou pelo menos, trazer
à luz algumas questões: “Que relação pode ser estabelecida entre as redes sociais e
o processo educacional?”; “Como a Educomunicação pode ajudar a solucionar a
possível crise na educação do século XXI?”; “Os processos de leitura e escrita estão
sendo deixados de lado na era informacional?”. Para tanto uso a análise de alguns
casos locais e internacionais de uso das redes sociais nas práticas educativas.
19
A utilização da metodologia da observação participante se pauta em acompanhar os
pesquisados durante os processos de construção/interação com as redes sociais,
dentro dos ambientes formais de aprendizado e seus possíveis usos. Optei por essa
metodologia por me permitir estabelecer uma interação mais direta com os jovens
envolvidos na pesquisa (a saber, estudantes do ensino fundamental II de uma
escola municipal de Lauro de Freitas e universitários do primeiro semestre do curso
de Relações Públicas da Universidade do Estado da Bahia, Uneb, Campus I), além
de ser, no primeiro caso, apenas como observadora e no segundo, como
observadora e monitora do grupo, liberdade para propor práticas de escrita em
ambiente virtual que possibilitaram formação de reflexão a respeito do uso das
mídias. No segundo caso, especificamente, pude colocar em prática o que preconiza
o antropólogo Adjair Alves (2011) sobre observação participante, ao afirmar que:
Em se tratando da observação participante é fundamental que se
compreenda que o conhecimento construído é oriundo da relação
com sujeitos envolvidos no processo social; pesquisador e
pesquisados. (...) Na prática, a pesquisa social compreende uma
troca verbal, uma situação de diálogo em que é preciso conhecer a
linguagem dos interlocutores a serem pesquisados.(ALVES, 2011, p.
28)
A ideia dos casos diversos serve para, a princípio, montar uma análise que parta de
um lócus mais micro – por isso mais próximo de nossa atual realidade – e, como
num processo global que é o das tecnologias de informação e comunicação, abrir o
diafragma e ver o lócus mais amplo e macro. Então, dessa forma, serão analisadas
experiências de páginas no Facebook e blogs criados por estudantes de uma escola
da rede municipal de ensino de Lauro de Freitas e de estudantes do curso de
Relações Públicas da Universidade do Estado da Bahia; o projeto GENTE – Ginásio
Experimental de Tecnologias Educacionais, implantado na rede municipal do Rio de
Janeiro; e a Khan Academy, organizada pelo americano Salman Khan, que usa
vídeos do Youtube numa perspectiva inovadora de educação. Tais análises levaram
em conta as práticas caracterizadas por um conjunto de ações educomunicacionais
propostas por Ismar Soares e Adilson Citelli; Pierre Levy, Marshal McLuhan, Manuel
Castells, Nestor Garcia Canclini e Jesus Martín-Barbero e Nelson Pretto, entre
20
outros, para entender os caminhos da inteligência cognitiva tecnológica; e nomes
como Paulo Freire, Edgar Morin e Zygmunt Bauman para pensar as encruzilhadas
educacionais a que nós, educadores, estudantes e eternos seres informacionais
estamos expostos nessa grande infovia global e tentar analisar as questões sociais
que permeiam essa necessidade de interação/cognição a que estamos submetidos.
1.1 DAS SEÇÕES
Para montar um mosaico, é preciso ter uma base em mãos! Essa base se forma a
partir de uma breve contextualização sobre a relação entre Internet, Redes Sociais e
Educação. Na seção 2, intitulada Redes, Internet e Educação: considerações sobre
uma relação não tão jovem assim, pretendo, à luz de autores como Marshal
McLuhan, Vannevar Bush, Nelson Pretto e Manuel Castells traçar um panorama
histórico-comparativo desse flerte entre as redes de relacionamento, a partir das
ciências comunicacionais, com o processo educacional.
McLuhan, já em 1964, nos brinda com desafios elucidativos dessa que viria a ser
uma relação dicotômica, quando deveria ser amplamente dialógica. Com base no
que o norte-americano afirma em “Os Meios de Comunicação como extensões dos
Homens: understanding media”, já podemos começar a entender que, norteados por
um mundo cada vez mais tecnológico, os homens não se permitiam, ainda, pensar
que as máquinas, os sistemas de informação e a velocidade dos meios poderiam ser
mais que aliados instrumentais. O autor, logo no inicio da obra afirma “Qualquer
criança pode fazer uma lista dos efeitos do telefone, ou do rádio, ou do carro, no
sentido de moldar a vida e o trabalho de seus amigos e de sua comunidade.” (1964,
p. 13). Essa assertiva seria a prerrogativa básica de um projeto educomunicacional,
já que pensa o educando como protagonista de um processo que envolve saberes
intuitivos e instrumentais cotidianos. A partir dele e dos outros autores citados,
pretendo apontar os chamados que vem sendo feitos há no mínimo seis décadas à
educação do mundo todo, não para adotar uma atitude reativa frente à Torrente de
Mídias (GITLIN, 2003), mas para entendê-la como parte das vivências humanas,
levando-se em conta suas limitações sociais de gênero, classe social, etnia, raça,
religião; ou seja, abordando conceitos que remetem a questão das plurais
identidades e das experiências unas e coletivas.
21
Ainda nesta seção “convido” o educador Paulo Freire e o comunicólogo Pierre Levy
para “virtualmente” discutirem conceitos de virtualização e hominização. A sub-seção
Virtualização e Hominização: Levy e Freire aborda os conceitos de virtual e humano
levantados pelo francês especificamente no ensaio “O que é virtual?” (1996) e as
práticas de educação libertadora do brasileiro que conquistaram todo o mundo. A
aproximação entre as ideias de ambos, sem sugerir aqui uma proposta de recepção
e sim, uma ideia de solução global abrangente e inclusiva, nos permite pensar que,
mesmo dentro de realidades distantes e distintas – o primeiro tendo como base as
experiências da Europa em pleno auge econômico pós-guerra fria; o segundo
vivendo a educação no campo da América Latina – o uso das tecnologias (não das
tecnocracias) comunicacionais é um passo importantíssimo para que educandos e
educadores aproximem-se mais das realidades de ambos, evitando os rachas e
abismos que sugerem as evasões e o fracasso do atual sistema escolar.
Nesta seção, à luz dos hábitos relacionais dos jovens discentes, questiono o perfil
das salas de aula atuais. Para a realidade do século XXI, devemos acreditar e
manter Salas ou chats? Entre um e outro temos paredes, liquidez (BAUMAN, 2001,
2004, 2013), consumo, interação, exclusão, manipulação, individualidades e
coletividades. O que os diferencia? Estamos, como educadores, prontos para
entender essa nova configuração espacial que se desenha frente a um tempo cada
vez mais acelerado? Tempo, espaço são os mesmos para todos os elementos
presentes dentro desse lócus de interação e saber?
A seção seguinte, A diversidade dos canais: Facebook, Youtube, Salman Khan e
Projeto Gente, trata especificamente dos cases que formam este mosaico de
pesquisa e observação. No caso do Facebook, duas realidades são apresentadas: a
página criada pela professora de Língua Portuguesa para os alunos de uma das
duas turmas de 9º ano do Ensino Fundamental II da escola municipal Ana Lúcia
Magalhães, em Lauro de Freitas, região metropolitana de Salvador, Bahia; e a
página criada pelos próprios alunos do I Semestre do Curso de Relações Públicas
da Universidade do Estado da Bahia, Campus I, Salvador. Nesse contexto, os
exemplos serão apenas tratados como tais: exemplos. Entretanto, uma análise
desses dois cases, a partir dos conceitos de semiótica aplicada, deve ser feita
brevemente a partir da seção 4: A Sala de Aula do 9º ano da Escola Ana Lúcia
22
Magalhães: um “Baú De Retalhos” no Facebook e no Blogspot. Mas, antes de
chegar a essa análise, que será de grande valia para entender a leitura imagética e
dos signos constantes nos ambientes virtuais, ainda na seção 3, pretendo
questionar, de forma não menos simbólica, os enredos que envolvem Novos
Personagens, velhos roteiros (sub-seção 3.1). Quem são os novos personagens da
história da educação? Temos alienígenas nas salas de aula? (GREEN e BIGUM,
1995) numa perspectiva onde o saber, institucionalmente, parte do educador para
educando, no século vigente, onde o saber parece estar descentrado, Tempo: o
movimento é inverso? (sub-seção 3.2). Vídeos postados como tutoriais de aulas
(Khan Academy), salas sem paredes e sem divisões seriais (Projeto Gente – RJ),
modificam o sentido e a forma de obtenção do saber?
A análise semiótica das páginas no Facebook, na já mencionada seção 4, faz parte
do processo de observação participada proposto por mim no início desse projeto de
pesquisa. Entender como os envolvidos veem essa experiência, que leituras
possíveis são feitas a partir do signo midiático, é uma tentativa de esclarecer porque
iniciativas como essa – de aproximação entre saberes – podem dar certo ou não.
Recorro à teoria dos signos de Charles Sander Pierce para análise dos citados
grupos e, a partir dela, tento compreender a imagem do espaço de sala de aula feita
pelos alunos que interagem através da rede social, e pela professora, que no caso
de Lauro de Freitas, sugeriu a ação. Este capítulo possui uma sub-seção, intitulada
De kkk´s e silêncios numa referência às possíveis formas de interação polifônica em
rede. É nela que registro as minhas impressões, quando da observação e interação
com os discentes da disciplina Oficina de Produção Textual, oferecida à turma do I
semestre do curso de Relações Públicas da Uneb, que foram instados por mim e
pela professora regente da disciplina a criar uma página no Facebook e um Blog
para estender para o campo do virtual – e numa via de mão dupla, trazer as
experiências desse campo para o ambiente entre paredes da sala de aula – as suas
concepções de leitura e produção textual, pautadas dos assuntos discutidos em aula
ou pelas mídias.
É preciso discorrer sobre os pontos acima elencados para que possamos perceber
que Educomunicação envolve muito mais que a apropriação das mídias na sala de
aula, ou ensinar o aluno a “ler” as informações de forma mais crítica, mas aspectos
23
muito mais complexos, e nem por isso menos importantes. Primeiro, porque os
processos educomunicativos sugerem envolvimento de todos os personagens dessa
ação de forma igualitária, e isso pressupõe igualdade de direitos, de deveres, de
saberes. Será que estamos, todos os envolvidos no ecossistema comunicativo ou
pedagógico, em um patamar de igualdade ou os processos acelerados e
homogeneizantes calam as vozes menos favorecidas, enquadrando-as em
categorias e subcategorias e reforçando os estereótipos de consumo? (BAUMAN,
2013)
Responder as perguntas espalhadas ao longo dessa introdução seria o objetivo
dessa dissertação. Entretanto, acreditamos que ler, escrever, experimentar, serve,
como afirma Jorge Larossa (2004), para fazer novas perguntas. São as perguntas
que levam as descobertas. E as descobertas, quase sempre, envolvem dolorosos e
espinhosos processos de refutarmos aquilo que entendemos como real para
tentarmos mirar em amplas e infinitas possibilidades de mudanças e readaptação
que podem nos trazer certa desestabilização. Cito o questionamento feito por
Sócrates a Glauco na Alegoria da Caverna, de Platão a respeito da saída da
caverna: “se fosse obrigado a olhar exatamente para a luz, não haveria de sentir os
olhos doloridos e não tentaria desviá-los e dirigi-los para o que pode ver?” (2006, p.
45). Por vezes podemos pensar, como os estranhos prisioneiros da alegoria
socrática, que o caminho conhecido pode ser o mais confortável, a princípio, e, por
isso, nos negarmos a fazer o caminho da dúvida e das perguntas. Entretanto,
acredito, assim como McLuhan, que “nós estamos entrando na nova era da
educação, que passa a ser programada no sentido da descoberta, mais do que no
sentido da instrução” (1964, p. 13). Ou seja, devemos nos abrir às descobertas
propostas pela sociedade vigente, e principalmente, abrir a nossa capacidade de
questionar o quanto de real há dentro das nossas cavernas de repetição e prática,
pois é a partir das perguntas que surgem novas hipóteses.
24
2
REDES,
INTERNET
E
EDUCAÇÃO:
CONSIDERAÇÕES
SOBRE
UMA
RELAÇÃO NÃO TÃO JOVEM ASSIM
“Criamos a época da produção veloz, mas nos
sentimos enclausurados dentro dela. A máquina,
que produz em grande escala, tem provocado a
escassez. Nossos conhecimentos fizeram-nos
céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis.
Pensamos em demasia e sentimos bem pouco”
(Charles Chaplin)
Pensar educação através dos processos atuais de comunicação e disseminação de
informação é, antes de tudo, pensar em excessos. Na atual sociedade, conhecida
como sociedade da informação, pesquisas afirmam que há queda nos processos de
leitura e interação com as práticas educacionais mais tradicionais, que, segundo o
perfil traçado pela pesquisa “Retratos de Leitura”4, vem perdendo espaço para
entretenimentos digitais, como jogos on line, redes sociais ou filmes em DVD. Eles,
os educandos e nós, os educadores, somos constantemente bombardeados com
excessos de imagens, textos, mensagens... excesso de produção. Isso não parece
ser uma barreira deste século. Em 1945, Vannevar Bush já falava disso como um
problema, afirmando que “a dificuldade (…) [está no fato] de as publicações estarem
muito além de nossa capacidade atual de fazer uso efetivo desses registros”.
Muito se produz, pouco se aproveita. O próprio Bush temia por esse excesso de
produção de informação, afirmando no artigo “Como Pensamos” que, diante dessa
dificuldade de navegarmos em meio a tanto informação, e armazená-la de forma
aproveitável, precisaríamos de uma extensão de nossa memória, o Memex 5, ideia
que, ao se aprimorar para os conceitos atuais, deu origem ao que hoje conhecemos
4
Dados da edição 2012 da pesquisa, realizada pela Fundação Pro-livro e pelo Ibope inteligência.
Segundo a pesquisa, Em 2011, 28% dos entrevistados disseram gostar de ler jornais, revistas, livros
e textos na internet no tempo livre. O porcentual era de 36% na pesquisa anterior, em 2007.
Enquanto isso, o índice de quem gosta de assistir à TV subiu de 77% para 85.
5
“Memex não é um herói de cartoon, é uma máquina um tanto quanto visionária para auxiliar a
memória e guardar conhecimentos (daí o nome Memex - Memory Extension), que foi pensada pelo
cientista americano Vannevar Bush e enunciada em l945”. Definição do site da Unicamp.
25
como o hipertexto6. Mas, apesar de hoje termos a nosso dispor extensões de nossa
memória, ainda há, para além de nossa capacidade de absorção e leitura, muita
informação sendo produzida. Muita informação e muito lixo. E lixo no sentido físico e
literário. Catalogar o que é útil, mediar essa relação de apreensão do conhecimento
é uma tarefa complexa, mas vital para que possamos repensar as nossas práticas
de absorção, catalogação e priorização de saberes. Sobre isso, Bush afirma que
Presumivelmente, o espírito do homem deve se elevar se ele puder
rever seu passado sombrio e analisar mais completa e objetivamente
seus atuais problemas (…). Suas incursões podem ser mais
agradáveis se ele tiver o privilégio de esquecer uma série de coisas
que ele não precisa ter a mão imediatamente. (BUSH, 2007, p. 31)
(Grifo meu)
Os processos de esquecimento, ou de filtragem de informações, não são totalmente
aleatórios ou desvinculados de convenções. Temos os filtros impostos pelos meios
de consumo7 – os mais perceptíveis – pelo contexto social no qual estamos
inseridos, pelas nossas expectativas de vida ou familiares... Nesse contexto, tudo
aquilo que não fez parte do que deve ser consumido, aprendido ou levado em conta,
nos é imposto como algo descartável, passível de permanecer apenas no modo do
temporário em nossa memória afetiva, instrumental ou funcional. Se não nos dá
6
7
Trabalho aqui com a definição de hipertexto trazida por Adilson Citelli (2006, p. 234): “megatexto de
onde derivam textos particulares. A internet é um poderoso recurso para ter acesso ao hipertexto,
facultando, através de ligações, de pesquisas processadas na rede, o esclarecimento de assuntos e
temas muito preciosos (...).” e com a ideia de hipertexto contida no Dicionário do Século XXI de
Jacques Atali (2001, p. 212): “Associação de ideias. Vagabundagem (sic) do espírito, caminho de
exploração e descobertas entre as riquezas da Internet”. Dessa última definição também podemos
pensar nos conceitos de flâneur, que devem ser tratados posteriormente, ainda nessa seção. O
dicionário organizado por Atali reúne 458 verbetes que, para o autor, serão importantes para
entender o século atual. Entre eles, aqueles mais comuns ao homem,como amor, educação,
experiência ou dinheiro, outros mais usuais para o século vigente, como hipermídia, hipertexto,
chips e bytes e alguns de sua própria autoria, como “adoletela” e “civilego”.
Sobre isso, ver palestra disponibilizada pela fundação TED (acrônimo para Technology,
Entertainment, Design; em português:Tecnologia, Entretenimento, Design ) a respeito dos filtros
nas internet. Eli Pariser, presidente-executivo de um site de conteúdo viral, presidente do conselho
de MoveOn.org e um co- fundador da Avaaz.org, fala sobre os filtros e códigos binários usados
pelas redes sociais que nos tornam individualizados e personalizados, numa perspectiva de
consumo e “conforto”. Para se ter uma ideia, uma busca no Google não remete o mesmo resultado
para pessoas diferentes porque o sistema de buscas leva em conta 57 tipos de informações
diversas para dar as respostas: local de acesso a internet, servidor usado com o padrão, ultimas
buscas feitas, etc. Essa filtragem acontece para que as buscas sejam o mais úteis possível para
determinada pessoa, dentro do que é chamado pelo autor do vídeo de “filtros bolha”. Vídeo
disponível em http://www.ted.com/talks/lang/pt-br/eli_pariser_beware_online_filter_bubbles.html.
26
prazer (seja ele sensorial ou no âmbito da geração de frutos de status), não nos
permite utilização prática ou nos instrumentaliza, deve ser descartado.
Dito isso, antes dos processos de catalogação do que seria de vital importância ou
não, é necessário ter em mente o que seria lixo, lixo de conhecimento, lixo de leitura.
Ou, usando um termo mais erudito, o que estaria apenas no campo do efêmero e/ou
o que, por escolha do leitor, do receptor das informações, possa ser catalogado
como aproveitável e permanente. Pensemos que, antes da apreensão das culturas
ditas eruditas, de “alto valor” e hierarquizadas, somos todos expostos a cultura
midiática desde que nascemos. Mesmo que aja uma triagem quanto ao que é visto
ou consumido – filtros familiares, sociais, identitários ou geográficos – somos todos
projetados, de alguma forma, a consumirmos a cultura dos meios. Então, quem seria
responsável por fazer esse processo primeiro de triagem do que é “alimento sólido”
e do que é apenas descartável?
A princípio nós mesmos, como seres dotados de uma memória limitada e
tensionados pelas orientações sociais às quais estamos submetidos, fazemos esse
processo de catalogação. Ou seja, “recordar, assim como esquecer é (...) operar
uma classificação.” (CANDAU, 2011, p. 84). Mas, institucionalmente, contamos com
um outro operador de esquecimentos, priorizador de lembranças e classificador de
culturas: A escola.
A cultura primeira do aluno é, desde já, uma cultura midiática, por
força da sociedade em que vive. O papel da escola, nesse contexto,
seria fazer com que tanto as crianças, quanto os jovens e
adultos pudessem passar dessa cultura primeira à cultura
elaborada. (OROFINO, 2005, p. 23) (Grifo meu.).
Ou seja, teríamos como um dos papeis funcionais da escola, resgatar o aluno do
excesso de informação a que ele é exposto, pondo em prática o caráter semântico e
etimológico contido no próprio termo aluno: “sem luz”. Em meio às trevas da cultura
midiática em que ele está inserido, a escola seria a lâmpada, o caminho, a ponte
para que ele pudesse chegar à cultura elaborada e dita erudita. Mas, será que a
ideia de passar de uma cultura para outra através do papel “orientador” que a escola
27
ainda acredita ter não é um reforço para as práticas de alijamento das culturas e dos
saberes dos educandos? Porque uma cultura tem mesmo que servir de ponte a
outra? E se tem que servir, quais suportes são usados para que essa ponte seja
construída? “Como a educação escolar pode se colocar diante do papel que as
mídias desempenham hoje, tanto nos processos de difusão de ideologias
dominantes quanto na construção de novas redes de resistência e solidariedade
mundial?” (OROFINO, p. 30)
Para além das questões expostas acima, devo questionar o que nos faz crer que os
conteúdos curriculares, impostos pelo nosso ensino formal – especificamente no
Brasil – são os mais adequados para tornarem-se lembranças permanentes para os
nossos jovens educandos. Por que decorar o Teorema de Bhaskara (por exemplo) é
mais importante que entender como funcionam os relacionamentos interpessoais
estabelecidos em sua comunidade de origem? Não à toa, tais pontos tratados como
relevantes em nossos currículos são tratados de forma irônica e jocosa pelos nossos
estudantes.
Talvez o gerador dessas dúvidas seja a necessidade vital que nós, como
educadores, e nossos discentes, acostumados com a ideia de serem apenas
depositórios de conhecimento, temos de que os saberes precisam ser catalogados,
separados e triados, em de maior ou menor importância e de maior ou menor grau.
Orientados pelos ditames do mercado, do capital, do sistema (sic), ambos os
protagonistas dessa relação sentem-se perdidos frente às novas expectativas que
esse novo mundo acelerado nos mostrou. “Criamos a época da produção veloz, mas
nos sentimos enclausurados dentro dela”, afirmava Adenoid Hynkel, o personagem
que não queria ser imperador, de Charles Chaplin, em o Grande Ditador, de 1940.
Criticando a velocidade das transformações nos meios de produção, a fita aborda
como os seres humanos sentem-se perdidos num mundo em que “produzir” era
palavra de ordem e consumir era a forma de se sentir incluído socialmente (não
muito diferente dos dias de hoje). Distantes 72 anos do discurso do palhaço, nos
encontramos tão perdidos quanto numa sociedade bem mais acelerada que aquela.
Atualmente nos pergunta Canclini, ao colocar no mesmo patamar “Leitores,
espectadores e internautas”: “para que servem os livros, quando é melhor pesquisar
28
na internet, se é censurável ou desejável conseguir vídeos piratas ou baixar musicas
grátis? Que sentido tem fazer arte, exibi-la, ir vê-la ou não?” (2008, p. 13). Ao
mesmo tempo em que ele questiona qual seria o papel das artes, educação, leitura
etc. nesse novo contexto em que estamos todos mais próximos dos produtos
culturais por conta da internet, Canclini alerta para a necessidade de não pensarmos
os produtores e consumidores das novas mídias tecnológicas como “ilhas isoladas”.
A partir do conceito do flâneur8 do século XIX, que percorre as ruas, observando os
centros urbanos, descobrindo os saberes no vagar das suas ideias que passeiam
junto com o balançar do vai e vem dos seus passos, temos agora a ideia do flâneur
do século XXI que, pelo vai e vem dos seus olhos (SANTAELLA, 2004) exerce o seu
passeio pelos códigos binários informacionais, construindo saberes através dos
hiperlinks.
Para internautas, as fronteiras entre épocas e níveis educacionais se esfumam.
Apesar de que na web continua havendo brechas, tanto nos modos de acesso como
na amplitude e heterogeneidade de repertórios aos que chegam a setores diversos,
ao navegar ou “googlear” textos e imagens de diferentes épocas, a cultura dos que
são vizinhos e a dos que estão distantes tornam-se espantosamente acessíveis.
“Familiariza-se”. (CANCLINI, 2008, p. 52), ou seja, torna-se um viajante que recebe
as diversas culturas de forma natural, ou, pelo menos, de forma que parece ser.
Manuel Castells, sociólogo espanhol contemporâneo e autor da série “Sociedade em
Rede” pensa em um novo paradigma tecnológico – um novo contexto social e de
produção. Segundo ele, esse novo paradigma teria se firmado especialmente em
meados da década de 60 e início da década de 70, com o desenvolvimento das
pesquisas do que viria a ser a internet em 1969 e, dois anos depois, com o
desenvolvimento do microprocessador. Seria equivocado pensar que foram as
novas perspectivas tecnológicas quem regeram um novo paradigma educacional?
Vivemos um novo intervalo histórico, no qual uma série de acontecimentos nos faz
8
“Para o perfeito flâneur, para o observador apaixonado, é um imenso prazer para fixar residência em
que o número no ondulante, no movimento, no fugidio e ao infinito. Estar longe de casa e ainda
assim sentir-se em casa em qualquer lugar, ver o mundo, estar no centro do mundo e permanecer
escondido do mundo, tais são alguns dos prazeres menores desses espíritos independentes,
apaixonados, imparciais, que a linguagem pode definir, sem jeito.” Citação de Baudelaire disponível
em http://fr.wikipedia.org/wiki/Fl%C3%A2neur.
29
repensar as práticas antes cotidianas e mecanizadas alicerçadas pelo fordismo e
pelos meios de produção fragmentados e cada vez mais especializados.
(CASTELLS, 1999, p. 49).
Outros autores como o brasileiro Ismar Soares, professor titular da Escola de
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo – ECA/Usp, situam o
surgimento dessa relação de educação com comunicação e de rompimentos de
paradigmas entre o fim da década de 40 e o início dos anos 50. O certo é que, pós
2ª. Grande Guerra, tornou-se cada vez mais necessária a formação de seres
preparados para exercerem as mais diversas funções já que, em períodos de crise e
escassez de mão de obra, a valorização dos sentimentos de nacionalismo e
ufanismo, a construção de identidade, eram feitas nas salas de aula e pelos
noticiários radiofônicos. A nova proposta então, mesmo que ainda não tão
alinhavada, era romper com o modelo de mera produção de mão de obra e alimentar
um indivíduo que valorizasse, não só o papel que desempenhava em sociedade –
seja de operário ou de soldado – mas aquela sociedade em que ele desempenhava
esse papel. Sentimentos de apropriação de suas culturas, de seu território eram
propagados em campanhas nacionalistas que podiam ser vistas em bancas de
revistas, programas de TV, de rádio e, como não podia deixar de ser, na escola.
Cabe aqui pensar no questionamento apontado por Edgar Morin a respeito da
mudança de atitude frente aos novos desafios propostos pelos usos dos meios – e
não só por eles – para nossa sociedade, não estar atrelada apenas a educação e
sim na ação de respeitar as mudanças de paradigmas apontadas a partir das
minorias. Pensar nesse sentido nos leva mais uma vez a acreditar que o viver em
rede, pode sim ser uma grande chance de suplantar uma educação que não leva em
conta as minorias e identidades sociais realmente excluídas do processo
formacional. Porém o conceito de rede que discuto vai além da simples questão
tecnológica. Entendo que o mundo conectado e em rede, utilizando aqui termos
estritamente tecnológicos, não é um mundo tecnicista, mas menos fragmentado,
mais disperso, menos especializado em questões específicas, um lócus onde,
inicialmente, os saberes deveriam fazer parte dos interesses práticos de vida. Ao
que parece, o próprio mercado já entendeu esse preceito. Desde o das tecnologias
comunicacionais
(“viver
sem
fronteiras”,
“seja
multiconectado”,
“um
beijo
30
compartilhado em rede é muito melhor”)9, ao próprio mercado educacional que
sugere que “uma sala de aula sem paredes é muito melhor”10. Entendendo que num
mundo conectado, teoricamente, todos tem voz, estimular uma aprendizagem em
rede é estimular que as vozes diferentes – polifônicas – não se calem, não se
perpetuem nos processos de exclusão e marginalização. Contudo, não podemos ser
ingênuos e acreditar de forma utópica que o uso das tecnologias vai nos tornar mais
humanos e menos individualistas, sectários e desintegrados. Em 1999, quando boa
parte do que temos hoje como realidade tecnológica era apenas experimentado,
mesmo nos EUA, já se questionava o desequilíbrio que era promovido por
vislumbrarmos uma sociedade high tech. Jonh Naisbitt, ex-executivo da Microsoft,
escrevia nesse ano “High tech * Hight touch:
a tecnologia e nossa busca por
significados”, no afã de discutir o desequilíbrio promovido por uma sociedade
baseada apenas no tech, ou na “alta tecnologia”. Ele afirma:
Ao deixarmos de pensar sobre o todo, geramos desequilíbrios. O
importante é que temos hoje uma massa enorme de pessoas,
gerando soluções high tech impelidas pela “economia de merado”.
Proporcionalmente, há muitas poucas pessoas dedicadas a soluções
de problemas sistemáticos, que fazem as desigualdades do mercado
aumentarem. (...) É como se estivéssemos presos no círculo gerado
pela exploração tecnológica. Presos num mundo de ilusão. A
reversão para um círculo virtuoso passa pelo retorno à essência. E a
volta à realidade real. É o caminho do high touch (NAISBITT, 1999,
pgs. 11 e 12)
Por isso, institucionalmente, mesmo depois de passadas as necessidades ufanistas
demandadas pelas sucessivas guerras mundiais (encerrada a Guerra Fria,
inclusive), ainda acreditamos que a escola pode cumprir o seu papel auxiliando,
9
As empresas de telefonia mais populares no Brasil já apostam na capacidade de comunicar-se e
interagir em rede como um chamariz para aumentar as vendas. Para a Vivo, por exemplo,
conectados vivemos melhor. A Tim sugere que devemos “viver sem fronteiras”, numa alusão clara à
globalização, mas, também, às possibilidades de interação em rede. Oi e Claro seguem o mesmo
padrão. As empresas de softwares vão mais longe e propõe, de forma clara, a reformulação da
forma de educar seguindo um padrão apenas instrumental. No comercial do novo Windows 8, uma
professora, aparentemente do ensino fundamental I, explica as vantagens de se ter um computador
com o novo sistema operacional e encerra seu discurso para a câmera questionando: “Prova sem
papel e caneta. Já pensou?”
10
Na Bahia, o Centro Universitário Jorge Amado (Unijorge) lançou campanha publicitária divulgando
abertura do processo seletivo no vestibular em que um dos slogans, em diversas peças
promocionais, era “sou mais uma sala de aula sem paredes”, numa alusão a educação em rede.
31
como uma bússola, a nortear esse mundo tão rápido e conectado. Para isso,
formadores e educandos precisam pensar para além das hierarquizações, tão em
voga no início das relações entre os meios e as mensagens (McLuhan, 1964),
deixando de lado os anacronismos e dispersões dialetais que assustam tanto e a
todos, acreditando que:
Neste “cenário operativo”, a busca de soluções de alguns problemas
da ME [mídia educação] depende de uma consciência do momento
cultural atual e de sua promoção nos diversos contextos projetando
um modo diferente de fazer a sociedade, a escola, e a formação,
onde as mídias possam ser consideradas uma questão relevante
pelas interações, saberes e culturas que propicia e não só por seus
efeitos negativos. (FANTIN, 2005?, p. 13)
E essa busca de soluções só se daria a partir de dois momentos: um primeiro, e
talvez o mais difícil de realizar por ser o mais externo ao espaço escolar, envolve a
apreensão dos conceitos de identidades, experiências e valores sociais, tão
díspares e heterogêneos. Pensar em rede, em uma sociedade que entrelaça as
suas malhas através de nós apertados por vícios de capital – que ao mesmo tempo
exigem de cada um ser único e especial, despertando sentimentos de necessidade
de interação, aceitação e agregação para que possam consumir o que é produzido
em escala massiva – e da não interação, deve levar em conta que a relação entre a
mão de obra e a matéria no processo de trabalho envolve o uso de meios de
produção para agir sobre a matéria com base em energia, conhecimentos e
informação: a tecnologia é a forma específica dessa relação (CASTELLS, p. 34).
Ou seja, para atingir todas as diferentes camadas sociais, o saber deve estar
elevado ao padrão de consumo essencial. Como nos fazem acreditar que o efêmero
é imprescindível, podemos e devemos elevar o que aprendemos e apreendemos ao
patamar do utilizável, utilitário, formador. Quando alguma parte do ecossistema
social se sente deslocado do seu hábito de ação, torna-se um predador dentro
desse mesmo sistema. Geralmente esses predadores são vistos como outros,
estranhos, estrangeiros, alienígenas. Não levamos em conta que os outros – “eles”,
como o discurso nos tencionou a chamar – somos nós mesmos, numa realidade tão
32
próxima e clara quanto opaca e distante, tornada assim pelos processos de
manutenção de padrões realizados constantemente pelos veículos de comunicação.
Devemos pensar então em novas formas de interação social que não estejam
pautadas estritamente no consumo e a exclusão daqueles que se sentem alijados do
processo de manutenção dos padrões. Essas formas podem vir através da
educação,
mas
cabe
questionar
as
suas
demandas:
são
utópicas
ou
mercadológicas? A escola vai continuar existindo (e com ela o grande filão
consumidor) e seria possível continuar pensando em suas mudanças de perfil
tecnológico e prático sem pensar que nela se perpetuam mais um vetor de
consumo? Os educandos não deixam de ser consumidores, em momento algum, na
nossa sociedade. Os são em sala de aula porque a sociedade afirma que só com
formação adequada será possível tornar-se um funcionário remunerado o suficiente
para consumir. O são nas redes sociais porque se tornam nichos distintos que serão
tratados como tal pelas grandes empresas comunicacionais. Mas aqui temos uma
outra diferença entre os meios de comunicação e a escola. Enquanto as redes e os
meios de comunicação identificam as diferenças para tornar todos igualmente
consumidores (dentro das suas limitações), a escola formal, ainda no século XXI,
mantém separadas as limitações para tentar formar todos igualmente diferentes.
Um esquadrinhamento de como seriam realizados os procedimentos atuais de
leitura, qual o grau de interação na formação acadêmico/escolar e como eles podem
ser agregados ao procedimento de formação social, intelectual e cognitivo seria um
possível segundo passo. Elencando como esses processos se dão atualmente,
compreendendo quem é esse novo leitor/educando frente ao excesso de velocidade
e de informação, só a partir disso que a apropriação do que é importante, e do que é
formador de leituras de mundo poderá ser feito.
De antemão é importante destacar aqui uma diferença essencial: quando abordo a
perspectiva da educação a partir da utilização das tecnologias comunicacionais ou
das redes sociais em si, não levo em conta o processo de Educação à Distância
(EAD). Claro que, inicialmente, o que conhecemos como educação por
correspondência ou via rádio, ou até mesmo a atual educação feita através de
encontros on-line, com ou sem tutoria presencial esporádica, trata-se de uma forma
33
de superar as distâncias espaciais e propagar educação. Mas, no caso específico de
minha abordagem de pesquisa, não analiso aqui essa modalidade de educação que,
segundo MORAN (apud BARROS e CARVALHO, 2011, p. 212), caracteriza-se por
ser “processo de ensino-aprendizagem, mediado por tecnologias, onde professores
e alunos estão separados espacial e/ou temporalmente”. (Grifo meu). Ou seja,
nesse caso a distância medida em quilômetros, milhas, jardas, ou na quantidade de
“sal” que cada um recebe ao final de sua carga produtiva, do jeito que conhecemos
e estamos acostumados, é o fator preponderante para que aconteça essa
modalidade educativa. No caso das relações que envolvem o uso das tecnologias
em sala de aula, ou ainda, de redes sociais como mais um vetor educacional, não
falamos de distância e temporalidade nos sentidos geográficos e cronológicos das
palavras, até porque em termos líquidos (BAUMAN, 1998), distâncias, espaços e
temporalidades ganham novas configurações.
A ideia de Educação a Distância, segundo Börje Holmberg (1981), credita que, para
que o ensino aconteça, não é necessário o aporte do professor, mas sim um
material previamente construído por um educador, levando-se em conta, inclusive,
que o conceito de curso, nessa situação, seria de algo que ainda não aconteceu,
mas que já está formatado para ser recebido pelo educando. Essa talvez seja a
grande diferença do que é proposto pela Educomunicação e o EAD. Apesar de
entender que o educando torna-se o protagonista do processo – escolhendo a
plataforma, o horário e a forma como realiza o seu processo de leitura/aprendizado –
a partir da proposta do Ensino à Distância ele torna-se também autônomo e
dissociado de um ecossistema comunicativo e coletivo, pois o professor, nessa
modalidade, de forma distinta do que acontece em sala de aula por não estar
presencialmente, mas em processo análogo, exerce o papel de mentor ou, como
usado ordinariamente, o papel de Tutor.
Sem atribuir peso de qualidade para a proposta EAD, os seus preceitos entendem
que a interação e adequação ao saber devem ser regidas por métodos que incluem:
planejamento, procedimentos de racionalização, tais como divisão de trabalho,
mecanização, automatização, controle e verificação, parecidos com os aplicados aos
procedimentos de trabalhos industriais. O autor afirma ainda que o curso deve ser
auto-instrutivo,
numa
clara
oposição
ao
que
defendem
os
princípios
34
educomunicacionais – a serem elencados ainda nesta seção – não por
desconsiderar que as reflexões e ações individuais sejam válidas, mas por entender
que o conceito de sociedade em rede (CASTELS, 1999) é oposto ao da
individualização e do saber dissociado da interação com o grupo, o lócus ou o
ambiente sócio-identitário.
Finalmente, reforçando o que entendemos como princípio diferenciador entre a
proposta EAD e o processo que envolve a Mídia Educação (e especificamente os
processos educomunicativos), cito o que diz a Unesco a respeito do assunto:
Por mídia-educação convém entender o estudo, o ensino e a
aprendizagem dos meios modernos de comunicação e expressão,
considerados como parte de um campo específico e autônomo de
conhecimentos, na teoria e na prática pedagógicas, o que é
diferente de sua utilização como auxiliar para o ensino e a
aprendizagem em outros campos do conhecimento, tais como a
matemática, a ciência e a geografia. (UNESCO, 1984) (Grifo meu)
Ou, como afirmam Menezes, Martins e Braga (2013):
Quanto ao aspecto pedagógico de uma comunidade de
aprendizagem on-line, professores e planejadores de cursos podem
se valer de recursos da CMC11 para criar ou utilizar ambientes
(proporcionando aos aprendizes oportunidades de reflexão e autodirecionamento) (Apud SHEPERD e SALES, 2013, p. 209)
Seguramente, se mantivermos a confusão entre EAD e Educomunicação, cairemos
na armadilha mais feroz do processo educacional perpetuado ao longo de seis
décadas: acreditaremos que as ferramentas são mais importantes que os
personagens e voltaremos os nossos investimentos na aquisição de meios e não na
sua apreensão. Exemplos como esses não faltam. Um dos mais caros e mais
próximos de nossa realidade pode ser analisado no investimento feito pelo Governo
do Estado da Bahia, quando, com o pretexto de implementar Educomunicação nas
escolas públicas de todo o estado, adquiriu tecnologia de ponta, mas se esqueceu
11
Comunicação Mediada por Computador
35
do básico. O assunto virou tema de diversas matérias jornalísticas, mas cito
especialmente uma, veiculada no jornal A Tarde de 12 de abril de 2009, que dizia:
ESCOLAS RECEBEM TECNOLOGIA DE PONTA MAS FALTA O
BÁSICO – Estado opta por investir R$ 38 milhões em TV´s Pendrive,
mas faltam cadeiras, merenda e rede elétrica suficiente. (Jornal A
Tarde, 2009)
O nosso “novo mundo elétrico” impõe a apreensão dos meios como princípio básico
para uma política de formação e educação renovadora, tal e qual como a
Educomunicação vem se propondo a ser. O exemplo do Governo do Estado da
Bahia mostra que, não raro pensa-se que investir – financeiramente, deixe-se claro –
na aquisição de um material ainda desconhecido de alguns educadores para todas
as salas de aula da rede estadual de ensino pode, junto aos professores, servir de
estímulo para uma educação mais inovadora, inclusiva e cidadã.
Atrelada ao equívoco governamental – alicerçado por um sistema social que se
reforça em cima do modelo de acúmulo – de achar que apenas o meio (em 2009 a
TV Pendrive, hoje, os tablets para os professores) faria uma revolução no quefazer
educacional na Rede Pública Estadual (todas as salas de aula do estado tem a “TV
azul”, porém nem todos os professores foram capacitados a usá-las; existem salas
de aula que sequer tem rede elétrica com capacidade para receber o equipamento
ou ainda, professores não possuem o pendrive para usar junto com a TV ou, quando
o possuem, não foram capacitados para o uso do equipamento) estava a resistência
do educador, também exposta na matéria, de que a tal TV fosse substituí-lo em sala
de aula, diminuindo o seu potencial educacional ou, pior ainda, a necessidade de
que ele mesmo estivesse em sala de aula.
A resistência do professor, exposta em frases como “o aluno achou que a TV fosse
fazer o trabalho do professor” ou “não fomos preparados para receber o
equipamento” mostra o temor do educador “tradicional” (além do despreparo dos
poderes públicos junto à nova proposta educacional) e, principalmente, a sua
postura em se sentir apenas mais uma ferramenta, que pode ser substituída a
36
qualquer momento por uma mais moderna. Apenas uma educadora, das tantas
ouvidas pela reportagem, posicionou-se de forma crítica quanto à utilização da
ferramenta “educomunicacional” imposta pelo Estado da Bahia, parafraseando, de
forma espontânea, citação de Marshal McLuhan (1964) quando afirma que os meios
podem fazer muitas coisas, menos somar-se ao que já somos:
Não se trata apenas da máquina, mas de ressignificar a prática
pedagógica com novas formas de aprendizado [...] o pendrive é o
livro, é a mesma coisa. Você vai carregar o conteúdo ali dentro. O
que a gente deve se perguntar é o que o professor vai fazer com
isso? (Jornal A Tarde, 2009).
Os equívocos são tantos que chegamos a acreditar, como numa espécie de ficção
científica retratada nos filmes da década de 70 ou nos desenhos dos Jetsons, que
máquinas falantes, inteligentes e dotadas de sensibilidades poderão, de algum
modo, superar os diálogos, as sensibilidades e as interações cognitivas que
acontecem no exercício cotidiano da troca de saberes que acontece entre
professor/aluno ou, melhor definido, educador/educando. Alguns de nós, realmente,
acreditam que tecnologias não são extensões dos homens! Devemos pensar como
nos deixamos endurecer de tal forma que, muitos de nós passamos a achar que
mais do que meras ferramentas, as tecnologias de comunicação e conhecimento
estabeleceram um campo de guerra entre os saberes. A tecnologia está posta e a
consumimos, mas não precisamos apenas ser meros consumidores. Podemos ser
programadores,
administradores,
construtores
e
refletores
em
rede,
mas,
principalmente, reflexivos frente a ela.
2.1 VIRTUALIZAÇÃO E HOMINIZAÇÃO: LEVY E FREIRE
A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí
que a posterior leitura desta não possa prescindir da
continuidade da leitura daquele. (Paulo Freire)
Nosso “novo mundo elétrico” está às portas, sem necessariamente novos mundos
serem criados para adaptar-se a tal. Esse novo mundo precisa ser aberto à
37
observação, participação e conversação – usando um termo caro a Larossa, que o
prefere ao quase sinônimo “diálogo” – constante, entre todos os atores envolvidos
nele, para que mudanças significativas sejam percebidas.
Segundo SANTOS (2001):
Moran sobre isto afirma que as mudanças podem ser periféricas ou
profundas: são periféricas quando o uso das TI [tecnologias de
informação] restringe-se ao manuseio do equipamento (ver um
programa de TV, assistir a um vídeo, aprender a usar um programa
de computador) ou pior, apenas à presença física dos equipamentos,
pois não são utilizados. As mudanças profundas ocorrem quando
realmente existe interação entre os atores educacionais e a
máquina, sendo esta utilizada como estruturante do saber.
(SANTOS, 2001. p.25) (Grifo meu).
Para entender o momento atual dos enfrentamentos educacionais, precisamos
pensar em como chegamos a eles. Teóricos das áreas da Comunicação e da
Educação concordam (aliás, não só dessas áreas, mas a cito especificamente por
ser uma fusão delas o meu objeto de pesquisa) que o final do século XX e início do
século XXI foi o momento do corte, de transformação e mudança de paradigma para
as práticas informacionais e educativas. Não há um consenso quanto ao termo.
Alguns usam as palavras em seu contexto mais fatalista, como os apocalípticos, que
acreditam que a exposição constante às mídias – na década de 50 à TV; nas
subsequentes, ao cinema mais veloz e menos autoral; e a partir da década de 90 à
internet e às redes sociais – reforçou o declínio do pensamento crítico dos jovens e
acelerou esse processo de ruptura com as práticas reflexivas e educacionais.
Acredito que pensar nesse sentido é um equívoco. Pensemos que BENJAMIN
(1930?) já decretava o fim da experiência narrativa por causa do surgimento do
romance e jornal impresso e ela não acabou de fato, apenas de adequou. Assim
aconteceu com o suposto fim do rádio por causa do cinema, deste por causa da TV
e por aí adiante. Ou, como afirma BAUMAN (2004):
Seria tolo e irresponsável culpar as engenhocas eletrônicas pelo
lento mas constante rumo da proximidade contínua, pessoal, direta,
face a face, multifacetada e multiuso. E, no entanto, a proximidade
38
virtual ostenta características que, no liquido mundo moderno, podem
ser vistas, com boa razão, como vantajosas. (p. 84)
Como Bauman, tantos outros acreditam que a era do virtual seja a onda onde toda a
humanidade pode surfar, agregando conceitos de interação sem limites e sem
exclusões, pensando sob uma perspectiva transformadora e geracional. Prefiro
coadunar com o pensamento destes últimos, sem, entretanto me deixar levar por
excessos de “romantismo” de que fazem prova tecnocratas ao afirmarem que a
solução está nos tablets por aluno ou em TV´s Pendrive em todas as salas de aula,
ou ainda em “estudos” rasos e “revolucionários” que alardeiam, sem muita
contestação por parte de grande parte dos nossos pares em sala de aula, por
exemplo, “que o uso do gadget na educação aumenta a criatividade e motivação dos
estudantes. Por isso, não resta dúvida: os tablets vieram para revolucionar, são a
mídia do futuro, uma tendência como ferramenta didática.”12
Busco consolidar essa visão, de forma crítica e estabelecendo pontos que possam
apoiar soluções humanistas, em dois autores que abordam a ideia de atrelar
conhecimento de mundo e identidades plurais à vivência escolar e às praticas
educacionais – ainda que não utilizem como nomenclatura para suas ideias o termo
“Educomunicação”: Pierre Levy e Paulo Freire.
Somos seres sociais e detentores de saberes, mesmo antes de estarmos no
ambiente formal de apreensão destes. Isso é um conceito freireano, defendido em
seu clássico “A importância do Ato de Ler” (2005), especialmente, mas em tantos
outros livros do autor, que nos remetem a práticas libertadoras, cognitivas, mas,
especialmente, comunicativas.
A educação fabril ou bancária, como bem definiu Paulo Freire, porém, estabelece
uma outra relação do indivíduo com a sociedade. Essa relação não seria de
apropriação, reflexão ou questionamento, mas de estagnação frente ao novo,
alienação de força de trabalho e criação de pensamento pouco analítico acerca do
12
Exortação contida em matéria veiculada no Blog Mais Estudo, intitulada “Geração Tablet”.
Disponível
em
http://blog.maisestudo.com.br/tabletfaculdade/?utm_source=Facebook&utm_medium=facebook&utm_campaign=fanpage
39
mundo que o cerca. Ela serve como mais um instrumento de regulação (BAUMAN,
1998), de formação de controle sobre o indivíduo, de criação de mão de obra
alienada e alienante e de uma reprodução de cultura onde o oprimido nunca
consegue assumir o papel de opressor porque, não raro, não sabe quem
desempenha esse papel. É essa educação fabril, que há muito tempo vem sendo
contestada, que não leva em conta as características culturais do indivíduo, as
informações que ele traz ao longo de sua vida ou que ele recebe, numa velocidade
cada vez maior na busca e criação de conhecimento.
LEVY13 situa um dos momentos dessa ruptura com a relação de saber deslocado da
realidade quando diz que “após o fim dos anos 60, começamos a experimentar uma
relação com o conhecimento e com o savoir-faire ignorada por nossos ancestrais”
(1999, p. 173). Essa relação ignorada é justamente a que desvincula educação de
comunicação, comunicação de oralidade, oralidade de conhecimento, conhecimento
de educação... esta relação não leva em conta a ideia de que a formação de
conhecimento é cíclica, e não surge como tábula rasa – o indivíduo recebe a
educação em sala de aula e só nela a adquire – mas por elementos que estão ao
redor, acima e por trás do indivíduo, sejam no seu passado ou no conhecimento que
ainda virá a ser adquirido.
Outra perspectiva importante para se pensar em rede e em individualidades
coletivas – na verdade um contraponto à ideia de que a tecnologia, por si só, pode
ser “tolerante”, “agregante” ou ferramenta de voz aos excluídos é a levantada
também por Pierre Levy em “As árvores do Conhecimento”. O francês aborda a
questão das múltiplas identidades e, assim como Castells, que afirma que
quando a rede desliga o Ser, o Ser, individual ou coletivo, constrói
seu significado sem a referência instrumental global: o processo de
desconexão torna-se recíproco após a recusa, pelos excluídos da
lógica unilateral de dominação estrutural e exclusão social”. (p. 41)
13
Em Cibercultura, Pierre Lévy aborda os papéis dos novos veículos das mídias, da Cibercultura, na
sociedade atual. No capítulo XII ele fala sobre as “Árvores do Conhecimento”, uma espécie de
“dispositivo informatizado em rede que tende a acompanhar, a integrar, a colocar em sinergia, de
forma positiva, todos esses processos”.
40
Levy acredita que em uma sociedade em rede – em vias informacionais – essas
múltiplas identidades tendem a ser escamoteadas, tendem a ser engolidas e
moldadas para tornar-se blocos de características uniformizantes e socialmente
regradas ou ditadas.
Entretanto, o modelo de software sugerido por Levy e Authier remonta ao saber
latino e grego, onde o ser – desta vez em caixa baixa por estar se referindo
especificamente à pessoa, e não aos anseios mais íntimos ou individuais – é
valorizado pelo saber que carrega e não pelo poder aquisitivo que tem para obtê-lo.
Segundo Levy, esse modelo de saber em árvore – clara referência ao processo
biológico do saber enraigado, mas que frutifica e gera mudas, ramas, galhos, etc –
pode ser aplicado às mais diversas modalidades de discussão informacional, dentro
de um contexto educativo escolar clássico ou não. São mostradas fábulas e
parábolas do conhecimento, ligadas ao consumo, ao aprendizado, à competitividade
coorporativa ou multinacional.
A metáfora da árvore aplicada por Levy na criação de um software que pudesse
agregar e disseminar saberes sem qualificá-los ou hierarquizá-los em currículos
escolares ou programas educacionais nos remete, claramente, à famosa analogia
feita por Paulo Freire de como ele se torna um leitor de mundo muito antes de
frequentar o ambiente escolar e se tornar um leitor de “palavras”:
Fui alfabetizado no chão do quintal da minha casa, à sombra das
mangueiras,com palavras do meu mundo e não do mundo maior dos
meus pais. O chão foi meu quadro negro, gravetos o meu giz.
(FREIRE, 2005, p. 15)
Assim como Levy, Freire acreditava que a valorização do saber individual era ponto
importante para a manutenção de um diálogo educacional bem sucedido, onde o
educando pudesse passar do papel de mero recebedor e repetidor de informação e
saber determinado por um currículo – que não raro está quase de todo deslocado de
sua área de saberes e voltado apenas para a necessidade de atender a uma
demanda mercadológica ou social – para o papel de protagonista no exercício de
41
comunicar e compartilhar. Uma sociedade que se embasa em apenas uma
determinada gama de saberes para montar um determinado currículo (que opta por
valorizar a álgebra ao invés da agricultura, por exemplo) reforça a ideia de exclusão,
mantendo um nicho de consumo, que causa o abandono e o fracasso das práticas
educacionais.
O próprio Freire dá o alerta:
Em sociedade que exclui dois terços de sua população e que impõe
ainda profundas injustiças à grande parte do terço para qual
funciona, é urgente que a questão da leitura e da escrita seja vista
enfaticamente sob o ângulo da luta política a que a compreensão
científica do problema traz a sua colaboração (FREIRE, 2005, p. 9)
Quando pensado no âmbito do virtual ou do virtualizante, o saber e o conhecimento,
não raro, são entendidos como banais e, como dito no início dessa seção, na cota
das informações excedentes. A construção de um conceito de que a educação em
rede é mero consumo, é da cota do banal ou não está na categoria do curricular é
tão equivocada quanto achar que ela vai nos trazer para o mundo sem fronteiras,
como o da propaganda da empresa de telefonia.
Essa construção é falha desde as academias, quando somos obrigados a escolher o
que queremos ser quando mal começamos a saber quem somos, quando a
construção da identidade consigo mesmo e com a sociedade ainda estão sendo
criados. Passamos uma boa parte da vida escolar negando aquilo que acumulamos
ao longo da vida social e, ao entrarmos na vida acadêmica, negamos mais uma vez
esses saberes. Ou seja, deixamos de lado o poder humanizante do saber e
passamos apenas para o que virtualmente poderíamos adquirir com o acúmulo do
saber deslocado do que já vivenciamos. Fugimos, como educadores – seja no
âmbito das paredes ou dos chats – do que é proposto por Freire ao acreditar que o
ato de educar não deve estar restrito apenas à repetição de palavras, fórmulas e
conceitos. Deixamos de levar em conta o real sentido da palavra decorar, ou seja,
aprender com o coração. E esse tipo de apreensão só surge quando o conceito a
ser apreendido deixa de ser virtual (hipotético, arquetipal, inexistente) e passa a ser
42
considerado como algo humanizante. Talvez, maior equívoco esteja no fato de
alguns professores – alguns diretores, alguns coordenadores, muitos políticos
gestores de educação pública e privada – acharem que a simples imposição de
meios tecnológicos no ambiente escolar, sem preparar o educador para as questões
mais elementares, como a valorização das culturas locais e individuais, dos saberes
locais ou dos recursos oferecidos ao seu redor, antes negados no percurso de
formação, são tão importantes quanto “o saber” que cita Freire para que haja o
aprendizado.
Educomunicar é mais que implantar infocentros, comprar computadores ou produzir
jornais, vídeo, rádio, TV: é abrir espaço para que os saberes sejam compartilhados e
transformados em experiência. É a experiência que nos torna humanos,
hominizados, que nos tira do espaço virtualizante dos “hipoteticamente num
ambiente sem atmosferas” dos enunciados da física, por exemplo, e nos remete
para o processo de reproduções do que realmente é aprendido. É com a palavra que
o homem se faz homem (FREIRE), mas a palavra não pode nem ser vazia de
sentido, nem apenas virtualizante de algo inexistente. Mais uma vez, ponto para as
redes sociais que, tornam o virtual real quando aproximam as sensações
impossíveis e difíceis de ser alcançadas para muitos, das naturais, corriqueiras e
cotidianas. Não à toa, Zuckerberg criou o Facebook para se sentir socializado dentro
de um ambiente de socialização desumanizado.
2.2 SALAS OU CHATS?
A princípio, a pesquisa Redes de Leitura aponta uma queda no número de leitores,
afirmando que, comparados com dados de 2008, menos pessoas afirmam terem lido
pelo menos um livro por ano. A pesquisa leva em conta apenas leitores de livros,
não levando em consideração o fato de que, a todo instante, fazemos uma leitura de
algo. Mensagens na internet, propagandas na TV, no rádio, no outdoor, páginas de
jornais, revistas e periódicos. Leitores constantes, que não param de ler. Livros
físicos são apenas mais um instrumento nessa sociedade midiatizada, mas, como
afirma Canclini (2008), são considerados como ilhas isoladas, descontextualizadas
dos processos de leitura de mundo atual. Eis que surge o novo desafio educacional:
agregar as experiências de leitura feitas constantemente com os da leitura didática,
43
permitindo ao aluno/leitor maior discernimento no processo de catalogação da
informação.
Nem os hábitos atuais dos leitores-espectadores-internautas, nem a
tensão das empresas que antes produziam em separado cada
mensagem permitem agora conceber como ilhas isoladas os textos,
as imagens e sua digitalização. (CANCLINI, 2008, p. 34)
Ainda segundo CANCLINI (2008), existem dois tipos de leitores: leitores fortes e
leitores fracos. Os fortes seriam aqueles extensivos ou intensivos, que leem com
frequência e aprofundam os seus processos de leitura. Já os fracos seriam os que,
segundo o autor, sentem que perdem tempo com “livros de adulto”. São os leitores
que passam mais tempo conectados com os novos media, que romperam com as
barreiras de territorialidade através da internet, que não entendem o fato de estarem
presos a apenas um suporte físico, o livro, quando podem, ao mesmo tempo, ver,
ouvir, interagir, navegar. São aqueles que acreditam no rompimento das barreiras
espaciais das salas e preferem a liquidez dos chats.
É nesse processo contínuo de interação que ele, esse leitor fraco, está mais exposto
ao que poderia ser considerado lixo. Sem critério, mas com interação, ele tem à sua
frente uma biblioteca imensa, onde o que é real e o que é virtual se misturam. A falta
de barreiras dos chats permite que a experiência de ler/entender o mundo seja feita
de forma mais interativa e menos limitada, ou, como afirma BAUMAN
Nós entramos nos chats e temos “camaradas” que conversam
conosco. Os camaradas, bem como sabe todo viciado em chats, vem
e vão, entram e saem do circuito – mas sempre há na linha alguns
deles se coçando para inundar o silêncio com “mensagens”. No
relacionamento “camarada/camarada”, não são as mensagens em si
mas o seu ir e vir, sua circulação, que constitui a mensagem, não
importa o conteúdo.” (2004, p. 52)
Essa interação não deve ser deixada de lado no momento em que esse leitor deixa
o seu espaço virtual e sem barreiras e adentra para o espaço físico da escola. O
44
professor passa a ter à sua frente um leitor alinear, que entende pouco de muito.
Hipertextual, mas desprovido de ferramentas para fazer uso adequado desse
excesso de conhecimento.
Elisabeth Lima (2008) vai afirmar que:
“... é necessário recordar que a internet surgiu sob a utopia de
incorporar todo o conhecimento humano, uma espécie de hiper
biblioteca, que forneceria ao leitor virtual a possibilidade de navegar
e interagir com todo o conhecimento produzido pelo homem do
passado e do presente. No entanto, a prática revelou que a internet
se assemelha mais a uma grande enciclopédia, reunindo um
significativo repertório cultural, mas abrigando indiscriminadamente o
trash, ou seja o lixo cultural que invade a web, tornando-a território
livre e sem controle. É nesse ponto que o navegador necessita ser,
antes de tudo, um leitor atento e crítico do universo da cibercultura,
conhecendo suas demandas próprias e suas ciladas” (LIMA, 2006, p.
11)
No âmbito educacional, ainda está nas mãos do educador o papel de mediar a
formação desse leitor descrito por Lima como um navegador que, num ambiente tão
“livre e sem controle”, deve apurar seu senso crítico. Sobre a formação do leitor, é
consenso de que é na escola que deve acontecer essa mediação de forma mais
apropriada. Afinal, onde, senão no local de apropriação de saber – não só ele, mas o
institucionalizado – que os processos de catalogação deveriam acontecer? Novas
formas de pensar educação estão sendo discutidas aqui. Mais que a exposição
continuada dos temas, de forma linear, com avaliações pontuais e quantitativas. É
necessário pensar educação como mais um processo comunicativo, talvez o mais
importante, porque é a partir dele que o que é apenas imagem passa a ser
significado, o que é apenas palavra passa a ser texto.
Em seu artigo “Meios de Comunicação a serviço da educação (Pedagogia dos
meios)”, MATTOS (1995) vai elencar as inúmeras possibilidades do uso das TV's
educativas e do sistema radiofônico em sala de aula. Pode parecer algo retrogrado
quando pensado no ano de publicação do artigo, mas ainda é a forma como as
esferas públicas de poder pensam quando se fala em educação atrelada a
45
comunicação. O investimento nesse sentido é feito na aquisição de material
tecnológico, computadores, TV's, equipamentos radiofônicos, tablets. Sugata Mitra14,
pesquisador de tecnologias educacionais relatou, na edição do Campus Party 15 de
2012 que os experimentos que realiza há 15 anos mostram que, quando as crianças
são expostas a um computador num lugar público, aprendem sozinhas a utilizá-lo e
há um desenvolvimento muito rápido da capacidade de leitura, aprendizagem e de
responder a perguntas. Novos equipamentos são adquiridos todos os dias pelos
governos estaduais e municipais, mas, em contrapartida, o tema “Educomunicação”
ocupou apenas quatro páginas da cartilha criada pelo Governo Federal em 200816.
O texto de MATTOS parece tão tecnocrata quantos as afirmativas de Mitra, mas o
primeiro dá o alerta para o que deveria ser a práxis educacional:
Devemos lamentar o fato de que também, nós, educadores, não
estamos sabendo ainda usar devidamente o potencial pedagógico
destes veículos. Exatamente por isso precisamos lutar para engajar
nossas escolas no progresso tecnológico de nosso tempo,
procurando desenvolver tecnologias alternativas, através das quais
possamos usufruir dos benefícios dos meios de massa no processo
de ensino aprendizagem, na perspectiva de universalização das
oportunidades educacionais. A educação é a solução para todos os
nossos problemas. (MATTOS, 1995, p. 196)
A escola já é esse lugar de formação de um leitor crítico, que deixa de ser o que
LIMA (2008) denomina como “leitor/navegador”, em oposição ao “leitor/imersivo”.
Para servir de mediador nesse local, onde leitores navegam pelas ondas de
informação ao invés de imergirem mais profundamente nos conhecimentos, numa
sociedade dominada pelo hipertextual – usando o termo cunhado pelas pesquisas
de Vannevar Bush – é necessário que o educador se aproprie de alguns princípios
14 Em entrevista concedida ao portal do Jornal O Globo.
15
A Campus Party é um evento criada há 16 anos na Espanha, e que acontece há seis edições no
Brasil. Atrai anualmente geeks, nerds, empreendedores, gamers, cientistas e outros profissionais
da área de tecnologia e comunicações para acompanhar atividades sobre Inovação, Ciência,
Cultura e Entretenimento Digital. Informações http://www.campus-party.com.br/2013/o-evento.html
16
Cartilha criada pelo Governo Federal para orientar as escolas quanto a construção das
conferências escolares de Meio Ambiente.
46
norteadores, para que ele mesmo não se sinta “afogado” num mar de excessos e
“lixo”. A Educomunicação propõe esses princípios, deslocando o papel de detentor
do poder do conhecimento do professor para todo o ambiente de formação,
proporcionando a todos os atores envolvidos nesse processo uma maior mobilidade
nessa torrente que não para de invadir os ambientes virtuais e físicos. Ele próprio –
o educador, que para a Educomunicação passa a ser um “educomunicador” precisa estar ciente de que, assim como o aluno, é um alvo permanente dessas
torrentes de mídia.
O educomunicador que, segundo COSTA (2008), deveria ter entre suas atribuições:

introduzir as mídias existentes na sala de aula, transformando ou acolhendo
os meios de comunicação como mais um material didático, junto com livros,
cadernos, etc;

capacitar o professor a utilizar a tecnologia da comunicação para elaborar
seus próprios materiais pedagógicos. Para tanto a autora sugere que a
vontade política – traduzida como o desejo de ser capaz de criar projetos
inovadores e eficientes usando ferramentas pouco usuais – é mais importante
que a própria habilidade em manejar tais equipamentos tecnológicos;

estimular a produção e apropriação de veículos de comunicação pelos alunos
também seria atributo desse profissional, destacando que, mais importante
que o produto final desse estímulo é o processo de criação, que fará com que
os envolvidos construam novos conceitos, despertando o lado critico que irá
proporcionar ao aluno a capacidade de apropriar-se do conhecimento,
podendo fazer uso dele não só em ambientes escolares, mas quando a
oportunidade surgir;

por fim, seria também atributo desse profissional trabalhar a comunicação em
todo o espaço educativo – além das paredes da sala de aula e com todos os
atores desse processo, como outros professores, diretores, coordenadores e
pais,
proporcionando
“ecossistemas
assim
comunicativos”
“canais
de
(SOARES).
troca
Essa
de
informações”
última
função
ou
do
educomunicador reforça o seu papel de operário social, que deve interagir em
todos os espaços, e não só nas salas de aula.
Essas, talvez, sejam as tarefas mais difíceis. O educador, não raro os casos, põe-se
no papel do preso da Alegoria da Caverna, de Platão, com medo do conhecimento
47
novo que se apresenta. Ao invés de tomar como mais uma fonte de saber e
ferramenta de mediação os media, o educador se opõe a elas, ou apenas as agrega
em momentos lúdicos, desassociados do contexto educacional. Talvez isso ocorra
porque ele próprio, o educador, ainda não saiba fazer a correta distinção entre o que
é lixo e o que é informação palatável.
Os atuais processos tecnológicos têm aberto portas para infinitas possibilidades. Os
limites territoriais agora se tornam líquidos, aproximando pessoas, derrubando
barreiras, aumentando o fluxo de imagens, informações e velocidade com que essa
informação é enviada, acessada, comentada, modificada.
O educando imerso nesse novo mundo também é novo. É um personagem desse
novo contexto. Um personagem que não lê, mas é considerado leitor. Que não
navega, mas é considerado navegador. Que não produz, mas é considerado, não
raros os casos, como produtor de lixo e, ao mesmo tempo, está imerso nele. Vive a
ilusão de que ao toque de um mouse ou o piscar de uma tela, terá ao seu alcance
toda a informação que possa acessar. Mas entende que precisa de uma mediação.
Mesmo para aqueles que defendem a tecnologia como maior aliada da educação
atual – e que o professor perder o seu papel para uma máquina é algo plausível –
concordam que, mais do que uma máquina, o futuro do conhecimento está numa
mudança de perfil: dos educadores, das formas de avaliação, dos processos de
criação e disseminação do saber.
Educar, ensinar a ler – meios, palavras, “saber em árvores”, mais que forma de
disseminação de informação, deve ser pensada como define LAROSSA (2004, p.
316), afirmando que
ler serve, sobretudo para se fazer perguntas. E não importa se são
novas perguntas ou se são perguntas de sempre. E o caminho do
pensamento tem a ver, parece-me, com chegar às próprias
perguntas, ou à própria formulação das velhas perguntas.
48
Os tecnocratas também pensam assim:
A solução é: professores, façam uma boa pergunta que motive os
alunos! Certa vez eu perguntei a crianças na China como o iPad
podia saber a localização delas. Após meia hora de pesquisas na
internet, eles responderam, corretamente, que era por meio de três
satélites. Então eu perguntei por que o iPad não usava apenas dois
ou 20 satélites para fazer isso. Eles pesquisaram de novo e
descobriram que era por causa de algo chamado trigonometria. Aí eu
falei para o professor de matemática deles: a porta está aberta.
(Sugata Mitra, 2012)
Se a solução passa pelo mundo das perguntas, devemos estar atentos então aos
questionamentos que deixamos de fazer quando deixamos de agregar o novo, ou
quando colocamos o temos como conhecimento base de lado. O desafio
educomunicacional talvez seja como desafio empírico, descrito por BACHELARD
(1996): um desafio que propõe conhecer para melhor questionar. Cabe a nós,
educadores, abrirmos nossas bem cheias cabeças para o novo, entendendo que ele
sempre se tornará novo, num exercício cíclico de pesquisa e saber.
49
3 A DIVERSIDADE DOS CANAIS: PROJETO GENTE, YOUTUBE, SALMAN KHAN
E FACEBOOK
“Margie, não podemos economizar com os meios
que irão educar os nossos filhos”.
(Diálogo entre Homer e Margie Simpson, sobre
contratação de serviço de TV a cabo, no episódio
Bart vs.Lisa vs.3ª série)
A sociedade do século XXI, conhecida como sociedade da informação e do
espetáculo, tornou-se refém das novas tecnologias ou as molda a partir de suas
necessidades? Manuel Castells em A sociedade em Rede (1999) afirma que, na
verdade, não existe esse dilema, pois a sociedade é a tecnologia.
Somos os
aparelhos, os produtos, as invenções que criamos, que usamos para tornarmos as
distâncias menores, os espaços menos delimitados e as fronteiras menos visíveis. O
pensamento do autor coaduna com o de Marshall McLuhan, quando afirma que o
meio é a mensagem – ou de forma mais ampla – que as tecnologias só passam a
existir porque nós existimos. Coaduna, também, com o que afirmam Levy e Lemos
(2010) o questionar o futuro da internet. Os autores, assim como tantos outros
entusiastas das tecnologias informacionais, afirmam que estamos caminhando para
uma sociedade onde as configurações de tempo e espaço, entre outras, por conta
das cibervias e ciberculturas, estão sendo reformuladas de modo que passemos a
entender que o tempo, agora, é um tempo do “real”, palpável e imediato, enquanto
que o espaço é virtual, assando para o campo daquilo que é imediatamente sensível
ou entendível, ou seja, semântico (p. 225).
Reproduzimos isso em nossas relações mais primárias (pessoais, de trabalho, com
a natureza, com as coisas). Essa forma tecnológica e automatizada com que
passamos, no século vigente especialmente – digo isso porque o nosso processo de
automatização e tecnologização vem sendo construído desde os primórdios do
século XIX, com a Revolução Industrial – nos dá uma ideia de urgências e
emergências, urgências essas que perdem o seu real sentido de existência quando
postas à luz da clareza e do criticismo.
50
O senso crítico mais “apurado” pode evocar a rigidez das formas de agir pautadas
em padrões seculares para dizer que a sociedade high tech não muda as formas de
convivência em sociedade, muito menos de aprendizagem. Isso nos põe frente a um
desafio que consiste em enfrentar as teconofobias, termo cunhado pelo cientista e
escritor de ficção científica Isaac Asimov. Para o autor, célebre por ter escrito o
compilado de contos futuristas “Eu, Robô” e ser o responsável pela propagação das
Três Leis da Robótica17 – e tão entusiasta quanto a maioria dos teóricos citados
nesse trabalho da relação homem/tecnologia – o medo das tecnologias, ou
tecnofobia, nos impede de aprender e apreender o possível a respeito dessa
relação, por questões que vão do medo de perder definitivamente o “poder” e o
“espaço” de decisões para as máquinas aos dilemas espirituais/religiosos/filosóficos.
Penso que o desafio que está posto para toda sociedade, e especialmente para nós,
educandos e educadores, para que não pensemos que somos os únicos seres
escravizados pela evolução tecnológica, é o de mediar esse conflito. Ainda citando
Lemos e Levy, a tendência nos tempos atuais é que todas as organizações
instituídas clássicas tornem-se redes sociais, e, principalmente, redes de
compartilhamento de saberes e conhecimento on line. Num mundo em que as
relações vão estar além das fronteiras geográficas, podemos pensar que a
reconfiguração de conceitos de tempo e espaço se dá de forma que pensemos que
tudo é urgente, emergente e instantâneo. Desta forma, compartilho da opinião
publicada recentemente pela articulista Eliane Brum, em artigo para a Revista
Época, intitulado “É urgente recuperar o sentido de urgência”. Falando sobre essa
sensação de que tudo é muito rápido e muito urgente e, por nos permitirmos estar
conectados 24 horas, somos escravizados pelas urgências alheias – ou das coisas
que não são tão urgentes assim – ela afirma:
Vivemos ao mesmo tempo o privilégio e a maldição de
experimentarmos uma transformação radical e muito, muito rápida
em nosso ser/estar no mundo, com grande impacto na nossa relação
com todos os outros. Como tudo o que é novo, é previsível que nos
atrapalhemos. E nos lambuzemos um pouco ou até bastante. Nessa
17 “1- Nenhum robô pode ferir um ser humano, nem permitir que sofra, por inação, qualquer dano; 2Um robô tem que obedecer às ordens que lhe forem dadas pelo ser humano, a menos que
contradigam a primeira lei; 3- A obrigação de cada robô é preservar a própria existência, desde que
não entre em conflito com a primeira ou a segunda lei.” (ASIMOV, 2006).
51
nova configuração, parece necessário resgatarmos alguns conceitos
para que nosso tempo não seja devorado por banalidades, como se
fosse matéria ordinária. (BRUM, 2013)
Para ela, a grande solução foi abandonar as benesses da tecnologia. Não usa
celular, mal atende ao telefone fixo, só marca e acerta compromissos por email. Ou
seja, uma solução tecnofóbica, uma forma de regresso à sociedade quase primitiva,
onde o homem, por medo do novo, se recolhia e excluía do processo de
transformação e interação, justamente por não saber lidar com ele. Não acredito que
a solução esteja em atitudes tão drásticas, até porque a tecnologia é e continua
sendo uma realidade cotidiana no mundo, mesmo que nos neguemos a usá-la. Mas,
nessa discussão a respeito da utilização de forma a não nos escravizarmos pelos
meios, ela chega a uma questão chave: o senso crítico no uso dos meios. Para que
pensemos como o uso das mídias em sala – ou a relação educacional em rede –
pode ser pensada de forma critica, recorro mais uma vez aos princípios
educomunicativos, já listados nessa dissertação.
Uma das linhas de articulação teóricas da Educomunicação, apontada por Ismar
Soares em livro de mesmo nome (2011) indica a vertente como sendo um campo de
interface. Ou seja, o papel da Educomunicação, como já dito anteriormente em
diversos pontos, não seria apenas instrumentalizar ou agregar ferramentas ao fazer
educacional, mas estabelecer cruzamentos entre o campo da educação e da
comunicação e, principalmente, das tecnologias comunicacionais e das redes de
interação social, de modo que possamos ser usuários críticos dos meios, desde os
processos de aquisição até os de criação e aprendizado virtual e virtualizante. O
autor exemplifica tal interface da seguinte forma:
A Educomunicação, ao reconhecer e codividir tais preocupações,
situa-se a partir de seu lugar específico, que é a interface.
Reconhece, em primeiro lugar, o direito universal à expressão, tanto
da mídia quanto de seu público. No caso, mais especificamente o
direito do público, levando em conta que o sistema vigente
desconsidera essa hipótese. Em decorrência, fará todo o esforço
necessário para ampliar o potencial comunicativo dos membros da
comunidade educativa e – no contexto de seu espaço privilegiado
que é a escola – de todos os membros desta comunidade, sejam
docentes ou discentes, ou, ainda, a comunidade do entorno.
(SOARES, 2011, p. 18. Grifo meu)
52
Entretanto, o educador pode pensar que, assim como muitas coisas se
revolucionaram socialmente a partir do uso constante das tecnologias (os conceitos
de tempo e espaço, por exemplo) o seu papel também se adequa à nova realidade.
Ao contrário disto, o seu papel nessa situação é tão mutável quanto o de todos os
personagens sociais envolvidos nesse processo de transformação em que estamos
inseridos. Ele, mais que os produtores de tecnologias, passa a ser o grande
mediador desse processo, pois é a partir de educação para os meios – educação
crítica, dotada de múltiplas leituras de mundo, que proponha uma interface e
discussão direta entre aquilo que acreditasse ser descartável e aquilo que
acreditávamos ser essencial – é que os cidadãos do terceiro milênio passarão de
meros escravos alienados pelas máquinas para usuários atentos ao mundo
tecnológico e a cibercultura.
O papel da Educomunicação – e das vertentes educacionais que pensam a
educação em rede – seria de auxiliar na formação desse novo personagem, que se
junta aos já existentes, tentando construir um roteiro que desmonte o já habitual, de
sala de aula entre paredes, aprendizado orientado, tempo de avaliação e saber
compartimentado. Analisando algumas experiências de educação que utilizam a
rede como ferramenta, escopo e até mesmo ponto de partida, pude perceber que os
princípios educomunicativos são universais, mesmo quando adotados sem uma
definição explicita do termo. E que, apesar de termos diferenças sociais que nos
remetem a contextos de educação formal bastante diferenciados, o que se desenha
como desafio do século XXI para a forma de educar é o mesmo em qualquer lugar
do mundo: quebrar com os velhos roteiros de aprendizado, entendendo os novos
personagens que foram formados a partir da relação de saberes e da torrente de
informações.
Isso se daria através do exercício do diálogo mútuo entre os envolvidos nos
processos transformadores vigentes. O caráter dialógico das novas mídias e do
século da informação, por consequência, é bem claro. Deixamos de lado o conceito
de mídia massiva, onde a interação se dava pela emissão direta de uma mensagem
para um grupo massivo e visto como uniforme e passamos para uma época onde
todos, potencialmente, são geradores de informação, de forma heterogênea e
difusa. Como educadores, vide experiências analisadas a seguir, ainda nos sentimos
53
bastante perdidos com esse excesso de mensageiros. Afinal, acreditávamos que
esse era o nosso papel, de grande emissor de formação e (in)formação. Nessa
perspectiva, o processo dialógico era apenas um ensaio, não uma realização
concreta do fato. Talvez, nisso, resida o grande vácuo existente entre os
personagens/alunos do século XXI e os professores: os alienígenas sem sala de
aula já se apropriaram dos canais dialógicos tecnológicos com naturalidade ímpar.
Ou porque já nasceram sob o signo da informação, ou porque entenderam
rapidamente que a “ética da inteligência coletiva é uma ética de diálogo, uma
espécie de ‘netiqueta’ suprema” (LEMOS E LEVY, 2010, p. 233).
3.1 NOVOS PERSONAGENS, VELHOS ROTEIROS
É uníssono entre os autores que versam sobre o uso das tecnologias em rede que
um novo perfil de educador deve ser pensado, frente à realidade tecnológica, em
rede e sistêmica do século vigente. Enquanto PIVA Jr., em seu livro voltado
especialmente para os educadores brasileiros e os dilemas da nova “sala de aula
digital” (2013), vai afirmar que esses profissionais serão os “facilitadores de
aprendizado”, os estudiosos a respeito da Educomunicação vão chamar esse perfil
de novo profissional de “Educomunicador”, conforme já explicitado na seção 2.
Entretanto, mediando ou passando a cumprir um novo papel dentro do ambiente de
aprendizado, esse novo profissional não é o único novo personagem a ser
incorporado no ambiente educativo. Como dito acima, é apenas através do diálogo
entre os envolvidos que a nova realidade educacional será melhor recebida, com
perspectivas de superação do nó górdio vigente no sistema atual. Ou, como afirma
CUNHA (2013) em dissertação sobre o tema:
Se fundamentarmos o processo educativo no diálogo, a comunicação
refaz o elo entre o professor e o aluno. Essa conexão também se dá
no ciberespaço, ambiente acolhedor à troca e ao compartilhamento,
onde as relações se horizontalizam. O desencontro entre professor e
aluno, hoje, se dá à margem das tecnologias. (p. 83)
Para ilustrar esse descompasso listo abaixo, relatos de quatro cenas – três ficcionais
e uma real – de ambientes de aprendizagem, com seus novos cenários e seus mais
variados personagens do século XXI que nos remetem ao novo perfil de educando:
54
Cena 1: Ainda de farda, aluna, aparentemente do ensino médio, com traços
andróginos, fuma escondida num canto da piscina da escola. Em cena anterior,
havia citado trechos de autores niilistas em sala de aula, questionando a dualidade –
e a não multiplicidade – das questões da vida, e, por fim, comparando o mundo
conectado a uma imensa sociedade capitalista que só se preocupa com os três
elementos que movem o capital: o individuo, a guerra e o consumo. Enquanto a
menina fuma, não se sabe o que pensa. Nenhum narrador ou voz em off explana o
que passa por suas ideias. Seus colegas, jovens da mesma idade e da mesma
classe, a encontram nessa posição e a espancam, de forma humilhante e vil. Ela
parece reagir friamente, como a água da piscina que passa a exibir o seu reflexo,
sem chorar ou reagir. Quando as agressões e insultos cessam, ela volta para a
borda da piscina, reacende o cigarro e permanece, calada, sozinha em seus
pensamentos...
Cena 2: Alunos de uma mesma escola vivem uma série de conflitos típicos de sua
idade. Drogas, separação dos pais, descoberta da sexualidade – sua e daqueles
que os cercam – sentimentos de deslocamento social. Enquanto lidam com os seus
conflitos, são expostos aos conflitos dos outros, através de vídeos viralizados
através de celulares de última geração. Nenhum de seus medos e experiências é
novidade para o período, desde que a adolescência foi reconhecida pela
Organização Mundial de Saúde como fase imprescindível para a formação do
caráter humano. Mas, nesse contexto, são as suas formas de lidar com esses
conflitos que definem os rumos dessa história. E tudo é compartilhado – através das
redes e dos canais de comunicação – entre eles.
Cena 3: Um professor de literatura e gramática, alunos. Alguns novatos, outros
oriundos de classes antigas, mas da mesma escola. Nessa instituição, o fardamento
não os distingue, pois ele não é cobrado. Cada aluno sem fardamento é um
fragmento de uma determinada esfera social. Demonstram tédio ao aprender, e,
talvez por isso mesmo, questionam metodologia, aplicabilidade social do que está
sendo dito, posição de poder em sala de aula... Uma delas quer saber porque os
exemplos usados pelo professor trazem nomes americanos para os personagens.
Um outro registra a aula, a sala, o intervalo, os colegas, a mãe e tudo o mais que
55
ocorre na sua vida com o seu celular multitecnológico. O professor, um adulto jovem,
sente-se ao mesmo tempo refém de uma situação com a qual não sabe lidar e
libertador desses alunos, jovens seres humanos tão diferentes entre si e com
desejos tão iguais de interação e aceitação. O desconforto evolui até gerar o
embate. Catarse.
Cena 4: Alunos produzem textos em sala de aula. A maioria já saiu da adolescência,
mas muitos deles ainda estão no momento de transição entre a vida adulta e os
hábitos infantis. A maioria acabou de sair do nível médio, estão iniciando os passos
na trajetória acadêmica. Todos muito jovens, conectados, descolados. A ideia da
aula é a escrita livre, com um tema, mas sem sugestão de forma. Uma escreve uma
poesia. O outro, um conto. A menina escreve um roteiro de clipe, com direito à trilha
sonora e tudo. Todos leem. Alguns choram. Outros riem. Na era da conexão, a
professora pede que montem um blog, ou uma página no “Face”. Eles aceitam, mas
não se sabe por que, não executam a tarefa de alimentar a página com suas
produções cotidianamente. Alguns dizem que não se sentem muito “pertencidos” ao
propósito. A professora leva os instrumentos para a sala de aula: o computador, a
internet... a internet institucional é ruim, a solução é usar o sinal que vem do celular
de um deles (!). Como numa imensa lan house, eles começam a se divertir (com
horário cronometrado). Dentro dos limites do espaço cibernético e da sala de aula,
sentiram-se, finalmente, integrados ao projeto...
As quatro cenas relatadas são recortes que retratam a realidade social e
educacional de jovens contemporâneos. São, na ordem, trechos de um seriado 18,
filmes19 e de uma experiência real20, todas realizadas ou vivenciadas nessa primeira
metade de um século que já nasce sob a égide de ser o século da informação. Os
relatos são globais. Mudam-se os cenários (Salvador, São Paulo, Paris...), mas, em
todas as cenas, guardados os marcadores geográficos e sociais, temos realidades
bastante semelhantes. Se lidássemos apenas com uma história, a sinopse
envolveria o cenário como as salas de aula – espaços que não comportam mais o
18
A menina sem qualidades, MTV Brasil, 2013.
19
As melhores coisas do mundo (Brasil, 2010) e Entre os muros da escola (França, 2008).
20
Experiência de utilização da rede em sala de aula realizada junto à turma de RP da Uneb, Campus
I.
56
tempo de aprendizado dos alunos – e dois protagonistas antagônicos (em tempos
líquidos, é difícil definir papeis de forma maniqueísta, com mocinhos e bandidos): o
educando e o educador. Enquanto o primeiro tenta lidar, ao mesmo tempo, com as
mudanças impostas pelo tempo e pelo espaço e com o engessamento dos
programas educacionais mundo afora, o segundo usa as mudanças tecnológicas
como aliada para melhor entender o mundo em que está inserido.
Algumas experiências vêm sendo realizadas em busca de possíveis soluções para
essa questão. Uma delas é a utilização do Facebook em sala de aula – experiências
que serão ponderadas na seção 4, numa perspectiva de avaliação dos signos e dos
símbolos, com apoio das teorias semióticas. No Brasil, temos diversos exemplos
sendo analisados, tanto no campo das políticas públicas como sob perspectivas
mais teóricas, mas talvez o de maior visibilidade seja o Projeto do Ginásio
Experimental de Novas Tecnologias Experimentais, implementado no Rio de Janeiro
no ano de 2012. O Projeto Gente, como é chamado, segue os moldes da escola da
Ponte, em Lisboa, que acredita que o aluno “deve estar no centro do processo de
aprendizagem”, como afirma o vídeo disponibilizado no site do projeto 21. São
atendidas escolas municipais da cidade do Rio de Janeiro, abordando uma proposta
que
consiste em conceber e desenvolver um novo modelo de escola que:
inova na arquitetura do prédio escolar; se apropria integralmente de
novas tecnologias educacionais; promove inovação curricular; coloca
o aluno no centro do processo de aprendizagem e tem ênfase na
formação dos professores.
O Projeto Gente, apesar de aplicado nas escolas municipais da cidade do Rio de
Janeiro, é um projeto financiado por instituições privadas – incluindo Ong´s – o que
nos
leva
mais
uma
vez
a
questão
do
incentivo
da
relação
educação/tecnologia/consumo. Não nos surpreende perceber que tal iniciativa é
apoiada financeiramente principalmente por um instituto de uma grande empresa de
cosméticos nacional, mesmo estando dentro do que planeja a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação, quando afirma , como princípios da educação nacional.
21
http://www.institutonatura.org.br/projetos/projeto-gente/
57
Figura 1
Página Inicial do Projeto Gente
I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola
II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, a
arte e o saber
III – pluralismo de ideias e concepções pedagógicas
IV – respeito à liberdade e apreço à tolerância
V – coexistência de instituições públicas e privadas de ensino
VI – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais
VII – valorização do profissional da educação escolar
VIII – gestão democrática do ensino público, na forma desta lei e da
legislação dos sistemas de ensino
IX – garantia de padrão de qualidade
X – valorização da experiência extra-escolar
XI – vinculação entre educação escolar, o trabalho e as práticas
sociais (Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, grifos meus)
A LDB estabelece a Educação como uma tarefa a ser partilhada entre o Estado (ou
seja,atribuições repartidas entre as diferentes instâncias governamentais - União,
Distrito Federal, Estados e Municípios) e a sociedade. É o que acontece no caso do
Projeto Gente, que implementa ações de interesse público, fomentadas por
instituições privadas da sociedade civil organizada, de modo a fomentar,
principalmente, os princípios 3, 10 e 11 (grifados na citação), da Lei homologada em
58
1996. Entretanto, experiências como a do Rio de Janeiro, que poderiam se tornar
políticas públicas de Estado e até mesmo do Governo Federal, encontram em
sucateamento de equipamentos, má utilização da verba pública para implantação de
equipamentos de ponta e falta de capacitação de professores e profissionais
dedicados a lidar com as novas tecnologias, entraves graves (vide seção 2, exemplo
da “TV Pen Drive” no Estado da Bahia). Quando se espelha no projeto da Escola de
Ponte, de Lisboa, que existe há 40 anos, o escopo do projeto Gente se torna
abrangente. Entretanto, um caso de sucesso que não é levado adiante ou expandido
numa perspectiva de política de Estado que ainda segundo Lemos e Levy também
deve ser reformulado a fim de atender as prerrogativas da sociedade da informação
vigente torna-se só mais um caso inovador. Por em prática o diálogo, acima dos
percalços vigentes é necessidade dos projetos como o Gente. E é isso que o
aproxima dos ideais educomunicativos e do que está sendo planejado há duas
décadas pelas leis educacionais brasileiras.
3.2 TEMPO: O MOVIMENTO É INVERSO?
“As escolas do futuro apresentarão aulas em
circuitos fechados de TV e todos os alunos
aprenderão os fundamentos da tecnologia dos
computadores.” (Isaac Asimov, em texto escrito em
1954, sobre como seria a educação em 2014)
Levar em conta a perspectiva do tempo nas relações com as redes é o mesmo que
estabelecer uma nova relação de sistematização de prioridades ou de prazeres.
Tempo, na definição (ou no sentido) cronológico, nos remete a frações lineares
(minutos, segundos horas) que devem ser organizadas de forma sistemática, a fim
de que possamos fazer uso adequado de frações – porções – maiores de tempo
(dias, meses, anos) que, agregados, formam outras sequencias maiores de tempo
(décadas, séculos, milênios). Ou, numa perspectiva mais humana e prática, o
conjunto de momentos se tornará apenas um complexo e emaranhado conceito do
que seria a vida.
59
Ora, nos encontramos então, numa dicotomia filosófica: levamos tempo/horas
(minutos, segundos, dias, meses, anos...) organizando a nossa vida para que
possamos vivê-la. Em educação esse tempo Cronos, então, é mais cruel ainda:
formulamos o saber em níveis ou ciclos – que à primeira vista dão uma ideia de
saber circular, mas, na verdade, nos remetem apenas a algo que começa e termina,
não que retorna e se mantém continuamente – unidades e horários. Para a
educação formal, o saber é compartimentado e fracionado, levando-se em conta o
principio romano da divisão do tempo – em partes e frações. Ou, como afirma a
LDB, aprovada em 1996, a configuração legal de tempo escolar torna obrigatório o
cumprimento de 800 horas efetivas de aulas por ano, com 200 dias letivos.
Temos, então, o horário de Português, de Matemática, de Física, de História etc.
Horários que não se encontram, a não ser quando um termina para o outro começar,
mantendo os saberes guardados em seus compartimentos isolados, como se o
saber precisasse ser isolado para se manter organizado. Na já citada coletânea de
entrevistas realizada por Viviane Mosé a respeito dos desafios da educação no
século XXI, todos os educadores ouvidos pela educadora questionam, de alguma
forma, como o tempo é tratado como aliado ou inimigo no processo de construção
do saber.
Legal e multidisciplinarmente, no Brasil, com a LDB, temos instituído o saber
interdisciplinar e transversal, que sugere uma direção oposta à da fragmentação
temporal e conceitual. Entretanto, o sinal de alarme dos nossos corredores
escolares (outra reprodução do sistema fabril do século XIX) não nos deixa esquecer
da imposição de Cronos em nosso dia a dia educativo. Temos um enfrentamento,
como afirmam FERREIRA e ARCO-VERDE
Embora legalizadas e implantadas tanto as propostas que organizam
o ensino em ciclos, como as de extensão da jornada escolar, sabe-se
que o enfrentamento de novos tempos e de novas práticas no âmbito
das escolas não se dá de forma linear. Não há desdobramentos
mecânicos, previsíveis, que possam ser resumidos em aceitar ou não
as reformas educacionais. Existe uma cultura escolar construída que
não se destrói, pelo menos imediatamente, com a regulamentação
de políticas públicas. Os profissionais de educação têm explícita ou
implicitamente suas crenças e opiniões, além de estarem sujeitos às
60
pressões das instituições políticas, sociais e da própria instituição
escolar e seus mecanismos de coerção. (2001, p. 13)
Porém, discentes são experientes em subverter as lógicas impostas como regras. Ao
que nós, professores, consideramos prova de desatenção, explicitada através das
conversas paralelas, da abstenção da sala de aula, ou até mesmo da presença
física enquanto que as ideias fluem – flanam – em outros espaços não
reconhecíveis, é entendido pelos discentes como pluralidade no uso do tempo. A
prática docente nos apresenta isso cotidianamente, nas mais diversas formas:
alunos que realizam atividades de uma disciplina no “horário” da outra; assuntos que
fogem do que é estipulado pelo currículo trazidos à luz no momento das
explanações teóricas... Não raro, mais que nós, docentes, nossos educandos
entendem que o viver é inter, multi, pluri. Espertamente eles se apropriam do “sinal
do tempo” quando lhes é adequado, quando já se sentem fartos daquele saber
especifico e desejam ir embora. Qual tempo seria o mais adequado a se pensar no
princípio do saber? Deveríamos propor uma inversão no processo de utilização do
tempo?
Quando a tecnologia nos traz uma nova forma de encarar o tempo – nos lembrando
que ele pode ser Cronos, mas também é Kairós22 - novas possibilidades educativas
podem se apresentar. Um dos primeiros exemplos que nos chamaram atenção
nesse processo de mudança na relação tempo/espaço escolar foi a experiência
proposta pelo Norte-Americano Salman Khan. Em 2008, ao perceber dificuldades de
um sobrinho em lidar com os assuntos abordados nas aulas de matemática, ele
resolveu criar vídeos tutoriais com experiências de fórmulas matemáticas aplicadas.
O jovem os assistia e passou a compartilhá-los no Youtube, para os colegas.
22
Há várias versões disponíveis sobre a relação entre os tempos Cronos e Kairós. Na Wikipédia,
conta que Kairós era o filho de Cronos. A enciclopédia colaborativa ainda afirma que “Os gregos
antigos possuíam duas palavras para a moderna noção de tempo": chronos e kairos. Enquanto a
primeira era usada no contexto de tempo cronológico, sequencial e linear, ao tempo existencial os
gregos denominavam Kairos e acreditavam nele para enfrentar o cruel e tirano Chronos. Enquanto
o
primeiro
é
de
natureza
quantitativa,
Kairos
possui
natureza
qualitatitva
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Kairós). Já ASSMAN apud FERREIRA e ARCO-VERDE (2001, p. 7)
afirma que “no grego bíblico, há distinção nítida entre Chrónos e Kairós, em que Káiros
significaria:tempo do Dom, hora da graça, da salvação; tempo propício, dia da libertação; hora da
“visitação”; momento em que “o anjo passa”; dia do Senhor; shabat; jubileu. Kairós representa o
tempo subjetivo, vivencial. A junção de Chrónos e Kairós é traduzida pelo poema bíblico: Tudo tem
o seu tempo”
61
Figura 2
Página Inicial da Khan Academy no Brasil
O site da instituição afirma que:
No Brasil, a experiência de maior alcance é a da Khan Academy:
mais de 10.000 alunos, de 8 a 10 anos de idade, de escolas públicas
do Ceará ao Paraná puderam aprender matemática com o auxílio de
uma plataforma de exercícios, vídeos e colaboração online. Os
professores têm informação em tempo real sobre os alunos e podem
incorporar à sua estratégia de aula maneiras de garantir o progresso
de cada aluno. A partir de janeiro, a plataforma ficará aberta
gratuitamente na internet e chegará a 100 mil alunos. (...) Desde
2012, escolas públicas brasileiras usam a plataforma de
exercícios similar à disponível na Khan Academy em inglês. Hoje
mais de 10 mil alunos de 3º, 4º e 5º anos dos estados de São Paulo,
Paraná e Ceará participam do projeto Khan Academy nas Escolas. O
objetivo é contribuir para a melhoria do desempenho dos alunos em
matemática e experimentar a metodologia em sala de aula, com a
formação e a contribuição dos professores. Na ferramenta, cada
aluno avança no seu próprio ritmo, assistindo aos vídeos e fazendo
os exercícios correspondentes. Já os professores monitoram a
aprendizagem de cada estudante em tempo real. Isso permite um
planejamento de aulas personalizado, considerando as dificuldades e
as demandas individuais. Assim, os professores podem intervir com
aqueles que apresentam mais dificuldade ou estimular quem já pode
avançar para o próximo assunto. No início do ano letivo de 2014,
plataforma de exercícios e relatórios estará disponível em português,
62
gratuitamente na internet. (...) Você pode usar os vídeos como
preferir: para reforçar o que aprendeu na escola, para relembrar algo
que já estudou, ou como ferramenta para aprender com orientação
de um professor, dentro ou fora da sala de aula. (...)
No projeto Khan Academy nas Escolas, a plataforma de exercícios e
relatórios serve como ferramenta para o professor monitorar o
aprendizado dos alunos e para planejar as aulas, considerando as
dificuldades e necessidades de cada um.(...) Sem dúvida, com o
planejamento e orientação do professor, o aprendizado é muito
maior.” (site da Khan Academia no Brasil)
A ideia inicial de dar um suporte extra-didático a um aluno que não conseguia
exercer o diálogo prático entre o saber institucionalizado e as suas vivências se
expandiu e deu origem a um projeto que já atinge diversos países, como o Brasil. A
experiência abriu espaço para que diversas plataformas voltadas antes para o
entretenimento disponibilizassem canais de vídeos educativos ou de educação à
distância (mais uma vez não confundir com o Ead), de forma gratuita. O Youtube
lançou, no fim de 2013, um canal dentro do site onde vídeos educacionais, das mais
diversas modalidades estivessem agrupados, especialmente para alunos do ensino
médio, podendo ser acessados de forma fácil e em qualquer lugar em que haja
conexão com internet.
Figura 3
Página inicial do Youtube Educação
63
Apesar de ser bastante acessível e encantador, devemos sempre nos ater ao alerta
dado por ADORNO (1995, p. 122) quando afirma que os meios são fetichizados,
porque os fins, que representam a vida humana digna, encontram-se encobertos e
desconectados da consciência das pessoas. Nesse sentido, parece fundamental
indagar: se o tempo contado pela “inquestionável ciência exata” é hoje questionável,
relembrando que PRIGOGINE anuncia que “o tempo é criação”, poderia a escola
ousar romper as amarras do tempo e redimensionar sua prática? Parece-nos que o
futuro da escola e de seus tempos permanece aberto...
São vários os exemplos de plataformas digitais e redes de relacionamento que são
utilizadas atualmente. Gráfico (Figura 4) de site especializado em educação afirma
que 2014 será o ano da utilização, simultânea, de inovações tecnológicas,
experiências, inovações e maior investimento na humanização da educação.
Plataformas de aprendizado como o Mooc, que oferecem cursos on line e gratuitos
de diversos centros de ensino do mundo (entre eles renomadas universidades como
Oxford e Harward) e sites que agregam videoaulas e tutoriais dos mais diversos
versando sobre assuntos que vão desde os tratados frequentemente nos currículos
escolares – geometria, álgebra, regras gramaticais e ortográficas – aos que são
desenvolvimentos principalmente para estimular a capacidade cognitiva e criativa
são abertos diariamente, tornando acessíveis à pessoas – especialmente aos jovens
– saberes que vão do aritmético ao evolutivo/espiritual.
Entretanto, as experiências relatadas nessa seção e as que serão analisadas na
seção 4 fazem parte desse estudo, especialmente, por se tratarem de exemplos que
ilustram de forma bastante clara as rupturas literais entre espaços delimitados por
paredes e ciclos – como no caso do Projeto Gente – ou invertendo a lógica do tempo
linear empregado nas salas de aula, nos casos da Khan Academy e do mais recente
Youtube Educação.
64
Figura 4
Gráfico sobre tendências educacionais para o ano de 2014
Nos casos específicos das abordagens que usam como plataforma em rede o site
de relacionamentos Facebook (na Escola Ana Lúcia Magalhães e na Turma de
Relações Públicas da Uneb), a serem analisados, nos chamou a atenção o fato de
os símbolos de sala de aula e espaço legal de aprendizado serem remodelados e
readaptados – ainda que de forma bastante incipiente – para atender às
necessidades de ambiente de relacionamento em rede. Relacionamentos esses que
se iniciam e se mantém na esfera do contato “olho a olho”, por assim dizer, e se
reconfiguram e se adaptam no contato “face a face” ou, ainda, “post a post”. Em
termos mais técnicos, numa interação Comunicação Mediada por Computador, para
não ilustrar tais situações comunicacionais com os termos “real” e “virtual”,
respectivamente.
65
4 A SALA DE AULA DO 9º ANO DA ESCOLA ANA LÚCIA MAGALHÃES: UM
“BAÚ DE RETALHOS” NO FACEBOOK E NO BLOGSPOT
“A informação é essencialmente uma questão de
linguagem, e a linguagem não é transparente no
mundo, ela apresenta sua própria opacidade através
da qual se constrói uma visão, um sentido particular
do mundo.” (Patrick Charaudeau)
Uma nova configuração educacional está em andamento. Ela surge por meio da
utilização, seja oficialmente instituída ou não, dos meios eletrônicos, das redes
sociais e das ferramentas multimídia e hipermídia em sala de aula. Como vimos, o
processo não é novidade. Como educadores, devemos nos apropriar o máximo
possível das novas práticas tecnológicas a fim de conseguirmos utilizar a linguagem
vigente no século XXI. Pensemos de modo pragmático: será que os usos das redes
sociais como instrumentos educativos estão sendo feitos de forma a colaborar com a
dialógica educacional, como proposta por Paulo Freire e Pierre Levy ou estariam
apenas à disposição de uma novidade tecnológica e de consumo, a fim de que
governos expandam as suas possibilidades de vendas/compras de equipamentos?
Para responder a essas perguntas, devemos levar em conta alguns processos de
interação que seguem passos – provavelmente lineares. Primeiro: o uso das mídias,
em especial das redes sociais – inicialmente o Orkut e os blogs e fotologs, depois
Twitter, Facebook, Instagram, Tumblr, Flickr, e tantas quantas existirem – como
ferramenta de aprendizagem e extensão do espaço da sala de aula foi se impondo
aos educadores como algo necessário e urgente. Estudantes tem acesso às redes
sem sair de suas carteiras escolares, em seus celulares, tablets, palmtops23. Em
2011, segundo a última pesquisa Retratos de Leitura no Brasil, o país tinha o título
de quinta maior população em redes sociais do mundo. Diante do crescente uso
desse tipo de mídia pelos discentes – para entretenimento, acesso a informação,
relacionamento interpessoal – os educadores do século XXI que não querem perder
23
Segundo a pesquisa Perfil da Juventude Brasileira, publicada em 2013, 91% dos jovens tem celular
e 21% deles usam para acessar a internet.
66
o seu espaço dentre das linhas da sala de aula se viram obrigados a apreender a
linguagem midiática que estava sendo utilizada pelos estudantes.
Porém, em alguns casos, a construção feita pelos discentes e docentes do espaço
de aprendizagem, como num ciclo reprodutivo, repete ou legítima os processos
didático-pedagógicos realizados em sala de aula.
Um exemplo disso foi a propagação da utilização de plataformas de interação
educacional/pedagógica
nos
ambientes
escolares/acadêmicos,
muitas
vezes
visando uma certeza de que a utilização das redes sociais seriam suprimidas dos
atos de interação escolar e pessoal por essas plataformas. O professor Nelson
Pretto narra um exemplo de como soa equivocada essa lição em artigo intitulado “A
vida no Orkut: narrativas e aprendizagens nas redes sociais”24:
Estava em minha sala de um prédio totalmente vazio, conectado no
moodle25, um dos ambientes da disciplina, esperando algum sinal
dos alunos, nesse semestre, a maior parte deles, do Curso de
Pedagogia. (...) No ambiente coletivo, onde a princípio todos os
alunos poderiam e deveriam estar, apenas duas alunas. Uma delas
me pergunta no chat: “e aí, profe (sic), vai ter aula hoje?! É que estou
aqui com outros colegas da disciplina no Orkut e todos se perguntam
a mesma coisa”. (...) O fato concreto é que o ambiente “educacional”
moodle não se constitui no ambiente de interação para essa turma
jovem – os nossos estudantes (...) – que, em vez disso, estavam
todos se comunicando, interagindo e, especialmente, vivendo um
outro espaço no mesmo ciberespaço. Ou seja, estavam todos no
Orkut que se constituía, naquele e em muitos momentos, o
verdadeiro ambiente de vivência e aprendizagem. (PRETTO, 2013,
p. 190)
24
O texto escrito por professor Nelson Pretto serve de apresentação para livro homônimo, organizado
por Edvaldo S. Couto e Telma B. Rocha, editado pela Edufba em 2010. A rede social mais popular
no Brasil, à época, era o Orkut, sendo que mais da metade dos usuários eram brasileiros.
25
“MOODLE é o acrônimo de "Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment", um software
livre, de apoio à aprendizagem, executado num ambiente virtual. A expressão designa ainda
o Learning Management System (Sistema de gestão da aprendizagem) em trabalho colaborativo
baseado nesse programa, acessível através da Internet ou de rede local. Em linguagem coloquial,
em língua inglesa o verbo "to moodle" descreve o processo de navegar despretensiosamente por
algo, enquanto fazem-se outras coisas ao mesmo tempo. Utilizado principalmente num contexto
de e-learning ou b-learning, o programa permite a criação de cursos "on-line", páginas de
disciplinas, grupos de trabalho e comunidades de aprendizagem, estando disponível em 75
línguas diferentes. Conta com 25.000 websites registrados, em 175 países.” (definição disponível
na página da Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Moodle)
67
O exemplo dado por Pretto ilustra a realidade cotidiana dos nossos educandos. Se
você está lendo esta dissertação no ano de 2014, quando ela foi redigida, sabe que
o Facebook é a rede social que mais cresce no Brasil atualmente. Mas se você está
em um outro momento de leitura, talvez num futuro não muito distante, basta
substituir o termo “Facebook” pela rede social que estiver “bombando” no momento!
Então, se os discentes estão nas redes sociais e os professores já sabem disso (e
na maioria das vezes também estão lá), basta irmos até onde eles estão e falarmos
a linguagem deles para começarmos a caminhar em passos largos para tornarmos a
educação mais interativa, participativa e dialógica? Basta aceitarmos o desafio
imposto pelas tecnologias, perdermos o medo de sermos substituídos pela máquina,
inserir uns “emoticons”, neologismos e “kkk´s” em nossos planos de aula e, voilà,
nos aproximaremos da perspectiva educomunicativa atendendo às expectativas
vigentes?
A partir da análise de uma sala de aulas de Língua Portuguesa que se propõe para
além das paredes da escola e de uma página no Facebook e blog criados por
discentes da disciplina Oficina de Produção Textual, oferecida pelo curso de
Relações Públicas da Universidade do Estado da Bahia, pretendo avaliar o quanto
de repetição e legitimação de padrões vigentes e o quanto de “práticas
educomunicativas” podem ser construídas numa interação que leva em conta o uso
das redes sociais como instrumentos dialógicos educacionais, propondo a formação
de uma rede educativa.
Adotando como base as práticas da observação participante, tomo como objetos de
análise o grupo criado por uma Professora de Língua Portuguesa da Escola
municipal Ana Lúcia Magalhães, no município de Lauro de Freitas, no Facebook,
com o objetivo de reunir os alunos do 9º. ano do Ensino Fundamental II em ambiente
virtual, para onde as atividades e discussões propostas em sala de aula seriam
estendidas; e a página na mesma rede social produzida e gerenciada por estudantes
do primeiro semestre do ano de 2013 do curso de Relações Públicas, oferecido pelo
Departamento de Ciências Humanas do Campus I da Universidade do Estado da
68
Bahia (Uneb, Salvador)26. O estudo se baseará nos estudos semióticos de Charles
Sanders Pierce, especialmente nas tríades primeiridade/secundidade/terceiridade e
sin-signo/quali-signo/legi-signo.
Sendo a semiótica a ciência detida ao estudo dos signos, ícones e seus significados
conceituais, acredito que analisar as representações feitas pelos membros desses
grupos, numa perspectiva observante (no caso da página dos estudantes da Escola
Estadual de Lauro de Freitas) e observante-participativa (no caso dos graduandos
em Relações Públicas da Uneb), me daria algumas respostas para as questões
levantadas quanto as possíveis formas de apreensão do uso das redes sociais no
quefazer educativo. Coadunam com o meu pensamento OROFINO, ao afirmar que
A semiologia, enquanto teoria geral dos signos nos possibilita
compreender as unidades mínimas de significação (signos) e suas
articulações entre si na construção de representações. Ela nos
permite, também, compreender a arbitrariedade de determinadas
opções, nos revelando o caráter social e histórico (portanto,
potencialmente transformável), da construção das linguagens e das
relações entre significantes e significado (2005, p. 94)
e FANTIN (2005?) também coaduna quando afirma que:
Na relação da ME27 e das ciências da comunicação a grande
contribuição reside inicialmente no campo dos estudos semióticos,
pois é da semiótica que a ME extrai uma metodologia de análise
dos textos, reconhecendo os elementos gramaticais, os códigos
e estruturas narrativas de um texto (ampliando o conceito de
textualidade, fazendo análise estrutural da imagem, análise da
narrativa - seus personagens, ação e transformação -, e análise
pragmática) e reconstruindo a estratégia de comunicação utilizada.”
(FANTIN, 2005?, p. 7. Grifo meu)
Essa análise que Fantin afirma ser dos códigos e estruturas da narrativa e Orofino
destaca como possibilitadora de interpretações das “unidades mínimas de
significação” é que vai permitir que vejamos onde estamos apenas mudando as
26
Todas as informações levadas em conta para esta parte da nossa análise foram coletas das
referidas páginas, por isso são de domínio público.
27
Mediação Educacional.
69
ideias de lugar – saindo das salas e levando para as redes – e onde estamos
apreendendo a linguagem dos “nativos digitais”. Se até mesmo os responsáveis pela
manutenção da rede social no ar – Mark Zuckerberg e seus executivos – já
entendem que a rede não deve se limitar ao mero entretenimento e consumo,
lançando uma cartilha28 sobre a possível aplicação dela como ferramenta educativa,
devemos pensar quais as reais possibilidades dessa ferramenta, levando em conta
as relações imagéticas e que fazem referência aos signos que ela reproduz.
Seria demasiado prolongado expor aqui as vertentes semióticas e seus preceitos
nessa seção, fugindo, inclusive, do objetivo primeiro dessa pesquisa, que se
pretende como um estudo de práticas educacionais atreladas ao uso das novas
mídias e não um estudo sobre as teorias de linguagens. Entretanto, é importante
delimitar o porquê de a Semiótica Pierciana ter sido a vertente escolhida para
analisar as práticas educacionais nos dois casos por mim propostos, ao invés de
utilizar, por exemplo, uma vertente mais comumente utilizada pelos estudos que
versam sobre leitura e produção textual, como a Semiótica Sausseriana, por
exemplo.
Primeiro, optar por estudos baseados nas tríades de Charles Sanders Piercie nos
permite analisar conceitos de lei, legitimação, simbolização e ícone, enquanto que a
dicotomia sausseriana reflete apenas a respeito dos signos e seus significados.
Segundo, que, enquanto a Semiótica Sausseriana aposta em discussões de sentido
psicológico e/ou de natureza associal, podemos afirmar, através de SOUZA que
28
“Em nossas conversas com professores, muitos disseram que estão buscando maneiras de
entender melhor os novos estilos de aprendizagem digital dos alunos. Os educadores também
expressaram que estão interessados em aprender a integrar o Facebook em seus planos de
ensino para enriquecer a experiência educacional dos alunos, aumentar a relevância do conteúdo
e incentivar a colaboração efetiva dos alunos com seus colegas. O Facebook pode fornecer aos
alunos a oportunidade de apresentar suas ideias, conduzir discussões on-line e colaborar de
forma efetiva. Além disso, o Facebook pode ajudar você, como educador, a se familiarizar com os
estilos de aprendizagem digital dos seus alunos. Por exemplo, isso pode facilitar a colaboração
entre os alunos e fornecer maneiras inovadoras para você envolver os alunos em sua matéria.
Também acreditamos que o Facebook pode ser uma ferramenta poderosa para ajudá-lo a se
conectar aos seus colegas, compartilhar conteúdo educativo e melhorar a comunicação entre
professores, pais e alunos.”, afirma a cartilha, lançada durante a produção desta dissertação. Seu
lançamento coincidiu com o processo final de análise dos grupos, não nos permitindo um
aprofundamento maior sobre seus norteamentos teóricos, relacionando com a prática discente.
70
Pierce sempre defendeu a natureza social do signo, não opondo,
como fez Saussure, língua/fala, mas eliminando simplesmente o
sujeito do discurso. O eu que fala é o lugar de comunicação do
interpretante em situação e toda situação é social. (SOUZA, 2006, p.
157)
Analisar representações reais de espaços concretos leva em conta os aspectos
amplos da representação de signo e a leitura de Pierce nos permite essa amplitude
representativa, para além das dicotomias saussureanas. Ainda Souza nos lembra
que foi o americano Pierce o responsável por aliar os princípios matemáticos à
leitura e a interpretação dos objetos e das suas representações, numa clara alusão à
necessidade de inter-relação das teorias para avançar nos processos interpretativos.
4.1 DE KKK´S E SILÊNCIOS
O perfil no Facebook dos alunos da escola Ana Lúcia Magalhães foi criado pela
professora de Língua Portuguesa da escola em 2011, com o intuito de relacionar os
conteúdos e leituras realizadas em sala de aula com as práticas virtuais, abrindo
espaço para comentários e discussões entre os estudantes, professores e outros
membros da comunidade escolar. A ferramenta, no início, dialogava com o projeto
“Ciranda de Leitura”, também criado na disciplina Língua Portuguesa, realizado de
modo presencial em sala de aula, que incentivava os alunos a ler e discutir obras
canônicas e não canônicas em sala de aula, construindo resenhas dos livros lidos e
compartilhando suas impressões com outros alunos. O diálogo entre as duas
iniciativas se dava, a princípio, com o estimulo da publicação das resenhas dos
livros lidos, feitas pelos estudantes, na rede social, com o objetivo específico de
estimular que os colegas lessem os livros uns dos outros. Nesse ano, segundo a
professora regente da disciplina, o projeto foi implantado por iniciativa própria, ainda
sob a desconfiança dos pais, coordenadores pedagógicos e outros professores, que
acreditavam que o uso do Facebook pelos alunos iria estimular a dispersão dos
mesmos.
No ano de 2012, a página passou a destinar-se não só a ser uma extensão do
projeto realizado em sala de aula, mas também a disseminação de todo tipo de
informação referente às aulas da disciplina, para as duas turmas do 9º ano do
ensino fundamental II da escola, a saber, o 9º ano A e o 9º ano B. A vontade da
71
professora em usar a rede, mais uma vez, justifica-se com dados estatísticos, não
expressos diretamente pelos envolvidos na construção da citada página, mas que
podem ser elencadas aqui e demonstram uma possível influência: estudo recente da
Experian Hitwise aponta que o brasileiro é o que mais interage com as redes sociais,
sendo que só no Facebook, são mais de 56 milhões de usuários29. Outra pesquisa,
dessa vez do Ibope/YouPix, realizada no mês de julho de 2013, mostrou que 92%
dos jovens do País que acessam a internet usaram redes sociais. Mesmo quando se
leva em conta o total de pessoas que navegam na rede, de todas as idades, são
78% acessando algum tipo de rede social.30 Além disso, a rede possibilita interação
quase imediata, com dispositivos de comunicação em tempo real (bate-papo),
postagem de vídeos, fotos, textos e slides.
O grupo era formado por 87 membros, sendo 86 alunos e a professora idealizadora
do projeto (Figura 5). Eu fui “aceita” no grupo, depois de expor a minha intenção em
analisar a proposta de interação pedagógica à luz dos preceitos educomunicativos.
Digo “aceita” porque a participação só era permitida apenas àqueles que fossem
convidados pela professora; por isso ficou restrita apenas a alunos das duas turmas
do 9º ano da escola, apesar de, segundo a professora, outras turmas tentarem
participar. A professora afirma que, como idealizou o grupo apenas para servir de
complemento às atividades realizadas pelas turmas de 9º ano, não abria a
participação para outros alunos da escola ou para interessados em geral.
Inicialmente, já podemos perceber uma reprodução da prática física no espaço
virtual. Como portas e paredes, que separam as classes, excluem as intervenções
externas e cerceiam a comunicação ilimitada entre entes que não são “apropriados”
ou pertencentes àquele espaço, a aceitação ou não de membros externos ao grupo
no Facebook servia, ao mesmo tempo, para não desviar a atenção dos alunos do
seu propósito de aprendizagem.
29
Segundo matéria veiculada no site Yahoo!, intitulada “Os internautas são a cara do Brasil”. Além
desses dados, o texto diz ainda que o número de crianças em idade escolar que tem acesso a
internet cresceu 19% em um ano.
30
Segundo matéria também do Yahoo!, com informações do jornal O Estado de São Paulo. A mesma
matéria revela um dado importante a respeito do tempo que o brasileiro dispensa usando as redes
sociais: “o tempo gasto na rede garantiu ao Brasil (12 horas por mês, segundo o Facebook) a
segunda colocação no ranking de países do Facebook, ultrapassando a Índia, que tem um número
total de usuários maior. O Brasil é também segundo colocado em usuários, atrás apenas dos
Estados Unidos, do Twitter e do Facebook”.
72
Figura 5
Visão geral do grupo no Facebook da Escola Ana Lúcia Magalhães
Essa primeira pista dada quando do inicio da minha aproximação com o grupo a ser
estudado já me remete a uma das tríades peircianas. Como dito no início dessa
seção, seria mais lógico e até mais simples pensar em Saussure e suas dicotomias
para
analisar
a
forma
como
o
par
professores/alunos
lidavam
com
a
imposição/transposição dos espaços de aprendizagem em ambiente de web. Lucia
Santaella, que também estuda o perfil cognitivo dos leitores atuais, nos dava o alerta
das possíveis dificuldades em usar a semiótica peirciana:
aplicar a teoria dos signos de Pierce não é uma tarefa simples: seus
conceitos são lógicos, definidos com precisão matemática,
geométrica. São muito gerais e abstratos, de acordo com aquilo que
prescreve uma teoria filosófica que se quer cientifica. (SANTAELLA,
2005, p. XV)
Mas, recorrer aos conceitos tríadicos piercianos poderá nos ajudar a entender que
estamos, involuntária ou voluntariamente, reproduzindo considerações e legitimando
imagens. Utilizamos como base os conceitos de primeiridade, secundidade,
73
terceiridade e de sin-signo, quali-signo e legi-signo, nos quais podemos evidenciar a
ideia de “sala de aula” feita pelos alunos, a partir de suas postagens e seus
comentários.
Para Peirce, os fenômenos de percepção da mente são divididos em três esferas: a
primeiridade, que mantém relação com ações ligadas ao acaso, possibilidade,
qualidade, sentimento, originalidade, liberdade, mônada; a secundidade, que
mantém ligação com ideias de dependência, determinação, dualidade, ação e
reação, aqui e agora, conflito, surpresa, dúvida; e a terceiridade, que mantém
relação com ideias de generalidade, continuidade, crescimento e inteligência.
(SANTAELLA, 2009, p. 7).
Ainda pensando nos fenômenos de percepção, identifica-se que a forma mais
simples da terceiridade manifesta-se no signo, sendo que o signo seria qualquer
coisa, de qualquer espécie, que representa algo (o objeto do signo), produzindo
assim um efeito interpretativo (interpretante). Mantendo-se num raciocínio triádico,
Pierce vai afirmar que o vai dar capacidade formal para algo ser um signo seriam a
qualidade, onde tudo pode ser signo; a existência, onde tudo é signo; e a lei, onde
tudo deve ser signo. Nesse sentido, algo que funcione como qualidade para
designar um signo é o quali-signo. À sua potencialidade como ser, existente, que
liga sua existência a outras coisas, é dado o nome de sin-signo. Já algo que institui o
signo como referência para outra coisa – a saber, um hino, uma bandeira, ou algo
que emoldura o singular ao conjunto das coisas, agindo sob força de lei – é dado o
nome de legi-signo.
O grupo no Facebook do 9º Ano da Escola Ana Lúcia Magalhães é uma
representação das salas de aula do 9º Ano da referida escola. Pode ser qualificado
como uma representação em terceiridade da classe, pois “segundo Pignatari (2004,
p. 45), a terceiridade traz as noções de generalização e de lei. Na terceiridade, o
signo provoca na mente uma ligação, um reconhecimento automático, baseado
naquilo que é uma lei, uma convenção.”(BRUNELLI, 2008, p.6. Grifo meu).
Sendo a sala de aula física uma convenção social, onde quem rege e comanda é a
professora, esta é quem exerce sob os alunos o papel de detentora da lei. Assim
74
ocorre no grupo do Facebook, onde os alunos são convidados apenas pela
professora, que os aceita ou os expulsa, de acordo com o seu comportamento
dentro do espaço virtual. Isso pode ser visto em postagens onde os alunos
questionam diretamente à professora se haverá aula ou prova, se devem ler esta ou
aquela obra, ou se podem ou não realizar determinada tarefa. Apesar de ser um
espaço destinado à extensão das práticas, boa parte das postagens age como um
legi-signo da prática escolar.
Os alunos interagem entre si postando imagens e trechos de obras, mas não mais
que assuntos relacionados ao cotidiano escolar. Em sua maioria, as imagens são
representações de momentos das aulas, geralmente feitas pela própria professora,
conforme pode ser visto da Figura 6.
Figura 6
Imagens postadas pelos discentes no grupo
Além de registrar e reproduzir o ambiente escolar, a professora ainda se comporta
como a detentora do poder dentro do grupo, quando comenta as imagens. Na foto
acima, onde podem ser vistos alunos dentro do espaço da sala de aula – em
momento de descontração, mas dentro do espaço escolar – ela comenta em tom
professoral com a aluna: “Inara Pires... conversadeira q só ” (sic); ao que obtém
como resposta uma onomatopeia que representa risos: “kkkkkkkkkkkkkkkkkk´ sim,
75
sim” (sic), numa reprodução do que poderia certamente ser um comportamento de
sala de aula.
A análise do grupo teve início em agosto de 2012. A partir desse período, podemos
notar que a maioria das postagens partia da professora, numa evidente
hierarquização do poder de utilização do espaço – mais uma representação de lei,
do legi-signo. Mesmo em ambiente virtual, ela é a professora. A princípio, as duas
turmas conviviam no mesmo grupo, respondendo aos estímulos da professora com
postagens a respeito dos livros lidos ou das atividades programadas em sala de
aula.
Não muito depois, no mês de setembro, segundo a própria professora, os alunos
solicitaram que o grupo fosse dividido, tornando-se um para o 9º ano A e outro para
o 9º ano B. Outra evidência de reprodução do ambiente escolar, já que a divisão,
justificou a professora, deveu-se ao fato de que os alunos de uma classe não
queriam que os alunos da outra classe soubessem o que eles faziam ou como eram
desenvolvidas as suas atividades, mantendo e estendendo na rede uma espécie de
competição que já existia entre as paredes escolares.
Mesmo com a utilização – e a aprovação por parte dos alunos – de ferramentas
inovadoras em sala de aula, a prática pedagógica em questão continua sob o signo
da lei, representado na forma de um quase simulacro a sala de aula real, com
paredes, quadro, porta e horários. Estudiosos da aplicabilidade dos estudos culturais
em sala de aula afirmam que estamos “numa era na qual a tecnologização da
natureza e a naturalização da tecnologia apagaram antigas e confortadoras
fronteiras (...)” (GREEN & BIGUM, 1995, p. 229). Entretanto, a utilização de
ferramentas midiáticas como o Facebook em sala de aula como forma de
reprodução da prática educativa reforçam essas fronteiras que antes estavam
apagadas, dando a elas apenas novos lócus.
Na figura 7, vemos a aprovação dos alunos quanto ao uso do Facebook em sala de
aula. Os comentários, com algumas exceções, são repletos de onomatopeias que
representam o riso (sin-signos de risadas dos alunos) (Figura 8). Quando não isso,
sugerem a utilização de ferramentas que possam tornar o uso do Facebook em sala
76
mais eficiente (quali-signos). Além disso, o diálogo também é um signo, que reforça
mais uma vez a representação (legi-signo) da sala de aula, que, se lido sem levar
em conta a linearidade textual – marca da construção feita em rede – pode ser visto
como a mesma conversa cheia de ruídos e frases entrecortadas, esboçando um
diálogo dual e complexo.
Figura 7
Pesquisa proposta pela docente
Os risos, ou melhor, as onomatopeias de riso emitidas pelos alunos também podem
ser interpretadas a partir das teorias do cômico e humor, como algo que substitui a
ausência de interação, ou pior ainda, que substitui a tensão existente em um
determinado ambiente.
O ambiente escolar já é, per si, um lócus de tensão entre dois componentes:
professores e alunos. A transposição para a rede social, lugar de interação mais
descontraída, leve e sem os possíveis atritos causados pela normatização escolar e
pela cobrança de resultados positivos – notas, presença, assiduidade, pontualidade
– poderia amenizar esse padrão, trazendo a leveza do humor para dentro das
“paredes” e “salas”.
77
Figura 8
Comentários dos alunos para a pesquisa
Entretanto, como pode ser visto nas análises acima e nas imagens postadas, essa
tensão se reproduzia, podendo ser legitimada ou pelos constantes “silêncios”
(ausência de interação nas postagens, falta de respostas às perguntas feitas pela
professora ou de postagens espontâneas que levantassem abordagens diferentes
para os temas escolares), ou pelos “risos”, que não raro eram utilizados como
respostas padrão para qualquer pergunta ou repreensão.
Para pensar melhor sobre isso, cito Bergson (1900) e sua análise do riso como
forma de superar os embates:
Quelquefois, il est vrai, ce mécanisme est plus malaisé à apercevoir.
Et nous touchons ici à une nouvelle difficulté de la théorie du
comique. Il y a des cas où tout l’intérêt d’une scène est dans un
personnage unique qui se dédouble, son interlocuteur jouant le rôle
d’un simple prisme, pour ainsi dire, au travers duquel s’effectue le
dédoublement. Nous risquons alors de faire fausse route si nous
cherchons le secret de l’effet produit dans ce que nous voyons et
entendons, dans la scène extérieure qui se joue entre les personnages, et non pas dans la comédie intérieure que cette scène ne fait
que réfracter. Par exemple, quand Alceste répond obstinément « Je
ne dis pas cela ! » à Oronte qui lui demande s’il trouve ses vers
mauvais, la répétition est comique, et pourtant il est clair qu’Oronte
ne s’amuse pas ici avec Alceste au jeu que nous décrivions tout à
78
l’heure. Mais qu’on y prenne garde ! il y a en réalité ici deux hommes
dans Alceste, d’un côté le « misanthrope » qui s’est juré maintenant
de dire aux gens leur fait, et d’autre part le gentilhomme qui ne peut
désapprendre tout d’un coup les formes de la politesse, ou même
peut-être simplement l’homme excellent, qui recule au moment
décisif où il faudrait passer de la théorie à l’action, blesser un amourpropre, faire de la peine. La véritable scène n’est plus alors entre
Alceste et Oronte, mais bien entre Alceste et Alceste lui-même. De
ces deux Alceste, il y en a un qui voudrait éclater, et l’autre qui lui
ferme la bouche au moment où il va tout dire. Chacun des « Je ne dis
pas cela ! » représente un effort croissant pour refouler quelque
chose qui pousse et presse pour sortir. Le ton de ces « Je ne dis pas
cela ! » devient donc de plus en plus violent, Alceste se fâchant de
plus en plus — non pas contre Oronte, comme il le croit, mais contre
lui-même. Et c’est ainsi que la tension du ressort va toujours se
renouvelant, toujours se renforçant, jusqu’à la détente finale. Le
mécanisme de la répétition est donc bien encore le même.
(BERGSON, 1900, p.?)31
O chiste repetitivo e os kkk´s que se repetem, muitas vezes não sendo a real
expressão do riso real, quebram a frieza do ambiente que se propõe leve, ao mesmo
tempo que legitimam a aparência de rotina escolar, onde os risinhos, as piadinhas e
os gracejos de uns, frente a sisudez, a sobriedade e a dureza de outros (esteriotipais
e arquetipais, claro) servem para estabelecer quem é o detentor do saber e quem
deve ser o receptor desse saber.
Além disso, é interessante pensar mais uma vez na informação de Bauman quando
pensamos na necessidade dos kkk´s, por exemplo, nas redes sociais ou nos
comentários em rede que refletem onomatopeias ou outras marcas típicas da
linguagem fática. Eles servem para marcar o lugar de fala e ao mesmo tempo para
demonstrar que há uma interação social presente ali. De outra forma, o humor pode
servir também como forma de amenizar situações de conflito que, em rede, não são
passíveis de solução de forma tão clara quanto com o diálogo “olho no olho”. “No
caso das [relações] socioafetivas, observa-se que a presença do humor nas
31
Creonte pergunta a Alceste se seus versos são ruins, e Alceste (Alceu, na verdade) reponde "eu
não disse isso". A repetição da frase "eu não disse isso" produz um efeito cômico. Mas cuidado,
existem dois Alceu presentes: um misantropo que jurou dizer sempre a verdade e outro, um gentil
homem polido. A cena não é mais entre Orestes e Alceu, mais entre esses dois Alceus, um que
quer explodir e outro que se cala e só consegue dizer: "eu não disse isso", Cada um desses "eu
não disse isso" representa um esforço maior para reprimir algo que pede para sair assim, o tom
dos "eu não disse isso" se faz cada fez mais violento, estando Alceu zangado não contra Oreste,
como este pensa, e sim contra si próprio, e assim a tensão vai se renovando. O mecanismo da
repetição está ai, mesmo sendo diferente.... (N. A)
79
interações colaborativas on-line parece amenizar possíveis divergências e
diferenças nas comunidades.” (SHEPERD e SALIÉS, 2012, p. 221).
O uso da semiótica para entender a linguagem adotada pelos estudantes e por
professores na construção e participação de um grupo de uma disciplina, de uma
determinada escola, em uma determinada rede social, nos faz refletir a respeito das
construções escolares que pretendemos fazer. Como vem sendo dito ao longo
dessa dissertação, emerge a necessidade de uma nova configuração escolar,
principalmente pelo grande fluxo de informação a que todos nós – como discentes,
docentes ou apenas cidadãos/consumidores – estamos expostos. Com o aumento
vertiginoso do número de brasileiros em redes sociais como o Facebook,
concomitantemente com o aumento da permanência dessas pessoas nessas redes,
proporcionado pela facilidade com que elas podem ser acessadas através de
celulares e outros equipamentos de pequeno porte, fica evidente que as fronteiras –
cada vez mais difíceis de distinguir – irão continuar em constante processo de
liquidez.
Entretanto, quando essa rede é usada como forma de legitimar um signo em seu
formato usual, vemos que estamos ainda diante de um desafio que nos confronta de
forma direta. O melhor uso das redes, em especial do “Face” em sala de aula é
como legitimador do poder simbólico da sala entre paredes? Mudar as práticas
apenas de plataforma é uma nova forma de utilização da linguagem e dos signos?
Podemos utilizar signos inovadores sem legitimar os que já existem?
Percebe-se que no grupo analisado, talvez esse tenha sido um caminho. Os
interpretantes – tanto estudantes quanto professora – talvez tenham agido apenas
sob a força de lei do signo sala de aula.
4.2 RETALHOS E MOSAICOS
Diferente do grupo do Facebook na escola estadual de Lauro de Freitas, a página no
Facebook criada pelos discentes de Relações Públicas foi feita em parceria direta
entre discente/docente. Participei desse processo de forma mais direita, já que os
80
discentes eram meus alunos na disciplina Oficina de Produção Textual, ministrada
para cumprir o estágio docente obrigatório para obtenção do título de mestra.
A princípio, a escolha da disciplina foi motivada pela relação próxima entre
Comunicação/Educação. A ementa da disciplina envolve noções de Gêneros
Textuais como Narração, Descrição, Dissertação, além de textos midiáticos e a
produção de uma peça de mídia como forma de avaliação final. Tradicionalmente
essa mídia era um cartaz, mas, pensando num possível diálogo entre a temática da
minha pesquisa, o pedido feito pela professora regente de “dar novos ares à sua
disciplina” e o perfil previamente analisado dos discentes da turma, definimos que a
culminância desse projeto seria um blog com o resultado das produções textuais e
imagéticas dos alunos, dentro da temática “Ver a Cidade” (sugerida pela professora
regente e voltada para as análises e percepções pessoais da cidade de Salvador).
O perfil dos discentes: jovens de 17 a 25 anos, recém-saídos (em sua maioria) do
ambiente escolar formal, moradores de Salvador, majoritariamente de classe média,
quase todos iniciando uma trajetória acadêmica pela primeira vez. Esse perfil se
encaixa no perfil da chamada Geração Y, onde a comunicação e as tecnologias de
informação fazem parte do dia-a-dia das pessoas. Muitos deles afirmaram optar pelo
curso de Relações Públicas por almejar outros percursos profissionais (Jornalismo,
Roteiro Cinematográfico, Produção Cultural), o que demonstra, também, uma certa
incerteza quanto ao futuro acadêmico/profissional.
Esse perfil coaduna com a temática proposta pela minha pesquisa, ajudando a
formular questões importantes para a minha dissertação, tais como “Que relação
pode ser estabelecida entre as redes sociais e o processo educacional?” ou “Como
a Educomunicação pode ajudar a solucionar a possível crise na educação do século
XXI?”, ou ainda “Os processos de leitura e escrita estão sendo deixados de lado na
era informacional?”. Estes questionamentos foram externados por mim aos
discentes no momento do primeiro encontro, quando fui arguida, por eles, qual seria
o meu objetivo com o tirocínio e como eles poderiam participar.
O dinamismo e o “estar sempre conectado”, características da juventude do século
XXI, também eram qualidades marcantes da turma, tanto que no primeiro momento
81
em que foi sugerida a interação do aprendizado em sala de aula com atividades on
line, os mesmos se mostraram amplamente dispostos e sugeriram, inclusive, que
não uma, mas as duas ferramentas fossem usadas pela turma, a saber, a
construção do blog e da página do Facebook destinada a socializar a produção
textual feitos em sala de aula.
Foram feitas, depois do início das aulas, mais duas chamadas de matrículas, o que
acarretou um aumento considerável de alunos em sala de aula (eles passaram de
20 para 40 em média) mais um atraso geral nas atividades por conta de alguns
deles não estarem familiarizados com a dinâmica da disciplina apresentada no
primeiro dia de aula. Esses atrasos não permitiram que todas as atividades do
módulo e previstas on line fossem aplicadas, mas não impediram que a página da
turma fosse aberta no Facebook32 e o blog33 fosse criado. Ambas intituladas “Baú de
Retalhos”, as páginas foram iniciadas em sala de aula, pelos próprios alunos e,
tinham como ideia inicial servir de plataforma de compartilhamento dos textos
produzidos em sala. Todo o processo de criação, produção de material e
manutenção das páginas foi pensado pelos discentes. O nome foi escolhido através
de sugestões dadas por eles em classe e, no fim, foi votado entre eles por trazer um
significado que remete a relação entre o mosaico de ideias que eles formam – por
serem muitos e diferentes uns dos outros – e o revirar de pensamentos e reflexões
guardados nas memórias de cada um que as atividades de produção textual
despertam.
A produção dos espaços virtuais, o texto e a linguagem utilizados, tanto pelos
discentes quanto pela professora regente da disciplina e a disposição – pouca –
para interação entre ambiente web e ambiente físico, mais uma vez, reforça a lógica
peirciana para analisar a utilização das redes em sala de aula. Os envolvidos nesse
processo – interpretantes, segundo Pierce – utilizam-se de códigos que podem ser
chamados de experiências de comunidade. Ainda citando Souza:
32
http://www.facebook.com/pages/Ba%C3%BA-de-Retalhos/318500381610225
33
http://www.bauderetalhosrp.blogspot.com/
82
É o campo da virtualidade, onde tudo está para ser criado. Na
secundidade, estão os tipos de comunidades restritos, baseados na
experiência existencial, os clubes, as gangues, as associações
religiosas e acadêmicas, cuja linguagem é específica: gíria,
linguagem técnica, jargões (...) A sociedade é um código múltiplo
com regras estabelecidas, mas que podem ser transformadas cada
vez que os interpretantes da primeiridade e da secundidade propõe
novas experiências. (SOUZA, 2006, p. 169).
O projeto “Ver a cidade”, como explicado anteriormente, era o projeto de avaliação
final proposto pela Professora Cida Ferraz, regente da disciplina. Consistia em
analisar a cidade, em grupos de no máximo 4 alunos (o número varia de turma a
turma), e, através de uma temática escolhida por cada grupo, discorrer sobre as
visões sobre a cidade de Salvador. A ideia da produção do projeto é apresentada
sempre no início da disciplina, quando da leitura da ementa, e o tema central (a
construção da imagem da cidade de Salvador) é discutido ao longo de toda a
disciplina, com textos literários e poéticos que passam por leituras de cidades, por
sensações citadinas (vistas de janelas de ônibus, sensações corriqueiras de visões
de rua, da casa, do bairro, construções de lembranças particulares, etc.) e que vão
incitando os discentes a construírem uma visão mais crítica no lócus onde estão
inseridos.
Acompanhando as atividades semanais da disciplina, sugeri que cada construção
dessas fosse registrada em linguagem verbal e imagética. Como a culminância do
projeto seria nos últimos cinco encontros (formatação, produção de resenha
baseada em discussões de textos teóricos sobre o tema constantes no “Caderno de
Atividades” e, por fim, apresentação do produto final), nas duas primeiras unidades a
temática foi alimentada a partir de postagens feitas pelos alunos especificamente na
página do Facebook da turma, onde o espaço de discussão e interação seria mais
aberto. Trechos de textos deles ou canônicos, filmes e imagens foram publicados, a
partir dos temas que estavam sendo propostos em sala de aula para produção.
(Figura 9)
83
Figura 9
Página inicial do grupo de Relações Públicas no Facebook
Uma das aulas foi ministrada no laboratório de informática do Departamento de
Ciências Humanas34, proporcionando a realização de um encontro de forma digital.
Nesse dia iniciamos a produção do que viriam a ser os primeiros cartazes de
divulgação dos grupos para o projeto “Ver a cidade”, atualizamos o blog com textos
e imagens da aula e a página do Facebook com postagens sobre o que eles
chamaram de “bastidores da aula”. O encontro serviu também para que eles
avaliassem o andamento da disciplina no plano da proposta on line, parcialmente, e
sugerissem mudanças que fariam com que a interação fosse maior.
34
A utilização dos espaços acadêmicos para utilização das redes sociais ainda é um entrave a ser
superado. Não só no caso relatado nesta dissertação, como pode ser visto em texto de CARMO
sobre experiência parecida com a nossa, realizada no Campus III da Uneb. O autor afirma:
“Embora haja um entusiasmo no meio acadêmico acerca da apropriação e da utilização dos sites
de mídias e redes sociais no ambiente acadêmico, a discussão teórica da utilização dessas
ferramentas esbarra em uma questão prática e burocrática dentro da Universidade do Estado da
Bahia. O sistema de funcionamento da Universidade é Multicampi, são 29 departamentos, em 24
campus. O acesso a internet em todos eles se dá através de login e senha específicos e
individuais, estudantes e professores não tem acesso aos sites de Redes e Mídias sociais, a
Unidade de Desenvolvimento Organizacional, UDO, instância da Universidade ao qual a Gerência
de Informática, Gerinf, está subordinada, alega que se o acesso for liberado provocaria um
congestionamento na rede, já que a largura de banda não dá conta de toda a demanda
acadêmica, na capital e no interior da Bahia.” (2013, p. 9)
84
Com a mudança do produto final de um cartaz para ferramentas digitais, os grupos
montaram clipes e blogs para expor as temáticas escolhidas: Comércio informal e de
shoppings em Salvador; Janelas Polifônicas; Cidade Vivida x Cidade Vendida e os
Grafites Gritam. Apenas um grupo não conseguiu apresentar o seu trabalho, por
problemas... tecnológicos! O resultado das atividades também foi compartilhado on
line¸ através das já referidas mídias sociais, mas os relatos de como as construções
dos filmes e dos registros fotográficos influenciaram mudanças no olhar dos alunos
foi o resultado mais recompensador de toda a disciplina.
Através da experiência desse semestre, pude perceber como as redes sociais
podem servir como grandes fortalecedores de laços reais. A turma, numerosa,
estabeleceu vínculos e desejo internos, que foram externados nos contatos virtuais,
mas, também, nos resultados das leituras e dos compartilhamentos dos “retalhos”
guardados em seus Baús pessoais.
Entretanto, pude notar as mesmas dificuldades de transposição de experiências
primárias e secundárias que foi percebido no grupo da escola Ana Lúcia Magalhães.
Quando os estudantes de Relações Públicas foram tencionados a publicar,
espontaneamente, sem nenhum tipo de retorno quantitativo – nota, pontuação extra
ou coisa similar – acontecimentos cotidianos que não versassem apenas sobre as
produções textuais sugeridas em sala (como as manifestações que aconteceram
pelo Brasil durante o período e nas quais a maioria da turma esteve presente
ativamente), os discentes relegaram o espaço criado por eles próprios a segundo
plano, mesmo que fizessem o que foi pedido pela professora regente e por mim
(compartilhar os seus registros visuais das manifestações, suas impressões,
proporem soluções para os problemas apontados pelos manifestantes...) em suas
páginas pessoais. Essa distância da página criada em sala de aula para as páginas
pessoais reforça a ideia de que, mesmo em ambiente virtual, há, da parte dos
envolvidos, uma ideia de separação de espaços, onde as salas de aula são apenas
espaços formais de aprendizado.
Em diversos momentos a produção textual, apenas sugerida por temas definidos por
professora Cida Ferraz, levou a turma inteira a rir ou a chorar de emoção, ampliando
85
uma visão que parece ser imediatista e desprovida de sentimento quando exposta
apenas à fria folha de papel ou a insípida tela do computador.
Ainda nos últimos encontros com a turma, depois de sugestão da professora
regente, os discentes pediram que o blog, uma iniciativa de socialização apenas de
produtos de uma disciplina, permanecesse por todo o curso, como uma Atividade
Curricular. Eles próprios sugeriram a apresentação de um projeto para a
coordenação
do
curso,
fazendo
com
que
o
endereço
www.bauderetalhosrp.blogspot.com se torne um espaço de discussão acadêmica,
do curso, da carreira, e dos sonhos de jovens escritores de suas próprias histórias.
Tanto na página do Facebook da turma de Relações Públicas da Uneb, no blog
criado por essa turma – ambos observados durante entre março e julho de 2013 –
quanto página na mesma rede social da turma do 9º da escola Ana Lúcia Magalhães
é possível coletar referências imagéticas que nos reportam a criação de um universo
que recria os espaços externos de aprendizado.
No caso da sala do 9º ano do Ana Lúcia Magalhães, isso se exemplifica pelas
constantes postagens de imagens que refletem o cotidiano em sala de aula:
momentos de estudo, descontração ou não, espaços que são delimitados ainda
pelas paredes escolares mais uma vez ganham grande relevância para os alunos.
Como é apenas um grupo dentro de um espaço já delimitado por características
próprias (a página do Facebook e os grupos criados dentro dela, ao contrário de
outras redes sociais voltadas especificamente para a interação entre membros, a
respeito dos mais diversos assuntos, não permite personalizações muito drásticas
em seu layout. O padrão azul, as fontes ou a disposição das imagens, não são
mutáveis, apesar de muitos usuários acreditarem nessa possibilidade).
No caso do Blog e da página no Facebook “Baú de Retalhos”, são a linguagem e a
interação nas postagens que dão o tom da necessidade de apropriação do espaço,
mesmo reforçando espaços legitimados de ensino. Entretanto, nos dois casos, é
possível perceber que, para que o projeto educomunicativo funcione, é preciso
repensar os papeis desempenhados pelos personagens desses roteiros, indo além
da simples mudança de cenários.
86
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Devemos assimilar o mundo que apreendemos pela
vista à estada na prisão, à luz do fogo que ilumina a
caverna à ação do sol. Quando à subida e a
contemplação do que há no alto, considera que se
trata da ascensão da alma até o lugar inteligível.”
(Platão)
Quando Platão, através do diálogo entre Sócrates e Glauco, ilustra o mito do homem
que sai da caverna e vê mais que as sombras a que ele estava acostumado dentro
de seu claustro, mostra que aquilo que julgamos conhecer como verdade, pode
apenas ser o reflexo das sombras, as projeções do real que se colocam como
verdadeiro e definitivo. A primeira reação do homem que sai da caverna ao encarar
o mundo “real” é o estranhamento. Logo em seguida, sofre com a sensação de dor
frente aquilo que não conhece e, por fim, acomodação ao novo e rejeição daquilo
que julgava como certo. Ao ser recolocado ao seu ambiente de origem, esse homem
que um dia começou a entender que o sol era quem gerava as sombras que via de
dentro de seu cárcere e que estas eram homens iguais a ele, novamente se
encontra na posição de estranhamento. Agora, ele se torna um estranho numa
realidade que antes era “sua”, e essa comparação das imagens do que via e do que
viu o tornam confuso quanto ao seu lugar de origem, transformando o seu novo
saber em vão.
Podemos ver claramente na Alegoria da Caverna um dos contrapontos conceituais
explanados ao longo dessa dissertação. Afinal, concretamente, o que é real ou o
que é virtual? A realidade é aquilo que conhecemos ou é apenas o reflexo daquilo
que somos tencionados a acreditar? A análise desses conceitos, especialmente nas
seções 2 e 3 desse trabalho nos permitiu entender que todos nós, seres dentro de
um espaço coletivo de inteligência, mas, especialmente, educadores e educandos,
somos em algum momento esses “estranhos prisioneiros”, como qualifica Glauco
quando apresentado, a princípio, a alegoria socrática.
87
Do mito da caverna podemos avaliar o quanto é difícil por em prática algo que se
propõe a ser a interação entre as formas de ver a realidade de dentro das cavernas
e do lado de fora delas. Primeiro, quando se pensa em algo que nos tire de uma
realidade a que estamos acostumados, acomodados, e nos leve para uma outra, o
medo e o estranhamento são reações imediatas. “E se alguém tentasse retirar os
seus laços, fazê-los subir, você acredita que, se pudessem agarrá-lo e executá-lo,
não o matariam?”, pergunta Sócrates a Glauco.
O medo do estranho companheiro que voltou a caverna e quer ajudar os outros a
entender a realidade lá fora é o primeiro desafio a ser superado pelo educador
moderno. Escondido atrás do medo de ser substituído pelos meios, pelas
ferramentas tecnológicas, ou ainda, afixada atrás do receio de que, em meio a um já
tão penoso claustro de rotinas, ele precise acrescentar mais uma – a de administrar
diversas realidades – há na verdade um sentimento maior de estranhamento, que na
maioria dos casos impede que esses meios sejam agregados às práticas
educacionais a fim de proporcionar uma leitura de mundo um pouco mais próxima
daquilo que viria a ser um fragmento do real, levando em conta inclusive as
experiências do outro, do educando, do aluno, que, assim como o educador,
também vê sombras.
Ainda na seção 2, mas, especialmente, na seção 4, quando das análises das
experiências que foram observadas durante essa pesquisa, podemos perceber que
essa mudança de espaços de “realidades” nos leva a uma oposição, ou quem sabe,
ainda, a uma ruptura nos papeis de legitimação de poder institucionalizado. “(...)
Quanto às recompensas concedidas àquele que fosse dotado de uma visão mais
aguçada para discernir a passagem das sombras na parede (...)”. Quanto ao poder
simbólico daquele que é dotado do “saber científico”, único necessário, que não leva
em conta o arcabouço social do outro, e se glorifica de exercer esse poder dentro de
um ambiente que deveria ser de troca de saberes, e não de reprodução de
sombras? A manutenção desse poder simbólico do “dotado de visão mais aguçada”
é outro obstáculo a saída da caverna. Levar em conta saberes que não são
dominados pelo detentor desse poder é outro desafio para o educador moderno.
Mediá-los é o passo seguinte. Essa mediação se mostra possível, mas não simples
ou tranqüila, como podemos ver, pois ainda legitimamos os valores referentes aos
88
espaços entre paredes, sem avaliarmos como aplicá-los, levando-se em conta as
diferenças existentes nos espaços líquidos das cibervias.
“Devemos assimilar o mundo (...) à estada na prisão”. A estada na caverna e as
sensações que isso proporciona são os fragmentos de realidade que se põe aos
olhos de todos os indivíduos, distorcendo sombras, aumentando monstros, viciando
o olhar. Fragmentada é a realidade, fragmentados são os saberes, fragmentadas
são as imagens e as informações dispostas na sociedade do século XXI. Os presos
que tem a sua cabeça virada apenas para uma direção são os indivíduos dessa
sociedade fragmentada que tem a vista inclinada apenas para um foco, o foco do
alienado. A subida da alma para esse lugar inteligível é este posto que se deva
desejar alcançar, propondo ao educador o papel daquele que foi até fora da caverna
e voltou, que venceu o medo, o estranhamento e a acomodação e que soube utilizar
aquilo que já tinha como conhecimento inato para apreender aquilo que lhe é
apresentado como “saber real”.
O desafio não é simples. Envolve mudar hábitos antigos, assumir fraquezas,
aprender a valorizar os erros e os acertos, os processos de aprendizado e não
apenas os resultados finais... E o desafio também não é óbvio. Educomunicar não é
apenas agregar ferramentas tecnológicas em sala de aula, brincar de ensinar ou de
ouvir os saberes dos educandos, relegando a papéis subalternos conhecimentos
que não sejam acadêmicos. Entretanto, mesmo nas previsões mais catastróficas
acerca do futuro da educação no século XXI35, o professor continua com o seu papel
primordial de alfabetizador, e o tempo de formação dos saberes mantém-se contínuo
e ilimitado.
Se conseguirmos pensar que o indivíduo que sai da caverna é o detentor das boas
novas e que aqueles que ainda estão presos são os que não querem ver mais do
que as sombras entenderemos, num período em que as mobilizações e as pressões
por mudanças têm partido das iniciativas on-line, que estamos realmente num
período em que as vozes poderão ser ouvidas a partir das malhas das cibervias.
35
Ainda no Dicionário do Séc. XXI de Atalli, ao definir educação, há prognósticos de que a educação
como conhecemos se tornará uma industria do espetáculo, que levará a um relativo descrédito
dos professores aos olhos dos alunos capazes de se defrontar com um outro saber disponível nos
meios de comunicação. (p. 147-148)
89
Através da observação participada e das experiências em sala, pude perceber que
um longo caminho ainda pode ser trilhado rumo ao processo de adotar as
tecnologias, especialmente as de interação social como o Facebook e o Youtube,
por exemplo, em sala de aula. Mesmo fazendo uma pesquisa que trilhou,
inicialmente, o caminho da revisão bibliográfica dos temas abordados, posso dizer
que esse trabalho também se insere na gama dos empíricos, por se tratar de uma
experiência em que pude vivenciar a aplicabilidade de uma proposta inovadora, que
era a utilização do Facebook como extensão – e por que não dizer – reapresentação
do espaço de aprendizado e leitura.
Para os preceitos educomunicativos, fazemos parte, junto com os nossos
educandos, de um ecossistema. Segundo Lemos e Levy “um ecossistema, uma
espécie viva, uma sociedade animal, uma sociedade humana, um organismo, um
sistema imunológico ou um cérebro podem ser chamados de ‘inteligentes’” (2010, p.
221). Ou seja, a inteligência viria dessa rede de compartilhamentos celulares que
podemos construir, abrindo caminho para processos de experimentação como os
relatados ao longo desta dissertação ou, apenas, para o diálogo mais aberto e
pluridisciplinar, como é proposto por lei, mas relegado ao esquecimento por aqueles
que creem apenas na reprodução fabril do século XIX.
A conclusão do artigo de SOARES sobre o perfil do profissional que se enquadra no
perfil de educomunicador é de que
Um grande número de respostas ao questionário (aplicado aos
educadores) aponta, por fim, como expectativa de resultado, a
formação para a cidadania e para a ética profissional, objetivando a
educação do “cidadão global.” (grifo nosso)
O que está em jogo para a saída da caverna em direção a aplicabilidade da proposta
educomunicacional é a capacidade do educador de abrir os espaços escolares para
a sua função mais inata, a da troca de experiências e de saberes, sem medos ou
restrições, valorizando os conhecimentos inatos e os tecnológicos, utilizando-se dos
meios como ferramentas e não como substitutos, proporcionando uma mediação
90
construtiva entre informação e conhecimento, a fim de que as novas leituras de
mundo sejam construídas, dissipando as sombras e facilitando o olhar – de
educandos e educadores – direto à luz.
Sozinho, sabendo que havia sol lá fora, o prisioneiro que volta da caverna é só mais
um prisioneiro que viu a luz do dia por outro ângulo. Se os outros prisioneiros o
ouvissem, ou ao menos se mobilizassem para entender as sombras que se
formavam – e não apenas tivessem medo delas, talvez o movimento proposto pelo
tempo da educação deixe de ser inverso, como sugerido na seção 3, passando do
obrigatório Cronos para o prazeroso Kairós e, quem sabe, para um tempo alinear,
multidirecional e transdisciplinar, como as cibervias, tornando possível o acesso ao
saber por diversos caminhos possíveis e passíveis de serem trilhados.
91
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